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161R. de Dir. Empresarial – RDEmp | Belo Horizonte, ano 13, n. 2, p. 161-173, maio/ago. 2016
Equity crowdfunding no Brasil?
Primeiras considerações sobre realidade
econômica e disciplina jurídica
Eduardo da Silva Mattos
Advogado e Economista. Doutorando em Finanças Estratégicas pela Universidade Presbite­
riana Mackenzie. Mestre em Direito Comercial pela Universidade de São Paulo. Bacharel
em Direito pela Universidade Federal do Paraná. Bacharel em Ciências Econômicas pela
FAE Business School. Professor da FAE Business School. Curitiba, Paraná, Brasil. E-mail:
<eduardo@mosadvocacia.com.br>
Bruno Polonio Renzetti
Advogado. Mestrando em Direito e Desenvolvimento pela Escola de Direito de São Paulo da
Fundação Getúlio Vargas. Bacharel em Direito pela Universidade Federal do Paraná. Curitiba,
Paraná, Brasil. E-mail: <bprenzetti@gmail.com>
Resumo: Em que pese as pequenas e médias empresas (PME’s) representarem um grande e relevante nicho
da economia brasileira, elas enfrentam grandes problemas de sobrevivência no mercado, principalmente
por não disporem de formas economicamente viáveis de financiamento. Historicamente, o investimento de
familiares e amigos, bem como o empréstimo bancário têm se mostrado como os modos de financiamento
mais utilizados pelas PME’s. Entretanto, essa sistemática se mostra altamente problemática – seja
pela baixa capacidade financeira de amigos e parentes, seja pelos altos juros bancários cobrados. O
presente artigo indica o equity crowdfunding como nova opção de financiamento para estes pequenos
empreendimentos (mesmo sendo essa alternativa também viável para projetos de maior porte), expondo
o seu modo de funcionamento e regulação no exterior, bem como a operação desse segmento dentro do
Brasil, mesmo que sem uma regulamentação específica. A partir da experiência internacional, notadamente
nos Estados Unidos, são levantadas importantes questões quanto à regulação dessa nova modalidade
de financiamento – ou mesmo quanto à necessidade de sua regulação, levando em conta que evidências
empíricas sugerem que o modelo já opera adequadamente no Brasil sem um marco específico – a fim de
fomentar o debate do tema de modo democrático e inclusivo no país. As duas primeiras seções do artigo
tratam, respectivamente, do ambiente macroeconômico para PME’s e da definição do que exatamente é
crowdfunding. As seções seguintes tratam dos problemas regulatórios enfrentados por essa modalidade
de financiamento, dentro e fora do Brasil. A seção final conclui, trazendo também uma agenda de pesquisa
para o tema.
Palavras-chave: Equity crowdfunding. Financiamento coletivo. Regulação. Finanças de pequenas empresas.
Sumário: 1 Introdução: ambiente econômico para financiamento de pequenas empresas - 2 O que é equity
crowdfunding? - 3 Os problemas regulatórios do equity crowdfunding e as soluções adotadas fora do país -
4 A prática do financiamento coletivo empresarial no Brasil - 5 Considerações finais – Referências
162 R. de Dir. Empresarial – RDEmp | Belo Horizonte, ano 13, n. 2, p. 161-173, maio/ago. 2016
Eduardo da Silva Mattos, Bruno Polonio Renzetti
1 Introdução: ambiente econômico para financiamento de
pequenas empresas
As pequenas e microempresas (PME’s) representam um importante e cres­
cente nicho da economia brasileira. Hoje, elas já totalizam mais de 6,6 milhões,
repre­sentando cerca de 99% do total de empresas existentes no país, empregam
mais de 17 milhões de pessoas (o que representa mais da metade da população
empregada no setor privado não ligado à agricultura)1
e são responsáveis por 27%
do PIB brasileiro.2
Apesar dessa visível relevância, o ambiente de negócios não é dos mais favorá­
veis para as pequenas empresas e para as startups no Brasil.3
De especial interesse
ao presente trabalho, as opções de financiamento não se mostram economicamente
viáveis. Senão, vejamos:
A teoria financeira percebeu empiricamente que, principalmente em pequenas
empresas, o financiamento é realizado via investidores e financiadores externos,
mas vinculados a uma dinâmica relacional com o fundador da empresa, ou seja,
os investidores são pessoas com conhecimento pessoal dos sócios. Esse tipo de
financiamento é popularmente baseado em três “F’s”: family, friends and fools, além
dos recursos dos próprios fundadores.4
Em que pese essa tentativa de financiamento pessoal, deve-se notar que a
disponibilidade financeira dos fundadores, amigos e parentes em PME’s costuma
ser reduzida. Além disso, empresas em expansão precisam de recursos que, na
prática, costumam exceder sua capacidade de financiamento interno.
A alternativa que surge, então, é a obtenção de empréstimos. Isso permite à
empresa, a disposição rápida de recursos para expandir os seus negócios. Contudo,
tal opção é extremamente custosa no Brasil. Seja por uma questão histórico-estru­
tural ou econômica, os juros cobrados pelos bancos nacionais são elevadíssimos
– mais precisamente, os juros nacionais se encontram entre os mais altos do mundo
há muitos anos, sendo atualmente o segundo maior spread bancário, mais de 20
pontos percentuais acima da média mundial.5
Ademais, os juros mais baixos e de longo prazo para empréstimo somente são
subsidiados por bancos estatais, a exemplo do Banco Nacional de Desenvolvimento
1
	 SEBRAE; DIEESE. Anuário do trabalho na micro e pequena empresa – 2014. p. 29.
2
	SEBRAE. Participação das micro e pequenas empresas na economia brasileira – 2014. p. 7.
3
	 Veja-se, por exemplo, a posição do Brasil no ranking Doing Business do Banco Mundial, que avalia a qualidade
do ambiente de negócios em um país. O Brasil está na 116ª posição geral (de 189 países avaliados) e em 97º
no quesito “obtenção de crédito”. (BANCO MUNDIAL. Classificação das economias. Disponível em <http://
portugues.doingbusiness.org/rankings>. Acesso em: 12 jan. 2016).
4
	 Em português, “famílias, amigos e tolos”. Cf. SALAMA, Bruno Meyerhof. O fim da responsabilidade limitada no
Brasil. São Paulo: Malheiros, 2014. p. 275.
5
	 Vide MATTOS, Eduardo. O que a crise do subprime ensinou ao Direito? Evidências e lições do modelo concor-
rencial e regulatório brasileiro. São Paulo: Almedina, 2015. p. 146.
163R. de Dir. Empresarial – RDEmp | Belo Horizonte, ano 13, n. 2, p. 161-173, maio/ago. 2016
Equity crowdfunding no Brasil? Primeiras considerações sobre realidade econômica e disciplina jurídica
Econômico e Social – BNDES. Entretanto, os financiamentos estatais costumam ser
direcionados, cumprindo finalidades políticas para grandes empresas e nem sempre
por critérios meritocráticos6
– o que só evidencia a diferença de custos de transação
entre pequenas e grandes empresas no Brasil. Em outras palavras, “a alavancagem
é estratégia particularmente perigosa – e no caso de pequenas empresas, é de um
modo geral uma estratégia suicida”.7
Com uma opção sendo limitada e a outra sendo financeiramente custosa, qual
é a escolha fornecida às PME’s?
Na era da internet e das economias de rede, surgiu uma alternativa bastante
atrativa e de crescimento exponencial: o crowdfunding, também conhecido como
financiamento coletivo. O problema com esse tipo de arranjo é que, justamente
em razão de suas características inovadoras, ele desafia o aparato regulatório do
mercado de capitais e o necessário balanço entre a promoção do desenvolvimento
empresarial e a garantia de segurança dos investidores.
É a partir desse panorama que o Direito e a Economia – em específico, as
finanças – podem contribuir para o aprimoramento e a sobrevivência das PME’s no
Brasil. O Direito traz os instrumentos necessários para conformação e divisão de
riscos da atividade empresarial por meio da (re)organização societária, da proteção
dos direitos de investidores e sócios e da modelagem institucional, enquanto a
ciência econômica contribui com as construções acerca da estrutura de capital das
PME’s, da diversificação de investimentos, do alinhamento de incentivos, dentre
outras questões relevantes.
O presente artigo é um primeiro estudo sobre o tema do equity crowdfunding,
ou financiamento coletivo empresarial, no Brasil, apresentando seus conceitos e
como o instituto vem sendo utilizado no Brasil e fora dele. Ao final do artigo, deixa-se
em aberto várias agendas de pesquisa nesse promissor nicho.
2 	O que é equity crowdfunding?
Primeiramente, deve-se notar que a prática do crowdfunding está inserida dentro
do que se pode considerar uma nova ordem econômica e social mundial, propiciada
pela difusão da internet, chamada de “economia compartilhada” ou de “economia
colaborativa”.
6
	 Por todos, veja-se LAZZARINI, Sérgio. Capitalismo de laços: os donos do Brasil e suas conexões. Rio de
Janeiro: Campus, 2010.
7
	 SALAMA, Bruno Meyerhof. O fim da responsabilidade limitada no Brasil. São Paulo: Malheiros, 2014. p. 285. O
autor ainda ressalta que, na prática, o que se verifica é o fenômeno da seleção adversa: as empresas voltadas
para atividades mais arriscadas – e, consequentemente, com maior possibilidade de rendimento – conseguem
o acesso mais fácil ao mercado de crédito, enquanto as empresas menores, com retornos menos arriscados,
acabam ficando de fora desse mercado.
