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CIÊNCIA CONTEMPLATIVA
Folha de Rosto
CIÊNCIA CONTEMPLATIVA
ONDE O BUDISMO E A
NEUROCIÊNCIA
SE ENCONTRAM
B. ALAN WALLACE
Tradução
CARMEN FISCHER
Créditos
Título original: Contemplative Science.
Copyright © 2007 Columbia University Press.
Esta edição traduzida da edição americana e autorizada especialmente pela
Columbia University Press, só pode ser publicada e vendida no Brasil.
Todos os direitos reservados. Nenhuma parte desta obra pode ser
reproduzida ou usada de qualquer forma ou por qualquer meio, eletrônico ou
mecânico, inclusive fotocópias, gravações ou sistema de armazenamento
em banco de dados, sem permissão por escrito, exceto nos casos de trechos
curtos citados em resenhas críticas ou artigos de revistas.
A Editora Pensamento-Cultrix Ltda. não se responsabiliza por eventuais
mudanças ocorridas nos endereços convencionais ou eletrônicos citados
neste livro.
Dados Internacionais de Catalogação na Publicação (CIP)
(Câmara Brasileira do Livro, SP, Brasil)
Wallace, B. Alan
Ciência contemplativa : onde o Budismo e a
neurociência se encontram ; B. Alan Wallace ; tradução
Carmen Fischer. — São Paulo: Cultrix, 2009.
Título original: Contemplative science : where
Buddhism and neuroscience converge.
ISBN 978-85-316-1056-1
ISBN Digital 978-85-316-1169-8
1. Budismo 2. Budismo – Psicologia 3. Consciência –
Fisiologia 4. Neurociências 5. Neurociências – Aspectos
religiosos – Budismo 6. Religião e medicina I. Título.
09-10041 CDD-294.3365
Índices para catálogo sistemático:
1. Ciência contemplativa : Aspectos religiosos : Budismo 294.3365
O primeiro número à esquerda indica a edição, ou reedição, desta obra. A
primeira dezena
à direita indica o ano em que esta edição, ou reedição, foi publicada.
Edição Ano
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Direitos de tradução para o Brasil
adquiridos com exclusividade pela
EDITORA PENSAMENTO-CULTRIX LTDA.
Rua Dr. Mário Vicente, 368 — 04270-000 — São Paulo, SP
Fone: 2066-9000 — Fax: 2066-9008
E-mail: pensamento@cultrix.com.br
http://www.pensamento-cultrix.com.br
que se reserva a propriedade literária desta tradução.
AGRADECIMENTOS
Eu gostaria de começar expressando minha gratidão a
Brian Hodel, que trabalhou meses comigo editando a
série de ensaios apresentada neste livro. Sem as suas
muitas sugestões, desde aspectos muito específicos até
seu plano geral, este livro jamais viria à luz. Meus
agradecimentos também a James Elliott, que ajudou a
aparar as arestas do manuscrito, e a Wendy Lochner e
Leslie Kriesel, da Columbia University Press, pelo papel
inestimável que ambos exerceram na produção deste
livro.
Sinto-me em dívida com muitos estudiosos,
meditadores e cientistas, que tanto inspiraram como
fizeram críticas a este livro, entre eles Michel Bitbol, José
Ignacio Cabezón, David Ritz Finkelstein, Owen Flanagan,
Paul Gailey, Daniel Goleman, William Grassie, Charles L.
Harper, Van Harvey, Anne Harrington, Piet Hut, David E.
Meyer, Ken Paller, David Presti, Matthieu Ricard, Ben
Shapiro, William Waldron, Zhihua Yao e Arthur Zajonc.
Meu entendimento foi profundamente enriquecido por
todas essas pessoas e sou grato a elas por sua
colaboração.
Quero agradecer também a meus pais por toda uma
vida de estímulo e bons conselhos, e a minha esposa,
Vesna A. Wallace, por seu apoio constante e sugestões,
com os quais eu conto em todos os momentos de
necessidade. Finalmente, minha infinita gratidão para
com todos os meus mestres, particularmente a Sua
Santidade o Dalai Lama, que me guiou em minha busca
da felicidade, da verdade e da virtude autênticas. Dedico
este livro como uma pequena prova da minha gratidão.
Que ele possa beneficiar a outros como meus professores
me beneficiaram.
Ele observou sua Alma com um Telescópio. O que parecia
totalmente irregular, ele viu e expôs como belas
Constelações: e acrescentou à Consciência mundos
dentro de mundos.
– samuel taylor coleridge
POR UMA CIÊNCIA CONTEMPLATIVA
1
PRINCÍPIOS DA CIÊNCIA
CONTEMPLATIVA
A SIMPLES IDEIA de propor uma disciplina com o
nome de “ciência contemplativa” pode
despertar suspeita entre aqueles que prezam
as conquistas da ciência, as quais, em parte,
devem-se justamente à separação de seu
método de investigação de toda e qualquer vinculação
religiosa. Essa estranheza tem uma forte base histórica
e, portanto, deve ser levada a sério. Mas os princípios da
contemplação e da ciência também têm bases históricas
que sugerem uma possível reconciliação e até mesmo
uma integração das duas abordagens.
O termo latino contemplatio, que deu origem à
palavra “contemplação”, corresponde à palavra grega
theoria. Ambas referem-se a uma total lealdade para
com revelar, esclarecer e tornar manifesta a natureza da
realidade. O objetivo central delas é a busca da verdade
e nada menos que a verdade. De acordo com o teólogo
cristão Josef Pieper, o principal elemento envolvido no
conceito de contemplação é a percepção silenciosa da
realidade.[1] Essa, segundo ele, é uma forma de
conhecimento alcançada não por meio do pensamento,
mas da visão. “A intuição é, sem dúvida, a forma perfeita
de conhecer. Porque a intuição é o conhecimento do que
está realmente presente; a analogia com ver com os
sentidos é exata.”[2] Mas diferentemente do
conhecimento objetivo, a contemplação não se dirige
meramente para o seu objeto; ela já repousa nele.
Embora o termo “ciência” tenha sido considerado
unicamente no âmbito da exploração de fenômenos
objetivos, físicos e quantitativos – a ponto de apenas eles
serem considerados reais por alguns cientistas – existem
fundamentos para se considerar a ciência num contexto
mais amplo. O Webster’s Ninth New Collegiate Dictionary
define método científico nos seguintes termos:
“Princípios e procedimentos para a busca sistemática de
conhecimento envolvendo o reconhecimento e a
formulação de um problema, o levantamento de dados
por meio da observação e da experimentação, bem como
a formulação e comprovação de hipóteses”. Não há nada
nessa definição que impeça a possibilidade de o
indivíduo fazer da perspectiva da primeira pessoa
observações de fenômenos mentais e sua relação com o
mundo como um todo. Exatamente como os cientistas
fazem observações e conduzem experimentos com a
ajuda de recursos tecnológicos, os meditadores vêm há
muito tempo fazendo suas próprias observações e
conduzindo seus próprios experimentos fazendo uso do
refinamento de suas capacidades de atenção e do
exercício da imaginação. Em princípio, não existe,
portanto, nada que seja fundamentalmente incompatível
entre a contemplação e a ciência. Mas o peso da história
continua se opondo a qualquer colaboração proveitosa
entre as duas.
A força que a ciência adquiriu ao se divorciar da
religião, e mais recentemente da filosofia, impôs um
pesado tributo a suas sociedades hospedeiras. É
importante observar que o século XX, que gerou o mais
vasto conhecimento científico de todo o curso da história
da humanidade, também testemunhou a maior
desumanidade para com o homem, como também a
maior degradação do meio ambiente e dizimação de
outras espécies. A expansão do conhecimento científico
não trouxe nenhum crescimento comparável em termos
de ética e virtude. Em consequência disso, a sociedade
moderna adquiriu mais conhecimento e poder, mas não
mais sabedoria e compaixão.
A ciência é vista há muito tempo com orgulho, e não
sem justificação, como sendo “isenta de valores”. Tenho
encontrado frequentemente cientistas que falam do puro
prazer da descoberta, sem qualquer relação com as
possíveis aplicações práticas de suas pesquisas. Mas não
podemos ignorar o fato de a maior parte das pesquisas
científicas serem atualmente financiadas por instituições
públicas e privadas que têm em mente objetivos
específicos. Elas querem bons retornos sobre os
investimentos que fazem. Com a moderna dissolução da
fusão medieval de religião, filosofia e ciência, ocorreu
uma desintegração semelhante na busca da felicidade
genuína, verdade e virtude – três elementos essenciais
que dão sentido à vida. A ciência contemplativa que
tenho em mente procura reintegrar a busca desses três
elementos por meios totalmente empíricos, sem
submissão dogmática a qualquer sistema de crenças,
seja de caráter religioso ou não. Para explorar essa
possibilidade, vamos antes rever os elementos essenciais
da felicidade genuína, da verdade e da virtude que
devem ser integrados.
OS ELEMENTOS ESSENCIAIS DE UMA VIDA PLENA
DE SENTIDO
Felicidade genuína
A felicidade genuína é um sentimento de bem-estar que
subjaz e permeia todos os estados emocionais,
abarcando todas as vicissitudes da vida, e que se
distingue do “prazer hedonista”, que é a sensação de
bem-estar provocada por estímulos prazerosos. A palavra
grega que estou traduzindo como felicidade genuína é
eudaimonia, a qual Aristóteles em sua Ética a Nicômaco
igualou ao que há de bom no homem. Ela se manifesta
como um processo da alma em concordância com a
virtude, e se houver mais de uma virtude, com a melhor
e mais completa.[3] Felicidade genuína não é a simples
culminação de uma vida com sentido, mas uma
característica da pessoa em processo de
desenvolvimento ético e espiritual. Esse é um conceito
intencionalmente genérico de desenvolvimento humano
que deixa a cada leitor a tarefa de decidir qual é a
virtude “melhor e mais completa”. É óbvio que esse ideal
de felicidade genuína pode ser adotado tanto por
pessoas religiosas como por não religiosas e cada uma
irá definir seus atributos específicos de acordo com sua
própria visão de mundo. Como veremos a seguir, esse
bem-estar é consequência natural do desenvolvimento
de um equilíbrio mental que propicia o fortalecimento do
“sistema imunopsicológico”, com o qual a pessoa
raramente sucumbe a uma vasta gama de aflições
mentais. Um estado de presença serena, equilíbrio
emocional e clareza mental são característicos dessa
felicidade genuína, que naturalmente se expressa num
modo de vida harmonioso e altruísta.
Santo Agostinho (354-430 d.C.) levantou essa questão
ao declarar que a única coisa de que necessitamos é a
resposta à seguinte pergunta: “Como o homem pode
alcançar a felicidade?”[4] A felicidade genuína, segundo
ele, é um “prazer proporcionado pela verdade”,[5]
enquanto as duas causas reais dos infortúnios humanos
são “a profunda ignorância” e “o amor pelas coisas vãs e
perniciosas”. A busca da verdadeira felicidade, ele
declarou, é motivada pelo amor a Deus, que é o desejo
de união com ele. Essa ênfase na profundidade da busca
de felicidade não se restringe à antiguidade grega ou à
teologia cristã. O Dalai Lama escreveu em seu livro The
Art of Happiness, que se tornou um best-seller: “Acredito
que a busca da felicidade seja o próprio propósito da
vida. Independentemente de a pessoa ter alguma crença
religiosa, de acreditar nessa ou naquela religião, todos
nós estamos buscando algo melhor na vida. Portanto, eu
acho que o próprio movimento de nossa vida segue na
direção da felicidade”.[6]
Verdade
A experiência da felicidade genuína não é alcançada
como um mero resultado da satisfação de prazeres
sensoriais ou de estímulos intelectuais. Tampouco é
resultado da mera aprendizagem de pensar de
determinada maneira ou da adoção de uma atitude
otimista. Ela tem que estar baseada num verdadeiro
entendimento da verdade. Mas existem muitas verdades
que têm pouca relevância para o pleno desenvolvimento
humano. Muitos dos aspectos do mundo natural
estudado pelos cientistas parecem extremamente
distantes dos valores humanos, e parece não haver razão
para se acreditar que os cientistas em geral, apesar de
todo seu conhecimento do mundo físico, sejam mais
felizes do que os profissionais de qualquer outra área.
Conforme já observamos, o enorme crescimento do
conhecimento científico no século passado não
correspondeu a nenhum crescimento equivalente em
termos de felicidade humana, embora os avanços da
medicina tenham certamente contribuído enormemente
para o nosso bem-estar físico.
Isso quer dizer que as verdades mais relevantes à
plena realização humana não são as mais comumente
exploradas com sucesso pela ciência moderna. Embora
os cientistas tenham focado sua atenção particularmente
no mundo exterior, não existe nenhum aspecto da
realidade mais pertinente à felicidade genuína do que a
natureza da identidade humana. O teólogo cristão Joseph
Maréchal aborda esse tópico dentro do contexto da
investigação contemplativa:[7]
A mente humana [...] é uma faculdade à procura de sua intuição – ou
seja, de integração com o Ser, o Ser puro e simples, uno e soberano, sem
restrição, sem distinção entre essência e existência, entre possível e real
[...] Mas aqui embaixo, em lugar do Uno, ela se encontra com o múltiplo,
o desconexo. Aqui, no que diz respeito à verdade, a multiplicidade
infinita de objetos suspende a afirmação e engendra a dúvida [...] A
afirmação da realidade não é então nada mais que a expressão da
tendência básica da mente para a unificação no e com o Absoluto.
Também na tradição budista, a importância do
autoconhecimento não pode ser exagerada,
especialmente sob a luz da afirmação budista de a causa
principal do sofrimento humano ser a ignorância e a
ilusão, especificamente no que diz respeito à própria
identidade. De todas as virtudes enfatizadas pelo
budismo, nenhuma é mais importante do que a da
sabedoria, que envolve a percepção da natureza última
da realidade. Shântideva, um iminente budista indiano
do século VII, escreveu: “O Sábio ensinou todo esse
sistema para se alcançar a sabedoria. Por isso, com o
desejo de se precaver do sofrimento, a pessoa deve
procurar alcançar a sabedoria”.[8]
Virtude
Exatamente como a felicidade genuína encontra-se
inextricavelmente ligada à compreensão da verdade, ela
tampouco pode ser compreendida sem levar em
consideração a virtude. Apesar das inúmeras diferentes
teorias que abundam entre filósofos e teólogos, a breve
definição de Santo Agostinho é particularmente notável e
universal, por tê-la exposto em termos de “ordem do
amor”, o que tem a ver com a prioridade dos nossos
valores.[9] Seguindo as palavras de Jesus com respeito à
importância central do amor a Deus e a seus
semelhantes, o teólogo John Burnaby escreveu: “O amor
a Deus, que é o desejo de união com Ele, e o amor entre
os homens, que é o sentimento de união com todos os
seres capazes de compartilhar do amor de Deus, estão
de fato intrinsecamente ligados um ao outro”.[10] Essa é
a base de todas as virtudes dentro do contexto teísta.
No contexto do budismo, que costuma ser
considerada uma religião não teísta, uma vida de
virtudes é a base necessária para a busca da verdade e
da felicidade genuína, ou da plena realização humana.
Essas virtudes são de três tipos: social/ambiental,
psicológica e espiritual. Apesar de as teorias éticas do
budismo estarem profundamente enraizadas na visão de
mundo budista, incluindo suas doutrinas com respeito à
reencarnação e ao karma, em seu livro Ethics for the New
Millennium, o Dalai Lama apresentou uma visão de ética
secular que é igualmente relevante tanto para adeptos
como não adeptos de qualquer religião.
Bem-estar psicológico
O poder de persuasão do behaviorismo, da psicologia e
da neurociência concerne a tópicos como tomada de
decisão, atenção e afirmações a respeito do que as
pessoas sentem em diferentes situações controladas. Os
processos mentais estudados pelas ciências cognitivas
são em grande medida aqueles que, de uma perspectiva
evolutiva, contribuíram para que a espécie humana
sobrevivesse e proliferasse. Todas as ramificações da
psicofísica e da psicologia que tratam de aspectos como
atenção, cognição, relações sociais e tipos de
personalidade dependem das respostas das pessoas a
perguntas quanto à intensidade de alguma coisa, como a
cor que estão vendo, o volume de um determinado som,
no que elas acreditam, quais são suas atitudes e assim
por diante. Muitos desses dados foram organizados em
termos de princípios coerentes e os conjuntos
estruturados de descobertas que os cientistas cognitivos
vêm tentando organizar e entender são muito vastos. A
neurociência contemporânea veio colocar mais luz sobre
o que os psicólogos exploraram em termos de memória,
atenção, emoções, atitudes etc.
Especialmente desde a Segunda Guerra Mundial, a
maior parte dos estudos psicológicos, particularmente
nos Estados Unidos, tem sido realizada com foco nos
processos mentais normais e patológicos. Apenas
recentemente, a atenção científica começou a se voltar
para o bem-estar mental, mas as verbas para essas
pesquisas têm sido limitadas em razão de a natureza do
bem-estar e seus efeitos comportamentais não serem
bem conhecidos – uma típica situação sem saída! É aí
que as tradições contemplativas do mundo, que vêm há
muito tempo se ocupando da felicidade humana no
contexto da verdade e da virtude, poderiam dar
importantes contribuições.
Dentro do vasto contexto da felicidade genuína, pode
valer a pena o esforço para identificar os domínios
específicos de desenvolvimento. Com base no bem-estar
social e ambiental que resulta do cultivo de atitudes
éticas, a pessoa pode chegar ao bem-estar psicológico
que advém de uma psique saudável e equilibrada. Estou
usando a palavra “psique” para designar toda uma gama
de fenômenos mentais conscientes e inconscientes
estudados pelos psicólogos, incluindo percepções,
pensamentos, emoções, memórias, fantasias, sonhos e
visões de todos os tipos. Os processos psicológicos são
condicionados pelo corpo, pela história pessoal, pelo
meio ambiente físico e pela sociedade, além de, a cada
momento, estarem em estreita correlação com funções
específicas do cérebro. A psique pode ser estudada
indiretamente por meio de questionários individuais e do
exame do comportamento do cérebro e observada
diretamente pela introspecção.
Se o bem-estar psicológico resulta da saúde e
equilíbrio da mente, ele precisa ser entendido com
relação a tipos específicos de desequilíbrios mentais aos
quais as pessoas normais – em geral consideradas
relativamente saudáveis – estão comumente propensas.
Um pressuposto básico por trás da análise seguinte é
que o sofrimento mental seja em geral um sintoma de
desequilíbrios mentais, assim como a dor física é um
sintoma de doença ou ferimento.[11] Nos próximos
tópicos, vamos examinar quatro tipos de desequilíbrios
mentais – relacionados com a conação, a atenção, a
cognição eo afeto – e em cada um, iremos identificar os
desequilíbrios em termos de deficiência, hiperatividade e
disfunção.
Desequilíbrios conativos
“Conação” é um termo importante, apesar de não ser
usado comumente, que tem relação com as faculdades
do desejo e da volição. Os desequilíbrios conativos
desviam nossos desejos e intenções do caminho da
satisfação psicológica e nos causam sofrimento
psicológico. Há uma deficiência conativa quando nos
vemos diante da perda apática do desejo de felicidade e
suas causas, bem como de uma indisposição para aliviar
nosso próprio sofrimento e o de outros. Essa deficiência
vem normalmente acompanhada de uma falta de
imaginação e de uma espécie de estagnação
complacente: não conseguimos imaginar nenhuma saída
melhor e, portanto, nem tentamos alcançar tal bem-
estar. A hiperatividade conativa ocorre quando nos
fixamos em desejos obsessivos que obscurecem a
realidade do presente. Estamos tão aprisionados a
fantasias com respeito ao futuro – e desejos não
realizados – que nossos sentidos ficam embotados diante
do que está acontecendo aqui e agora. Nesse processo,
podemos também nos manter cegos para as
necessidades e desejos dos outros. Finalmente, a
disfunção conativa ocorre quando desejamos coisas que
não conduzem a nosso próprio bem-estar nem ao de
outros e não desejamos o que possa vir a contribuir para
o nosso bem-estar e de outros. É crucial reconhecer que
a satisfação psicológica individual não é algo que possa
ser cultivado sem qualquer relação com os outros. Nós
não existimos independentemente dos outros e,
consequentemente, nosso bem-estar tampouco pode
ocorrer independentemente dos outros. Temos que levar
em conta o bem-estar das pessoas à nossa volta.
Que tipo de coisas (no sentido mais amplo, incluindo
coisas e qualidades tangíveis e intangíveis) proporcionam
realmente o bem-estar psicológico? Em seu livro, The
High Price of Materialism, o psicólogo Tim Kasser analisa
a relação entre os valores materialistas que predominam
no mundo de hoje e o bem-estar que todos nós
almejamos. Ele conclui:[12]
A pesquisa científica vigente sobre o valor do materialismo revela
descobertas claras e consistentes. As pessoas altamente centradas em
valores materialistas têm menos bem-estar pessoal e saúde psicológica
do que as que dão relativamente pouca importância às conquistas
materiais. Essas relações foram documentadas em amostras que
abarcam tanto ricos como pobres, adolescentes e idosos, australianos e
sul-coreanos.
Como já vimos, Santo Agostinho considerou o “amor
pelas coisas vãs e perniciosas” como uma espécie de
disfunção conativa, enquanto o desejo mais profundo e
com base na realidade é o amor a Deus, que é o desejo
de unir-se a Ele. Nicolau de Cusa, cardeal da Igreja
Católica Romana do século XV, repetiu esse tema ao
escrever: “Todo aquele... que busca, busca apenas o bem
e todo aquele que busca o bem e se afasta de ti [Deus]
se desvia do que está buscando”.[13] Shântideva tratou
da mesma questão de uma perspectiva não teísta:
“Aqueles que procuram escapar do sofrimento correm
diretamente para ele. E apesar do desejo de felicidade,
movidos pela ilusão, eles destroem o próprio bem-estar
como se fosse seu inimigo”.[14]
Apesar de existirem muitas abordagens para restaurar
o equilíbrio conativo, uma delas é tratar de sair da apatia
pelo reconhecimento da possibilidade de felicidade
genuína, curar o desejo obsessivo pelo cultivo da
satisfação e reparar os desejos equivocados pelo
reconhecimento das verdadeiras causas da felicidade
genuína e de nossa vulnerabilidade ao sofrimento.
Métodos específicos para contrabalançar os
desequilíbrios conativos foram desenvolvidos por
diversas tradições psicológicas e contemplativas tanto
para pessoas com visão de mundo secular como teísta e
não teísta.
Desequilíbrios de atenção
Ninguém que sofra de sérios desequilíbrios de atenção
pode ser considerado psicologicamente saudável. A
atenção deficiente é caracterizada pela incapacidade da
pessoa se concentrar num determinado objeto. A mente
se retira e se distancia até mesmo de seus próprios
processos internos. A atenção hiperativa ocorre quando a
mente é excessivamente estimulada, resultando em
distração e fragmentação compulsivas. E a disfunção da
atenção ocorre quando nos centramos nas coisas de
maneira ansiosa, que não conduz nem ao nosso próprio
bem-estar nem ao de outros. Por exemplo, uma pessoa
que sofre de compulsão sexual só vê os outros como
objetos sexuais e um vendedor pode se envolver
mentalmente com outros apenas como possíveis
compradores. Nesses casos, a mente está propensa tanto
aos desequilíbrios de atenção como aos de conação, que
comumente andam de mãos dadas.
