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“A luta contra a fome passa necessariamente pela reorganização do Aparelho de Estado” -
Samora Moisés Machel, 1º Presidente da República de Moçambique
Um país que não sabe identificar suas prioridades é um país que será sempre jogado ao
despesismo e a ignorância dos reais problemas enfrentados por seus cidadãos, por isso vemos os
espectáculos de importações de carros de altos níveis (de preços exorbitantes) em momentos em
que ainda parece não se perceber onde injectar os fundos que aparentemente sobram nos cofres
do estado.
Vivemos, ainda, numa realidade em que crianças definham de fome, mães não conseguem tirar
leite de qualidade por falta de alimentação adequada que fortalece seu leite com nutrientes para
melhor saúde do seu bebé. Mas ao mesmo tempo estamos nesta lenga-lenga de um povo que vive
em dualidades (um governo de luxo versus sociedade analfabeta e pobre).
Quando Beatriz Buchilli (PGR) apresentava o relatório sobre a corrupção na Assembleia da
República, disse ser imperioso recuperar os activos derivados dos actos de corrupção. Tal
discurso que põe em causa o que realmente acontece no cenário moçambicano. Ora vejamos:
Numa altura em que Moçambique ocupava a posição 112ª (2015), num total de 168 países
envolvidos, em 2016 caiu 32 lugares no Ranking da Transparência Internacional (TI), ocupando
a posição 142 (sendo a Dinarmarca o 1º lugar), num total de 177 países.
É importante perceber que tais quedas são, sem dúvidas, resultantes das dívidas ocultas, casos de
suborno da Embraer com envolvimento de altos quadros do país na compra de aeronaves, sem
falar dos empréstimos da EMATUM, MAM, PROINDICUS. Todos estes factores que
catapultam os custos da corrupção em Moçambique, fazem do país ocupar a pior posição desde
que o ranking começou a ser publicado a 22 anos, se formos a analisar os relatórios da
Transparência Internacional.
Em 2015, segundo o Gabinete Central de Combate a Corrupção (GCCC), Moçambique perdeu
80 milhões de dólares, dos quais apenas 14 milhoes foram recuperados, o que nos desafia a
melhorar os nossos sistemas de fiscalização (pode ser através de monitorias e avaliação nos
diversos sectores do estado, penalisando os infratctores (mas como fazê-lo, se os que cometem
tais atrocidades são os próprios que ocupam cargos de mais elevada relevância?) e, sem dúvidas,
saber apostar em políticas de prestação de contas. Falo claro de prestação de contas racionais e
fiáveis.
Antes de me alongar convido a ler o trecho de um dos discursos de Samora Moisés Machel
proferido numa reunião do Bureau Político com a população, em Nampula, 1984:
"O IV Congresso, o Comité Central, determinaram que é necessário reduzir o efectivo do
Aparelho de Estado. É preciso fazer dos Ministérios uma estrutura pequena, forte, contundente,
altamente disciplinada e executiva. Esta deve ser a primeira característica dos Ministérios que
queremos, nossos.
A segunda característica é que o pessoal deve ser qualificado, competente, operativo, eficiente,
eficaz e capaz.
A terceira característica é que o Ministério deve ser uma estrutura dinâmica, capaz de operar 24
horas sobre 24 horas.
Mas não conseguimos fazer isso até hoje, ao nível do Aparelho de Estado. Acomodamos lá
preguiçosos, ladrões, desviadores dos bens do Estado.Acomodamos lá pessoal incompetente,
incapaz, que não sabe o que é cortesia, que não sabe a quem está a servir. Não sabe ser servidor
do povo, nem sabe mesmo o que é o povo. Não tem patrão. Sente-se, ele próprio, como sendo a
autoridade, como sendo o poder, como sendo o povo, como sendo tudo! (Risos). É isto o nosso
Aparelho de Estado! Isto acontece no nosso Aparelho de Estado, porque estes meus colegas
Ministros gostam de ter muito pessoal, para ficarem muito grandes também! É por isso que
prolifera nos Ministérios gente incompetente. Quando têm um dactilógrafo incompetente, eles
admitem mais três, para fazerem o trabalho de um. Por vezes, no lugar de um admitem quatro e
no lugar de dois, admitem oito!
Assim, como vai ser dinâmica e contundente a estrutura?
Não expulsamos a incompetência, a incapacidade. Acomodamos, sim, a ignorância, a arrogância,
a prepotência. Fazemos desses incompetentes nossos aduladores, nossos admiradores.
