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A PINTURA RENASCENTISTA
A PINTURA RENASCENTISTA: O HOMEM COMO UNIDADE
DE MEDIDA
 No Renascimento, a arte é enquadrada em conceitos e metodologias de
bases científicas, tornando-se numa «realidade» tão demonstrável como
qualquer outra ciência.
 Também o artista vê alterar o seu estatuto social, sendo reconhecido como
um erudito, um humanista e um criador informado e inspirado por Deus.
A PINTURA RENASCENTISTA: O HOMEM COMO UNIDADE
DE MEDIDA
 No Renascimento, o Homem é tomado como Unidade de Medida de todas as
coisas.
 O Homem é referência e objeto de todas as pesquisas plásticas e pictóricas.
 Tal como na Antiguidade Clássica, a finalidade da arte é atingir o Belo sob a
forma da representação perfeita do Homem, da Natureza, do espaço e das
coisas que o habitam.
A PINTURA RENASCENTISTA: O HOMEM COMO UNIDADE
DE MEDIDA
Madona com o Menino Entronizada entre S. João Batista e S. Sebastião, Pietro Perugino,
1493.
O programa da pintura renascentista apresenta
as características seguintes:
• o desenho é um meio privilegiado para a
aplicação da perspetiva com rigor científico;
• a cor tem um papel vital na definição da
dimensão psicológica das personagens;
• o chiaroscuro (o tratamento do claro-escuro) é
um recurso indispensável à modelação
tridimensional dos volumes.
A PESQUISA EM TORNO DA PERSPETIVA
PF
LH
PF – PONTO
DE FUGA
LH – LINHA DO
HORIZONTE
O atual conceito e método da perspetiva
nasceu no Renascimento com Brunelleschi, c.
1420, e apresenta as características
seguintes:
• traçam-se linhas formando uma pirâmide
cujo vértice é o ponto de fuga;
• o eixo da pirâmide une o olho (ponto de
vista) com o vértice (ponto de fuga);
• a base da pirâmide, onde se forma a
imagem, resulta de um corte efetuado por
um plano perpendicular ao eixo – o quadro
onde se simula a realidade que o
observador contempla.
A PESQUISA EM TORNO DA PERSPETIVA
Demonstração do Sistema de Perspetiva Linear, Albrecht Dürer,
Tratado de Geometria, 1525.
• Foi Alberti que, no tratado De Pictura (1435),
definiu o quadro como «uma janela aberta para
o mundo», numa aproximação ao conceito de
perspetiva.
• Para demonstrar o rigor e a objetividade da
perspetiva, Dürer concebeu um engenho para
reproduzir imagens, como se se tratasse do
registo de uma experiência científica.
A PESQUISA EM TORNO DA PERSPETIVA
 Piero della Francesca dedicou-se a aprofundar os
conhecimentos sobre a perspetiva que deixou escritos
no seu tratado De prospectiva pingendi (1472).
Nesse tratado, Piero della Francesca define a
perspetiva com as características seguintes:
• integração das figuras num espaço arquitetónico,
para acentuar os efeitos das linhas de perspetiva;
• rigor no traçado das linhas de perspetiva, seguindo
conhecimentos de geometria para as proporções
relativas entre as figuras;
• composição seguindo traçados racionais e
geométricos.
A PESQUISA EM TORNO DA PERSPETIVA
A Trindade, Masaccio, Igreja de Santa
Maria Novella, Florença, c. 1420.
 Masaccio (1401-1428) foi o primeiro grande pintor italiano
depois de Giotto e um dos primeiros a desenvolver a
perspetiva criada por Brunelleschi.
A PESQUISA EM TORNO DA PERSPETIVA
A Trindade, Masaccio, Igreja de Santa
Maria Novella, Florença, c. 1420.
