1. Em pílulas
Edição em 92 tópicos da versão preliminar integral do livro de Augusto de
Franco (2011), FLUZZ: Vida humana e convivência social nos novos mundos
altamente conectados do terceiro milênio
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(Corresponde à introdução ao Capítulo 0, intitulado Tudo é fluzz)
Tudo flui como um rio.
Crátilo (c. 500 a. E. C., em um insight heraclítico, talvez)
Twiver.
200 milhões de timelines (em 2010) fluindo no twitter-river.
(A partir de 21/03/2006)
Fluzz é o Buzz que o Google não fez; e nem poderia fazer.
De uma conversa do autor com Marcelo Estraviz (2010) (1)
2. Tudo que flui é fluzz. Tudo que fluzz flui.
Tudo que flui é fluzz. Pronto. Qualquer outra definição seria diminutiva.
Qualquer outra explicação aprisionaria a imaginação criadora. Para ler este
livro é necessário soltar a imaginação que cria múltiplos sentidos. Para
escrever também (sim, esta é uma escritura de imaginação, não de
análise). Foi necessário até inventar palavra que não existe. Como disse o
poeta Manoel de Barros (pela boca do Bugre Felisdônio), “as coisas que não
existem são mais bonitas” (2).
Sim, fluzz é uma nova palavra substantiva. A substância mesmo,
entretanto, muda a cada momento. Como? Não sabemos. Então este é uma
espécie de “Livro das Ignorãças”, que vai avançando em círculos, ou em
espiral, como nós, os humanos, quando caminhamos às cegas (3). Por isso,
cada capítulo imita os anteriores e clona (no sentido grego, original, do
termo) o que já veio: do galho nasce um broto, e outro, e outro – como
filosofemas, não argumentos formais. Entrementes, porém, a imaginação
salta vôo: Manoel de Barros (novamente ele, mas agora pela sua própria
boca) diria que “todas as coisas... [aqui] já estão comprometidas com aves”
(4).
O impagável Ben Jonson havia advertido que “não se cunha uma nova
palavra sem correr um grande risco, porque, se for bem aceita, os louvores
serão moderados; se for rejeitada, o desprezo é certo”. Isso foi lembrado
por Arthur Koestler (1967), quando, no seu (extraordinário) O fantasma da
máquina, criou a palavra hólon (5). Fluzz tem algo de hólon, se deixarmos
de olhar a máquina, a estrutura fixa, e começarmos a acompanhar o
fantasma que desliza pelos seus desvãos (the ghost-in). Por isso, como ele,
vamos correr o risco. Vamos seguir o risco. Vamos voar com a ave. Vamos
fluir com o curso.
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3. Mas fluzz também é um novo adjetivo e assim será aplicado. Não se pode
dizer que uma coisa seja não-fluzz. Tudo é fluzz, em alguma medida. Mais-
fluzz, todavia, é o que está sujeito à mais-interatividade.
Mais interatividade, porém, não significa necessariamente interagir mais –
com mais freqüência, com mais pessoas – e sim estar mais aberto à
interação. O que tem mais interatividade? O que está mais vulnerável ao
outro-imprevisível.
Mais interatividade é, por isso, o que causa menos anisotropias no espaço-
tempo dos fluxos e, em conseqüência, menos deformações no campo social.
Ou seja, redes. Redes mais distribuídas do que centralizadas.
Atenção. Vai começar. Tudo que fluzz flui. Fluzz agora é verbo.
Notas
(1) Sobre a palavra fluzz. A palavra ‘fluzz’ nasceu de uma conversa informal do
autor, no início de 2010, com Marcelo Estraviz, sobre o Buzz do Google. O autor
observava que Buzz não captava adequadamente o fluxo da conversação,
argumentando que era necessário criar outro tipo de plataforma (i-based e não p-
based). Marcelo Estraviz respondeu com a interjeição ‘fluzz’, na ocasião mais como
uma brincadeira, para tentar traduzir a idéia de Buzz+fluxo. Ulteriormente a idéia
foi desenvolvida e recebeu outros significados, que não têm muito a ver com o
programa mal-sucedido do Google, como se pode ver neste livro.
(2) BARROS, Manoel (1993). “Uma didática da invenção” in O Livro das Ignorãças.
Rio de Janeiro: Record, 2004.
(3) Cf. DIAZ, Jesus (2010). Humans can only walk in circles and we don’t know
why. Gizmodo:
<http://www.npr.org/blogs/krulwich/2010/11/03/131050832/a-mystery-why-can-
t-we-walk-straight>
(4) BARROS, Manoel (1993). “Mundo pequeno” in O Livro das Ignorãças: Ed. cit.
(5) KOESTLER, Arthur (1967). O fantasma da máquina. Rio de Janeiro: Zahar,
1969.
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