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51R. bras. de Dir. Público – RBDP | Belo Horizonte, ano 14, n. 54, p. 51-70, jul./set. 2016
Contribuições para o novo marco
regulatório dos drones – Entre nobres
objetivos e inadequados procedimentos
Rafael Carvalho Rezende Oliveira
Pós-doutor pela Fordham University School of Law (New York). Doutor em Direito pela UVA/
RJ. Mestre em Teoria do Estado e Direito Constitucional pela PUC/RJ. Especialista em Di-
reito do Estado pela UERJ. Membro do Instituto de Direito Administrativo do Estado do Rio
de Janeiro (IDAERJ). Professor de Direito Administrativo do IBMEC, da EMERJ e do CURSO
FORUM. Professor dos cursos de Pós-Graduação da FGV e Cândido Mendes. Advogado, árbi-
tro e consultor jurídico.
Caio Cesar Figueiroa
Especialista em Direito Administrativo pela FGV Direito SP (GV Law). Professor assistente de
Direito Econômico da Universidade Ibirapuera (UNIB). Advogado em Direito Público.
Resumo: O trabalho tem por objetivo apresentar toda a arquitetura regulatória vigente pela qual os Sis-
temas de Aeronaves Não Tripuladas (Unmanned Aircraft Systems – UAS), popularmente conhecido como
drones, estão submetidos. A insegurança jurídica decorrente do vácuo regulatório sobre o uso destes equi-
pamentos com fins lucrativos tem inviabilizado o desenvolvimento de um amplo mercado, além de resfriar
os entusiastas em aprimorar esta tecnologia no território nacional. O pluralismo de entes reguladores en-
volvidos, muitas vezes abordando o mesmo objeto, também contribui para este cenário. Assim o presente
artigo se concentrará na proposta de regulação da Agência Nacional de Aviação Civil para o uso de tais
equipamentos com finalidade na exploração de atividade econômica, seja de modo direto ou intermediário.
Palavras-chave: Regulação. Sistemas de Aeronaves Remotamente Pilotadas. Drones. Remotely Piloted
Aircraft Systems (RPAS). Disrupção.
Sumário: 1 Introdução – 2 Aspectos regulatórios para Sistemas de Aeronaves Remotamente Pilotadas
(RPAS) – 3 Lacunas regulatórias e insegurança jurídica – 4 Contribuições para disposições regulatórias
futuras – 5 Considerações finais – Referências
1 Introdução
Acredita-se que a humanidade está atravessando um período de transição, o na-
tural devir decorrente da luta pela sobrevivência, ou, como preferem os economistas,
o aperfeiçoamento da administração dos recursos escassos, de modo a maximizar
a satisfação das necessidades, minimizando os custos decorrentes deste processo.
Este foi justamente o tema debatido na última edição do Fórum Econômico Mundial,
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RAFAEL CARVALHO REZENDE OLIVEIRA, CAIO CESAR FIGUEIROA
que ocorreu em janeiro, na cidade de Davos, na Suíça. O evento, que ocorre anual-
mente desde 1971, reuniu os principais líderes empresariais e políticos para discu-
tir as questões mais urgentes enfrentadas mundialmente. Segundo Klaus Schwab,
presidente e fundador do organismo, é possível inferir, a partir das mais recentes
transformações nas relações de produção, que o mundo está passando pela sua
quarta revolução industrial.1
É inegável que o tema das inovações tecnológicas está cada vez mais em pau-
ta, principalmente em decorrência dos impactos que essas criações têm propiciado
nos mais diversos ambientes. Em certas ocasiões, o grau de inovação proporciona
mudanças tão radicais que afetam toda a estrutura do modelo atingido, de modo a
quebrar sua linha de condução anterior. Trata-se da disrupção tecnológica, que, sob
o prisma econômico, pressiona o movimento de competição a ponto de destronar
empresas antes consolidadas, assim como gera preocupações para o direito, que se
vê sempre na ânsia de regular o uso de novas tecnologias.
E há razões para que o direito se preocupe com este gap. O fenômeno da disrup-
ção era encarado como um efeito secundário da inovação, um processo eventualmen-
te voluntário e mais demorado, concedendo um significativo período de tempo para
que os agentes reguladores pudessem se adequar com a sua gradual implementação
antes de delimitar o uso dos produtos decorrentes da evolução.2
Atualmente, a dis-
rupção tem sido um processo abrupto, tornando-se um fim em si mesmo.3
Vale, por
essa razão, um alerta: o desenvolvimento intencional e constante de tecnologias dis-
ruptivas sem ponderar outros elementos e valores que não só a eficiência poderá ser
problemático. A grande questão se restringe à previsibilidade e controle dos riscos
decorrentes deste fenômeno.
Neste sentido, este artigo pretende trabalhar com alguns possíveis problemas
decorrentes do uso exponencial de tecnologias disruptivas, mais precisamente a ex-
ploração de atividade econômica com o uso auxiliar de drones, formalmente conheci-
dos por Sistemas de Aeronaves Não Tripuladas (Unmanned Aircraft Systems – UAS).4
1
	 Klaus Schwab sintetiza as quatro revoluções nos seguintes termos: “The First Industrial Revolution used water
and steam power to mechanize production. The Second used electric power to create mass production. The
Third used electronics and information technology to automate production. Now a Fourth Industrial Revolution
is building on the Third, the digital revolution that has been occurring since the middle of the last century. It is
characterized by a fusion of technologies that is blurring the lines between the physical, digital, and biological
spheres” (SCHWAB, Klaus. The Fourth Industrial Revolution: What It Means and How to Respond. Foreign
Affairs, Dez. 2015. Disponível em: <https://www.foreignaffairs.com/articles/2015-12-12/fourth-industrial-
revolution>. Acesso em: 11 jun. 2016.
2
	 Fala-se hoje em transformações cada vez mais precoces, em ritmo de progressão geométrica, afetando sen-
sivelmente a capacidade do direito em se adequar a mudanças tão bruscas de um novo padrão sem ter tempo
suficiente de aperfeiçoar o modelo revogado. Involuntariamente, aqueles que não se adaptarem estarão fora
do jogo ou à mercê dos ditames da evolução tecnológica. Nesse sentido, FARIA, José Eduardo. Direito e con-
juntura. 2. ed. São Paulo: Saraiva, 2010.
3
	 Cf. KATYAL, Neal. Disruptive Technologies and the Law. The Georgetown Law Jornal, v. 102, 2014.
4
	 De acordo com o prefácio da Instrução do Comando da Aeronáutica (ICA) nº 100-40/2015, aprovada pela
Portaria DECEA nº 415/DGCEA, de 09.11.2015, e considerada a principal norma nacional regulamentando o
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CONTRIBUIÇÕES PARA O NOVO MARCO REGULATÓRIO DOS DRONES – ENTRE NOBRES OBJETIVOS...
A aplicação destes dispositivos pela iniciativa privada apresenta uma série de vanta-
gens no aspecto econômico, reduzindo significativamente os altos custos decorren-
tes de manutenção e operação de aeronaves tripuladas e as despesas decorrentes
da contratação de equipe de tripulação, por exemplo.5
Para se ter uma ideia da sua abrangência de uso, André Castro Carvalho con-
seguiu enumerar uma ampla gama de aplicações, tais como logística – que envolve
principalmente o transporte de bens; atividade jornalística; publicidade e marketing;
agropecuária; construção civil e pesada; extração de recursos naturais; mapeamento
de uso do solo urbano e rural; atividades de resgate e socorro médico; inspeções em
infraestruturas, como linhas férreas, rodovias, dutos, represas, antenas ou linhas de
transmissão; cinema, fotografia e teledramaturgia; radares, GPS, microfones ópticos
a laser e outros tipos de sensores; courier, como entrega de encomendas e alimen-
tos; dentre outros casos que certamente serão ainda desenvolvidos pela criatividade
dos empreendedores.6
O uso indiscriminado de UAS é matéria que ainda tem suscitado debates entre
agentes reguladores internacionais com o intuito de compreender os verdadeiros ris-
cos advindos desta tecnologia. No Brasil, o estado da arte é de incompletude, que
embora já tenha delimitado os contornos mínimos para o uso experimental em ativi-
dades científicas, o seu emprego para exploração de atividade econômica encontra-se
em estágio embrionário.