Em A Trindade, Masaccio aprofundou o realismo da
representação através dos aspetos seguintes:
• criação da ilusão de profundidade através da
aplicação da perspetiva;
• tratamento do volume dos corpos, através dos
efeitos de claro-escuro;
• utilização de elementos arquitetónicos clássicos.
A técnica da perspetiva linear possibilitou a ilusão de
profundidade. Uma das primeiras obras de pintura a
fazer uso dos princípios desenvolvidos por Brunelleschi
foi A Santíssima Trindade (1425-28) de Masaccio.
1. Cristo surge ao centro.
2. O Pai segura a cruz, em 2º plano.
3. Entre os dois está o símbolo do Espírito Santo.
4. Aos pés da cruz Nossa Senhora e São João Evangelista.
5. Junto às pilastras os doadores.
6. Cria a ilusão de abertura de um espaço na parede
através dos elementos arquitetónicos.
7. Os caixotões permitem estabelecer as linhas paralelas
e acentuam a profundidade.
8. As linhas convergem para os pés da cruz.
A PESQUISA EM TORNO DA PERSPETIVA
Lamentação sobre Cristo Morto, Andrea Mantegna, 1475-1478.
 Andrea Mantegna (1431-1506) foi
um exímio executante dos
princípios da perspetiva linear.
 Na obra Lamentação sobre Cristo
Morto, o corpo de Cristo é
representado deitado e num
ponto de vista rasante com os
pés em primeiro plano.
NOVOS PROCESSOS, NOVAS TÉCNICAS, NOVOS TEMAS
Novos processos:
• Perspetiva – processo geométrico que permitia representar com rigor o espaço e as
formas tridimensionais numa superfície plana.
• Naturalismo – interesse pelo estudo da Natureza e da anatomia da figura humana
como forma de obter maior realismo nas representações.
• Enquadramentos arquitetónicos – construção de cenários arquitetónicos sob efeitos
de perspetiva.
• Novos suportes de pintura – pintura em madeira e cavalete (telas) facilitando a
circulação das obras e a difusão de novas ideias estéticas.
NOVOS PROCESSOS, NOVAS TÉCNICAS, NOVOS TEMAS
Novas técnicas:
• Pintura a óleo – técnica importada da Flandres que permitia um maior
tempo de secagem e a realização de modelados e velaturas.
• Utilização do sfumato – esbatimento dos tons de modo a gerar uma
transição suave luz-sombra (chiaroscuro).
• Novos pigmentos aglutinantes – enriquecimento da gradação de cor, o
que facilitou a modelação das formas e dos volumes, e a criação de
atmosferas mais luminosas.
NOVOS PROCESSOS, NOVAS TÉCNICAS, NOVOS TEMAS
Novos temas:
• Retrato – o Humanismo, o Individualismo e o culto da personalidade próprios do
Renascimento fizeram crescer o gosto pelo retrato como afirmação social e
cultural.
• Nu – a «descoberta» do Homem, da sua anatomia e perfeição das formas, o nu
está ligado à tradição greco-romana.
• Paisagem – o estudo do mundo envolvente e a representação da Natureza (dos
ambientes) é um tema ideal para a aplicação dos novos recursos técnicos e
plásticos.
LEONARDO E A CAPTAÇÃO DA DIMENSÃO PSICOLÓGICA
DAS PERSONAGENS
 Leonardo da Vinci é considerado um dos artistas mais importantes de toda a
História.
As suas capacidades intelectuais revelaram-se em
áreas tão distintas como:
• a pintura, a escultura e a arquitetura;
• a poesia e a música;
• a matemática, a geometria e a engenharia;
• a astronomia, a filosofia e as ciências naturais.
LEONARDO E A CAPTAÇÃO DA DIMENSÃO PSICOLÓGICA
DAS PERSONAGENS
A Última Ceia, Leonardo da Vinci, fresco na Igreja de Santa Maria das Graças,
Milão, 1495-1498.
 Para Leonardo, a pintura devia ser muito mais
do que a representação fiel e exata do real,
devia ser mais do que a simples «recriação da
aparência do mundo exterior».
