1. Rev. ciênc. hum, Taubaté, v. 11, n. 2, p. 129-135, jul./dez. 2005. 129
O ensino da Geografia Física sob a
perspectiva ambiental
Fabio de Oliveira Sanches
Departamento de Ciências Sociais e Letras
Universidade de Taubaté
RESUMO
Graças à perspectiva ambiental dos últimos anos, a
Geografia Física, discriminada durante quase uma dé-
cada, retoma posição de destaque, tanto no ensino
superior, como na formação básica. Tal posição de
destaque foi decorrente da necessidade de se resga-
tar os conteúdos físicos da Geografia devido a uma
nova abordagem de ensino. O encontro mundial so-
bre meio ambiente, ocorrido no Rio de Janeiro em
1992, colocou o Brasil em evidência, inserindo-o na
pauta de discussão sobre principais problemas
ambientais mundiais (poluição urbana,desmatamentos
etc.), e promoveu mudanças internas significativas. Em
relação à Educação Básica, a instituição dos Parâmetros
Curriculares Nacionais (PCN), juntamente com os Te-
mas Transversais, sugeriram que os problemas
ambientais, locais, regionais e mundiais fossem discu-
tidos em sala de aula vinculados às disciplinas de en-
sino. Já no Ensino Superior, os problemas ambientais
assumiram importância como objeto de análise e dis-
cussão nos principais trabalhos acadêmicos. Dessa for-
ma, podemos considerar que houve, necessariamen-
te, um reencontro da Geografia Física com a Geogra-
fia Humana, para que, com base no objeto de estudo
da Geografia (a relação do Homem com o Meio), pos-
sam ser levantadas soluções para os principais proble-
mas de ordem ambiental.
PALAVRAS-CHAVE
Geografia Física. Meio Ambiente. Ensino da Geo-
grafia.
INTRODUÇÃO
A última década do século passado e os primeiros
anos deste século estão marcados por severas e pro-
fundas mudanças, em todo o mundo, na ordem polí-
tica, econômica e social.
Passando por modificações em seus sistemas eco-
nômicos, alguns países despertaram, nesse período
transitório, pretensas crises, que eclodiram e influen-
ciaram a economia em âmbito global. Conflitos étni-
co-religiosos emergiram em alguns deles (Chechenos,
Sérvios, Bósnios, Croatas), bem como, em outros, ver-
dadeiras cruzadas foram levantadas para combater
supostas práticas terroristas (Afeganistão, Iraque), de-
senvolvendo-se, assim, um certo “pano de fundo” para
as verdadeiras questões ligadas à economia e, princi-
palmente,à política internacional.Paralelamente a tudo
isso, questões relacionadas à preservação ambiental
mereceram também o seu destaque no contexto in-
ternacional (Rio-1992, Kyoto-1997, Johannesburgo-
2002), sobretudo quanto à apropriação de recursos
energéticos que, de uma forma ou de outra, estão
ligadas às ordens políticas, econômicas e sociais. Sem
sombra de dúvida, esse período alimentou bastante o
objeto de estudo da ciência geográfica, uma vez que,
no seu bojo, fundamenta a ação do homem e suas
relações com o espaço.
Este trabalho visa demonstrar que, em virtude dessa
perspectiva ambiental, houve uma retomada de inte-
resses relacionados à Geografia Física como instrumen-
to de análise e reflexão das questões ambientais, uma
vez que o Espaço Geográfico – objeto de estudo da
Geografia – é produto da ação humana sobre o ambi-
ente natural e que todas as questões de ordem
ambiental se arranjam como conseqüências dessa re-
lação.
