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Excludente de
Responsabilidade
Excludente de
Responsabilidade: Atraso
na entrada de operação de
usinas geradoras de
energia elétrica
Fernando Flach
Ana Caroline Koehler
Juliana Angélica Renuncio Sobottka
Rafaella Peçanha Guzela
Abstract: When signing a concession contract for the
implementation and operation of a new plant, the
private (concessionaire) assumes a bundle of
obligations that deserve prestige and that need to be
complied with, responding for possible
noncompliance. However, the occurrence of certain
extraordinary and unforeseeable events, unrelated to
the will and the sphere of action of the concessionaire,
may prevent him from fulfilling the obligations
assumed in the manner originally recommended.
We're talking about circumstances protected by the
Theory of Imprevision, capable of excluding the
responsibility of the individual for default (total or
partial) of the contract, and investigate how ANEEL
gives it applicability at the same time as it seeks to
develop the energy market with a balance between
the agents, to presume the tariff modality, to stimulate
the quality of the service provided and to ensure the
economic and financial viability of the concession
Keywords: Electrical energy, implementation and
operation of a new plant, Theory of Imprevision,
responsibility.
1 Introdução
O presente artigo tem como objetivo abordar as
questões inerentes ao reconhecimento de excludentes
de responsabilidade frente a atraso na entrada em
operação comercial de usinas hidrelétricas de geração
de energia elétrica, no âmbito da Agência Nacional de
Energia Elétrica – ANEEL e do Judiciário.
As empresas investidoras em obras de infraestrutura
para construção de usinas hidrelétricas de grande
porte participam de leilões e, quando se sagram
vencedoras, celebram Contrato de Concessão de Uso
do Bem Público com o Poder Concedente (União
Federal), por intermédio do qual se comprometem a
implantar e operar a usina e assumem uma série de
riscos associados a tal atividade.
Neste contrato de concessão são estabelecidos os
prazos do cronograma físico das obras, inclusive a data
para a entrada em operação comercial das unidades
geradoras, cujo descumprimento importa em
penalidades no âmbito da ANEEL, e, no caso da
comercialização, na necessidade de aquisição de
energia elétrica para repor o lastro de energia e
potência perante a Câmara de Comercialização de
Energia Elétrica–CCEE, sob pena de severas sanções,
visto que o financiamento destes empreendimentos,
em regra, se dá pela venda antecipada da energia que
será gerada, através do sistema de project finance.
Permeando este modelo, existem os riscos ordinários
do negócio, denominados contratualmente "por sua
conta e risco", os quais devem ser previstos e
assumidos pelos agentes concessionários, tais como
atrasos decorrentes de atos comissivos ou omissivos
imputáveis à conduta do agente.
Contudo, também existem os atos extraordinários, os
quais não podem ser imputados ao agente
concessionário, pois alheios à sua vontade,
decorrentes de atos imprevisíveis e, quando
previsíveis, de efeitos incalculáveis, cuja
responsabilidade ultrapassa os riscos ordinários do
agente, não se incluindo, portanto, na cláusula
contratual "por sua conta e risco".
Tratam-se de casos fortuitos, força maior, atos do
poder público, fato do príncipe e eventos
imprevisíveis, cuja ocorrência do ato extraordinário, do
dano e do nexo causal entre ambos, quando
comprovado, impõe a readequação do cronograma
físico das obras – para redefinição de novos marcos
temporais e datas para entrada em operação
comercial das unidades geradoras –, bem como o
reequilíbrio econômico-financeiro do contrato de
concessão.
Nesta linha, serão abordadas às questões inerentes à
aplicação da Teoria da Imprevisão, do direito ao
reequilíbrio econômico-financeiro do contrato e
relevantes casos que tratam da abordagem
empreendida pela ANEEL sobre o tema, cujo objetivo
será demonstrar os parâmetros jurídico-regulatórios
que devem ser obedecidos.
2 Excludente de Responsabilidade
O inadimplemento do contrato administrativo
caracteriza-se pelo descumprimento total ou parcial de
suas cláusulas por quaisquer das partes contratantes,
seja a Administração Pública ou o contratado. A
inexecução ou execução incompleta do contrato pode
dar-se com culpa ou sem culpa de qualquer das partes,
sendo que as consequências para o inadimplente
variam a depender da presença ou ausência do
elemento culpa.
Para o presente artigo, interessa-nos a ocorrência de
inexecução sem culpa do particular, verificada pela
ocorrência de fatos alheios ao controle deste que
impede ou dificulta o cumprimento do pacto tal como
inicialmente preconizado. Fala-se aqui de fato
excepcional, extraordinário e imprevisível, que enseja
aplicação da Teoria da Imprevisão.
A Teoria da Imprevisão resulta da aplicação de uma
antiga cláusula, rebus sic stantibus, que se entende
implícita em qualquer contrato de execução
prolongada, segundo a qual o vinculo obrigatório
gerado pelo contrato somente subsiste enquanto
inalterado o estado de fato vigente à época de sua
estipulação.
De acordo com tal noção, aprimorada pela doutrina e
sedimentada pela jurisprudência, existem hipóteses
em que a força vinculante do contrato se atenua.
Falam-se aqui em ocorrências de (i) caso fortuito, (ii)
força maior, (iii) fato do príncipe, (iv) fato da
administração e (v) interferências imprevistas.
Segundo o artigo 19, § único da lei 13.360/2016:
“Para os fins do disposto no caput, entendem-se
como excludentes de responsabilidade todas as
ocorrências de caso fortuito e força maior,
incluindo, mas não se limitando a, greves,
suspensões judiciais, embargos por órgãos da
administração pública direta ou indireta, não
emissão de licenças ou autorizações pelos órgãos
competentes por motivo não imputável ao
empreendedor e invasões em áreas da obra, desde
que reconhecidos pela Aneel a ausência de
responsabilidade do agente e o nexo de
causalidade entre a ocorrência e o atraso na
entrada em operação comercial.”
Assim, no que tange à caracterização do excludente de
responsabilidade, interessa-nos saber mais sobre os
institutos do caso fortuito, força maior e fato da
administração, como veremos a seguir.
Os institutos jurídicos denominados de caso fortuito e
de força maior são situações de fato que impedem o
cumprimento de obrigações contratuais. O caso
fortuito decorre de eventos da natureza, como
catástrofes, ciclones e tempestades anormais. Já a
força maior é resultado de um fato causado, de
alguma forma, pela vontade humana, como é o
clássico exemplo da greve
1
.
Quanto ao fato da administração, Hely Lopes Meirelles
traz a seguinte explanação sobre o tema:
“Fato da Administração é toda ação ou omissão do
Poder Público que, incidindo direta e
especificamente sobre o contrato, retarda ou
impede a sua execução. O fato da Administração
equipara-se à força maior e produz os mesmos
efeitos excludentes da responsabilidade do
particular pela inexecução do ajuste. É o que
ocorre, por exemplo, quando a Administração
deixa de entregar o local da obra ou serviço, ou
não providencia as desapropriações necessárias ou
1
CARVALHO FILHO. José dos Santos. Manual de Direito
Administrativo. 16ª Ed. Lumen Juris: 2006. Pág. 179.
atrasa os pagamentos por longo tempo, ou pratica
qualquer ato impeditivo dos trabalhos a cargo da
outra parte.
2
(grifo nosso)
Nessas situações, o contrato administrativo é atingido
de forma direta, comprometendo sobremaneira a
possibilidade de efetivação de seus termos por parte
do particular contratante.
Na hipótese de ocorrer uma situação caracterizadora
de fato da administração, deve-se promover a
modificação do contrato, culminando, pois, em uma
readequação de seus termos.
Em relação aos requisitos caracterizadores do instituto
em evidência, mais que uma ordem específica a um
contrato administrativo, tem-se que a determinação
estatal deve ser imprevisível ou, se previsível, de
consequência incalculável.
Os dispositivos legais que preveem a isenção de
responsabilidade pelo atraso na entrada em operação
comercial das usinas de geração hidrelétrica,
decorrente de fatos caracterizados como excludentes
de responsabilidade, encontram-se disciplinados no
art. 57, § 1º, inciso II, da Lei nº 8.666/93 e no art. 2º,
§§ 16 e 17, da Lei nº 10.848/2004, e mais
recentemente, o artigo 19, § único da Lei nº
13.360/2016. No âmbito regulatório tem previsão no
art. 4º, inciso II, da Resolução Normativa ANEEL nº
453/2011.
Contratualmente, encontra-se expresso em cláusulas
dos contratos de concessão de uso de bem público
para geração de energia elétrica
3
e dos contratos de
comercialização de energia elétrica no ambiente
regulado – CCEARs.
4
2
MEIRELLES, Hely Lopes. Direito Administrativo
Brasileiro, 16ª ed., SP: RT, 2000.
3
Subcláusula Primeira - Sem prejuízo do disposto nas demais
Cláusulas deste Contrato, constituem encargos específicos da
Concessionária, na exploração da UHE, o que se segue: [...]
II. elaborar, por sua conta e risco, os projetos da UHE e
executar as obras correspondentes, tudo em conformidade
com as normas técnicas e legais específicas e de acordo com
o cronograma físico apresentado à ANEEL, de modo a garantir
a entrada em operação das Unidades Geradoras nas datas
fixadas, assumindo todos e quaisquer ônus e
responsabilidades pelos eventuais atrasos, ressalvados os
casos de atos do Poder Público e os decorrentes de casos
fortuitos ou de força maior, conforme Subcláusula Terceira
desta Cláusula. [...]
Subcláusula Terceira - No caso de atraso na entrada em
operação comercial das Unidades Geradoras da UHE
provocados por atrasos do Poder Público e decorrentes de
caso fortuito ou força maior, o cronograma físico poderá ser
revisto pela Concessionária e submetido à ANEEL para
aprovação, observando o que determina o art. 3º do Decreto
nº 5.163/2004. (Negrito).
4
CLÁUSULA 15 – CASO FORTUITO OU FORÇA MAIOR
15.1. Na ocorrência de evento de caso fortuito ou força
maior, nos termos do parágrafo único do art. 393 do Código
Civil, que afete ou impeça o cumprimento das obrigações
contratuais, o CONTRATO permanecerá em vigor, mas a
PARTE atingida pelo evento não responderá pelas
consequências do não cumprimento de suas obrigações nos
A ANEEL, por intermédio da sua Procuradoria-Geral,
tem fundamentado o mesmo entendimento, conforme
consta no Parecer nº 0098/2011-PGE/ANEEL:
“26. A ANEEL, por meio de suas Superintendências,
tem acertadamente admitido como excludente da
responsabilidade do agente a ocorrência de caso
fortuito, força maior ou ato do poder público,
desde que um destes fatores tenha provocado o
atraso. É exigida a imprevisibilidade do evento,
produzido por forças anômalas e externas ao
serviço público prestado, a inevitabilidade, quando
não haveria nada que a Concessionária pudesse
fazer para evitar o sinistro.
27. Assim, atraso de cronograma de
empreendimentos justificados por um fato
superveniente, inevitável e imprevisível, elide a
Concessionária de qualquer punição, de modo que
esta não poderá ser responsabilizada pela
consequência de um evento do qual ela não teve
participação, impossibilitando-a de cumprir sua
obrigação.”
Com o reconhecimento das excludentes de
responsabilidade, devem ser afastados todos os
prejuízos decorrentes do não cumprimento do termo
contratual, no caso, quanto à entrada em operação
comercial da usina, isentando o agente da necessidade
de: (i) reposição de lastro de energia e potência na
CCEE; (ii) pagamento pelo Uso do Bem Público – UBP à
União Federal; (iii) pagamento dos encargos setoriais
5
;
e (iv) sofrer penalidades decorrente de
descumprimento de cláusulas do contrato de
concessão perante a ANEEL e (v) suportar penalidades
oriundas da inadimplência dos contratos de
comercialização no âmbito da CCEE.
3 Análise e Jurisprudência Acerca do
Reconhecimento do Excludente de
Responsabilidade
A presente análise utiliza-se da ocorrência de alguns
casos de usinas de grande porte situadas na região
amazônica, cujos contratos de concessão preveem a
assunção de dívidas, as quais devem ser cumpridas a
termos do CONTRATO, durante o período de ocorrência do
evento e proporcionalmente aos seus efeitos.
5
É obrigação da concessionária pagar especialmente pelos
seguintes encargos setoriais: (i) Taxa de Fiscalização de
Serviços de Energia Elétrica – TFSEE, instituída pela Lei nº
9.427/96 para custear a receita da ANEEL; (ii) Compensação
Financeira pela Utilização de Recursos Hídricos – CFURH,
criada pela Lei n.º 7.990/89 para indenizar os municípios pela
afetação decorrente da utilização dos recursos hídricos; (iii)
Tarifa de Uso do Sistema de Distribuição – TUSD e Tarifa de
Uso do Sistema de Transmissão – TUST, instituída pela Lei nº
9.074/95 para remunerar os agentes de distribuição e
transmissão pela utilização dos seus sistemas elétricos; e
aplicar, anualmente, no caso das grandes hidrelétricas, o
montante de, no mínimo, um por cento de sua receita
operacional líquida em pesquisa e desenvolvimento do setor
elétrico, nos termos da Lei nº. 9.991/2000, alterada pela Lei
nº 10.848/2004, e na forma que dispuser a regulamentação
específica sobre a matéria.
partir da assinatura do contrato e, especialmente, a
partir da entrada em operação comercial das
unidades geradoras, que ocorre mediante
motorização gradual e sucessiva das turbinas até a
usina atingir a capacidade máxima de geração,
embasando assim o Reconhecimento (ou não) do
Excludente de Responsabilidade.