A atenção deficiente se aproxima do conceito budista
de lassidão e a atenção hiperativa corresponde ao de
agitação. Esses desequilíbrios podem ser sanados pela
prática da atenção – a capacidade de manter
voluntariamente a atenção focada num objeto familiar,
sem descuido ou distração; e da meta-atenção – a
capacidade de monitorar a qualidade da atenção,
percebendo rapidamente quando ela sucumbiu ou à
agitação ou à lassidão. Shântideva ressaltou a
importância da capacidade de atenção para a satisfação
psicológica: “Pelo aumento dessa disposição, a pessoa
consegue estabilizar a mente em concentração
meditativa, uma vez que com a mente dispersa, ela vive
entre as garras de suas aflições mentais”.[15]
Enquanto os praticantes de meditação budistas
identificaram e aprenderam a restaurar esses
desequilíbrios da atenção, os mesmos problemas foram
objeto de interesse de todas as tradições contemplativas
do mundo. Um meditador cristão ortodoxo do Oriente
escreveu: “Observando atentamente o próprio coração,
aumentando a consciência de si mesmo, o aspirante
alcança a nepsis (‘sobriedade’ ou ‘vigilância’) e a
diakrisis (‘discernimento’ ou ‘discriminação’, a
capacidade para distinguir os pensamentos positivos dos
negativos)”.[16] E Joseph Maréchal segue na mesma
linha ao escrever:
Não se pode chegar à contemplação sem uma atenção prolongada, pelo
menos por alguns instantes; então a atenção atua sobre os elementos
psicológicos à maneira dos polos de um magneto, que são limalhas de
ferro imantadas. É possível que a característica da contemplação seja
mais uma profunda orientação do ser humano numa intuição ou voltada
para uma intuição? [17]
Desequilíbrios cognitivos
Uma pessoa que sofre de um grave desequilíbrio
cognitivo está radicalmente dissociada da realidade e é,
em geral, diagnosticada como vítima de alguma espécie
de psicose. Em geral, as pessoas normais também
propendem a desequilíbrios cognitivos, que constituem a
origem de muitos distúrbios mentais. Esses
desequilíbrios são frequentemente considerados como
inerentes à natureza humana, mas essa é uma suposição
à espera de ser desafiada por estudos empíricos
rigorosos.
Prosseguindo a análise dos três tipos de desequilíbrio,
a deficiência cognitiva é caracterizada pela incapacidade
de perceber o que está presente nos cinco campos da
experiência sensorial e na mente. Quando nos
encontramos dissociados do que está ocorrendo tanto à
nossa volta como em nosso interior, estamos sofrendo do
distúrbio da deficiência cognitiva. A hiperatividade
cognitiva entra em ação quando confundimos nossas
projeções conceituais com a verdadeira percepção –
quando não conseguimos distinguir as realidades
percebidas das suposições e fantasias sobrepostas. Os
psicóticos fazem isso de formas extremadas, enquanto as
pessoas normais são mais prudentes, mas a maioria de
nós encontra-se no mesmo espectro da hiperatividade
cognitiva, o que resulta em sofrimento mental
desnecessário. Finalmente, a disfunção cognitiva ocorre
quando compreendemos mal as coisas, por alguma falha
ou em nossos sentidos físicos ou em nossa capacidade
para interpretar o que está acontecendo.
Superar esse desequilíbrio cognitivo é um dos
propósitos mais importantes da prática budista e, para
isso, uma das principais intervenções é o cultivo da
percepção atenta. O primeiro desafio consiste em
aprender a dar atenção apenas ao que está sendo
apresentado aos nossos sentidos e aos nossos processos
mentais internos. Para isso, Buda propôs o seguinte
ideal: “No que é visto existe apenas o que é visto: no que
é ouvido, existe apenas o que é ouvido; no que é sentido,
existe apenas o que é sentido; no que é percebido, existe
apenas o que é percebido”.[18] Em seus
desdobramentos sobre essa questão, o budismo dá
instruções detalhadas sobre como aplicar a atenção a
nossa própria presença física e mental no mundo, a
relação com os outros seres e com o ambiente
inanimado. Existe um volume crescente de pesquisas
científicas explorando os efeitos terapêuticos dessa
prática de atenção, grande parte delas inspirada pela
obra de Jon Kabat-Zinn e seu extremamente bem-
sucedido programa de redução do stress com base nessa
prática.
Desequilíbrios afetivos
Esses desequilíbrios costumam ocorrer em decorrência
de desequilíbrios de conação, atenção e cognição e
podem ser classificados como de três tipos. A deficiência
afetiva apresenta-se em sintomas como de apatia
emocional e uma sensação de fria indiferença para com
os outros. A hiperatividade afetiva é caracterizada pela
alternância entre entusiasmo e depressão, esperança e
medo, adulação e desprezo, desejo obsessivo e
hostilidade. A disfunção afetiva ocorre quando as reações
emocionais são inapropriadas para as circunstâncias,
como comprazer-se com a desgraça alheia. Psicólogos e
praticantes de meditação de todo o mundo criaram uma
ampla variedade de intervenções para sanar esses
desequilíbrios, algumas delas aplicáveis à sociedade em
geral, outras inseridas em visões de mundo religiosas.
Uma abordagem constituída de quatro intervenções
extraída do budismo tem profundidade espiritual sem
necessidade de vínculo com qualquer sistema de crenças
em particular. A essência dessa prática é curar a
compulsão com amabilidade, a distância indiferente com
compaixão, a depressão com alegria empática e o
preconceito pessoal com equanimidade.
O efeito geral dos quatro desequilíbrios mentais acima
mencionados é a constante insatisfação, que só é
aliviada superficialmente nos momentos de entrega a
estímulos mentais e sensoriais prazerosos ou pelo uso de
drogas que alteram o cérebro. Com pouca fé em seus
próprios recursos internos para a felicidade genuína,
muitas pessoas tornam-se dependentes de estímulos
prazerosos ou de supressores químicos da insatisfação,
mas assim que esses estímulos são removidos,
desaparece a sensação de bem-estar. Da perspectiva da
ciência contemplativa, o primeiro propósito pragmático
da psicologia é explorar os estados da psique para
identificar quais levam à perpetuação do sofrimento e
quais levam à felicidade genuína. Assim como trocar o
uso de combustíveis fósseis por energia solar, nós temos
a oportunidade de nos afastar da dependência obsessiva
de estímulos prazerosos e adotar o cultivo da perfeita
saúde mental como base da felicidade.
Uma hipótese fundamental por trás dessa busca é que
em termos de natureza humana, nosso estado habitual é
marcado pela angústia e sofrimento, mas nosso potencial
é para a saúde e a satisfação. O desequilíbrio não é
inerente a nossa mente, mas causado pelo hábito e,
portanto, por meio de um esforço apropriado e contínuo,
os desequilíbrios podem ser sanados, resultando num
estado de bem-estar que não depende de estímulos
sensoriais, químicos, intelectuais ou estéticos prazerosos.
Esta é uma área na qual a ciência e todas as tradições
contemplativas podem colaborar em benefício de todo
mundo.
Existe uma profunda complementaridade entre as
abordagens científica e contemplativa ao estudo da
psique. As ciências comportamentais, a psicologia e a
neurociência lançaram luz sobre os processos cognitivos
que nos permitiram sobreviver, reproduzir e ter a
experiência do bem-estar hedonista. As tradições
contemplativas mostram como podemos encontrar a
felicidade genuína, ou o bem-estar eudemônico, e
explorar as dimensões espirituais de nossa existência. O
bem-estar hedonista e o eudemônico não costumam se
opor um ao outro. Pelo contrário, sem o bem-estar
hedonista, incluindo a boa saúde e comida suficiente,
roupa e abrigo, é difícil embora não impossível se
alcançar o bem-estar eudemônico. Da mesma maneira,
quanto mais cultivamos a felicidade genuína que vem de
dentro, mais conseguimos valorizar os simples prazeres
da vida. Apesar de o bem-estar
hedonista não ter valor intrínseco ou duradouro, ele pode
ajudar na busca de uma vida plena de sentido,
integrando a felicidade genuína, a verdade e a virtude.
AS ORIGENS DA PSIQUE
Os cientistas cognitivos contemporâneos, por limitarem
suas pesquisas a comportamentos, atividade cerebral e
relatos subjetivos de pessoas normais e subnormais,
fizeram fortes suposições a respeito das origens da
psique: existe um amplo consenso quanto aos processos
mentais não serem nada mais do que funções ou
propriedades do cérebro. E enquanto a pesquisa
científica se confinar a esses limites, é improvável que
surjam evidências capazes de desafiar seriamente esse
consenso. Os métodos científicos com base em
pressupostos materialistas aplicados ao estudo da mente
provavelmente só servem para reforçá-los.
Mas a filosofia e a ciência ocidentais nem sempre
adotaram essa atitude. Pitágoras (570-495 a.C.), o mais
célebre dos filósofos pré-socráticos, que supostamente
cunhou o termo “filosofia”, fundou uma comunidade
contemplativa no sul da Itália que era tanto religiosa
como científica, com uma forte ênfase na matemática.
Seu principal objetivo era o cultivo da santidade por meio
da purificação do corpo e da mente. Na visão dele, o
homem que se dedica a tal purificação é o “verdadeiro
filósofo”, aquele que “contempla” (theorein), e o melhor
de todos os métodos de purificação é a ciência.
Pitágoras é amplamente conhecido por sua teoria da
metempsicose ou reencarnação, segundo a qual a alma é
imortal e renasce tanto em forma humana quanto
animal. Essa visão é considerada uma descoberta
empírica baseada em sua própria experiência de recordar
até vinte vidas passadas tanto dele mesmo como de
outros. As primeiras e mais antigas versões de sua vida
concordam em descrever Pitágoras como um fazedor de
milagres e a Sociedade Pitagórica como a mais
importante escola científica da Grécia Antiga.
No diálogo Fedro de Platão, Sócrates aborda essa
questão, começando por comentar que, de acordo com a
visão popular, a alma se dispersa e se desfaz com a
morte.[19] Mas a verdade, ele diz, que é conhecida
apenas por aqueles que praticaram a filosofia, está longe
disso. A alma do filósofo, tendo “praticado a morte” pelo
domínio dos impulsos e apetites físicos, “parte para um
lugar que é, como ela mesma, invisível, divino, imortal e
sábio, onde, ao chegar, a felicidade a espera e a liberta
de... todos... os males humanos”.[20] Mas as almas
daqueles que não praticaram a filosofia, estando
permeadas pelo corpóreo, tornam-se espíritos errantes
depois da morte, de maneira quase idêntica à versão
budista do estado intermediário (antarâbhava) que
ocorre depois da morte e antes da próxima
reencarnação. Finalmente, Sócrates declara: “Por causa
do desejo físico, que as persegue sem cessar, elas
voltam a se aprisionar de novo dentro de um corpo. E
como era de se esperar, elas continuam presas ao
mesmo tipo de caráter ou natureza que desenvolveram
durante a vida”.[21]
A crença na metempsicose era também comum no
cristianismo primitivo. Orígenes (185-254 d.C.),
amplamente reconhecido como o maior teólogo cristão
depois de São Paulo e antes de Santo Agostinho, sofreu
forte influência de Pitágoras e Platão. O conhecimento de
Deus, ele dizia, é nato no ser humano e pode ser
“lembrado” e despertado por meio de disciplinas
especiais. Dessa maneira, a alma pode ascender até
Deus numa longa e permanente jornada de uma vida
para outra. Por meio da contemplação (theoria), a alma
avança no conhecimento (gnosis) de Deus, que a
transforma, segundo Platão, até tornar-se divina. Para
Orígenes, assim como para Pitágoras, não havia
nenhuma separação absoluta entre ciência e religião. A
vida contemplativa pode ser subdividida em
contemplação de Deus e contemplação da natureza e
segue três estágios: a vida ativa (praktikê); a
contemplação da natureza, ou “contemplação natural”
(physikê); e a contemplação no sentido estrito, a visão de
Deus, também chamada de “teologia” (theologia), ou
“conhecimento espiritual” (gnosis).[22] Essa visão
integrada da ciência e da espiritualidade foi
posteriormente suprimida quando o Imperador Justiniano
escreveu uma série de anátemas contra os escritos de
Orígenes. No sínodo local de 543 d.C., ele ordenou ao
patriarca Mennas que reunisse todos os bispos presentes
em Constantinopla e os fizesse assinar os anátemas.
Mas a questão estava longe de ser encerrada com a
condenação dos escritos de Orígenes a respeito das
origens da alma. Santo Agostinho tratou da questão
propondo quatro hipóteses: 1) que a alma da pessoa
procede da de seus pais; 2) que as almas individuais são
criadas novamente a partir das condições individuais no
momento da concepção; 3) que as almas existem em
algum outro lugar e são enviadas por Deus para habitar
corpos humanos; e 4) que as almas descem para o plano
da existência humana por sua própria escolha.[23] Para
Santo Agostinho, todas essas hipóteses eram
compatíveis com a fé cristã. No verdadeiro espírito da
filosofia, ele declarou: “É importante que nenhuma das
quatro seja afirmada sem um bom fundamento”.[24]
Embora muitos cristãos de hoje tenham escolhido a
segunda – que as almas individuais são criadas
novamente a partir das condições individuais no
momento da concepção – as bases empíricas e lógicas
dessa visão estão longe de ser esclarecidas.
As origens da psique foram amplamente ignoradas
pelos cientistas desde a época de Copérnico até o
surgimento da psicologia moderna. William James, que
criou o primeiro laboratório de neurociência na
Universidade de Harvard nos Estados Unidos, propôs três
hipóteses para explicar as origens dos processos mentais
relacionados com as funções do cérebro: 1) o cérebro
produz pensamentos, assim como um circuito elétrico
gera luz; 2) o cérebro libera ou permite acontecimentos
mentais assim como o gatilho de uma besta dispara uma
flecha pela remoção do obstáculo que prende a corda; e
3) o cérebro emite pensamentos, assim como a luz
atinge um prisma e, consequentemente, emite um
espectro de cores.[25] Em seu tempo, como também até
hoje, todas essas três hipóteses condizem com todo
conhecimento científico a respeito das correlações
mente-cérebro. James, que acreditava na terceira opção,
desenvolveu sua teoria:[26]
Quando finalmente o cérebro deixa totalmente de funcionar, ou se
degenera, esse fluxo especial de consciência que o acompanhava
desaparece totalmente deste mundo natural. Mas a esfera do ser que
abastecia a consciência continua intacta; e neste mundo mais real com o
qual, mesmo enquanto aqui, ela estava em interação, a consciência
pode, de maneiras que desconhecemos, continuar inalterada.
James especulou ainda quanto à possibilidade de o
fluxo de consciência ser um fenômeno diferente do
cerebral, de um tipo que interage com o cérebro
enquanto ele permanece em atividade, absorvendo e
retendo a identidade, a personalidade e as memórias que
fazem parte dessa interação, e continuar sem o cérebro.
Apesar de James continuar sendo amplamente
respeitado entre os cientistas cognitivos
contemporâneos, as ideias dele a respeito das origens e
da natureza da consciência são em geral ignoradas ou
rejeitadas. A maioria dos psicólogos e neurocientistas
refuta categoricamente qualquer espécie de dualismo
com base no argumento de que não existe nenhuma
evidência da existência de qualquer fenômeno mental
subjetivo separado das funções e propriedades do
cérebro. Mas enquanto os cientistas cognitivos
confinarem seus estudos a comportamento, função do
cérebro e relatos subjetivos de sujeitos normais e
patológicos, eles terão poucas chances de descobrirem
evidências que possam mostrar o contrário.
Um estudioso que desafiou cientificamente essas
visões é Ian Stevenson, professor emérito de psiquiatria
e ex-diretor do Departamento de Estudos da
Personalidade da Universidade da Virgínia.[27] Em seu
livro recente, Where Reincarnation and Biology Intersect,
ele sumariza trinta anos de estudos de relatos de
crianças supostamente recordando lembranças precisas
de pessoas e acontecimentos específicos de suas vidas
passadas. Esse livro, escrito para o grande público,
consiste basicamente num resumo de seus estudos, dos
quais os fundamentos científicos são detalhados em sua
compacta obra em dois volumes Reincarnation and
Biology: A Contribution to the Etiology of Birthmarks and
Birth Defects. A obra de Stevenson provê algumas das
evidências científicas mais sólidas para desafiar as
hipóteses materialistas sobre as origens da psique, mas
passou amplamente despercebida pela comunidade
científica.[28]
Essa recusa a examinar as evidências empíricas que
contrariam as crenças em geral tem sido mais associada
a crentes religiosos do que a cientistas. O físico Richard
Feynman expressa claramente os ideais científicos do
ceticismo e do empirismo: “Os pesquisadores buscam
com mais diligência, e dedicam mais esforço,
exatamente naqueles lugares em que é maior a
probabilidade de nossas teorias se provarem erradas. Em
outras palavras, estamos tentando provar o mais rápido
possível que estamos errados, porque só assim podemos
avançar”.[29] Lamentavelmente, os cientistas cognitivos
atuais não parecem dispostos a procurar naqueles
lugares em que se possa provar que suas teorias
materialistas estejam equivocadas. Enquanto suas
pesquisas se ativerem às origens da psique, eles
continuarão visando unicamente a investigações que
venham reforçar suas crenças. Se quisermos encontrar
alternativas viáveis à ortodoxia científica, teremos que
sair da ciência contemporânea para examinarmos as
tradições contemplativas do mundo. Volto-me agora para
uma hipótese budista baseada na prática contemplativa
e que está de acordo com tudo que se conhece
atualmente sobre as correlações cérebro-mente.
A Consciência-Substrato
Para descobrir as origens de qualquer fenômeno natural,
os cientistas criaram métodos rigorosos que permitem
observar o próprio fenômeno, realizando experimentos
sobre ele sempre que possível. Essa conduta tem se
mostrado legítima para a exploração das origens de
todos os tipos de objetos, desde as células, com as quais
se pode fazer experimentos, até as estrelas, que podem
ser observadas, mas não manipuladas no decorrer dos
experimentos. O mesmo vale para a psique. Para
desvendar suas origens, temos que criar métodos
sofisticados que permitam observar e fazer experiências
sobre os estados de consciência. Não basta observar e
realizar experimentos sobre seus correlatos neurais e
comportamentais e, enquanto a ciência cognitiva
restringir sua pesquisa a esses aspectos, ela não poderá
evitar a conclusão de que a consciência resulta
unicamente dos processos materiais que estão sendo
investigados. Essa não é uma descoberta lógica nem
empírica, mas apenas uma conclusão inevitável baseada
numa metodologia aplicada ao exame de processos
mentais subjetivos e qualitativos da mesma maneira com
que se examina processos físicos objetivos e
quantitativos.
Em decorrência dessa orientação, os cientistas
cognitivos veem-se diante de uma “lacuna explicativa”:
como é possível que os padrões de atividade neural ou
produzam os processos mentais subjetivos ou sejam
equivalentes a eles? Deve haver tipos de atividade
neural que contribuem causalmente para o surgimento
de estados específicos de consciência e de atividade
mental. Vamos atribuir à causalidade a seguinte
definição fenomenológica: se B segue A, e B não ocorre
na ausência de A, então A exerce uma influência causal
sobre B. Nenhum mecanismo físico é forçosamente
necessário para que ocorra uma relação causal,
conforme amplamente demonstrado pelos fenômenos
eletromagnéticos e pela mecânica quântica. O filósofo
John Searle argumenta que uma atividade neuronal de
“ordem inferior” “causa” processos mentais, enquanto
padrões neuronais de “ordem superior” são equivalentes
a processos mentais.[30] Esteja ele certo ou não, alguns
tipos de ativação neuronal prévia são certamente
necessários para a geração de subsequentes processos
mentais específicos. Mas como aqueles processos
neurais precedem seus resultantes acontecimentos
mentais, eles não podem ser considerados como seus
equivalentes. Poderia haver uma identidade apenas entre
os processos neuronais e mentais que ocorrem
simultaneamente.
Com respeito a uma relação causal entre
acontecimentos neurais e mentais, deparamos com o
“difícil problema” de David Chalmers:[31] o que há
nesses processos neuronais, diferentemente de tantos
outros acontecimentos eletroquímicos, que lhes permite
produzir toda uma gama de experiências mentais
subjetivas? Aqui há uma grave lacuna explicativa.
Entretanto, se certos processos neuronais são
equivalentes a seus concorrentes processos mentais, o
que permite que eles assumam essa natureza dual:
processos neuronais objetivos, que podem ser
perfeitamente entendidos em termos de física, química e
biologia; e processos mentais subjetivos que não são
detectáveis pelo uso de instrumentos de medição dessas
disciplinas, mas são diretamente observáveis pela
experiência da perspectiva da primeira pessoa? É como
se esses processos neuronais concorrentes tivessem uma
vida secreta que é ocultada da medição científica da
perspectiva da terceira pessoa: eles são
simultaneamente acontecimentos neurais objetivamente
perceptíveis e processos mentais subjetivos
objetivamente invisíveis.
Um fato simples que dificilmente é reconhecido tanto
pelos cientistas cognitivos como pelos filósofos da mente
é que os acontecimentos mentais podem ser observados
diretamente. Mas como reconhece James, “A
introspecção é difícil e falível; e... a dificuldade é
simplesmente a de qualquer observação seja de que tipo
for”.[32] De importância crucial para se fazer
observações rigorosas dos fenômenos mentais é o cultivo
da atenção deliberadamente focada e vívida, que os
budistas chamam de samâdhi. Essa atenção focada é
para a investigação científica dos fenômenos mentais o
que o telescópio é para a investigação científica dos
fenômenos celestes.[33] Segundo os praticantes de
meditação budistas, aquele que alcança o nível superior
de samâdhi conhecido como shamatha, ou quietude
meditativa, tem acesso por meio da experiência ao
relativo estado natural da consciência conhecido pela
corrente Grande Perfeição (Dzogchen) do budismo
tibetano como “consciência-substrato”(âlayavijnâna).
Segundo eles, é desse fluxo de consciência que emergem
a psique e todos os sentidos físicos. De acordo com suas
descobertas, a psique é condicionada pelo corpo e sua
interação física com o ambiente circundante, mas
emerge da consciência-substrato.[34]
Essa visão se mostra coerente com as hipóteses de
Pitágoras, Sócrates, Orígenes, Santo Agostinho e William
James e também com tudo que se conhece atualmente
sobre as interações mente-cérebro. Mas é também onde
todas as visões contemplativas divergem
fundamentalmente das crenças da maioria dos cientistas
cognitivos contemporâneos. O que o budismo traz para
esse confronto de visões de mundo é um método prático
para testar a hipótese pela experiência na primeira
pessoa, por meio do refinamento da atenção e do
apaziguamento da mente de maneiras totalmente
desconhecidas da ciência moderna.