REVISÃO DA LITERATURA
Como para a abordagem e compreensão dos ele-
mentos de caráter ambiental pela Geografia necessi-
ta-se que estejam extremamente bem conceituados
e fundamentados os mecanismos de funcionamento
dos diversos elementos naturais (comportamento do
clima, da dinâmica fluvial, o metabolismo da flora),
houve, ao final da década de 1990, uma espécie de
“redescoberta” da Geografia Física, para atendimento
de tais demandas. Entretanto, é importante salientar
que a afinidade da Geografia Física, como um campo
da ciência geográfica, com a área das Ciências
Ambientais, não deve ser confundida a ponto de ca-
racterizar seu estudo como uma abordagem essenci-
almente ambiental. Brown (1977) alimenta esse con-
texto e, além de resgatar uma antiga discussão da
Geografia Humana versus Geografia Física, reforça os
cuidados que devem ser mantidos em relação à asso-
2. ciação da Geografia Física com as Ciências do Meio
Ambiente, uma vez que, nessa perspectiva, ocorreria
a aproximação de diversos não-geógrafos para o de-
senvolvimento de estudos nessa área.
Já Christofoletti (2002) afirma que as mudanças
ambientais constituem um processo atuante na su-
perfície terrestre desde a constituição do planeta, e
que as transferências de energia que ocorrem nos
sistemas terrestres (atmosfera, hidrosfera, litosfera e
biosfera), desencadeadas pela energia solar, promo-
vem novas transformações, as quais culminam em
novas condições ambientais. Assim, a problemática das
mudanças ambientais insere-se com grande proprie-
dade no campo de ação da Geografia Física. Entretan-
to, o surgimento e a evolução do homem propicia-
ram uma nova força modificadora que se tornou, no
século XX, o mais poderoso agente transformador da
superfície terrestre, graças ao seu desenvolvimento
tecnológico.
OS PRECEDENTES AMBIENTAIS
Em seu trabalho, Moraes (1993) apresenta-nos a
evolução do pensamento geográfico e afirma que é
possível observar que a formação do naturalista
Humboldt, associada as suas diversas viagens, colo-
cou a Geografia como uma disciplina preocupada com
a conexidade dos elementos naturais e sua causalida-
de. No entanto, na visão desse naturalista, caberia ao
homem apenas contemplar a mais pura universalida-
de das coisas, de tudo o que coexiste no espaço e da
simultaneidade de tudo na Terra.
É claro que a metodologia de abordagem de
Humboldt apresentava-se puramente na forma
empírica, ou seja, fundamentada na observação dos
elementos componentes da Terra; entretanto, é pos-
sível abstrair, da sua linha analítica, uma visão integra-
da dos elementos naturais, o que futuramente contri-
buiria, de alguma forma, para a formação e consolida-
ção das idéias de ecossistema.
Notadamente, o mundo passou a assumir uma
preocupação com as questões ambientais após o tér-
mino da 2ª Guerra Mundial, sobretudo mediante o
processo de reconstrução do continente europeu.
A Conferência das Nações Unidas sobre o Meio
Ambiente, na cidade de Estocolmo, em 1972, demons-
trou para o mundo a necessidade de preocupações
relacionadas às questões ambientais. A partir de en-
tão, outros encontros internacionais passaram a discu-
tir a problemática ambiental (Tiblisi, em 1976; Rio de
Janeiro, em 1992; Johannesburgo, em 2002). Já no
Brasil, a criação da Secretaria do Meio Ambiente
(SEMA), nos anos 70, a instituição da Lei sobre Política
Nacional do Meio Ambiente e o Conselho Nacional
do Meio Ambiente (CONAMA), nos anos 80, junta-
mente com o encontro no Rio de Janeiro, em 1992,
colocaram o país no contexto ambiental mundial (EDU-
CAÇÃO, 2001).
A resolução CONAMA 001/86 define que o impac-
to ambiental compreende qualquer alteração das pro-
priedades físicas, químicas e biológicas do meio am-
biente causada pela atividade humana, direta ou indi-
retamente, e, ainda, que o licenciamento de ativida-
des modificadoras do meio ambiente dependerá da
elaboração de Estudo de Impacto Ambiental (EIA) e
respectivo relatório (RIMA) aprovado por órgão com-
petente,
[...] O desafio de superar a crise ecológica ao
nível global deve ser, sem dúvida, uma preo-
cupação de todas as esferas do poder público
e da humanidade como um todo. Nessa dire-
ção, em termos constitucionais, na década de
1980, a Educação Ambiental passou a ser um
dos instrumentos da Política Nacional de Meio
Ambiente, com a promulgação da Constituição
da República Federativa do Brasil, em 1988, seu
artigo 225, estabelece que: “Todos têm direito
ao meio ambiente equilibrado, bem de uso
comum do povo e essencial à sadia qualidade
de vida, impondo-se ao poder público e a cole-
tividade o dever de defendê-lo e preservá-lo
para as presentes e futuras gerações
(MARTIM, 2002).
