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UMA DAS MAIS BELAS PASSAGENS DO MASNAVI

                      A HISTÓRIA DE MOISÉS E O PASTOR

   •   Um dos trabalhos mais conhecidos e influentes tanto do sufismo quanto da literatura da
       Pérsia. Contando com seis livros de poemas compreendendo mais de 50.000 linhas,
       representa em 424 histórias a luta e o sofrimento do homem em sua busca por Deus.

Certa vez, Moisés ouviu um pastor que rezava de forma espontânea: “Ó Deus,
mostra-me onde estás, para que eu possa tornar-me Teu Servo, para que eu
amarre Tuas sandálias e que eu penteie Teus cabelos, para que eu lave Tua
roupa, mate Teus piolhos, traga Teu leite, oh meu adorado! Que eu beije Tua
mão amada, que eu massageie Teu pé amado e no momento de dormir,
balance Tua pequena cama. Ó Tu, a quem todas as minhas cabras são
ofertadas em sacrifício; ó Tu em quem eu penso, lânguido, pleno de desejo de
amor”. Ao ouvir a oração do pastor, Moisés, o profeta legalista, repreende-o
severamente, identificando-o como alguém perverso e ímpio, por referir-se ao
Deus juiz de forma assim tão familiar e estúpida. Para ele, o grande Deus não
necessitava de um semelhante serviço. Diante de tal atitude, o pastor,
envergonhado e transtornado, com a alma queimada, rasga suas roupas e
retira-se para o deserto. Neste momento, veio do céu uma revelação de Deus
a Moisés, que dizia: “Separaste meu servidor de Mim. Eis que viestes para
reconciliar meu povo comigo, e não para afastá-lo de mim. De todas as
coisas, a mais detestável a meus olhos é o divórcio. Dei a cada povo uma
forma de expressão. (...) Não tenho necessidade de seus louvores, estando
acima de toda necessidade. (...) Não considero as palavras que são ditas,
mas o coração que as oferece, pois o coração é a essência e a palavra
acidente. (...) Ó Moisés, aqueles que amam os belos ritos são de uma classe,
aqueles cujos corações e almas ardem de amor são de outra. (...) Não é
preciso virar-se para a Caaba quando se está nela, e mergulhadores não
precisam de sapatos. (...) A religião do amor é diferente de todas as outras
religiões, pois para os amantes, Deus é a fé e a religião”. Em seguida, Deus
infundiu no íntimo do coração de Moisés os mistérios que palavra humana
alguma alcança. As palavras invadiram seu coração, transformando
radicalmente sua visão. Após compreender a reprovação de Deus, Moisés
corre ao deserto em busca do pastor. Ao encontrar-se com ele, assim se
expressa, movido de compaixão: “Não busque regra alguma, nem método de
adoração; diga tudo o que seu coração aflito deseja. Tua blasfêmia é a
verdadeira religião, e tua religião é a luz do espírito: estás salvo, e graças a ti
um mundo inteiro salvou-se igualmente”

Com esta bela história de Moisés e o Pastor, Rûmî quer reforçar a idéia da
presença graciosa de Deus que age de forma diversificada nos corações,
provocando expressões distintas e particulares de acolhimento, para além das
rígidas fronteiras traçadas pelas ortodoxias muitas vezes frias e insensíveis.
A RELIGIÃO DO AMOR



A religião do amor é aquela que vem sempre acompanhada das boas ações.
Mais importante do que as expressões da fala é a realidade de afirmação
de um sentido reto. As más ações constituem expressão de um coração
corrompido, produzindo um hálito negativo junto às narinas de Deus
(MIII, 169). Quando há pureza na experiência de louvor a Deus, a
impureza se levanta e vai embora (MIII, 186). Não há, melhor
companheiro do que as obras para atravessar a existência. Nem os
amigos, nem todas as riquezas e bens da terra conseguem acompanhar
o ser humano para além da tumba, mas sim a excelência de suas ações
(MV, 1045-1047). Deus é melhor invocado com a língua dos atos, pois a
língua das palavras é frágil (MV, 1044). O amor, é o fiel escudeiro do ser
humano nos tempos de sua avaliação derradeira:


      “No dia da Ressurreição, homens e mulheres comparecerão
            pálidos e trêmulos de medo para o julgamento final.
          Eu apresentarei o teu amor em minhas mãos e Te direi:
                      Interrogue-o, ele te responderá.”



“Um dia, um homem chegou diante de uma árvore. Viu folhas, ramos, frutos
estranhos. A cada um perguntou o que eram essas árvores e esses frutos.
Nenhum jardineiro o compreendeu, nem sabia o nome da árvore, nem lhe
pôde indicar o que ela poderia ser. O homem disse a si mesmo: Se não posso
compreender que árvore é essa, contudo sei que, depois que deitei meu olhar
sobre ela, meu coração e minha alma se tornaram frescos e verdes. Vou
então me colocar a sua sombra.”46
A presença deste mistério na vida de Rûmî é tão impressionante que só o
silêncio é capaz de dar conta da lâmina de seu conteúdo. Muitos de seus
poemas terminam conclamando o silêncio:

“Silêncio!
E depois mais silêncio.
Não use a boca para falar.
A boca é para provar dessa doçura47”

“seus lábios são silenciosos, embora seu coração esteja repleto de
vozes” (MV,2238).

Os sufis verdadeiros buscam ardentemente a essência. É a alma nobre
que perdura. As palavras são acidentes efêmeros, que passam. “As
preces rituais, a guerra santa, os jejuns não perdurarão, mas sim o
espírito (que habita a pessoa iluminada)” (MV, 249).