 A pintura devia captar a dimensão
psicológica das personagens: o seu caráter,
a sua expressão, as suas emoções
LEONARDO E A CAPTAÇÃO DA DIMENSÃO PSICOLÓGICA
DAS PERSONAGENS
A Última Ceia, Leonardo da Vinci, fresco na Igreja de Santa Maria das Graças,
Milão, 1495-1498.
 Em A Última Ceia Leonardo aplicou a
perspetiva com rigor científico, esbatendo a
distinção entre espaço real e espaço fictício.
 Mas o verdadeiro interesse desta pintura
e o centro da ação é o drama psicológico
das personagens: os seus gestos, as suas
expressões e as suas motivações
implícitas.
LEONARDO. A PITTURA È COSA MENTALE
A Virgem dos Rochedos, Leonardo da Vinci, 1495-1508.
 Uma das maiores contribuições para a cultura artística
foi o Tratado de Pintura (c. 1498), onde Leonardo da
Vinci define o desenho e a pintura como cosa mentale
– um processo intelectual ou um meio que conduz à
experimentação e ao conhecimento.
LEONARDO. A PITTURA È COSA MENTALE
Inovações técnicas implementadas por Leonardo da
Vinci:
• técnica do sfumato – produzir suaves gradações entre
os tons, suavizando as transições entre o claro--
escuro (esfumar os contornos das formas);
• perspetiva aérea – à medida que as formas se
esbatem no horizonte perdem nitidez e definição de
tonalidades, adquirindo um tom azulado ou
acinzentado por efeitos atmosféricos.
LEONARDO E A CAPTAÇÃO DA DIMENSÃO PSICOLÓGICA
DAS PERSONAGENS
Aspetos mais relevantes:
• mistério da sua identidade: Lisa Gherardini, mulher de
Francesco del Giocondo;
• sorriso estranho e enigmático;
• subjetividade da expressão, produzindo um efeito
misterioso e interrogador;
• profundo retrato psicológico;
• aplicação da perspetiva aérea criando um «ilusionismo
atmosférico» na paisagem;
• subtil modelação das formas através do sfumato;
• obra de uma grande qualidade plástica.
CASO PRÁTICO – A ANUNCIAÇÃO
DE LEONARDO DA VINCI (1472-
75)
A Anunciação, Leonardo da Vinci, 1472-1475.
A Anunciação é uma pintura religiosa, sendo um dos temas mais comuns da
iconografia cristã e da arte mariana católica romana.
O quadro fixa o momento em que o arcanjo Gabriel, enviado por Deus, anuncia à
Virgem Maria ser ela a escolhida para conceber Jesus, Filho de Deus.
Maria encontra-se num
palácio de arquitetura
florentina, num terraço
sobre o jardim, numa zona
mista interior-exterior.
Maria ergue a mão
esquerda em sinal
de respeito e
submissão.
O anjo Gabriel
acaba de chegar e
anuncia:
«Conceberás e
darás à luz um filho
e lhe porás o nome
de Jesus.».
Maria é
surpreendida nos
seus afazeres
quotidianos.
Um muro baixo cerca o jardim,
mas abre-se a meio, deixando ver
um caminho para a floresta, ao
longe, por entre o rosto e a mão
do anjo.
A arca de mármore que recebe o ambão
(a estante de leitura) é uma citação do
Túmulo de Piero e Giovanni de Médicis de
Verrocchio, na Igreja de San Lorenzo, em
Florença.
Segundo o Evangelho de S. João, Maria estaria
a costurar um pano (a «tecer o Véu do
Templo»), mas, na versão de Leonardo está a
folhear a Bíblia, numa premonição do destino.