Martim (2002) ressalta que é função do poder pú-
blico promover a educação ambiental em todos os
níveis de ensino e a conscientização pública sobre a
preservação do meio ambiente.
Desse modo, do ponto de vista geográfico, o res-
gate dos aspectos físicos mostrou-se mais do que ne-
cessário, tanto para a participação do profissional jun-
to à elaboração de tais relatórios, como para a aborda-
gem e o tratamento de tais questões relacionadas à
conceituação e conscientização sobre a ordem
ambiental.
GEOGRAFIA FÍSICA: DO DESENCONTRO AO
REENCONTRO
Com o processo de redemocratização ocorrido no
Brasil em meados dos anos 80, houve praticamente
um completo repúdio no ensino dos conteúdos da
Geografia Física no ensino regular, frente a uma nova
perspectiva no ensino da ciência geográfica que se
contrapunha às velhas bases conceituais/conteúdistas
lecionadas durante o período militar.
A Geografia Crítica, ideologicamente concebida no
bojo marxista e sufocada durante todo o período de
exceção, assume naquele momento uma abordagem
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3. prática nas obras didáticas do ensino da Geografia ao
longo do final dos anos 80 e no início dos anos 90.
A coleção Geografia Crítica (VESENTINI; VLACH,
2001) fora amplamente utilizada como material didá-
tico pelos professores do ensino público. Vieira,
Valadão e Le Sann (2002) analisaram a linha de traba-
lho da referida obra e observaram que a coleção ten-
ta unir a Geografia Crítica com um socio-contrutivismo,
ressaltando que a Geografia proposta na coleção não
elimina o estudo da natureza, mas renova-o.
[...] O manual do professor apresenta temáticas
gerais acerca da coleção, do método de ensi-
no, da construção do saber e do papel do ho-
mem na era da globalização, além do papel do
professor no processo de ensino-aprendizagem.
[...] Essa coleção está voltada para as discus-
sões em torno da Geografia humana, envol-
vendo, principalmente, os aspectos geopolíticos
de organização do espaço mundial. A aborda-
gem dos aspectos físicos é bastante restrita.
Apresenta uma preocupação específica em tor-
no da representação cartográfica, fazendo re-
ferências às novas tecnologias acompanhadas
de textos explicativos e imagens. Entretanto,
no tema relevo, o recurso gráfico priorizado foi
o mapa hipsométrico. Nos quatro volumes, o
relevo é tratado como conteúdo específico de
cada região, ou seja, relevo brasileiro, relevo
africano, relevo europeu, entre outros [...]
(VIEIRA, VALADÃO; LE SANN, 2002).
Observamos, nesse contexto, uma valorização dos
preceitos relacionados aos aspectos da Geografia Hu-
mana, em detrimento dos preceitos da Geografia Físi-
ca. Dessa forma, verifica-se que os conteúdos relacio-
nados à Geografia Física foram praticamente submeti-
dos a um segundo plano de importância no ensino
regular, frente à “preferência” na adoção de discus-
sões e reflexões inseridas em conjecturas humanas e
socioeconômicas.
Somente com a instituição dos Parâmetros
Curriculares Nacionais (PCN) e a proposição dos Te-
mas Transversais (Meio Ambiente, Saúde, Ética,
Pluralidade Cultural, Orientação Sexual e Temas Lo-
cais) essa dicotomia Geografia Humana versus Geo-
grafia Física deixou de prevalecer, sobretudo em rela-
ção à redefinição do objeto de estudo da ciência ge-
ográfica como o produto da relação do Homem com
o Espaço (Meio).
A necessidade do resgate de conceitos, conteú-
dos e fundamentos e esse novo interesse pelo ensino
da Geografia Física foram, dessa forma, calcados na
institucionalização de diretrizes básicas voltadas à ori-
entação do processo de ensino-aprendizagem no En-
sino Fundamental e Médio, destacando os chamados
“Temas Transversais” (LEITE; MININNI-MEDINA, 2001).