164 R. de Dir. Empresarial – RDEmp | Belo Horizonte, ano 13, n. 2, p. 161-173, maio/ago. 2016
Eduardo da Silva Mattos, Bruno Polonio Renzetti
Essa nova ordem é uma nova realidade sensível em diversos setores econômicos
(inclusive no financeiro, objeto do artigo) e engloba não somente a relação de em­
presas com consumidores – as ditas plataformas Business-to-consumer (B2C), como
é o afamado caso do Uber – mas também relações diretas entre consumidores/
usuários, como o crescente AirBnb.8
Especificamente quanto ao objeto do artigo, crowdfunding pode ser definido, a
grosso modo, como “o uso da internet para levantar recursos por meio de pequenas
contribuições de um grande número de investidores”.9
Trata-se de uma indústria de
mais de 5 bilhões de dólares por ano,10
que permite que “pequenos empreendedores,
que tradicionalmente tinham grande dificuldade em obter capital, tenham acesso a
qualquer pessoa no mundo que possua um computador, acesso à internet e alguns
trocados para investir”.11
O início desse modelo de financiamento se deu principalmente para empreen­
dimentos artísticos:12
algum artista tentava financiar determinado projeto próprio
(como o lançamento de um novo CD ou uma turnê, por exemplo) e pedia recursos
ao público. Essa operação é realizada por meio de uma plataforma online, que
intermedeia essa relação em troca de um percentual do total arrecadado pelo projeto.
O capital levantado, por sua vez, poderia se dar a título gratuito (uma efetiva doação
por quem se interessasse pelo projeto) ou então poderia haver alguma contrapar­
tida – como, por exemplo, o recebimento, por quem cedeu dinheiro ao financiamento,
de uma cópia do CD depois do lançamento, caso o projeto tenha arrecadado o volu­me
necessário.13
Percebendo o apelo que essa modalidade de financiamento trouxe ao público
– servindo até mesmo como uma ferramenta de gestão, visto que a capacidade
de captação de recursos indicava o interesse existente, pelo mercado, no produto
sendo ofertado14
– passou-se a questionar a viabilidade de, ao invés de oferecer
8
	 Por todos os livros sobre o tema, veja-se BOTSMAN, Rachel; ROGERS, Roo. What’s mine is yours: the rise of
collaborative consumption. HarperBusiness, 2010.
9
	 BRADFORD, C. Steven. Crowdfunding and the federal securities laws. Columbia Business Law Review, v. 2012,
n. 1, 2012. Tradução livre pelos autores. No original: “the use of the Internet to raise money through small
contributions from a large number of investors”
10
	 BRODERICK, Daniel. Crowdfunding’s Untapped Potential. In: Emerging Markets. FORBES. 5 de Agosto de 2014.
11
	 BRADFORD, C. Steven. Crowdfunding and the federal securities laws. Columbia Business Law Review, v. 2012,
n. 1, 2012. Tradução livre pelos autores. No original: “smaller entrepreneurs, who traditionally have had great
difficulty obtaining capital, have access to anyone in the world with a computer, Internet access, and spare cash
to invest”.
12
	 COHN, Stuart. The new crowdfunding registration exemption: good idea, bad execution. Florida Law Review, v.
64, 2012. p. 1435.
13
	 A utilização das contrapartidas domina a prática do financiamento coletivo em comparação à doação pura
e simples. Em verdade, desenvolveu-se um refinamento das contrapartidas: os empreendedores costumam
oferecer recompensas diferentes para os investidores de acordo com o montante investido – ou seja, quem
investe mais, recebe uma recompensa melhor do que quem investe menos. Cf. SCHWIENBACHER, Armin;
LARRALDE, Benjamin. Crowdfunding of Small Entrepreneurial Ventures. Disponível em: <http://ssrn.com/abs-
tract=1699183>. p. 4, 13.
14
	 Cf. SCHWIENBACHER, Armin; LARRALDE, Benjamin. Crowdfunding of Small Entrepreneurial Ventures. Disponível
em: <http://ssrn.com/abstract=1699183>. p. 5.
165R. de Dir. Empresarial – RDEmp | Belo Horizonte, ano 13, n. 2, p. 161-173, maio/ago. 2016
Equity crowdfunding no Brasil? Primeiras considerações sobre realidade econômica e disciplina jurídica
recompensas e simples contrapartidas, oferecer-se quotas (ou participação nos
resultados) da empresa (ou projeto) que estava sendo financiada. E é aqui que está
o equity crowdfunding, que indica o financiamento coletivo empresarial, pois envolve
o capital social (em inglês, equity).
Embora o crowdfunding tradicional já traga discussões relevantes de cunho
jurídico – por exemplo, se seria necessário recolher ITCMD sobre o valor recebido
como doação ou se a relação existente entre as partes seria de consumo no caso do
investimento com contrapartida –, as discussões se tornam muito mais complexas
com o equity crowdfunding, ou seja, ao envolver participações no capital social.
3	Os problemas regulatórios do equity crowdfunding e as
	 soluções adotadas fora do país
O equity crowdfunding traz, principalmente, problemas de três ordens para os
diferentes agentes envolvidos no processo de financiamento:
(i)	Problemas para os empreendedores, pois a prática do financiamento coletivo
parece se enquadrar como forma de “oferta pública” de valores mobiliários
e, consequentemente, submete os projetos às duras (e caras) disposições
do regulador de cada país;
(ii)	Problemas para os investidores, pois na falta de um claro aparato regula­
tório para a situação – e considerando a assimetria de informação entre
empreendedor e investidor –, existiria risco de fraudes. Ademais, a falta de
garantias e proteções voltadas aos investidores poderia levar a níveis sub-
ótimos de investimento ou ao afastamento das boas empresas do mercado
de financiamento coletivo (no conhecido problema de seleção adversa);15
(iii)	 E, por fim, problemas para as plataformas onlines que intermedeiam a relação
entre empreendedor e investidor, pois poderia se considerar a plataforma
como corretora, agente financeiro ou alguma outra categoria regulada.
O primeiro dos problemas se refere aos altos custos de uma empresa em se
submeter às normas do regulador de valores mobiliários. Além dos custos regula­
tórios, os custos legais e contábeis de compliance para as pequenas empresas se
tornam impraticáveis, sufocando a atividade empresarial.16
Não bastasse isso, o
15
	 Os problemas de assimetria de informação poderiam levar até mesmo ao desaparecimento ou à estatização
de determinados mercados, como bem observou George Akerloff em clássico artigo. Vide: AKERLOF, George A.
The Market for “Lemons”: Quality Uncertainty and the Market Mechanism. The Quarterly Journal of Economics,
v. 84, n. 3, ago., 1970. p. 488-500. Esse problema de seleção adversa foi analisado quanto ao caso espe-
cífico do crowdfunding em TOMBOC, Gmeleen Faye B. Lemons Problem in Crowdfunding, The John Marshall
Journal of Information Technology & Privacy Law, v. 30, 2013. p. 253-280.
16
	 POPE, Nikki. Crowdfunding microstartups: it’s time for the Securities and Exchange Commission to approve a
small offering exemption. University of Pennsylvania Journal of Business Law, v. 13, n. 4, 2010-2011. p. 981.
166 R. de Dir. Empresarial – RDEmp | Belo Horizonte, ano 13, n. 2, p. 161-173, maio/ago. 2016
Eduardo da Silva Mattos, Bruno Polonio Renzetti
Brasil enfrenta custos acima dos internacionais. Por motivos que incluem reserva
de mercado e práticas que poderiam ser caracterizadas como anticompetitivas,17
um
estudo realizado pela consultoria Oxera, encomendado pela Comissão de Valores
Mobiliários (CVM), constatou que algumas das taxas cobradas pelo mercado acio­
nário brasileiro são o dobro de taxas existentes em outros locais do mundo com
mercados de tamanho semelhante.18
O segundo problema expõe um trade-off existente para a autoridade regula­tória:
a necessidade de conciliar a proteção dos pequenos investidores quanto a fraudes,
com a necessidade de permitir a canalização da poupança privada para investi­mento
em atividades produtivas. A proteção dos investidores é, inegavelmente, um objetivo
da atuação regulatória, mas é necessário observar a que custo isso ocorre. Da
mesma forma, o acesso à informação atualmente não é tão precário quanto o era
anos atrás.19
Todas essas características devem ser levadas em conta para contornar
o problema delineado.
O terceiro problema é direcionado a um agente específico (as plataformas
de financiamento coletivo), mas é, em certa medida, o mesmo indicado acima. Os
custos (e responsabilidades) de corretores são consideráveis e isso poderia for­
necer uma barreira à entrada de novos competidores. Por outro lado, a completa
falta de regulação dessas plataformas poderia fazer proliferar o número de agentes
que buscam ganhar dinheiro somente pela intermediação, sem se preocupar com a
qualidade das empresas que estão sendo financiadas – ampliando, assim, os riscos
de fraude.
Essas situações foram enfrentadas, de uma forma ou de outra, nos Estados
Unidos.
Com o intuito de fomentar a atividade de pequenos empresários, principalmente
após os problemas econômicos advindos da crise do subprime, foi promulgado em
2012, o Jumpstart Our Business Startups Act, conhecido como JOBS Act. Uma das
previsões dessa lei (Título III) foi a de que seria regulamentado o equity crowdfunding
no país. Após discussões de cunho político e acadêmico, a comissão de valores
mobiliários dos EUA (U.S. Securities and Exchange Commission, conhecida como
SEC) aprovou, em 30 de outubro de 2015, as regras finais que regulamentam a
atuação dessa forma de financiamento (o documento é chamado de RIN3235-AL37).
17
	 Vide: MATTOS, Eduardo. Concorrência no sistema de pagamentos: condutas anticompetitivas e acesso a
câmaras de compensação como essential facility. Revista de Direito Bancário, do Mercado de Capitais e da
Arbitragem, v. 67, 2015. p. 111-132.