Análise técnica, formal e plástica:
• aplicação das leis da perspetiva linear;
• aplicação das regras da perspetiva aérea e do sfumato no
tratamento da paisagem;
• a cena está organizada numa composição de ordem
geométrica e clássica;
• a estrutura da composição baseia-se numa pirâmide, o
que lhe confere equilíbrio, escala e proporção;
• as figuras estão desenhadas a partir de rigorosos estudos
de anatomia, movimento e expressão;
• as figuras estão modeladas através da técnica do
chiaroscuro;
• a paisagem, as flores e todos os elementos naturais
evidenciam uma precisão naturalista e o conhecimento
profundo de botânica;
• captação da dimensão psicológica das personagens.
A Anunciação, Leonardo da Vinci, 1472-1475.
A composição estrutura-
se em duas áreas
distintas, dominadas por
cada uma das
personagens.
O centro da composição
é a paisagem, esbatida
ao fundo, evidenciando a
técnica da perspetiva
aérea.
O recurso a um espaço
arquitetónico permite
evidenciar a perspetiva linear e
contextualizar as personagens.
Linha do
horizonte ao
nível dos olhos
do anjo
enquadra toda a
ação.
A composição clássica,
suportada por uma
pirâmide, confere
equilíbrio, ordem e escala
ao tema.
O ventre de Maria
ocupa um «centro
nevrálgico», na
interseção das linhas
estruturantes.
Uma linha
intermédia
acentua a
absoluta
geometrização da
composição.
O centro da composição é a
paisagem, o mar e as
montanhas, constituindo um
«vazio psicológico» onde se
concentra a tensão dramática
da ação.
A Virgem apresenta uma
face humanizada, serena
e inteligente, de acordo
com o contexto cultural
do Renascimento.
O anjo Gabriel segura um lírio
na mão esquerda, símbolo de
brancura, da virgindade e da
pureza de Maria.
O muro que cerca o
pátio é uma alusão
ao «Jardim de
Éden», perdido para
os homens, mas
recuperado pela
obediência de
Maria que permitiu
a «Encarnação do
Verbo».
Toda a ação incide na
dimensão psicológica das
personagens: nos seus
gestos, nas suas
expressões, nas suas
motivações implícitas.
O «tapete» de flores que reveste o pátio
representa a primavera e o
reflorescimento da flora e da fauna. É
uma referência a «25 de março», início
da primavera (no calendário juliano) e
«dia da Anunciação».
É no tratamento dos
panejamentos que
Leonardo evidencia
o seu domínio da
cor, da luz e do
chiaroscuro.
A paisagem, ao
fundo, é
representada através
da técnica do
sfumato e da
perspetiva aérea.
As asas do anjo
são reproduzidas
com rigor
científico a partir
do estudo das
asas dos
pássaros.
Maria é
representada
numa expressão
de extrema
beatitude,
humildade e
encantamento.
A luz divina
incide sobre o
rosto e faz brilhar
os seus cabelos
dourados.
Maria está a ler a
Bíblia, na
passagem em que
o profeta Isaías
anuncia que uma
Virgem conceberá
o Salvador.
A concha (segundo a
mitologia clássica) simboliza
o sexo feminino e a
fertilidade.
A concha está, também,
associada à água, à purificação
e ao Batismo (renovação de
uma vida nova).
No Templo de Salomão
(em Jerusalém), um Véu
separava o Santo dos
Santos do resto do
Templo.
O Véu do Templo
simboliza a separação do
mundo terreno, e a
entrada na «intimidade
com Deus».
Quando Cristo morreu, o
Véu ter-se-á rasgado de alto
a baixo, desvelando a
Verdade, permitindo o
acesso a Deus.
Três ciprestes dividem o
espaço de ação do Anjo:
representam o Filho, o
Pai e o Espírito Santo.
Sete pinheiros definem o
pano de fundo da
paisagem.
O cipreste é a árvore da vida,
símbolo da imortalidade e da
ressurreição.
O pinheiro representa a força
vital, inquebrantável e
imortal.