Apesar do recente corpo de normas infralegais que tentaram viabilizar um mar-
co provisório àqueles que anseiam pelo uso das aeronaves com intuito comercial,
até que seja possível entender todas as nuances de sua operação, é necessário,
desde já, apontar algumas das circunstâncias que ensejam “entraves” – como a
acesso do espaço aéreo por “Sistemas de Aeronaves Remotamente Pilotadas”, drones, no Brasil, a aludida
nomenclatura foi adotada em substituição ao termo Veículos Aéreos Não Tripulados (VANT), hodiernamente
tido por obsoleto segundo a comunidade aeronáutica internacional, uma vez que o uso de tais equipamentos
não depende exclusivamente da aeronave, mas de todo um aparato integrado, inclusive em solo, de modo
que todo o sistema necessita ser considerado (BOANOVA FILHO, José Luiz. Aeronaves não tripuláveis no Brasil
e sua regulação. Revista Brasileira de Direito Aeronáutico e Espacial – RBDAE, n. 96, p. 49-51, dez. 2014).
Desse gênero, desdobram-se duas categorias, os Remotely Piloted Aircraft Systems (RPAS), compreendendo
as aeronaves que dependam de comandos remotos para sua plena operação, e as aeronaves totalmente
autônomas que, uma vez programadas, não sofrem qualquer tipo de interferência durante a execução da
operação. Em boa parte do mundo as aeronaves autônomas são proibidas, inclusive no Brasil, conforme
enunciado pelo próprio DECEA, que ao tecer comentários sobre as premissas básicas da regulamentação
sobredita, afirma que “as aeronaves totalmente autônomas não serão objeto de regulamentação e seu voo
não está autorizado”.
5
	 Segundo Robert A. Heverly, esta tendência da instrumentalização da atividade econômica pelo uso destas
aeronaves atinge os mais diversos nichos de mercado, “Companies such as Amazon, Facebook, Google and
others are investing in drone development for a variety of tasks, including delivery of retail goods to consumers,
creation of sky-based computer networks, and even crop dusting in the agricultural community” (HEVERLY,
Robert A. The State of Drones: State authority to regulate drones. Albany Government Law Review, 8, 29, 2015).
6
	 CARVALHO, André Castro. Drones já são uma preocupação jurídica. Huffpost Brasil, 24 abr. 2014. Disponível em:
<http://www.brasilpost.com.br/andre-castro-carvalho/drones-ja-sao-uma-preocupacao-juridica_b_5199971.
html>. Acesso em: 04 jul. 2016.
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54 R. bras. de Dir. Público – RBDP | Belo Horizonte, ano 14, n. 54, p. 51-70, jul./set. 2016
RAFAEL CARVALHO REZENDE OLIVEIRA, CAIO CESAR FIGUEIROA
própria iniciativa privada costuma denominar7
– para o escorreito desenvolvimento
da atividade, se mantidas no âmbito do marco regulatório definitivo, prometido pela
ANAC desde 2014.
Antes de alcançar estas circunstâncias, todavia, serão discutidas as razões
que levaram o Poder Público a se preocupar com a regulação do uso de tais equi-
pamentos, considerando perspectivas relacionadas com oportunidades econômicas,
condições de mercado, segurança, privacidade e desenvolvimento tecnológico. Por
conseguinte, será imprescindível apresentar os conceitos e limites legais já traçados,
para então voltar a tocar nas exigências atuais que merecem ser consideradas para
uma proposta definitiva de regulação.
2  Aspectos regulatórios para Sistemas de Aeronaves
Remotamente Pilotadas (RPAS)
2.1  Por que regular?
O gap entre o direito e as novas tecnologias não é nenhuma novidade. É natural
que os fatos se sobressaiam. Diante do desejo de agir estatal através da ampla
gama de instrumentos de regulação, surge a seguinte questão: há necessidade para
se regular a atividade dos RPAS? Ou de forma mais precisa, em que medida são
cabíveis ações para regular a relação entre os RPAS e a sua iminente integração com
o espaço aéreo?
Antes de partir para a resposta de tais indagações, é preciso relembrar dos fun-
damentos de validade para a regulação estatal em face do desempenho de atividades
econômicas em sentido estrito, incluindo as inovações.8
Um dos pilares do Estado
brasileiro é justamente a livre iniciativa (art. 1º, inciso IV da Constituição), o que
significa que é livre o exercício e o desempenho da atividade econômica (art. 170, ca-
put), observadas as ponderações impostas por força do princípio da Legalidade (art.
5º, inciso II c/c art. 170, parágrafo único). Tais ponderações exsurgem a partir das
necessidades cotidianas para o equilíbrio das garantias e direitos dos indivíduos que
almejam viver em sociedade, e se concretizam por meio de condicionamentos criados
pelo Estado, limitando o desempenho de algumas atividades, mas sem perder de
7
	 Conforme noticiado pelo Jornal da Globo, a iniciativa privada tem pressionado o Poder Público a expedir uma
regulamentação do exercício da atividade para fins comerciais desde 2013. Disponível em: <http://g1.globo.
com/sp/vale-do-paraiba-regiao/noticia/2013/04/em-reuniao-industria-pede-anac-regulacao-de-drone-com-
urgencia.html>. Acesso em: 04 jul. 2016.
8
	 Em um dos mais recentes artigos sobre Direito Regulatório, Egon Bockmann Moreira aborda a evolução e o
tratamento da regulação econômica pelo ordenamento brasileiro, levantando pertinentes indagações quanto
ao futuro dos mecanismos de intervenção indireta do Estado (MOREIRA, Egon Bockmann. Qual é o futuro da
regulação no Brasil? In: SUNDFELD, Carlos Ari; ROSILHO, André (Coord.). Direito da Regulação e Políticas
Públicas. São Paulo: Malheiros, 2014. p. 108-139).
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55R. bras. de Dir. Público – RBDP | Belo Horizonte, ano 14, n. 54, p. 51-70, jul./set. 2016
CONTRIBUIÇÕES PARA O NOVO MARCO REGULATÓRIO DOS DRONES – ENTRE NOBRES OBJETIVOS...
vista aquelas mesmas necessidades (decorrentes de eventuais conflitos de direitos)
que lhe deram azo.
É a partir dessa noção, de liberdade sendo a regra e a intervenção (condicio-
namento) a exceção, que se perquire sobre as razões de intervenção estatal nos
espaços da iniciativa privada, pois vige em nosso ordenamento a regra da mínima in-
tervenção.9
No caso dos RPAS, é interessante acrescentar a ideia de que a inovação
propiciada, em verdade, se dá pelo seu uso na esfera civil, deixando de ser uma ex-
clusividade do Estado,10
para se tornar uma ferramenta de uso privado, em movimen-
to inverso do que geralmente ocorre no campo dos serviços públicos (publicatio).11
Não é necessário dispender muitos minutos de reflexão para se apontar as
preocupações mais latentes pelo uso inadequado de RPAS pela sociedade civil, sen-
do o aspecto da segurança indubitavelmente o mais relevante. Nesse ponto, pesa a
dificuldade dos agentes reguladores locais em construir um arcabouço normativo que
permita o uso controlado de RPAS, resguardando a segurança de terceiros, sem obs-
tar, por outro lado, o aprimoramento da tecnologia e a expansão da utilidade destas
ferramentas pela iniciativa privada.12
Apesar dessa dificuldade, o principal organismo
internacional de aviação civil – International Civil Aviation Organization (ICAO) – tomou
postura mais proativa em detrimento dos agentes reguladores nacionais, tendo lança-
do em 2015 o RPAS Manual, visando à integração do espaço aéreo, de modo que os
RPAS possam operar concomitantemente com as aeronaves tripuladas.13
É, portanto, a segurança operacional o principal elemento considerado nos as-
pectos da regulação, de forma a minimizar os riscos no compartilhamento do espaço
aéreo com aeronaves tripuladas como também para segurança de pessoas e bens
no solo.14
Outro aspecto posto em questionamento abrange a relação de privacidade.
