1) O documento analisa uma negociação entre uma empresa espanhola de gestão de centros comerciais chamada Capital Shopping e um retalhista italiano chamado Soleto.
2) A negociação durou 5 anos e falhou devido à falta de comunicação e flexibilidade entre as partes, especialmente da parte do Capital Shopping.
3) O modelo teórico utilizado para analisar a negociação foi o Modelo de Lewis, que categoriza culturas em linear-ativas, multi-ativas e reativas.
1. 1
Licenciatura em Relações Internacionais
Negociação Internacional
Professora Sandrina Antunes
2º semestre | 2019/2020
O Impacto da Cultura na Negociação entre um Centro Comercial
Espanhol e um Retalhista Italiano
António Pedro Magalhães Dias A80937
Mariana Vilela Pereira A83675
Marina Fernandes Alves A85840
Abstract
(PT)
O principal objetivo do nosso trabalho é analisar uma negociação real entre um Centro
Comercial e um retalhista no mercado espanhol. De uma forma mais específica, este estudo de caso
baseia-se na negociação entre uma empresa espanhola de gestão de centros comerciais e um
retalhista italiano pertencente à indústria cosmética e de serviços de saúde.
Além disto, foi analisado alguns pontos negativos relativamente à negociação mencionada,
nomeadamente decorrentes da adoção de um método de negociação distributivo.
A nossa análise baseou-se no que poderia ser melhorado para ultrapassar os aspetos
negativos acima mencionados, realçando a importância do mediador para encontrar uma melhor
solução para todas as partes envolvidas. Também a falta de comunicação entre os negociadores
levou-nos a considerar a importância da inteligência emocional ao longo deste processo.
Por último, a outra parte da análise consistiu na procura de uma possível explicação para
algumas falhas observadas na negociação seguindo o Modelo de Lewis e as suas características.
2. 2
(EN)
The main goal of our essay is to analyse a real case study between a shopping centre and a
retailer in the Spanish Market. In detail, this negotiation is between a Spanish shopping centre
management company and an Italian retailer from the cosmetic and health-care industry, whose
aim is to expand its brand around Europe.
Following this line of thought, it was noticed that the bilateral negotiation mentioned
before failed due to single-issue negotiations associated with a distributive effect approach.
Our analysis focuses on what could be improved and in order to answer this, we consider
appropriate to mention the importance of the mediator to find a better solution for all parties
involved. There was a lack of communication between both parties, so we also considered crucial
to mention the importance of emotional intelligence during this process.
The other part of our analysis is to try to find a possible explanation for the failure of the
negotiation by following the Lewis model and its characteristics.
1. Introdução
Este trabalho foi proposto pela Unidade Curricular de Negociação Internacional, no 2º
semestre do 3º ano da licenciatura de Relações Internacionais e tem como principal objetivo a
análise de uma negociação real internacional entre duas ou mais partes aplicando,
simultaneamente, um modelo teórico à escolha dos alunos.
Neste caso, iremos proceder à análise de uma negociação real entre uma empresa
espanhola de gestão de Centros Comerciais designada de Capital Shopping e um Retalhista Italiano
pertencente à indústria de cosméticos e à indústria de serviços de saúde denominado de Soleto.
Por motivos de confidencialidade os nomes dos negociantes anteriormente referidos são fictícios
e, portanto, serão utilizados estes mesmos nomes ao longo deste trabalho.
Este processo negocial prolongou-se durante 5 anos, mais precisamente, de 2008 a 2013 e
caracterizou-se como uma negociação muito complexa, com falhas graves de comunicação, com
ausência de diálogos e sem cedências de ambas das partes. Estas adversidades conduziram
eventualmente a um desfecho muito pouco favorável: não houve acordo entre as partes
envolvidas. A nossa principal ideia, nesta etapa, foi contextualizar a negociação, situar o conflito,
mencionar os atores e descrever como surge a negociação.