A porta entreabre-
se deixando ver o
tálamo (o leito
conjugal), símbolo
da união entre o
divino e o
humano, de um
modo
transcendente.
O quarto cipreste
simboliza o Homem,
pecador mas redimido
através da submissão de
Maria.
A montanha, no centro ao
fundo, simboliza a
transcendência,
a ascensão ao Céu, representa
o contacto do Homem com o
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  • 2. A PINTURA RENASCENTISTA: O HOMEM COMO UNIDADE DE MEDIDA  No Renascimento, a arte é enquadrada em conceitos e metodologias de bases científicas, tornando-se numa «realidade» tão demonstrável como qualquer outra ciência.  Também o artista vê alterar o seu estatuto social, sendo reconhecido como um erudito, um humanista e um criador informado e inspirado por Deus.
  • 3. A PINTURA RENASCENTISTA: O HOMEM COMO UNIDADE DE MEDIDA  No Renascimento, o Homem é tomado como Unidade de Medida de todas as coisas.  O Homem é referência e objeto de todas as pesquisas plásticas e pictóricas.  Tal como na Antiguidade Clássica, a finalidade da arte é atingir o Belo sob a forma da representação perfeita do Homem, da Natureza, do espaço e das coisas que o habitam.
  • 4. A PINTURA RENASCENTISTA: O HOMEM COMO UNIDADE DE MEDIDA Madona com o Menino Entronizada entre S. João Batista e S. Sebastião, Pietro Perugino, 1493. O programa da pintura renascentista apresenta as características seguintes: • o desenho é um meio privilegiado para a aplicação da perspetiva com rigor científico; • a cor tem um papel vital na definição da dimensão psicológica das personagens; • o chiaroscuro (o tratamento do claro-escuro) é um recurso indispensável à modelação tridimensional dos volumes.
  • 5. A PESQUISA EM TORNO DA PERSPETIVA PF LH PF – PONTO DE FUGA LH – LINHA DO HORIZONTE O atual conceito e método da perspetiva nasceu no Renascimento com Brunelleschi, c. 1420, e apresenta as características seguintes: • traçam-se linhas formando uma pirâmide cujo vértice é o ponto de fuga; • o eixo da pirâmide une o olho (ponto de vista) com o vértice (ponto de fuga); • a base da pirâmide, onde se forma a imagem, resulta de um corte efetuado por um plano perpendicular ao eixo – o quadro onde se simula a realidade que o observador contempla.
  • 6. A PESQUISA EM TORNO DA PERSPETIVA Demonstração do Sistema de Perspetiva Linear, Albrecht Dürer, Tratado de Geometria, 1525. • Foi Alberti que, no tratado De Pictura (1435), definiu o quadro como «uma janela aberta para o mundo», numa aproximação ao conceito de perspetiva. • Para demonstrar o rigor e a objetividade da perspetiva, Dürer concebeu um engenho para reproduzir imagens, como se se tratasse do registo de uma experiência científica.
  • 7. A PESQUISA EM TORNO DA PERSPETIVA  Piero della Francesca dedicou-se a aprofundar os conhecimentos sobre a perspetiva que deixou escritos no seu tratado De prospectiva pingendi (1472). Nesse tratado, Piero della Francesca define a perspetiva com as características seguintes: • integração das figuras num espaço arquitetónico, para acentuar os efeitos das linhas de perspetiva; • rigor no traçado das linhas de perspetiva, seguindo conhecimentos de geometria para as proporções relativas entre as figuras; • composição seguindo traçados racionais e geométricos.
  • 8. A PESQUISA EM TORNO DA PERSPETIVA A Trindade, Masaccio, Igreja de Santa Maria Novella, Florença, c. 1420.  Masaccio (1401-1428) foi o primeiro grande pintor italiano depois de Giotto e um dos primeiros a desenvolver a perspetiva criada por Brunelleschi.