Não expulsamos, não punimos, não prendemos os motoristas que destroem carros do Estado, que
atropelam e matam cidadãos. Não prendemos, não julgamos, não condenamos os que desviam os
bens do Estado . É assim que o nosso Aparelho de Estado está infiltrado.
Mas a luta contra a fome passa necessariamente pela reorganização do Aparelho de Estado, pela
eliminação dos prepotentes, dos arrogantes, dos preguiçosos, dos ladrões no Aparelho de
Estado."
Certamente que depois de ler o trecho, acima, do discurso de Samora Machel [1] notamos, na
actualidade, uma roptura com aquilo que chamaria de valorização racional de um povo, ou se
ainda preferirmos, o respeito pelas lideranças no contexto africano, particularmente em
Moçambique (se formos a tomar este discurso na essência da palavra). Há, sem dúvidas, a
necessidade de uma reestruturação da máquina do estado, mas que tal resstruturação significa,
também, a participação da sociedade na implementação de tais anseios.
Continuar cego nao é uma opção para quem sabe que ainda pode recuperar a “visão”, mas estar
paralítico e ver seu país ruir pode ser alternativa de quem acredita que somente as futuras
gerações serão as responsáveis por uma mudança. Coloco, neste sentido, a aparente dualidade de
Homens que não sabem se decidem acordar para tomar banho ou continuam na manta e sentem a
quentura (da manta) que pode retardar o seu desenvolvimento.
Quando Samora Machel diz que “É preciso fazer dos Ministérios uma estrutura pequena” desafia
a sociedade (moçambicana) a repensar não só nos seus gastos, mas também numa ética laboral
que significa acima de tudo perceber que há uma nação que precisa de atenção e não um
escritório cheio de mao-de-obra ineficiente. Aliás, pensar nesta perspectiva de Samora Machael,
provavelmente nos faça repensar no como formatar (recriar) ministérios que já se encontram
enfermados de lerdeza, ineficiência e acima de tudo do desconhecimento sobre as suas reais
funções.
Sem dúvidas que a necessidade de “o pessoal deve ser qualificado” deve/deveria ser uma aposta
a se levar a sérios se o que se precisar for um estado virado para o futuro. Um futuro de
oportunidades e de desenvolvimento, onde as “doenças crónicas e agudas” etc sejam uma utopia
porque o estado/governo disponibilizou recursos para lutar contra as diversas doenças fatais que
aniquilam gente e crianças desnutridas.
Quando Samora Machel desafia que “o Ministério deve ser uma estrutura dinâmica, capaz de
operar 24 horas sobre 24 horas”, certamente remete-me as ausênicas massivas que se notam
durante as horas do trabalho nos diversos sectores do estado (e nao só). Tais desistências que
amortecem e desaceleram a função pública, por isso que temos uma administração pública
enferujada e asfixiada e deixada aos relento. Claro que a sua reactualização significa uma
“limpeza institucional” séria, no sentido de perceber, de forma séria, a necessidade de galvanizar
a máquina do estado para garantir o seu desenvolvimento, de forma mais produtiva, celere e
acima de tudo inclusivo.
Reflectindo sobre a visão de Samora Machel quando diz “Acomodamos lá (no Aparelho do
Estado) pessoal incompetente, incapaz, que não sabe o que é cortesia”, percebo a falta de
seriedade no que tange a forma como so funcionários públicos percebem o seu dever de servir.
Disse DEVER, porque é sim uma missão que se tem a cumprir, atender de forma cordial os
utentes e não como se nada se tratasse (que se leia o Estatuto e Regulamento dos Funcionários e
Agentes do Estado para se perceber como se portar e o que seria incompatibilidades nos
funcionários do estado).
Samora Machel dizia que “quando um gato foge e vai viver no mato e só visita a casa para
roubar ouvos e galinhas já não é gato, mas sim uma góia”. Faço esta analogia olhando para os
diversos sectores do Aparelho do Estado que, nas suas anomalias, continuam se enfraquecendo
cada vez mais, como se não soubessem identicar dificuldades e através de uma analise FOFA
(Forças, Oportunidas, Fraquezas e Ameaças) criar ideias/políticas para o desenvolvimento,
criando novas rédeas que dinamizem e fortifiquem aquilo que são ambições da nação (ou será
que não temos ambições como estado?).
Soluções? Há várias, mas de entre elas, acredito ser imperioso que se saiba ser servidor do povo
e saber o que é o povo. Não se pode continuar com um discurso de que “o povo é o patrão”, se
esquecemos dele (o povo) nas tomadas de decisão e quando os dirigentes se sobrepõem ao povo.
Acho também importante a racionalização dos fundos do estado, porque somente dessa forma se
poderá perceber que “a luta contra a fome passa necessariamente pela reorganização do Aparelho
de Estado”.