9
	 Carlos Ari Sundfeld destaca que “Todo condicionamento é constrangimento sobre a liberdade. Esta, sendo
valor protegido pelo Direito, só pode ser comprimida quando inevitável para a realização de interesses pú-
blicos. Daí a enunciação do princípio da mínima intervenção estatal na vida privada. Por força dele, todo
constrangimento imposto aos indivíduos pelo Estado deve justificar-se pela necessidade de realização do
interesse público. O legislador não pode cultivar o prazer do poder pelo poder, isto é, constranger os indivíduos
sem que tal constrangimento seja teleologicamente orientado” (SUNDFELD, Carlos Ari. Direito Administrativo
Ordenador. São Paulo: Malheiros, 2003. p. 68). Em sentido análogo, vide SCHIRATO, Vitor Rhein. Livre inicia-
tiva nos serviços públicos. Belo Horizonte: Fórum, 2012. p. 310-311).
10
	Os drones foram inicialmente utilizados para fins bélicos, desenvolvidos para o atendimento de diversas fun-
ções no campo militar, tais como: informação de movimentação de tropas inimigas, apoio em locais de difícil
acesso, espionagem e inclusive o combate. VILLAMIZAR, Fernando. Drones, ¿Hacia una guerra sin regulación
jurídica internacional? Revista de Relaciones Internacionales, Estrategia y Seguridad, 10(2), p. 89-109, 2015.
11
	 Cf. ARAGÃO, Alexandre Santos de. Direito dos Serviços Públicos. 3. ed. Rio de Janeiro: Forense, 2013.
12
	 Cf. HAVEL, Brian F.; MULLIGAN, John Q. Unmanned Aircraft Systems: a challenge to global regulators. 65
DePaul Law Review, 107, Fall, 2015.
13
	 Material disponível em: <http://www.wyvernltd.com/wp-content/uploads/2015/05/ICAO-10019-RPAS.pdf>.
Acesso em: 26 maio 2016. Sobre os estudos mais recentes dos riscos advindos na introdução de UAS no es-
paço aéreo não segregado, vide BROOKER, Peter. Introducing Unmanned Aircraft Systems into a High Reliability
ATC System. Journal of Navigation, London, Cambridge Journals Online, v. 66, n. 5, p. 719-735; RODRIGUES,
Elder Soares. Aspectos Regulatórios da Operação de Veículo Aéreo Não Tripulado. In: CONGRESSO RIO DE
TRANSPORTES, 13., jun. 2015.
14
	 Em 2013, por exemplo, durante um dos eventos mais tradicionais de Virgínia, foi noticiada a queda de
um drone sobre a arquibancada durante as gravações da “Great Bull Run”. Disponível em: <https://www.
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RAFAEL CARVALHO REZENDE OLIVEIRA, CAIO CESAR FIGUEIROA
John Horgan aponta as tendências de evolução dos drones para objetos cada vez
menores, possibilitando o uso para fins de vigilância, por exemplo.15
Enquanto que no
campo da segurança, o controle estatal se torna mais factível pelo condicionamento
das operações por meio de autorizações, o risco da vigilância clandestina é uma
barreira mais complexa, ainda que se imponham exigências de identificação destas
aeronaves.16
O desvirtuamento do uso dos RPAS, todavia, não pode ser impedimento para
que o Estado abdique do seu papel regulador, de modo a rechaçar as externalidades
apontadas, assim como também não pode provocar asfixias regulatórias no desem-
penho da atividade econômica.17
É desse movimento pendular entre maior e menor
intervenção que se travam as propostas de regulação, cuja mora na resposta destes
problemas à sociedade acaba afetando, consequentemente, o desenvolvimento tec-
nológico nacional, ou agravando as preocupações do seu uso sem o devido contro-
le. Em seguida, serão expostas as respostas normativas dadas pelo ordenamento
brasileiro.
2.2  Legislação vigente
Antes de aprofundar o estudo das normas que integram o quadro de regulação
preliminar dos RPAS, deve ser apresentada uma ressalva inicial: a imposição de
condicionamentos para a operação destes equipamentos não se confunde com as li-
mitações impostas para o uso do espaço aéreo, sendo este último considerado como
bem público da União.18
Contudo, como o tema da inovação implica significativos
washingtonpost.com/local/drone-crashes-into-virginia-bull-run-crowd/2013/08/26/424e0b9e-0e00-11e3-
85b6-d27422650fd5_story.html>. Acesso em: 05 jul. 2016.
15
	 HORGAN, John. Why drones should make you afraid very afraid. Scientific American, feb. 2013. Disponível em:
<http://blogs.scientificamerican.com/cross-check/why-drones-should-make-you-afraid-very-afraid/>. Acesso em:
03 jun. 2016. O MIT e Harvard têm desenvolvido alguns projetos de microaeronaves, reproduzindo em escala
de insetos, como o RoboBee. Disponível em: <http://bgr.com/2016/05/20/harvard-mit-robobee-perching/>.
Acesso em: 28 jun. 2016.
16
	 SLOBOGIN, Christopher. Panvasive Surveillance, Political Process Theory, and the Nondelegation Doctrine. The
Georgetown Law Jornal, v. 102, p. 1721-1776, 2014; MCNEAL, Gregory S. Drones and Aerial Surveillance:
Considerations for Legislators. Brookings Institution: The Robots Are Coming: The Project on Civilian Robotics,
Nov. 2014.
17
	 Em comentários já apresentados em obra própria, há que se considerar que dessa busca incessante pelo
equilíbrio na regulação estatal, há que se considerar os problemas decorrentes dos extremos, isto é, enquanto
que na regulação de menos intensidade desconsidera-se a preocupação com a distribuição de riquezas, fa-
vorecendo a ampliação das desigualdades, o exagero contribui para a ineficiência da economia, e da própria
máquina estatal (OLIVEIRA, Rafael Carvalho Rezende. Novo perfil da regulação estatal: Administração Pública
de resultados e análise de impacto regulatório. Rio de Janeiro: Forense, 2015. p. 139).
18
	 O espaço aéreo é a área acima do território, terrestre ou hídrico, nacional. Floriano de Azevedo Marques
Neto sustenta que o espaço aéreo nacional é bem público de uso especial pertencente ao domínio da União.
MARQUES NETO, Floriano de Azevedo. Bens públicos: função social e exploração econômica: o regime jurídico
das utilidades públicas. Belo Horizonte: Fórum, 2009. p. 145-146. De outro lado, Diogo de Figueiredo Moreira
Neto afirma que o espaço aéreo é bem público de uso comum. MOREIRA NETO, Diogo de Figueiredo. Curso
de direito administrativo. 16. ed. Rio de Janeiro: Forense, 2014. p. 403-404. Independentemente da natureza
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CONTRIBUIÇÕES PARA O NOVO MARCO REGULATÓRIO DOS DRONES – ENTRE NOBRES OBJETIVOS...
impactos que deverão ser considerados para evitar a segregação aeroespacial entre
aeronaves tripuladas e não tripuladas, o assunto teve que ser revisitado.
Sabe-se que a Constituição Federal conferiu competência à União para explorar,
diretamente ou mediante autorização, concessão ou permissão, a navegação aérea
(art. 21, inciso XII, alínea “c”), previsão regulamentada pela Lei nº 7.565/86 (Código
Brasileiro de Aeronáutica – CBA), que, embora anterior à Constituição de 1988, foi
por ela recepcionada. O CBA, por sua vez, sofreu significativas alterações sobre a
divisão de competências, que, inicialmente, concentravam-se nas mãos do Ministério
da Aeronáutica,19
mas que, com a promulgação da Lei nº 11.182/2005, algumas
destas foram repartidas com a Agência Nacional de Aviação Civil (ANAC).
