EFEITOS DOS CUSTOS TRANSACIONAIS NA IMPLEMENTAÇÃO DE UM PROGRAMA DE GOVERNO
Investigações dos crimes de maio deixaram graves dúvidas
1. RENATOSANTANA
DAREDAÇÃO
Sandra Carvalho é diretora adjunta da ONG
Justiça Global, com sede no Rio de Janeiro. A
entidade passou a acompanhar de perto o caso
dosCrimesdeMaioeestáenvolvida,juntocoma
Defensoria Pública de Santos e São Vicente e
Associação de Mães e Familiares Vítimas da
Violência,nopedidojudicialparaqueosassassi-
natos sejam investigados e julgados em âmbito
federal. Para Sandra, precoce dos inquéritos
reflete a demora em ouvir testemunhas. Em
alguns casos a espera chegou a oito meses, não
houvecruzamentodas investigações,provas pe-
riciais não foram devidamente preservadas e
informações foram mal apuradas. No pacote da
impunidadeaindaestãoasintimidaçõesdeteste-
munhas. Outro aliado dessas falhas é o sistema
deficiente de proteção. E o corporativismo: em
casos de polícia que investiga polícia, os índices
deresponsabilizaçãosãomenores.
“É o que podemos perceber logo de início: a
polícia não conduziu bem as investigações; o
MinistérioPúbliconãofoiexaustivoeoJudiciá-
rio acatou o pedido de arquivamento”, explica
Sandra.
A dificuldade de conseguir informações é
outro problema apontado pela diretora da
ONG. Com informações extra-oficiais colhidas
dentro da Polícia Civil e do Ministério Público,
Sandra afirma que nos casos dos Crimes de
Maio os índices de esclarecimento das mortes
dosagentespúblicossãomaioresquenoshomi-
cídiosocorridosnaperiferia,envolvendocivis.
“NoBrasil,osinquéritosnogeralsãodemora-
dos. Sei de processos com 10 anos de duração.
Issoémuitoruim,masilustraoquãorápidosos
inquéritos dos Crimes de Maio foram arquiva-
dos”,constataSandra.
A Justiça Global conseguiu, em novembro
do ano passado, que a Corte Interamericana
de Direitos Humanos pedisse ao Brasil para
reabrir as investigações sobre a morte de um
agricultor. Antônio Tavares, de 37 anos, foi
vítima de projétil disparado por um PM, em
2000, durante marcha do Movimento Sem
Terra (MST) no Paraná. O crime está impune
earquivado.
FORMASDEIMPUNIDADE
Marcela Fogaça Vieira é advogada do pro-
grama de Justiça da ONG Conectas Direi-
tos Humanos. A entidade atua na área dos
direitos humanos, com foco nos diversos
tipos de violências praticadas por organis-
mos do Estado. Para ela, o sistema é
formatado para manter impunes policiais
assassinos.
A Conectas elaborou um estudo detalhado
dos Crimes de Maio, de autoria de grupos de
extermínio depois dos atentados do PCC. A
advogada ressalta as ações de violência cometi-
das pela polícia fardada, ou seja, no horário de
trabalho.
“Os boletins de ocorrência com resistência
seguida de morte ou auto de resistência são
problemas sérios. O homicídio praticamente
desaparece e, como o ‘indiciado’ está morto, o
inquéritopolicialéfrequentementearquivado”,
explica.
Novos mecanismos de facilitação, segun-
do Marcela, foram criados. O governo pau-
lista implementou em 2009 o registro digi-
tal de ocorrência (RDO). O boletim de
ocorrência acabou substituído.
“Os policiais já dominavam os BOs colo-
cando suas próprias versões. Agora têm
uma ajuda extra. A palavra morte foi
abolida do título da ocorrência, uma vez
que os casos passaram a ser registrados
apenas como resistência”, diz a advogada.
O resultado é a diminuição da transparên-
cia. Para ela, é necessário ler todo histórico
da ocorrência para saber como a pessoa foi
morta.
Investigaçõesdoscrimes
deixaramgravesdúvidas
ONGs ligadas aos direitos humanos denunciam pontos falhos nas investigações. Junto com a Defensoria Pública
de Santos e São Vicente, lutam para que processos sejam julgados em âmbito federal
15 de maio de 2006, 23
horas, Rua Campos Sal-
les esquina com a Rua
Brás Cubas, Vila Ma-
thias, Santos.
Ana Paula Gonzaga dos
Santos, grávida de nove
meses, e Eddie Joey Olivei-
ra, ambos com 24 anos,
são executados enquanto
conversavam.