Destes, embora todos estejam direta e indiretamente
relacionados entre si e com a Ciência Geográfica, o
Meio Ambiente, foi o responsável por aquele resgate,
uma vez que se compreendeu que a questão
ambiental não se limitava meramente à preservação
de espécies animais e vegetais ou à supressão dos
desmatamentos, mas sim à qualidade de vida do ho-
mem no meio em que vive, sendo ele urbano ou
rural, e aos problemas decorrentes da relação homem-
espaço.
Ferreira (1995 apud SENA, 1999) afirma que a ques-
tão ambiental, para a maioria da população, ainda se
resume aos grandes temas veiculados pela mídia (ca-
mada de ozônio, Amazônia etc.), os quais auxiliam na
difusão dos temas ambientais.
Essa “redescoberta” da Geografia Física, nos anos
90, em virtude do enfoque ambiental, também pode
ser encontrada no trabalho de Suertegaray e Nunes
(2001), que salientam que esse (re)encontro da Geo-
grafia Física não é nada mais do que um (re)encontro
com a Geografia Humana.
Nessa abordagem, é revelado que esse
(re)encontro corresponde ao processo de evolução e
desenvolvimento do próprio pensamento filosófico de
nossa ciência, visto que:
[...] a busca da articulação entre natureza e
sociedade não foi tarefa fácil para os geógrafos.
[...] Construir uma ciência de articulação na
época em que surgiu oficialmente a Geografia
pareceria ser como remar contra a maré, pois
neste período a visão de ciência dominante
privilegiava a divisão entre as ciências da natu-
reza e da sociedade. [...] O que prevaleceu no
final do século XIX e durante mais da metade
do século XX foi a fragmentação. Disso resul-
tou algo comum aos geógrafos: o esfacelamento
da Geografia e, em particular, de uma parte
desta denominada Geografia Física em diferen-
tes campos do conhecimento [...]
(SUERTEGARAY; NUNES, 2001, p. 15-16).
Essa fragmentação científica do século passado
acabou por promover o primeiro impacto na Geogra-
fia Física. Entretanto, hoje, a análise integrada do meio
físico, percorrendo conceitos como os de Paisagem,
Geossistemas ou Sistemas Físicos, reafirma a impor-
tância do estudo da Geografia Física, principalmente
quando relacionada com os aspectos humanos, na
ocupação do espaço.
Suertegaray e Nunes (2001) fundamentam essa
discussão com base nos números apresentados no XXI
Encontro Nacional de Geógrafos (XXI ENG) e no 8°
Encuentro de Geografos de América Latina (8°EGAL),
conforme Tabela 1.
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4. Tabela 1. Temas predominantes na geografia que
trata as questões ambientais
Temas
Unidades de conservação
Diagnóstico ambiental
Impactos ambientais
Zoneamento ecológico/paisagem
Legislação e preservação
Natureza e sociedade
Turismo, apropriação, impactos
Ambiente e planejamento
8°EGAL
4
19
39
2
0
3
10
21
XXI ENG
7
36
66
8
5
5
7
8
Fonte: SUERTEGARAY, D. M. A., NUNES, J. O. R. (2001).
[...] No caso do Encontro Nacional de Geógrafos,
verifica-se um maior número comparados com
a produção na América Latina, não obstante a
produção é restrita. De qualquer forma é pos-
sível visualizar os dados referentes ao XII ENG
um certo equilíbrio nas diferentes áreas. No
caso do 8º EGAL, é nítida a predominância de
trabalhos em Geomorfologia, Climatologia e
Recursos Hídricos. Outro dado importante é o
número de trabalhos nesta área comparado
com as temáticas reconhecidas como da área
humana. No âmbito geral, esses trabalhos não
perfazem um número expressivo [...]
(SUERTEGARAY; NUNES, 2001).