Uma vantagem da prática de shamatha está no fato
de ela não requerer submissão a nenhuma religião ou
crença filosófica. Entretanto, ela pode servir de elo entre
os métodos científicos e contemplativos de exploração
da mente. As pessoas que alcançam esse grau
excepcional de equilíbrio da atenção dizem que os
pensamentos racionais adormecem e todas as formas
aparentes de si mesmo, dos outros, de seu corpo e do
ambiente circundante desaparecem. Nesse ponto, como
nos estados de sono e de morte, a mente se volta para
dentro e os sentidos físicos adormecem. Segundo relatos
de meditadores tibetanos, o que permanece é um estado
de consciência clara e radiante, que constitui a base para
que todas as manifestações acorram ao fluxo mental da
pessoa. Todos os fenômenos que surgem para a
percepção sensorial e mental estão imbuídos da
luminosidade própria dessa consciência-substrato. Assim
como os reflexos dos planetas e das estrelas numa
piscina de água límpida e cristalina são as manifestações
de todo o mundo fenomênico nesse estado vazio e
límpido da psique. Düdjom Lingpa (1835-1904), mestre
Dzogchen da ordem Nyingma do budismo tibetano,
escreveu: “A consciência-substrato, com sua natureza
vazia e cristalina, permanece como a causa de tudo que
é emanado. A psique que emana da consciência-
substrato apresenta formas, que são estabilizadas pelo
fluxo contínuo da consciência.”[35]
De acordo com a experiência desses meditadores, há
um princípio
de preservação da consciência que se manifesta em
todos os momentos da experiência. Os componentes
materiais do cérebro, como neurônios e processos
eletroquímicos, não se transformam em fenômenos
mentais imateriais, como sonhos e alucinações. Nenhum
padrão de acontecimento neuronal torna-se de fato um
acontecimento mental. Mas os fenômenos mentais
tampouco emergem do nada. Mais propriamente, essa
consciência-substrato vazia e radiante transforma-se em
imagens mentais, pensamentos racionais, percepções,
emoções etc. No decorrer de uma vida humana, esses
acontecimentos mentais são condicionados pelo cérebro
e pelo entorno, mas emergem dessa consciência-
substrato e voltam a se dissolver nela. Da mesma
maneira, esses acontecimentos mentais influenciam o
cérebro, o corpo e o meio físico, mas não se transformam
em fenômenos físicos. Em resumo, da perspectiva
budista, o “difícil problema” de como o cérebro produz
experiência mental subjetiva é um falso problema, uma
vez que, na realidade, essa experiência provém da
consciência-substrato. E a lacuna explicativa na
demonstração de como certos tipos de atividade neural
podem ser equivalentes aos acontecimentos mentais é
intransponível, uma vez que os acontecimentos neurais e
mentais jamais são idênticos.
A consciência-substrato pode ser caracterizada como
um estado relativamente vazio, desprovido de toda
“energia cinética” dos pensamentos, das imagens
mentais e das percepções sensoriais. Falando de modo
geral, ela é indiscernível enquanto a mente está ativa;
ela normalmente se manifesta apenas nos estados de
sono sem sonhos e na morte. Embora essa consciência-
substrato seja descrita como o estado natural e livre da
mente, o brilho e a pureza que lhe são próprios estão
presentes mesmo quando a mente encontra-se
obscurecida por emoções e pensamentos aflitivos.
Quando em repouso, ela é luminosa e vazia, mas quando
catalisada por pensamentos ou estímulos sensoriais, sua
“energia potencial” se transforma em “energia cinética”
da psique, manifestando todos os tipos de atividade
mental e sensorial.
Essa dimensão da consciência individual transcende
as qualidades e limitações específicas da história pessoal
nesta vida, neste gênero e mesmo nesta espécie, e esse
substrato é subjacente a todas as formas de consciência,
humanas e não humanas.[36] Uma vez que a mente do
praticante tenha alcançado esse luminoso e silencioso
estado de consciência conhecido como shamatha, diz-se
ser possível direcionar a atenção para o passado,
trazendo à consciência lembranças claras e detalhadas
de acontecimentos ocorridos anteriormente nesta vida.
Então, por meio de um rigoroso treinamento, a pessoa
supostamente pode recordar acontecimentos anteriores
à vida atual, lembrando, como Pitágoras, de
circunstâncias de vidas passadas.
Essas memórias não estão armazenadas no cérebro,
mas o cérebro é necessário para resgatá-las enquanto a
mente permanecer corporificada. As memórias são
armazenadas, por assim dizer, na corrente da
consciência-substrato, que passa de uma vida para
outra. Essa conclusão está baseada em experiências de
meditadores altamente treinados que refinaram sua
capacidade de atenção de maneiras desconhecidas para
a ciência moderna. Sem o desenvolvimento desse
telescópio interno – shamatha – para explorar estados
profundos da consciência, as evidências científicas da
reencarnação restringem-se a pesquisas de campo de
estudiosos como Ian Stevenson.
Embora essa descrição da consciência-substrato
possa parecer uma versão budista da alma imortal, é
importante observar as diferenças entre essa versão
baseada na experiência e as diversas especulações
filosóficas e teológicas a respeito da alma. Os praticantes
que tiveram a experiência do shamatha costumam
descrever essa dimensão da consciência como um fluxo
de momentos de percepção que vêm e vão e que,
portanto, não é uma única entidade que persiste através
do tempo e tampouco é imutável. Além do mais, como
influencia a psique e é condicionada por eventos físicos e
mentais, ela não é independente.
A consciência-substrato pode ser caracterizada como
a natureza relativa da mente individual no sentido de
que, no contexto do fluxo da mente individual, ela
envolve o menor estado de atividade possível, com o
maior potencial e grau possível de liberdade ou
possibilidade. Por exemplo, uma vez que o fluxo de
consciência de uma pessoa tenha surgido do sono sem
sonhos, ele pode se manifestar livremente numa ampla
diversidade de paisagens e experiências oníricas. Essa
criatividade excepcional é manifestada enquanto em
hipnose profunda, que também dá acesso à consciência-
substrato. Mas esse potencial é acessado de maneira
mais efetiva quando a pessoa penetra lucidamente na
consciência-substrato por meio do shamatha, de acordo
com a prática realizada por uma série de importantes
tradições contemplativas do mundo. O estado de
shamatha proporciona uma percepção vívida dessa
dimensão da consciência, ao contrário do marasmo ou
letargia que normalmente caracteriza o estado de sono
sem sonhos.
ESTADOS DE CONSCIÊNCIA E DE ESPAÇO DE VAZIO
RELATIVO
A tradição da Grande Perfeição do budismo tibetano faz
uma distinção entre a consciência-substrato
(âlayavijnâna) e o substrato (âlaya), que é descrito como
o espaço objetivo vazio da mente e que é subjetivamente
experienciado pela consciência-substrato. Esse estado de
vacuidade é imaterial, como o espaço, um espaço em
branco, um vazio de pensamentos no qual todas as
manifestações objetivas dos sentidos físicos e da
atividade mental se dissolvem quando a pessoa
adormece; e é desse vácuo que as formas voltam a
emergir quando ela desperta. Düdjom Lingpa explicou
que quando a percepção entra no substrato:
a mente comum de um ser senciente comum, como ela era, desaparece.
Consequentemente, os pensamentos racionais adormecem e os
pensamentos erráticos se desvanecem no espaço da percepção [...]
Aderindo às experiências de vacuidade e luminosidade enquanto
voltadas para dentro, as formas aparentes de si mesmo, dos outros e dos
objetos desaparecem. Essa é a consciência-substrato [...] a pessoa
chegou à natureza essencial da mente.[37]
Essa descrição da experiência contemplativa do
substrato e da consciência daquele estado profundo de
luminosa vacuidade é semelhante às descrições que os
físicos fazem do estado de relativa vacuidade do espaço.
Em geral, o vazio é definido como o estado de menos
energia possível de uma extensão de espaço, o resultado
a que se chega quando tudo mais é removido. O vazio
verdadeiro, ou absoluto, consiste do que restar quando
tudo mais for removido de um espaço bem definido –
tudo que as leis da natureza permitirem. O vazio relativo,
ou falso, consiste do que restar quando tudo mais for
removido de um espaço bem definido que o estado atual
da tecnologia permitir. O vazio relativo tem energia e
estrutura e não é perfeitamente simétrico, o que quer
dizer que é internamente diferenciado.
Assim como boa parte das manifestações conscientes
é considerada proveniente do substrato e consiste de
configurações desse espaço interno da mente, também
todas as configurações de massa e energia emergem do
vácuo e consistem de configurações do espaço físico. Os
campos de partículas elementares não são nada mais do
que agitações no espaço vazio, enquanto a massa pode
ser vista como energia congelada. A luz é uma espécie
de agitação no espaço vazio ou, mais precisamente, uma
oscilação das grandezas de campo abstrato no espaço,
não uma oscilação do próprio espaço. O físico Henning
Genz explica: “Os sistemas reais são, nesse sentido,
‘agitações do vácuo’ – muito à maneira com que as
ondulações superficiais de um lago são agitações da
água do lago [...] O vácuo em si mesmo é informe, mas
pode assumir formas específicas. Ao fazer isso, ele se
torna uma realidade física, um ‘mundo real’”.[38]
Apesar de a maioria dos cientistas cognitivos atuais
estar convencida de que a mente não passa de uma
função ou propriedade emergente da matéria, os físicos
nos dizem que a matéria consiste de oscilações das
grandezas imateriais abstratas no espaço. São
necessárias mais pesquisas para determinar se essas
abstrações realmente existem independentes no espaço
objetivo ou se são artifícios subjetivos das mentes que as
concebem. Alternativamente, o “mundo real” pode não
ser nem totalmente objetivo nem totalmente subjetivo.
A filosofia do empirismo radical de William James
reflete precisamente a visão da Grande Perfeição ao
rejeitar a dualidade absoluta da mente e da matéria em
favor de um mundo da experiência, no qual a consciência
como uma entidade, em e por si mesma, não existe;
tampouco ela é uma função da matéria, porque a
matéria como uma entidade, em e por si mesma,
tampouco existe. De acordo com essa visão, as ideias de
substâncias mentais e físicas são construtos conceituais,
como também a distinção metafísica entre sujeito e
objeto. Mente e matéria são construtos, enquanto a
experiência verdadeira é primordial.
Estados de Consciência e de Espaço de Vazio
Absoluto
Ao contrário da consciência-substrato, que pode ser
considerada o estado natural relativo da mente, de
acordo com a Grande Perfeição, a consciência primordial
(jnâna) é caracterizada como o estado natural absoluto
da consciência. Esse estado de perfeita simetria –
internamente indiferenciado em termos de todo e
qualquer conceito ou qualidade – é o mais baixo estado
de atividade mental possível, com o maior potencial e
grau de liberdade possível. Enquanto a consciência-
substrato está ciente do substrato – o relativo espaço
interno da mente – a consciência primordial está
indivisivelmente ciente do espaço absoluto dos
fenômenos (dharmadhâtu), que transcende a dualidade
dos espaços interno e externo. Todos os fenômenos que
compõem nossos mundos intersubjetivos da experiência
– manifestações dos espaços interno e externo, tempo,
matéria e consciência – emergem desse espaço absoluto
e consistem de nada mais que suas configurações. No
vácuo relativo e limitado do substrato, como no caso do
sono profundo, os acontecimentos mentais específicos a
um determinado indivíduo emergem e voltam a se
dissolver naquele espaço subjetivo da consciência. Mas
todos os fenômenos no tempo e no espaço emergem e
voltam a se dissolver no vácuo eterno e infinito do
espaço absoluto. Enquanto o vácuo relativo do substrato
pode ser acessado por meio do cultivo do shamatha, o
espaço absoluto dos fenômenos pode ser percebido
apenas pelo cultivo da introvisão contemplativa
(vipashyana).
A percepção do espaço absoluto pela consciência
primordial transcende todas as distinções de sujeito e
objeto, mente e matéria, na verdade, todas as palavras e
conceitos. Essa percepção não envolve o encontro de um
modo subjetivo de consciência com um espaço subjetivo,
mas é antes a percepção não dual da unidade intrínseca
do espaço absoluto e da consciência primordial. Eles são
simultâneos, não localizados no espaço e no tempo.
Enquanto o espaço absoluto é a natureza fundamental do
mundo apreendido pela experiência, a consciência
primordial é a natureza fundamental da mente que
apreende o mundo. Mas como os dois sempre foram da
mesma natureza, a visão da Grande Perfeição não é a do
idealismo filosófico, do dualismo nem do materialismo.
Todas essas distinções, como entre sujeito e objeto e
mente e matéria, são consideradas meros artifícios
conceituais. A indivisibilidade do espaço absoluto e da
consciência primordial é a Grande Perfeição, muitas
vezes referida como o “mesmo sabor” de todos os
fenômenos.
No plano relativo, a consciência-substrato é diferente
do substrato e é internamente caracterizada por
experiências distintas de felicidade, luminosidade e
ausência de conceitos. A experiência dela só ocorre
quando a mente se afasta do mundo exterior, e é
determinada pelo tempo e pela causalidade – específica
a um determinado indivíduo. A unidade do espaço
absoluto e da consciência primordial, por outro lado,
também está imbuída das qualidades de felicidade,
luminosidade e ausência de conceitos, não presentes
como atributos distintos, mas como uma unidade
inefável. Esse vácuo absoluto é adentrado quando se
permite que a consciência repouse num estado de não
dualidade, aberta para todo o universo. Desprovido de
qualquer estrutura interna, ele contém uma única
simetria absoluta que transcende a relatividade do
espaço, do tempo, da mente e da matéria.
Existem também diferenças importantes entre os
efeitos percebidos por meio da experiência da
consciência-substrato e da consciência primordial.
Quando a pessoa alcança a experiência da consciência-
substrato por meio do shamatha, as preocupações
mentais são suprimidas apenas temporariamente, mas
diz-se que, pela experiência da consciência primordial,
todas as preocupações e obscurecimentos mentais
podem ser eliminados para sempre. Igualmente, o
sentimento de felicidade paradisíaca de quem descansa
no estado natural relativo da consciência é limitado e
transitório, enquanto esse sentimento de plenitude além
das palavras, inerente ao estado natural absoluto da
consciência primordial, é ilimitado e eterno. Pelo acesso à
consciência-substrato, a pessoa percebe a natureza
relativa da consciência individual, mas pela experiência
da consciência primordial, a dimensão da percepção
torna-se ilimitada. Igualmente, o potencial criativo da
consciência que é acessado por meio do shamatha é
limitado, enquanto o potencial acessado por meio da
suprema introvisão contemplativa supostamente não
conhece limites.
Considera-se a consciência primordial como a causa
última da felicidade genuína, a verdade última que
liberta a mente de todas as aflições e obscurecimentos,
como também a causa última de todas as virtudes. É
nessa dimensão da consciência que têm origem nossos
desejos mais profundos de felicidade, verdade e virtude.
Essa dimensão é o alfa e o ômega de uma existência
plena de sentido, a origem última da sabedoria e da
compaixão. Considera-se que a percepção da consciência
primordial, quando baseada na prévia prática do
shamatha, permite que recursos internos ilimitados
sejam acessados por diferentes tipos de percepção
extrassensorial e fenômenos paranormais. Entre esses
fenômenos, estão incluídos a visão remota ou
clarividência, o conhecimento do que se passa na mente
de outros, a precognição e outros poderes paranormais,
como o controle mental de fenômenos físicos. Entre os
exemplos, estão incluídos a capacidade de transpor
objetos sólidos, caminhar sobre as águas, controlar
mentalmente o fogo, voar e multiplicar e transformar à
vontade objetos físicos pela força da mente.
Embora os relatos desses poderes aparentemente
milagrosos e sobrenaturais sejam comuns nos anais das
tradições contemplativas do mundo, a visão remota e a
precognição foram também estudadas por pesquisadores
modernos como o físico Russel Targ.[39] O poder da
mente para influenciar objetos físicos tem sido estudado
por R. G. Jahn no Princeton Engineering Anomalies
Research Laboratory, mas as descobertas desses
pesquisadores têm sido amplamente ignoradas pela
comunidade científica. Isso pode em parte se dever aos
resultados inconclusivos e à natureza inerentemente
conservadora da comunidade científica, especialmente
com respeito a descobertas que supostamente
solapariam as bases dos pressupostos da visão de
mundo científica.
As pesquisas de Stevenson, Targ e Jahn são como
estudar as partículas elementares de alta energia pela
observação daquelas que são ocasional e
imprevisivelmente produzidas na natureza, enquanto o
cultivo da concentração em estados profundos de
meditação, ou samâdhi, é como construir um acelerador
de partículas para se observar as partículas de alta
energia em laboratório. Os muitos laboratórios de
ciências cognitivas existentes para examinar o cérebro e
seus comportamentos podem ser complementados com
laboratórios de investigações contemplativas, criados
especificamente para gerar estados refinados de
consciência de “alta energia” e usá-los para explorar os
potenciais da consciência e seu papel no mundo natural.
Assim como a mecânica e a engenharia clássicas são
úteis para a solução de problemas não relativistas, as
ciências cognitivas atuais são úteis para dar respostas a
questões relativas aos estados de consciência normais e
subnormais. Mas algumas das suposições básicas da
física clássica jamais foram verdadeiras e algumas das
suposições materialistas da ciência cognitiva clássica
podem igualmente se provar não verdadeiras quando
estados excepcionais de consciência são alcançados sob
condições controladas e estudadas com rigor científico.
A descrição budista do espaço absoluto dos
fenômenos tem algumas semelhanças com o vácuo
absoluto, ou verdadeiro, da física moderna. Em 1973,
Edward Tyron formulou a teoria de que o universo é uma
flutuação gigantesca do vácuo, cujo total de energia é
igual ou próximo de zero. Conforme explica Genz: “Se
seu total de energia é igual ou próximo de zero, ele pode
ter se originado como uma flutuação espontânea do
vácuo. Poderíamos imaginar algo próximo a uma
anulação ocorrendo entre o potencial de energias
negativas de todas as massas que se atraem
mutuamente no universo e as energias do movimento
(ou cinéticas) e da massa dessas configurações”.[40] O
autor científico K. C. Cole explica a simetria do
verdadeiro vácuo nos seguintes termos:[41]
Se você pode transformar algo de maneira que a transformação não faz
uma diferença perceptível, isso é simetria [...] Se algo já era
perfeitamente simétrico, por mais que você tentasse alterá-lo, a
mudança hipotética não teria nenhum efeito. Sem mudança, não há
nenhuma percepção. Um nada perfeitamente simétrico seria um estado
tão imutável que nada que você pudesse fazer faria qualquer diferença.
Tanto o espaço absoluto dos fenômenos como o
verdadeiro vácuo são considerados como tendo exercido
um papel crucial na formação do universo como o
conhecemos. Henning Genz sugere:
Talvez as flutuações da mecânica quântica tenham originado não apenas
a matéria da qual nosso mundo era feito antes de sua inflação, mas
também o próprio espaço-tempo. Talvez o verdadeiro vácuo, o
verdadeiro nada, da filosofia e da religião, devesse ser visto como um
estado inteiramente livre de leis, espaço e tempo. Esse estado pode ser
considerado como nada mais que um conjunto de possibilidades do que
poderia ser.[42]
E K. C. Cole acrescenta,
A liberação de energia pode explicar o processo de aquecimento que
provocou o big-bang. Como a água levada ao ponto de congelamento
libera sua energia para seus arredores, o “congelamento” do vácuo
libera enormes quantidades de energia [...]. Tão simplesmente quanto a
água vira gelo, o vácuo inflado congelou-se na estrutura que deu origem
aos quarks, elétrons e, finalmente, a nós.[43]
Numa linha de raciocínio notavelmente semelhante, o
Dalai Lama escreveu em seu livro recente sobre a
Grande Perfeição:[44]
Todo e qualquer estado de consciência é permeado pela luz cristalina da
percepção primordial. Por mais que o gelo se solidifique, ele jamais perde
sua verdadeira natureza, que é a água. Da mesma maneira, mesmo
conceitos muito óbvios são tais que o “lugar” deles, por assim dizer, o
lugar onde repousam, não sai fora do espaço de sua percepção
primordial. Eles surgem dentro do espaço da percepção primordial e é
também nele que se dissolvem.
Enquanto os físicos formularam suas teorias a respeito
dos vácuos verdadeiro e falso com base em
experimentos físicos e análises matemáticas, os budistas
formularam suas teorias a respeito dos estados de
consciência verdadeiro e falso com base em experiências
contemplativas e análises filosóficas. Ambas as tradições
dão alta prioridade à investigação empírica e à análise
racional, mas seus pontos de partida e seus métodos de
observação são profundamente diferentes. A revolução
científica começou com a suposição de que um Deus
exterior criou o mundo antes e independentemente da
consciência humana. Os físicos estabeleceram então
para si mesmos a meta de apreender o universo objetivo
da perspectiva do “olho de Deus” e de formular suas leis
nos termos da própria linguagem de Deus, que eles
consideravam ser a matemática. Como eles se voltaram
para o domínio do espaço objetivo e seus conteúdos que
existem independentemente da consciência, era
totalmente natural que para eles a mente tivesse um
papel apenas marginal na natureza; e suas teorias dos
vácuos verdadeiro e falso em geral não fazem nenhuma
referência à consciência.
Na verdade, alguns defensores dessa visão
mecanicista supuseram desde o início que a consciência
não exerce nenhum papel significativo no universo. Como
declarou o neurologista Antonio Damasio: “O
conhecimento da consciência diz pouco ou nada a
respeito das origens do universo, do sentido da vida e do
provável destino de ambos”.[45] Tal convicção é notável
à luz do fato de os neurocientistas não terem ainda
descoberto a natureza ou as origens da consciência.
Esses pesquisadores costumam supor que já sabem que
a consciência não tem nenhuma existência separada do
cérebro e que, portanto, a única questão a ser
respondida é como o cérebro produz estados
conscientes. Em seu livro, The Discoverers: A History of
Man’s Search to Know His World and Himself, o
historiador Daniel J. Boorstin chama essas suposições de
“ilusões de conhecimento”. São essas ilusões, ele sugere,
e não a mera ignorância, que atuaram historicamente
como os maiores impedimentos ao avanço científico.[46]
A importância dos estados de vacuidade do espaço
físico e da consciência dificilmente pode ser
superestimada. O físico John March-Russell declara: “A
crença atual é que você tem que entender todas as
propriedades do vácuo antes de poder entender qualquer
outra coisa”.[47] Os físicos ainda não entenderam todas
as propriedades do vácuo nem todas as leis da natureza,
mas assumiram amplamente que a consciência é
irrelevante para o universo que eles estão tentando
entender. Enquanto o universo concebido pelos físicos
existe independentemente da consciência, os budistas
consideram tal universo irrelevante para o mundo da
experiência humana, no qual a consciência exerce um
papel crucial.