  • 9. A PESQUISA EM TORNO DA PERSPETIVA A Trindade, Masaccio, Igreja de Santa Maria Novella, Florença, c. 1420. Em A Trindade, Masaccio aprofundou o realismo da representação através dos aspetos seguintes: • criação da ilusão de profundidade através da aplicação da perspetiva; • tratamento do volume dos corpos, através dos efeitos de claro-escuro; • utilização de elementos arquitetónicos clássicos.
  • 10. A técnica da perspetiva linear possibilitou a ilusão de profundidade. Uma das primeiras obras de pintura a fazer uso dos princípios desenvolvidos por Brunelleschi foi A Santíssima Trindade (1425-28) de Masaccio. 1. Cristo surge ao centro. 2. O Pai segura a cruz, em 2º plano. 3. Entre os dois está o símbolo do Espírito Santo. 4. Aos pés da cruz Nossa Senhora e São João Evangelista. 5. Junto às pilastras os doadores. 6. Cria a ilusão de abertura de um espaço na parede através dos elementos arquitetónicos. 7. Os caixotões permitem estabelecer as linhas paralelas e acentuam a profundidade. 8. As linhas convergem para os pés da cruz.
  • 11. A PESQUISA EM TORNO DA PERSPETIVA Lamentação sobre Cristo Morto, Andrea Mantegna, 1475-1478.  Andrea Mantegna (1431-1506) foi um exímio executante dos princípios da perspetiva linear.  Na obra Lamentação sobre Cristo Morto, o corpo de Cristo é representado deitado e num ponto de vista rasante com os pés em primeiro plano.
  • 12. NOVOS PROCESSOS, NOVAS TÉCNICAS, NOVOS TEMAS Novos processos: • Perspetiva – processo geométrico que permitia representar com rigor o espaço e as formas tridimensionais numa superfície plana. • Naturalismo – interesse pelo estudo da Natureza e da anatomia da figura humana como forma de obter maior realismo nas representações. • Enquadramentos arquitetónicos – construção de cenários arquitetónicos sob efeitos de perspetiva. • Novos suportes de pintura – pintura em madeira e cavalete (telas) facilitando a circulação das obras e a difusão de novas ideias estéticas.
  • 13. NOVOS PROCESSOS, NOVAS TÉCNICAS, NOVOS TEMAS Novas técnicas: • Pintura a óleo – técnica importada da Flandres que permitia um maior tempo de secagem e a realização de modelados e velaturas. • Utilização do sfumato – esbatimento dos tons de modo a gerar uma transição suave luz-sombra (chiaroscuro). • Novos pigmentos aglutinantes – enriquecimento da gradação de cor, o que facilitou a modelação das formas e dos volumes, e a criação de atmosferas mais luminosas.
  • 14. NOVOS PROCESSOS, NOVAS TÉCNICAS, NOVOS TEMAS Novos temas: • Retrato – o Humanismo, o Individualismo e o culto da personalidade próprios do Renascimento fizeram crescer o gosto pelo retrato como afirmação social e cultural. • Nu – a «descoberta» do Homem, da sua anatomia e perfeição das formas, o nu está ligado à tradição greco-romana. • Paisagem – o estudo do mundo envolvente e a representação da Natureza (dos ambientes) é um tema ideal para a aplicação dos novos recursos técnicos e plásticos.
  • 15. LEONARDO E A CAPTAÇÃO DA DIMENSÃO PSICOLÓGICA DAS PERSONAGENS  Leonardo da Vinci é considerado um dos artistas mais importantes de toda a História. As suas capacidades intelectuais revelaram-se em áreas tão distintas como: • a pintura, a escultura e a arquitetura; • a poesia e a música; • a matemática, a geometria e a engenharia; • a astronomia, a filosofia e as ciências naturais.