Sérgio dos Céus Nelson

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  • 1. “A luta contra a fome passa necessariamente pela reorganização do Aparelho de Estado” - Samora Moisés Machel, 1º Presidente da República de Moçambique Um país que não sabe identificar suas prioridades é um país que será sempre jogado ao despesismo e a ignorância dos reais problemas enfrentados por seus cidadãos, por isso vemos os espectáculos de importações de carros de altos níveis (de preços exorbitantes) em momentos em que ainda parece não se perceber onde injectar os fundos que aparentemente sobram nos cofres do estado. Vivemos, ainda, numa realidade em que crianças definham de fome, mães não conseguem tirar leite de qualidade por falta de alimentação adequada que fortalece seu leite com nutrientes para melhor saúde do seu bebé. Mas ao mesmo tempo estamos nesta lenga-lenga de um povo que vive em dualidades (um governo de luxo versus sociedade analfabeta e pobre). Quando Beatriz Buchilli (PGR) apresentava o relatório sobre a corrupção na Assembleia da República, disse ser imperioso recuperar os activos derivados dos actos de corrupção. Tal discurso que põe em causa o que realmente acontece no cenário moçambicano. Ora vejamos: Numa altura em que Moçambique ocupava a posição 112ª (2015), num total de 168 países envolvidos, em 2016 caiu 32 lugares no Ranking da Transparência Internacional (TI), ocupando a posição 142 (sendo a Dinarmarca o 1º lugar), num total de 177 países. É importante perceber que tais quedas são, sem dúvidas, resultantes das dívidas ocultas, casos de suborno da Embraer com envolvimento de altos quadros do país na compra de aeronaves, sem falar dos empréstimos da EMATUM, MAM, PROINDICUS. Todos estes factores que catapultam os custos da corrupção em Moçambique, fazem do país ocupar a pior posição desde que o ranking começou a ser publicado a 22 anos, se formos a analisar os relatórios da Transparência Internacional. Em 2015, segundo o Gabinete Central de Combate a Corrupção (GCCC), Moçambique perdeu 80 milhões de dólares, dos quais apenas 14 milhoes foram recuperados, o que nos desafia a melhorar os nossos sistemas de fiscalização (pode ser através de monitorias e avaliação nos diversos sectores do estado, penalisando os infratctores (mas como fazê-lo, se os que cometem
  • 2. tais atrocidades são os próprios que ocupam cargos de mais elevada relevância?) e, sem dúvidas, saber apostar em políticas de prestação de contas. Falo claro de prestação de contas racionais e fiáveis. Antes de me alongar convido a ler o trecho de um dos discursos de Samora Moisés Machel proferido numa reunião do Bureau Político com a população, em Nampula, 1984: "O IV Congresso, o Comité Central, determinaram que é necessário reduzir o efectivo do Aparelho de Estado. É preciso fazer dos Ministérios uma estrutura pequena, forte, contundente, altamente disciplinada e executiva. Esta deve ser a primeira característica dos Ministérios que queremos, nossos. A segunda característica é que o pessoal deve ser qualificado, competente, operativo, eficiente, eficaz e capaz. A terceira característica é que o Ministério deve ser uma estrutura dinâmica, capaz de operar 24 horas sobre 24 horas. Mas não conseguimos fazer isso até hoje, ao nível do Aparelho de Estado. Acomodamos lá preguiçosos, ladrões, desviadores dos bens do Estado.Acomodamos lá pessoal incompetente, incapaz, que não sabe o que é cortesia, que não sabe a quem está a servir. Não sabe ser servidor do povo, nem sabe mesmo o que é o povo. Não tem patrão. Sente-se, ele próprio, como sendo a autoridade, como sendo o poder, como sendo o povo, como sendo tudo! (Risos). É isto o nosso Aparelho de Estado! Isto acontece no nosso Aparelho de Estado, porque estes meus colegas Ministros gostam de ter muito pessoal, para ficarem muito grandes também! É por isso que prolifera nos Ministérios gente incompetente. Quando têm um dactilógrafo incompetente, eles admitem mais três, para fazerem o trabalho de um. Por vezes, no lugar de um admitem quatro e no lugar de dois, admitem oito! Assim, como vai ser dinâmica e contundente a estrutura? Não expulsamos a incompetência, a incapacidade. Acomodamos, sim, a ignorância, a arrogância, a prepotência. Fazemos desses incompetentes nossos aduladores, nossos admiradores.