Convergência com o Cristianismo
Embora a revolução científica tenha sido profundamente
influenciada pela crença em um Deus que existe
totalmente separado de sua criação e que observa e
controla o mundo de uma perspectiva absolutamente
objetiva, essa não foi a única teologia defendida por
devotos cristãos através dos tempos. Diferentemente da
busca de uma visão da perspectiva do olho de Deus, que
tanto marcou a ciência moderna, os meditadores cristãos
ortodoxos do Oriente sempre defenderam uma espécie
de contemplação natural que vê Deus em todas as coisas
e todas as coisas em Deus para discernir a presença
divina, que é inerente a todos os fenômenos naturais e
que, ao mesmo tempo, os transcende. A ênfase é
colocada na imanência de Deus, em vez de apenas em
sua transcendência. Em vez de procurar compreender o
mundo pelo uso da linguagem da matemática, aqueles
meditadores cristãos procuraram conhecer Deus indo
além de todos os tipos de pensamento e linguagem: [48]
Como a divindade é um mistério que escapa às palavras e ao
entendimento, deduz-se que em tal contemplação a mente humana tem
que ir além de conceitos, palavras e imagens – acima do nível do
pensamento racional – para apreender Deus intuitivamente pelo simples
“olhar” ou “toque”. De acordo com Evágrio, a mente deve se
“desnudar”, passando da multiplicidade para a unidade [...]. Nos níveis
mais elevados de contemplação, a diferenciação da percepção sujeito-
objeto desaparece e, em seu lugar, resta apenas um senso de unidade
todo-abrangente.
Em vez de considerar a visão da perspectiva do olho
de Deus como absolutamente externa à mente humana,
os filósofos contemplativos da tradição cristã
neoplatônica, seguindo o exemplo do tradutor e filósofo
cristão do século IX, John Scotus Erigena (815?-877?),
viram a possibilidade de buscar Deus no interior de si
mesmos. Nicolau de Cusa, que pertencia a essa tradição
contemplativa, acreditava também que a face de Deus
só pudesse ser conhecida pela experiência que
transcende todos os conceitos, inclusive os matemáticos.
Ao fazer isso, ele dizia, a pessoa pode alcançar “a visão
absoluta, a origem de toda visão daqueles que veem,
[que] supera toda agudeza, toda agilidade e toda
capacidade de todos que veem no presente e que
poderão ver no futuro”.[49]
De acordo com a tradição da Grande Perfeição, a
percepção dualista comum não poderia existir na
ausência da consciência primordial e Nicolau de Cusa
expressou uma visão similar ao dizer: “Sem a visão
absoluta, não pode haver nenhuma visão contraída. A
visão que é absoluta abarca em si mesma todos os
modos de ver e engloba todos de maneira tal que abarca
cada um, permanecendo inteiramente absoluta a cada
variedade”.[50] E fez também uma outra afirmação
notável que tem semelhança com a afirmação budista de
que a realidade como um todo pode ser apreendida pelo
entendimento da natureza da consciência: “Portanto,
quem quer que mereça ver sua face vê todas as coisas
abertamente e nada permanece oculto para tal pessoa”.
[51] Na verdade, muitos dos grandes místicos cristãos,
inclusive Santo Agostinho, declararam que um dos
efeitos da prática contemplativa era uma percepção mais
clara da natureza de Deus, da alma humana e das leis da
natureza.[52]
Parte das visões da natureza do mundo material
alcançadas pela meditação cristã parece dar
credibilidade a essa afirmação. Os fenômenos materiais
que parecem formar nosso meio físico, de acordo com
Nicolau de Cusa, consistem de “naturezas contraídas” e o
mesmo acontece com os fenômenos mentais comuns.
Esse tema parece em princípio ser notavelmente
semelhante à metáfora dos estados comuns da matéria e
da consciência existindo como manifestações
“congeladas” da natureza última da realidade. Nicolau de
Cusa seguiu essa mesma linha de raciocínio ao escrever:
“O poder primordial de ser da matéria é material e,
portanto, contraído e não absoluto; assim como o poder
de ser sensível ou racional também é contraído e não
absoluto, mas o poder absolutamente não contraído
equivale ao simplesmente absoluto, ou seja, ao infinito”.
[53] De acordo com a física moderna, o vácuo absoluto
tem a característica singular da perfeita simetria, como
também acontece com o espaço absoluto dos
fenômenos, de acordo com a visão da Grande Perfeição.
E Nicolau de Cusa fez o seguinte comentário: “Todas as
coisas que são ditas de Deus não podem diferir em
realidade por causa da suprema simplicidade de Deus”.
[54] A questão última da Grande Perfeição é a não
dualidade das dimensões relativa e absoluta da
realidade, crença que parece ser partilhada por Nicolau
de Cusa: “Não existe nada fora de você, mas todas as
coisas em você não são nada mais que você. Mostra-me,
Senhor, como a diversidade, que não existe em ti, não
existe em si mesma e nem pode existir”.[55]
A breve discussão acima não é obviamente
conclusiva. Existem muitas diferenças importantes entre
as teorias budista e cristã com respeito à consciência e
entre as teorias científica e contemplativa do espaço.
Mas no meio dessas diferenças doutrinárias e teóricas,
pode também existir uma base comum oculta sobre a
qual essas divergentes tradições acabam convergindo.
Se isso é verdade, eu acredito que elas estejam
convergindo quanto à verdade mais importante que pode
ser alcançada e conhecida pela experiência. Essa é a
verdade que gera a felicidade genuína e resulta numa
vida de virtude a serviço de todos os seres.
DESAFIOS A UMA CIÊNCIA CONTEMPLATIVA
Um dos mais importantes desafios a serem enfrentados
pela ciência contemplativa é naturalizar a consciência
sem reduzi-la a uma propriedade emergente ou a uma
função da matéria. Isso requer a exploração de
alternativas ao dualismo cartesiano, que tem se
mostrado infrutífero, e ao materialismo científico, que
restringe seriamente nosso entendimento da natureza e
dos potenciais da consciência.
Estamos também diante do desafio de rever os
fundamentos da natureza humana. Se nos baseamos
unicamente na física para compreender nosso lugar na
natureza, a existência humana é reduzida à condição de
robô. Se nos baseamos apenas na biologia, somos
reduzidos à condição de animais. A psicologia
contemporânea vigente tem amplamente se restringido a
estudar as mentes humanas normais e subnormais e
definido a identidade humana dentro dessas limitações.
O budismo vê a nossa existência em termos de três
dimensões: a natureza humana qualificada pelo corpo
humano e pela psique, e nossa natureza enquanto seres
sencientes, qualificada pela consciência-substrato
individual e pela consciência primordial, que transcende
todas as limitações da vida humana e da existência
senciente. O cristianismo afirma que o homem foi criado
à imagem e semelhança de Deus, o que provê uma base
ao desafio colocado por Jesus para que cada pessoa seja
perfeita como o Pai no céu é perfeito. Mas ele também
considera a natureza humana como pecadora e,
portanto, necessitada de redenção por Cristo.
Nos termos de nossa visão da realidade como um
todo, argumentei que os princípios fundamentais da
ciência moderna são válidos com respeito ao mundo
físico objetivo destituído de percepção subjetiva
enquanto são ignoradas as implicações da consciência
refinada (como, por exemplo, por meio da prática de
samâdhi). Esse desprezo pelo papel da consciência pode
parecer insignificante, muito à maneira com que as
suposições básicas da mecânica clássica parecem válidas
enquanto a matéria estudada é grande e não se
aproxima da velocidade da luz. Mas quando a
consciência é altamente refinada, torna-se necessário
falar de estados “relativos” de consciência (assim
chamados porque sua relevância para o mundo físico se
torna óbvia); as suposições materialistas atuais podem
se provar falsas.
O refinamento da consciência por meio da
contemplação e a investigação científica das implicações
de tais estados de consciência podem revolucionar
explicitamente as ciências cognitivas e revolucionar
implicitamente a ciência natural como um todo, a qual
está grandemente baseada nos pressupostos do
materialismo do século XIX. Isso irá requerer uma
profunda investigação do poder causal da consciência, e
especialmente dos estados relativos de consciência, no
mundo natural. Isso, por sua vez, poderá gerar uma
ciência do mundo da experiência que tomará o lugar de
nossa atual ciência do mundo puramente objetivo,
desprovido de subjetividade.
Os ideais da vida contemplativa quase desapareceram
no Ocidente moderno, mas não precisamos buscar fora
de nossa cultura para redescobri-los. Na verdade, não
precisamos ir nada além de São Tomás de Aquino, cuja
influência no cristianismo ocidental dificilmente pode ser
superestimada: “É requisito para o bem da comunidade
humana que existam pessoas que se dediquem à vida
contemplativa”.[56] O próprio propósito da civilização é a
busca da felicidade genuína, da verdade e da virtude, e a
vida contemplativa é inteiramente focada nesses
propósitos. Acredito que era isso que São Tomás de
Aquino tinha em mente quando escreveu:[57]
A vida política como um todo parece estar ordenada com vista à
obtenção da felicidade contemplativa. Porque a paz, que é conquistada e
preservada em virtude da atividade política, coloca o homem em
condições de se dedicar à contemplação da verdade.
2
ONDE A CIÊNCIA E A RELIGIÃO SE
CHOCAM
NO SISTEMA educacional norte-americano, e
também na mídia em geral, a ciência é
comumente apresentada como um conjunto
de conhecimentos empíricos sobre o mundo
natural, descoberto por pesquisadores que são
implacavelmente céticos com respeito a todas as crenças
e suposições não comprovadas, inclusive suas próprias.
As religiões, por sua vez, são comumente apresentadas
como promotoras de crenças sobre o universo e o
sentido da existência humana, as quais são aceitas por
seus adeptos com base na autoridade divina. Assim, a
ciência e a religião parecem representar duas atitudes
mentais incompatíveis e o conflito entre essas duas
maneiras de ver a realidade parece inevitável.
Apesar de haver alguma verdade nessa descrição, em
muitos sentidos ela é equivocada e tem gerado muita
confusão tanto com respeito à natureza da ciência como
da religião. A ciência enquanto método de investigação
tem sido um instrumento extremamente poderoso para
investigar a natureza do universo e tem contribuído com
conhecimentos profundos que mudaram as perspectivas
e vidas humanas em todo o mundo. Mas o sucesso da
abordagem científica conduziu a desdobramentos
especulativos de suas descobertas para áreas da
metafísica, onde não existe de fato nenhuma evidência
experimental de qualquer espécie. Essa é a gênese do
materialismo científico, que é um dogma, não uma teoria
científica. A adesão inquestionável a esse sistema de
crenças presta um grande desserviço à própria ciência,
uma vez que gera confusão a respeito da natureza,
capacidades e limitações reais da investigação científica.
E é perigosa para a sociedade, porque se o estado aceita
sem questionar um sistema metafísico centrado
unicamente em interesses materiais, a existência
humana fica empobrecida e o caminho aberto para a
degradação ambiental e pessoal que é o flagelo da
sociedade moderna.
A visão do materialismo científico pode ser resumida
nos seguintes termos: o mundo físico é a única realidade
que existe. Ele é gerado totalmente por forças naturais
impessoais; é desprovido de ordem ou valores morais
intrínsecos; e funciona sem a intervenção de quaisquer
forças espirituais imateriais, sejam elas benéficas ou não.
A vida e a consciência surgiram originalmente no
universo totalmente por acaso, de configurações
complexas de matéria e energia. A vida em geral, e a
vida humana em particular, não tem nenhum sentido,
valor ou significado além do que ela própria se atribui. No
decorrer de uma vida individual, todos os desejos,
esperanças, intenções, sentimentos etc. – em resumo,
todas as experiências e ações – são determinadas
unicamente pelo corpo e por forças impessoais do meio
físico que atuam sobre ela. O fim de uma vida individual
resulta no desaparecimento da consciência e na
completa aniquilação do indivíduo e, consequentemente,
esse é também o destino de toda vida no universo: ela
simplesmente desaparecerá sem deixar qualquer
vestígio. Em resumo, o homem é fundamentalmente
isolado; ele vive na fronteira de um mundo hostil, que é
tão indiferente a suas esperanças quanto a seu
sofrimento ou a seus crimes. Apenas pela aceitação
dessa visão da existência humana e do universo em
geral, os seres humanos podem viver de maneira
autêntica.
A ciência sempre evoluiu em estreita interação com
as religiões e filosofias das culturas em que estão
inseridas. A perspectiva acima está intimamente ligada à
ideologia materialista de Marx, que se infiltrou na ciência
por meio de figuras como a do marxista russo Aleksandr
Oparin que, em 1938, publicou um livro de grande
influência propondo que a vida tem origem na não vida,
sugerindo um fluxo natural do inorgânico para a matéria
orgânica.[58] Pode-se ver na descrição acima do
universo estreitos paralelos com o existencialismo do
século XX, de Sartre e Camus, como também reflexos do
relativismo ético de pós-modernistas como Derrida e
Foucault. Mas filosofia é filosofia. Não vamos confundi-la
com ciência empírica.
O materialismo científico é incompatível com todas as
grandes religiões do mundo e tem sido apresentado
como conhecimento científico por muitos cientistas
proeminentes, entre eles Carl Sagan, Richard Feynman,
Jacques Monod, Richard Dawkins, Francis Crick, Edward
O. Wilson, Steven Weinberg, Stephen Jay Gould e Antonio
Damasio, representando diferentes áreas da ciência.
Metodologicamente, é perfeitamente razoável que a
ciência adote as hipóteses de trabalho do naturalismo,
ou seja, que procure entender o mundo em termos de
seus agentes naturais, não sobrenaturais. As teorias
científicas, diferentemente das ideias filosóficas e das
crenças religiosas, têm que ser submetidas à observação
empírica e à experimentação. Mas os materialistas
científicos costumam dar o passo seguinte de promover
uma visão de mundo que faz afirmações que vão além
do âmbito do conhecimento científico.
Contrária à posição de muitos fervorosos adeptos do
materialismo científico, a crença nessa visão de mundo
não é necessária para o exercício eficiente da ciência. Ela
é meramente uma opinião secundária que alguns
cientistas têm sobre a existência. A crença tem
importância fundamental, tanto na ciência como na
religião, mas ela costuma exercer um papel diferente em
cada contexto. Na ciência, as crenças que são levadas
para a pesquisa e o ensino funcionam como um conjunto
de hipóteses de trabalho. Elas não devem ser
dogmáticas, mas antes suposições que permitem aos
cientistas levantarem determinadas hipóteses.
Teoricamente, todas essas suposições estão sujeitas à
refutação empírica. As hipóteses de trabalho podem ser
adotadas para o propósito de tentar obter avanços na
ciência, mas elas têm que também ser encaradas como
provisórias, mesmo que algumas delas sejam
consideradas “verdades”. De acordo com seus próprios
critérios de ceticismo, os cientistas devem manter a
mente suficientemente aberta para reconhecer que
qualquer uma dessas hipóteses pode acabar sendo
rejeitada.
Com o passar do tempo, no entanto, as hipóteses de
trabalho podem facilmente se transformar em crenças
aguerridas e é aqui que entra o dogma. O termo
“dogma” refere-se a uma visão de mundo coerente,
aplicada universalmente, formada a partir de um
conjunto de crenças e atitudes que exige submissão
intelectual e emocional. Como tal, o dogma exerce um
poder sobre os indivíduos e as comunidades que vai
muito além dos meros fatos e das teorias baseadas
neles. Na realidade, ele pode prevalecer apesar das
evidências contrárias totalmente óbvias e a submissão a
ele pode se tornar ainda mais aguerrida diante de
obstáculos. Existem muitos tipos de dogma, entre eles os
religiosos, filosóficos, políticos e científicos.
É comum o cientista ignorar as evidências que
contrariam suas hipóteses de trabalho mais
fundamentais. Por toda sua ênfase no ideal de ceticismo,
a ciência é conservadora e a mudança de paradigma não
ocorre facilmente. Nesse sentido, o dogma pode ser
concebido mais como relativo do que como absoluto. Por
um lado, fazer ciência implica tomar muitas suposições
como crenças, em diferentes graus. Por outro, a pesquisa
científica é realizada por pessoas e, como as pessoas são
governadas por diversas forças – políticas, sociais e
outras –, os ideais da ciência podem ser bem diferentes
do que ela de fato pratica.
O DOGMA DO MATERIALISMO CIENTÍFICO
Os cientistas não são mais isentos de dogmas do que os
políticos, os filósofos ou os teólogos. Pode-se
argumentar, entretanto, que há uma diferença sutil,
porém importante, entre as crenças defendidas por
cientistas e não cientistas. A grandeza e o prodígio da
ciência estão no fato de ela ter se desenvolvido por doze
gerações de uma maneira muito mais aberta e receptiva
a mudanças do que cada cientista individualmente. Os
cientistas são seres humanos limitados, mas a ciência
enquanto método parece ir além de muitas das
limitações de seus praticantes. Daí o ditado comum de
que é preciso que a geração mais velha de cientistas
morra para dar lugar a novas ideias, uma vez que muitas
pessoas não conseguem aceitar plenamente conceitos
radicalmente novos. Devido a tudo isso, pode ser que, no
devido tempo, os dogmas científicos atuais acabem
sendo desafiados e talvez derrubados. Isso vai, no
entanto, depender de as sociedades e culturas futuras
viverem por tempo suficiente e com liberdade de
pesquisa suficiente para permitir que a ciência continue.
A pesquisa que desafia os dogmas da ciência não
depende apenas de ser tolerada, mas também
incentivada.
Vamos agora examinar mais de perto os princípios
essenciais da ideologia do materialismo científico.
Objetivismo
O princípio do objetivismo requer que a ciência lide com
fatos empíricos testáveis por métodos empíricos e
verificáveis da perspectiva da terceira pessoa. Os
fenômenos que melhor se prestam a tal investigação são
universais, públicos, controláveis, repetitivos e
previsíveis. Na mente de alguns adeptos do materialismo
científico, a exigência do objetivismo científico pode
também implicar um compromisso com a visão expressa
nas palavras do biólogo social Edward O. Wilson: “Fora de
nossa mente, a realidade existe de modo independente
[...]. Dentro de nossa mente, ocorre a reconstituição da
realidade com base na absorção sensorial e na
organização espontânea de conceitos”[59] A tarefa
própria dos cientistas, segundo ele, é colocar
corretamente as representações subjetivas da realidade
dentro de nossa mente de acordo com o mundo exterior
objetivo. Essa visão, que tem origem na metafísica do
século XVII de René Descartes, supõe que o mundo
objetivo encontra-se fora do mundo subjetivo das
manifestações, inclusive de todas as evidências de
nossos sentidos, que são consideradas existentes apenas
dentro de nossa mente.
Reducionismo
Conquanto existam muitos tipos de reducionismo, o
“reducionismo categórico” é a tendência a reduzir algo
relativamente desconhecido ou pouco entendido a uma
classe de fenômenos mais conhecidos e entendidos.
Apesar de esse sempre ter sido um método psicológico
genérico para adquirir conhecimento do mundo, devido
ao curso específico do desenvolvimento dos principais
ramos da ciência natural, o reducionismo na ciência
seguiu uma orientação especial. Historicamente, foram
as ciências físicas que fizeram os primeiros grandes
progressos e estabeleceram aquilo que se tornou
conhecido como método científico e, portanto, para as
gerações posteriores de biólogos era natural procurar
entender os organismos vivos em termos de física. O
físico Richard Feynman expôs sua visão ao declarar num
curso de graduação: “Não há nada que os seres vivos
façam que não possa ser entendido do ponto de vista de
que eles são feitos de átomos atuando de acordo com as
leis da física”.[60] Os cientistas cognitivos, por sua vez,
tentam entender os processos mentais em termos dos
mecanismos biológicos do cérebro e dos sistemas de
inteligência artificial. Da mesma maneira, os estudiosos
acadêmicos de religião costumam procurar explicar as
experiências espirituais em termos de psicologia,
medicina, economia e outros fatores não religiosos.
Em nenhum lugar esse reducionismo categórico é
mais comumente aplicado do que ao estudo do
comportamento humano e da mente, dois dos mais
misteriosos e complexos campos da pesquisa científica.
O biólogo Richard Dawkins, por exemplo, afirma que os
genes constituem a principal força motriz da evolução e
que os seres humanos, como todos os animais, são
basicamente máquinas criadas por nossos genes.
Escrevendo sobre os genes como se tivessem propósitos
conscientes, ele defende que eles controlam o
comportamento humano, “não diretamente com seus
dedos manipulando os cordões de marionetes, mas
indiretamente como os programadores de
computador”.4[61]No mesmo espírito do reducionismo
categórico, o neurologista Antonio Damasio escreve:
Muitos de nós da neurociência somos guiados por um único objetivo e
uma única esperança: prover finalmente uma explicação abrangente
sobre como o tipo de padrão neural que podemos atualmente descrever
com os recursos da neurobiologia, de moléculas para sistemas, chega a
se tornar a imagem multidimensional, integrando espaço e tempo, da
experiência que temos neste exato momento.[62]
Enquanto estratégia de pesquisa, o reducionismo
demonstrou seu valor pragmático muitas vezes na
história da ciência. Alguns cientistas adotam com cautela
o reducionismo como um método que se mostrou
extremamente útil em muitas áreas da pesquisa, sem
adotá-lo como uma crença sobre a verdadeira natureza
da realidade como um todo. Mas mesmo enquanto
método, ele tem suas limitações. Os biólogos, por
exemplo, sabem que não podem explicar coisas como
comportamento animal em termos de movimentos
individuais de moléculas; e os cientistas cognitivos
sabem que processos mentais complexos não podem ser
entendidos em termos de comportamentos de neurônios
individuais.
O princípio do confinamento
De acordo com o princípio do confinamento, mesmo que
existissem fenômenos não materiais, eles jamais
exerceriam qualquer influência no universo físico. Isso
porque o universo está fechado a quaisquer hipotéticas
intervenções causais não físicas. Adotar esse princípio
como uma hipótese de trabalho faz muito sentido
quando os instrumentos de pesquisa se restringem a
mensurar os fenômenos físicos. Mas as implicações
desse princípio, quando elevado ao nível de verdade
metafísica, são enormes, tanto em termos dos limites do
conhecimento científico quanto da natureza da existência
humana. Em seu livro The Blind Watchmaker, Richard
Dawkins transcende o domínio legítimo da ciência
quando declara:
A seleção natural, o processo automático, cego e inconsciente que
Darwin descobriu, e que conhecemos hoje como a explicação para a
existência de todas as formas aparentemente propositais de vida, não
tem nenhum propósito em mente. Ela não tem mente nem nenhuma
visão mental. Ela não planeja o futuro. Não tem visão, nem previsão,
absolutamente nenhuma visão. Se é possível atribuir-lhe o papel de
relojoeiro da natureza, esse é o de um relojoeiro cego.[63]
O físico Steven Weinberg comete o mesmo erro com a
afirmação frequentemente citada que faz em seu livro
The First Three Minutes: “Quanto mais o universo parece
compreensível, mais ele também parece fora de
propósito”.[64] Não é que os materialistas científicos não
gostem de abordar temas metafísicos. Eles gostam, mas
muitas vezes os tomam equivocadamente como
conclusões científicas. Com isso, prestam um grande
desserviço ao conhecimento tanto da ciência como da
religião.
Fisicismo
O princípio do fisicismo declara que o universo consiste
apenas de configurações da matéria e da energia dentro
do espaço e do tempo. Para entender esse princípio, é
crucial reconhecer que a matéria em questão não é
aquela com a qual deparamos na experiência cotidiana.
Uma pedra que seguramos na mão, por exemplo, é
percebida como dotada de certa coloração, textura e
peso. Mas todas essas qualidades são atributos
secundários que existem, de acordo com uma linha de
raciocínio que vem desde Descartes, não no mundo
objetivo, mas como representações dentro de nossa
mente. A matéria que constitui os alicerces básicos do
universo objetivo, de acordo com o materialismo
científico, é anterior e separada de todos esses atributos
secundários que surgem apenas em relação com um
sujeito consciente. As verdadeiras propriedades da
matéria são seus atributos primários inerentes que
existem independentemente de todos os modos de
detecção.