Com efeito, na data da entrada em operação
comercial das unidades geradoras, as concessionárias
assumem as seguintes obrigações: (i) pagamento pelo
Uso do Bem Público – UBP à União Federal; (ii)
pagamento da Tarifa de Uso do Sistema de
Transmissão – TUST ao ONS; (iii) pagamento da
Compensação Financeira pela Utilização de Recursos
Hídricos – CFURH à ANEEL; (iv) entrega da energia às
diversas distribuidoras supridas/contratantes
decorrentes do leilão ou, em caso de atraso na
entrada em operação comercial das unidades
geradoras (não geração de energia elétrica),
obrigação de reposição do lastro de energia ou
potência no âmbito da CCEE; tudo sob pena de
pagamento de severas penalidades regulatórias e
contratuais.
Em decorrência das dificuldades logísticas, ambientais
e sociais para implantar tais usinas na região
amazônica, ocorreram atrasos na entrada em
operação comercial das suas unidades geradoras.
Objetivando evitar os enormes prejuízos financeiros
em face das obrigações contratuais, bem como dos
elevados preços do PLD no período
6
, as
concessionárias fazem jus, inicialmente, à medida
cautelar administrativa para suspender os efeitos de
todas as obrigações, penalidades e sanções até que a
ANEEL decida definitivamente os seus pleitos.
O art. 47 da Resolução Normativa ANEEL nº
273/2004
7
, atento ao comando normativo exposto no
artigo 61 da Lei nº 9.784/99
8
, prevê a possibilidade de
concessão de efeito suspensivo nos recursos
administrativos no âmbito da ANEEL, em havendo
6
O PLD atingiu o valor máximo de R$ 822,43/MWh em todo
o ano de 2014. Em 2015, com vistas a evitar que os agentes
expostos na CCEE pudessem sucumbir, a ANEEL reduziu o
valor máximo do PLD para R$ 388,48/MWh a partir de
janeiro. Contudo, os CCEARs das concessionárias, decorrentes
do preço fixado no leilão, previam o importe aproximado de
R$ 95,00 o MWh em valores de 2014.
7
Art. 47. Salvo disposição legal em contrário, o recurso não
tem efeito suspensivo.
§1º Havendo justo receio de prejuízo de difícil ou incerta
reparação decorrente da execução da decisão recorrida, o
Diretor-Geral poderá, de ofício ou a pedido, conceder efeito
suspensivo ao recurso.
8
Art. 61. Salvo disposição legal em contrário, o recurso não
tem efeito suspensivo.
Parágrafo único. Havendo justo receio de prejuízo de difícil ou
incerta reparação decorrente da execução, a autoridade
recorrida ou a imediatamente superior poderá, de ofício ou a
pedido, dar efeito suspensivo ao recurso.
justo receito de prejuízo de difícil ou incerta
reparação.
Os requisitos para a concessão de efeito suspensivo
são dois, a saber: (i) justo receio de prejuízo de difícil
ou incerta reparação; e (ii) que o prejuízo decorra da
execução da decisão combatida.
O art. 45, da Lei nº 9.784/99, prescreve que "em caso
de risco iminente, a Administração Pública poderá
motivadamente adotar providências acauteladoras
sem a prévia manifestação do interessado."
Com base nestes dispositivos, tem sido pacífica a
possibilidade de apreciação de Medida Cautelar pela
Diretoria da ANEEL, fundamentada no direito
constitucional de petição (art. 5º, inciso XXXIV da
CFRB/88)
9
e no poder geral de cautela, este previsto
no dispositivo legal supracitado.
O Parecer nº 0756/2011/PGE-ANEEL/PGF/AGU, de
02/12/2011, posiciona-se favoravelmente ao
entendimento de que os pedidos autônomos,
formulados com base no direito de petição e que
tenham por fundamento o poder geral de cautela do
administrador, este na forma do que dispõe o art. 45
da Lei nº 9.784/99, devem ser apreciados pela
Diretoria Colegiada da ANEEL, após distribuição a um
Diretor Relator.
10
O objetivo da suspensão parcial e emergencial das
obrigações legais e contratuais, nestes casos, tem
como finalidade preservar a higidez, utilidade e
eficácia do próprio processo administrativo, a fim de
salvaguardar a inafastável proteção às garantias
fundamentais da ampla defesa e do contraditório (art.
5º, inciso LV, da CFRB/88)
11
.
Com efeito, a interposição de medida cautelar tem
como finalidade pedir à ANEEL que se abstenha de
exigir o cumprimento das obrigações decorrentes do
atraso na entrada em operação comercial das
unidades geradoras, amparadas por excludentes de
responsabilidade, nos prazos previstos no Contrato de
Concessão, até que seja julgado definitivamente o
pedido de aprovação do novo cronograma físico – ou
seja, até que ocorra o trânsito em julgado
administrativo – em face das excludentes de
responsabilidade pleiteadas.
No caso das usinas UHE Santo Antônio, UHE Jirau e
UHE Belo Monte, cujos respectivos concessionários
tiveram seus pleitos cautelares administrativos
negados ou não apreciados (omissão) pela ANEEL,
com vistas a evitar os referidos prejuízos financeiros,
não restou outra saída senão socorrerem-se à Justiça
Federal, visando obter medidas liminares que
9
XXXIV - são a todos assegurados, independentemente do
pagamento de taxas:
a) o direito de petição aos Poderes Públicos em defesa de
direitos ou contra ilegalidade ou abuso de poder;
11
LV - aos litigantes, em processo judicial ou administrativo,
e aos acusados em geral são assegurados o contraditório e
ampla defesa, com os meios e recursos a ela inerentes;
suspendessem todas as obrigações contratuais até
que a ANEEL decidisse definitivamente (trânsito em
julgado administrativo) os pedidos de
reconhecimento de excludentes de responsabilidade.
Diversamente foi o caso da Energia Sustentável do
Brasil – ESBR (UHE Jirau), que pleiteou junto à ANEEL,
inicialmente, o reconhecimento de 334 (trezentos e
trinta e quatro dias) à título de excludentes de
responsabilidade, decorrentes de greves,
depredações, vandalismos, incêndios e problemas de
desembaraço aduaneiro. No entanto, o Parecer nº
136/2013 da Procuradoria-Geral da ANEEL, de 19 de
março de 2014, opinou pelo reconhecimento de
apenas 66 (sessenta e seis) dias de atraso, à título de
excludentes de responsabilidade por atos de
vandalismos e retenção ilegal de equipamento
(desembaraço aduaneiro).
3.1 Decisões de mérito quanto ao reconhecimento
das excludentes de responsabilidade por atraso
na entrada em operação comercial
As usinas UHE Belo Monte, UHE Santo Antônio e UHE
Jirau são consideradas usinas estruturantes,
construídas na inóspita região Amazônia, cujo regime
hidrológico de cheias e vazões traz uma série de
dificuldades para a execução das obras, haja vista
que, com o aumento da vazão dos rios no período da
cheia, não é possível executar obras no leito do rio,
em face da denominada "janela hidrológica". Assim,
caso hajam atrasos no cronograma de obras, poderão
haver reflexos indiretos pela perda do período seco
em que é possível realizar as obras no leito do rio,
como construção da ensecadeira para drenar a água e
erigir a barragem.
Em face da magnitude e complexidade das obras, o
Conselho Nacional de Política Energética – CNPE
indicou tais projetos hidrelétricos como sendo
prioritários, com importância estratégica e de
interesse público para o país.
12
Tais usinas preveem no Edital de Leilão e no Contrato
de Concessão a obrigatoriedade de destinação de
70% (setenta por cento) da energia gerada para o
mercado regulado, mediante assinatura de CCEARs
com diversas distribuidoras supridas, cujo preço foi
definido no leilão. Assim, há a responsabilidade de
entrega da energia no início da entrada em operação
comercial das unidades geradoras.
Caso haja descumprimento, a concessionária assume
uma série de prejuízos financeiros, o que poderá até
inviabilizar o próprio negócio, porquanto a
motorização das unidades geradoras dessas usinas é
gradual e os prejuízos iniciais podem impedir a
implementação das demais unidades geradoras.
A Santo Antônio Energia S.A. – SAESA é uma
concessionária de Uso de Bem Público de Energia
12
Conforme Resoluções CNPE nº 4/2007 (UHE Santo
Antônio), nº 1/2008 (UHE Jirau) e nº 5/2009 (UHE Belo
Monte)
Elétrica
13
, em regime de Produção Independente de
Energia Elétrica, mediante outorga de concessão para
implantar e operar a UHE Santo Antônio, com 3.568
MW de potência instalada.
Essa concessionária efetuou protocolo na ANEEL de
pedido de excludente de responsabilidade pela
ocorrência de greves e atos criminosos ocorridos no
canteiro de obras, entre os anos de 2009 a 2013,
totalizando 107,71 (sento e sete virgula setenta e um)
dias.
Ainda que a SFG/ANEEL tenha reconhecido 37 (trinta
e sete) dias, a Diretoria da Agência não reconheceu
nenhum dia de atraso, ao argumento de que a
antecipação do cronograma – formalizada à pedido
da concessionária com o Poder Concedente – ocorreu
por conta e risco do empreendedor e não integrou a
equação original previsto no contrato de concessão,
pois teria ocorrido uma renúncia quanto às
excludentes em face da antecipação do
cronograma.
14
Desta decisão a SAESA interpôs Recurso
Administrativo, postulando pelo reconhecimento de
107,71 dias ou, subsidiariamente, 84 (oitenta e
quatro) dias de atraso, e, consequentemente, pela
alteração do cronograma da usina e dos contratos
CCEARs a ele vinculados. Fundamentou-se,
essencialmente, que a assinatura de Termo Aditivo
antecipando o cronograma de obras não implica
renúncia ao direito de pleitear-se excludentes de
responsabilidade com amparo em fatos anteriores.
Concomitantemente a SAESA também ajuizou Ação
Declaratória com Obrigação de Fazer,
15
objetivando
buscar a declaração de ilegalidade das greves, no
período de 84 (oitenta e quatro) dias, para
determinar à ANEEL que promova as alterações
necessárias no cronograma físico de implantação da
UHE Santo Antônio, a recontabilização das obrigações
de fornecimento de energia e encargos no período
em questão, no âmbito da CCEE, bem como a isenção
de quaisquer penalidades, sanções e restrições
decorrentes das alegadas excludentes de
responsabilidade.
Alega a concessionária que, nos anos de 2009 a 2013,
foram deflagradas greves e manifestações ilegais e
violentas que ultrapassaram a esfera das relações
trabalhistas e configuram perturbação da ordem
pública, mediante roubos, saques, depredações e
incêndios, cujo resultado comprometeu o ritmo das
obras das usinas que compõem o Complexo do rio
Madeira (UHE Santo Antônio e UHE Jirau) e motivou a
intervenção da Força Nacional de Segurança Pública.
13
Leilão nº 05/2007 e Contrato de Concessão nº 001/2008-
MME-UHE Santo Antonio.
14
Voto de Relatoria do Diretor André Pepitone da Nóbrega,
proferido em 28/04/2015, nos autos do processo ANEEL nº
48500.001273/2008-22.
15
Processo nº 2750-04.2015.4.01.4100, em trâmite na 1ª
Vara Federal de Rondônia.
Em sua fundamentação, alega a concessionária que
houve omissão da ANEEL por ausência de deliberação
por 22 (vinte e dois) meses, o que teria infringido a
razoável duração do processo prevista no art. 5º
inciso LXXVIII, da Constituição Federal de 1988
16
, o
disposto no art. 49 da Lei nº 9.784/99
17
, que prevê
até 60 (sessenta) dias para a administração pública
decidir após instruir o feito, e o disposto no art. 37 da
Resolução Normativa ANEEL nº 273/2007
18
, que
prevê até 90 (noventa) dias para a Agência decidir
pedidos e requerimentos de qualquer espécie, sendo,
portanto, considerado a demora da Agência abusiva e
injustificável, equivalente ao indeferimento dos
pedidos pelo silêncio administrativo negativo, o que
justifica a propositura da ação antes da decisão
definitiva no âmbito da ANEEL.
19
Essa demora da Agência, por sua vez, trouxe prejuízos
significativos à SAESA, que foi obrigada a adquirir
energia para recompor o lastro no âmbito da CCEE e a
pagar o Encargo do Uso do Sistema de Transmissão –
EUST ao ONS, com prejuízos na ordem de 1,3 bilhões
de reais, conforme afirma a concessionária em sua
petição inicial.
Em decorrência do alegado, foi deferida antecipação
de tutela determinando à ANEEL que (i) reconheça,
inicialmente, 56 (cinquenta e seis) dias de atraso no
cronograma de obras, e (ii) contabilize as obrigações
de fornecimento de energia e pagamentos de
encargos referente aos impactos das excludentes de
responsabilidade. Contudo, a decisão foi suspensa por
decisão monocrática proferida pelo STJ, em
16
LXXVIII - a todos, no âmbito judicial e administrativo, são
assegurados a razoável duração do processo e os meios que
garantam a celeridade de sua tramitação. (Incluído pela
Emenda Constitucional nº 45, de 2004).
17
Art. 49. Concluída a instrução de processo administrativo, a
Administração tem o prazo de até trinta dias para decidir,
salvo prorrogação por igual período expressamente
motivada.
18
Art. 37. Será de noventa dias o prazo máximo para decisão
de petições e requerimentos de qualquer espécie
apresentados à Agência, ressalvado o disposto em legislação
específica.
19
"O silêncio administrativo negativo, ao contrário do
positivo, se caracteriza pelo indeferimento do petitório
levantado pelo administrado, isto é, a inatividade formal do
Poder Público, por descumprir o prazo legal/regulamentar,
implica a denegação do requerimento promovido. [...]
O silêncio administrativo negativo próprio é de fácil
constatação, uma vez que a disposição legal é categórica:
ocorrendo inatividade formal da Administração pública,
observado o prazo legal, tem-se a denegação ou o
indeferimento do requerimento apresentado pelo
administrado.
Assim sendo, pode-se gizar que inexiste qualquer adversidade
quanto à consolidação dos seus efeitos, a saber, o uso das
vias administrativas recursais ou judiciais pertinentes, haja
vista o emprego dado ao silêncio ocorrido, saber, o
indeferimento ex lege do requerimento apresentado ou
interposto. (LIMA, Raimundo Márcio Ribeiro. O silêncio
administrativo: A inatividade formal do Estado como uma
refinada forma de ilegalidade!.” Disponível em:
<http://www.agu.gov.br>. Acesso em: 08-07-2015)
aditamento à inicial empreendida pelas distribuidoras
que já haviam obtido decisão favorável na outra ação
judicial da SAESA.
