O jornalista Daniel Piza afirma em entrevista que os jovens de hoje têm limitações na educação porque a escola é falha, e comenta sobre literatura, política e futebol. Ele também discute como cria seus personagens fictícios e analisa a cidade de São Paulo como inspiração para contos.
Jornalista Daniel Piza comenta sobre literatura, política, educação e futebol
1. D1 Araçatuba, domingo, 30 de janeiro de 2011
Destaque
A atriz Paola Oliveira afirma
que tem se esforçado muito
para provar que pode ganhar
papéis de destaque na televi-
são. Colegas de trabalho enfa-
tizam seu esforço para aten-
der à expectativa gerada. D4
ENTREVISTA
‘Não é o fim dos
Araçatuba
Jean Oliveira
jean.oliveira@folhadaregiao.com.br
tempos’ estilistas do idioma, além de Ma-
chado, como Graciliano Ramos,
Guimarães Rosa, Rubem Braga,
Pedro Nava, poetas como Drum-
xar de falar de criminalidade,
caos e carências.
O escritor João Ubaldo
O
jornalista Daniel Piza mond e João Cabral. Aqui há até Ribeiro, em entrevista à Fo-
tem se destacado no ce- O jornalista um sentido “utilitário”: com es- lha da Região, disse que gos-
nário nacional como re- Daniel Piza afirma, sas leituras, aumentamos nossa ta de sentar em lugares de
pórter, colunista e comentarista. em entrevista capacidade de expressão, que an- grande movimento, ver as
Sua área de atuação é vasta, ca- da tão reduzida no dia a dia. pessoas, dar nomes e inven-
minhando entre literatura, histó- exclusiva à Folha da tar histórias sobre elas. Usa
ria, política e futebol. Região, que os Agora, falando direta- deste artifício também para
Como se diz no jargão es- jovens de hoje têm mente sobre seu trabalho co- compor os personagens?
portivo, é do tipo que 'joga em limitações porque a mo escritor, gostaria que nos Qual seu método favorito?
todas as posições'. Ele concedeu falasse um pouco sobre a Bem, sou repórter, conheço
uma entrevista exclusiva à Folha escola é falha. obra “Noites Urbanas”, que muito bem minha cidade e meu
da Região na última sexta-feira Também comenta são contos passados na cida- país, para não falar de outros paí-
e comentou que está muito preo- sobre literatura, de de São Paulo. A ‘Pauli- ses. Observar pessoas das mais
cupado com o futuro da Educa- política e futebol ceia’ é muito rica em histórias variadas classes, idades e regiões
ção no Brasil. De acordo com e personagens, não? é fundamental para meu traba-
ele, o país têm ficado atrás de ou- lho, tanto de jornalismo como de
tros emergentes, como a China.
Na conversa, ele também
“ ficção. Mas isso não é tudo. Fic-
ção não é apenas memória ou
comentou como é seu processo Ainda é cedo crônica, não é apenas retrabalhar
de criação ficcional. No ano pas- para dizer o que você viu ou viveu, como
sado, ele lançou o livro 'Noites que o ano será tantos escritores brasileiros pare-
Urbanas', em que apresenta uma cem acreditar. Ela envolve tam-
do Santos, mas
série de contos sobre os persona- bém ideias, conceitos, reflexões
gens que circulam por São Paulo. espero que enriquecem a imaginação.
Sobre a cidade, ele disse que é que sim, Não é autobiografia: é sair para o
muito rica em histórias a serem já que a maioria mundo e se reencontrar lá adian-
contadas. " Uma cidade onde te, transformado.
51% das pessoas querem ir embo-
dos outros
ra, mas quase nunca vão, é no tem jogado um O senhor também é um
mínimo interessante para qual-
quer escritor sério", comenta.
futebol analista de futebol. Acredita
que 2011 será o ano do San-
burocrático, tos? Não seria perfeita uma fi-
BIOGRAFIA covarde nal do Mundial de Clubes en-
Piza nasceu em São Paulo tre Santos e Barcelona?
em 1970 e estudou Direito no ” Seria perfeita, sim, mas
Largo de São Francisco (USP). É, sim, mas curiosamente acho que daria Barcelona fácil. O
Começou sua carreira de jornalis- pouco explorada na ficção brasi- Santos tem grandes jogadores em
ta em "O Estado de S. Paulo" leira. Não falo de iniciativas “re- maturação, Neymar e Ganso, e
(1991-92), onde foi repórter do gionais”, que olham o caráter su- outros experientes, como Elano,
Caderno2 e editor-assistente do perficial da grande cidade, seus mas ainda sofre com o sistema
Cultura. costumes, suas misturas, etc. defensivo e uma certa ansiedade
Trabalhou em seguida na Fo- Mas de leituras mais profundas, que o faz se desconcentrar de-
lha de S. Paulo (1992-95), como dos subterrâneos de uma cidade pois que fica em vantagem. Ain-
repórter e editor-assistente da onde se quer o máximo de traba- da é cedo para dizer que o ano
Ilustrada, cobrindo especialmente lho e diversão e se enfrentam tan- será do Santos, mas espero que
as áreas de livros e artes visuais. tos problemas para isso. Uma ci- sim, já que a maioria dos outros
Em maio de 2000, retornou ao dade onde 51% das pessoas que- tem jogado um futebol burocráti-
"Estado" como editorexecutivo e rem ir embora, mas quase nunca co, covarde, mais preocupado
colunista cultural; desde 2004 as- vão, é no mínimo interessante pa- em fazer faltas do que em fazer
sina também uma coluna sobre ra qualquer escritor sério. Meus gols. O Barcelona é apaixonado
futebol. contos tentam captar isso, essa pelo gol alheio, por isso nunca
Traduziu seis títulos, de au- São Paulo mais íntima, sem dei- sai de perto dele...