18
	OXERA. Introducing competition between stock exchanges: the costs and benefits. Agenda: advancing econom-
ics in business. p. 02, 03. Disponível em: <http://www.oxera.com/Oxera/media/Oxera/downloads/Agenda/
Introducing-competition-between-stock-exchanges.pdf?ext=.pdf>. Acesso em: 13 jan. 2016.
19
	 POPE, Nikki. Crowdfunding microstartups: it’s time for the Securities and Exchange Commission to approve
a small offering exemption. University of Pennsylvania Journal of Business Law, v. 13, n. 4, 2010-2011.
p. 982-984.
167R. de Dir. Empresarial – RDEmp | Belo Horizonte, ano 13, n. 2, p. 161-173, maio/ago. 2016
Equity crowdfunding no Brasil? Primeiras considerações sobre realidade econômica e disciplina jurídica
Algumas das soluções utilizadas serão enumeradas, por motivos didáticos, na
mesma ordem dos problemas colocados anteriormente nessa seção:20
(i)	Para lidar com os problemas dos altos custos, empresas pequenas estão
isentas do registro de valores mobiliários necessário para as demais. Os
valores que podem ser levantados por ano, para fins de enquadramento
na isenção, atingem um milhão de dólares. Dessa forma, permite-se que
pequenas empresas levantem uma boa quantia em dinheiro com baixos
custos. Libera-se, da mesma forma, a ampliação de empresas já existentes
via crowdfunding.
(ii)	Visando proteger os investidores, limitou-se o que cada pessoa pode investir
em empresas via crowdfunding em um ano. Esses tetos são estipulados
tanto em valores absolutos por ano, quanto em percentuais de renda anual
e de patrimônio. Ainda, os limites variam de acordo com a capacidade
financeira de cada investidor – quanto maior a capacidade financeira, maior
a liberdade de se investir via crowdfunding. Não foram feitas previsões espe­
ciais para investidores qualificados ou para investidores institucionais. O
intuito disso é duplo: (a) permitir que a eventual falência de um negócio
(cuja probabilidade é admitidamente alta para startups) não prejudique a
renda das famílias, considerando o valor relativamente ínfimo investido; e
(b) permitir que os negócios sejam efetivamente financiados por um grande
número de pessoas com pequenos valores individuais. Ainda, visando mitigar
a questão de assimetria de informação, as empresas que desejem utilizar
do financiamento via crowdfunding deverão cumprir uma série de deveres
de informação e transparência – caso contrário, alguns argumentam que o
crowdfunding poderia se tornar um fraudfunding, ou seja, financiamento de
fraudes.21
(iii) Os negócios deverão ser conduzidos por corretoras ou por “portais de finan­
ciamento”, devidamente regulamentos pela SEC e somente em meios vir­
tuais. Além disso, um emissor só poderá se utilizar de um único intermediário.
Ainda, os intermediários serão os responsáveis pela observância e fiscali­
zação dos limites de renda estipulados aos investidores (vide item “ii” logo
acima). Nesse sentido, os maiores custos e responsabilidades regulatórias
recaíram sobre o grupo dos intermediários. A saída parece razoável, consi­
derando a importância da função que esses agentes desempenham e, caso
assim não o fosse, a facilidade existente para a proliferação de plataformas
20
	 O documento integral, acompanhado de comentários acerca dos motivos de escolhas dos limites estipulados
bem como de detalhes do processo de definição regulatória, pode ser acessado no site da SEC. Veja-se:
Disponível em: <http://www.sec.gov/rules/final/2015/33-9974.pdf>. Acesso em: 13 jan. 2016.
21
	 HAZEN, Thomas Lee. Crowdfunding or Fraudfunding? Social Networks and the Securities Laws – Why the
Specially Tailored Exemption Must Be Conditioned on Meaningful Disclosure. North Carolina Law Review, v. 90,
2012. p. 1735.
168 R. de Dir. Empresarial – RDEmp | Belo Horizonte, ano 13, n. 2, p. 161-173, maio/ago. 2016
Eduardo da Silva Mattos, Bruno Polonio Renzetti
pouco preocupadas com a qualidade dos projetos financiados – que, ao final,
traria vicissitudes acentuadas de assimetria de informação e de seleção
adversa. Além disso, esse grupo parece ser o menor (em termos de número
absoluto de participantes) dentre os três listados. Assim, sob a ótica dos
custos de transação, a fiscalização pela própria SEC seria mais viável e
eficiente.
Como se pode observar, as soluções adotadas parecem adequadas para lidar
com os problemas ainda hipotéticos e balancear as necessidades de proteção de
investidores com o fomento da atividade econômica.
Ademais, evidência empírica sugere que, mesmo sem regulação, os empreen­
dimentos financiados por crowdfunding estão dando retorno aos investidores, por
mais que com um prazo de maturação maior do que o inicialmente programado.22
Isso indica que a dinâmica e os incentivos entre empreendedores e investidores
estão (naturalmente) alinhados. Por tal motivo, os projetos que estão sendo levados
adiante (ou seja, propostos pelo empreendedor e aceitos pelo investidor, visto que
os projetos que não recebem os recursos requeridos sequer saem do papel) parecem
economicamente adequados. Nesse sentido, a escolha do regulador por acompa­nhar
de perto somente os intermediários parece uma interessante estratégia de proteção
da ordem natural do mercado (gatekeeping).23
Na Europa, a discussão está um tanto mais dispersa e não tão avançada.
Apesar disso, a prática do financiamento coletivo empresarial no continente cresce
com desenvoltura e sem maiores problemas para empresas ou investidores24
–
como exemplo, veja-se que um grupo de 5500 famílias holandesas investiu em uma
empresa de energia eólica (De Windcentrale) e, como resultado do investimento,
obtiveram 16 anos de energia “gratuita”.25
22
	 MOLLICK, Ethan. The dynamics of crowdfunding: an exploratory study. Journal of Business Venturing, v. 29,
2014. p. 1-16.
23
	 Comportamentos oportunistas certamente existem. Seria o caso, por exemplo, de empresas que querem
levantar recursos mesmo sem reais intenções de ir adiante com o negócio, ou de intermediários que
queiram levantar o máximo de dinheiro possível somente pela comissão que recebem, independentemente
da qualidade e seriedade dos projetos. Nesse sentido, atribuir responsabilidades financeiras e penais aos
intermediários acaba por mitigar incentivos para comportamentos ruins deles próprios. E como projetos só
entrarão no mercado de crowdfunding caso sejam aprovados internamente pelos intermediários, as corretoras
atuam de certa forma como gatekeepers, ou seja, como intermediários que fornecem informações adequadas
ao mercado – e colocam sua reputação em risco com isso. Para maiores detalhes sobre gatekeepers,
veja-se: COFFEE JR., John C. Gatekeepers failure and reform: the challenge of fashioning relevant reforms.
Boston University Law Review, v. 84, 2004. De bibliografia nacional, veja-se: SATIRO, Francisco. Agências de
classificação de créditos e seu papel de gatekeepers. In: VON ADAMEK, Marcelo Vieira (coord.). Temas de
direito societário e empresarial contemporâneos. São Paulo: Malheiros, 2011.
24
	 Para uma revisão do desenvolvimento regulatório na Europa (e em alguns países europeus em específico),
veja-se: WEINSTEIN, Ross S. Crowdfunding in the US and Abroad: What to Expect When You’re Expecting.
Cornell International Law Journal, v. 46, 2013. p. 437-449.
25
	 REIMINK, Mariska. Crowdfunding in Dutch Small and Medium Enterprises: An empirical analysis of factors
influencing the intention to invest in a crowdfunding initiative. Dissertação de mestrado: University of Twente,
Faculdade de Administração, Twente, 2014. p. 1.
169R. de Dir. Empresarial – RDEmp | Belo Horizonte, ano 13, n. 2, p. 161-173, maio/ago. 2016
Equity crowdfunding no Brasil? Primeiras considerações sobre realidade econômica e disciplina jurídica
Pode-se citar, ainda, o exemplo da Camden Town Brewery, do Reino Unido,
empresa que produz cervejas artesanais. A cervejaria lançou no site CrowdCube
uma campanha com a meta de arrecadar um milhão e meio de libras esterlinas a
partir de investimentos feitos em equity crowdfunding. A companhia não só atingiu
o seu objetivo, como também quase duplicou a meta, arrecadando 2.75 milhões de
libras ao fim do prazo de investimento. Após essa visível aceitação do mercado, a
Camden foi adquirida pela gigante do setor AB InBev por um valor não declarado,
em dezembro de 2015, trazendo grande retorno para todos os investidores.26
Esses exemplos, somados à evidência indicada em estudos acadêmicos,
poderiam levantar até mesmo a questão da efetividade de se regular (ainda mais
com práticas do século passado) um mercado tão dinâmico, ágil e criado na era da
informação e que, atualmente, vem se desenvolvendo adequadamente.
Não há dúvidas de que a realidade trará novas questões à discussão, mas
esse parece um interessante início.
4 A prática do financiamento coletivo empresarial no Brasil
No Brasil, assim como na maioria dos países do mundo, não há um arcabouço
regulatório específico para regular a atividade de financiamento coletivo empresarial.
Contudo, a falta de uma estrutura normativa específica não impede a formação
e a operação de mercados – e, então, foram desenvolvidas algumas plataformas
de financiamento coletivo bastante interessantes.27
Para se evitar a utilização de procedimentos flagrantemente ilegais de emissão
de valores imobiliários,28
o que se fez foi encaixar o objetivo do equity crowdfunding
dentro das regras já existentes no Brasil – e sempre com consultas prévias à CVM.
Alguns caminhos diferentes foram encontrados e satisfazem, até certo ponto, o
objetivo desse tipo de financiamento.