Preservou-se, contudo, a competência do controle de acesso ao espaço aéreo,
que atualmente é exercida pelo Departamento de Controle do Espaço Aéreo (DECEA),
vinculado ao Comando da Aeronáutica. A estrutura do DECEA é composta por órgãos
regionais, com o intuito de facilitar a navegação aérea, de modo seguro e eficiente,
nas áreas de suas respectivas jurisdições, compostas pelo total de cinco blocos
delineados sobre o território nacional.20
Para fins de tráfego aéreo, os RPAS são equiparados a aeronaves tripuladas,
estando o seu acesso ao espaço aéreo sujeito às normas do DECEA e às respectivas
autorizações de seus órgãos regionais, no teor do que dispõe o art. 20 do Código
Brasileiro de Aeronáutica.21
Dessa maneira, não sendo o RPAS de uso recreativo,
o seu acesso ao espaço aéreo dependerá de prévia autorização especial fornecida
pelo órgão regional competente do DECEA, cujo procedimento de requerimento foi
minuciosamente descrito pela recente ICA nº 100-40/2015.22
jurídica do espaço aéreo, a União possui competência privativa para legislar sobre a utilização do espaço
aéreo, especialmente as condições para a navegação aérea e aeroespacial (arts. 22, X, e 48, V, da CRFB),
bem como para explorar, diretamente ou mediante autorização, concessão ou permissão a navegação aérea,
aeroespacial e a infraestrutura aeroportuária (art. 21, XII, “c”, da CRFB). A concessão de uso do espaço aéreo
encontra-se prevista no art. 8º do Decreto-Lei nº 271/1967. Sobre o tema, vide: OLIVEIRA, Rafael Carvalho
Rezende. Curso de Direito Administrativo. 4. ed. São Paulo: Método, 2016. p. 647.
19
	 Hoje, Comando da Aeronáutica, nos termos do art. 19 da Lei Complementar nº 97/1999.
20
	 Os órgãos regionais que compõem o DECEA são os Centros Integrados de Defesa Aérea e Controle de Tráfego
Aéreo (CINDACTA) I, II, III e IV e o Serviço Regional de Proteção ao Voo de São Paulo (SRPV-SP), cada qual
com sua jurisdição definida. Desta forma, para solicitar a autorização de uso do espaço aéreo, será preciso
observar a localidade em que se pretende operar. As exatas dimensões das zonas de competência podem ser
conferidas nos termos do ICA nº 100-40/2015.
21
	 Art. 20. Salvo permissão especial, nenhuma aeronave poderá voar no espaço aéreo brasileiro, aterrissar no
território subjacente ou dele decolar, a não ser que tenha: I – marcas de nacionalidade e matrícula, e esteja
munida dos respectivos certificados de matrícula e aeronavegabilidade (artigos 109 a 114); II – equipamentos
de navegação, de comunicações e de salvamento, instrumentos, cartas e manuais necessários à segurança
do vôo, pouso e decolagem; III – tripulação habilitada, licenciada e portadora dos respectivos certificados, do
Diário de Bordo (artigo 84, parágrafo único) da lista de passageiros, manifesto de carga ou relação de mala
postal que, eventualmente, transportar.
22
	 Conforme destacado anteriormente, o ICA 100-40 foi aprovado pela Portaria nº 415 do Departamento de
Controle do Espaço Aéreo (DECEA), de 09.11.2015, com o intuito de regulamentar os procedimentos e
responsabilidades necessários para o acesso seguro ao espaço aéreo nacional por Sistemas de Aeronaves
Remotamente Pilotadas (RPAS). Antes de sua vigência, vigorava desde 2010 a AIC nº 21/2010, que tratava
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RAFAEL CARVALHO REZENDE OLIVEIRA, CAIO CESAR FIGUEIROA
Voltando às preocupações destinadas à operação de RPAS, dentre as normas
vigentes, deve-se distinguir a finalidade do uso de tais equipamentos, lembrando que
este artigo focará nos casos destinados à exploração de atividade econômica. É im-
portante, contudo, desde já, fazer a ressalva de que o uso com propósitos recreativos
de tais aeronaves teve tratamento equiparado à prática de aeromodelismo, disciplina-
do conforme a Portaria DAC nº 207/STE/1999, do antigo Departamento de Aviação
Civil (vinculado, à época, ao Ministério da Aeronáutica),23
na qual os equipamentos
devem respeitar a restrição de não operar nas zonas de aproximação e decolagem de
aeródromos e nunca ultrapassar altura superior a 400 pés (aproximadamente 120
metros) mantendo-se o equipamento sempre ao alcance da visão do piloto.
Para fins de pesquisa e desenvolvimento, o Código Brasileiro de Aeronáutica pre-
viu no seu art. 119 que tais voos estariam sujeitos à emissão prévia de Certificados
de Autorização de Voo Experimental (CAVE).24
Para atender a esta exigência, no cam-
po dos RPAS com a finalidade científica, de pesquisa e desenvolvimento bem como
para o treinamento de pilotos, vigora a Instrução Suplementar nº 21-001 de 2012 da
Agência Nacional de Aviação Civil (ANAC), que detalha o procedimento e os requisitos
necessários para a obtenção do CAVE. Conforme já mencionado, diferentemente da
regulamentação para o uso recreativo (aeromodelismo), esta autorização da ANAC
não exclui a competência de outros agentes reguladores, como o DECEA, por exem-
plo, em que pese as autorizações serem de finalidades distintas.25
Em que pese as diversas propostas apresentadas pela ANAC para a regulação
do uso de RPAS com fins comerciais, a lacuna regulatória ainda persiste, assim como
em outros países.26
Resta ponderar os principais traços vertidos nas propostas apre-
sentadas pela Agência Reguladora, conforme se verá no próximo subitem.
da concessão de autorizações para RPAS, mas que, se comparada à atual regulamentação, condicionava o
uso dos equipamentos a requisitos mais genéricos.
23
	 Cabe ressaltar que o DAC foi extinto em 2006, sendo suas atividades e responsabilidades absorvidas pela
ANAC.
24
	 Art. 119. As aeronaves em processo de homologação, as destinadas à pesquisa e desenvolvimento para fins
de homologação e as produzidas por amadores estão sujeitas à emissão de certificados de autorização de voo
experimental e de marca experimental (artigos 17, Parágrafo único, e 67, §1º).
25
	 Acerca das distinções entre autorizações operacionais, como as concedidas pela ANAC para a operação dos
RPAS e autorizações por operação, como a que o DECEA outorga para o acesso e uso do espaço aéreo, o
elemento principal a ser considerado é a natureza do vínculo entre o Poder Público e o autorizatário, sendo no
primeiro caso instrumentos mais estáveis, orientando a atividade em conformidade com estratégias setoriais,
ao passo que a última se esgota a partir da realização da operação episódica que a fundamentou (ARAGÃO,
Alexandre Santos de. Direito dos Serviços Públicos. 3. ed. Rio de Janeiro: Forense, 2013. p. 204).
26
	 Os Estados Unidos tiveram que enfrentar forte resistência popular ante a intenção de regulamentação do uso
civil de drones, pois o seu uso sempre foi associado com finalidades bélicas (HEVERLY, Robert A. The State
of Drones: State authority to regulate drones. Albany Government Law Review, 8, 29, 2015). Apesar disso, no
dia 21 de junho de 2016 foi publicada a primeira regulamentação oficial pela Federal Aviation Administration
(FAA), órgão responsável pela regulação do espaço aéreo, das aeronaves e a respectiva infraestrutura, visando
ao uso destes equipamentos para exploração econômica. Disponível em: <http://www1.folha.uol.com.br/
mercado/2016/06/1784244-governo-americano-divulga-regras-para-uso-de-drones-comerciais.shtml>.
Acesso em: 22 jun. 2016.
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CONTRIBUIÇÕES PARA O NOVO MARCO REGULATÓRIO DOS DRONES – ENTRE NOBRES OBJETIVOS...
2.3  Proposta regulatória (ainda) em discussão
A ANAC divulgou pela primeira vez a sua intenção de regulação de RPAS na esfe-
ra civil em 2011, expedindo, primeiramente, a Instrução Suplementar nº 21, voltada
especificamente para o seu emprego em pesquisas científicas. Excepcionalmente, e
por pressão da iniciativa privada, a Agência concedeu algumas autorizações para a
utilização de drones com finalidades adversas, como para ajudar no combate contra
a dengue,27
e até mesmo para execução de eventos culturais, como o Carnaval do
Rio de Janeiro,28
todas expedidas com base no art. 20 do CBA combinado com a Lei
nº 11.182/05.29
No início de 2014, foi apresentada a primeira proposta de regulação do uso
de RPAS para exploração de atividade econômica,30
e mesmo após ampla gama de
sugestões o projeto não movimentou. Até que, em setembro de 2015, a Agência
comunicou a intenção de retomar o projeto, apresentando concomitantemente a
abertura de datas para realização de consulta e audiência pública. Não obstante a
concretização destas etapas, até o presente momento, nada foi apresentado perante
a sociedade civil, sendo que os pedidos de autorização estão sendo analisados ca-
suisticamente pela área técnica da Agência, com ulterior apreciação do pedido pela
Diretoria Colegiada.31
27
	 Disponível em: <http://g1.globo.com/sc/santa-catarina/noticia/2015/05/anac-libera-drone-com-camera-para-
combate-dengue-em-chapeco-sc.html>. Acesso em: 05 jul. 2016.