20
Diversamente foi o caso da Energias Sustentável do
Brasil S.A. – ESBR, concessionária de Uso de Bem
Público de Energia Elétrica
21
, em regime de Produção
Independente de Energia, mediante outorga de
concessão para implantar e operar a UHE Jirau, com
3.750 MW de potência instalada.
A concessionária pleiteou inicialmente 334 (trezentos
e trinta e quatro dias) à título de excludentes de
responsabilidade, decorrentes de greves,
depredações, vandalismos, incêndios e problemas de
desembaraço aduaneiro. Na primeira decisão, a
ANEEL somente reconheceu 52 (cinquenta e dois)
dias em face de laudo pericial produzido em ação
cautelar julgada procedente. Em análise do pedido de
reconsideração, a Agência manteve o
reconhecimento de apenas 52 (cinquenta e dois) dias
de excludentes de responsabilidade.
22
Em ação ordinária movida pela ESBR contra a ANEEL
23
, pleiteando o reconhecimento das excludentes de
responsabilidade pelo atraso no cronograma de obras
da UHE Jirau, decorrente (i) dos reflexos diretos e
indiretos dos eventos danosos ocorridos em 2011 e
2012 no canteiro de obras da usina e também (ii) de
movimentos sociais, bem como aqueles (iii)
decorrentes dos Atos do Poder Público que
resultaram em atrasos por conta de retenções ilegais
efetuadas pelo fisco e da morosidade no
desembaraço aduaneiro de equipamentos destinados
às obras, com base (iv) em laudo pericial produzido
em sede de ação cautelar
24
, houve sentença de
mérito reconhecendo 535 (quinhentos e trinta e
cinco) dias de excludentes de responsabilidade e
determinação à ANEEL para que reveja e adeque o
cronograma físico de obras, sendo inexigíveis
20
A decisão foi proferida monocraticamente pela Ministra
Laurita Vaz, vice-presidente do STJ em exercício da
Presidência, nos autos da Suspensão de Segurança nº 2727.
Originariamente o então Ministro Presidente Feliz Fischer
proferiu decisão monocrática para suspender a decisão do
TRF1, que havia deferido pedido liminar nos autos do
Mandado de Segurança, interposto para suspender todas as
obrigações contratuais enquanto à ANEEL não decidisse o
pleito administrativo. Ao que pese a Ação Ordinária da SAESA,
em trâmite na 1ª Vara Federal de Rondônia, tratar-se de
causa de pedir diversa, pois nesta segunda ação discute-se o
mérito propriamente dito quanto ao reconhecimento das
excludentes de responsabilidade, a Ministra entendeu que
ambos os feitos têm a mesma finalidade, e, portanto, adotou
as mesmas razões explicitadas na decisão anterior para
suspender a eficácia do pedido de antecipação de tutela
deferido no TRF1.
21
Leilão nº 5/2008 e Contrato nº 2/2008–MME–UHE JIRAU.
22
Voto de Relatoria do Diretor André Pepitone da Nóbrega,
proferido em 28/04/2015, nos autos do processo ANEEL nº
48500.004505/2008-02.
23
Processo nº 10426-71.2013.4.01.4100 – 5ª Vara Federal
Ambiental e Agrária de Rondônia-RO.
24
Processo nº 9500-90.2013.4.01.4100 – 5ª Vara Federal
Ambiental e Agrária de Rondônia-RO.
quaisquer obrigações, penalidades e custos impostos
por conta dos atrasos oriundos dos eventos.
No tocante à Norte Energia S.A. – NESA, esta é
concessionária de Uso de Bem Público de Energia
Elétrica
25
, em regime de Produção Independente de
Energia, mediante outorga de concessão para
implantar e operar a UHE Belo Monte, usina
hidrelétrica que quando finalizada será a 4ª maior
hidrelétrica do mundo, com 11.000 MW de potência
instalada na Casa de Força Principal (Belo Monte), e
233,1 MW de potência instalada na Casa de Força
Complementar (Pimental), o que totaliza 11.233,1
MW de potência instalada.
A Norte Energia S.A. solicitou à ANEEL
26
que
reconhecesse as excludentes de responsabilidade
pelo atraso na entrada em operação comercial,
decorrentes do (i) atraso na emissão da Licença de
Instalação – LI, (ii) atraso na emissão da Declaração
de Utilidade Pública – DUP, medidas liminares que
paralisaram todas as obras no total de 81 (oitenta e
um) dias – causando a perda da janela hidrológica e a
paralisação das obras no leito do rio Xingu – e (iii)
invasão do canteiro de obras, obstrução de acesso e
movimentos grevistas, totalizando 460 (quatrocentos
e sessenta) dias na Casa de Força Secundária
(Pimental) e 365 (trezentos e sessenta e cinco) dias na
Casa de Força Principal (Belo Monte).
Em exaustiva decisão, a ANEEL negou todas as
excludentes de responsabilidade
27
, ao argumento, em
suma, de que a NESA supostamente não teria
comprovado o nexo de causalidade entre os fatos
alegados e os atrasos, que o dano não teria sido
comprovado e que haveria comportamento
contraditório (venire contra factum proprium) da
concessionária ao ter afirmado que os eventos
alegados não teriam impactado as obras.
A NESA interpôs pedido de reconsideração contra a
decisão da Agência, com pedido cautelar de
suspensão de todas as obrigações contratuais até o
julgamento definitivo do pedido.
Alegou-se, preliminarmente, violação dos princípios
constitucionais da ampla defesa e do contraditório
pela omissão da ANEEL em não apreciar os
argumentos declinados na petição protocolada pela
NESA para contrapor os argumentos exarados no
parecer da Procuradoria-Geral da ANEEL, bem como
pela necessidade de se produzir prova técnica
pericial, em face da afirmação da própria Agência, em
dizer que existe dificuldade em se identificar o nexo
de causalidade.
No mérito, a NESA arguiu que o nexo de causalidade
estaria perfeitamente demonstrado, haja vista que a
própria Agência reconhece a existência do atraso e da
25
Leilão nº 06/2009 e Contrato de Concessão nº 001/2010-
MME-UHE Belo Monte.
26
Processo ANEEL nº 48500.006599/2013-11.
27
Voto de Relatoria do Diretor José Jurhosa Junior, proferido
em 28/04/2015, nos autos do processo nº
48500.006599/2013-11.
ocorrência de fatos extraordinários. E quanto ao
comportamento contraditório, a NESA demonstrou a
sua inaplicabilidade ao caso, tanto sob o enfoque
jurídico como fático, pois as afirmações da NESA de
inexistência de atraso – alegadas pela ANEEL para
negar o pleito – muitas das vezes ocorreram logo
após a ocorrência dos fatos, sendo que, somente após
alguns meses, é que se pôde mensurar o efetivo dano
no cronograma de obras, como de fato ocorreu.
Foram afirmações tomadas com o intuito de
responder à uma ação fiscalizatória da ANEEL, sob
pena de imposição de multa, o que justifica a boa-fé
da concessionária em afirmar que não haveria atraso
e que estaria envidando todos os esforços para
recuperar o tempo perdido. Em uma das
oportunidades, a Agência tomou conhecimento da
liminar movida pela ACEPOAT – que paralisou as
obras por 77 (setenta e sete dias – através da mídia,
antes da concessionária ter sido intimada
oficialmente da decisão, tendo enviado ofício para
que a mesma respondesse sobre os reflexos desta
medida no cronograma de obras, sob pena de
aplicação das penalidades previstas na Resolução
Normativa ANEEL nº 63/2004. Naquela oportunidade
era impossível mensurar-se quaisquer efeitos
concretos desta medida no andamento das obras,
pela razão óbvia de que não seria possível saber por
quanto tempo a medida judicial iria paralisar as obras.
Quanto aos eventos que culminaram o atraso nas
obras da UHE Belo Monte, a concessionária rebateu
ponto a ponto as argumentação proferidas na decisão
da Agência, apresentando considerações sobre a
dimensão e andamento das obras e todas as
excludentes de responsabilidade já referidas, bem
como planilha com linha do tempo demonstrando a
ocorrência dos sucessivos atrasos, incluindo
somatório dos dias sem que houvesse sobreposição
de datas no cálculo final dos dias de atraso.
Sobre tudo que foi dito, merece destaque os 61
(sessenta em um) dias que o IBAMA demorou além
do prazo contratual de 06 (seis) meses para emitir a
Licença de Instalação – LI. Destacou-se que nenhuma
razão assiste à ANEEL, pois o contrato de concessão
prevê expressamente a data em que a licença deveria
ser emitida, considerando 06 (seis) meses desde a
data do pedido protocolado no órgão ambiental.
Assim, a justificativa de que o prazo poderia ser
prorrogado por 06 (seis) meses, conforme art. 14 da
Resolução CONAMA nº 273/97
28
, em face da
existência de EIA/RIMA, não possui aplicabilidade,
pois há data definida contratualmente para a
obtenção da LI e todos os outros marcos temporais
28
Art. 14. O órgão ambiental competente poderá estabelecer
prazos de análise diferenciados para cada modalidade de
licença (LP, LI e LO), em função das peculiaridades da
atividade ou empreendimento, bem como para a formulação
de exigências complementares, desde que observado o prazo
máximo de 6 (seis) meses a contar do ato de protocolar o
requerimento até seu deferimento ou indeferimento,
ressalvados os casos em que houver EIA/RIMA e/ou audiência
pública, quando o prazo será de até 12 (doze) meses.
do cronograma físico foram definidos a partir deste.
Ademais, o contrato de concessão, lei entre as partes,
é norma hierarquicamente superior às resoluções do
CONAMA.
Pelo exposto, pôde-se concluir que somente a UHE
Jirau teve suas excludentes de responsabilidade
plenamente atendidas, decorrente de ação judicial
proposta contra a Agência, com base em produção de
laudo pericial, em ação cautelar, imediatamente após
o incêndio e demais eventos criminosos que
causaram atrasos para o cumprimento da avença
contratual, e também com base em atos do poder
público decorrentes dos embaraços aduaneiros. Nos
demais casos, a Agência utilizou-se de todos os
argumentos possíveis, com o objetivo nítido de negar
as excludentes de responsabilidade, desconsiderando
que sua posição, neste caso, deveria ser de
neutralidade entre os agentes do setor elétrico.
3.2 Considerações sobre a análise de
excludentes de responsabilidade pela ANEEL
Na análise das excludentes de responsabilidade por
atraso no cronograma de obras, cujo reflexo será o
atraso na entrada em operação comercial da usina, a
ANEEL apura as informações através da fiscalização
das obras, com base nos relatórios mensais que o
agente envia à área técnica responsável, no caso, a
Superintendência de Fiscalização de Serviços de
Geração – SFG.
Diversos são os precedentes em que a ANEEL
reconheceu excludentes de responsabilidade sobre os
atrasos na entrada em operação comercial de usinas
de geração hidrelétrica, cujo resultando culminou na
aprovação de novo cronograma físico das obras,
afastamento da obrigação do gerador de repor lastro
de energia na CCEE decorrente dos CCEARs e isenção
de sanções e penalidades.
29
Contudo, após a análise do caso da usina
termoelétrica UTE Maranhão III
30
, houve mudança de
postura por parte da Agência, que começou a exigir
que o agente comprovasse cabalmente o nexo de
causalidade entre os eventos extraordinários
29
Cite-se v.g. o precedente constante do Voto de Relatoria do
Diretor Julião Silveira Coelho, proferido em 17/03/2012, nos
autos do Processo ANEEL nº 48500.000893/2009-24,
instruído pela Nota Técnica SCG nº 398/2010 e Parecer PGE
nº 155/2011. Trata-se do caso da UHE Mauá, com 363MW de
potência instalada, em que a ANEEL reconheceu 469
(quatrocentos e sessenta e nove) dias de atraso por
excludentes de responsabilidade decorrentes de medidas
judiciais e demora na emissão de licença ambiental pelo
IBAMA, sendo 64 (sessenta e quatro) dias decorrentes da
perda da janela hidrológica. Destacam-se também os
seguintes precedentes da Procuradoria-Geral da ANEEL:
Parecer nº 791/2010-PGE/ANEEL, Parecer nº 075/2011-
PGE/ANEEL e Parecer nº 1.079/2010 – PGE/ANEEL.
30
Processo ANEEL nº 48500.004388/2011-74.
alegados e o prejuízo suportado no cronograma de
obras.
31
O que se têm observado, a partir das informações
veiculadas nos canais de notícias, é que desde as
reuniões do Comitê de Monitoramento do Setor
Elétrico – CMSE, ocorridas no ano de 2014, para
discutir o problema dos atrasos excessivos das obras
de construção de usinas de geração e linhas de
transmissão, e a ampla divulgação desses relatórios
na mídia, a ANEEL, ao invés de apurar devidamente os
fatos quanto à comprovação do nexo de causalidade,
mediante fiscalização in locu e laudo de engenharia
(perícia), têm simplesmente negado todos os pleitos
de excludentes de responsabilidade dos agentes, sob
a alegação de que o agente deve comprovar
cabalmente o nexo de causalidade.
Os problemas extraordinários enfrentados pelos
agentes comumente caracterizam-se nas seguintes
situações:
31
Sobre este aspecto, importa transcrever excerto do Voto
de relatoria do Diretor José Jurhosa, nos autos do processo nº
48500.006599/2013-11, que indeferiu os sucessivos pedidos
de excludentes de responsabilidade formulados pela Norte
Energia S.A. (UHE Belo Monte), nos seguintes termos:
"178. Naquela oportunidade, o Relator reconheceu que,
embora o outorgado de geração não tenha incentivo para
retardar o cronograma e nem o início do suprimento de seus
contratos de comercialização, algumas decisões da ANEEL
firmaram a percepção de que, na hipótese de atraso, o
empreendedor terá sua responsabilidade eximida, ainda que
não haja a comprovação fática do nexo de causalidade entre
os eventos suscitados e os atrasos incorridos. E mais, que se
tratava de direito que, uma vez invocado, limitaria inclusive a
possibilidade de a ANEEL conferir tratamento diferenciado à
matéria, sob pena de ofensa à segurança jurídica e à
isonomia, conforme alertou o Relator no caso da UTE
Maranhão III.