A primeira saída posta em prática foi a de se utilizar uma exceção de registro
prevista na Resolução nº 400 da CVM. Micro e pequenas empresas – assim definidas
de acordo com a Lei Complementar nº 123/2006 – estão dispensadas de registro na
CVM, desde que cumpram alguns requisitos:
(i)	O valor ofertado ao público deve ser inferior a R$2.400.000,00 durante um
período de 12 meses (art. 5º, §4º);
26
	 DAVIES, Rob. Camden Town Brewery sold to world’s biggest drinks company. The Guardian. 21 de dezembro
de 2015.
27
	 Dentre elas, poder-se-iam citar os casos das plataformas Broota, EuSócio, EqSeed e StartMeUp.
28
	 Vide art. 2º da Resolução nº 400 da CVM (grifou-se): “Toda oferta pública de distribuição de valores mobiliários
nos mercados primário e secundário, no território brasileiro, dirigida a pessoas naturais, jurídicas, fundo ou
universalidade de direitos, residentes, domiciliados ou constituídos no Brasil, deverá ser submetida previa-
mente a registro na Comissão de Valores Mobiliários – CVM, nos termos desta Instrução”.
170 R. de Dir. Empresarial – RDEmp | Belo Horizonte, ano 13, n. 2, p. 161-173, maio/ago. 2016
Eduardo da Silva Mattos, Bruno Polonio Renzetti
(ii)	 A empresa deve comunicar a CVM, via internet, que pretende se utilizar da
dispensa de registro (art. 5º, §§5º e 6º);
(iii) 	A empresa deverá, “em linguagem simples, clara, objetiva, serena e mode­
rada, advertindo os leitores para os riscos do investimento”, fornecer ao
público informações “verdadeiras, completas, consistentes e que não indu­
zam o investidor a erro” (art. 5º, §7º, I e II);
(iv)	A empresa deverá informar que o material divulgado é publicitário. Além
disso, deve informar que aquela oferta foi dispensada de registro pela CVM e
que a comissão “não garante a veracidade das informações prestadas pelo
ofertante nem julga a sua qualidade ou a dos valores mobiliários ofertados”
(art. 5º, §8º, I e II).
As empresas emitem títulos de dívida, com remuneração definida contra­
tualmente, conversíveis em ações depois de um determinado termo. Ao final do
termo, a empresa se compromete ou a pagar aos investidores o título acrescido da
remuneração ou, então, a se tornar uma sociedade anônima e conceder a opção ao
investidor de adentrar, ou não, no quadro social. Além disso, há o risco (real) de o
negócio não vingar e o investidor perder o dinheiro colocado na atividade.
A segunda alternativa é chamada de Contrato de Investimento Coletivo (CIC).
Nela, não há a constituição de um instrumento de dívida. Os investidores compram
quotas desses CIC’s. Em troca, eles participam dos resultados da emissora e, após
um termo definido contratualmente, também receberão a opção de participar do
quadro social da empresa.29
As plataformas online que conectam empreendedores e investidores, atual­
mente, não recebem tratamento especial no Brasil. Elas são consideradas como
for­nece­doras de um serviço de tecnologia, e não intermediários financeiros.
Hoje, tampouco há limitação quanto aos valores investidos por uma única
pessoa – diferentemente do que foi definido nos Estados Unidos.
Considerando o caráter regulatório ainda incipiente – note-se a prática brasileira
de equity crowdfunding ter se desenvolvido pelos vãos regulatórios existentes –,
há muito a ser avançado e discutido. As questões apontadas acima, bem como a
experiência internacional, parecem ser pontos de partida extremamente relevantes
para conformação de uma disciplina do investimento coletivo empresarial.
29
	 As contrapartidas dos CIC’s são bastante flexíveis e definidas contratualmente. A opção de participação no
quadro social, inclusive, não é obrigação dos CIC’s. Entretanto, como a participação no quadro social é próprio
objeto do equity crowdfunding, optou-se por inserir isso na descrição de como é a prática desse financiamento
no Brasil.
171R. de Dir. Empresarial – RDEmp | Belo Horizonte, ano 13, n. 2, p. 161-173, maio/ago. 2016
Equity crowdfunding no Brasil? Primeiras considerações sobre realidade econômica e disciplina jurídica
5 Considerações finais
O presente artigo apresentou uma primeira abordagem acadêmica quanto ao
tema do equity crowdfunding no Brasil.
Como indicado acima, o caminho a ser percorrido ainda é longo e a agenda de
pesquisa é vasta. Algumas questões pujantes podem ser indicadas: qual limite de
proteção ao investidor é o mais adequado, considerando a necessidade de, por outro
lado, estimularem-se formas alternativas de financiamento empresarial em um país
com spreads bancários dentre os maiores do mundo? Será estipulado algum teto
de investimento por entidade familiar? Qual é a natureza jurídica e o enquadramento
regulatório das plataformas que intermedeiam o levantamento de recursos? Qual
é a disciplina jurídica do investimento realizado? Quem arcará com a maioria dos
custos regulatórios? Haverá algum incentivo a esse tipo de investimento pelo público,
considerando o alto grau de risco envolvido? Ou, em âmbito até mais filosófico,
esse tipo de atividade (livre e criada naturalmente em um ambiente de mercado e
de livre troca de informações) é adequadamente regulado pelo Estado, qualquer que
seja o marco regulatório?
Nos Estados Unidos, as regras implementadas passaram por um grande
pro­­ces­so de debate entre a SEC e vários dos setores interessados – corretoras,
startups, investidores e acadêmicos. A construção de um ambiente institucional
sólido, com sensível melhoria nos resultados econômicos, passa invariavelmente por
esse processo de debate democrático (legítimo, e não pro forma) entre os interesses
envol­vidos, como defende Elinor Ostrom.30
Esse parece ser um caminho adequado
para ser trilhado pela regulação brasileira.
Equity Crowdfunding In Brazil? First Impressions About Economic Reality And Legal Framework
Abstract: Even though small and medium enterprises (SME) constitute an important sector within Brazilian
economic system, they still face a fairly large amount of issues in order to survive, mainly because there
are not economic-feasible financing options for such businesses. Historically speaking, money from family e
friends, along with bank loans, have been the most common ways to finance an enterprise, but this system
is currently weary – due to financial constraints to family and friends, as well as the high interest rates
charged by banks. As a new financing option, this paper introduces equity crowdfunding as an alternative
for SME’s, explaining how it works abroad and in Brazil. Having the American experience as a benchmark,
important questions are raised about the regulation of such financing option – or even the necessity
regulation, since evidence suggests this market is operating efficiently without a specific legal framework –
in order to promote a more democratic and inclusive debate. The first two sections of the paper examine,
respectively, the macroeconomic environment for SME and the delimitations of what exactly crowdfunding
is. The following sections assess the regulatory problems of such financing alternative, abroad and in Brazil.
Finally, the last section concludes, proposing a research agenda for the theme.
Key-words: Equity crowdfunding. Regulation. Small-business finance.
30
	 OSTROM, Elinor. Governing the commons: the Evolution of Institutions for Collective Action. Cambridge:
Cambridge University Press, 1990. Capítulos 1 e 4.
172 R. de Dir. Empresarial – RDEmp | Belo Horizonte, ano 13, n. 2, p. 161-173, maio/ago. 2016
Eduardo da Silva Mattos, Bruno Polonio Renzetti
Referências
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MATTOS, Eduardo. O que a crise do subprime ensinou ao Direito? Evidências e lições do modelo
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173R. de Dir. Empresarial – RDEmp | Belo Horizonte, ano 13, n. 2, p. 161-173, maio/ago. 2016
Equity crowdfunding no Brasil? Primeiras considerações sobre realidade econômica e disciplina jurídica
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SEBRAE; DIEESE. Anuário do trabalho na micro e pequena empresa – 2014.
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Cornell International Law Journal, v. 46, 2013. p. 437-449.
Informação bibliográfica deste texto, conforme a NBR 6023:2002 da Associação
Brasileira de Normas Técnicas (ABNT):
MATTOS, Eduardo da Silva; RENZETTI, Bruno Polonio. Equity crowdfunding no
Brasil? Primeiras considerações sobre realidade econômica e disciplina jurídica.
Revista de Direito Empresarial – RDEmp, Belo Horizonte, ano 13, n. 2, p. 161-173,
maio/ago. 2016.