3. 3
Para estudar esta negociação recorremos ao quadro teórico de Lewis ou também
denominado de Modelo de Lewis. Através do seu livro, “When Cultures Collide”, Richard Lewis
categorizou as culturas de todo o mundo num gráfico mesmo sabendo do risco de proferir
estereótipos e clichés errados. Segundo Lewis, “Determining national characteristics is treading a
minefield of inaccurate assessment and surprising exception” (Lubin, 2013). Nesta fase,
descrevemos o modelo teórico utilizado na análise.
Seguindo o Modelo teórico de Lewis, foi analisado o ato comunicacional da negociação
real anteriormente mencionada. Além disto, foram também referidos os aspetos negativos que
resultaram desta negociação bem como o que se poderia melhorar para ultrapassar estes mesmos
aspetos negativos. A falta de capacidade de comunicação entre o Centro Comercial Espanhol e o
Retalhista Italiano permitiu-nos considerar a importância do impacto das diferenças e semelhanças
culturais ao longo do processo de negociação. Por último, nesta fase, procedemos à apresentação
e organização dos dados recolhidos em função do modelo teórico de análise selecionado e
procedemos à análise desses mesmos dados.
Relativamente às fontes de informação, foram utilizados artigos académicos, livros e
websites relacionados com os temas abordados. A negociação em questão, “CASE STUDY: A
NEGOTIATION BETWEEN A SHOPPING CENTRE AND A RETAILER” trata-se de um artigo académico
da Universidade Nova de Lisboa baseado na negociação real entre um centro comercial e um
retalhista. Quanto ao Modelo de Lewis, os dados utilizados basearam-se no livro do próprio Richard
D. Lewis, “When Cultures Collide: LEADING ACROSS CULTURES”, mais precisamente no capítulo 3
do livro, “Categorizing Cultures” visto que é o que se enquadra mais na temática abordada e na
estrutura da Unidade Curricular, assim como a parte 3 do livro.
2.1 Contextualização da negociação
Nesta secção é crucial analisar em mais detalhe, o contexto da negociação entre o retalhista
internacional de cosméticos Soleto e o Capital shopping.
A Soleto apresenta-se como uma marca de liderança na indústria de cosméticos, produtos
de saúde para o corpo e para o rosto. Tem como público-alvo a geração mais jovem e consumidores
de classe média. Deste modo, a Soleto pertence ao grupo LIPSIL. É uma empresa Italiana com o
objetivo de se projetar por toda a Europa. Iniciou a sua atividade em 2008 e, atualmente, enfrenta
uma forte competitividade em relação a outras empresas com bastante poder de projeção. Por
4. 4
exemplo, a Dove (Unilever), a Pantene (Procter & Gamble), a Olay (Procter & Gamble), The Body
Shop (L'Oréal), a Nivea (Beiersdorf AG), a Lancôme (L'Oréal), a Avon e Shisheido.
Neste contexto a Soleto não fica ofuscada, uma vez que é considerada uma das melhores
marcas de produtos cosméticos Italianos, com uma forte capacidade de competição relativamente
ao mercado Europeu. Contudo, o desafio apresentado pelo contexto Espanhol levou a empresa a
acumular perdas.
Por conseguinte, é crucial analisar o mercado Espanhol de modo a perceber as falhas que
surgiram. O Capital Shopping localiza-se em Madrid, o que significa que é estrategicamente bem
localizado. O objetivo e a sua estratégia principal prendem-se no facto de apresentarem uma
experiência e oportunidade irrecusáveis de forma a atrair as melhores marcas de cada setor para
as suas instalações.
A partir de 2008, o mercado Espanhol começou a apresentar sintomas de uma
desaceleração económica, o que veio condicionar várias vertentes, entre elas o aumento das taxas
de desemprego e uma queda das taxas de consumo. A situação não melhorou e, em 2009, várias
empresas não tiveram acesso a créditos devido aos problemas de liquidez do setor financeiro. No
entanto, até ao final do ano 2010, a empresa Italiana conseguiu ainda manter as suas vendas e
apresentava taxas de crescimento de cerca de 5%, apesar do início da crise internacional que
afetava várias indústrias. Em 2011, as vendas mensais sofreram uma queda de 10% para 20%. Por
essa razão, a Soleto solicitou uma renegociação dos termos acordados no contrato em relação ao
aluguer fixo mensal, de modo a garantir uma maior sustentabilidade e continuidade da sua
presença.