QUAL A EFICÁCIA DO MATERIALISMO CIENTÍFICO?
Um dos argumentos mais comuns em defesa dos
princípios do materialismo científico enquanto
conhecimento científico é que eles funcionam. Ou seja,
que em termos pragmáticos, eles têm se mostrado
extremamente úteis. Um segundo argumento em defesa
de sua validade baseia-se no fato de nunca ter-se
encontrado qualquer evidência capaz de refutá-los. Se
essas duas afirmações são verdadeiras, temos que levar
a sério a possibilidade de a adoção desses princípios ser
necessária para a realização de qualquer tipo de
pesquisa científica. Vamos, portanto, agora proceder a
uma avaliação do materialismo científico em termos de
sua importância e validade pragmáticas.
O objetivismo e as ciências cognitivas
Por sua ênfase no estudo científico de fenômenos
universais, públicos, controláveis, repetitivos e
previsíveis, o princípio do objetivismo marginaliza tudo
que é individual, privado, fora do controle, único e
anômalo. Em grande parte, isso esclarece porque a
mente só se tornou objeto de estudo científico três
séculos após o início da revolução científica. Mas esses
fenômenos, inclusive todos os tipos de processos
mentais subjetivos, não são menos reais ou importantes
do que os considerados pelo princípio do objetivismo.
Priorizar simplesmente a realidade e a importância dos
fenômenos objetivos desvaloriza a experiência subjetiva
a ponto de ela ser comumente considerada um mero
epifenômeno dos processos físicos objetivos
“subjacentes” a ela.
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Ciencia Contemplativa - B. Alan Wallace.pdf

  • 1.
  • 2. d dLivros Livros { Baixe Livros de forma Rápida e Gratuita } Converted by convertEPub
  • 4. Folha de Rosto CIÊNCIA CONTEMPLATIVA ONDE O BUDISMO E A NEUROCIÊNCIA SE ENCONTRAM B. ALAN WALLACE Tradução CARMEN FISCHER
  • 5. Créditos Título original: Contemplative Science. Copyright © 2007 Columbia University Press. Esta edição traduzida da edição americana e autorizada especialmente pela Columbia University Press, só pode ser publicada e vendida no Brasil. Todos os direitos reservados. Nenhuma parte desta obra pode ser reproduzida ou usada de qualquer forma ou por qualquer meio, eletrônico ou mecânico, inclusive fotocópias, gravações ou sistema de armazenamento em banco de dados, sem permissão por escrito, exceto nos casos de trechos curtos citados em resenhas críticas ou artigos de revistas. A Editora Pensamento-Cultrix Ltda. não se responsabiliza por eventuais mudanças ocorridas nos endereços convencionais ou eletrônicos citados neste livro. Dados Internacionais de Catalogação na Publicação (CIP) (Câmara Brasileira do Livro, SP, Brasil) Wallace, B. Alan Ciência contemplativa : onde o Budismo e a neurociência se encontram ; B. Alan Wallace ; tradução Carmen Fischer. — São Paulo: Cultrix, 2009. Título original: Contemplative science : where Buddhism and neuroscience converge. ISBN 978-85-316-1056-1 ISBN Digital 978-85-316-1169-8 1. Budismo 2. Budismo – Psicologia 3. Consciência – Fisiologia 4. Neurociências 5. Neurociências – Aspectos religiosos – Budismo 6. Religião e medicina I. Título. 09-10041 CDD-294.3365 Índices para catálogo sistemático: 1. Ciência contemplativa : Aspectos religiosos : Budismo 294.3365 O primeiro número à esquerda indica a edição, ou reedição, desta obra. A primeira dezena à direita indica o ano em que esta edição, ou reedição, foi publicada. Edição Ano 1-2-3-4-5-6-7-8-9 09-10-11-12-13-14-15-16-17 Direitos de tradução para o Brasil
  • 6. adquiridos com exclusividade pela EDITORA PENSAMENTO-CULTRIX LTDA. Rua Dr. Mário Vicente, 368 — 04270-000 — São Paulo, SP Fone: 2066-9000 — Fax: 2066-9008 E-mail: pensamento@cultrix.com.br http://www.pensamento-cultrix.com.br que se reserva a propriedade literária desta tradução.
  • 7. AGRADECIMENTOS Eu gostaria de começar expressando minha gratidão a Brian Hodel, que trabalhou meses comigo editando a série de ensaios apresentada neste livro. Sem as suas muitas sugestões, desde aspectos muito específicos até seu plano geral, este livro jamais viria à luz. Meus agradecimentos também a James Elliott, que ajudou a aparar as arestas do manuscrito, e a Wendy Lochner e Leslie Kriesel, da Columbia University Press, pelo papel inestimável que ambos exerceram na produção deste livro. Sinto-me em dívida com muitos estudiosos, meditadores e cientistas, que tanto inspiraram como fizeram críticas a este livro, entre eles Michel Bitbol, José Ignacio Cabezón, David Ritz Finkelstein, Owen Flanagan, Paul Gailey, Daniel Goleman, William Grassie, Charles L. Harper, Van Harvey, Anne Harrington, Piet Hut, David E. Meyer, Ken Paller, David Presti, Matthieu Ricard, Ben Shapiro, William Waldron, Zhihua Yao e Arthur Zajonc. Meu entendimento foi profundamente enriquecido por todas essas pessoas e sou grato a elas por sua colaboração. Quero agradecer também a meus pais por toda uma vida de estímulo e bons conselhos, e a minha esposa, Vesna A. Wallace, por seu apoio constante e sugestões, com os quais eu conto em todos os momentos de necessidade. Finalmente, minha infinita gratidão para com todos os meus mestres, particularmente a Sua
  • 8. Santidade o Dalai Lama, que me guiou em minha busca da felicidade, da verdade e da virtude autênticas. Dedico este livro como uma pequena prova da minha gratidão. Que ele possa beneficiar a outros como meus professores me beneficiaram.
  • 9. Ele observou sua Alma com um Telescópio. O que parecia totalmente irregular, ele viu e expôs como belas Constelações: e acrescentou à Consciência mundos dentro de mundos. – samuel taylor coleridge
  • 10. POR UMA CIÊNCIA CONTEMPLATIVA
  • 11. 1 PRINCÍPIOS DA CIÊNCIA CONTEMPLATIVA A SIMPLES IDEIA de propor uma disciplina com o nome de “ciência contemplativa” pode despertar suspeita entre aqueles que prezam as conquistas da ciência, as quais, em parte, devem-se justamente à separação de seu método de investigação de toda e qualquer vinculação religiosa. Essa estranheza tem uma forte base histórica e, portanto, deve ser levada a sério. Mas os princípios da contemplação e da ciência também têm bases históricas que sugerem uma possível reconciliação e até mesmo uma integração das duas abordagens. O termo latino contemplatio, que deu origem à palavra “contemplação”, corresponde à palavra grega theoria. Ambas referem-se a uma total lealdade para com revelar, esclarecer e tornar manifesta a natureza da realidade. O objetivo central delas é a busca da verdade e nada menos que a verdade. De acordo com o teólogo cristão Josef Pieper, o principal elemento envolvido no conceito de contemplação é a percepção silenciosa da realidade.[1] Essa, segundo ele, é uma forma de conhecimento alcançada não por meio do pensamento, mas da visão. “A intuição é, sem dúvida, a forma perfeita de conhecer. Porque a intuição é o conhecimento do que está realmente presente; a analogia com ver com os sentidos é exata.”[2] Mas diferentemente do
  • 12. conhecimento objetivo, a contemplação não se dirige meramente para o seu objeto; ela já repousa nele. Embora o termo “ciência” tenha sido considerado unicamente no âmbito da exploração de fenômenos objetivos, físicos e quantitativos – a ponto de apenas eles serem considerados reais por alguns cientistas – existem fundamentos para se considerar a ciência num contexto mais amplo. O Webster’s Ninth New Collegiate Dictionary define método científico nos seguintes termos: “Princípios e procedimentos para a busca sistemática de conhecimento envolvendo o reconhecimento e a formulação de um problema, o levantamento de dados por meio da observação e da experimentação, bem como a formulação e comprovação de hipóteses”. Não há nada nessa definição que impeça a possibilidade de o indivíduo fazer da perspectiva da primeira pessoa observações de fenômenos mentais e sua relação com o mundo como um todo. Exatamente como os cientistas fazem observações e conduzem experimentos com a ajuda de recursos tecnológicos, os meditadores vêm há muito tempo fazendo suas próprias observações e conduzindo seus próprios experimentos fazendo uso do refinamento de suas capacidades de atenção e do exercício da imaginação. Em princípio, não existe, portanto, nada que seja fundamentalmente incompatível entre a contemplação e a ciência. Mas o peso da história continua se opondo a qualquer colaboração proveitosa entre as duas. A força que a ciência adquiriu ao se divorciar da religião, e mais recentemente da filosofia, impôs um pesado tributo a suas sociedades hospedeiras. É importante observar que o século XX, que gerou o mais
  • 13. vasto conhecimento científico de todo o curso da história da humanidade, também testemunhou a maior desumanidade para com o homem, como também a maior degradação do meio ambiente e dizimação de outras espécies. A expansão do conhecimento científico não trouxe nenhum crescimento comparável em termos de ética e virtude. Em consequência disso, a sociedade moderna adquiriu mais conhecimento e poder, mas não mais sabedoria e compaixão. A ciência é vista há muito tempo com orgulho, e não sem justificação, como sendo “isenta de valores”. Tenho encontrado frequentemente cientistas que falam do puro prazer da descoberta, sem qualquer relação com as possíveis aplicações práticas de suas pesquisas. Mas não podemos ignorar o fato de a maior parte das pesquisas científicas serem atualmente financiadas por instituições públicas e privadas que têm em mente objetivos específicos. Elas querem bons retornos sobre os investimentos que fazem. Com a moderna dissolução da fusão medieval de religião, filosofia e ciência, ocorreu uma desintegração semelhante na busca da felicidade genuína, verdade e virtude – três elementos essenciais que dão sentido à vida. A ciência contemplativa que tenho em mente procura reintegrar a busca desses três elementos por meios totalmente empíricos, sem submissão dogmática a qualquer sistema de crenças, seja de caráter religioso ou não. Para explorar essa possibilidade, vamos antes rever os elementos essenciais da felicidade genuína, da verdade e da virtude que devem ser integrados.
  • 14. OS ELEMENTOS ESSENCIAIS DE UMA VIDA PLENA DE SENTIDO Felicidade genuína A felicidade genuína é um sentimento de bem-estar que subjaz e permeia todos os estados emocionais, abarcando todas as vicissitudes da vida, e que se distingue do “prazer hedonista”, que é a sensação de bem-estar provocada por estímulos prazerosos. A palavra grega que estou traduzindo como felicidade genuína é eudaimonia, a qual Aristóteles em sua Ética a Nicômaco igualou ao que há de bom no homem. Ela se manifesta como um processo da alma em concordância com a virtude, e se houver mais de uma virtude, com a melhor e mais completa.[3] Felicidade genuína não é a simples culminação de uma vida com sentido, mas uma característica da pessoa em processo de desenvolvimento ético e espiritual. Esse é um conceito intencionalmente genérico de desenvolvimento humano que deixa a cada leitor a tarefa de decidir qual é a virtude “melhor e mais completa”. É óbvio que esse ideal de felicidade genuína pode ser adotado tanto por pessoas religiosas como por não religiosas e cada uma irá definir seus atributos específicos de acordo com sua própria visão de mundo. Como veremos a seguir, esse bem-estar é consequência natural do desenvolvimento de um equilíbrio mental que propicia o fortalecimento do “sistema imunopsicológico”, com o qual a pessoa raramente sucumbe a uma vasta gama de aflições mentais. Um estado de presença serena, equilíbrio emocional e clareza mental são característicos dessa
  • 15. felicidade genuína, que naturalmente se expressa num modo de vida harmonioso e altruísta. Santo Agostinho (354-430 d.C.) levantou essa questão ao declarar que a única coisa de que necessitamos é a resposta à seguinte pergunta: “Como o homem pode alcançar a felicidade?”[4] A felicidade genuína, segundo ele, é um “prazer proporcionado pela verdade”,[5] enquanto as duas causas reais dos infortúnios humanos são “a profunda ignorância” e “o amor pelas coisas vãs e perniciosas”. A busca da verdadeira felicidade, ele declarou, é motivada pelo amor a Deus, que é o desejo de união com ele. Essa ênfase na profundidade da busca de felicidade não se restringe à antiguidade grega ou à teologia cristã. O Dalai Lama escreveu em seu livro The Art of Happiness, que se tornou um best-seller: “Acredito que a busca da felicidade seja o próprio propósito da vida. Independentemente de a pessoa ter alguma crença religiosa, de acreditar nessa ou naquela religião, todos nós estamos buscando algo melhor na vida. Portanto, eu acho que o próprio movimento de nossa vida segue na direção da felicidade”.[6] Verdade A experiência da felicidade genuína não é alcançada como um mero resultado da satisfação de prazeres sensoriais ou de estímulos intelectuais. Tampouco é resultado da mera aprendizagem de pensar de determinada maneira ou da adoção de uma atitude otimista. Ela tem que estar baseada num verdadeiro entendimento da verdade. Mas existem muitas verdades que têm pouca relevância para o pleno desenvolvimento humano. Muitos dos aspectos do mundo natural
  • 16. estudado pelos cientistas parecem extremamente distantes dos valores humanos, e parece não haver razão para se acreditar que os cientistas em geral, apesar de todo seu conhecimento do mundo físico, sejam mais felizes do que os profissionais de qualquer outra área. Conforme já observamos, o enorme crescimento do conhecimento científico no século passado não correspondeu a nenhum crescimento equivalente em termos de felicidade humana, embora os avanços da medicina tenham certamente contribuído enormemente para o nosso bem-estar físico. Isso quer dizer que as verdades mais relevantes à plena realização humana não são as mais comumente exploradas com sucesso pela ciência moderna. Embora os cientistas tenham focado sua atenção particularmente no mundo exterior, não existe nenhum aspecto da realidade mais pertinente à felicidade genuína do que a natureza da identidade humana. O teólogo cristão Joseph Maréchal aborda esse tópico dentro do contexto da investigação contemplativa:[7] A mente humana [...] é uma faculdade à procura de sua intuição – ou seja, de integração com o Ser, o Ser puro e simples, uno e soberano, sem restrição, sem distinção entre essência e existência, entre possível e real [...] Mas aqui embaixo, em lugar do Uno, ela se encontra com o múltiplo, o desconexo. Aqui, no que diz respeito à verdade, a multiplicidade infinita de objetos suspende a afirmação e engendra a dúvida [...] A afirmação da realidade não é então nada mais que a expressão da tendência básica da mente para a unificação no e com o Absoluto. Também na tradição budista, a importância do autoconhecimento não pode ser exagerada, especialmente sob a luz da afirmação budista de a causa
  • 17. principal do sofrimento humano ser a ignorância e a ilusão, especificamente no que diz respeito à própria identidade. De todas as virtudes enfatizadas pelo budismo, nenhuma é mais importante do que a da sabedoria, que envolve a percepção da natureza última da realidade. Shântideva, um iminente budista indiano do século VII, escreveu: “O Sábio ensinou todo esse sistema para se alcançar a sabedoria. Por isso, com o desejo de se precaver do sofrimento, a pessoa deve procurar alcançar a sabedoria”.[8] Virtude Exatamente como a felicidade genuína encontra-se inextricavelmente ligada à compreensão da verdade, ela tampouco pode ser compreendida sem levar em consideração a virtude. Apesar das inúmeras diferentes teorias que abundam entre filósofos e teólogos, a breve definição de Santo Agostinho é particularmente notável e universal, por tê-la exposto em termos de “ordem do amor”, o que tem a ver com a prioridade dos nossos valores.[9] Seguindo as palavras de Jesus com respeito à importância central do amor a Deus e a seus semelhantes, o teólogo John Burnaby escreveu: “O amor a Deus, que é o desejo de união com Ele, e o amor entre os homens, que é o sentimento de união com todos os seres capazes de compartilhar do amor de Deus, estão de fato intrinsecamente ligados um ao outro”.[10] Essa é a base de todas as virtudes dentro do contexto teísta. No contexto do budismo, que costuma ser considerada uma religião não teísta, uma vida de virtudes é a base necessária para a busca da verdade e da felicidade genuína, ou da plena realização humana.
  • 18. Essas virtudes são de três tipos: social/ambiental, psicológica e espiritual. Apesar de as teorias éticas do budismo estarem profundamente enraizadas na visão de mundo budista, incluindo suas doutrinas com respeito à reencarnação e ao karma, em seu livro Ethics for the New Millennium, o Dalai Lama apresentou uma visão de ética secular que é igualmente relevante tanto para adeptos como não adeptos de qualquer religião. Bem-estar psicológico O poder de persuasão do behaviorismo, da psicologia e da neurociência concerne a tópicos como tomada de decisão, atenção e afirmações a respeito do que as pessoas sentem em diferentes situações controladas. Os processos mentais estudados pelas ciências cognitivas são em grande medida aqueles que, de uma perspectiva evolutiva, contribuíram para que a espécie humana sobrevivesse e proliferasse. Todas as ramificações da psicofísica e da psicologia que tratam de aspectos como atenção, cognição, relações sociais e tipos de personalidade dependem das respostas das pessoas a perguntas quanto à intensidade de alguma coisa, como a cor que estão vendo, o volume de um determinado som, no que elas acreditam, quais são suas atitudes e assim por diante. Muitos desses dados foram organizados em termos de princípios coerentes e os conjuntos estruturados de descobertas que os cientistas cognitivos vêm tentando organizar e entender são muito vastos. A neurociência contemporânea veio colocar mais luz sobre o que os psicólogos exploraram em termos de memória, atenção, emoções, atitudes etc.
  • 19. Especialmente desde a Segunda Guerra Mundial, a maior parte dos estudos psicológicos, particularmente nos Estados Unidos, tem sido realizada com foco nos processos mentais normais e patológicos. Apenas recentemente, a atenção científica começou a se voltar para o bem-estar mental, mas as verbas para essas pesquisas têm sido limitadas em razão de a natureza do bem-estar e seus efeitos comportamentais não serem bem conhecidos – uma típica situação sem saída! É aí que as tradições contemplativas do mundo, que vêm há muito tempo se ocupando da felicidade humana no contexto da verdade e da virtude, poderiam dar importantes contribuições. Dentro do vasto contexto da felicidade genuína, pode valer a pena o esforço para identificar os domínios específicos de desenvolvimento. Com base no bem-estar social e ambiental que resulta do cultivo de atitudes éticas, a pessoa pode chegar ao bem-estar psicológico que advém de uma psique saudável e equilibrada. Estou usando a palavra “psique” para designar toda uma gama de fenômenos mentais conscientes e inconscientes estudados pelos psicólogos, incluindo percepções, pensamentos, emoções, memórias, fantasias, sonhos e visões de todos os tipos. Os processos psicológicos são condicionados pelo corpo, pela história pessoal, pelo meio ambiente físico e pela sociedade, além de, a cada momento, estarem em estreita correlação com funções específicas do cérebro. A psique pode ser estudada indiretamente por meio de questionários individuais e do exame do comportamento do cérebro e observada diretamente pela introspecção.