Colangelo (1997) também apresenta sua contribui-
ção, afirmando que fora solicitada à Geografia Física
uma reformulação metodológica significativa em fins
da década de 80 e no início da década de 90, princi-
palmente, na busca de respostas objetivas na avalia-
ção, valoração e elaboração estratégica de interven-
ções sobre as componentes do meio físico, vinculan-
do o rigor taxonômico e mensuração (qualificação e
quantificação dos trabalhos respectivamente), atribu-
tos imprescindíveis nos estudos de diagnósticos e prog-
nósticos dos mais diversos tipos de processos.
Sendo assim, Leite e Mininni-Medina (2001) de-
monstra que, nos objetivos gerais dos PCN e do tema
Meio Ambiente para o Ensino Fundamental e Médio
destacam-se, principalmente, a importância de conhe-
cer a integração e sistematização do ambiente natu-
ral e social e suas inter-relações, observando e anali-
sando fatos e situações do ponto de vista ambiental,
e a ação no sentido de se manter um ambiente sau-
dável a fim de melhorar a qualidade de vida.
Oliveira (2002), por sua vez, enfatiza que a Geo-
grafia, como disciplina escolar, dispõe de uma situa-
ção curricular única, uma vez que é integrante dos
currículos escolares em todos os sistemas educacio-
nais. Assim, o professor de Geografia precisa estar in-
formado quanto às mudanças que vêm ocorrendo na
vida moderna, principalmente na tecnologia da edu-
cação. Como exemplo disso, ressalta que as fotografi-
as aéreas e as imagens de satélites vêm sendo ampla-
mente utilizadas para explicar a organização do espa-
ço urbano e rural.
Na utilização, análise e interpretação de tais ferra-
mentas, necessita-se que sejam levados em conside-
ração, desde fundamentos teóricos relacionados ao
crescimento populacional, passando por questões re-
lacionadas à ordem das políticas públicas e de plane-
jamento urbano, até à própria disponibilidade do es-
paço físico a ser ocupado, quanto as suas
potencialidades e problemáticas ambientais e às ca-
racterísticas intrínsecas dos sensores utilizados, princi-
palmente na área de sensoriamento remoto.
Philippi e Rosa (2001) procuraram identificar os
problemas e potencialidades ambientais nos níveis
global, nacional, regional e local, considerando suas
relações e suas interdependências de forma crítica e
uma visão linear com relação aos problemas
ambientais, demonstrando que a abordagem, nessas
questões, deve ser feita sob uma ótica integrada dos
elementos envolvidos, ou seja, uma visão holística,
em que a Terra merece ser analisada como um “siste-
ma vivo”, na busca de um equilíbrio natural dos seus
processos de evolução.
Nessa relação de dependência haveria problemas
ambientais na entrada do sistema, relacionados com
o próprio sistema, e, ainda, problemas na saída do
sistema, por exemplo: os desmatamentos e proces-
sos erosivos na entrada, o modelo agrícola
implementado em questão (socioeconômico) e gera-
ção energética no próprio sistema, e a poluição das
águas, do ar e dos solos, na saída do sistema.
Nesse caso, é possível observar a mais ampla
integração das áreas do conhecimento geográfico (hu-
mano, físico econômico etc.), na busca do entendi-
mento de toda a problemática ambiental, para com-
preensão dos complexos processos erosivos associa-
dos ao conjunto dos agentes exógenos. Portanto, a
maneira pela qual o homem se apropria do espaço
demonstra e justifica a necessidade de seu estudo
sistemático e integrado, demonstrando, mais do que
nunca, a indissociabilidade dos preceitos físicos e hu-
manos da Geografia.
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5. QUESTÕES AMBIENTAIS E A GEOGRAFIA FÍSICA
As mudanças ambientais incluem uma série de
transformações que ocorrem na superfície terrestre,
de ordem quantitativa e qualitativa, envolvendo seto-
res relacionados à climatologia, à hidrologia, à
geomorfologia, à geologia, à biologia, à ecologia e à
organização do espaço.
Coltrinari (1997) destaca que, em algumas áreas
das ciências sociais, utiliza-se o termo meio ambiente
ou ambiente, em referência ao meio social ou à vida
humana. Já nas ciências naturais e nas áreas das ciên-
cias humanas próximas a elas, sobretudo a Geografia,
os termos referem-se exclusivamente às condições
físicas da Terra e aos componentes e sistemas da
geosfera-biosfera, ainda que modificados pela atua-
ção do homem.