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  • 1. UMA DAS MAIS BELAS PASSAGENS DO MASNAVI A HISTÓRIA DE MOISÉS E O PASTOR • Um dos trabalhos mais conhecidos e influentes tanto do sufismo quanto da literatura da Pérsia. Contando com seis livros de poemas compreendendo mais de 50.000 linhas, representa em 424 histórias a luta e o sofrimento do homem em sua busca por Deus. Certa vez, Moisés ouviu um pastor que rezava de forma espontânea: “Ó Deus, mostra-me onde estás, para que eu possa tornar-me Teu Servo, para que eu amarre Tuas sandálias e que eu penteie Teus cabelos, para que eu lave Tua roupa, mate Teus piolhos, traga Teu leite, oh meu adorado! Que eu beije Tua mão amada, que eu massageie Teu pé amado e no momento de dormir, balance Tua pequena cama. Ó Tu, a quem todas as minhas cabras são ofertadas em sacrifício; ó Tu em quem eu penso, lânguido, pleno de desejo de amor”. Ao ouvir a oração do pastor, Moisés, o profeta legalista, repreende-o severamente, identificando-o como alguém perverso e ímpio, por referir-se ao Deus juiz de forma assim tão familiar e estúpida. Para ele, o grande Deus não necessitava de um semelhante serviço. Diante de tal atitude, o pastor, envergonhado e transtornado, com a alma queimada, rasga suas roupas e retira-se para o deserto. Neste momento, veio do céu uma revelação de Deus a Moisés, que dizia: “Separaste meu servidor de Mim. Eis que viestes para reconciliar meu povo comigo, e não para afastá-lo de mim. De todas as coisas, a mais detestável a meus olhos é o divórcio. Dei a cada povo uma forma de expressão. (...) Não tenho necessidade de seus louvores, estando acima de toda necessidade. (...) Não considero as palavras que são ditas, mas o coração que as oferece, pois o coração é a essência e a palavra acidente. (...) Ó Moisés, aqueles que amam os belos ritos são de uma classe, aqueles cujos corações e almas ardem de amor são de outra. (...) Não é preciso virar-se para a Caaba quando se está nela, e mergulhadores não precisam de sapatos. (...) A religião do amor é diferente de todas as outras religiões, pois para os amantes, Deus é a fé e a religião”. Em seguida, Deus infundiu no íntimo do coração de Moisés os mistérios que palavra humana alguma alcança. As palavras invadiram seu coração, transformando radicalmente sua visão. Após compreender a reprovação de Deus, Moisés corre ao deserto em busca do pastor. Ao encontrar-se com ele, assim se expressa, movido de compaixão: “Não busque regra alguma, nem método de adoração; diga tudo o que seu coração aflito deseja. Tua blasfêmia é a verdadeira religião, e tua religião é a luz do espírito: estás salvo, e graças a ti um mundo inteiro salvou-se igualmente” Com esta bela história de Moisés e o Pastor, Rûmî quer reforçar a idéia da presença graciosa de Deus que age de forma diversificada nos corações, provocando expressões distintas e particulares de acolhimento, para além das rígidas fronteiras traçadas pelas ortodoxias muitas vezes frias e insensíveis.
  • 2. A RELIGIÃO DO AMOR A religião do amor é aquela que vem sempre acompanhada das boas ações. Mais importante do que as expressões da fala é a realidade de afirmação de um sentido reto. As más ações constituem expressão de um coração corrompido, produzindo um hálito negativo junto às narinas de Deus (MIII, 169). Quando há pureza na experiência de louvor a Deus, a impureza se levanta e vai embora (MIII, 186). Não há, melhor companheiro do que as obras para atravessar a existência. Nem os amigos, nem todas as riquezas e bens da terra conseguem acompanhar o ser humano para além da tumba, mas sim a excelência de suas ações (MV, 1045-1047). Deus é melhor invocado com a língua dos atos, pois a língua das palavras é frágil (MV, 1044). O amor, é o fiel escudeiro do ser humano nos tempos de sua avaliação derradeira: “No dia da Ressurreição, homens e mulheres comparecerão pálidos e trêmulos de medo para o julgamento final. Eu apresentarei o teu amor em minhas mãos e Te direi: Interrogue-o, ele te responderá.” “Um dia, um homem chegou diante de uma árvore. Viu folhas, ramos, frutos estranhos. A cada um perguntou o que eram essas árvores e esses frutos. Nenhum jardineiro o compreendeu, nem sabia o nome da árvore, nem lhe pôde indicar o que ela poderia ser. O homem disse a si mesmo: Se não posso compreender que árvore é essa, contudo sei que, depois que deitei meu olhar sobre ela, meu coração e minha alma se tornaram frescos e verdes. Vou então me colocar a sua sombra.”46 A presença deste mistério na vida de Rûmî é tão impressionante que só o silêncio é capaz de dar conta da lâmina de seu conteúdo. Muitos de seus poemas terminam conclamando o silêncio: “Silêncio! E depois mais silêncio. Não use a boca para falar. A boca é para provar dessa doçura47” “seus lábios são silenciosos, embora seu coração esteja repleto de vozes” (MV,2238). Os sufis verdadeiros buscam ardentemente a essência. É a alma nobre que perdura. As palavras são acidentes efêmeros, que passam. “As preces rituais, a guerra santa, os jejuns não perdurarão, mas sim o espírito (que habita a pessoa iluminada)” (MV, 249).