  • 16. LEONARDO E A CAPTAÇÃO DA DIMENSÃO PSICOLÓGICA DAS PERSONAGENS A Última Ceia, Leonardo da Vinci, fresco na Igreja de Santa Maria das Graças, Milão, 1495-1498.  Para Leonardo, a pintura devia ser muito mais do que a representação fiel e exata do real, devia ser mais do que a simples «recriação da aparência do mundo exterior».  A pintura devia captar a dimensão psicológica das personagens: o seu caráter, a sua expressão, as suas emoções
  • 17. LEONARDO E A CAPTAÇÃO DA DIMENSÃO PSICOLÓGICA DAS PERSONAGENS A Última Ceia, Leonardo da Vinci, fresco na Igreja de Santa Maria das Graças, Milão, 1495-1498.  Em A Última Ceia Leonardo aplicou a perspetiva com rigor científico, esbatendo a distinção entre espaço real e espaço fictício.  Mas o verdadeiro interesse desta pintura e o centro da ação é o drama psicológico das personagens: os seus gestos, as suas expressões e as suas motivações implícitas.
  • 18. LEONARDO. A PITTURA È COSA MENTALE A Virgem dos Rochedos, Leonardo da Vinci, 1495-1508.  Uma das maiores contribuições para a cultura artística foi o Tratado de Pintura (c. 1498), onde Leonardo da Vinci define o desenho e a pintura como cosa mentale – um processo intelectual ou um meio que conduz à experimentação e ao conhecimento.
  • 19. LEONARDO. A PITTURA È COSA MENTALE Inovações técnicas implementadas por Leonardo da Vinci: • técnica do sfumato – produzir suaves gradações entre os tons, suavizando as transições entre o claro-- escuro (esfumar os contornos das formas); • perspetiva aérea – à medida que as formas se esbatem no horizonte perdem nitidez e definição de tonalidades, adquirindo um tom azulado ou acinzentado por efeitos atmosféricos.
  • 20. LEONARDO E A CAPTAÇÃO DA DIMENSÃO PSICOLÓGICA DAS PERSONAGENS Aspetos mais relevantes: • mistério da sua identidade: Lisa Gherardini, mulher de Francesco del Giocondo; • sorriso estranho e enigmático; • subjetividade da expressão, produzindo um efeito misterioso e interrogador; • profundo retrato psicológico; • aplicação da perspetiva aérea criando um «ilusionismo atmosférico» na paisagem; • subtil modelação das formas através do sfumato; • obra de uma grande qualidade plástica.
  • 21. CASO PRÁTICO – A ANUNCIAÇÃO DE LEONARDO DA VINCI (1472- 75)
  • 22. A Anunciação, Leonardo da Vinci, 1472-1475. A Anunciação é uma pintura religiosa, sendo um dos temas mais comuns da iconografia cristã e da arte mariana católica romana. O quadro fixa o momento em que o arcanjo Gabriel, enviado por Deus, anuncia à Virgem Maria ser ela a escolhida para conceber Jesus, Filho de Deus.
  • 23. Maria encontra-se num palácio de arquitetura florentina, num terraço sobre o jardim, numa zona mista interior-exterior. Maria ergue a mão esquerda em sinal de respeito e submissão. O anjo Gabriel acaba de chegar e anuncia: «Conceberás e darás à luz um filho e lhe porás o nome de Jesus.». Maria é surpreendida nos seus afazeres quotidianos. Um muro baixo cerca o jardim, mas abre-se a meio, deixando ver um caminho para a floresta, ao longe, por entre o rosto e a mão do anjo. A arca de mármore que recebe o ambão (a estante de leitura) é uma citação do Túmulo de Piero e Giovanni de Médicis de Verrocchio, na Igreja de San Lorenzo, em Florença. Segundo o Evangelho de S. João, Maria estaria a costurar um pano (a «tecer o Véu do Templo»), mas, na versão de Leonardo está a folhear a Bíblia, numa premonição do destino.