  • 20. Se o bem-estar psicológico resulta da saúde e equilíbrio da mente, ele precisa ser entendido com relação a tipos específicos de desequilíbrios mentais aos quais as pessoas normais – em geral consideradas relativamente saudáveis – estão comumente propensas. Um pressuposto básico por trás da análise seguinte é que o sofrimento mental seja em geral um sintoma de desequilíbrios mentais, assim como a dor física é um sintoma de doença ou ferimento.[11] Nos próximos tópicos, vamos examinar quatro tipos de desequilíbrios mentais – relacionados com a conação, a atenção, a cognição eo afeto – e em cada um, iremos identificar os desequilíbrios em termos de deficiência, hiperatividade e disfunção. Desequilíbrios conativos “Conação” é um termo importante, apesar de não ser usado comumente, que tem relação com as faculdades do desejo e da volição. Os desequilíbrios conativos desviam nossos desejos e intenções do caminho da satisfação psicológica e nos causam sofrimento psicológico. Há uma deficiência conativa quando nos vemos diante da perda apática do desejo de felicidade e suas causas, bem como de uma indisposição para aliviar nosso próprio sofrimento e o de outros. Essa deficiência vem normalmente acompanhada de uma falta de imaginação e de uma espécie de estagnação complacente: não conseguimos imaginar nenhuma saída melhor e, portanto, nem tentamos alcançar tal bem- estar. A hiperatividade conativa ocorre quando nos fixamos em desejos obsessivos que obscurecem a realidade do presente. Estamos tão aprisionados a
  • 21. fantasias com respeito ao futuro – e desejos não realizados – que nossos sentidos ficam embotados diante do que está acontecendo aqui e agora. Nesse processo, podemos também nos manter cegos para as necessidades e desejos dos outros. Finalmente, a disfunção conativa ocorre quando desejamos coisas que não conduzem a nosso próprio bem-estar nem ao de outros e não desejamos o que possa vir a contribuir para o nosso bem-estar e de outros. É crucial reconhecer que a satisfação psicológica individual não é algo que possa ser cultivado sem qualquer relação com os outros. Nós não existimos independentemente dos outros e, consequentemente, nosso bem-estar tampouco pode ocorrer independentemente dos outros. Temos que levar em conta o bem-estar das pessoas à nossa volta. Que tipo de coisas (no sentido mais amplo, incluindo coisas e qualidades tangíveis e intangíveis) proporcionam realmente o bem-estar psicológico? Em seu livro, The High Price of Materialism, o psicólogo Tim Kasser analisa a relação entre os valores materialistas que predominam no mundo de hoje e o bem-estar que todos nós almejamos. Ele conclui:[12] A pesquisa científica vigente sobre o valor do materialismo revela descobertas claras e consistentes. As pessoas altamente centradas em valores materialistas têm menos bem-estar pessoal e saúde psicológica do que as que dão relativamente pouca importância às conquistas materiais. Essas relações foram documentadas em amostras que abarcam tanto ricos como pobres, adolescentes e idosos, australianos e sul-coreanos. Como já vimos, Santo Agostinho considerou o “amor pelas coisas vãs e perniciosas” como uma espécie de
  • 22. disfunção conativa, enquanto o desejo mais profundo e com base na realidade é o amor a Deus, que é o desejo de unir-se a Ele. Nicolau de Cusa, cardeal da Igreja Católica Romana do século XV, repetiu esse tema ao escrever: “Todo aquele... que busca, busca apenas o bem e todo aquele que busca o bem e se afasta de ti [Deus] se desvia do que está buscando”.[13] Shântideva tratou da mesma questão de uma perspectiva não teísta: “Aqueles que procuram escapar do sofrimento correm diretamente para ele. E apesar do desejo de felicidade, movidos pela ilusão, eles destroem o próprio bem-estar como se fosse seu inimigo”.[14] Apesar de existirem muitas abordagens para restaurar o equilíbrio conativo, uma delas é tratar de sair da apatia pelo reconhecimento da possibilidade de felicidade genuína, curar o desejo obsessivo pelo cultivo da satisfação e reparar os desejos equivocados pelo reconhecimento das verdadeiras causas da felicidade genuína e de nossa vulnerabilidade ao sofrimento. Métodos específicos para contrabalançar os desequilíbrios conativos foram desenvolvidos por diversas tradições psicológicas e contemplativas tanto para pessoas com visão de mundo secular como teísta e não teísta. Desequilíbrios de atenção Ninguém que sofra de sérios desequilíbrios de atenção pode ser considerado psicologicamente saudável. A atenção deficiente é caracterizada pela incapacidade da pessoa se concentrar num determinado objeto. A mente se retira e se distancia até mesmo de seus próprios processos internos. A atenção hiperativa ocorre quando a
  • 23. mente é excessivamente estimulada, resultando em distração e fragmentação compulsivas. E a disfunção da atenção ocorre quando nos centramos nas coisas de maneira ansiosa, que não conduz nem ao nosso próprio bem-estar nem ao de outros. Por exemplo, uma pessoa que sofre de compulsão sexual só vê os outros como objetos sexuais e um vendedor pode se envolver mentalmente com outros apenas como possíveis compradores. Nesses casos, a mente está propensa tanto aos desequilíbrios de atenção como aos de conação, que comumente andam de mãos dadas. A atenção deficiente se aproxima do conceito budista de lassidão e a atenção hiperativa corresponde ao de agitação. Esses desequilíbrios podem ser sanados pela prática da atenção – a capacidade de manter voluntariamente a atenção focada num objeto familiar, sem descuido ou distração; e da meta-atenção – a capacidade de monitorar a qualidade da atenção, percebendo rapidamente quando ela sucumbiu ou à agitação ou à lassidão. Shântideva ressaltou a importância da capacidade de atenção para a satisfação psicológica: “Pelo aumento dessa disposição, a pessoa consegue estabilizar a mente em concentração meditativa, uma vez que com a mente dispersa, ela vive entre as garras de suas aflições mentais”.[15] Enquanto os praticantes de meditação budistas identificaram e aprenderam a restaurar esses desequilíbrios da atenção, os mesmos problemas foram objeto de interesse de todas as tradições contemplativas do mundo. Um meditador cristão ortodoxo do Oriente escreveu: “Observando atentamente o próprio coração, aumentando a consciência de si mesmo, o aspirante
  • 24. alcança a nepsis (‘sobriedade’ ou ‘vigilância’) e a diakrisis (‘discernimento’ ou ‘discriminação’, a capacidade para distinguir os pensamentos positivos dos negativos)”.[16] E Joseph Maréchal segue na mesma linha ao escrever: Não se pode chegar à contemplação sem uma atenção prolongada, pelo menos por alguns instantes; então a atenção atua sobre os elementos psicológicos à maneira dos polos de um magneto, que são limalhas de ferro imantadas. É possível que a característica da contemplação seja mais uma profunda orientação do ser humano numa intuição ou voltada para uma intuição? [17] Desequilíbrios cognitivos Uma pessoa que sofre de um grave desequilíbrio cognitivo está radicalmente dissociada da realidade e é, em geral, diagnosticada como vítima de alguma espécie de psicose. Em geral, as pessoas normais também propendem a desequilíbrios cognitivos, que constituem a origem de muitos distúrbios mentais. Esses desequilíbrios são frequentemente considerados como inerentes à natureza humana, mas essa é uma suposição à espera de ser desafiada por estudos empíricos rigorosos. Prosseguindo a análise dos três tipos de desequilíbrio, a deficiência cognitiva é caracterizada pela incapacidade de perceber o que está presente nos cinco campos da experiência sensorial e na mente. Quando nos encontramos dissociados do que está ocorrendo tanto à nossa volta como em nosso interior, estamos sofrendo do distúrbio da deficiência cognitiva. A hiperatividade cognitiva entra em ação quando confundimos nossas projeções conceituais com a verdadeira percepção –
  • 25. quando não conseguimos distinguir as realidades percebidas das suposições e fantasias sobrepostas. Os psicóticos fazem isso de formas extremadas, enquanto as pessoas normais são mais prudentes, mas a maioria de nós encontra-se no mesmo espectro da hiperatividade cognitiva, o que resulta em sofrimento mental desnecessário. Finalmente, a disfunção cognitiva ocorre quando compreendemos mal as coisas, por alguma falha ou em nossos sentidos físicos ou em nossa capacidade para interpretar o que está acontecendo. Superar esse desequilíbrio cognitivo é um dos propósitos mais importantes da prática budista e, para isso, uma das principais intervenções é o cultivo da percepção atenta. O primeiro desafio consiste em aprender a dar atenção apenas ao que está sendo apresentado aos nossos sentidos e aos nossos processos mentais internos. Para isso, Buda propôs o seguinte ideal: “No que é visto existe apenas o que é visto: no que é ouvido, existe apenas o que é ouvido; no que é sentido, existe apenas o que é sentido; no que é percebido, existe apenas o que é percebido”.[18] Em seus desdobramentos sobre essa questão, o budismo dá instruções detalhadas sobre como aplicar a atenção a nossa própria presença física e mental no mundo, a relação com os outros seres e com o ambiente inanimado. Existe um volume crescente de pesquisas científicas explorando os efeitos terapêuticos dessa prática de atenção, grande parte delas inspirada pela obra de Jon Kabat-Zinn e seu extremamente bem- sucedido programa de redução do stress com base nessa prática.
  • 26. Desequilíbrios afetivos Esses desequilíbrios costumam ocorrer em decorrência de desequilíbrios de conação, atenção e cognição e podem ser classificados como de três tipos. A deficiência afetiva apresenta-se em sintomas como de apatia emocional e uma sensação de fria indiferença para com os outros. A hiperatividade afetiva é caracterizada pela alternância entre entusiasmo e depressão, esperança e medo, adulação e desprezo, desejo obsessivo e hostilidade. A disfunção afetiva ocorre quando as reações emocionais são inapropriadas para as circunstâncias, como comprazer-se com a desgraça alheia. Psicólogos e praticantes de meditação de todo o mundo criaram uma ampla variedade de intervenções para sanar esses desequilíbrios, algumas delas aplicáveis à sociedade em geral, outras inseridas em visões de mundo religiosas. Uma abordagem constituída de quatro intervenções extraída do budismo tem profundidade espiritual sem necessidade de vínculo com qualquer sistema de crenças em particular. A essência dessa prática é curar a compulsão com amabilidade, a distância indiferente com compaixão, a depressão com alegria empática e o preconceito pessoal com equanimidade. O efeito geral dos quatro desequilíbrios mentais acima mencionados é a constante insatisfação, que só é aliviada superficialmente nos momentos de entrega a estímulos mentais e sensoriais prazerosos ou pelo uso de drogas que alteram o cérebro. Com pouca fé em seus próprios recursos internos para a felicidade genuína, muitas pessoas tornam-se dependentes de estímulos prazerosos ou de supressores químicos da insatisfação,
  • 27. mas assim que esses estímulos são removidos, desaparece a sensação de bem-estar. Da perspectiva da ciência contemplativa, o primeiro propósito pragmático da psicologia é explorar os estados da psique para identificar quais levam à perpetuação do sofrimento e quais levam à felicidade genuína. Assim como trocar o uso de combustíveis fósseis por energia solar, nós temos a oportunidade de nos afastar da dependência obsessiva de estímulos prazerosos e adotar o cultivo da perfeita saúde mental como base da felicidade. Uma hipótese fundamental por trás dessa busca é que em termos de natureza humana, nosso estado habitual é marcado pela angústia e sofrimento, mas nosso potencial é para a saúde e a satisfação. O desequilíbrio não é inerente a nossa mente, mas causado pelo hábito e, portanto, por meio de um esforço apropriado e contínuo, os desequilíbrios podem ser sanados, resultando num estado de bem-estar que não depende de estímulos sensoriais, químicos, intelectuais ou estéticos prazerosos. Esta é uma área na qual a ciência e todas as tradições contemplativas podem colaborar em benefício de todo mundo. Existe uma profunda complementaridade entre as abordagens científica e contemplativa ao estudo da psique. As ciências comportamentais, a psicologia e a neurociência lançaram luz sobre os processos cognitivos que nos permitiram sobreviver, reproduzir e ter a experiência do bem-estar hedonista. As tradições contemplativas mostram como podemos encontrar a felicidade genuína, ou o bem-estar eudemônico, e explorar as dimensões espirituais de nossa existência. O bem-estar hedonista e o eudemônico não costumam se
  • 28. opor um ao outro. Pelo contrário, sem o bem-estar hedonista, incluindo a boa saúde e comida suficiente, roupa e abrigo, é difícil embora não impossível se alcançar o bem-estar eudemônico. Da mesma maneira, quanto mais cultivamos a felicidade genuína que vem de dentro, mais conseguimos valorizar os simples prazeres da vida. Apesar de o bem-estar hedonista não ter valor intrínseco ou duradouro, ele pode ajudar na busca de uma vida plena de sentido, integrando a felicidade genuína, a verdade e a virtude. AS ORIGENS DA PSIQUE Os cientistas cognitivos contemporâneos, por limitarem suas pesquisas a comportamentos, atividade cerebral e relatos subjetivos de pessoas normais e subnormais, fizeram fortes suposições a respeito das origens da psique: existe um amplo consenso quanto aos processos mentais não serem nada mais do que funções ou propriedades do cérebro. E enquanto a pesquisa científica se confinar a esses limites, é improvável que surjam evidências capazes de desafiar seriamente esse consenso. Os métodos científicos com base em pressupostos materialistas aplicados ao estudo da mente provavelmente só servem para reforçá-los. Mas a filosofia e a ciência ocidentais nem sempre adotaram essa atitude. Pitágoras (570-495 a.C.), o mais célebre dos filósofos pré-socráticos, que supostamente cunhou o termo “filosofia”, fundou uma comunidade contemplativa no sul da Itália que era tanto religiosa como científica, com uma forte ênfase na matemática. Seu principal objetivo era o cultivo da santidade por meio
  • 29. da purificação do corpo e da mente. Na visão dele, o homem que se dedica a tal purificação é o “verdadeiro filósofo”, aquele que “contempla” (theorein), e o melhor de todos os métodos de purificação é a ciência. Pitágoras é amplamente conhecido por sua teoria da metempsicose ou reencarnação, segundo a qual a alma é imortal e renasce tanto em forma humana quanto animal. Essa visão é considerada uma descoberta empírica baseada em sua própria experiência de recordar até vinte vidas passadas tanto dele mesmo como de outros. As primeiras e mais antigas versões de sua vida concordam em descrever Pitágoras como um fazedor de milagres e a Sociedade Pitagórica como a mais importante escola científica da Grécia Antiga. No diálogo Fedro de Platão, Sócrates aborda essa questão, começando por comentar que, de acordo com a visão popular, a alma se dispersa e se desfaz com a morte.[19] Mas a verdade, ele diz, que é conhecida apenas por aqueles que praticaram a filosofia, está longe disso. A alma do filósofo, tendo “praticado a morte” pelo domínio dos impulsos e apetites físicos, “parte para um lugar que é, como ela mesma, invisível, divino, imortal e sábio, onde, ao chegar, a felicidade a espera e a liberta de... todos... os males humanos”.[20] Mas as almas daqueles que não praticaram a filosofia, estando permeadas pelo corpóreo, tornam-se espíritos errantes depois da morte, de maneira quase idêntica à versão budista do estado intermediário (antarâbhava) que ocorre depois da morte e antes da próxima reencarnação. Finalmente, Sócrates declara: “Por causa do desejo físico, que as persegue sem cessar, elas voltam a se aprisionar de novo dentro de um corpo. E
  • 30. como era de se esperar, elas continuam presas ao mesmo tipo de caráter ou natureza que desenvolveram durante a vida”.[21] A crença na metempsicose era também comum no cristianismo primitivo. Orígenes (185-254 d.C.), amplamente reconhecido como o maior teólogo cristão depois de São Paulo e antes de Santo Agostinho, sofreu forte influência de Pitágoras e Platão. O conhecimento de Deus, ele dizia, é nato no ser humano e pode ser “lembrado” e despertado por meio de disciplinas especiais. Dessa maneira, a alma pode ascender até Deus numa longa e permanente jornada de uma vida para outra. Por meio da contemplação (theoria), a alma avança no conhecimento (gnosis) de Deus, que a transforma, segundo Platão, até tornar-se divina. Para Orígenes, assim como para Pitágoras, não havia nenhuma separação absoluta entre ciência e religião. A vida contemplativa pode ser subdividida em contemplação de Deus e contemplação da natureza e segue três estágios: a vida ativa (praktikê); a contemplação da natureza, ou “contemplação natural” (physikê); e a contemplação no sentido estrito, a visão de Deus, também chamada de “teologia” (theologia), ou “conhecimento espiritual” (gnosis).[22] Essa visão integrada da ciência e da espiritualidade foi posteriormente suprimida quando o Imperador Justiniano escreveu uma série de anátemas contra os escritos de Orígenes. No sínodo local de 543 d.C., ele ordenou ao patriarca Mennas que reunisse todos os bispos presentes em Constantinopla e os fizesse assinar os anátemas. Mas a questão estava longe de ser encerrada com a condenação dos escritos de Orígenes a respeito das
  • 31. origens da alma. Santo Agostinho tratou da questão propondo quatro hipóteses: 1) que a alma da pessoa procede da de seus pais; 2) que as almas individuais são criadas novamente a partir das condições individuais no momento da concepção; 3) que as almas existem em algum outro lugar e são enviadas por Deus para habitar corpos humanos; e 4) que as almas descem para o plano da existência humana por sua própria escolha.[23] Para Santo Agostinho, todas essas hipóteses eram compatíveis com a fé cristã. No verdadeiro espírito da filosofia, ele declarou: “É importante que nenhuma das quatro seja afirmada sem um bom fundamento”.[24] Embora muitos cristãos de hoje tenham escolhido a segunda – que as almas individuais são criadas novamente a partir das condições individuais no momento da concepção – as bases empíricas e lógicas dessa visão estão longe de ser esclarecidas. As origens da psique foram amplamente ignoradas pelos cientistas desde a época de Copérnico até o surgimento da psicologia moderna. William James, que criou o primeiro laboratório de neurociência na Universidade de Harvard nos Estados Unidos, propôs três hipóteses para explicar as origens dos processos mentais relacionados com as funções do cérebro: 1) o cérebro produz pensamentos, assim como um circuito elétrico gera luz; 2) o cérebro libera ou permite acontecimentos mentais assim como o gatilho de uma besta dispara uma flecha pela remoção do obstáculo que prende a corda; e 3) o cérebro emite pensamentos, assim como a luz atinge um prisma e, consequentemente, emite um espectro de cores.[25] Em seu tempo, como também até hoje, todas essas três hipóteses condizem com todo
  • 32. conhecimento científico a respeito das correlações mente-cérebro. James, que acreditava na terceira opção, desenvolveu sua teoria:[26] Quando finalmente o cérebro deixa totalmente de funcionar, ou se degenera, esse fluxo especial de consciência que o acompanhava desaparece totalmente deste mundo natural. Mas a esfera do ser que abastecia a consciência continua intacta; e neste mundo mais real com o qual, mesmo enquanto aqui, ela estava em interação, a consciência pode, de maneiras que desconhecemos, continuar inalterada. James especulou ainda quanto à possibilidade de o fluxo de consciência ser um fenômeno diferente do cerebral, de um tipo que interage com o cérebro enquanto ele permanece em atividade, absorvendo e retendo a identidade, a personalidade e as memórias que fazem parte dessa interação, e continuar sem o cérebro. Apesar de James continuar sendo amplamente respeitado entre os cientistas cognitivos contemporâneos, as ideias dele a respeito das origens e da natureza da consciência são em geral ignoradas ou rejeitadas. A maioria dos psicólogos e neurocientistas refuta categoricamente qualquer espécie de dualismo com base no argumento de que não existe nenhuma evidência da existência de qualquer fenômeno mental subjetivo separado das funções e propriedades do cérebro. Mas enquanto os cientistas cognitivos confinarem seus estudos a comportamento, função do cérebro e relatos subjetivos de sujeitos normais e patológicos, eles terão poucas chances de descobrirem evidências que possam mostrar o contrário. Um estudioso que desafiou cientificamente essas visões é Ian Stevenson, professor emérito de psiquiatria
  • 33. e ex-diretor do Departamento de Estudos da Personalidade da Universidade da Virgínia.[27] Em seu livro recente, Where Reincarnation and Biology Intersect, ele sumariza trinta anos de estudos de relatos de crianças supostamente recordando lembranças precisas de pessoas e acontecimentos específicos de suas vidas passadas. Esse livro, escrito para o grande público, consiste basicamente num resumo de seus estudos, dos quais os fundamentos científicos são detalhados em sua compacta obra em dois volumes Reincarnation and Biology: A Contribution to the Etiology of Birthmarks and Birth Defects. A obra de Stevenson provê algumas das evidências científicas mais sólidas para desafiar as hipóteses materialistas sobre as origens da psique, mas passou amplamente despercebida pela comunidade científica.[28] Essa recusa a examinar as evidências empíricas que contrariam as crenças em geral tem sido mais associada a crentes religiosos do que a cientistas. O físico Richard Feynman expressa claramente os ideais científicos do ceticismo e do empirismo: “Os pesquisadores buscam com mais diligência, e dedicam mais esforço, exatamente naqueles lugares em que é maior a probabilidade de nossas teorias se provarem erradas. Em outras palavras, estamos tentando provar o mais rápido possível que estamos errados, porque só assim podemos avançar”.[29] Lamentavelmente, os cientistas cognitivos atuais não parecem dispostos a procurar naqueles lugares em que se possa provar que suas teorias materialistas estejam equivocadas. Enquanto suas pesquisas se ativerem às origens da psique, eles continuarão visando unicamente a investigações que
  • 34. venham reforçar suas crenças. Se quisermos encontrar alternativas viáveis à ortodoxia científica, teremos que sair da ciência contemporânea para examinarmos as tradições contemplativas do mundo. Volto-me agora para uma hipótese budista baseada na prática contemplativa e que está de acordo com tudo que se conhece atualmente sobre as correlações cérebro-mente. A Consciência-Substrato Para descobrir as origens de qualquer fenômeno natural, os cientistas criaram métodos rigorosos que permitem observar o próprio fenômeno, realizando experimentos sobre ele sempre que possível. Essa conduta tem se mostrado legítima para a exploração das origens de todos os tipos de objetos, desde as células, com as quais se pode fazer experimentos, até as estrelas, que podem ser observadas, mas não manipuladas no decorrer dos experimentos. O mesmo vale para a psique. Para desvendar suas origens, temos que criar métodos sofisticados que permitam observar e fazer experiências sobre os estados de consciência. Não basta observar e realizar experimentos sobre seus correlatos neurais e comportamentais e, enquanto a ciência cognitiva restringir sua pesquisa a esses aspectos, ela não poderá evitar a conclusão de que a consciência resulta unicamente dos processos materiais que estão sendo investigados. Essa não é uma descoberta lógica nem empírica, mas apenas uma conclusão inevitável baseada numa metodologia aplicada ao exame de processos mentais subjetivos e qualitativos da mesma maneira com que se examina processos físicos objetivos e quantitativos.