O Capital shopping não mostrou qualquer flexibilidade em relação à mudança das variáveis
pré-acordadas no contrato e como consequência, em 2010 e 2011, as taxas de ocupação desceram
abaixo de 85% em certas lojas, uma vez que surgiu uma incapacidade de pagamento do aluguer fixo
acordado, entrando em falência.
A pergunta fulcral centra-se naquilo que realmente falhou na negociação. Em primeiro
lugar, destaca-se a negligência de pedidos por parte do centro comercial Espanhol. Neste caso, o
Capital Shopping, em 2008, não apresentou qualquer flexibilidade e desconsiderou igualmente o
pedido da empresa Italiana. A razão principal adveio do pensamento de que a Soleto seria
facilmente substituída por outra marca do mesmo setor e por isso não tinha a necessidade de abrir
concessões.
Por outro lado, é constatada a necessidade de mais criatividade numa negociação. De facto,
existem várias estratégias, nomeadamente a introdução de outras variáveis no processo de forma
5. 5
a garantir benefícios para ambos. Numa negociação, o interesse próprio exclusivo só irá levar a um
fracasso a longo prazo. A Soleto solicitou uma redução da renda fixa mensal tanto no ano 2008 e
2010, visto que o aluguer apresentava um valor muito alto em relação ao valor de vendas que a
empresa Italiana observava.
A falha patente foi a recusa da solicitação feita pelo retalhista Italiano, juntamente com a
falha de procura de outras variáveis. Nesta linha de pensamento, a negociação poderia ter passado
pela renovação e reforma do 3ªandar realizada pela Soleto em troca de uma redução do aluguer.
Mais concretamente, o Capital Shopping poderia não perder necessariamente com a redução da
renda mensal se conseguisse conjugar e dinamizar outras variáveis. Neste caso, a estratégia
assumida nesta negociação focava-se no ganho de um e na perda do outro o que, por efeito, se
baseou numa abordagem de negociação distributiva.
2.2 Quadro teórico utilizado
Richard Lewis evidencia a necessidade de considerar as diferenças entre culturas para gerir
uma empresa ou um governo no mundo globalizado em que vivemos. Ele sugere a utilização de um
modelo amplo para caracterizar as várias características nacionais comprimidas em 3 culturas:
linear-ativas, multi-ativas e reativas. Estas culturas apresentam atitudes diferentes em relação ao
tempo, liderança, team-building, maneira de processar informação, entre vários outros fatores.
Enquanto as pessoas da mesma cultura partilham vários conceitos básicos, pessoas de
culturas diferentes encaram esses conceitos de perspetivas diferentes e, como resultado,
comportam-se de maneiras diferentes. Posto isto, devemos ter uma boa compreensão de outras
culturas com quem venhamos a interagir para podermos compreendê-las melhor.
Os comportamentos externos são apenas uma parte superficial das diferenças culturais e
podem ser facilmente imitados para criar maior rapport. Subjacentes a estes comportamentos
estão grandes diferenças sobre como as pessoas pensam e noções distintas sobre conceitos básicos
como, por exemplo, a honra, a justiça e o amor. A linguagem também tem um papel importante
pois esta altera pensamentos e influencia comportamentos. Lewis diz-nos que várias teorias
linguísticas afirmam que a linguagem determina a maneira como pensamos.
Lewis diz-nos para olhar para a cultura como uma forma de programação coletiva, noção
desenvolvida pelo pioneiro da linguística Geert Hofstede. Essa programação começa quando
nascemos, é reforçada na escola e no trabalho e leva-nos a pensar que a nossa maneira de pensar
e agir é normal, enquanto outras não são. As pessoas de uma cultura consideram a sua normal e as
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outras anormais. Devemos compreender que os nossos valores e pressupostos sobre a realidade
são subjetivos.