  • 24. Análise técnica, formal e plástica: • aplicação das leis da perspetiva linear; • aplicação das regras da perspetiva aérea e do sfumato no tratamento da paisagem; • a cena está organizada numa composição de ordem geométrica e clássica; • a estrutura da composição baseia-se numa pirâmide, o que lhe confere equilíbrio, escala e proporção; • as figuras estão desenhadas a partir de rigorosos estudos de anatomia, movimento e expressão; • as figuras estão modeladas através da técnica do chiaroscuro; • a paisagem, as flores e todos os elementos naturais evidenciam uma precisão naturalista e o conhecimento profundo de botânica; • captação da dimensão psicológica das personagens. A Anunciação, Leonardo da Vinci, 1472-1475.
  • 25. A composição estrutura- se em duas áreas distintas, dominadas por cada uma das personagens. O centro da composição é a paisagem, esbatida ao fundo, evidenciando a técnica da perspetiva aérea. O recurso a um espaço arquitetónico permite evidenciar a perspetiva linear e contextualizar as personagens. Linha do horizonte ao nível dos olhos do anjo enquadra toda a ação. A composição clássica, suportada por uma pirâmide, confere equilíbrio, ordem e escala ao tema. O ventre de Maria ocupa um «centro nevrálgico», na interseção das linhas estruturantes. Uma linha intermédia acentua a absoluta geometrização da composição.
  • 26. O centro da composição é a paisagem, o mar e as montanhas, constituindo um «vazio psicológico» onde se concentra a tensão dramática da ação. A Virgem apresenta uma face humanizada, serena e inteligente, de acordo com o contexto cultural do Renascimento. O anjo Gabriel segura um lírio na mão esquerda, símbolo de brancura, da virgindade e da pureza de Maria. O muro que cerca o pátio é uma alusão ao «Jardim de Éden», perdido para os homens, mas recuperado pela obediência de Maria que permitiu a «Encarnação do Verbo». Toda a ação incide na dimensão psicológica das personagens: nos seus gestos, nas suas expressões, nas suas motivações implícitas. O «tapete» de flores que reveste o pátio representa a primavera e o reflorescimento da flora e da fauna. É uma referência a «25 de março», início da primavera (no calendário juliano) e «dia da Anunciação».
  • 27. É no tratamento dos panejamentos que Leonardo evidencia o seu domínio da cor, da luz e do chiaroscuro. A paisagem, ao fundo, é representada através da técnica do sfumato e da perspetiva aérea. As asas do anjo são reproduzidas com rigor científico a partir do estudo das asas dos pássaros. Maria é representada numa expressão de extrema beatitude, humildade e encantamento. A luz divina incide sobre o rosto e faz brilhar os seus cabelos dourados. Maria está a ler a Bíblia, na passagem em que o profeta Isaías anuncia que uma Virgem conceberá o Salvador. A concha (segundo a mitologia clássica) simboliza o sexo feminino e a fertilidade. A concha está, também, associada à água, à purificação e ao Batismo (renovação de uma vida nova). No Templo de Salomão (em Jerusalém), um Véu separava o Santo dos Santos do resto do Templo. O Véu do Templo simboliza a separação do mundo terreno, e a entrada na «intimidade com Deus». Quando Cristo morreu, o Véu ter-se-á rasgado de alto a baixo, desvelando a Verdade, permitindo o acesso a Deus.
  • 28. Três ciprestes dividem o espaço de ação do Anjo: representam o Filho, o Pai e o Espírito Santo. Sete pinheiros definem o pano de fundo da paisagem. O cipreste é a árvore da vida, símbolo da imortalidade e da ressurreição. O pinheiro representa a força vital, inquebrantável e imortal. A porta entreabre- se deixando ver o tálamo (o leito conjugal), símbolo da união entre o divino e o humano, de um modo transcendente. O quarto cipreste simboliza o Homem, pecador mas redimido através da submissão de Maria. A montanha, no centro ao fundo, simboliza a transcendência, a ascensão ao Céu, representa o contacto do Homem com o divino.