179. Posteriormente àquela decisão, ao indeferir o pedido de
excludente de responsabilidade com vistas à alteração de
cronograma de implantação e do início do suprimento das
EOLs Primavera, Cristal e São Judas [Processos
48500.005408/2010-43, 48500.005409/2010-98 e
48500.005407/2010-07], o Relator explicitou a relevante
alteração na jurisprudência do Colegiado quanto à extensão e
à profundidade a serem aplicadas quando da análise de
excludentes de responsabilidade, não bastando presumir o
nexo de causalidade, que deverá ser comprovado pelo agente
e verificado pela Agência.
180. Consolidar o entendimento inaugurado pelo Relator no
caso da UTE Maranhão III requer um olhar diferenciado da
Agência. Não basta pedir, há que se comprovar o nexo de
causalidade.
181. Inúmeros têm sido os eventos trazidos à apreciação da
ANEEL para justificar os atrasos na implantação dos
empreendimentos de geração. Dentre eles, a demora na
obtenção das licenças ambientais, aí incluído um sem número
de situações que provocam os alegados atrasos, demora na
obtenção de declaração de utilidade pública, lentidão na
expedição dos atos de outorga, quando da alteração de
características técnicas, descompasso entre obras de geração
e transmissão, embaraços alfandegários e aduaneiros,
invasões aos canteiros, obstrução de acesso, movimentos
grevistas e sociais, medidas liminares e ações judiciais. Enfim,
uma gama de situações, todas usadas para justificar atrasos
na implantação dos empreendimentos de geração.”
a) demora na emissão das licenças ambientais
(fato da administração);
b) medida liminar judicial suspendendo as obras,
motivadas por novas exigências relacionadas às licenças
ambientais e outras questões alheias à vontade do
agente (fato da administração);
c) normas ambientais supervenientes trazendo
restrições ao projeto básico aprovado (fato da
administração);
d) demora da ANEEL na emissão da Declaração
de Utilidade Pública – DUP, cujo documento é
indispensável à desapropriação das terras para as
obras (fato da administração);
e) demora injustificável nos embaraços
aduaneiros e alfandegários (fato da administração);
f) demora na expedição de atos de outorga (fato
da administração);
g) invasão, obstrução de acesso e incêndio
no canteiro de obras (força maior);
h) movimentos grevistas e sociais (força maior);
Observe-se que a responsabilidade do agente de
geração limita-se na entrega dos seus relatórios
mensais à ANEEL
32
, e que, se tais informações não
forem suficientes, compete ao órgão regulador o
ônus da prova, conforme regra de distribuição
probatória prevista no art. 333 do Código de Processo
Civil
33
.
Neste caso, compete à ANEEL alegar o fato
impeditivo, modificativo ou extintivo quanto ao
indeferimento das excludentes de responsabilidades,
comprovadas pelos agentes, em seus relatórios
mensais, porquanto, distribuir diversamente o ônus
da prova torna excessivamente difícil aos agentes o
exercício do seu direito, ainda mais quando
transcorridos muitos meses após a ocorrência dos
eventos.
Em suma, a ANEEL, com vistas a evitar uma suposta
"indústria" de excludentes de responsabilidade, tem
negado praticamente todos os pedidos que são
submetidas ao seu crivo regulatório – desde que se
iniciou a crise no setor elétrico, no início de 2013 –
em face dos prejuízos financeiros que os agentes têm
acumulado desde então, resultantes do desastre que
foi a antecipada renovação das concessões de
geração e transmissão promovidas pela Lei nº
32
É obrigação da concessionária ou autorizada entregar
relatórios mensais sobre o andamento das obras, sob pena de
punição nos termos do art. 6º, inciso XIX, da Resolução
Normativa ANEEL nº 63/2004, conforme competências da
Agência prevista nos arts. 16 e 19 do Decreto nº 41.019/57,
no art. 3º da Lei nº 8.987/95, no art. 17 do Decreto nº
2.003/96, no art. 2º da Lei nº 9.427/96 e no art. 2º, nos
incisos XV e XXXIII do art. 4º e nos incisos II e V do art. 16, do
Anexo I do Decreto nº 2.335/97.
33
Art. 333. O ônus da prova incumbe:
I - ao réu, quanto à existência de fato impeditivo, modificativo
ou extintivo do direito do autor. Parágrafo único. É nula a
convenção que distribui de maneira diversa o ônus da prova
quando: I - recair sobre direito indisponível da parte;
II - tornar excessivamente difícil a uma parte o exercício do
direito.
12.783/2013, além da crise hidrológica que se arrasta
desde o final do ano de 2012, impondo geração
termoelétrica à preços elevadíssimos, cujo resultado
elevou o PLD a valores praticamente impagáveis pelos
agentes expostos, o que afetou especialmente a
receita das distribuidoras.
Evidencia-se uma incompreensível mudança de
postura por parte da ANEEL, com base em motivações
estranhas à lei, doutrina e jurisprudência, pautadas
em uma indevida inversão nas regras processuais de
distribuição do ônus probatório, quanto ao
reconhecimento de excludentes de responsabilidade
(comprovação de nexo causal), o que ensejou uma
massiva judicialização, cujo destaque enfocamos nas
ações referentes às grandes obras prioritárias e
estratégicas de geração hidrelétrica no norte do país.
Todavia, também insta destacar que a ANEEL, na
forma do que dispõe o art. 3º, incisos IV e V, Anexo
do Decreto nº 2.335/97
34
, tem a missão de promover
o desenvolvimento do mercado em equilíbrio entre
os agentes de geração, transmissão e distribuição,
pautando-se por uma modicidade tarifária que
incentive o investimento no setor elétrico brasileiro,
estimule a qualidade do serviço prestado e assegure a
viabilidade econômico-financeira das concessões.
Com efeito, as referidas decisões, adotadas pela
ANEEL com vistas a evitar, a qualquer custo, o
aumento tarifário (modicidade tarifária), elevaram
consideravelmente o chamado risco regulatório, que
se traduz em aumento na precificação do custo de
investimento no setor elétrico.
Na prática, os investidores ou (i) deixarão de
participar dos leilões promovidos para implantar
usinas de geração hidrelétrica – principalmente na
região amazônica –, ou (ii) precificarão os custos
associados a um possível e elevado risco de atraso
nas obras, para fins de lance de oferta dos leilões, o
que resultará, inevitavelmente, em: (a)
desinvestimento no setor elétrico; (b) aumento dos
custos inerentes aos novos empreendimentos; e,
consequentemente, (c) aumento da tarifa de energia
elétrica para os consumidores cativos.
Considerando que a geração hidrelétrica é de energia
renovável, não poluente, de baixo impacto ambiental
e reduzido custo quando comparado à geração
termoelétrica movida à gás, carvão ou óleo
35
, o
34
Art. 3º A ANEEL orientará a execução de suas atividades
finalísticas de forma a proporcionar condições favoráveis para
que o desenvolvimento do mercado de energia elétrica
ocorra com equilíbrio entre os agentes e em benefício da
sociedade, observando as seguintes diretrizes: [...]
IV - criação de condições para a modicidade das tarifas, sem
prejuízo da oferta e com ênfase na qualidade do serviço de
energia elétrica;
V - criação de ambiente para o setor de energia elétrica que
incentive o investimento, de forma que os concessionários,
permissionários e autorizados tenham asseguradas a
viabilidade econômica e financeira, nos termos do respectivo
contrato;
35
As usinas hidrelétricas comercializam energia pelo preço
médio de R$ 110,00 a R$ 250,00, ao passo que o custo do
resultado destas decisões regulatórias refletirá
inevitavelmente no aumento da poluição do ar
atmosférico e do preço da energia elétrica para o
consumidor, haja vista que as demais fontes de
geração hoje economicamente viáveis, tais como
solar e eólica, são instáveis e não entram na base de
geração como as fontes hidrelétrica e termoelétrica,
fontes estas estáveis, contínuas e necessárias à
estabilidade e segurança do sistema elétrico.
4. Conclusão
Ao lograr êxito no leilão e assinar contrato de
concessão junto ao Poder Concedente, o particular
assume uma série de obrigações contratuais que
merecem ser prestigiadas.
Contudo, como se viu, situações imprevisíveis e
extraordinárias podem alterar as previsões e o
cenário existente ao tempo em que se celebrou o
pacto. Falam-se em hipóteses que impõe ao particular
uma realidade fática inédita, sob a qual este não
detém qualquer ingerência, que impede ou
sobremaneira dificulta o cumprimento do pacto tal
como inicialmente preconizado.
Nessa circunstancia, comprovado que dado
inadimplemento (parcial ou total) foi motivados por
eventos extraordinários, alheios à vontade do
concessionário, imprevisíveis e, quando previsíveis,
de efeitos incalculáveis, há campo de incidência de
excludentes de responsabilidade. Isso conforme a
Teoria da Imprevisão, que se dividem nos casos
fortuitos, de força maior, atos do poder público, fatos
do príncipe e interferências imprevistas.
Tais excludentes também ensejam o reequilíbrio
econômico-financeiro do contrato de concessão, com
vistas a preservar a receita inicialmente estabelecida
na avença entre as partes contratantes, mediante a
recomposição do prazo perdido pelo atraso na
entrada em operação comercial.
Como visto, os problemas mais comuns enfrentados
são a demora na emissão das licenças ambientais,
efeitos imprevisíveis de medida liminar judicial que
suspende a obra, normas ambientais supervenientes
que trazem restrições ao projeto básico aprovado,
demora dos órgãos ambientais para expedir as
licenças ambientais, demora da ANEEL na emissão da
Declaração de Utilidade Pública – DUP, embaraços
aduaneiros e alfandegários, demora na expedição de
atos de outorga, invasão, obstrução de acesso e atos
de vandalismo no canteiro de obras, movimentos
grevistas e sociais.
Há ainda os prejuízos relacionados com o pagamento
pelo Uso do Bem Público – UBP à União Federal,
encargos setoriais, com destaque para a Tarifa de Uso
despacho das usinas termoelétricas vai de R$ 280,00 a R$
1.100,00, como é o caso da UTE Goiânia II, em que o Custo
Variável Unitário varia de R$ 915/MWh a R$ 1.148/MWh,
conforme exposto na Nota Técnica nº 001/2014-ASD-SEM-
SRG/ANEEL, de 10/10/2014.
do Sistema de Transmissão – TUST, Compensação
Financeira pela Utilização dos Recursos Hídricos –
CFURH e Taxa de Fiscalização de Serviços de Energia
Elétrica – TFSEE, assim como as sanções e penalidades
no âmbito da CCEE e ANEEL.
Analisando os casos dessas grandes usinas
construídas no norte do país, que enfrentaram
problemas de toda sorte para manter o cumprimento
do cronograma das obras, concluiu-se aqueles
concessionárias fazem jus ao reconhecimento de
excludentes de responsabilidade pelo atraso na
entrada em operação comercial de suas unidades
geradoras, motivados por atos e fatos expostos e
comprovados, os quais servem à ANEEL para deferir
os pedidos cautelares desses agentes, de forma a
suspender o efeito de todas as obrigações contratuais
até que fossem decididos definitivamente os pleitos
apresentados.
Pôde-se concluir que a Agência tem exigido dos
agentes a comprovação cabal do nexo de causalidade,
não aceitando como suficiente as informações
prestadas mensalmente pelos agentes à fiscalização,
o que constitui inversão do ônus da prova em
infringência à regra processual que impõe à ANEEL
provar o fato impeditivo, modificativo ou extintivo do
direito dos agentes.
Aliás, é de se observar que compete à ANEEL, na
qualidade de Agência Reguladora, fiscalizar as obras e
produzir prova suficiente para assegurar aos agentes
o reconhecimento das excludentes de
responsabilidade, ou, ao menos, sinalizar
previamente aos agentes a necessidade de que os
mesmos assim o façam.
O fato é que a ANEEL vinha reconhecendo
excludentes de responsabilidade de longa data, com
base nos mesmos fatos alegados pelas
concessionárias aqui analisadas, cuja prova era
lastreada unicamente nos relatórios mensais da
fiscalização sobre o andamento das obras e
cumprimento dos marcos temporais do cronograma
físico.
Contudo, a partir do caso da UTE Maranhão III e da
reunião do Comitê de Monitoramento do Setor
Elétrico – CMSE, ocorrida no ano de 2014, a Agência
mudou a sua postura de análise dessas excludentes,
sob a alegação de que teria se formado uma
verdadeira "indústria" de excludentes de
responsabilidade, mas cuja real motivação também
foi a busca de solução para reduzir os prejuízos
financeiros suportados pelas distribuidoras,
decorrentes dos problemas estruturais causados pela
antecipada renovação das concessões (Lei nº
12.783/2013) e pelo déficit hídrico.
É certo que os agentes devem, sim, ser penalizados,
caso atrasem as obras, haja vista que o atraso
importa na redução de oferta de energia ao sistema
elétrico, comprometendo o fornecimento de energia
e elevando o custo da tarifa, decorrente da
necessidade de despacho de geração termoelétrica
para garantir o fornecimento.
Todavia, na ocorrência de fatos extraordinários, em
que a conduta é alheia à vontade do concessionário,
decorrentes de eventos imprevisíveis e, quando
previsíveis, de consequências incalculáveis, pautadas
por excludentes de responsabilidade, tais prejuízos
não podem ser suportados pelos concessionários, sob
pena de se aumentar o risco regulatório, o que,
impreterivelmente, reflete em uma diminuição de
investimento no setor e aumento do preço de oferta
nos leilões de novas usinas hidrelétricas.