De maneira mais detalhada, Lewis refere-se aos indivíduos de culturas linear-ativas como
muito focados nas tarefas, planeadores organizados, pontuais e com quase nenhuma linguagem
corporal. Já os indivíduos de culturas multi-ativas podem ser caracterizados como extrovertidos e
expressivos na sua linguagem corporal, dão pouca atenção ao planeamento e fazem várias coisas
ao mesmo tempo. Quanto às culturas reativas são pessoas introvertidas, bons ouvintes e dão mais
importância à relação do que aos resultados obtidos. Estas são apenas algumas das características
distintas de cada cultura.
“Linear-active people, like Swedes, Swiss, Dutch and Germans, do one thing at a time,
concentrate hard on that thing and do it within a scheduled timescale. These people think that in
this way they are more efficient and get more done.” (Lewis, 2006).
As culturas linear-ativas e multi-ativas apresentam-se como as mais opostas e
frequentemente irritam-se mutuamente, a não ser que um se adapte ao estilo do outro. As culturas
que são orientadas para a informação, como as linear-ativas, por norma estabelecem e seguem as
agendas, enquanto que as multi-ativas tendem a ignorar as agendas e a ir de acordo com o fluxo.
Relativamente ao fator “tempo”, as culturas linear-ativas são muito dominadas por este,
encarando-o como algo escasso. Opostamente, as culturas multi-ativas gostam de fazer o máximo
possível ao mesmo tempo. Nas culturas reativas o foco passa, não por gerir o tempo, mas por saber
adaptarem-se a ele.
No que toca a capacidade de liderança e organização, os gestores de culturas linear-ativas
tendem a ser mais orientados para a execução de tarefas, procuram competência técnica e focam-
se nos resultados. Os líderes nas culturas multi-ativas são, por norma, mais extrovertidos e
dependem da sua capacidade de inspirar e persuadir os seus funcionários. Os líderes em culturas
reativas são orientados para as pessoas, mas exercem liderança através de conhecimento,
paciência e controlo silencioso. Eles mostram modéstia e cortesia e trabalham para criar um
ambiente harmonioso.
Lewis defende que devemos adaptar as nossas reuniões e maneiras de falar às diferenças
culturais presentes em cada situação. Isto pode envolver mesmo a natureza da negociação, o lugar
social, o processo de tomada de decisão, a imagem pessoal e até ter atenção relativamente a usar
argumentos racionais ou apelos emocionais.
Relativamente às culturas em análise na nossa negociação, são ambas multi-ativas. Lewis
descreve os Italianos como encantadores e inteligentes, com excelentes capacidades de
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comunicação e constante flexibilidade. O seu estilo de comunicação é eloquente, demonstrativo e
aparentemente emocional. Em contextos de reuniões,os Italianos não se regem muito pela agenda.
Podem avançar para pontos à frente ou voltar a pontos que já tinham sido discutidos
anteriormente. Por norma, falam alto, com excitação e prolongam-se nas discussões.
Lewis refere que existem várias Espanhas com distintas culturas, mas os Castelhanos
constituem a maioria e serão o nosso foco de análise. Enquanto que a maioria das culturas aceitam
que os factos são inquestionáveis, para os Espanhóis as coisas podem não ser o que parecem,
defendendo que há várias verdades. Os Espanhóis, geralmente, são amigáveis e hospitaleiros e
gostam de socializar e procrastinar antes de discutir os assuntos. Quando formulam uma estratégia,
são normalmente propostas abertas e um bocado vagas. Os Italianos, ao contrário dos Espanhóis,
não são particularmente sensíveis e aceitam críticas, mostrando ser bastante flexíveis.
2.3 Análise dos dados
A negociação foca-se no envolvimento de dois participantes, mais especificamente um
centro comercial conhecido como Capital Shopping e a empresa Italiana designada Soleto. Deste
modo, a relação entre estes dois atores equivale a uma relação entre proprietário e inquilino, em
que o shopping representa o investimento no desenvolvimento de um determinado espaço e, neste
caso, a empresa Soleto tem a obrigação de pagar um preço para exercer os seus negócios dentro
deste estabelecimento. O benefício em questão será a capacidade de a empresa atrair clientes e
estar situada num local que, à partida, irá gerar um grande tráfego de pessoas de modo a aumentar
as suas vendas.