Recebido em: 03.03.2016
Aprovado em: 05.04.2016

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  • 1. 161R. de Dir. Empresarial – RDEmp | Belo Horizonte, ano 13, n. 2, p. 161-173, maio/ago. 2016 Equity crowdfunding no Brasil? Primeiras considerações sobre realidade econômica e disciplina jurídica Eduardo da Silva Mattos Advogado e Economista. Doutorando em Finanças Estratégicas pela Universidade Presbite­ riana Mackenzie. Mestre em Direito Comercial pela Universidade de São Paulo. Bacharel em Direito pela Universidade Federal do Paraná. Bacharel em Ciências Econômicas pela FAE Business School. Professor da FAE Business School. Curitiba, Paraná, Brasil. E-mail: <eduardo@mosadvocacia.com.br> Bruno Polonio Renzetti Advogado. Mestrando em Direito e Desenvolvimento pela Escola de Direito de São Paulo da Fundação Getúlio Vargas. Bacharel em Direito pela Universidade Federal do Paraná. Curitiba, Paraná, Brasil. E-mail: <bprenzetti@gmail.com> Resumo: Em que pese as pequenas e médias empresas (PME’s) representarem um grande e relevante nicho da economia brasileira, elas enfrentam grandes problemas de sobrevivência no mercado, principalmente por não disporem de formas economicamente viáveis de financiamento. Historicamente, o investimento de familiares e amigos, bem como o empréstimo bancário têm se mostrado como os modos de financiamento mais utilizados pelas PME’s. Entretanto, essa sistemática se mostra altamente problemática – seja pela baixa capacidade financeira de amigos e parentes, seja pelos altos juros bancários cobrados. O presente artigo indica o equity crowdfunding como nova opção de financiamento para estes pequenos empreendimentos (mesmo sendo essa alternativa também viável para projetos de maior porte), expondo o seu modo de funcionamento e regulação no exterior, bem como a operação desse segmento dentro do Brasil, mesmo que sem uma regulamentação específica. A partir da experiência internacional, notadamente nos Estados Unidos, são levantadas importantes questões quanto à regulação dessa nova modalidade de financiamento – ou mesmo quanto à necessidade de sua regulação, levando em conta que evidências empíricas sugerem que o modelo já opera adequadamente no Brasil sem um marco específico – a fim de fomentar o debate do tema de modo democrático e inclusivo no país. As duas primeiras seções do artigo tratam, respectivamente, do ambiente macroeconômico para PME’s e da definição do que exatamente é crowdfunding. As seções seguintes tratam dos problemas regulatórios enfrentados por essa modalidade de financiamento, dentro e fora do Brasil. A seção final conclui, trazendo também uma agenda de pesquisa para o tema. Palavras-chave: Equity crowdfunding. Financiamento coletivo. Regulação. Finanças de pequenas empresas. Sumário: 1 Introdução: ambiente econômico para financiamento de pequenas empresas - 2 O que é equity crowdfunding? - 3 Os problemas regulatórios do equity crowdfunding e as soluções adotadas fora do país - 4 A prática do financiamento coletivo empresarial no Brasil - 5 Considerações finais – Referências
  • 2. 162 R. de Dir. Empresarial – RDEmp | Belo Horizonte, ano 13, n. 2, p. 161-173, maio/ago. 2016 Eduardo da Silva Mattos, Bruno Polonio Renzetti 1 Introdução: ambiente econômico para financiamento de pequenas empresas As pequenas e microempresas (PME’s) representam um importante e cres­ cente nicho da economia brasileira. Hoje, elas já totalizam mais de 6,6 milhões, repre­sentando cerca de 99% do total de empresas existentes no país, empregam mais de 17 milhões de pessoas (o que representa mais da metade da população empregada no setor privado não ligado à agricultura)1 e são responsáveis por 27% do PIB brasileiro.2 Apesar dessa visível relevância, o ambiente de negócios não é dos mais favorá­ veis para as pequenas empresas e para as startups no Brasil.3 De especial interesse ao presente trabalho, as opções de financiamento não se mostram economicamente viáveis. Senão, vejamos: A teoria financeira percebeu empiricamente que, principalmente em pequenas empresas, o financiamento é realizado via investidores e financiadores externos, mas vinculados a uma dinâmica relacional com o fundador da empresa, ou seja, os investidores são pessoas com conhecimento pessoal dos sócios. Esse tipo de financiamento é popularmente baseado em três “F’s”: family, friends and fools, além dos recursos dos próprios fundadores.4 Em que pese essa tentativa de financiamento pessoal, deve-se notar que a disponibilidade financeira dos fundadores, amigos e parentes em PME’s costuma ser reduzida. Além disso, empresas em expansão precisam de recursos que, na prática, costumam exceder sua capacidade de financiamento interno. A alternativa que surge, então, é a obtenção de empréstimos. Isso permite à empresa, a disposição rápida de recursos para expandir os seus negócios. Contudo, tal opção é extremamente custosa no Brasil. Seja por uma questão histórico-estru­ tural ou econômica, os juros cobrados pelos bancos nacionais são elevadíssimos – mais precisamente, os juros nacionais se encontram entre os mais altos do mundo há muitos anos, sendo atualmente o segundo maior spread bancário, mais de 20 pontos percentuais acima da média mundial.5 Ademais, os juros mais baixos e de longo prazo para empréstimo somente são subsidiados por bancos estatais, a exemplo do Banco Nacional de Desenvolvimento 1 SEBRAE; DIEESE. Anuário do trabalho na micro e pequena empresa – 2014. p. 29. 2 SEBRAE. Participação das micro e pequenas empresas na economia brasileira – 2014. p. 7. 3 Veja-se, por exemplo, a posição do Brasil no ranking Doing Business do Banco Mundial, que avalia a qualidade do ambiente de negócios em um país. O Brasil está na 116ª posição geral (de 189 países avaliados) e em 97º no quesito “obtenção de crédito”. (BANCO MUNDIAL. Classificação das economias. Disponível em <http:// portugues.doingbusiness.org/rankings>. Acesso em: 12 jan. 2016). 4 Em português, “famílias, amigos e tolos”. Cf. SALAMA, Bruno Meyerhof. O fim da responsabilidade limitada no Brasil. São Paulo: Malheiros, 2014. p. 275. 5 Vide MATTOS, Eduardo. O que a crise do subprime ensinou ao Direito? Evidências e lições do modelo concor- rencial e regulatório brasileiro. São Paulo: Almedina, 2015. p. 146.
  • 3. 163R. de Dir. Empresarial – RDEmp | Belo Horizonte, ano 13, n. 2, p. 161-173, maio/ago. 2016 Equity crowdfunding no Brasil? Primeiras considerações sobre realidade econômica e disciplina jurídica Econômico e Social – BNDES. Entretanto, os financiamentos estatais costumam ser direcionados, cumprindo finalidades políticas para grandes empresas e nem sempre por critérios meritocráticos6 – o que só evidencia a diferença de custos de transação entre pequenas e grandes empresas no Brasil. Em outras palavras, “a alavancagem é estratégia particularmente perigosa – e no caso de pequenas empresas, é de um modo geral uma estratégia suicida”.7 Com uma opção sendo limitada e a outra sendo financeiramente custosa, qual é a escolha fornecida às PME’s? Na era da internet e das economias de rede, surgiu uma alternativa bastante atrativa e de crescimento exponencial: o crowdfunding, também conhecido como financiamento coletivo. O problema com esse tipo de arranjo é que, justamente em razão de suas características inovadoras, ele desafia o aparato regulatório do mercado de capitais e o necessário balanço entre a promoção do desenvolvimento empresarial e a garantia de segurança dos investidores. É a partir desse panorama que o Direito e a Economia – em específico, as finanças – podem contribuir para o aprimoramento e a sobrevivência das PME’s no Brasil. O Direito traz os instrumentos necessários para conformação e divisão de riscos da atividade empresarial por meio da (re)organização societária, da proteção dos direitos de investidores e sócios e da modelagem institucional, enquanto a ciência econômica contribui com as construções acerca da estrutura de capital das PME’s, da diversificação de investimentos, do alinhamento de incentivos, dentre outras questões relevantes. O presente artigo é um primeiro estudo sobre o tema do equity crowdfunding, ou financiamento coletivo empresarial, no Brasil, apresentando seus conceitos e como o instituto vem sendo utilizado no Brasil e fora dele. Ao final do artigo, deixa-se em aberto várias agendas de pesquisa nesse promissor nicho. 2 O que é equity crowdfunding? Primeiramente, deve-se notar que a prática do crowdfunding está inserida dentro do que se pode considerar uma nova ordem econômica e social mundial, propiciada pela difusão da internet, chamada de “economia compartilhada” ou de “economia colaborativa”. 6 Por todos, veja-se LAZZARINI, Sérgio. Capitalismo de laços: os donos do Brasil e suas conexões. Rio de Janeiro: Campus, 2010. 7 SALAMA, Bruno Meyerhof. O fim da responsabilidade limitada no Brasil. São Paulo: Malheiros, 2014. p. 285. O autor ainda ressalta que, na prática, o que se verifica é o fenômeno da seleção adversa: as empresas voltadas para atividades mais arriscadas – e, consequentemente, com maior possibilidade de rendimento – conseguem o acesso mais fácil ao mercado de crédito, enquanto as empresas menores, com retornos menos arriscados, acabam ficando de fora desse mercado.