28
	 Disponível em: <http://g1.globo.com/rio-de-janeiro/carnaval/2016/noticia/2016/02/anac-notifica-beija-flor-
por-uso-de-drone-durante-desfile-no-rio.html>. Acesso em: 05 jul. 2016.
29
	 Tratando da possibilidade de requerimento da autorização “inominada” para uso de drones sem fins lucrativos,
José Luiz Boa Nova Filho pondera que “mesmo não estando regulada a operação para fins não experimentais,
pode-se requerer à ANAC uma autorização para esse tipo de operação. [...] Tal procedimento encontra respaldo
na Lei nº 7.565, de 19 de dezembro de 1986, o Código Brasileiro de Aeronáutica, que estabelece: [...]”
(BOANOVA FILHO, José Luiz. Aeronaves não tripuláveis no Brasil e sua regulação. Revista Brasileira de Direito
Aeronáutico e Espacial – RBDAE, n. 96, dez. 2014, p. 49-51). Ademais, sobre o rol de competências da ANAC,
dispõe o art. 8º da Lei nº 11.182/05: “Art. 8º Cabe à ANAC adotar as medidas necessárias para o atendimento
do interesse público e para o desenvolvimento e fomento da aviação civil, da infra-estrutura aeronáutica e
aeroportuária do País, atuando com independência, legalidade, impessoalidade e publicidade, competindo-lhe:
[...] XVII – proceder à homologação e emitir certificados, atestados, aprovações e autorizações, relativos às
atividades de competência do sistema de segurança de voo da aviação civil, bem como licenças de tripulantes
e certificados de habilitação técnica e de capacidade física e mental, observados os padrões e normas por ela
estabelecidos;”
30
	 A proposta foi apresentada durante o 2º Workshop sobre RPAS, organizado pela ANAC e realizado em fevereiro
de 2014, em São José dos Campos-SP.
31
	 De acordo com a coluna de Celso Ming, em O Estado de S.Paulo, “a diretoria da ANAC permaneceu incompleta
por quase um ano e esse foi um dos fatores que certamente atrasaram o processo. Para a tomada de decisões
que impactam a sociedade são necessários pelo menos três diretores, sendo que por quase todo o ano de
2015, a Agência passou com apenas dois. Desde o início de abril, no entanto, a diretoria está completa e
a expectativa é a de que a regulamentação saia logo” (MING, Celso. Não são aviões de carreira. O Estado
de S.Paulo, 1º maio 2016. Disponível em: <http://economia.estadao.com.br/noticias/geral,nao-sao-avioes-
de-carreira,10000048310>. Acesso em: 05 jul. 2016). Além disso, segundo consta do sítio eletrônico da
ANAC, o processo de deliberação da proposta apresentada e submetida à consulta pública, autuado sob o nº
00066.020773/2014-51, teria como previsão de conclusão o mês de junho de 2016 (http://www.anac.gov.br/
participacao-social/agenda-regulatoria/temas-2015-2016/tema-24-spo-regulamentacao-acerca-da-certificacao-
e-vigilancia-continuada-de-operadores-de-veiculo-aereo-nao-tripulado-vant).
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RAFAEL CARVALHO REZENDE OLIVEIRA, CAIO CESAR FIGUEIROA
O conteúdo das propostas até o momento apresentadas pela ANAC revela, em
grande parte, a preocupação com as questões de segurança, de forma a delimitar a
distância mínima entre os RPAS de pessoas que não tenham declarado ciência da
presença do equipamento. A regulação também se mostrou mais intensa – leia-se
exigente – quanto mais pesada for a aeronave.32
Esta metodologia teve por embasa-
mento a regulamentação francesa, cujas preocupações de segurança variam entre o
peso do equipamento e a distância de voo.33
Do material até o momento divulgado pela ANAC, nada foi mencionado em re-
lação ao procedimento para a obtenção da autorização da operação de RPAS. A dis-
cricionariedade na concessão de autorizações neste nicho é inadequada com os fins
que se espera alcançar com um marco regulatório bem definido, qual seja, a atração
de investimentos e o desenvolvimento da economia interna, sendo imprescindível,
todavia, um nível mínimo de segurança jurídica, considerando os elevados aportes
necessários que os setores de pesquisa e desenvolvimento acabam demandando.
Ante este vácuo regulatório, e até que venha a ser propriamente apresentado
um modelo definitivo, é preciso rechaçar algumas das circunstâncias que causam in-
segurança àqueles que pretendem se arriscar neste mercado, que além da ausência
de um procedimento administrativo bem definido para a concessão da autorização de
operação com fins lucrativos, falta a garantia do diálogo institucional entre os entes
reguladores, de modo a evitar normas conflitantes ou políticas regulatórias com alto
custo de implementação, com definições de competências claras, como também
rever algumas exigências que foram além do que seria necessário para atender as
necessidades que justificariam a intervenção estatal neste domínio. São os temas
que serão abordados no próximo capítulo.
32
	 Segundo a classificação proposta pela Agência, conforme a apresentação disponível no sítio eletrônico da
própria ANAC (http://www.anac.gov.br/assuntos/paginas-tematicas/drones), na Classe 1 estão os drones
com peso maior que 150 quilos, na Classe 2 os com 25 até 150 quilos e, na Classe 3, os de peso menor
ou igual a 25 quilos. Para os equipamentos das Classes 1 e 2, será exigido que os pilotos sejam maiores de
18 anos, tenham licença e habilitação para pilotar e apresentem o registro de todos os voos. Também será
preciso ter certificado médico aeronáutico. Os equipamentos da Classe 3 não exigirão o registro dos voos, nem
o certificado médico aeronáutico, mas sim que o operador seja maior de 18 anos. A licença e a habilitação
só serão obrigatórias para quem pretende operar acima de 400 pés (120 metros), em conformidade com as
normas preexistentes sobre o uso de RPAS recreativos.
33
	 Para mais detalhes sobre a solução adotada pioneiramente pela França, em relação ao uso de RPAS com
fins comerciais, consultar: <http://www.developpement-durable.gouv.fr/IMG/pdf/tableau-synthese-aeronefs-
telepilotes.pdf>. Acesso em: 28 jun. 2016.
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CONTRIBUIÇÕES PARA O NOVO MARCO REGULATÓRIO DOS DRONES – ENTRE NOBRES OBJETIVOS...
3  Lacunas regulatórias e insegurança jurídica
3.1  O pluralismo de agentes reguladores e o risco de
sobreposição de competências
Como visto, há diversas prescrições infralegais disciplinando a operação de
RPAS, ainda que de maneira esparsa e desorganizada. Em suma, coube ao DECEA
o planejamento, a disciplina e a fiscalização no acesso e uso do espaço aéreo,34
e à
ANAC a regulação e fiscalização de aeronaves, tripulação e da parte de infraestrutura
aeroportuária.35
Mas há outros envolvidos neste contexto, como por exemplo a Agência
Nacional de Telecomunicações (ANATEL), responsável por administrar e fiscalizar o uso
das radiofrequências utilizadas para o controle (enlace) das aeronaves.36
Foi também
constatada a tentativa de regulação do uso de RPAS em sede municipal37
e estadual.38
A autorização da ANAC é condição necessária, porém não suficiente, para a ope-
ração desses equipamentos, pois também, conforme já descrito, há permissões a
serem concedidas pela ANATEL e DECEA. Em tese, é possível afirmar que se trata de
funções distintas e bem delineadas, embora, complementares para o uso adequado
do espaço aéreo.