Por um lado, observa-se uma empresa de administração de centros comerciais que exerce
operações em vários países, nomeadamente em Espanha. Em sequência, a empresa Italiana Soleto
projeta-se a nível internacional com a oferta de uma indústria de produtos cosméticos e serviços
de saúde, tendo como público-alvo a geração mais jovem.
A negociação iniciou-se em 2008 tendo sido estabelecido um contrato de cinco anos. Desde
já, o período da negociação revela uma característica típica da cultura Espanhola. Para os
Castelhanos a pressa é inimiga da perfeição logo não gostam de ser apressados nem de serem
pressionados: o que apreciam é tempo e espaço. O Capital Shopping, além da sua inflexibilidade,
mostrou a necessidade de analisar e pensar sobre as propostas da marca Soleto necessitando, por
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isso, de tempo e espaço. As pressões desta mesma loja Italiana também não o ajudaram no
processo de desenvolvimento da negociação, um aspeto que os Espanhóis não gostam muito.
Numa fase inicial surgiram algumas divergências em relação a certas questões. A empresa
Soleto tinha o objetivo de solicitar um lugar no 1ª andar do Centro comercial, porém não existiam
vagas disponíveis e a negociação prolongou-se. Consequentemente, devido à estratégia definida
previamente pela empresa Italiana em encontrar um dos principais centros comerciais Espanhóis,
foi possível chegar a um acordo que tinha como proposta 2000 metros quadrados localizados no 3º
andar. Isto demonstra a flexibilidade dos Italianos como Lewis refere: “Italians (…) are excellent
communicators and combine ultra-keen perception with ever-present flexibility”. (Lewis, 2006).
No ano seguinte, em 2009, constatou-se uma descida das vendas da Soleto e, portanto, a
empresa solicitou ao Capital Shopping uma descida do aluguer fixo atual. Não existiu um feedback
positivo derivado da inflexibilidade por parte do centro comercial e da inflexibilidade associada ao
povo Espanhol nestes tópicos de alterar variáveis consideradas essenciais. A cultura Espanhola,
segundo Lewis, revela-se como mais inflexível relativamente à cultura Italiana sobretudo se as
questões negociais envolverem assuntos de honra pessoal e nacionalismo. O Capital Shopping
desde o início demonstrou um comportamento implacável e muito inflexível. Depois, uma das
razões da recusa do pedido foi o facto de a maioria das outras lojas não sofrerem o mesmo
problema, uma vez que mantinham um número de vendas considerável. Em contraste, a empresa
Soleto constata que as margens de lucro eram baixas e não eram suficientes para cobrir esse custo
fixo. Como Lewis menciona, os Italianos gostam sempre de ter margem de manobra para negociar
um preço e se não a tiverem, sentem que não estão a praticar um negócio justo.
A situação veio alterar-se com o tempo e, em 2010, não era apenas a Soleto que pedia uma
redução do preço do aluguer, mas também outras lojas. Chegou o momento que Capital Shopping
decidiu averiguar a situação atual com o intuito de perseverar as parcerias estabelecidas em
Espanha, mas também noutros países. Por conseguinte, o centro comercial solicitou os relatórios
financeiros que descrevessem a queda de vendas da empresa. O processo não foi imediato e a
primeira reação de Soleto foi negar o fornecimento dessas informações em detalhe devido à
violação de confidencialidade. Isto provou ser um ponto de alarme e discórdia entre as duas partes,
pois os Espanhóis valorizam a cooperação e, a empresa Italiana não aceitou mostrar os seus dados
com receio que a gerência do Capital Shopping analisasse os dados de outra maneira, talvez
também por terem a consciência de que para os Espanhóis os factos podem ser interpretados de
várias maneiras. Outro ponto relativamente ao Modelo de Lewis refere também que os Espanhóis
apesar de serem considerados muito calorosos e afetivos quando têm necessidade de ser
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pragmáticos e práticos, são. Neste caso, quando o centro comercial quis averiguar as margens de
lucro baixas da Soleto através de relatórios financeiros que descrevessem a queda das vendas das
empresas demonstrou uma atitude muito prática e precisa. O centro comercial Espanhol não se
deixou levar pelas simples informações das lojas, nomeadamente da Soleto e procurou resolver o
assunto através dos relatórios financeiros. Esta atitude, como foi descrito anteriormente, foi
inicialmente recusada pela marca Italiana por questões de confidencialidade.