A Agência deveria ter uma postura diferente quando
da apreciação dos casos das concessionárias ora
analisadas, pautando-se segundo o interesse público
que é inerente a estes empreendimentos de geração
– estratégicos e prioritários para o país segundo o
CNPE – o que certamente evitaria que as mesmas
tivessem que buscar a intervenção do Judiciário para
obstar possível colapso financeiro de suas
concessões, o que traria maior segurança jurídica aos
vultuosos investimentos empregados, cujo impacto
resultaria na diminuição do risco regulatório e dos
custos associados aos leilões de novos
empreendimentos.
Pelo exposto, foi possível concluir que a ANEEL não
deve privilegiar substancialmente a diretriz da
modicidade tarifária quando da análise de
excludentes de responsabilidade pelo atraso na
entrada em operação comercial de usinas de geração
hidrelétrica, pois o Decreto nº 2.335/97 prevê que a
Agência tem a missão de desenvolver o mercado de
energia com equilíbrio entre os agentes, pautando-se
por uma modicidade tarifária que incentive o
investimento no setor elétrico brasileiro, estimule a
qualidade do serviço prestado e assegure a
viabilidade econômico-financeira da concessão.

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Excludentes de responsabilidade em atrasos de usinas

  • 1. Excludente de Responsabilidade Excludente de Responsabilidade: Atraso na entrada de operação de usinas geradoras de energia elétrica Fernando Flach Ana Caroline Koehler Juliana Angélica Renuncio Sobottka Rafaella Peçanha Guzela Abstract: When signing a concession contract for the implementation and operation of a new plant, the private (concessionaire) assumes a bundle of obligations that deserve prestige and that need to be complied with, responding for possible noncompliance. However, the occurrence of certain extraordinary and unforeseeable events, unrelated to the will and the sphere of action of the concessionaire, may prevent him from fulfilling the obligations assumed in the manner originally recommended. We're talking about circumstances protected by the Theory of Imprevision, capable of excluding the responsibility of the individual for default (total or partial) of the contract, and investigate how ANEEL gives it applicability at the same time as it seeks to develop the energy market with a balance between the agents, to presume the tariff modality, to stimulate the quality of the service provided and to ensure the economic and financial viability of the concession Keywords: Electrical energy, implementation and operation of a new plant, Theory of Imprevision, responsibility. 1 Introdução O presente artigo tem como objetivo abordar as questões inerentes ao reconhecimento de excludentes de responsabilidade frente a atraso na entrada em operação comercial de usinas hidrelétricas de geração de energia elétrica, no âmbito da Agência Nacional de Energia Elétrica – ANEEL e do Judiciário. As empresas investidoras em obras de infraestrutura para construção de usinas hidrelétricas de grande porte participam de leilões e, quando se sagram vencedoras, celebram Contrato de Concessão de Uso do Bem Público com o Poder Concedente (União Federal), por intermédio do qual se comprometem a implantar e operar a usina e assumem uma série de riscos associados a tal atividade. Neste contrato de concessão são estabelecidos os prazos do cronograma físico das obras, inclusive a data para a entrada em operação comercial das unidades geradoras, cujo descumprimento importa em penalidades no âmbito da ANEEL, e, no caso da comercialização, na necessidade de aquisição de energia elétrica para repor o lastro de energia e potência perante a Câmara de Comercialização de Energia Elétrica–CCEE, sob pena de severas sanções, visto que o financiamento destes empreendimentos, em regra, se dá pela venda antecipada da energia que será gerada, através do sistema de project finance. Permeando este modelo, existem os riscos ordinários do negócio, denominados contratualmente "por sua conta e risco", os quais devem ser previstos e assumidos pelos agentes concessionários, tais como atrasos decorrentes de atos comissivos ou omissivos imputáveis à conduta do agente. Contudo, também existem os atos extraordinários, os quais não podem ser imputados ao agente concessionário, pois alheios à sua vontade, decorrentes de atos imprevisíveis e, quando previsíveis, de efeitos incalculáveis, cuja responsabilidade ultrapassa os riscos ordinários do agente, não se incluindo, portanto, na cláusula contratual "por sua conta e risco". Tratam-se de casos fortuitos, força maior, atos do poder público, fato do príncipe e eventos imprevisíveis, cuja ocorrência do ato extraordinário, do dano e do nexo causal entre ambos, quando comprovado, impõe a readequação do cronograma físico das obras – para redefinição de novos marcos temporais e datas para entrada em operação comercial das unidades geradoras –, bem como o reequilíbrio econômico-financeiro do contrato de concessão. Nesta linha, serão abordadas às questões inerentes à aplicação da Teoria da Imprevisão, do direito ao reequilíbrio econômico-financeiro do contrato e relevantes casos que tratam da abordagem empreendida pela ANEEL sobre o tema, cujo objetivo será demonstrar os parâmetros jurídico-regulatórios que devem ser obedecidos. 2 Excludente de Responsabilidade O inadimplemento do contrato administrativo caracteriza-se pelo descumprimento total ou parcial de suas cláusulas por quaisquer das partes contratantes, seja a Administração Pública ou o contratado. A inexecução ou execução incompleta do contrato pode dar-se com culpa ou sem culpa de qualquer das partes, sendo que as consequências para o inadimplente variam a depender da presença ou ausência do elemento culpa. Para o presente artigo, interessa-nos a ocorrência de inexecução sem culpa do particular, verificada pela
  • 2. ocorrência de fatos alheios ao controle deste que impede ou dificulta o cumprimento do pacto tal como inicialmente preconizado. Fala-se aqui de fato excepcional, extraordinário e imprevisível, que enseja aplicação da Teoria da Imprevisão. A Teoria da Imprevisão resulta da aplicação de uma antiga cláusula, rebus sic stantibus, que se entende implícita em qualquer contrato de execução prolongada, segundo a qual o vinculo obrigatório gerado pelo contrato somente subsiste enquanto inalterado o estado de fato vigente à época de sua estipulação. De acordo com tal noção, aprimorada pela doutrina e sedimentada pela jurisprudência, existem hipóteses em que a força vinculante do contrato se atenua. Falam-se aqui em ocorrências de (i) caso fortuito, (ii) força maior, (iii) fato do príncipe, (iv) fato da administração e (v) interferências imprevistas. Segundo o artigo 19, § único da lei 13.360/2016: “Para os fins do disposto no caput, entendem-se como excludentes de responsabilidade todas as ocorrências de caso fortuito e força maior, incluindo, mas não se limitando a, greves, suspensões judiciais, embargos por órgãos da administração pública direta ou indireta, não emissão de licenças ou autorizações pelos órgãos competentes por motivo não imputável ao empreendedor e invasões em áreas da obra, desde que reconhecidos pela Aneel a ausência de responsabilidade do agente e o nexo de causalidade entre a ocorrência e o atraso na entrada em operação comercial.” Assim, no que tange à caracterização do excludente de responsabilidade, interessa-nos saber mais sobre os institutos do caso fortuito, força maior e fato da administração, como veremos a seguir. Os institutos jurídicos denominados de caso fortuito e de força maior são situações de fato que impedem o cumprimento de obrigações contratuais. O caso fortuito decorre de eventos da natureza, como catástrofes, ciclones e tempestades anormais. Já a força maior é resultado de um fato causado, de alguma forma, pela vontade humana, como é o clássico exemplo da greve 1 . Quanto ao fato da administração, Hely Lopes Meirelles traz a seguinte explanação sobre o tema: “Fato da Administração é toda ação ou omissão do Poder Público que, incidindo direta e especificamente sobre o contrato, retarda ou impede a sua execução. O fato da Administração equipara-se à força maior e produz os mesmos efeitos excludentes da responsabilidade do particular pela inexecução do ajuste. É o que ocorre, por exemplo, quando a Administração deixa de entregar o local da obra ou serviço, ou não providencia as desapropriações necessárias ou 1 CARVALHO FILHO. José dos Santos. Manual de Direito Administrativo. 16ª Ed. Lumen Juris: 2006. Pág. 179. atrasa os pagamentos por longo tempo, ou pratica qualquer ato impeditivo dos trabalhos a cargo da outra parte. 2 (grifo nosso) Nessas situações, o contrato administrativo é atingido de forma direta, comprometendo sobremaneira a possibilidade de efetivação de seus termos por parte do particular contratante. Na hipótese de ocorrer uma situação caracterizadora de fato da administração, deve-se promover a modificação do contrato, culminando, pois, em uma readequação de seus termos. Em relação aos requisitos caracterizadores do instituto em evidência, mais que uma ordem específica a um contrato administrativo, tem-se que a determinação estatal deve ser imprevisível ou, se previsível, de consequência incalculável. Os dispositivos legais que preveem a isenção de responsabilidade pelo atraso na entrada em operação comercial das usinas de geração hidrelétrica, decorrente de fatos caracterizados como excludentes de responsabilidade, encontram-se disciplinados no art. 57, § 1º, inciso II, da Lei nº 8.666/93 e no art. 2º, §§ 16 e 17, da Lei nº 10.848/2004, e mais recentemente, o artigo 19, § único da Lei nº 13.360/2016. No âmbito regulatório tem previsão no art. 4º, inciso II, da Resolução Normativa ANEEL nº 453/2011. Contratualmente, encontra-se expresso em cláusulas dos contratos de concessão de uso de bem público para geração de energia elétrica 3 e dos contratos de comercialização de energia elétrica no ambiente regulado – CCEARs. 4 2 MEIRELLES, Hely Lopes. Direito Administrativo Brasileiro, 16ª ed., SP: RT, 2000. 3 Subcláusula Primeira - Sem prejuízo do disposto nas demais Cláusulas deste Contrato, constituem encargos específicos da Concessionária, na exploração da UHE, o que se segue: [...] II. elaborar, por sua conta e risco, os projetos da UHE e executar as obras correspondentes, tudo em conformidade com as normas técnicas e legais específicas e de acordo com o cronograma físico apresentado à ANEEL, de modo a garantir a entrada em operação das Unidades Geradoras nas datas fixadas, assumindo todos e quaisquer ônus e responsabilidades pelos eventuais atrasos, ressalvados os casos de atos do Poder Público e os decorrentes de casos fortuitos ou de força maior, conforme Subcláusula Terceira desta Cláusula. [...] Subcláusula Terceira - No caso de atraso na entrada em operação comercial das Unidades Geradoras da UHE provocados por atrasos do Poder Público e decorrentes de caso fortuito ou força maior, o cronograma físico poderá ser revisto pela Concessionária e submetido à ANEEL para aprovação, observando o que determina o art. 3º do Decreto nº 5.163/2004. (Negrito). 4 CLÁUSULA 15 – CASO FORTUITO OU FORÇA MAIOR 15.1. Na ocorrência de evento de caso fortuito ou força maior, nos termos do parágrafo único do art. 393 do Código Civil, que afete ou impeça o cumprimento das obrigações contratuais, o CONTRATO permanecerá em vigor, mas a PARTE atingida pelo evento não responderá pelas consequências do não cumprimento de suas obrigações nos
  • 3. A ANEEL, por intermédio da sua Procuradoria-Geral, tem fundamentado o mesmo entendimento, conforme consta no Parecer nº 0098/2011-PGE/ANEEL: “26. A ANEEL, por meio de suas Superintendências, tem acertadamente admitido como excludente da responsabilidade do agente a ocorrência de caso fortuito, força maior ou ato do poder público, desde que um destes fatores tenha provocado o atraso. É exigida a imprevisibilidade do evento, produzido por forças anômalas e externas ao serviço público prestado, a inevitabilidade, quando não haveria nada que a Concessionária pudesse fazer para evitar o sinistro. 27. Assim, atraso de cronograma de empreendimentos justificados por um fato superveniente, inevitável e imprevisível, elide a Concessionária de qualquer punição, de modo que esta não poderá ser responsabilizada pela consequência de um evento do qual ela não teve participação, impossibilitando-a de cumprir sua obrigação.” Com o reconhecimento das excludentes de responsabilidade, devem ser afastados todos os prejuízos decorrentes do não cumprimento do termo contratual, no caso, quanto à entrada em operação comercial da usina, isentando o agente da necessidade de: (i) reposição de lastro de energia e potência na CCEE; (ii) pagamento pelo Uso do Bem Público – UBP à União Federal; (iii) pagamento dos encargos setoriais 5 ; e (iv) sofrer penalidades decorrente de descumprimento de cláusulas do contrato de concessão perante a ANEEL e (v) suportar penalidades oriundas da inadimplência dos contratos de comercialização no âmbito da CCEE. 3 Análise e Jurisprudência Acerca do Reconhecimento do Excludente de Responsabilidade A presente análise utiliza-se da ocorrência de alguns casos de usinas de grande porte situadas na região amazônica, cujos contratos de concessão preveem a assunção de dívidas, as quais devem ser cumpridas a termos do CONTRATO, durante o período de ocorrência do evento e proporcionalmente aos seus efeitos. 5 É obrigação da concessionária pagar especialmente pelos seguintes encargos setoriais: (i) Taxa de Fiscalização de Serviços de Energia Elétrica – TFSEE, instituída pela Lei nº 9.427/96 para custear a receita da ANEEL; (ii) Compensação Financeira pela Utilização de Recursos Hídricos – CFURH, criada pela Lei n.º 7.990/89 para indenizar os municípios pela afetação decorrente da utilização dos recursos hídricos; (iii) Tarifa de Uso do Sistema de Distribuição – TUSD e Tarifa de Uso do Sistema de Transmissão – TUST, instituída pela Lei nº 9.074/95 para remunerar os agentes de distribuição e transmissão pela utilização dos seus sistemas elétricos; e aplicar, anualmente, no caso das grandes hidrelétricas, o montante de, no mínimo, um por cento de sua receita operacional líquida em pesquisa e desenvolvimento do setor elétrico, nos termos da Lei nº. 9.991/2000, alterada pela Lei nº 10.848/2004, e na forma que dispuser a regulamentação específica sobre a matéria. partir da assinatura do contrato e, especialmente, a partir da entrada em operação comercial das unidades geradoras, que ocorre mediante motorização gradual e sucessiva das turbinas até a usina atingir a capacidade máxima de geração, embasando assim o Reconhecimento (ou não) do Excludente de Responsabilidade. Com efeito, na data da entrada em operação comercial das unidades geradoras, as concessionárias assumem as seguintes obrigações: (i) pagamento pelo Uso do Bem Público – UBP à União Federal; (ii) pagamento da Tarifa de Uso do Sistema de Transmissão – TUST ao ONS; (iii) pagamento da Compensação Financeira pela Utilização de Recursos Hídricos – CFURH à ANEEL; (iv) entrega da energia às diversas distribuidoras supridas/contratantes decorrentes do leilão ou, em caso de atraso na entrada em operação comercial das unidades geradoras (não geração de energia elétrica), obrigação de reposição do lastro de energia ou potência no âmbito da CCEE; tudo sob pena de pagamento de severas penalidades regulatórias e contratuais. Em decorrência das dificuldades logísticas, ambientais e sociais para implantar tais usinas na região amazônica, ocorreram atrasos na entrada em operação comercial das suas unidades geradoras. Objetivando evitar os enormes prejuízos financeiros em face das obrigações contratuais, bem como dos elevados preços do PLD no período 6 , as concessionárias fazem jus, inicialmente, à medida cautelar administrativa para suspender os efeitos de todas as obrigações, penalidades e sanções até que a ANEEL decida definitivamente os seus pleitos. O art. 47 da Resolução Normativa ANEEL nº 273/2004 7 , atento ao comando normativo exposto no artigo 61 da Lei nº 9.784/99 8 , prevê a possibilidade de concessão de efeito suspensivo nos recursos administrativos no âmbito da ANEEL, em havendo 6 O PLD atingiu o valor máximo de R$ 822,43/MWh em todo o ano de 2014. Em 2015, com vistas a evitar que os agentes expostos na CCEE pudessem sucumbir, a ANEEL reduziu o valor máximo do PLD para R$ 388,48/MWh a partir de janeiro. Contudo, os CCEARs das concessionárias, decorrentes do preço fixado no leilão, previam o importe aproximado de R$ 95,00 o MWh em valores de 2014. 7 Art. 47. Salvo disposição legal em contrário, o recurso não tem efeito suspensivo. §1º Havendo justo receio de prejuízo de difícil ou incerta reparação decorrente da execução da decisão recorrida, o Diretor-Geral poderá, de ofício ou a pedido, conceder efeito suspensivo ao recurso. 8 Art. 61. Salvo disposição legal em contrário, o recurso não tem efeito suspensivo. Parágrafo único. Havendo justo receio de prejuízo de difícil ou incerta reparação decorrente da execução, a autoridade recorrida ou a imediatamente superior poderá, de ofício ou a pedido, dar efeito suspensivo ao recurso.