Na prática, contudo, evidentemente, diante de tantos entes concomitantemente
tentarem se valer de sua parcela de polícia para regular a operação das atividades de
RPAS surge o risco de coexistirem no quadro regulatório normas conflitantes tratando
de um mesmo objeto (antinomia), ou ainda a postergação prejudicial da concretização
de regulação do tema em virtude dos possíveis conflitos de competência entre os
agentes reguladores (anomia).39
34
	 Segundo o ICA 100-40/2015, item 1.2, compete ao DECEA legislar sobre os procedimentos de acesso ao
espaço aéreo, cabendo aos demais entes, que porventura venham a participar da regulação de atividades que
sejam desempenhadas neste espaço, “tratar dos assuntos dentro de sua área de atuação”.
35
	 Lei nº 11.182/05: “Art. 2º Compete à União, por intermédio da ANAC e nos termos das políticas estabelecidas pelos
Poderes Executivo e Legislativo, regular e fiscalizar as atividades de aviação civil e de infra-estrutura aeronáutica e
aeroportuária. [...] Art. 8º Cabe à ANAC adotar as medidas necessárias para o atendimento do interesse público e
para o desenvolvimento e fomento da aviação civil, da infra-estrutura aeronáutica e aeroportuária do País, atuando
com independência, legalidade, impessoalidade e publicidade, competindo-lhe: [...]”.
36
	 A Lei nº 9.472/1997 dispôs no art. 163 sobre a Autorização de Uso de Radiofrequência. O sistema de radio-
comunicação entre a aeronave e a sua respectiva estação de pilotagem é fundamental para o funcionamento
e operação de voos por meio de RPAS, mas, além da aludida autorização, cabe ainda buscar a certificação e
a homologação dos equipamentos de comunicação, sem prejuízo da licença para funcionamento da estação,
nos termos da vasta legislação da ANATEL. A agência criou um manual para auxiliar aqueles que necessitem
se enquadrar dentro das condicionantes mencionadas. O manual encontra-se disponível em: <http://www.
anatel.gov.br/Portal/verificaDocumentos/documento.asp?numeroPublicacao=342842&filtro=1&documentoP
ath=342842.pdf>. Acesso em: 03 jun. 2016.
37
	 Trata-se do caso de Curitiba, e a tentativa de regular a atividade via Plano Diretor. Consoante a Secretaria
Municipal de Informação e Tecnologia do município, a regulamentação proposta partiria das normas já
delineadas pela ANAC. Disponível em: <http://www.gazetadopovo.com.br/vida-e-cidadania/curitiba-define-
regras-para-os-drones-ec8e9tjmzrwfixwxpgyddmxce>. Acesso em: 04 jun. 2016.
38
	 O caso envolve a Secretaria de Estado de Ciência, Tecnologia, Inovação e Educação Profissional do Governo
do Estado do Espírito Santo. Disponível em: <http://www.sectti.es.gov.br/drone>. Acesso em: 04 jun. 2016.
39
	 Acerca destes riscos, destaca-se o alerta já feito em outras oportunidades: “A especialização e a forte auto-
nomia das agências reguladoras tiveram por objetivo principal garantir a despolitização de setores regulados,
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RAFAEL CARVALHO REZENDE OLIVEIRA, CAIO CESAR FIGUEIROA
Em relação ao segundo caso, isto é, na hipótese de conflito de competências
entre policymakers, reguladores e entes federativos não se trata de uma peculia-
ridade apenas do setor aéreo. Por exemplo, a Lei nº 9.472/97, no art. 19, inciso
XIX, conferiu competência à ANATEL para o controle, prevenção e repressão de infra-
ções à ordem econômica, embora coincidam com a competência geral exercida pelo
Conselho Administrativo de Defesa Econômica (CADE). Da mesma forma, no setor de
gás para termoelétricas, envolvendo competências da ANP e da ANEEL, respectiva-
mente, que apesar de envolver a princípio apenas entes da União, remanesce ainda
competência dos estados para o serviço público de distribuição de gás canalizado.
Uma vez constatado o conflito de competências, há que se ponderar as esferas
de poder da Federação envolvidas. Se do mesmo plano, a solução poderá ocorrer no
exercício do poder hierárquico da Administração, já em hipótese da pluralidade de
agentes de unidades distintas, caberá ao Supremo Tribunal Federal dar a palavra final
sobre a distribuição de competências.40
3.2  O regime das autorizações e a sua precariedade para o
uso de RPAS com fins lucrativos
Um dos pontos mais controvertidos do quadro normativo em vigência, e que
poderá ser repetido na regulação a ser implementada, diz respeito à exigência de
autorização para o uso dos RPAS com fins lucrativos, condicionado à prévia análise
por parte dos órgãos técnicos da ANAC, e deliberadas, caso a caso, pela Diretoria
Colegiada, sem prever, todavia, qualquer critério que paute o procedimento para a
concessão (ou não) da aludida autorização, nem quanto à estabilidade do título.41
O
fundamento para esta autorização de finalidade ainda não catalogada pela ANAC se
dá com base no art. 20 do CBA, combinado com o art. 8º, XVII, da Lei nº 11.182/05.
viabilizando, dessa forma, tratamento técnico aos desafios apresentados pelos setores do mercado. O insula-
mento das agências, todavia, gerou a fragmentação regulatória, com a fixação de normas e políticas setori-
ais sem maiores preocupações com os impactos gerados de forma global em outros setores econômicos”
(OLIVEIRA, Rafael Carvalho Rezende. Novo perfil da regulação estatal: Administração Pública de resultados e
análise de impacto regulatório. Rio de Janeiro: Forense, 2015. p. 220).
40
	 Cf. SOUTO, Marcos Juruena Villela. Agências Reguladoras. Revista de Direito Administrativo, Rio de Janeiro, n.
216, p. 125-162, abr./jun. 1999; TÔRRES, Heleno Taveira. Conflitos de competência entre agências regulado-
ras: um caso: competência constitucional da ANP para regulação do transporte marítimo de petróleo em face
das competências da ANTAQ. Interesse Público, Belo Horizonte, v. 8, n. 36, maio 2006.
41
	 De antemão, adverte-se ao leitor que este artigo não pretende se aprofundar na discussão jurídica acerca do
instituto das autorizações, se ato vinculado ou discricionário, ou ainda se precária ou estável, considerando
os mares de tinta já gastos pela doutrina pátria sobre o tema. Dentre as principais referências, vide ARAGÃO,
Alexandre Santos de. Direito dos Serviços Públicos. 3. ed. Rio de Janeiro: Forense, 2013. p. 209-214;
SUNDFELD, Carlos Ari. Autorização de Serviços de Telecomunicações: os requisitos para sua obtenção. Revista
de Direito Administrativo e Constitucional, v. 15, p. 200, 2004; DI PIETRO, Maria Sylvia Zanella. Parcerias na
Administração Pública. Concessão. Permissão. Franquia. Terceirização e Outras Formas. 3. ed. São Paulo:
Atlas, 1999. p. 126-127.
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CONTRIBUIÇÕES PARA O NOVO MARCO REGULATÓRIO DOS DRONES – ENTRE NOBRES OBJETIVOS...
O condicionamento do exercício de atividade econômica à prévia autorização é
prática usual em outros setores regulados, sendo que em cada caso, os interesses
públicos visados (justificando, assim, a intervenção estatal) coadunam-se com os
requisitos exigidos para a sua emissão.42
O uso da autorização, enquanto típico ins-
trumento regulatório, é o mecanismo concebido pela legislação de modo a dotar o
Poder Público de ferramentas para exercer a fiscalização sobre as atividades desem-
penhadas em regime privado. A sua exigência encontra como fundamento de validade
o pleno exercício do poder de polícia, de modo a estabelecer requisitos previamente
ao exercício de uma ou mais etapas de suas respectivas cadeias, visando, em última
instância, ao desempenho equilibrado, eficiente, seguro ou outras finalidades públi-
cas de relevo.
No contexto do uso de UAS, isto é, abrangendo todos os tipos de aeronaves
não tripuladas, o art. 8º da Convenção sobre Aviação Civil Internacional (Convenção
de Chicago) – firmada pelo Brasil em 29 de maio de 1945, ratificada em 8 de junho
de 1946 e promulgada pelo Decreto federal nº 21.713/46 – determina a exigên-
cia dos Estados Signatários que regulamentem a autorização especial como con-
dicionante operacional, de modo a assegurar o controle sobre o voo desses novos
instrumentos.43
O que mais preocupa o setor, certamente, é o vácuo legislativo em não contar
com um procedimento claro, como nos demais casos mencionados, voltados para
a exploração comercial do uso destes equipamentos. Ademais, as propostas até o
momento apresentadas pela ANAC em momento algum deram indícios de como seria
este procedimento, sugerindo apenas critérios das possíveis exigências de enquadra-
mento dos equipamentos conforme a variação do seu peso.