  • 35. Em decorrência dessa orientação, os cientistas cognitivos veem-se diante de uma “lacuna explicativa”: como é possível que os padrões de atividade neural ou produzam os processos mentais subjetivos ou sejam equivalentes a eles? Deve haver tipos de atividade neural que contribuem causalmente para o surgimento de estados específicos de consciência e de atividade mental. Vamos atribuir à causalidade a seguinte definição fenomenológica: se B segue A, e B não ocorre na ausência de A, então A exerce uma influência causal sobre B. Nenhum mecanismo físico é forçosamente necessário para que ocorra uma relação causal, conforme amplamente demonstrado pelos fenômenos eletromagnéticos e pela mecânica quântica. O filósofo John Searle argumenta que uma atividade neuronal de “ordem inferior” “causa” processos mentais, enquanto padrões neuronais de “ordem superior” são equivalentes a processos mentais.[30] Esteja ele certo ou não, alguns tipos de ativação neuronal prévia são certamente necessários para a geração de subsequentes processos mentais específicos. Mas como aqueles processos neurais precedem seus resultantes acontecimentos mentais, eles não podem ser considerados como seus equivalentes. Poderia haver uma identidade apenas entre os processos neuronais e mentais que ocorrem simultaneamente. Com respeito a uma relação causal entre acontecimentos neurais e mentais, deparamos com o “difícil problema” de David Chalmers:[31] o que há nesses processos neuronais, diferentemente de tantos outros acontecimentos eletroquímicos, que lhes permite produzir toda uma gama de experiências mentais
  • 36. subjetivas? Aqui há uma grave lacuna explicativa. Entretanto, se certos processos neuronais são equivalentes a seus concorrentes processos mentais, o que permite que eles assumam essa natureza dual: processos neuronais objetivos, que podem ser perfeitamente entendidos em termos de física, química e biologia; e processos mentais subjetivos que não são detectáveis pelo uso de instrumentos de medição dessas disciplinas, mas são diretamente observáveis pela experiência da perspectiva da primeira pessoa? É como se esses processos neuronais concorrentes tivessem uma vida secreta que é ocultada da medição científica da perspectiva da terceira pessoa: eles são simultaneamente acontecimentos neurais objetivamente perceptíveis e processos mentais subjetivos objetivamente invisíveis. Um fato simples que dificilmente é reconhecido tanto pelos cientistas cognitivos como pelos filósofos da mente é que os acontecimentos mentais podem ser observados diretamente. Mas como reconhece James, “A introspecção é difícil e falível; e... a dificuldade é simplesmente a de qualquer observação seja de que tipo for”.[32] De importância crucial para se fazer observações rigorosas dos fenômenos mentais é o cultivo da atenção deliberadamente focada e vívida, que os budistas chamam de samâdhi. Essa atenção focada é para a investigação científica dos fenômenos mentais o que o telescópio é para a investigação científica dos fenômenos celestes.[33] Segundo os praticantes de meditação budistas, aquele que alcança o nível superior de samâdhi conhecido como shamatha, ou quietude meditativa, tem acesso por meio da experiência ao
  • 37. relativo estado natural da consciência conhecido pela corrente Grande Perfeição (Dzogchen) do budismo tibetano como “consciência-substrato”(âlayavijnâna). Segundo eles, é desse fluxo de consciência que emergem a psique e todos os sentidos físicos. De acordo com suas descobertas, a psique é condicionada pelo corpo e sua interação física com o ambiente circundante, mas emerge da consciência-substrato.[34] Essa visão se mostra coerente com as hipóteses de Pitágoras, Sócrates, Orígenes, Santo Agostinho e William James e também com tudo que se conhece atualmente sobre as interações mente-cérebro. Mas é também onde todas as visões contemplativas divergem fundamentalmente das crenças da maioria dos cientistas cognitivos contemporâneos. O que o budismo traz para esse confronto de visões de mundo é um método prático para testar a hipótese pela experiência na primeira pessoa, por meio do refinamento da atenção e do apaziguamento da mente de maneiras totalmente desconhecidas da ciência moderna. Uma vantagem da prática de shamatha está no fato de ela não requerer submissão a nenhuma religião ou crença filosófica. Entretanto, ela pode servir de elo entre os métodos científicos e contemplativos de exploração da mente. As pessoas que alcançam esse grau excepcional de equilíbrio da atenção dizem que os pensamentos racionais adormecem e todas as formas aparentes de si mesmo, dos outros, de seu corpo e do ambiente circundante desaparecem. Nesse ponto, como nos estados de sono e de morte, a mente se volta para dentro e os sentidos físicos adormecem. Segundo relatos de meditadores tibetanos, o que permanece é um estado
  • 38. de consciência clara e radiante, que constitui a base para que todas as manifestações acorram ao fluxo mental da pessoa. Todos os fenômenos que surgem para a percepção sensorial e mental estão imbuídos da luminosidade própria dessa consciência-substrato. Assim como os reflexos dos planetas e das estrelas numa piscina de água límpida e cristalina são as manifestações de todo o mundo fenomênico nesse estado vazio e límpido da psique. Düdjom Lingpa (1835-1904), mestre Dzogchen da ordem Nyingma do budismo tibetano, escreveu: “A consciência-substrato, com sua natureza vazia e cristalina, permanece como a causa de tudo que é emanado. A psique que emana da consciência- substrato apresenta formas, que são estabilizadas pelo fluxo contínuo da consciência.”[35] De acordo com a experiência desses meditadores, há um princípio de preservação da consciência que se manifesta em todos os momentos da experiência. Os componentes materiais do cérebro, como neurônios e processos eletroquímicos, não se transformam em fenômenos mentais imateriais, como sonhos e alucinações. Nenhum padrão de acontecimento neuronal torna-se de fato um acontecimento mental. Mas os fenômenos mentais tampouco emergem do nada. Mais propriamente, essa consciência-substrato vazia e radiante transforma-se em imagens mentais, pensamentos racionais, percepções, emoções etc. No decorrer de uma vida humana, esses acontecimentos mentais são condicionados pelo cérebro e pelo entorno, mas emergem dessa consciência- substrato e voltam a se dissolver nela. Da mesma maneira, esses acontecimentos mentais influenciam o
  • 39. cérebro, o corpo e o meio físico, mas não se transformam em fenômenos físicos. Em resumo, da perspectiva budista, o “difícil problema” de como o cérebro produz experiência mental subjetiva é um falso problema, uma vez que, na realidade, essa experiência provém da consciência-substrato. E a lacuna explicativa na demonstração de como certos tipos de atividade neural podem ser equivalentes aos acontecimentos mentais é intransponível, uma vez que os acontecimentos neurais e mentais jamais são idênticos. A consciência-substrato pode ser caracterizada como um estado relativamente vazio, desprovido de toda “energia cinética” dos pensamentos, das imagens mentais e das percepções sensoriais. Falando de modo geral, ela é indiscernível enquanto a mente está ativa; ela normalmente se manifesta apenas nos estados de sono sem sonhos e na morte. Embora essa consciência- substrato seja descrita como o estado natural e livre da mente, o brilho e a pureza que lhe são próprios estão presentes mesmo quando a mente encontra-se obscurecida por emoções e pensamentos aflitivos. Quando em repouso, ela é luminosa e vazia, mas quando catalisada por pensamentos ou estímulos sensoriais, sua “energia potencial” se transforma em “energia cinética” da psique, manifestando todos os tipos de atividade mental e sensorial. Essa dimensão da consciência individual transcende as qualidades e limitações específicas da história pessoal nesta vida, neste gênero e mesmo nesta espécie, e esse substrato é subjacente a todas as formas de consciência, humanas e não humanas.[36] Uma vez que a mente do praticante tenha alcançado esse luminoso e silencioso
  • 40. estado de consciência conhecido como shamatha, diz-se ser possível direcionar a atenção para o passado, trazendo à consciência lembranças claras e detalhadas de acontecimentos ocorridos anteriormente nesta vida. Então, por meio de um rigoroso treinamento, a pessoa supostamente pode recordar acontecimentos anteriores à vida atual, lembrando, como Pitágoras, de circunstâncias de vidas passadas. Essas memórias não estão armazenadas no cérebro, mas o cérebro é necessário para resgatá-las enquanto a mente permanecer corporificada. As memórias são armazenadas, por assim dizer, na corrente da consciência-substrato, que passa de uma vida para outra. Essa conclusão está baseada em experiências de meditadores altamente treinados que refinaram sua capacidade de atenção de maneiras desconhecidas para a ciência moderna. Sem o desenvolvimento desse telescópio interno – shamatha – para explorar estados profundos da consciência, as evidências científicas da reencarnação restringem-se a pesquisas de campo de estudiosos como Ian Stevenson. Embora essa descrição da consciência-substrato possa parecer uma versão budista da alma imortal, é importante observar as diferenças entre essa versão baseada na experiência e as diversas especulações filosóficas e teológicas a respeito da alma. Os praticantes que tiveram a experiência do shamatha costumam descrever essa dimensão da consciência como um fluxo de momentos de percepção que vêm e vão e que, portanto, não é uma única entidade que persiste através do tempo e tampouco é imutável. Além do mais, como
  • 41. influencia a psique e é condicionada por eventos físicos e mentais, ela não é independente. A consciência-substrato pode ser caracterizada como a natureza relativa da mente individual no sentido de que, no contexto do fluxo da mente individual, ela envolve o menor estado de atividade possível, com o maior potencial e grau possível de liberdade ou possibilidade. Por exemplo, uma vez que o fluxo de consciência de uma pessoa tenha surgido do sono sem sonhos, ele pode se manifestar livremente numa ampla diversidade de paisagens e experiências oníricas. Essa criatividade excepcional é manifestada enquanto em hipnose profunda, que também dá acesso à consciência- substrato. Mas esse potencial é acessado de maneira mais efetiva quando a pessoa penetra lucidamente na consciência-substrato por meio do shamatha, de acordo com a prática realizada por uma série de importantes tradições contemplativas do mundo. O estado de shamatha proporciona uma percepção vívida dessa dimensão da consciência, ao contrário do marasmo ou letargia que normalmente caracteriza o estado de sono sem sonhos. ESTADOS DE CONSCIÊNCIA E DE ESPAÇO DE VAZIO RELATIVO A tradição da Grande Perfeição do budismo tibetano faz uma distinção entre a consciência-substrato (âlayavijnâna) e o substrato (âlaya), que é descrito como o espaço objetivo vazio da mente e que é subjetivamente experienciado pela consciência-substrato. Esse estado de vacuidade é imaterial, como o espaço, um espaço em
  • 42. branco, um vazio de pensamentos no qual todas as manifestações objetivas dos sentidos físicos e da atividade mental se dissolvem quando a pessoa adormece; e é desse vácuo que as formas voltam a emergir quando ela desperta. Düdjom Lingpa explicou que quando a percepção entra no substrato: a mente comum de um ser senciente comum, como ela era, desaparece. Consequentemente, os pensamentos racionais adormecem e os pensamentos erráticos se desvanecem no espaço da percepção [...] Aderindo às experiências de vacuidade e luminosidade enquanto voltadas para dentro, as formas aparentes de si mesmo, dos outros e dos objetos desaparecem. Essa é a consciência-substrato [...] a pessoa chegou à natureza essencial da mente.[37] Essa descrição da experiência contemplativa do substrato e da consciência daquele estado profundo de luminosa vacuidade é semelhante às descrições que os físicos fazem do estado de relativa vacuidade do espaço. Em geral, o vazio é definido como o estado de menos energia possível de uma extensão de espaço, o resultado a que se chega quando tudo mais é removido. O vazio verdadeiro, ou absoluto, consiste do que restar quando tudo mais for removido de um espaço bem definido – tudo que as leis da natureza permitirem. O vazio relativo, ou falso, consiste do que restar quando tudo mais for removido de um espaço bem definido que o estado atual da tecnologia permitir. O vazio relativo tem energia e estrutura e não é perfeitamente simétrico, o que quer dizer que é internamente diferenciado. Assim como boa parte das manifestações conscientes é considerada proveniente do substrato e consiste de configurações desse espaço interno da mente, também
  • 43. todas as configurações de massa e energia emergem do vácuo e consistem de configurações do espaço físico. Os campos de partículas elementares não são nada mais do que agitações no espaço vazio, enquanto a massa pode ser vista como energia congelada. A luz é uma espécie de agitação no espaço vazio ou, mais precisamente, uma oscilação das grandezas de campo abstrato no espaço, não uma oscilação do próprio espaço. O físico Henning Genz explica: “Os sistemas reais são, nesse sentido, ‘agitações do vácuo’ – muito à maneira com que as ondulações superficiais de um lago são agitações da água do lago [...] O vácuo em si mesmo é informe, mas pode assumir formas específicas. Ao fazer isso, ele se torna uma realidade física, um ‘mundo real’”.[38] Apesar de a maioria dos cientistas cognitivos atuais estar convencida de que a mente não passa de uma função ou propriedade emergente da matéria, os físicos nos dizem que a matéria consiste de oscilações das grandezas imateriais abstratas no espaço. São necessárias mais pesquisas para determinar se essas abstrações realmente existem independentes no espaço objetivo ou se são artifícios subjetivos das mentes que as concebem. Alternativamente, o “mundo real” pode não ser nem totalmente objetivo nem totalmente subjetivo. A filosofia do empirismo radical de William James reflete precisamente a visão da Grande Perfeição ao rejeitar a dualidade absoluta da mente e da matéria em favor de um mundo da experiência, no qual a consciência como uma entidade, em e por si mesma, não existe; tampouco ela é uma função da matéria, porque a matéria como uma entidade, em e por si mesma, tampouco existe. De acordo com essa visão, as ideias de
  • 44. substâncias mentais e físicas são construtos conceituais, como também a distinção metafísica entre sujeito e objeto. Mente e matéria são construtos, enquanto a experiência verdadeira é primordial. Estados de Consciência e de Espaço de Vazio Absoluto Ao contrário da consciência-substrato, que pode ser considerada o estado natural relativo da mente, de acordo com a Grande Perfeição, a consciência primordial (jnâna) é caracterizada como o estado natural absoluto da consciência. Esse estado de perfeita simetria – internamente indiferenciado em termos de todo e qualquer conceito ou qualidade – é o mais baixo estado de atividade mental possível, com o maior potencial e grau de liberdade possível. Enquanto a consciência- substrato está ciente do substrato – o relativo espaço interno da mente – a consciência primordial está indivisivelmente ciente do espaço absoluto dos fenômenos (dharmadhâtu), que transcende a dualidade dos espaços interno e externo. Todos os fenômenos que compõem nossos mundos intersubjetivos da experiência – manifestações dos espaços interno e externo, tempo, matéria e consciência – emergem desse espaço absoluto e consistem de nada mais que suas configurações. No vácuo relativo e limitado do substrato, como no caso do sono profundo, os acontecimentos mentais específicos a um determinado indivíduo emergem e voltam a se dissolver naquele espaço subjetivo da consciência. Mas todos os fenômenos no tempo e no espaço emergem e voltam a se dissolver no vácuo eterno e infinito do espaço absoluto. Enquanto o vácuo relativo do substrato
  • 45. pode ser acessado por meio do cultivo do shamatha, o espaço absoluto dos fenômenos pode ser percebido apenas pelo cultivo da introvisão contemplativa (vipashyana). A percepção do espaço absoluto pela consciência primordial transcende todas as distinções de sujeito e objeto, mente e matéria, na verdade, todas as palavras e conceitos. Essa percepção não envolve o encontro de um modo subjetivo de consciência com um espaço subjetivo, mas é antes a percepção não dual da unidade intrínseca do espaço absoluto e da consciência primordial. Eles são simultâneos, não localizados no espaço e no tempo. Enquanto o espaço absoluto é a natureza fundamental do mundo apreendido pela experiência, a consciência primordial é a natureza fundamental da mente que apreende o mundo. Mas como os dois sempre foram da mesma natureza, a visão da Grande Perfeição não é a do idealismo filosófico, do dualismo nem do materialismo. Todas essas distinções, como entre sujeito e objeto e mente e matéria, são consideradas meros artifícios conceituais. A indivisibilidade do espaço absoluto e da consciência primordial é a Grande Perfeição, muitas vezes referida como o “mesmo sabor” de todos os fenômenos. No plano relativo, a consciência-substrato é diferente do substrato e é internamente caracterizada por experiências distintas de felicidade, luminosidade e ausência de conceitos. A experiência dela só ocorre quando a mente se afasta do mundo exterior, e é determinada pelo tempo e pela causalidade – específica a um determinado indivíduo. A unidade do espaço absoluto e da consciência primordial, por outro lado,
  • 46. também está imbuída das qualidades de felicidade, luminosidade e ausência de conceitos, não presentes como atributos distintos, mas como uma unidade inefável. Esse vácuo absoluto é adentrado quando se permite que a consciência repouse num estado de não dualidade, aberta para todo o universo. Desprovido de qualquer estrutura interna, ele contém uma única simetria absoluta que transcende a relatividade do espaço, do tempo, da mente e da matéria. Existem também diferenças importantes entre os efeitos percebidos por meio da experiência da consciência-substrato e da consciência primordial. Quando a pessoa alcança a experiência da consciência- substrato por meio do shamatha, as preocupações mentais são suprimidas apenas temporariamente, mas diz-se que, pela experiência da consciência primordial, todas as preocupações e obscurecimentos mentais podem ser eliminados para sempre. Igualmente, o sentimento de felicidade paradisíaca de quem descansa no estado natural relativo da consciência é limitado e transitório, enquanto esse sentimento de plenitude além das palavras, inerente ao estado natural absoluto da consciência primordial, é ilimitado e eterno. Pelo acesso à consciência-substrato, a pessoa percebe a natureza relativa da consciência individual, mas pela experiência da consciência primordial, a dimensão da percepção torna-se ilimitada. Igualmente, o potencial criativo da consciência que é acessado por meio do shamatha é limitado, enquanto o potencial acessado por meio da suprema introvisão contemplativa supostamente não conhece limites.
  • 47. Considera-se a consciência primordial como a causa última da felicidade genuína, a verdade última que liberta a mente de todas as aflições e obscurecimentos, como também a causa última de todas as virtudes. É nessa dimensão da consciência que têm origem nossos desejos mais profundos de felicidade, verdade e virtude. Essa dimensão é o alfa e o ômega de uma existência plena de sentido, a origem última da sabedoria e da compaixão. Considera-se que a percepção da consciência primordial, quando baseada na prévia prática do shamatha, permite que recursos internos ilimitados sejam acessados por diferentes tipos de percepção extrassensorial e fenômenos paranormais. Entre esses fenômenos, estão incluídos a visão remota ou clarividência, o conhecimento do que se passa na mente de outros, a precognição e outros poderes paranormais, como o controle mental de fenômenos físicos. Entre os exemplos, estão incluídos a capacidade de transpor objetos sólidos, caminhar sobre as águas, controlar mentalmente o fogo, voar e multiplicar e transformar à vontade objetos físicos pela força da mente. Embora os relatos desses poderes aparentemente milagrosos e sobrenaturais sejam comuns nos anais das tradições contemplativas do mundo, a visão remota e a precognição foram também estudadas por pesquisadores modernos como o físico Russel Targ.[39] O poder da mente para influenciar objetos físicos tem sido estudado por R. G. Jahn no Princeton Engineering Anomalies Research Laboratory, mas as descobertas desses pesquisadores têm sido amplamente ignoradas pela comunidade científica. Isso pode em parte se dever aos resultados inconclusivos e à natureza inerentemente
  • 48. conservadora da comunidade científica, especialmente com respeito a descobertas que supostamente solapariam as bases dos pressupostos da visão de mundo científica. As pesquisas de Stevenson, Targ e Jahn são como estudar as partículas elementares de alta energia pela observação daquelas que são ocasional e imprevisivelmente produzidas na natureza, enquanto o cultivo da concentração em estados profundos de meditação, ou samâdhi, é como construir um acelerador de partículas para se observar as partículas de alta energia em laboratório. Os muitos laboratórios de ciências cognitivas existentes para examinar o cérebro e seus comportamentos podem ser complementados com laboratórios de investigações contemplativas, criados especificamente para gerar estados refinados de consciência de “alta energia” e usá-los para explorar os potenciais da consciência e seu papel no mundo natural. Assim como a mecânica e a engenharia clássicas são úteis para a solução de problemas não relativistas, as ciências cognitivas atuais são úteis para dar respostas a questões relativas aos estados de consciência normais e subnormais. Mas algumas das suposições básicas da física clássica jamais foram verdadeiras e algumas das suposições materialistas da ciência cognitiva clássica podem igualmente se provar não verdadeiras quando estados excepcionais de consciência são alcançados sob condições controladas e estudadas com rigor científico. A descrição budista do espaço absoluto dos fenômenos tem algumas semelhanças com o vácuo absoluto, ou verdadeiro, da física moderna. Em 1973, Edward Tyron formulou a teoria de que o universo é uma
  • 49. flutuação gigantesca do vácuo, cujo total de energia é igual ou próximo de zero. Conforme explica Genz: “Se seu total de energia é igual ou próximo de zero, ele pode ter se originado como uma flutuação espontânea do vácuo. Poderíamos imaginar algo próximo a uma anulação ocorrendo entre o potencial de energias negativas de todas as massas que se atraem mutuamente no universo e as energias do movimento (ou cinéticas) e da massa dessas configurações”.[40] O autor científico K. C. Cole explica a simetria do verdadeiro vácuo nos seguintes termos:[41] Se você pode transformar algo de maneira que a transformação não faz uma diferença perceptível, isso é simetria [...] Se algo já era perfeitamente simétrico, por mais que você tentasse alterá-lo, a mudança hipotética não teria nenhum efeito. Sem mudança, não há nenhuma percepção. Um nada perfeitamente simétrico seria um estado tão imutável que nada que você pudesse fazer faria qualquer diferença. Tanto o espaço absoluto dos fenômenos como o verdadeiro vácuo são considerados como tendo exercido um papel crucial na formação do universo como o conhecemos. Henning Genz sugere: Talvez as flutuações da mecânica quântica tenham originado não apenas a matéria da qual nosso mundo era feito antes de sua inflação, mas também o próprio espaço-tempo. Talvez o verdadeiro vácuo, o verdadeiro nada, da filosofia e da religião, devesse ser visto como um estado inteiramente livre de leis, espaço e tempo. Esse estado pode ser considerado como nada mais que um conjunto de possibilidades do que poderia ser.[42] E K. C. Cole acrescenta,
  • 50. A liberação de energia pode explicar o processo de aquecimento que provocou o big-bang. Como a água levada ao ponto de congelamento libera sua energia para seus arredores, o “congelamento” do vácuo libera enormes quantidades de energia [...]. Tão simplesmente quanto a água vira gelo, o vácuo inflado congelou-se na estrutura que deu origem aos quarks, elétrons e, finalmente, a nós.[43] Numa linha de raciocínio notavelmente semelhante, o Dalai Lama escreveu em seu livro recente sobre a Grande Perfeição:[44] Todo e qualquer estado de consciência é permeado pela luz cristalina da percepção primordial. Por mais que o gelo se solidifique, ele jamais perde sua verdadeira natureza, que é a água. Da mesma maneira, mesmo conceitos muito óbvios são tais que o “lugar” deles, por assim dizer, o lugar onde repousam, não sai fora do espaço de sua percepção primordial. Eles surgem dentro do espaço da percepção primordial e é também nele que se dissolvem. Enquanto os físicos formularam suas teorias a respeito dos vácuos verdadeiro e falso com base em experimentos físicos e análises matemáticas, os budistas formularam suas teorias a respeito dos estados de consciência verdadeiro e falso com base em experiências contemplativas e análises filosóficas. Ambas as tradições dão alta prioridade à investigação empírica e à análise racional, mas seus pontos de partida e seus métodos de observação são profundamente diferentes. A revolução científica começou com a suposição de que um Deus exterior criou o mundo antes e independentemente da consciência humana. Os físicos estabeleceram então para si mesmos a meta de apreender o universo objetivo da perspectiva do “olho de Deus” e de formular suas leis nos termos da própria linguagem de Deus, que eles
  • 51. consideravam ser a matemática. Como eles se voltaram para o domínio do espaço objetivo e seus conteúdos que existem independentemente da consciência, era totalmente natural que para eles a mente tivesse um papel apenas marginal na natureza; e suas teorias dos vácuos verdadeiro e falso em geral não fazem nenhuma referência à consciência. Na verdade, alguns defensores dessa visão mecanicista supuseram desde o início que a consciência não exerce nenhum papel significativo no universo. Como declarou o neurologista Antonio Damasio: “O conhecimento da consciência diz pouco ou nada a respeito das origens do universo, do sentido da vida e do provável destino de ambos”.[45] Tal convicção é notável à luz do fato de os neurocientistas não terem ainda descoberto a natureza ou as origens da consciência. Esses pesquisadores costumam supor que já sabem que a consciência não tem nenhuma existência separada do cérebro e que, portanto, a única questão a ser respondida é como o cérebro produz estados conscientes. Em seu livro, The Discoverers: A History of Man’s Search to Know His World and Himself, o historiador Daniel J. Boorstin chama essas suposições de “ilusões de conhecimento”. São essas ilusões, ele sugere, e não a mera ignorância, que atuaram historicamente como os maiores impedimentos ao avanço científico.[46] A importância dos estados de vacuidade do espaço físico e da consciência dificilmente pode ser superestimada. O físico John March-Russell declara: “A crença atual é que você tem que entender todas as propriedades do vácuo antes de poder entender qualquer outra coisa”.[47] Os físicos ainda não entenderam todas