Arquivo/Folha da Região
tores como Herman Melville e
Henry James, e organizou seis ou-
tros, nas áreas de jornalismo cul- derados em desenvolvimento da. Sei também que a internet Como escritor, como o
tural e literatura brasileira. Escre- como a China, a Rússia e Ín- é em grande parte um ato de senhor avalia o nível de leitu-
veu 17 livros, entre eles "Jornalis- dia estariam em nossa frente leitura, seja de mensagens e diá- ra do brasileiro? Está pior
mo Cultural" (2003), a biografia no quesito Educação? rios, seja de notícias e pesqui- que no passado ou sempre
"Machado de Assis - Um Gênio Veja quais os alunos vence- sas, mas é uma leitura dispersa, foi assim?
Brasileiro" (2005), "Aforismos dores em quase todos os concur- impaciente, que não passa mais Estatisticamente, não sei di-
sem Juízo" (2008) e os contos de sos internacionais: são os chine- de 30 segundos na mesma pági- zer. Nossos números não são con-
"Noites Urbanas" (2010). Fez ses. Ou então pense no que a Co- na. Não estou pregando o fiáveis. Fala-se que o índice au-
também os roteiros dos documen- reia do Sul fez em 20 anos. Não “slow reading”, eu mesmo sou mentou, mas, de novo, é basica-
tários "São Paulo - Retratos do temos nenhum projeto assim no mente por causa da venda de li-
Mundo" e "Um Paraíso Perdido -
Amazônia de Euclides".
Brasil, nenhum debate amplo so-
bre qual educação queremos.
“ vros didáticos, religiosos e best
sellers de qualidade duvidosa. E
Leia a entrevista: Nossas escolas cobram Os jovens como um professor que não gos-
memorização dos alunos, não a têm tido ta de ler vai passar ao aluno o
A presidente Dilma assu- compreensão conceitual, a refle- dificuldade de prazer que existe nos livros? Ele
miu falando em investimen- xão, a observação empírica. Isso passa a obrigação, a classificação,
concentração, de
tos em Educação e valoriza- leva tempo, por isso mesmo não não o prazer, não a experiência.
ção dos professores. O se- se pode apostar na inércia. Nada conviver com o Mas isso não é de hoje. Estudei
nhor está otimista quando ao
futuro do país em relação à
indica que essa mudança de men-
talidade esteja em consolidação
silêncio, em ótimos colégios e a maioria
dos alunos sempre achou que os
formação formal das novas no Brasil de 2011. de lidar com a clássicos são chatos...
gerações? ansiedade. Mas
Difícil ser otimista nesse te- Com o aumento do aces- isso é cultural Quais clássicos da litera-
ma. Absolutamente todos os go- so à internet, muitos jovens tura são fundamentais para
vernantes que assumem dizem trocam a leitura de livros para e pode ser uma pessoa que quer ter pelo
que vão investir em educação. Al- blogs e notícias on line. Co- reequacionado menos a sensação de ter lido
guns até aumentam o orçamen- mo o senhor avalia este fenô- o mínimo da boa literatura?
to, mas o retorno é de proporção meno? Bom, tenho minha lista de
bem menor. Ouço ministros dize- Acho ruim, claro. Sei que ” clássicos que realmente muda-
rem que em breve a escolaridade alguns livros são muito lidos um leitor rápido. Mas atento. ram meu modo de ver o mundo:
do brasileiro vai chegar a dez, on- por jovens e que a indústria edi- Os jovens de hoje têm tido difi- livros de Shakespeare, Darwin,
ze anos. Mas dez, onze anos de torial continua firme e forte, culdade de concentração, de Dostoievski, Nietzsche, Macha-
quê? Parece que é só uma ques- mas o fato é que a grande maio- conviver com o silêncio, de li- do, etc. Acho também que há
tão de desenvolvimento econômi- ria dos jovens hoje não tem pa- dar com a ansiedade. Mas isso um papel nos clássicos que é o
co, mas não é. ciência para textos longos que é cultural e pode ser reequacio- de nos enriquecer o repertório
Os demais países consi- não sejam fantasias ou auto-aju- nado. Não é o fim dos tempos. linguístico. O Brasil teve grandes