Conforme orientado pelo DECEA, deverá ser encaminhado à ANAC um requeri-
mento, “destacando as características da operação pretendida e do projeto do RPAS,
de modo a demonstrar à ANAC que o nível de segurança do projeto é compatível
com os riscos associados à operação (riscos a outras aeronaves em voo e a pes-
soas e bens no solo)”. Nesse interregno, qualquer indivíduo que queira inovar neste
42
	 No setor de telecomunicações, por exemplo, a autorização da ANATEL é demandada para as atividades a
serem prestadas em regime privado, assegurando que o particular detenha as condições mínimas para a
execução dos serviços, nos termos do art. 131, da Lei nº 9.472/97. No mercado financeiro, o Banco Central
é o agente responsável por emitir a autorização para os interessados que serão fiscalizados no desempenho
de suas atividades ao longo de toda sua existência, conforme o art. 18, da Lei nº 4.595/64, considerando a
relevância destas atividades para o sistema econômico do país. No setor de infraestrutura e logística (portos,
aeroportos, rodovias etc.), as autorizações visam assegurar a qualidade mínima dos serviços e a correlata
proteção dos usuários.
43
	 Convenção sobre Aviação Civil Internacional. Art. 8º – Aeronave Sem Piloto. Nenhuma aeronave capaz de
navegar sem piloto, poderá sobrevoar sem piloto o território de um Estado contratante sem autorização es-
pecial do citado Estado e de conformidade com os termos da mesma autorização. Cada Estado contratante
se compromete a tomar as disposições necessárias para que o voo sem piloto de tal aeronave nas regiões
acessíveis de aeronaves civis seja controlada de modo a evitar todo perigo para as aeronaves civis.
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sentido, terá que empreender sob o risco de depender de uma decisão segundo a
conveniência e oportunidade da ANAC ou, no mínimo, ter que responder a processos
administrativos.
No contexto da legislação sob análise e a partir das projeções da regulação que
está em vias de desenvolvimento, portanto, não há respaldo ou segurança necessária
de que, uma vez preenchidos os requisitos preestabelecidos pelo regulador, a autori-
zação seria expedida sem qualquer embargo, ou de que seus efeitos perdurariam por
tempo razoável. Este poço de incertezas, naturalmente, tende a frustrar particulares
que pretendessem fazer o uso dos RPAS em suas atividades, assim como também
alveja os incentivos para o desenvolvimento deste tipo de tecnologia em território na-
cional, considerando os altos investimentos envolvidos para sustentar tais projetos.44
Ainda que a autorização a ser previamente outorgada pela ANAC busque preservar
os bens jurídicos vistos nos parágrafos anteriores (notadamente, a segurança da coleti-
vidade, de forma a possibilitar um uso racional do espaço aéreo em condições técnicas
adequadas), a lacuna de definições mais precisas quanto aos critérios utilizados para a
concessão ou não da autorização inviabiliza os objetivos maiores pelo Estado, como a
promoção de incentivos ao desenvolvimento tecnológico (art. 218 da CF).45
Dessa maneira, eventual discussão sobre as prospecções de um futuro marco
regulatório definitivo deverá considerar que a legitimidade da autorização não pode
se desvencilhar dos demais objetivos preconizados pela Constituição. Assim, sua
legalidade depende da aderência a tal pauta finalística, devendo os requisitos neces-
sários para sua obtenção observar a proporcionalidade aos fins visados, sob pena de
infringir, inclusive, a livre iniciativa. Por isso, é importante frisar que, ainda que haja
interesses coletivos relevantes que justifiquem a limitação do uso do espaço aéreo,
tais atividades continuam sendo exercidas sob o regime privado e a sua pedra basilar
continua sendo a livre iniciativa.
A regulação pela autorização deverá observar os limites de intervenção em re-
lação aos ônus que poderão ser impostos aos interessados em obter e mantê-la
para o uso de RPAS na exploração de atividade econômica. Entre eles, a regulação
implicará a observância de dois limites: (i) os requisitos para sua obtenção e fruição
não deverão ser excessivos, de modo a impedir o uso por outros atores interessados;
(ii) é imprescindível a previsão de tais requisitos para obtenção e permanência da
autorização na legislação.
44
	 Consoante os ensinamentos de Vitor Rhein Schirato, o regime jurídico das autorizações, como instrumento
condicionante do exercício da livre iniciativa, deverá considerar como premissas: (i) o nível de investimento
envolvido para o desempenho da atividade a ser fiscalizada, não havendo que se falar nestes casos em pre-
cariedade; e (ii) o enquadramento do instrumento com base nas determinações expressas da lei, evitando con-
cepções doutrinárias engessadas (SCHIRATO, Vitor Rhein. Livre Iniciativa nos Serviços Públicos. Belo Horizonte:
Fórum, 2012. p. 314).
45
	 Art. 218. O Estado promoverá e incentivará o desenvolvimento científico, a pesquisa, a capacitação científica
e tecnológica e a inovação.
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CONTRIBUIÇÕES PARA O NOVO MARCO REGULATÓRIO DOS DRONES – ENTRE NOBRES OBJETIVOS...
Partindo do pressuposto de que o exercício da discricionariedade pelo regulador
somente pode se dar na medida estabelecida pela norma,46
e, no caso, não havendo
parâmetros definidos, é natural o ambiente de insegurança propiciado ao setor, tendo
em vista que competirá única e exclusivamente ao regulador decidir quanto à validade
e eficácia da autorização. Daí a importância de revisitar, mais uma vez, o instituto da
autorização no direito público moderno enquanto ferramenta de caráter vinculada e
estável. Isso porque hodiernamente não é mais possível cogitar o uso de autorização
apenas para objetos simples, como para a instalação de bancas de jornal (em que
prescindiam de grandes investimentos por parte do particular autorizado).
O instituto das autorizações, conforme mencionado, hoje é utilizado em diversos
setores, precipuamente para a regulação de atividades econômicas que demandam
grandes investimentos por parte dos interessados, implicando, consequentemente, o
afastamento da doutrina clássica e a sua concepção de instrumento precário, outor-
gada de maneira discricionária.47
É, portanto, imprescindível que a nova regulamenta-
ção venha a considerar esse novo papel das autorizações, rechaçando reproduções
automáticas da doutrina que hoje já estão superadas.48
Para fins de definição de prazos, é relevante retomar o fundamento da autoriza-
ção para fins de assegurar interesses públicos elencados pela norma que a instituiu.
Por outro lado, vige também o respeito à livre iniciativa, segundo a qual a vigência das
autorizações deverá ser extensa o suficiente de modo a garantir o livre desempenho
da atividade autorizada e desde que não comprometa o cumprimento dos interesses
públicos inicialmente indicados. O prazo deverá também ser proporcional às exigên-
cias impostas para sua obtenção, de modo também que não inviabilize os retornos
financeiros estimados considerando o custo de oportunidade do mercado.
46
	 Nesse sentido, Floriano Azevedo Marques Neto leciona que “[s]ó haverá margem de discricionariedade (e,
portanto, campo para que o administrador exerça juízo de conveniência ou oportunidade de manejar a com-
petência conferida pelo legislador ou de escolher uma dentre várias medidas possíveis para atingir a finalidade
legal) quando o legislador não tiver determinado, de forma cabal e precisa, a conduta a ser adotada diante
da situação de fato. Tendo a lei previsto de forma fechada a hipótese de aplicação da competência adminis-
trativa, a providência a ser adotada, a mensuração (ponderação) da providência e a finalidade a ser atingida,
descaberá falar em discricionariedade. Diante de tal prescrição legal, não pode o administrador agir para além
dos limites nela previstos ou deixar de atuar conforme o comando legal (princípio da função). Em ambos os
casos incorrerá em ilegalidade” (MARQUES NETO, Floriano Peixoto de Azevedo. Discricionariedade e regulação
setorial: o caso do controle dos atos de concentração por regulador setorial. In: ARAGÃO, Alexandre Santos de
(Org.). O poder normativo das agências reguladoras. 2. ed. Rio de Janeiro: Forense, 2011. p. 431).