No trabalho de Cunha e Guerra (2000), pode-se
observar uma discussão sobre as causas e conseqüên-
cias da degradação ambiental integrando a
Geomorfologia, a paisagem degradada numa bacia
hidrográfica e seus compartimentos, e, ainda, a degra-
dação ambiental abordada de forma global e holística,
por meio da análise de sua sociedade e relações com
o meio natural.
Segundo essa obra, os processos ambientais, como
a lixiviação, os movimentos de massa e as cheias dos
rios, ocorrem com e sem a intervenção humana, o
chamado Equilíbrio Natural, ou Dinâmico. No entan-
to, o grau de degradação ambiental amplia-se em áre-
as humanizadas, cabendo ao homem o processo de
recuperação, uma vez que a intervenção humana, mal
planejada ou não, intensifica e acelera os problemas
de ordem ambiental. As causas da degradação justifi-
cam-se no crescimento e na concentração
populacional, e também no manejo inadequado dos
solos rurais e urbanos (o corte nas encostas, as encos-
tas desprotegidas, a falta de infra-estrutura para habi-
tação, o mau uso dos solos na agricultura, a erosão
laminar, as ravinas voçorocas etc.).
Christofoletti (2002) afirma que, como conse-
qüência dos estudos relacionados à ordem dos siste-
mas ambientais (climatologia, hidrologia,
geomorfologia biogeografia etc.), novas abordagens
surgirão, mesclando análises do meio físico com as
atividades humanas e apresentando uma nova etapa
no tratamento interdisciplinar, por exemplo, estudos
na bioclimatologia, na biogemorfologia, na economia
ecológica etc.
Quanto à visão da ocupação do espaço em áreas
urbanas, periurbanas e rurais, Agostini (2003) discute
a ocupação, por parte da população, das áreas perifé-
ricas ao município de Taubaté e toda a problemática
decorrente da falta de planejamento urbano. Discute
também a dificuldade de reconhecimento e regula-
mentação de um planejamento pelos órgãos públi-
cos, para obtenção dos mínimos serviços sociais, ocu-
pação de áreas tidas como de proteção ambiental etc.
Trata-se de uma realidade, infelizmente, não exclusi-
va a esse município.
Nesse trabalho, foi possível observar a inter-rela-
ção das questões socioeconômicas, políticas e
ambientais na ocupação do espaço e toda a proble-
mática envolvida.
A abordagem da questão ambiental pela Geogra-
fia Física também deve levar em conta a escala em
que o problema está se apresentando.
Um bom exemplo pode ser observado com rela-
ção aos problemas de ordem climática, haja vista as
mudanças climáticas de âmbito global, nos últimos
anos, que vêm sendo estudadas por instituições de
pesquisa do mundo todo, à procura de um responsá-
vel, ou dos responsáveis, pelo aumento das tempera-
turas médias no Globo, seja de origem natural, seja
de origem antrópica. O mesmo pode ser destacado
quanto aos estudos climáticos em menor escala, con-
siderando-se que os elementos que compõem o cli-
ma (temperatura, ventos, precipitação etc.) sofrem
modificações em seu comportamento, em virtude do
crescimento e expansão das áreas urbanas, como os
fenômenos da “ilha de calor” e o da chamada “inver-
são térmica”.
As obras de Campos (2003) e Marques (2003) de-
monstram a importância de tais temas nos trabalhos
realizados no nível acadêmico; no entanto, a efetiva
aplicação desses temas em salas de aula do Ensino
Fundamental e Médio reforçará o caráter ambiental
da ciência geográfica.
Em Brandão (2001), é possível observar uma refle-
xão sobre os avanços tecnológicos atuais aliados aos
esforços para o conhecimento das forças da natureza
e da vulnerabilidade das sociedades modernas frente
aos chamados eventos naturais extremos, principal-
mente quanto às questões de ordem meteorológica.