  • 4. justo receito de prejuízo de difícil ou incerta reparação. Os requisitos para a concessão de efeito suspensivo são dois, a saber: (i) justo receio de prejuízo de difícil ou incerta reparação; e (ii) que o prejuízo decorra da execução da decisão combatida. O art. 45, da Lei nº 9.784/99, prescreve que "em caso de risco iminente, a Administração Pública poderá motivadamente adotar providências acauteladoras sem a prévia manifestação do interessado." Com base nestes dispositivos, tem sido pacífica a possibilidade de apreciação de Medida Cautelar pela Diretoria da ANEEL, fundamentada no direito constitucional de petição (art. 5º, inciso XXXIV da CFRB/88) 9 e no poder geral de cautela, este previsto no dispositivo legal supracitado. O Parecer nº 0756/2011/PGE-ANEEL/PGF/AGU, de 02/12/2011, posiciona-se favoravelmente ao entendimento de que os pedidos autônomos, formulados com base no direito de petição e que tenham por fundamento o poder geral de cautela do administrador, este na forma do que dispõe o art. 45 da Lei nº 9.784/99, devem ser apreciados pela Diretoria Colegiada da ANEEL, após distribuição a um Diretor Relator. 10 O objetivo da suspensão parcial e emergencial das obrigações legais e contratuais, nestes casos, tem como finalidade preservar a higidez, utilidade e eficácia do próprio processo administrativo, a fim de salvaguardar a inafastável proteção às garantias fundamentais da ampla defesa e do contraditório (art. 5º, inciso LV, da CFRB/88) 11 . Com efeito, a interposição de medida cautelar tem como finalidade pedir à ANEEL que se abstenha de exigir o cumprimento das obrigações decorrentes do atraso na entrada em operação comercial das unidades geradoras, amparadas por excludentes de responsabilidade, nos prazos previstos no Contrato de Concessão, até que seja julgado definitivamente o pedido de aprovação do novo cronograma físico – ou seja, até que ocorra o trânsito em julgado administrativo – em face das excludentes de responsabilidade pleiteadas. No caso das usinas UHE Santo Antônio, UHE Jirau e UHE Belo Monte, cujos respectivos concessionários tiveram seus pleitos cautelares administrativos negados ou não apreciados (omissão) pela ANEEL, com vistas a evitar os referidos prejuízos financeiros, não restou outra saída senão socorrerem-se à Justiça Federal, visando obter medidas liminares que 9 XXXIV - são a todos assegurados, independentemente do pagamento de taxas: a) o direito de petição aos Poderes Públicos em defesa de direitos ou contra ilegalidade ou abuso de poder; 11 LV - aos litigantes, em processo judicial ou administrativo, e aos acusados em geral são assegurados o contraditório e ampla defesa, com os meios e recursos a ela inerentes; suspendessem todas as obrigações contratuais até que a ANEEL decidisse definitivamente (trânsito em julgado administrativo) os pedidos de reconhecimento de excludentes de responsabilidade. Diversamente foi o caso da Energia Sustentável do Brasil – ESBR (UHE Jirau), que pleiteou junto à ANEEL, inicialmente, o reconhecimento de 334 (trezentos e trinta e quatro dias) à título de excludentes de responsabilidade, decorrentes de greves, depredações, vandalismos, incêndios e problemas de desembaraço aduaneiro. No entanto, o Parecer nº 136/2013 da Procuradoria-Geral da ANEEL, de 19 de março de 2014, opinou pelo reconhecimento de apenas 66 (sessenta e seis) dias de atraso, à título de excludentes de responsabilidade por atos de vandalismos e retenção ilegal de equipamento (desembaraço aduaneiro). 3.1 Decisões de mérito quanto ao reconhecimento das excludentes de responsabilidade por atraso na entrada em operação comercial As usinas UHE Belo Monte, UHE Santo Antônio e UHE Jirau são consideradas usinas estruturantes, construídas na inóspita região Amazônia, cujo regime hidrológico de cheias e vazões traz uma série de dificuldades para a execução das obras, haja vista que, com o aumento da vazão dos rios no período da cheia, não é possível executar obras no leito do rio, em face da denominada "janela hidrológica". Assim, caso hajam atrasos no cronograma de obras, poderão haver reflexos indiretos pela perda do período seco em que é possível realizar as obras no leito do rio, como construção da ensecadeira para drenar a água e erigir a barragem. Em face da magnitude e complexidade das obras, o Conselho Nacional de Política Energética – CNPE indicou tais projetos hidrelétricos como sendo prioritários, com importância estratégica e de interesse público para o país. 12 Tais usinas preveem no Edital de Leilão e no Contrato de Concessão a obrigatoriedade de destinação de 70% (setenta por cento) da energia gerada para o mercado regulado, mediante assinatura de CCEARs com diversas distribuidoras supridas, cujo preço foi definido no leilão. Assim, há a responsabilidade de entrega da energia no início da entrada em operação comercial das unidades geradoras. Caso haja descumprimento, a concessionária assume uma série de prejuízos financeiros, o que poderá até inviabilizar o próprio negócio, porquanto a motorização das unidades geradoras dessas usinas é gradual e os prejuízos iniciais podem impedir a implementação das demais unidades geradoras. A Santo Antônio Energia S.A. – SAESA é uma concessionária de Uso de Bem Público de Energia 12 Conforme Resoluções CNPE nº 4/2007 (UHE Santo Antônio), nº 1/2008 (UHE Jirau) e nº 5/2009 (UHE Belo Monte)
  • 5. Elétrica 13 , em regime de Produção Independente de Energia Elétrica, mediante outorga de concessão para implantar e operar a UHE Santo Antônio, com 3.568 MW de potência instalada. Essa concessionária efetuou protocolo na ANEEL de pedido de excludente de responsabilidade pela ocorrência de greves e atos criminosos ocorridos no canteiro de obras, entre os anos de 2009 a 2013, totalizando 107,71 (sento e sete virgula setenta e um) dias. Ainda que a SFG/ANEEL tenha reconhecido 37 (trinta e sete) dias, a Diretoria da Agência não reconheceu nenhum dia de atraso, ao argumento de que a antecipação do cronograma – formalizada à pedido da concessionária com o Poder Concedente – ocorreu por conta e risco do empreendedor e não integrou a equação original previsto no contrato de concessão, pois teria ocorrido uma renúncia quanto às excludentes em face da antecipação do cronograma. 14 Desta decisão a SAESA interpôs Recurso Administrativo, postulando pelo reconhecimento de 107,71 dias ou, subsidiariamente, 84 (oitenta e quatro) dias de atraso, e, consequentemente, pela alteração do cronograma da usina e dos contratos CCEARs a ele vinculados. Fundamentou-se, essencialmente, que a assinatura de Termo Aditivo antecipando o cronograma de obras não implica renúncia ao direito de pleitear-se excludentes de responsabilidade com amparo em fatos anteriores. Concomitantemente a SAESA também ajuizou Ação Declaratória com Obrigação de Fazer, 15 objetivando buscar a declaração de ilegalidade das greves, no período de 84 (oitenta e quatro) dias, para determinar à ANEEL que promova as alterações necessárias no cronograma físico de implantação da UHE Santo Antônio, a recontabilização das obrigações de fornecimento de energia e encargos no período em questão, no âmbito da CCEE, bem como a isenção de quaisquer penalidades, sanções e restrições decorrentes das alegadas excludentes de responsabilidade. Alega a concessionária que, nos anos de 2009 a 2013, foram deflagradas greves e manifestações ilegais e violentas que ultrapassaram a esfera das relações trabalhistas e configuram perturbação da ordem pública, mediante roubos, saques, depredações e incêndios, cujo resultado comprometeu o ritmo das obras das usinas que compõem o Complexo do rio Madeira (UHE Santo Antônio e UHE Jirau) e motivou a intervenção da Força Nacional de Segurança Pública. 13 Leilão nº 05/2007 e Contrato de Concessão nº 001/2008- MME-UHE Santo Antonio. 14 Voto de Relatoria do Diretor André Pepitone da Nóbrega, proferido em 28/04/2015, nos autos do processo ANEEL nº 48500.001273/2008-22. 15 Processo nº 2750-04.2015.4.01.4100, em trâmite na 1ª Vara Federal de Rondônia. Em sua fundamentação, alega a concessionária que houve omissão da ANEEL por ausência de deliberação por 22 (vinte e dois) meses, o que teria infringido a razoável duração do processo prevista no art. 5º inciso LXXVIII, da Constituição Federal de 1988 16 , o disposto no art. 49 da Lei nº 9.784/99 17 , que prevê até 60 (sessenta) dias para a administração pública decidir após instruir o feito, e o disposto no art. 37 da Resolução Normativa ANEEL nº 273/2007 18 , que prevê até 90 (noventa) dias para a Agência decidir pedidos e requerimentos de qualquer espécie, sendo, portanto, considerado a demora da Agência abusiva e injustificável, equivalente ao indeferimento dos pedidos pelo silêncio administrativo negativo, o que justifica a propositura da ação antes da decisão definitiva no âmbito da ANEEL. 19 Essa demora da Agência, por sua vez, trouxe prejuízos significativos à SAESA, que foi obrigada a adquirir energia para recompor o lastro no âmbito da CCEE e a pagar o Encargo do Uso do Sistema de Transmissão – EUST ao ONS, com prejuízos na ordem de 1,3 bilhões de reais, conforme afirma a concessionária em sua petição inicial. Em decorrência do alegado, foi deferida antecipação de tutela determinando à ANEEL que (i) reconheça, inicialmente, 56 (cinquenta e seis) dias de atraso no cronograma de obras, e (ii) contabilize as obrigações de fornecimento de energia e pagamentos de encargos referente aos impactos das excludentes de responsabilidade. Contudo, a decisão foi suspensa por decisão monocrática proferida pelo STJ, em 16 LXXVIII - a todos, no âmbito judicial e administrativo, são assegurados a razoável duração do processo e os meios que garantam a celeridade de sua tramitação. (Incluído pela Emenda Constitucional nº 45, de 2004). 17 Art. 49. Concluída a instrução de processo administrativo, a Administração tem o prazo de até trinta dias para decidir, salvo prorrogação por igual período expressamente motivada. 18 Art. 37. Será de noventa dias o prazo máximo para decisão de petições e requerimentos de qualquer espécie apresentados à Agência, ressalvado o disposto em legislação específica. 19 "O silêncio administrativo negativo, ao contrário do positivo, se caracteriza pelo indeferimento do petitório levantado pelo administrado, isto é, a inatividade formal do Poder Público, por descumprir o prazo legal/regulamentar, implica a denegação do requerimento promovido. [...] O silêncio administrativo negativo próprio é de fácil constatação, uma vez que a disposição legal é categórica: ocorrendo inatividade formal da Administração pública, observado o prazo legal, tem-se a denegação ou o indeferimento do requerimento apresentado pelo administrado. Assim sendo, pode-se gizar que inexiste qualquer adversidade quanto à consolidação dos seus efeitos, a saber, o uso das vias administrativas recursais ou judiciais pertinentes, haja vista o emprego dado ao silêncio ocorrido, saber, o indeferimento ex lege do requerimento apresentado ou interposto. (LIMA, Raimundo Márcio Ribeiro. O silêncio administrativo: A inatividade formal do Estado como uma refinada forma de ilegalidade!.” Disponível em: <http://www.agu.gov.br>. Acesso em: 08-07-2015)