Oprocessofoiarquivado
em22denovembrode
2006.
15 de maio de 2006, 22
horas, Caminho da Divi-
sa, 43, Jardim Castelo,
Santos.
WagnerLuisdosSantos,de
22anos,eDiegoVieirados
SantosMiranda,de19anos,
voltavamdacasadairmã,
emSãoVicente,quando
ouviramtiros.Viramapare-
cerumamotovermelha
grandecomdoishomens
encapuzadas.Ogarupaati-
roucomumametralhado-
ra.AndersonFranciscoAn-
chia,de16anos,eEwerton
deCastroMoreira,de19
anos,estavamnumbar,on-
deosprimeirosdisparos
foramfeitos.Nenhumadas
vítimastinhamanteceden-
tesouusavamdrogas
Processofoiarquiva-
doem4demaiode
2007.
17 de março de 2007,
Avenida Jovino de Mello,
Santos.
RogérioMonteiroFerreira,
de31anos,estavanumbar
quandodoishomenschega-
ramdemoto.Entraramno
estabelecimentoederam
doistirosquandoorapaz
saíadobanheiro.Depois,o
atiradorseaproximoue
efetuoumaistrêsdisparos.
OIrmãodeRogério,Alexan-
droMonteiroFerreira,to-
mouumasurradepoliciais
noMorrodaNovaCintra
depoisdeficarrodandona
viaturapolicialdurante
trêshoras.Orapazpresen-
ciouumaaçãodeencapuza-
dos.Ospoliciaisforjarama
posse,porpartedeAlexan-
dro.Eleestápreso.
OprocessodeRogério
foiarquivadoem18de
marçode2008.
15demaiode2006,
23h20,RuaTorquato
Dias,288,MorrodaNova
Cintra,Santos.
EdsonRogérioSilvadosSan-
tos,29anos,mortonolocal
quetinhavarridoduranteo
dia.Eragari.Foimortode-
poisdeserrevistadopela
PolíciaMilitar.
Oprocessofoi
arquivadonodia23
dejunhode2008.
14demaiode2006,
23h30,RuaSãoFrancis-
co,Centro.
Marcos Rebello Filho, 26
anos, Thiago Roberto Soa-
res, 19 anos, e Jô Farias da
Silva, 22 anos, foram mor-
tos enquanto estavam nu-
ma pizzaria/locadora de
games. Os dois encapuza-
dos que efetuaram os dis-
paros contra os garotos
usavam calça cinza e botas
pretas.
Oprocessofoi
arquivadoem7de
maiode2008.
17demaiode2006,
20h47,ruasCananeiae
CaminhoSãoSebastião,
ChicodePaula,Santos.
RicardoPortoNoronha,de
17anos,eMateusAndrade
deFreitas,de22anos,esta-
vamvoltandodasaulas,
suspensasporcontados
ataquesdoPCC.Pertode
umapizzaria,localdeen-
controdosamigos,foram
abordadosporduaspes-
soasencapuzadasnuma
motoverde.Apesardos
disparosteremsidofeitos
nomesmolugar,asvítimas
foramsocorridasemlocais
diferentes.
OprocessodeMateus
foiarquivadoem8de
maiode2007eode
Ricardoem15de
maiode2008.
>>Noanopassado,307inquéritostornaram-
seprocessosnoTribunaldeJustiçaMilitar
(TJM)doEstadodeSãoPaulo,porsolicitação
doMinistérioPúblico,órgãoqueoferecea
denúnciaaojudiciário.Emtramitação,2009
terminoucom3.346inquéritos.
>>Onúmerodepoliciaispunidosnãoestádis-
ponível.NoTJM,aindanoanopassado,1007
processosforamjulgadosemsegundainstân-
cia,alémdeoutras404açõesdenatureza
cível,contrapuniçõesdisciplinaresimpos-
taspelaautoridademilitar.
2009
Ano
emqueogovernopaulista
implementouoRegistroDigital
deOcorrência(RDO).
“Éoquepodemosperceberlogodeinício:apolícianãoconduziu
bemasinvestigações;oMinistériopúbliconãofoiexaustivoe
oJudiciárioacatouopedidodearquivamento”.
SandraCarvalho,diretoraadjuntadaONGJustiçaglobal
2008
Ano
emquefoiarquivado
oúltimoprocessodosCrimes
deMaio.
OsprocessosempoderdaDefensoriaPública
Crimesdemaio 3ªparte
DAVIRIBEIRO
Terça-feira 27 ATRIBUNA
BaixadaSantista A-3baixadasantista@atribuna.com.br abril de2010 www.atribuna.com.br