As freqüentes enchentes nos grandes centros
populacionais, durante os meses chuvosos, têm sua
origem no processo de ocupação espacial, desenvol-
vimento e expansão das cidades. A ocupação das
margens dos córregos, em virtude da forte especula-
ção imobiliária, a pouca infra-estrutura de suas cons-
truções, somada à impermeabilização do espaço ur-
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6. bano, que acelera o processo de escoamento superfi-
cial da água precipitada, favorecem a ocorrência des-
sas eventuais catástrofes em cidades como São Paulo,
Rio de Janeiro, Salvador.
O crescimento populacional associado à ocupação
do espaço, na maioria das vezes sem o devido plane-
jamento, promove a ocorrência de problemas
ambientais, sobretudo na ocasião desses eventos na-
turais extremos (verão com elevada precipitação, con-
centração das chuvas em um curto período de tempo
etc.), e, muitas vezes, são tidos como os responsáveis
pelas chamadas catástrofes naturais – deslizamentos,
escorregamentos, movimentos de massa etc.
REFLEXÕES FINAIS
Muito longe de esgotar o assunto, procurou-se,
com essa breve articulação de idéias, demonstrar que,
atualmente, o ensino dos conteúdos ligados à Geo-
grafia Física reassumiu um papel de destaque no tra-
tamento e na análise das questões relacionadas à or-
dem ambiental.
Observa-se, também, que tal retomada ocorreu
graças à implantação das propostas dos PCN referen-
tes aos temas transversais, sobretudo em função do
tratamento ao tema meio ambiente, que redirecionou
as atenções para o ensino da Geografia Física, que,
durante o final da década de 1980, fora desprezada,
em virtude das preocupações socioeconômicas calca-
das nos ideais da Geografia Crítica. Essa nova atenção,
despertada pelos estudos geográficos relacionados à
Geografia Física, a partir dos anos 1990, deveu-se a
uma nova proposta de abordagem de seus conteú-
dos, sobretudo sob uma nova postura prática, cami-
nhando para a superação da dicotomia entre a Geo-
grafia Física e a Geografia Humana e demonstrando
que não se pode abandonar o conhecimento dos ele-
mentos da natureza, principalmente porque o homem
mantém profunda relação histórica com a apropria-
ção espacial. Portanto, cabe ao geógrafo, mas não
exclusivamente a ele, analisar, interpretar, estudar e
propor soluções aos problemas do nosso cotidiano.
THE EDUCATION OF PHYSICAL GEOGRAPHY
UNDER THE ENVIROMENTAL PERSPECTIVE
ABSTRACT
Due to the environmental perspective over the last
years, Physical Geography, which was discriminated
for almost one decade, now assumes an outstanding
role not only in the superior education, but also in
basic education. This position was occurred by the
necessity to rescue the physical contents of Geography
because the new teaching approaches. The world
meeting about the environmental held in Rio de Ja-
neiro in 1992, put Brazil in evidence, including the
country in the discussion about the main world
environmental problems (urban pollution,
deforestation, etc.), and promoted significant internal
changes. In relation to the Basic Education, the
institution of “Parâmetros Curriculares Nacionais” (PCN),
with the “Temas Transversais”, suggested that the
environmental, local, regional and world problems
would be discussed in the classrooms linked to the
teaching subject. In the undergraduate courses, the
environmental problems had their importance as
analysis object and discussion inmain academic studies.
Thus, we can consider there was, necessarily, a reunion
with Physical and Human Geography, so that, based
on the study object of geography (the relationship
between man and environment), solutions to the main
environmental problems can be raised.
KEY-WORDS
Physical Geography. Environmental. Teaching of the
Geography.
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Fabio Sanches
é Mestre em Ciências Ambientais e professor dos cursos de Geografia da
Universidade de Taubaté – UNITAU- e do Centro Universitário Salesiano de
São Paulo: Unidade Lorena - UNISAL.
Departamento de Ciências Sociais e Letras
R. Visconde do Rio Branco, 22
centro – Taubaté –SP
CEP. 12.020-040
e-mail: fsanches@unitau.br
TRAMITAÇÃO
Artigo recebido em: 14/10/2004
Aceito para publicação: 25/08/2005
Rev. ciênc. hum, Taubaté, v. 11, n. 2, p. 129-135, jul./dez. 2005. 135