  • 6. aditamento à inicial empreendida pelas distribuidoras que já haviam obtido decisão favorável na outra ação judicial da SAESA. 20 Diversamente foi o caso da Energias Sustentável do Brasil S.A. – ESBR, concessionária de Uso de Bem Público de Energia Elétrica 21 , em regime de Produção Independente de Energia, mediante outorga de concessão para implantar e operar a UHE Jirau, com 3.750 MW de potência instalada. A concessionária pleiteou inicialmente 334 (trezentos e trinta e quatro dias) à título de excludentes de responsabilidade, decorrentes de greves, depredações, vandalismos, incêndios e problemas de desembaraço aduaneiro. Na primeira decisão, a ANEEL somente reconheceu 52 (cinquenta e dois) dias em face de laudo pericial produzido em ação cautelar julgada procedente. Em análise do pedido de reconsideração, a Agência manteve o reconhecimento de apenas 52 (cinquenta e dois) dias de excludentes de responsabilidade. 22 Em ação ordinária movida pela ESBR contra a ANEEL 23 , pleiteando o reconhecimento das excludentes de responsabilidade pelo atraso no cronograma de obras da UHE Jirau, decorrente (i) dos reflexos diretos e indiretos dos eventos danosos ocorridos em 2011 e 2012 no canteiro de obras da usina e também (ii) de movimentos sociais, bem como aqueles (iii) decorrentes dos Atos do Poder Público que resultaram em atrasos por conta de retenções ilegais efetuadas pelo fisco e da morosidade no desembaraço aduaneiro de equipamentos destinados às obras, com base (iv) em laudo pericial produzido em sede de ação cautelar 24 , houve sentença de mérito reconhecendo 535 (quinhentos e trinta e cinco) dias de excludentes de responsabilidade e determinação à ANEEL para que reveja e adeque o cronograma físico de obras, sendo inexigíveis 20 A decisão foi proferida monocraticamente pela Ministra Laurita Vaz, vice-presidente do STJ em exercício da Presidência, nos autos da Suspensão de Segurança nº 2727. Originariamente o então Ministro Presidente Feliz Fischer proferiu decisão monocrática para suspender a decisão do TRF1, que havia deferido pedido liminar nos autos do Mandado de Segurança, interposto para suspender todas as obrigações contratuais enquanto à ANEEL não decidisse o pleito administrativo. Ao que pese a Ação Ordinária da SAESA, em trâmite na 1ª Vara Federal de Rondônia, tratar-se de causa de pedir diversa, pois nesta segunda ação discute-se o mérito propriamente dito quanto ao reconhecimento das excludentes de responsabilidade, a Ministra entendeu que ambos os feitos têm a mesma finalidade, e, portanto, adotou as mesmas razões explicitadas na decisão anterior para suspender a eficácia do pedido de antecipação de tutela deferido no TRF1. 21 Leilão nº 5/2008 e Contrato nº 2/2008–MME–UHE JIRAU. 22 Voto de Relatoria do Diretor André Pepitone da Nóbrega, proferido em 28/04/2015, nos autos do processo ANEEL nº 48500.004505/2008-02. 23 Processo nº 10426-71.2013.4.01.4100 – 5ª Vara Federal Ambiental e Agrária de Rondônia-RO. 24 Processo nº 9500-90.2013.4.01.4100 – 5ª Vara Federal Ambiental e Agrária de Rondônia-RO. quaisquer obrigações, penalidades e custos impostos por conta dos atrasos oriundos dos eventos. No tocante à Norte Energia S.A. – NESA, esta é concessionária de Uso de Bem Público de Energia Elétrica 25 , em regime de Produção Independente de Energia, mediante outorga de concessão para implantar e operar a UHE Belo Monte, usina hidrelétrica que quando finalizada será a 4ª maior hidrelétrica do mundo, com 11.000 MW de potência instalada na Casa de Força Principal (Belo Monte), e 233,1 MW de potência instalada na Casa de Força Complementar (Pimental), o que totaliza 11.233,1 MW de potência instalada. A Norte Energia S.A. solicitou à ANEEL 26 que reconhecesse as excludentes de responsabilidade pelo atraso na entrada em operação comercial, decorrentes do (i) atraso na emissão da Licença de Instalação – LI, (ii) atraso na emissão da Declaração de Utilidade Pública – DUP, medidas liminares que paralisaram todas as obras no total de 81 (oitenta e um) dias – causando a perda da janela hidrológica e a paralisação das obras no leito do rio Xingu – e (iii) invasão do canteiro de obras, obstrução de acesso e movimentos grevistas, totalizando 460 (quatrocentos e sessenta) dias na Casa de Força Secundária (Pimental) e 365 (trezentos e sessenta e cinco) dias na Casa de Força Principal (Belo Monte). Em exaustiva decisão, a ANEEL negou todas as excludentes de responsabilidade 27 , ao argumento, em suma, de que a NESA supostamente não teria comprovado o nexo de causalidade entre os fatos alegados e os atrasos, que o dano não teria sido comprovado e que haveria comportamento contraditório (venire contra factum proprium) da concessionária ao ter afirmado que os eventos alegados não teriam impactado as obras. A NESA interpôs pedido de reconsideração contra a decisão da Agência, com pedido cautelar de suspensão de todas as obrigações contratuais até o julgamento definitivo do pedido. Alegou-se, preliminarmente, violação dos princípios constitucionais da ampla defesa e do contraditório pela omissão da ANEEL em não apreciar os argumentos declinados na petição protocolada pela NESA para contrapor os argumentos exarados no parecer da Procuradoria-Geral da ANEEL, bem como pela necessidade de se produzir prova técnica pericial, em face da afirmação da própria Agência, em dizer que existe dificuldade em se identificar o nexo de causalidade. No mérito, a NESA arguiu que o nexo de causalidade estaria perfeitamente demonstrado, haja vista que a própria Agência reconhece a existência do atraso e da 25 Leilão nº 06/2009 e Contrato de Concessão nº 001/2010- MME-UHE Belo Monte. 26 Processo ANEEL nº 48500.006599/2013-11. 27 Voto de Relatoria do Diretor José Jurhosa Junior, proferido em 28/04/2015, nos autos do processo nº 48500.006599/2013-11.
  • 7. ocorrência de fatos extraordinários. E quanto ao comportamento contraditório, a NESA demonstrou a sua inaplicabilidade ao caso, tanto sob o enfoque jurídico como fático, pois as afirmações da NESA de inexistência de atraso – alegadas pela ANEEL para negar o pleito – muitas das vezes ocorreram logo após a ocorrência dos fatos, sendo que, somente após alguns meses, é que se pôde mensurar o efetivo dano no cronograma de obras, como de fato ocorreu. Foram afirmações tomadas com o intuito de responder à uma ação fiscalizatória da ANEEL, sob pena de imposição de multa, o que justifica a boa-fé da concessionária em afirmar que não haveria atraso e que estaria envidando todos os esforços para recuperar o tempo perdido. Em uma das oportunidades, a Agência tomou conhecimento da liminar movida pela ACEPOAT – que paralisou as obras por 77 (setenta e sete dias – através da mídia, antes da concessionária ter sido intimada oficialmente da decisão, tendo enviado ofício para que a mesma respondesse sobre os reflexos desta medida no cronograma de obras, sob pena de aplicação das penalidades previstas na Resolução Normativa ANEEL nº 63/2004. Naquela oportunidade era impossível mensurar-se quaisquer efeitos concretos desta medida no andamento das obras, pela razão óbvia de que não seria possível saber por quanto tempo a medida judicial iria paralisar as obras. Quanto aos eventos que culminaram o atraso nas obras da UHE Belo Monte, a concessionária rebateu ponto a ponto as argumentação proferidas na decisão da Agência, apresentando considerações sobre a dimensão e andamento das obras e todas as excludentes de responsabilidade já referidas, bem como planilha com linha do tempo demonstrando a ocorrência dos sucessivos atrasos, incluindo somatório dos dias sem que houvesse sobreposição de datas no cálculo final dos dias de atraso. Sobre tudo que foi dito, merece destaque os 61 (sessenta em um) dias que o IBAMA demorou além do prazo contratual de 06 (seis) meses para emitir a Licença de Instalação – LI. Destacou-se que nenhuma razão assiste à ANEEL, pois o contrato de concessão prevê expressamente a data em que a licença deveria ser emitida, considerando 06 (seis) meses desde a data do pedido protocolado no órgão ambiental. Assim, a justificativa de que o prazo poderia ser prorrogado por 06 (seis) meses, conforme art. 14 da Resolução CONAMA nº 273/97 28 , em face da existência de EIA/RIMA, não possui aplicabilidade, pois há data definida contratualmente para a obtenção da LI e todos os outros marcos temporais 28 Art. 14. O órgão ambiental competente poderá estabelecer prazos de análise diferenciados para cada modalidade de licença (LP, LI e LO), em função das peculiaridades da atividade ou empreendimento, bem como para a formulação de exigências complementares, desde que observado o prazo máximo de 6 (seis) meses a contar do ato de protocolar o requerimento até seu deferimento ou indeferimento, ressalvados os casos em que houver EIA/RIMA e/ou audiência pública, quando o prazo será de até 12 (doze) meses. do cronograma físico foram definidos a partir deste. Ademais, o contrato de concessão, lei entre as partes, é norma hierarquicamente superior às resoluções do CONAMA. Pelo exposto, pôde-se concluir que somente a UHE Jirau teve suas excludentes de responsabilidade plenamente atendidas, decorrente de ação judicial proposta contra a Agência, com base em produção de laudo pericial, em ação cautelar, imediatamente após o incêndio e demais eventos criminosos que causaram atrasos para o cumprimento da avença contratual, e também com base em atos do poder público decorrentes dos embaraços aduaneiros. Nos demais casos, a Agência utilizou-se de todos os argumentos possíveis, com o objetivo nítido de negar as excludentes de responsabilidade, desconsiderando que sua posição, neste caso, deveria ser de neutralidade entre os agentes do setor elétrico. 3.2 Considerações sobre a análise de excludentes de responsabilidade pela ANEEL Na análise das excludentes de responsabilidade por atraso no cronograma de obras, cujo reflexo será o atraso na entrada em operação comercial da usina, a ANEEL apura as informações através da fiscalização das obras, com base nos relatórios mensais que o agente envia à área técnica responsável, no caso, a Superintendência de Fiscalização de Serviços de Geração – SFG. Diversos são os precedentes em que a ANEEL reconheceu excludentes de responsabilidade sobre os atrasos na entrada em operação comercial de usinas de geração hidrelétrica, cujo resultando culminou na aprovação de novo cronograma físico das obras, afastamento da obrigação do gerador de repor lastro de energia na CCEE decorrente dos CCEARs e isenção de sanções e penalidades. 29 Contudo, após a análise do caso da usina termoelétrica UTE Maranhão III 30 , houve mudança de postura por parte da Agência, que começou a exigir que o agente comprovasse cabalmente o nexo de causalidade entre os eventos extraordinários 29 Cite-se v.g. o precedente constante do Voto de Relatoria do Diretor Julião Silveira Coelho, proferido em 17/03/2012, nos autos do Processo ANEEL nº 48500.000893/2009-24, instruído pela Nota Técnica SCG nº 398/2010 e Parecer PGE nº 155/2011. Trata-se do caso da UHE Mauá, com 363MW de potência instalada, em que a ANEEL reconheceu 469 (quatrocentos e sessenta e nove) dias de atraso por excludentes de responsabilidade decorrentes de medidas judiciais e demora na emissão de licença ambiental pelo IBAMA, sendo 64 (sessenta e quatro) dias decorrentes da perda da janela hidrológica. Destacam-se também os seguintes precedentes da Procuradoria-Geral da ANEEL: Parecer nº 791/2010-PGE/ANEEL, Parecer nº 075/2011- PGE/ANEEL e Parecer nº 1.079/2010 – PGE/ANEEL. 30 Processo ANEEL nº 48500.004388/2011-74.