  • 3. Não expulsamos, não punimos, não prendemos os motoristas que destroem carros do Estado, que atropelam e matam cidadãos. Não prendemos, não julgamos, não condenamos os que desviam os bens do Estado . É assim que o nosso Aparelho de Estado está infiltrado. Mas a luta contra a fome passa necessariamente pela reorganização do Aparelho de Estado, pela eliminação dos prepotentes, dos arrogantes, dos preguiçosos, dos ladrões no Aparelho de Estado." Certamente que depois de ler o trecho, acima, do discurso de Samora Machel [1] notamos, na actualidade, uma roptura com aquilo que chamaria de valorização racional de um povo, ou se ainda preferirmos, o respeito pelas lideranças no contexto africano, particularmente em Moçambique (se formos a tomar este discurso na essência da palavra). Há, sem dúvidas, a necessidade de uma reestruturação da máquina do estado, mas que tal resstruturação significa, também, a participação da sociedade na implementação de tais anseios. Continuar cego nao é uma opção para quem sabe que ainda pode recuperar a “visão”, mas estar paralítico e ver seu país ruir pode ser alternativa de quem acredita que somente as futuras gerações serão as responsáveis por uma mudança. Coloco, neste sentido, a aparente dualidade de Homens que não sabem se decidem acordar para tomar banho ou continuam na manta e sentem a quentura (da manta) que pode retardar o seu desenvolvimento. Quando Samora Machel diz que “É preciso fazer dos Ministérios uma estrutura pequena” desafia a sociedade (moçambicana) a repensar não só nos seus gastos, mas também numa ética laboral que significa acima de tudo perceber que há uma nação que precisa de atenção e não um escritório cheio de mao-de-obra ineficiente. Aliás, pensar nesta perspectiva de Samora Machael, provavelmente nos faça repensar no como formatar (recriar) ministérios que já se encontram enfermados de lerdeza, ineficiência e acima de tudo do desconhecimento sobre as suas reais funções. Sem dúvidas que a necessidade de “o pessoal deve ser qualificado” deve/deveria ser uma aposta a se levar a sérios se o que se precisar for um estado virado para o futuro. Um futuro de oportunidades e de desenvolvimento, onde as “doenças crónicas e agudas” etc sejam uma utopia porque o estado/governo disponibilizou recursos para lutar contra as diversas doenças fatais que aniquilam gente e crianças desnutridas.
  • 4. Quando Samora Machel desafia que “o Ministério deve ser uma estrutura dinâmica, capaz de operar 24 horas sobre 24 horas”, certamente remete-me as ausênicas massivas que se notam durante as horas do trabalho nos diversos sectores do estado (e nao só). Tais desistências que amortecem e desaceleram a função pública, por isso que temos uma administração pública enferujada e asfixiada e deixada aos relento. Claro que a sua reactualização significa uma “limpeza institucional” séria, no sentido de perceber, de forma séria, a necessidade de galvanizar a máquina do estado para garantir o seu desenvolvimento, de forma mais produtiva, celere e acima de tudo inclusivo. Reflectindo sobre a visão de Samora Machel quando diz “Acomodamos lá (no Aparelho do Estado) pessoal incompetente, incapaz, que não sabe o que é cortesia”, percebo a falta de seriedade no que tange a forma como so funcionários públicos percebem o seu dever de servir. Disse DEVER, porque é sim uma missão que se tem a cumprir, atender de forma cordial os utentes e não como se nada se tratasse (que se leia o Estatuto e Regulamento dos Funcionários e Agentes do Estado para se perceber como se portar e o que seria incompatibilidades nos funcionários do estado). Samora Machel dizia que “quando um gato foge e vai viver no mato e só visita a casa para roubar ouvos e galinhas já não é gato, mas sim uma góia”. Faço esta analogia olhando para os diversos sectores do Aparelho do Estado que, nas suas anomalias, continuam se enfraquecendo cada vez mais, como se não soubessem identicar dificuldades e através de uma analise FOFA (Forças, Oportunidas, Fraquezas e Ameaças) criar ideias/políticas para o desenvolvimento, criando novas rédeas que dinamizem e fortifiquem aquilo que são ambições da nação (ou será que não temos ambições como estado?). Soluções? Há várias, mas de entre elas, acredito ser imperioso que se saiba ser servidor do povo e saber o que é o povo. Não se pode continuar com um discurso de que “o povo é o patrão”, se esquecemos dele (o povo) nas tomadas de decisão e quando os dirigentes se sobrepõem ao povo. Acho também importante a racionalização dos fundos do estado, porque somente dessa forma se poderá perceber que “a luta contra a fome passa necessariamente pela reorganização do Aparelho de Estado”. Sérgio dos Céus Nelson