  • 4. 164 R. de Dir. Empresarial – RDEmp | Belo Horizonte, ano 13, n. 2, p. 161-173, maio/ago. 2016 Eduardo da Silva Mattos, Bruno Polonio Renzetti Essa nova ordem é uma nova realidade sensível em diversos setores econômicos (inclusive no financeiro, objeto do artigo) e engloba não somente a relação de em­ presas com consumidores – as ditas plataformas Business-to-consumer (B2C), como é o afamado caso do Uber – mas também relações diretas entre consumidores/ usuários, como o crescente AirBnb.8 Especificamente quanto ao objeto do artigo, crowdfunding pode ser definido, a grosso modo, como “o uso da internet para levantar recursos por meio de pequenas contribuições de um grande número de investidores”.9 Trata-se de uma indústria de mais de 5 bilhões de dólares por ano,10 que permite que “pequenos empreendedores, que tradicionalmente tinham grande dificuldade em obter capital, tenham acesso a qualquer pessoa no mundo que possua um computador, acesso à internet e alguns trocados para investir”.11 O início desse modelo de financiamento se deu principalmente para empreen­ dimentos artísticos:12 algum artista tentava financiar determinado projeto próprio (como o lançamento de um novo CD ou uma turnê, por exemplo) e pedia recursos ao público. Essa operação é realizada por meio de uma plataforma online, que intermedeia essa relação em troca de um percentual do total arrecadado pelo projeto. O capital levantado, por sua vez, poderia se dar a título gratuito (uma efetiva doação por quem se interessasse pelo projeto) ou então poderia haver alguma contrapar­ tida – como, por exemplo, o recebimento, por quem cedeu dinheiro ao financiamento, de uma cópia do CD depois do lançamento, caso o projeto tenha arrecadado o volu­me necessário.13 Percebendo o apelo que essa modalidade de financiamento trouxe ao público – servindo até mesmo como uma ferramenta de gestão, visto que a capacidade de captação de recursos indicava o interesse existente, pelo mercado, no produto sendo ofertado14 – passou-se a questionar a viabilidade de, ao invés de oferecer 8 Por todos os livros sobre o tema, veja-se BOTSMAN, Rachel; ROGERS, Roo. What’s mine is yours: the rise of collaborative consumption. HarperBusiness, 2010. 9 BRADFORD, C. Steven. Crowdfunding and the federal securities laws. Columbia Business Law Review, v. 2012, n. 1, 2012. Tradução livre pelos autores. No original: “the use of the Internet to raise money through small contributions from a large number of investors” 10 BRODERICK, Daniel. Crowdfunding’s Untapped Potential. In: Emerging Markets. FORBES. 5 de Agosto de 2014. 11 BRADFORD, C. Steven. Crowdfunding and the federal securities laws. Columbia Business Law Review, v. 2012, n. 1, 2012. Tradução livre pelos autores. No original: “smaller entrepreneurs, who traditionally have had great difficulty obtaining capital, have access to anyone in the world with a computer, Internet access, and spare cash to invest”. 12 COHN, Stuart. The new crowdfunding registration exemption: good idea, bad execution. Florida Law Review, v. 64, 2012. p. 1435. 13 A utilização das contrapartidas domina a prática do financiamento coletivo em comparação à doação pura e simples. Em verdade, desenvolveu-se um refinamento das contrapartidas: os empreendedores costumam oferecer recompensas diferentes para os investidores de acordo com o montante investido – ou seja, quem investe mais, recebe uma recompensa melhor do que quem investe menos. Cf. SCHWIENBACHER, Armin; LARRALDE, Benjamin. Crowdfunding of Small Entrepreneurial Ventures. Disponível em: <http://ssrn.com/abs- tract=1699183>. p. 4, 13. 14 Cf. SCHWIENBACHER, Armin; LARRALDE, Benjamin. Crowdfunding of Small Entrepreneurial Ventures. Disponível em: <http://ssrn.com/abstract=1699183>. p. 5.
  • 5. 165R. de Dir. Empresarial – RDEmp | Belo Horizonte, ano 13, n. 2, p. 161-173, maio/ago. 2016 Equity crowdfunding no Brasil? Primeiras considerações sobre realidade econômica e disciplina jurídica recompensas e simples contrapartidas, oferecer-se quotas (ou participação nos resultados) da empresa (ou projeto) que estava sendo financiada. E é aqui que está o equity crowdfunding, que indica o financiamento coletivo empresarial, pois envolve o capital social (em inglês, equity). Embora o crowdfunding tradicional já traga discussões relevantes de cunho jurídico – por exemplo, se seria necessário recolher ITCMD sobre o valor recebido como doação ou se a relação existente entre as partes seria de consumo no caso do investimento com contrapartida –, as discussões se tornam muito mais complexas com o equity crowdfunding, ou seja, ao envolver participações no capital social. 3 Os problemas regulatórios do equity crowdfunding e as soluções adotadas fora do país O equity crowdfunding traz, principalmente, problemas de três ordens para os diferentes agentes envolvidos no processo de financiamento: (i) Problemas para os empreendedores, pois a prática do financiamento coletivo parece se enquadrar como forma de “oferta pública” de valores mobiliários e, consequentemente, submete os projetos às duras (e caras) disposições do regulador de cada país; (ii) Problemas para os investidores, pois na falta de um claro aparato regula­ tório para a situação – e considerando a assimetria de informação entre empreendedor e investidor –, existiria risco de fraudes. Ademais, a falta de garantias e proteções voltadas aos investidores poderia levar a níveis sub- ótimos de investimento ou ao afastamento das boas empresas do mercado de financiamento coletivo (no conhecido problema de seleção adversa);15 (iii) E, por fim, problemas para as plataformas onlines que intermedeiam a relação entre empreendedor e investidor, pois poderia se considerar a plataforma como corretora, agente financeiro ou alguma outra categoria regulada. O primeiro dos problemas se refere aos altos custos de uma empresa em se submeter às normas do regulador de valores mobiliários. Além dos custos regula­ tórios, os custos legais e contábeis de compliance para as pequenas empresas se tornam impraticáveis, sufocando a atividade empresarial.16 Não bastasse isso, o 15 Os problemas de assimetria de informação poderiam levar até mesmo ao desaparecimento ou à estatização de determinados mercados, como bem observou George Akerloff em clássico artigo. Vide: AKERLOF, George A. The Market for “Lemons”: Quality Uncertainty and the Market Mechanism. The Quarterly Journal of Economics, v. 84, n. 3, ago., 1970. p. 488-500. Esse problema de seleção adversa foi analisado quanto ao caso espe- cífico do crowdfunding em TOMBOC, Gmeleen Faye B. Lemons Problem in Crowdfunding, The John Marshall Journal of Information Technology & Privacy Law, v. 30, 2013. p. 253-280. 16 POPE, Nikki. Crowdfunding microstartups: it’s time for the Securities and Exchange Commission to approve a small offering exemption. University of Pennsylvania Journal of Business Law, v. 13, n. 4, 2010-2011. p. 981.
  • 6. 166 R. de Dir. Empresarial – RDEmp | Belo Horizonte, ano 13, n. 2, p. 161-173, maio/ago. 2016 Eduardo da Silva Mattos, Bruno Polonio Renzetti Brasil enfrenta custos acima dos internacionais. Por motivos que incluem reserva de mercado e práticas que poderiam ser caracterizadas como anticompetitivas,17 um estudo realizado pela consultoria Oxera, encomendado pela Comissão de Valores Mobiliários (CVM), constatou que algumas das taxas cobradas pelo mercado acio­ nário brasileiro são o dobro de taxas existentes em outros locais do mundo com mercados de tamanho semelhante.18 O segundo problema expõe um trade-off existente para a autoridade regula­tória: a necessidade de conciliar a proteção dos pequenos investidores quanto a fraudes, com a necessidade de permitir a canalização da poupança privada para investi­mento em atividades produtivas. A proteção dos investidores é, inegavelmente, um objetivo da atuação regulatória, mas é necessário observar a que custo isso ocorre. Da mesma forma, o acesso à informação atualmente não é tão precário quanto o era anos atrás.19 Todas essas características devem ser levadas em conta para contornar o problema delineado. O terceiro problema é direcionado a um agente específico (as plataformas de financiamento coletivo), mas é, em certa medida, o mesmo indicado acima. Os custos (e responsabilidades) de corretores são consideráveis e isso poderia for­ necer uma barreira à entrada de novos competidores. Por outro lado, a completa falta de regulação dessas plataformas poderia fazer proliferar o número de agentes que buscam ganhar dinheiro somente pela intermediação, sem se preocupar com a qualidade das empresas que estão sendo financiadas – ampliando, assim, os riscos de fraude. Essas situações foram enfrentadas, de uma forma ou de outra, nos Estados Unidos. Com o intuito de fomentar a atividade de pequenos empresários, principalmente após os problemas econômicos advindos da crise do subprime, foi promulgado em 2012, o Jumpstart Our Business Startups Act, conhecido como JOBS Act. Uma das previsões dessa lei (Título III) foi a de que seria regulamentado o equity crowdfunding no país. Após discussões de cunho político e acadêmico, a comissão de valores mobiliários dos EUA (U.S. Securities and Exchange Commission, conhecida como SEC) aprovou, em 30 de outubro de 2015, as regras finais que regulamentam a atuação dessa forma de financiamento (o documento é chamado de RIN3235-AL37). 17 Vide: MATTOS, Eduardo. Concorrência no sistema de pagamentos: condutas anticompetitivas e acesso a câmaras de compensação como essential facility. Revista de Direito Bancário, do Mercado de Capitais e da Arbitragem, v. 67, 2015. p. 111-132. 18 OXERA. Introducing competition between stock exchanges: the costs and benefits. Agenda: advancing econom- ics in business. p. 02, 03. Disponível em: <http://www.oxera.com/Oxera/media/Oxera/downloads/Agenda/ Introducing-competition-between-stock-exchanges.pdf?ext=.pdf>. Acesso em: 13 jan. 2016. 19 POPE, Nikki. Crowdfunding microstartups: it’s time for the Securities and Exchange Commission to approve a small offering exemption. University of Pennsylvania Journal of Business Law, v. 13, n. 4, 2010-2011. p. 982-984.