  • 8. alegados e o prejuízo suportado no cronograma de obras. 31 O que se têm observado, a partir das informações veiculadas nos canais de notícias, é que desde as reuniões do Comitê de Monitoramento do Setor Elétrico – CMSE, ocorridas no ano de 2014, para discutir o problema dos atrasos excessivos das obras de construção de usinas de geração e linhas de transmissão, e a ampla divulgação desses relatórios na mídia, a ANEEL, ao invés de apurar devidamente os fatos quanto à comprovação do nexo de causalidade, mediante fiscalização in locu e laudo de engenharia (perícia), têm simplesmente negado todos os pleitos de excludentes de responsabilidade dos agentes, sob a alegação de que o agente deve comprovar cabalmente o nexo de causalidade. Os problemas extraordinários enfrentados pelos agentes comumente caracterizam-se nas seguintes situações: 31 Sobre este aspecto, importa transcrever excerto do Voto de relatoria do Diretor José Jurhosa, nos autos do processo nº 48500.006599/2013-11, que indeferiu os sucessivos pedidos de excludentes de responsabilidade formulados pela Norte Energia S.A. (UHE Belo Monte), nos seguintes termos: "178. Naquela oportunidade, o Relator reconheceu que, embora o outorgado de geração não tenha incentivo para retardar o cronograma e nem o início do suprimento de seus contratos de comercialização, algumas decisões da ANEEL firmaram a percepção de que, na hipótese de atraso, o empreendedor terá sua responsabilidade eximida, ainda que não haja a comprovação fática do nexo de causalidade entre os eventos suscitados e os atrasos incorridos. E mais, que se tratava de direito que, uma vez invocado, limitaria inclusive a possibilidade de a ANEEL conferir tratamento diferenciado à matéria, sob pena de ofensa à segurança jurídica e à isonomia, conforme alertou o Relator no caso da UTE Maranhão III. 179. Posteriormente àquela decisão, ao indeferir o pedido de excludente de responsabilidade com vistas à alteração de cronograma de implantação e do início do suprimento das EOLs Primavera, Cristal e São Judas [Processos 48500.005408/2010-43, 48500.005409/2010-98 e 48500.005407/2010-07], o Relator explicitou a relevante alteração na jurisprudência do Colegiado quanto à extensão e à profundidade a serem aplicadas quando da análise de excludentes de responsabilidade, não bastando presumir o nexo de causalidade, que deverá ser comprovado pelo agente e verificado pela Agência. 180. Consolidar o entendimento inaugurado pelo Relator no caso da UTE Maranhão III requer um olhar diferenciado da Agência. Não basta pedir, há que se comprovar o nexo de causalidade. 181. Inúmeros têm sido os eventos trazidos à apreciação da ANEEL para justificar os atrasos na implantação dos empreendimentos de geração. Dentre eles, a demora na obtenção das licenças ambientais, aí incluído um sem número de situações que provocam os alegados atrasos, demora na obtenção de declaração de utilidade pública, lentidão na expedição dos atos de outorga, quando da alteração de características técnicas, descompasso entre obras de geração e transmissão, embaraços alfandegários e aduaneiros, invasões aos canteiros, obstrução de acesso, movimentos grevistas e sociais, medidas liminares e ações judiciais. Enfim, uma gama de situações, todas usadas para justificar atrasos na implantação dos empreendimentos de geração.” a) demora na emissão das licenças ambientais (fato da administração); b) medida liminar judicial suspendendo as obras, motivadas por novas exigências relacionadas às licenças ambientais e outras questões alheias à vontade do agente (fato da administração); c) normas ambientais supervenientes trazendo restrições ao projeto básico aprovado (fato da administração); d) demora da ANEEL na emissão da Declaração de Utilidade Pública – DUP, cujo documento é indispensável à desapropriação das terras para as obras (fato da administração); e) demora injustificável nos embaraços aduaneiros e alfandegários (fato da administração); f) demora na expedição de atos de outorga (fato da administração); g) invasão, obstrução de acesso e incêndio no canteiro de obras (força maior); h) movimentos grevistas e sociais (força maior); Observe-se que a responsabilidade do agente de geração limita-se na entrega dos seus relatórios mensais à ANEEL 32 , e que, se tais informações não forem suficientes, compete ao órgão regulador o ônus da prova, conforme regra de distribuição probatória prevista no art. 333 do Código de Processo Civil 33 . Neste caso, compete à ANEEL alegar o fato impeditivo, modificativo ou extintivo quanto ao indeferimento das excludentes de responsabilidades, comprovadas pelos agentes, em seus relatórios mensais, porquanto, distribuir diversamente o ônus da prova torna excessivamente difícil aos agentes o exercício do seu direito, ainda mais quando transcorridos muitos meses após a ocorrência dos eventos. Em suma, a ANEEL, com vistas a evitar uma suposta "indústria" de excludentes de responsabilidade, tem negado praticamente todos os pedidos que são submetidas ao seu crivo regulatório – desde que se iniciou a crise no setor elétrico, no início de 2013 – em face dos prejuízos financeiros que os agentes têm acumulado desde então, resultantes do desastre que foi a antecipada renovação das concessões de geração e transmissão promovidas pela Lei nº 32 É obrigação da concessionária ou autorizada entregar relatórios mensais sobre o andamento das obras, sob pena de punição nos termos do art. 6º, inciso XIX, da Resolução Normativa ANEEL nº 63/2004, conforme competências da Agência prevista nos arts. 16 e 19 do Decreto nº 41.019/57, no art. 3º da Lei nº 8.987/95, no art. 17 do Decreto nº 2.003/96, no art. 2º da Lei nº 9.427/96 e no art. 2º, nos incisos XV e XXXIII do art. 4º e nos incisos II e V do art. 16, do Anexo I do Decreto nº 2.335/97. 33 Art. 333. O ônus da prova incumbe: I - ao réu, quanto à existência de fato impeditivo, modificativo ou extintivo do direito do autor. Parágrafo único. É nula a convenção que distribui de maneira diversa o ônus da prova quando: I - recair sobre direito indisponível da parte; II - tornar excessivamente difícil a uma parte o exercício do direito.
  • 9. 12.783/2013, além da crise hidrológica que se arrasta desde o final do ano de 2012, impondo geração termoelétrica à preços elevadíssimos, cujo resultado elevou o PLD a valores praticamente impagáveis pelos agentes expostos, o que afetou especialmente a receita das distribuidoras. Evidencia-se uma incompreensível mudança de postura por parte da ANEEL, com base em motivações estranhas à lei, doutrina e jurisprudência, pautadas em uma indevida inversão nas regras processuais de distribuição do ônus probatório, quanto ao reconhecimento de excludentes de responsabilidade (comprovação de nexo causal), o que ensejou uma massiva judicialização, cujo destaque enfocamos nas ações referentes às grandes obras prioritárias e estratégicas de geração hidrelétrica no norte do país. Todavia, também insta destacar que a ANEEL, na forma do que dispõe o art. 3º, incisos IV e V, Anexo do Decreto nº 2.335/97 34 , tem a missão de promover o desenvolvimento do mercado em equilíbrio entre os agentes de geração, transmissão e distribuição, pautando-se por uma modicidade tarifária que incentive o investimento no setor elétrico brasileiro, estimule a qualidade do serviço prestado e assegure a viabilidade econômico-financeira das concessões. Com efeito, as referidas decisões, adotadas pela ANEEL com vistas a evitar, a qualquer custo, o aumento tarifário (modicidade tarifária), elevaram consideravelmente o chamado risco regulatório, que se traduz em aumento na precificação do custo de investimento no setor elétrico. Na prática, os investidores ou (i) deixarão de participar dos leilões promovidos para implantar usinas de geração hidrelétrica – principalmente na região amazônica –, ou (ii) precificarão os custos associados a um possível e elevado risco de atraso nas obras, para fins de lance de oferta dos leilões, o que resultará, inevitavelmente, em: (a) desinvestimento no setor elétrico; (b) aumento dos custos inerentes aos novos empreendimentos; e, consequentemente, (c) aumento da tarifa de energia elétrica para os consumidores cativos. Considerando que a geração hidrelétrica é de energia renovável, não poluente, de baixo impacto ambiental e reduzido custo quando comparado à geração termoelétrica movida à gás, carvão ou óleo 35 , o 34 Art. 3º A ANEEL orientará a execução de suas atividades finalísticas de forma a proporcionar condições favoráveis para que o desenvolvimento do mercado de energia elétrica ocorra com equilíbrio entre os agentes e em benefício da sociedade, observando as seguintes diretrizes: [...] IV - criação de condições para a modicidade das tarifas, sem prejuízo da oferta e com ênfase na qualidade do serviço de energia elétrica; V - criação de ambiente para o setor de energia elétrica que incentive o investimento, de forma que os concessionários, permissionários e autorizados tenham asseguradas a viabilidade econômica e financeira, nos termos do respectivo contrato; 35 As usinas hidrelétricas comercializam energia pelo preço médio de R$ 110,00 a R$ 250,00, ao passo que o custo do resultado destas decisões regulatórias refletirá inevitavelmente no aumento da poluição do ar atmosférico e do preço da energia elétrica para o consumidor, haja vista que as demais fontes de geração hoje economicamente viáveis, tais como solar e eólica, são instáveis e não entram na base de geração como as fontes hidrelétrica e termoelétrica, fontes estas estáveis, contínuas e necessárias à estabilidade e segurança do sistema elétrico. 4. Conclusão Ao lograr êxito no leilão e assinar contrato de concessão junto ao Poder Concedente, o particular assume uma série de obrigações contratuais que merecem ser prestigiadas. Contudo, como se viu, situações imprevisíveis e extraordinárias podem alterar as previsões e o cenário existente ao tempo em que se celebrou o pacto. Falam-se em hipóteses que impõe ao particular uma realidade fática inédita, sob a qual este não detém qualquer ingerência, que impede ou sobremaneira dificulta o cumprimento do pacto tal como inicialmente preconizado. Nessa circunstancia, comprovado que dado inadimplemento (parcial ou total) foi motivados por eventos extraordinários, alheios à vontade do concessionário, imprevisíveis e, quando previsíveis, de efeitos incalculáveis, há campo de incidência de excludentes de responsabilidade. Isso conforme a Teoria da Imprevisão, que se dividem nos casos fortuitos, de força maior, atos do poder público, fatos do príncipe e interferências imprevistas. Tais excludentes também ensejam o reequilíbrio econômico-financeiro do contrato de concessão, com vistas a preservar a receita inicialmente estabelecida na avença entre as partes contratantes, mediante a recomposição do prazo perdido pelo atraso na entrada em operação comercial. Como visto, os problemas mais comuns enfrentados são a demora na emissão das licenças ambientais, efeitos imprevisíveis de medida liminar judicial que suspende a obra, normas ambientais supervenientes que trazem restrições ao projeto básico aprovado, demora dos órgãos ambientais para expedir as licenças ambientais, demora da ANEEL na emissão da Declaração de Utilidade Pública – DUP, embaraços aduaneiros e alfandegários, demora na expedição de atos de outorga, invasão, obstrução de acesso e atos de vandalismo no canteiro de obras, movimentos grevistas e sociais. Há ainda os prejuízos relacionados com o pagamento pelo Uso do Bem Público – UBP à União Federal, encargos setoriais, com destaque para a Tarifa de Uso despacho das usinas termoelétricas vai de R$ 280,00 a R$ 1.100,00, como é o caso da UTE Goiânia II, em que o Custo Variável Unitário varia de R$ 915/MWh a R$ 1.148/MWh, conforme exposto na Nota Técnica nº 001/2014-ASD-SEM- SRG/ANEEL, de 10/10/2014.
  • 10. do Sistema de Transmissão – TUST, Compensação Financeira pela Utilização dos Recursos Hídricos – CFURH e Taxa de Fiscalização de Serviços de Energia Elétrica – TFSEE, assim como as sanções e penalidades no âmbito da CCEE e ANEEL. Analisando os casos dessas grandes usinas construídas no norte do país, que enfrentaram problemas de toda sorte para manter o cumprimento do cronograma das obras, concluiu-se aqueles concessionárias fazem jus ao reconhecimento de excludentes de responsabilidade pelo atraso na entrada em operação comercial de suas unidades geradoras, motivados por atos e fatos expostos e comprovados, os quais servem à ANEEL para deferir os pedidos cautelares desses agentes, de forma a suspender o efeito de todas as obrigações contratuais até que fossem decididos definitivamente os pleitos apresentados. Pôde-se concluir que a Agência tem exigido dos agentes a comprovação cabal do nexo de causalidade, não aceitando como suficiente as informações prestadas mensalmente pelos agentes à fiscalização, o que constitui inversão do ônus da prova em infringência à regra processual que impõe à ANEEL provar o fato impeditivo, modificativo ou extintivo do direito dos agentes. Aliás, é de se observar que compete à ANEEL, na qualidade de Agência Reguladora, fiscalizar as obras e produzir prova suficiente para assegurar aos agentes o reconhecimento das excludentes de responsabilidade, ou, ao menos, sinalizar previamente aos agentes a necessidade de que os mesmos assim o façam. O fato é que a ANEEL vinha reconhecendo excludentes de responsabilidade de longa data, com base nos mesmos fatos alegados pelas concessionárias aqui analisadas, cuja prova era lastreada unicamente nos relatórios mensais da fiscalização sobre o andamento das obras e cumprimento dos marcos temporais do cronograma físico. Contudo, a partir do caso da UTE Maranhão III e da reunião do Comitê de Monitoramento do Setor Elétrico – CMSE, ocorrida no ano de 2014, a Agência mudou a sua postura de análise dessas excludentes, sob a alegação de que teria se formado uma verdadeira "indústria" de excludentes de responsabilidade, mas cuja real motivação também foi a busca de solução para reduzir os prejuízos financeiros suportados pelas distribuidoras, decorrentes dos problemas estruturais causados pela antecipada renovação das concessões (Lei nº 12.783/2013) e pelo déficit hídrico. É certo que os agentes devem, sim, ser penalizados, caso atrasem as obras, haja vista que o atraso importa na redução de oferta de energia ao sistema elétrico, comprometendo o fornecimento de energia e elevando o custo da tarifa, decorrente da necessidade de despacho de geração termoelétrica para garantir o fornecimento. Todavia, na ocorrência de fatos extraordinários, em que a conduta é alheia à vontade do concessionário, decorrentes de eventos imprevisíveis e, quando previsíveis, de consequências incalculáveis, pautadas por excludentes de responsabilidade, tais prejuízos não podem ser suportados pelos concessionários, sob pena de se aumentar o risco regulatório, o que, impreterivelmente, reflete em uma diminuição de investimento no setor e aumento do preço de oferta nos leilões de novas usinas hidrelétricas. A Agência deveria ter uma postura diferente quando da apreciação dos casos das concessionárias ora analisadas, pautando-se segundo o interesse público que é inerente a estes empreendimentos de geração – estratégicos e prioritários para o país segundo o CNPE – o que certamente evitaria que as mesmas tivessem que buscar a intervenção do Judiciário para obstar possível colapso financeiro de suas concessões, o que traria maior segurança jurídica aos vultuosos investimentos empregados, cujo impacto resultaria na diminuição do risco regulatório e dos custos associados aos leilões de novos empreendimentos. Pelo exposto, foi possível concluir que a ANEEL não deve privilegiar substancialmente a diretriz da modicidade tarifária quando da análise de excludentes de responsabilidade pelo atraso na entrada em operação comercial de usinas de geração hidrelétrica, pois o Decreto nº 2.335/97 prevê que a Agência tem a missão de desenvolver o mercado de energia com equilíbrio entre os agentes, pautando-se por uma modicidade tarifária que incentive o investimento no setor elétrico brasileiro, estimule a qualidade do serviço prestado e assegure a viabilidade econômico-financeira da concessão.