  • 52. as propriedades do vácuo nem todas as leis da natureza, mas assumiram amplamente que a consciência é irrelevante para o universo que eles estão tentando entender. Enquanto o universo concebido pelos físicos existe independentemente da consciência, os budistas consideram tal universo irrelevante para o mundo da experiência humana, no qual a consciência exerce um papel crucial. Convergência com o Cristianismo Embora a revolução científica tenha sido profundamente influenciada pela crença em um Deus que existe totalmente separado de sua criação e que observa e controla o mundo de uma perspectiva absolutamente objetiva, essa não foi a única teologia defendida por devotos cristãos através dos tempos. Diferentemente da busca de uma visão da perspectiva do olho de Deus, que tanto marcou a ciência moderna, os meditadores cristãos ortodoxos do Oriente sempre defenderam uma espécie de contemplação natural que vê Deus em todas as coisas e todas as coisas em Deus para discernir a presença divina, que é inerente a todos os fenômenos naturais e que, ao mesmo tempo, os transcende. A ênfase é colocada na imanência de Deus, em vez de apenas em sua transcendência. Em vez de procurar compreender o mundo pelo uso da linguagem da matemática, aqueles meditadores cristãos procuraram conhecer Deus indo além de todos os tipos de pensamento e linguagem: [48] Como a divindade é um mistério que escapa às palavras e ao entendimento, deduz-se que em tal contemplação a mente humana tem que ir além de conceitos, palavras e imagens – acima do nível do
  • 53. pensamento racional – para apreender Deus intuitivamente pelo simples “olhar” ou “toque”. De acordo com Evágrio, a mente deve se “desnudar”, passando da multiplicidade para a unidade [...]. Nos níveis mais elevados de contemplação, a diferenciação da percepção sujeito- objeto desaparece e, em seu lugar, resta apenas um senso de unidade todo-abrangente. Em vez de considerar a visão da perspectiva do olho de Deus como absolutamente externa à mente humana, os filósofos contemplativos da tradição cristã neoplatônica, seguindo o exemplo do tradutor e filósofo cristão do século IX, John Scotus Erigena (815?-877?), viram a possibilidade de buscar Deus no interior de si mesmos. Nicolau de Cusa, que pertencia a essa tradição contemplativa, acreditava também que a face de Deus só pudesse ser conhecida pela experiência que transcende todos os conceitos, inclusive os matemáticos. Ao fazer isso, ele dizia, a pessoa pode alcançar “a visão absoluta, a origem de toda visão daqueles que veem, [que] supera toda agudeza, toda agilidade e toda capacidade de todos que veem no presente e que poderão ver no futuro”.[49] De acordo com a tradição da Grande Perfeição, a percepção dualista comum não poderia existir na ausência da consciência primordial e Nicolau de Cusa expressou uma visão similar ao dizer: “Sem a visão absoluta, não pode haver nenhuma visão contraída. A visão que é absoluta abarca em si mesma todos os modos de ver e engloba todos de maneira tal que abarca cada um, permanecendo inteiramente absoluta a cada variedade”.[50] E fez também uma outra afirmação notável que tem semelhança com a afirmação budista de que a realidade como um todo pode ser apreendida pelo
  • 54. entendimento da natureza da consciência: “Portanto, quem quer que mereça ver sua face vê todas as coisas abertamente e nada permanece oculto para tal pessoa”. [51] Na verdade, muitos dos grandes místicos cristãos, inclusive Santo Agostinho, declararam que um dos efeitos da prática contemplativa era uma percepção mais clara da natureza de Deus, da alma humana e das leis da natureza.[52] Parte das visões da natureza do mundo material alcançadas pela meditação cristã parece dar credibilidade a essa afirmação. Os fenômenos materiais que parecem formar nosso meio físico, de acordo com Nicolau de Cusa, consistem de “naturezas contraídas” e o mesmo acontece com os fenômenos mentais comuns. Esse tema parece em princípio ser notavelmente semelhante à metáfora dos estados comuns da matéria e da consciência existindo como manifestações “congeladas” da natureza última da realidade. Nicolau de Cusa seguiu essa mesma linha de raciocínio ao escrever: “O poder primordial de ser da matéria é material e, portanto, contraído e não absoluto; assim como o poder de ser sensível ou racional também é contraído e não absoluto, mas o poder absolutamente não contraído equivale ao simplesmente absoluto, ou seja, ao infinito”. [53] De acordo com a física moderna, o vácuo absoluto tem a característica singular da perfeita simetria, como também acontece com o espaço absoluto dos fenômenos, de acordo com a visão da Grande Perfeição. E Nicolau de Cusa fez o seguinte comentário: “Todas as coisas que são ditas de Deus não podem diferir em realidade por causa da suprema simplicidade de Deus”. [54] A questão última da Grande Perfeição é a não
  • 55. dualidade das dimensões relativa e absoluta da realidade, crença que parece ser partilhada por Nicolau de Cusa: “Não existe nada fora de você, mas todas as coisas em você não são nada mais que você. Mostra-me, Senhor, como a diversidade, que não existe em ti, não existe em si mesma e nem pode existir”.[55] A breve discussão acima não é obviamente conclusiva. Existem muitas diferenças importantes entre as teorias budista e cristã com respeito à consciência e entre as teorias científica e contemplativa do espaço. Mas no meio dessas diferenças doutrinárias e teóricas, pode também existir uma base comum oculta sobre a qual essas divergentes tradições acabam convergindo. Se isso é verdade, eu acredito que elas estejam convergindo quanto à verdade mais importante que pode ser alcançada e conhecida pela experiência. Essa é a verdade que gera a felicidade genuína e resulta numa vida de virtude a serviço de todos os seres. DESAFIOS A UMA CIÊNCIA CONTEMPLATIVA Um dos mais importantes desafios a serem enfrentados pela ciência contemplativa é naturalizar a consciência sem reduzi-la a uma propriedade emergente ou a uma função da matéria. Isso requer a exploração de alternativas ao dualismo cartesiano, que tem se mostrado infrutífero, e ao materialismo científico, que restringe seriamente nosso entendimento da natureza e dos potenciais da consciência. Estamos também diante do desafio de rever os fundamentos da natureza humana. Se nos baseamos unicamente na física para compreender nosso lugar na
  • 56. natureza, a existência humana é reduzida à condição de robô. Se nos baseamos apenas na biologia, somos reduzidos à condição de animais. A psicologia contemporânea vigente tem amplamente se restringido a estudar as mentes humanas normais e subnormais e definido a identidade humana dentro dessas limitações. O budismo vê a nossa existência em termos de três dimensões: a natureza humana qualificada pelo corpo humano e pela psique, e nossa natureza enquanto seres sencientes, qualificada pela consciência-substrato individual e pela consciência primordial, que transcende todas as limitações da vida humana e da existência senciente. O cristianismo afirma que o homem foi criado à imagem e semelhança de Deus, o que provê uma base ao desafio colocado por Jesus para que cada pessoa seja perfeita como o Pai no céu é perfeito. Mas ele também considera a natureza humana como pecadora e, portanto, necessitada de redenção por Cristo. Nos termos de nossa visão da realidade como um todo, argumentei que os princípios fundamentais da ciência moderna são válidos com respeito ao mundo físico objetivo destituído de percepção subjetiva enquanto são ignoradas as implicações da consciência refinada (como, por exemplo, por meio da prática de samâdhi). Esse desprezo pelo papel da consciência pode parecer insignificante, muito à maneira com que as suposições básicas da mecânica clássica parecem válidas enquanto a matéria estudada é grande e não se aproxima da velocidade da luz. Mas quando a consciência é altamente refinada, torna-se necessário falar de estados “relativos” de consciência (assim chamados porque sua relevância para o mundo físico se
  • 57. torna óbvia); as suposições materialistas atuais podem se provar falsas. O refinamento da consciência por meio da contemplação e a investigação científica das implicações de tais estados de consciência podem revolucionar explicitamente as ciências cognitivas e revolucionar implicitamente a ciência natural como um todo, a qual está grandemente baseada nos pressupostos do materialismo do século XIX. Isso irá requerer uma profunda investigação do poder causal da consciência, e especialmente dos estados relativos de consciência, no mundo natural. Isso, por sua vez, poderá gerar uma ciência do mundo da experiência que tomará o lugar de nossa atual ciência do mundo puramente objetivo, desprovido de subjetividade. Os ideais da vida contemplativa quase desapareceram no Ocidente moderno, mas não precisamos buscar fora de nossa cultura para redescobri-los. Na verdade, não precisamos ir nada além de São Tomás de Aquino, cuja influência no cristianismo ocidental dificilmente pode ser superestimada: “É requisito para o bem da comunidade humana que existam pessoas que se dediquem à vida contemplativa”.[56] O próprio propósito da civilização é a busca da felicidade genuína, da verdade e da virtude, e a vida contemplativa é inteiramente focada nesses propósitos. Acredito que era isso que São Tomás de Aquino tinha em mente quando escreveu:[57] A vida política como um todo parece estar ordenada com vista à obtenção da felicidade contemplativa. Porque a paz, que é conquistada e preservada em virtude da atividade política, coloca o homem em condições de se dedicar à contemplação da verdade.
  • 58. 2 ONDE A CIÊNCIA E A RELIGIÃO SE CHOCAM NO SISTEMA educacional norte-americano, e também na mídia em geral, a ciência é comumente apresentada como um conjunto de conhecimentos empíricos sobre o mundo natural, descoberto por pesquisadores que são implacavelmente céticos com respeito a todas as crenças e suposições não comprovadas, inclusive suas próprias. As religiões, por sua vez, são comumente apresentadas como promotoras de crenças sobre o universo e o sentido da existência humana, as quais são aceitas por seus adeptos com base na autoridade divina. Assim, a ciência e a religião parecem representar duas atitudes mentais incompatíveis e o conflito entre essas duas maneiras de ver a realidade parece inevitável. Apesar de haver alguma verdade nessa descrição, em muitos sentidos ela é equivocada e tem gerado muita confusão tanto com respeito à natureza da ciência como da religião. A ciência enquanto método de investigação tem sido um instrumento extremamente poderoso para investigar a natureza do universo e tem contribuído com conhecimentos profundos que mudaram as perspectivas e vidas humanas em todo o mundo. Mas o sucesso da abordagem científica conduziu a desdobramentos especulativos de suas descobertas para áreas da metafísica, onde não existe de fato nenhuma evidência
  • 59. experimental de qualquer espécie. Essa é a gênese do materialismo científico, que é um dogma, não uma teoria científica. A adesão inquestionável a esse sistema de crenças presta um grande desserviço à própria ciência, uma vez que gera confusão a respeito da natureza, capacidades e limitações reais da investigação científica. E é perigosa para a sociedade, porque se o estado aceita sem questionar um sistema metafísico centrado unicamente em interesses materiais, a existência humana fica empobrecida e o caminho aberto para a degradação ambiental e pessoal que é o flagelo da sociedade moderna. A visão do materialismo científico pode ser resumida nos seguintes termos: o mundo físico é a única realidade que existe. Ele é gerado totalmente por forças naturais impessoais; é desprovido de ordem ou valores morais intrínsecos; e funciona sem a intervenção de quaisquer forças espirituais imateriais, sejam elas benéficas ou não. A vida e a consciência surgiram originalmente no universo totalmente por acaso, de configurações complexas de matéria e energia. A vida em geral, e a vida humana em particular, não tem nenhum sentido, valor ou significado além do que ela própria se atribui. No decorrer de uma vida individual, todos os desejos, esperanças, intenções, sentimentos etc. – em resumo, todas as experiências e ações – são determinadas unicamente pelo corpo e por forças impessoais do meio físico que atuam sobre ela. O fim de uma vida individual resulta no desaparecimento da consciência e na completa aniquilação do indivíduo e, consequentemente, esse é também o destino de toda vida no universo: ela simplesmente desaparecerá sem deixar qualquer
  • 60. vestígio. Em resumo, o homem é fundamentalmente isolado; ele vive na fronteira de um mundo hostil, que é tão indiferente a suas esperanças quanto a seu sofrimento ou a seus crimes. Apenas pela aceitação dessa visão da existência humana e do universo em geral, os seres humanos podem viver de maneira autêntica. A ciência sempre evoluiu em estreita interação com as religiões e filosofias das culturas em que estão inseridas. A perspectiva acima está intimamente ligada à ideologia materialista de Marx, que se infiltrou na ciência por meio de figuras como a do marxista russo Aleksandr Oparin que, em 1938, publicou um livro de grande influência propondo que a vida tem origem na não vida, sugerindo um fluxo natural do inorgânico para a matéria orgânica.[58] Pode-se ver na descrição acima do universo estreitos paralelos com o existencialismo do século XX, de Sartre e Camus, como também reflexos do relativismo ético de pós-modernistas como Derrida e Foucault. Mas filosofia é filosofia. Não vamos confundi-la com ciência empírica. O materialismo científico é incompatível com todas as grandes religiões do mundo e tem sido apresentado como conhecimento científico por muitos cientistas proeminentes, entre eles Carl Sagan, Richard Feynman, Jacques Monod, Richard Dawkins, Francis Crick, Edward O. Wilson, Steven Weinberg, Stephen Jay Gould e Antonio Damasio, representando diferentes áreas da ciência. Metodologicamente, é perfeitamente razoável que a ciência adote as hipóteses de trabalho do naturalismo, ou seja, que procure entender o mundo em termos de seus agentes naturais, não sobrenaturais. As teorias
  • 61. científicas, diferentemente das ideias filosóficas e das crenças religiosas, têm que ser submetidas à observação empírica e à experimentação. Mas os materialistas científicos costumam dar o passo seguinte de promover uma visão de mundo que faz afirmações que vão além do âmbito do conhecimento científico. Contrária à posição de muitos fervorosos adeptos do materialismo científico, a crença nessa visão de mundo não é necessária para o exercício eficiente da ciência. Ela é meramente uma opinião secundária que alguns cientistas têm sobre a existência. A crença tem importância fundamental, tanto na ciência como na religião, mas ela costuma exercer um papel diferente em cada contexto. Na ciência, as crenças que são levadas para a pesquisa e o ensino funcionam como um conjunto de hipóteses de trabalho. Elas não devem ser dogmáticas, mas antes suposições que permitem aos cientistas levantarem determinadas hipóteses. Teoricamente, todas essas suposições estão sujeitas à refutação empírica. As hipóteses de trabalho podem ser adotadas para o propósito de tentar obter avanços na ciência, mas elas têm que também ser encaradas como provisórias, mesmo que algumas delas sejam consideradas “verdades”. De acordo com seus próprios critérios de ceticismo, os cientistas devem manter a mente suficientemente aberta para reconhecer que qualquer uma dessas hipóteses pode acabar sendo rejeitada. Com o passar do tempo, no entanto, as hipóteses de trabalho podem facilmente se transformar em crenças aguerridas e é aqui que entra o dogma. O termo “dogma” refere-se a uma visão de mundo coerente,
  • 62. aplicada universalmente, formada a partir de um conjunto de crenças e atitudes que exige submissão intelectual e emocional. Como tal, o dogma exerce um poder sobre os indivíduos e as comunidades que vai muito além dos meros fatos e das teorias baseadas neles. Na realidade, ele pode prevalecer apesar das evidências contrárias totalmente óbvias e a submissão a ele pode se tornar ainda mais aguerrida diante de obstáculos. Existem muitos tipos de dogma, entre eles os religiosos, filosóficos, políticos e científicos. É comum o cientista ignorar as evidências que contrariam suas hipóteses de trabalho mais fundamentais. Por toda sua ênfase no ideal de ceticismo, a ciência é conservadora e a mudança de paradigma não ocorre facilmente. Nesse sentido, o dogma pode ser concebido mais como relativo do que como absoluto. Por um lado, fazer ciência implica tomar muitas suposições como crenças, em diferentes graus. Por outro, a pesquisa científica é realizada por pessoas e, como as pessoas são governadas por diversas forças – políticas, sociais e outras –, os ideais da ciência podem ser bem diferentes do que ela de fato pratica. O DOGMA DO MATERIALISMO CIENTÍFICO Os cientistas não são mais isentos de dogmas do que os políticos, os filósofos ou os teólogos. Pode-se argumentar, entretanto, que há uma diferença sutil, porém importante, entre as crenças defendidas por cientistas e não cientistas. A grandeza e o prodígio da ciência estão no fato de ela ter se desenvolvido por doze gerações de uma maneira muito mais aberta e receptiva
  • 63. a mudanças do que cada cientista individualmente. Os cientistas são seres humanos limitados, mas a ciência enquanto método parece ir além de muitas das limitações de seus praticantes. Daí o ditado comum de que é preciso que a geração mais velha de cientistas morra para dar lugar a novas ideias, uma vez que muitas pessoas não conseguem aceitar plenamente conceitos radicalmente novos. Devido a tudo isso, pode ser que, no devido tempo, os dogmas científicos atuais acabem sendo desafiados e talvez derrubados. Isso vai, no entanto, depender de as sociedades e culturas futuras viverem por tempo suficiente e com liberdade de pesquisa suficiente para permitir que a ciência continue. A pesquisa que desafia os dogmas da ciência não depende apenas de ser tolerada, mas também incentivada. Vamos agora examinar mais de perto os princípios essenciais da ideologia do materialismo científico. Objetivismo O princípio do objetivismo requer que a ciência lide com fatos empíricos testáveis por métodos empíricos e verificáveis da perspectiva da terceira pessoa. Os fenômenos que melhor se prestam a tal investigação são universais, públicos, controláveis, repetitivos e previsíveis. Na mente de alguns adeptos do materialismo científico, a exigência do objetivismo científico pode também implicar um compromisso com a visão expressa nas palavras do biólogo social Edward O. Wilson: “Fora de nossa mente, a realidade existe de modo independente [...]. Dentro de nossa mente, ocorre a reconstituição da realidade com base na absorção sensorial e na
  • 64. organização espontânea de conceitos”[59] A tarefa própria dos cientistas, segundo ele, é colocar corretamente as representações subjetivas da realidade dentro de nossa mente de acordo com o mundo exterior objetivo. Essa visão, que tem origem na metafísica do século XVII de René Descartes, supõe que o mundo objetivo encontra-se fora do mundo subjetivo das manifestações, inclusive de todas as evidências de nossos sentidos, que são consideradas existentes apenas dentro de nossa mente. Reducionismo Conquanto existam muitos tipos de reducionismo, o “reducionismo categórico” é a tendência a reduzir algo relativamente desconhecido ou pouco entendido a uma classe de fenômenos mais conhecidos e entendidos. Apesar de esse sempre ter sido um método psicológico genérico para adquirir conhecimento do mundo, devido ao curso específico do desenvolvimento dos principais ramos da ciência natural, o reducionismo na ciência seguiu uma orientação especial. Historicamente, foram as ciências físicas que fizeram os primeiros grandes progressos e estabeleceram aquilo que se tornou conhecido como método científico e, portanto, para as gerações posteriores de biólogos era natural procurar entender os organismos vivos em termos de física. O físico Richard Feynman expôs sua visão ao declarar num curso de graduação: “Não há nada que os seres vivos façam que não possa ser entendido do ponto de vista de que eles são feitos de átomos atuando de acordo com as leis da física”.[60] Os cientistas cognitivos, por sua vez, tentam entender os processos mentais em termos dos
  • 65. mecanismos biológicos do cérebro e dos sistemas de inteligência artificial. Da mesma maneira, os estudiosos acadêmicos de religião costumam procurar explicar as experiências espirituais em termos de psicologia, medicina, economia e outros fatores não religiosos. Em nenhum lugar esse reducionismo categórico é mais comumente aplicado do que ao estudo do comportamento humano e da mente, dois dos mais misteriosos e complexos campos da pesquisa científica. O biólogo Richard Dawkins, por exemplo, afirma que os genes constituem a principal força motriz da evolução e que os seres humanos, como todos os animais, são basicamente máquinas criadas por nossos genes. Escrevendo sobre os genes como se tivessem propósitos conscientes, ele defende que eles controlam o comportamento humano, “não diretamente com seus dedos manipulando os cordões de marionetes, mas indiretamente como os programadores de computador”.4[61]No mesmo espírito do reducionismo categórico, o neurologista Antonio Damasio escreve: Muitos de nós da neurociência somos guiados por um único objetivo e uma única esperança: prover finalmente uma explicação abrangente sobre como o tipo de padrão neural que podemos atualmente descrever com os recursos da neurobiologia, de moléculas para sistemas, chega a se tornar a imagem multidimensional, integrando espaço e tempo, da experiência que temos neste exato momento.[62] Enquanto estratégia de pesquisa, o reducionismo demonstrou seu valor pragmático muitas vezes na história da ciência. Alguns cientistas adotam com cautela o reducionismo como um método que se mostrou extremamente útil em muitas áreas da pesquisa, sem
  • 66. adotá-lo como uma crença sobre a verdadeira natureza da realidade como um todo. Mas mesmo enquanto método, ele tem suas limitações. Os biólogos, por exemplo, sabem que não podem explicar coisas como comportamento animal em termos de movimentos individuais de moléculas; e os cientistas cognitivos sabem que processos mentais complexos não podem ser entendidos em termos de comportamentos de neurônios individuais. O princípio do confinamento De acordo com o princípio do confinamento, mesmo que existissem fenômenos não materiais, eles jamais exerceriam qualquer influência no universo físico. Isso porque o universo está fechado a quaisquer hipotéticas intervenções causais não físicas. Adotar esse princípio como uma hipótese de trabalho faz muito sentido quando os instrumentos de pesquisa se restringem a mensurar os fenômenos físicos. Mas as implicações desse princípio, quando elevado ao nível de verdade metafísica, são enormes, tanto em termos dos limites do conhecimento científico quanto da natureza da existência humana. Em seu livro The Blind Watchmaker, Richard Dawkins transcende o domínio legítimo da ciência quando declara: A seleção natural, o processo automático, cego e inconsciente que Darwin descobriu, e que conhecemos hoje como a explicação para a existência de todas as formas aparentemente propositais de vida, não tem nenhum propósito em mente. Ela não tem mente nem nenhuma visão mental. Ela não planeja o futuro. Não tem visão, nem previsão, absolutamente nenhuma visão. Se é possível atribuir-lhe o papel de relojoeiro da natureza, esse é o de um relojoeiro cego.[63]
  • 67. O físico Steven Weinberg comete o mesmo erro com a afirmação frequentemente citada que faz em seu livro The First Three Minutes: “Quanto mais o universo parece compreensível, mais ele também parece fora de propósito”.[64] Não é que os materialistas científicos não gostem de abordar temas metafísicos. Eles gostam, mas muitas vezes os tomam equivocadamente como conclusões científicas. Com isso, prestam um grande desserviço ao conhecimento tanto da ciência como da religião. Fisicismo O princípio do fisicismo declara que o universo consiste apenas de configurações da matéria e da energia dentro do espaço e do tempo. Para entender esse princípio, é crucial reconhecer que a matéria em questão não é aquela com a qual deparamos na experiência cotidiana. Uma pedra que seguramos na mão, por exemplo, é percebida como dotada de certa coloração, textura e peso. Mas todas essas qualidades são atributos secundários que existem, de acordo com uma linha de raciocínio que vem desde Descartes, não no mundo objetivo, mas como representações dentro de nossa mente. A matéria que constitui os alicerces básicos do universo objetivo, de acordo com o materialismo científico, é anterior e separada de todos esses atributos secundários que surgem apenas em relação com um sujeito consciente. As verdadeiras propriedades da matéria são seus atributos primários inerentes que existem independentemente de todos os modos de detecção.
  • 68. QUAL A EFICÁCIA DO MATERIALISMO CIENTÍFICO? Um dos argumentos mais comuns em defesa dos princípios do materialismo científico enquanto conhecimento científico é que eles funcionam. Ou seja, que em termos pragmáticos, eles têm se mostrado extremamente úteis. Um segundo argumento em defesa de sua validade baseia-se no fato de nunca ter-se encontrado qualquer evidência capaz de refutá-los. Se essas duas afirmações são verdadeiras, temos que levar a sério a possibilidade de a adoção desses princípios ser necessária para a realização de qualquer tipo de pesquisa científica. Vamos, portanto, agora proceder a uma avaliação do materialismo científico em termos de sua importância e validade pragmáticas. O objetivismo e as ciências cognitivas Por sua ênfase no estudo científico de fenômenos universais, públicos, controláveis, repetitivos e previsíveis, o princípio do objetivismo marginaliza tudo que é individual, privado, fora do controle, único e anômalo. Em grande parte, isso esclarece porque a mente só se tornou objeto de estudo científico três séculos após o início da revolução científica. Mas esses fenômenos, inclusive todos os tipos de processos mentais subjetivos, não são menos reais ou importantes do que os considerados pelo princípio do objetivismo. Priorizar simplesmente a realidade e a importância dos fenômenos objetivos desvaloriza a experiência subjetiva a ponto de ela ser comumente considerada um mero epifenômeno dos processos físicos objetivos “subjacentes” a ela.