A relutância da empresa Italiana deriva do seu pensamento de que o Capital Shopping
poderia tirar outras conclusões acerca dos dados e até mesmo fazer alterações para outra direção
não pretendida. Com isto, nenhuma mudança se proporcionou e o preço do aluguer manteve-se
fixo, enfraquecendo as relações entre eles e criando a ideia na empresa Italiana de que os seus
parceiros de negócios Espanhóis eram inflexíveis. Lewis (2006) refere que os Italianos “must come
away from the deal showing they have won or gained something”, como os Espanhóis não deram
margem para isto acontecer, os Italianos viram-se numa má posição.
Nesta linha de pensamento, no respetivo ano de 2010, a empresa não desistia do seu
pedido de redução e os atrasos de pagamento começaram a surgir, algo a que o povo Espanhol tem
aversão, mas que para os Italianos não têm problema nenhum e consideram mesmo algo normal.
“Italians often ‘borrow’ your money in the sense that they pay late. This is another area where
change of habit is very difficult to bring about. The best you can do is try to arrange satisfactory
payment schedules in advance”. (Lewis, 2006). Ora, esta flexibilidade que os Italianos esperariam
de Espanha relativamente ao plano de pagamentos não foi concretizada. No ano seguinte, em 2011,
a empresa Italiana constatou graves problemas de liquidez uma vez que sofreu uma queda
acentuada das vendas em relação ao ano passado. Assim, a Soleto não solicitava apenas uma
redução do aluguer, mas também outras concessões, colocando na mesa todas as cartas: ou o seu
pedido de redução de renda era aceite ou a empresa Soleto sairia da cadeia de centros comerciais
do centro da Espanha. Por esta altura, a flexibilidade dos Italianos começava a perder-se e a
inflexibilidade dos Espanhóis mantinha-se tão vincada como sempre. Para além disso, começou a
haver críticas de ambas as partes, o que para os Italianos não é encarado de maneira muito
negativa, mas para os Espanhóis é considerado como uma ofensa à sua honra, que tanto valorizam,
assim piorando ainda mais as suas negociações.
Com efeito, a reação do Capital Shopping foi contratar uma empresa externa, neste caso,
uma empresa de auditoria que tirasse as suas próprias conclusões em relação à situação financeira
da Soleto. Isto é visto pelos Italianos como algo antiquado e demasiado “law-abiding”, pois os
Italianos não têm nenhum problema em contornar as regras e leis, tendo uma interpretação
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bastante flexível sobre vários acordos e regulamentos. Isto mostrou ser um ponto de divergência
entre eles. Já os espanhóis são considerados como tendo uma escala de valores muito antiquada e
antiga. Muitas vezes, em negociações, os Espanhóis estão mais focados no empresário, por
exemplo, do que no próprio projeto/produto em si.
A análise foi realizada e a empresa de auditoria referiu que o valor da renda apenas
correspondia a 10% dos seus ganhos e, portanto, apesar da queda de vendas, ainda havia
capacidade de sustentar os custos. A sua avaliação passou por referir que o problema se centrava
na estrutura de custos que efetivamente deveria ter uma revisão e melhor controlo. Isto acabou
por ser o “final nail in the coffin”, pois não deu qualquer margem de manobra para a empresa
Italiana e eles sentiram que o Capital Shopping foi demasiado inflexível e não deu nada a ganhar à
Soleto.