  • 7. 167R. de Dir. Empresarial – RDEmp | Belo Horizonte, ano 13, n. 2, p. 161-173, maio/ago. 2016 Equity crowdfunding no Brasil? Primeiras considerações sobre realidade econômica e disciplina jurídica Algumas das soluções utilizadas serão enumeradas, por motivos didáticos, na mesma ordem dos problemas colocados anteriormente nessa seção:20 (i) Para lidar com os problemas dos altos custos, empresas pequenas estão isentas do registro de valores mobiliários necessário para as demais. Os valores que podem ser levantados por ano, para fins de enquadramento na isenção, atingem um milhão de dólares. Dessa forma, permite-se que pequenas empresas levantem uma boa quantia em dinheiro com baixos custos. Libera-se, da mesma forma, a ampliação de empresas já existentes via crowdfunding. (ii) Visando proteger os investidores, limitou-se o que cada pessoa pode investir em empresas via crowdfunding em um ano. Esses tetos são estipulados tanto em valores absolutos por ano, quanto em percentuais de renda anual e de patrimônio. Ainda, os limites variam de acordo com a capacidade financeira de cada investidor – quanto maior a capacidade financeira, maior a liberdade de se investir via crowdfunding. Não foram feitas previsões espe­ ciais para investidores qualificados ou para investidores institucionais. O intuito disso é duplo: (a) permitir que a eventual falência de um negócio (cuja probabilidade é admitidamente alta para startups) não prejudique a renda das famílias, considerando o valor relativamente ínfimo investido; e (b) permitir que os negócios sejam efetivamente financiados por um grande número de pessoas com pequenos valores individuais. Ainda, visando mitigar a questão de assimetria de informação, as empresas que desejem utilizar do financiamento via crowdfunding deverão cumprir uma série de deveres de informação e transparência – caso contrário, alguns argumentam que o crowdfunding poderia se tornar um fraudfunding, ou seja, financiamento de fraudes.21 (iii) Os negócios deverão ser conduzidos por corretoras ou por “portais de finan­ ciamento”, devidamente regulamentos pela SEC e somente em meios vir­ tuais. Além disso, um emissor só poderá se utilizar de um único intermediário. Ainda, os intermediários serão os responsáveis pela observância e fiscali­ zação dos limites de renda estipulados aos investidores (vide item “ii” logo acima). Nesse sentido, os maiores custos e responsabilidades regulatórias recaíram sobre o grupo dos intermediários. A saída parece razoável, consi­ derando a importância da função que esses agentes desempenham e, caso assim não o fosse, a facilidade existente para a proliferação de plataformas 20 O documento integral, acompanhado de comentários acerca dos motivos de escolhas dos limites estipulados bem como de detalhes do processo de definição regulatória, pode ser acessado no site da SEC. Veja-se: Disponível em: <http://www.sec.gov/rules/final/2015/33-9974.pdf>. Acesso em: 13 jan. 2016. 21 HAZEN, Thomas Lee. Crowdfunding or Fraudfunding? Social Networks and the Securities Laws – Why the Specially Tailored Exemption Must Be Conditioned on Meaningful Disclosure. North Carolina Law Review, v. 90, 2012. p. 1735.
  • 8. 168 R. de Dir. Empresarial – RDEmp | Belo Horizonte, ano 13, n. 2, p. 161-173, maio/ago. 2016 Eduardo da Silva Mattos, Bruno Polonio Renzetti pouco preocupadas com a qualidade dos projetos financiados – que, ao final, traria vicissitudes acentuadas de assimetria de informação e de seleção adversa. Além disso, esse grupo parece ser o menor (em termos de número absoluto de participantes) dentre os três listados. Assim, sob a ótica dos custos de transação, a fiscalização pela própria SEC seria mais viável e eficiente. Como se pode observar, as soluções adotadas parecem adequadas para lidar com os problemas ainda hipotéticos e balancear as necessidades de proteção de investidores com o fomento da atividade econômica. Ademais, evidência empírica sugere que, mesmo sem regulação, os empreen­ dimentos financiados por crowdfunding estão dando retorno aos investidores, por mais que com um prazo de maturação maior do que o inicialmente programado.22 Isso indica que a dinâmica e os incentivos entre empreendedores e investidores estão (naturalmente) alinhados. Por tal motivo, os projetos que estão sendo levados adiante (ou seja, propostos pelo empreendedor e aceitos pelo investidor, visto que os projetos que não recebem os recursos requeridos sequer saem do papel) parecem economicamente adequados. Nesse sentido, a escolha do regulador por acompa­nhar de perto somente os intermediários parece uma interessante estratégia de proteção da ordem natural do mercado (gatekeeping).23 Na Europa, a discussão está um tanto mais dispersa e não tão avançada. Apesar disso, a prática do financiamento coletivo empresarial no continente cresce com desenvoltura e sem maiores problemas para empresas ou investidores24 – como exemplo, veja-se que um grupo de 5500 famílias holandesas investiu em uma empresa de energia eólica (De Windcentrale) e, como resultado do investimento, obtiveram 16 anos de energia “gratuita”.25 22 MOLLICK, Ethan. The dynamics of crowdfunding: an exploratory study. Journal of Business Venturing, v. 29, 2014. p. 1-16. 23 Comportamentos oportunistas certamente existem. Seria o caso, por exemplo, de empresas que querem levantar recursos mesmo sem reais intenções de ir adiante com o negócio, ou de intermediários que queiram levantar o máximo de dinheiro possível somente pela comissão que recebem, independentemente da qualidade e seriedade dos projetos. Nesse sentido, atribuir responsabilidades financeiras e penais aos intermediários acaba por mitigar incentivos para comportamentos ruins deles próprios. E como projetos só entrarão no mercado de crowdfunding caso sejam aprovados internamente pelos intermediários, as corretoras atuam de certa forma como gatekeepers, ou seja, como intermediários que fornecem informações adequadas ao mercado – e colocam sua reputação em risco com isso. Para maiores detalhes sobre gatekeepers, veja-se: COFFEE JR., John C. Gatekeepers failure and reform: the challenge of fashioning relevant reforms. Boston University Law Review, v. 84, 2004. De bibliografia nacional, veja-se: SATIRO, Francisco. Agências de classificação de créditos e seu papel de gatekeepers. In: VON ADAMEK, Marcelo Vieira (coord.). Temas de direito societário e empresarial contemporâneos. São Paulo: Malheiros, 2011. 24 Para uma revisão do desenvolvimento regulatório na Europa (e em alguns países europeus em específico), veja-se: WEINSTEIN, Ross S. Crowdfunding in the US and Abroad: What to Expect When You’re Expecting. Cornell International Law Journal, v. 46, 2013. p. 437-449. 25 REIMINK, Mariska. Crowdfunding in Dutch Small and Medium Enterprises: An empirical analysis of factors influencing the intention to invest in a crowdfunding initiative. Dissertação de mestrado: University of Twente, Faculdade de Administração, Twente, 2014. p. 1.
  • 9. 169R. de Dir. Empresarial – RDEmp | Belo Horizonte, ano 13, n. 2, p. 161-173, maio/ago. 2016 Equity crowdfunding no Brasil? Primeiras considerações sobre realidade econômica e disciplina jurídica Pode-se citar, ainda, o exemplo da Camden Town Brewery, do Reino Unido, empresa que produz cervejas artesanais. A cervejaria lançou no site CrowdCube uma campanha com a meta de arrecadar um milhão e meio de libras esterlinas a partir de investimentos feitos em equity crowdfunding. A companhia não só atingiu o seu objetivo, como também quase duplicou a meta, arrecadando 2.75 milhões de libras ao fim do prazo de investimento. Após essa visível aceitação do mercado, a Camden foi adquirida pela gigante do setor AB InBev por um valor não declarado, em dezembro de 2015, trazendo grande retorno para todos os investidores.26 Esses exemplos, somados à evidência indicada em estudos acadêmicos, poderiam levantar até mesmo a questão da efetividade de se regular (ainda mais com práticas do século passado) um mercado tão dinâmico, ágil e criado na era da informação e que, atualmente, vem se desenvolvendo adequadamente. Não há dúvidas de que a realidade trará novas questões à discussão, mas esse parece um interessante início. 4 A prática do financiamento coletivo empresarial no Brasil No Brasil, assim como na maioria dos países do mundo, não há um arcabouço regulatório específico para regular a atividade de financiamento coletivo empresarial. Contudo, a falta de uma estrutura normativa específica não impede a formação e a operação de mercados – e, então, foram desenvolvidas algumas plataformas de financiamento coletivo bastante interessantes.27 Para se evitar a utilização de procedimentos flagrantemente ilegais de emissão de valores imobiliários,28 o que se fez foi encaixar o objetivo do equity crowdfunding dentro das regras já existentes no Brasil – e sempre com consultas prévias à CVM. Alguns caminhos diferentes foram encontrados e satisfazem, até certo ponto, o objetivo desse tipo de financiamento. A primeira saída posta em prática foi a de se utilizar uma exceção de registro prevista na Resolução nº 400 da CVM. Micro e pequenas empresas – assim definidas de acordo com a Lei Complementar nº 123/2006 – estão dispensadas de registro na CVM, desde que cumpram alguns requisitos: (i) O valor ofertado ao público deve ser inferior a R$2.400.000,00 durante um período de 12 meses (art. 5º, §4º); 26 DAVIES, Rob. Camden Town Brewery sold to world’s biggest drinks company. The Guardian. 21 de dezembro de 2015. 27 Dentre elas, poder-se-iam citar os casos das plataformas Broota, EuSócio, EqSeed e StartMeUp. 28 Vide art. 2º da Resolução nº 400 da CVM (grifou-se): “Toda oferta pública de distribuição de valores mobiliários nos mercados primário e secundário, no território brasileiro, dirigida a pessoas naturais, jurídicas, fundo ou universalidade de direitos, residentes, domiciliados ou constituídos no Brasil, deverá ser submetida previa- mente a registro na Comissão de Valores Mobiliários – CVM, nos termos desta Instrução”.