No final do ano 2012, os atrasos de pagamentos continuaram e a acumulação era cada vez
maior com cerca de dois a três meses em atraso. Por consequência, o Capital Shopping parou de
aceitar este comportamento e postura e, consequentemente, recorreu a recursos judiciais de
forma à empresa Soleto pagar os valores do aluguer pendentes. Segundo o Modelo de Lewis, os
Espanhóis não gostam de falta de pontualidade nem de confundir um comportamento matinal com
preguiça. Se há atrasos com pagamentos ou com entregas é melhor referir ao negociante Espanhol
que se está sob pressão e que necessita de ajuda. Neste caso concreto, os atrasos de pagamento
da Soleto perante o Capital Shopping continuaram e a acumulação era cada vez maior. Logo, o
shopping Espanhol, perante este comportamento, decidiu recorrer a recursos judiciais para a Soleto
pagar o que devia. Esta situação demonstra a inflexibilidade dos Espanhóis perante os atrasos de
pagamentos. Por esta razão, em 2013 a empresa retirou-se do Capital Shopping, devido às
diferenças, em grande parte culturais, na maneira de encarar uma relação de negócios sustentável.
3. Conclusão
Em suma, podemos concluir que as diferenças culturais acabaram por ser um grande
entrave à comunicação eficaz entre as duas partes e foram a principal causa de a parceria ter tido
uma conclusão negativa. Ao longo do processo surgiram divergências em vários assuntos e ambas
as partes não foram capazes de se adaptar à posição do outro, resultando, em última instância, no
abandono do centro comercial por parte do retalhista.
11. 11
Tendo em conta o que o Modelo de Lewis explica, os Espanhóis tendem a ser bastante
inflexíveis no que diz respeito a negócios e isso provou-se verdade na análise da nossa negociação.
De maneira inversa, os Italianos são dos povos mais flexíveis no contexto Europeu e esperavam
uma retribuição dessa flexibilidade por parte dos seus parceiros Espanhóis, tanto a nível do plano
de pagamentos como na redução do preço do aluguer, sendo que os Italianos gostam de negociar
os preços e têm de sentir que ganharam algo com a negociação.
Esta inflexibilidade Espanhola ficou ainda mais vincada quando optaram por contratar uma
empresa de auditoria para analisar a situação financeira da Soleto, não mostrando confiança nos
seus parceiros Italianos, demonstrando assim o pragmatismo do povo Espanhol. Isto não foi
encarado como um ataque pessoal à honra da empresa Italiana, mas foi encarado como demasiado
“quadrado” e respeitador da lei, algo que os Italianos não têm qualquer problema de contornar
para o seu benefício. Um dos motivos para a Soleto não querer divulgar a sua situação financeira
antes da contratação da empresa de auditoria prende-se pela compreensão de que o povo Espanhol
tende a encarar tudo não como factos, mas como verdades subjetivas que podem ser interpretadas
de maneira diferente da dos Italianos.
Lewis menciona que os Espanhóis não lidam bem com atrasos de pagamentos e isto provou
ser verdade na nossa negociação, pois os Italianos viam os seus atrasos como normais devido à
normalidade deste tipo de situações na sua cultura, não compreendendo então a dimensão do
problema que os Espanhóis atribuíam à situação.
Podemos concluir que a falta de estudo de ambas as partes sobre a cultura da outra acabou
por criar expectativas infundamentadas que não se poderiam ter concretizado na negociação. É
imperativo conhecermos bem a cultura com que vamos participar numa negociação para evitar
problemas semelhantes aos que a Soleto e o Capital Shopping encontraram. O modelo de Lewis
apresenta-se como uma ferramenta ótima e indispensável para uma melhor gestão de negociações
internacionais.
Na negociação em análise, o Modelo de Lewis provou ser capaz de fazer uma análise
completa e detalhada sobre as características de cada cultura quando se envolvem numa
negociação, quais os seus pontos fortes e quais as suas falhas.
12. 12
Bibliografia
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RETAILER. [pdf] Lisboa: NOVA – School of Business and Economics, pp.2-29. Available at:
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