  • 10. 170 R. de Dir. Empresarial – RDEmp | Belo Horizonte, ano 13, n. 2, p. 161-173, maio/ago. 2016 Eduardo da Silva Mattos, Bruno Polonio Renzetti (ii) A empresa deve comunicar a CVM, via internet, que pretende se utilizar da dispensa de registro (art. 5º, §§5º e 6º); (iii) A empresa deverá, “em linguagem simples, clara, objetiva, serena e mode­ rada, advertindo os leitores para os riscos do investimento”, fornecer ao público informações “verdadeiras, completas, consistentes e que não indu­ zam o investidor a erro” (art. 5º, §7º, I e II); (iv) A empresa deverá informar que o material divulgado é publicitário. Além disso, deve informar que aquela oferta foi dispensada de registro pela CVM e que a comissão “não garante a veracidade das informações prestadas pelo ofertante nem julga a sua qualidade ou a dos valores mobiliários ofertados” (art. 5º, §8º, I e II). As empresas emitem títulos de dívida, com remuneração definida contra­ tualmente, conversíveis em ações depois de um determinado termo. Ao final do termo, a empresa se compromete ou a pagar aos investidores o título acrescido da remuneração ou, então, a se tornar uma sociedade anônima e conceder a opção ao investidor de adentrar, ou não, no quadro social. Além disso, há o risco (real) de o negócio não vingar e o investidor perder o dinheiro colocado na atividade. A segunda alternativa é chamada de Contrato de Investimento Coletivo (CIC). Nela, não há a constituição de um instrumento de dívida. Os investidores compram quotas desses CIC’s. Em troca, eles participam dos resultados da emissora e, após um termo definido contratualmente, também receberão a opção de participar do quadro social da empresa.29 As plataformas online que conectam empreendedores e investidores, atual­ mente, não recebem tratamento especial no Brasil. Elas são consideradas como for­nece­doras de um serviço de tecnologia, e não intermediários financeiros. Hoje, tampouco há limitação quanto aos valores investidos por uma única pessoa – diferentemente do que foi definido nos Estados Unidos. Considerando o caráter regulatório ainda incipiente – note-se a prática brasileira de equity crowdfunding ter se desenvolvido pelos vãos regulatórios existentes –, há muito a ser avançado e discutido. As questões apontadas acima, bem como a experiência internacional, parecem ser pontos de partida extremamente relevantes para conformação de uma disciplina do investimento coletivo empresarial. 29 As contrapartidas dos CIC’s são bastante flexíveis e definidas contratualmente. A opção de participação no quadro social, inclusive, não é obrigação dos CIC’s. Entretanto, como a participação no quadro social é próprio objeto do equity crowdfunding, optou-se por inserir isso na descrição de como é a prática desse financiamento no Brasil.
  • 11. 171R. de Dir. Empresarial – RDEmp | Belo Horizonte, ano 13, n. 2, p. 161-173, maio/ago. 2016 Equity crowdfunding no Brasil? Primeiras considerações sobre realidade econômica e disciplina jurídica 5 Considerações finais O presente artigo apresentou uma primeira abordagem acadêmica quanto ao tema do equity crowdfunding no Brasil. Como indicado acima, o caminho a ser percorrido ainda é longo e a agenda de pesquisa é vasta. Algumas questões pujantes podem ser indicadas: qual limite de proteção ao investidor é o mais adequado, considerando a necessidade de, por outro lado, estimularem-se formas alternativas de financiamento empresarial em um país com spreads bancários dentre os maiores do mundo? Será estipulado algum teto de investimento por entidade familiar? Qual é a natureza jurídica e o enquadramento regulatório das plataformas que intermedeiam o levantamento de recursos? Qual é a disciplina jurídica do investimento realizado? Quem arcará com a maioria dos custos regulatórios? Haverá algum incentivo a esse tipo de investimento pelo público, considerando o alto grau de risco envolvido? Ou, em âmbito até mais filosófico, esse tipo de atividade (livre e criada naturalmente em um ambiente de mercado e de livre troca de informações) é adequadamente regulado pelo Estado, qualquer que seja o marco regulatório? Nos Estados Unidos, as regras implementadas passaram por um grande pro­­ces­so de debate entre a SEC e vários dos setores interessados – corretoras, startups, investidores e acadêmicos. A construção de um ambiente institucional sólido, com sensível melhoria nos resultados econômicos, passa invariavelmente por esse processo de debate democrático (legítimo, e não pro forma) entre os interesses envol­vidos, como defende Elinor Ostrom.30 Esse parece ser um caminho adequado para ser trilhado pela regulação brasileira. Equity Crowdfunding In Brazil? First Impressions About Economic Reality And Legal Framework Abstract: Even though small and medium enterprises (SME) constitute an important sector within Brazilian economic system, they still face a fairly large amount of issues in order to survive, mainly because there are not economic-feasible financing options for such businesses. Historically speaking, money from family e friends, along with bank loans, have been the most common ways to finance an enterprise, but this system is currently weary – due to financial constraints to family and friends, as well as the high interest rates charged by banks. As a new financing option, this paper introduces equity crowdfunding as an alternative for SME’s, explaining how it works abroad and in Brazil. Having the American experience as a benchmark, important questions are raised about the regulation of such financing option – or even the necessity regulation, since evidence suggests this market is operating efficiently without a specific legal framework – in order to promote a more democratic and inclusive debate. The first two sections of the paper examine, respectively, the macroeconomic environment for SME and the delimitations of what exactly crowdfunding is. The following sections assess the regulatory problems of such financing alternative, abroad and in Brazil. Finally, the last section concludes, proposing a research agenda for the theme. Key-words: Equity crowdfunding. Regulation. Small-business finance. 30 OSTROM, Elinor. Governing the commons: the Evolution of Institutions for Collective Action. Cambridge: Cambridge University Press, 1990. Capítulos 1 e 4.
  • 12. 172 R. de Dir. Empresarial – RDEmp | Belo Horizonte, ano 13, n. 2, p. 161-173, maio/ago. 2016 Eduardo da Silva Mattos, Bruno Polonio Renzetti Referências AKERLOF, George A. The Market for “Lemons”: Quality Uncertainty and the Market Mechanism. The Quarterly Journal of Economics, v. 84, n. 3, ago., 1970. p. 488-500. BANCO MUNDIAL. Classificação das economias. Disponível em <http://portugues.doingbusiness. org/rankings>. Acesso em: 12 jan. 2016. BOTSMAN, Rachel; ROGERS, Roo. What’s mine is yours: the rise of collaborative consumption. HarperBusiness, 2010. BRADFORD, C. Steven. Crowdfunding and the federal securities laws. Columbia Business Law Review, v. 2012, n. 1, 2012. BRODERICK, Daniel. Crowdfunding’s Untapped Potential In Emerging Markets. FORBES. 5 de Agosto de 2014. COFFEE JR., John C. Gatekeepers failure and reform: the challenge of fashioning relevant reforms. Boston University Law Review, v. 84, 2004. COHN, Stuart. The new crowdfunding registration exemption: good idea, bad execution. Florida Law Review, v. 64, 2012. DAVIES, Rob. Camden Town Brewery sold to world’s biggest drinks company. The Guardian. 21 de dezembro de 2015. HAZEN, Thomas Lee. Crowdfunding or Fraudfunding? Social Networks and the Securities Laws – Why the Specially Tailored Exemption Must Be Conditioned on Meaningful Disclosure. North Carolina Law Review, v. 90, 2012. p. 1735. LAZZARINI, Sérgio. Capitalismo de laços: os donos do Brasil e suas conexões. Rio de Janeiro: Campus, 2010. MATTOS, Eduardo. Concorrência no sistema de pagamentos: condutas anticompetitivas e acesso a câmaras de compensação como essential facility. Revista de Direito Bancário, do Mercado de Capitais e da Arbitragem, v. 67, 2015. p. 111-132. MATTOS, Eduardo. O que a crise do subprime ensinou ao Direito? Evidências e lições do modelo concorrencial e regulatório brasileiro. São Paulo: Almedina, 2015. MOLLICK, Ethan. The dynamics of crowdfunding: an exploratory study. Journal of Business Venturing, v. 29, 2014. p. 1-16. OSTROM, Elinor. Governing the commons: the Evolution of Institutions for Collective Action. Cambridge: Cambridge University Press, 1990. OXERA. Introducing competition between stock exchanges: the costs and benefits. Agenda: advancing economics in business. p. 02, 03. Disponível em: <http://www.oxera.com/Oxera/media/Oxera/ downloads/Agenda/Introducing-competition-between-stock-exchanges.pdf?ext=.pdf>. Acesso em: 13 jan. 2016. POPE, Nikki. Crowdfunding microstartups: it’s time for the Securities and Exchange Commission to approve a small offering exemption. University of Pennsylvania Journal of Business Law, v. 13, n. 4, 2010-2011. p. 981-984. REIMINK, Mariska. Crowdfunding in Dutch Small and Medium Enterprises: An empirical analysis of factors influencing the intention to invest in a crowdfunding initiative. Dissertação de mestrado: University of Twente, Faculdade de Administração, Twente, 2014. SALAMA, Bruno Meyerhof. O fim da responsabilidade limitada no Brasil. São Paulo: Malheiros, 2014.
  • 13. 173R. de Dir. Empresarial – RDEmp | Belo Horizonte, ano 13, n. 2, p. 161-173, maio/ago. 2016 Equity crowdfunding no Brasil? Primeiras considerações sobre realidade econômica e disciplina jurídica SATIRO, Francisco. Agências de classificação de créditos e seu papel de gatekeepers. In: VON ADAMEK, Marcelo Vieira (coord.). Temas de direito societário e empresarial contemporâneos. São Paulo: Malheiros, 2011. SCHWIENBACHER, Armin; LARRALDE, Benjamin. Crowdfunding of Small Entrepreneurial Ventures. Disponível em: <http://ssrn.com/abstract=1699183>. SEBRAE. Participação das micro e pequenas empresas na economia brasileira – 2014. SEBRAE; DIEESE. Anuário do trabalho na micro e pequena empresa – 2014. TOMBOC, Gmeleen Faye B. Lemons Problem in Crowdfunding, The John Marshall Journal of Information Technology & Privacy Law, v. 30, 2013. p. 253-280. WEINSTEIN, Ross S. Crowdfunding in the US and Abroad: What to Expect When You’re Expecting. Cornell International Law Journal, v. 46, 2013. p. 437-449. Informação bibliográfica deste texto, conforme a NBR 6023:2002 da Associação Brasileira de Normas Técnicas (ABNT): MATTOS, Eduardo da Silva; RENZETTI, Bruno Polonio. Equity crowdfunding no Brasil? Primeiras considerações sobre realidade econômica e disciplina jurídica. Revista de Direito Empresarial – RDEmp, Belo Horizonte, ano 13, n. 2, p. 161-173, maio/ago. 2016. Recebido em: 03.03.2016 Aprovado em: 05.04.2016