47
	 Nesse sentido MEIRELLES, Hely Lopes. Direito administrativo brasileiro. 37. ed. São Paulo: Malheiros, 2011.
p. 192; BANDEIRA DE MELO, Oswaldo Aranha. Princípios gerais de direito administrativo. 2. ed. Rio de Janeiro:
Forense, 1979. v. 1, p. 552. Vale, todavia, a ressalva, que mesmo a doutrina clássica admitia-se a outorga de
autorização por prazo determinado, constituindo autorização qualificada (CRETELLA JÚNIOR, José. Definição da
autorização administrativa. Revista dos Tribunais, São Paulo, v. 92, n. 813, p. 763, jul. 2003).
48
	 Cf. CÂMARA, Jacintho Arruda. As autorizações da Lei Geral de Telecomunicações e a teoria geral do direito
administrativo. Revista de Direito da Informática e Telecomunicações – RDIT, Belo Horizonte, n. 3, p. 55-68,
jul./dez. 2007.
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RAFAEL CARVALHO REZENDE OLIVEIRA, CAIO CESAR FIGUEIROA
3.3  A apólice de seguro como obrigação regulatória acessória
Outro ponto que é tratado dentro da atual regulamentação, nos termos do
Regulamento Brasileiro de Homologação Aeronáutica (RBHA) nº 47, proferido pela
ANAC, consiste na obrigatoriedade de contratação de apólice de seguro. O ICA nº
100-40/2015, recém-editado pelo DECEA, trata da exigência específica de aquisição
de seguro para operação de RPAS no espaço aéreo, cujo prêmio consiga cobrir os
riscos decorrentes da operação.49
Tal exigência, como condicionante para a operação
de RPAS com finalidade comercial, é inviável em relação à necessidade de conferir
maior segurança durante a integração do uso do espaço aéreo, por duas razões.
A primeira, de ordem mercadológica, que em virtude das magnitudes dos da-
nos envolvidos nos riscos da operação, como, por exemplo, a colisão de um RPAS
com um avião comercial, dificilmente trará incentivos para que o mercado securitário
comercialize produtos que possam atender às exigências da ANAC. Além disso, pela
inexistência de uma norma bem definida em relação às obrigações e riscos sobre a
exploração comercial de RPAS, é natural que o mercado securitário também se sinta
acuado.
Em um segundo ponto, a sua exigência poderá restringir o acesso à tecnologia,
concentrando desnecessariamente a exploração de atividade econômica por RPAS,
sem uma justificativa plausível para tanto, uma vez que os critérios da identifica-
ção obrigatória da aeronave atrelada ao ordenamento jurídico (como as hipóteses de
responsabilidade civil decorrentes do risco da atividade, nos termos do art. 927 do
Código Civil) dariam respaldo suficiente e necessário para fins de responsabilização
perante terceiros.50
Seria uma boa oportunidade rever esta exigência na regulação definitiva a ser
planejada pela ANAC, ou pelo menos ponderá-la consoante as categorias dos equipa-
mentos operados, de modo que não se crie uma nova barreira aos incentivos de uso
e exploração de RPAS para fins comerciais, sobretudo, quanto ao desenvolvimento
da própria tecnologia.
49
	 De acordo com as respostas fornecidas em sede da última rodada de perguntas da Audiência Pública nº
013/2015 da ANAC, a exigência do seguro se estende aos RPAS de qualquer finalidade, com ressalva aos
operados por órgãos públicos ou enquadrados como aeromodelos.
50
	 A esse respeito, leciona Alexandre Santos de Aragão: “Assim, por exemplo, as atividades privadas regula-
mentadas podem ser condicionadas à prévia autorização administrativa (art. 170, parágrafo único), mas não
pode o Legislador ou a Administração Pública disciplinar tal autorização de forma que inviabilize ou restrinja
excessivamente a entrada ou a permanência no mercado regulado” (ARAGÃO, Alexandre Santos de. Direito dos
Serviços Públicos. 3. ed. Rio de Janeiro: Forense, 2013. p. 195).
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CONTRIBUIÇÕES PARA O NOVO MARCO REGULATÓRIO DOS DRONES – ENTRE NOBRES OBJETIVOS...
4  Contribuições para disposições regulatórias futuras
Considerando as premissas adotadas pelo ICA nº 100-40/2015, isto é, do
reconhecimento de que o debate sobre a regulamentação proposta estaria longe de
ser o modelo desejado, e diante dos pontos de insegurança apresentados no capítulo
anterior, seria desejável que a nova regulamentação a ser editada pela ANAC fuja da
“visão de túnel”,51
e passe a encarar as ferramentas propiciadas por um modelo de
governança regulatória,52
antes de estruturar uma nova arquitetura definitiva.
Dentre estas ferramentas, podem-se mencionar as formas de coordenação
entre entes reguladores, isto é, uma proposta de diálogo institucionalizado entre
todos os entes envolvidos na missão de construir um ambiente livre de incertezas,
de modo a atrair investimentos e o bom uso do mercado voltado para RPAS. Tem-se
conhecimento do projeto Drone Legal,53
como desmembramento das ações do grupo
de trabalho coordenado pela Secretaria de Aviação Civil junto com os Ministérios da
Justiça; Defesa; Desenvolvimento, Indústria e Comércio Exterior, Agência Brasileira
de Inteligência (ABIN), Polícia Federal, Receita Federal, ANATEL, DECEA e ANAC.54
O diálogo, todavia, deve tomar rumos mais concretos quanto à apresentação
de resultados, não bastando apenas a formatação de diálogos com a sociedade civil
por meio de audiências e consultas públicas.55
Seria possível partir de projetos de
institucionalização do compartilhamento de competências por meio da instituição de
atos normativos inter-regulatórios, como as resoluções conjuntas.
Ademais, considerando os interesses no jogo de equilibrar incentivos para pro-
moção do desenvolvimento, sem deixar de lado as preocupações decorrentes da ope-
ração da atividade, deve-se pontuar os custos de transação para todos os envolvidos,
desde operadores, fabricantes, terceiros, fiscalizadores e o próprio agente regulador.
A razão é óbvia, e relaciona-se primordialmente com o aspecto da segurança jurídica
e os custos e benefícios das alternativas regulatórias a serem consideradas. Nesse
ponto, o uso da Análise de Impacto Regulatório (AIR) é medida que corrobora com
este equilíbrio, visando, em última instância, à eficiência para o alcance das políticas
pensadas no modelo a ser implementado.
Trata-se, em suma, do planejamento em arquiteturas regulatórias, de forma
a contabilizar as relações de custo-benefício incorporadas por este planejamento,
51
	 JUSTEN FILHO, Marçal. O direito das agências reguladoras independentes. São Paulo: Dialética, 2002. p. 372.
52
	 OLIVEIRA, Rafael Carvalho Rezende. Novo perfil da regulação estatal: Administração Pública de resultados e
análise de impacto regulatório. Rio de Janeiro: Forense, 2015. p. 184.
53
	 Mais informações sobre o programa disponíveis em: <http://www.aviacao.gov.br/noticias/2015/09/secretaria
-lanca-campanha-de-conscientizacao-sobre-o-uso-de-drones>. Acesso em: 27 jun. 2016.
54
	 A primeira da série de medidas a serem anunciadas pelo grupo de trabalhou consistiu na abertura de consulta
pública para a proposta de regulamentação.
55
	 Não se quer, com essa afirmação, menosprezar a relevância destas ferramentas, principalmente quando sua
finalidade é tentar aproximar os stakeholders, de modo a colaborar com a construção de um modelo regu-
latório que incentive o desenvolvimento da tecnologia.
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RAFAEL CARVALHO REZENDE OLIVEIRA, CAIO CESAR FIGUEIROA
com plena participação social, de modo a conferir maior legitimidade às decisões do
agente regulador.56
Nos ensinamentos do Professor Alexandre Santos de Aragão, o
uso de AIR deve ser o mais amplo possível, englobando todas as possíveis “instân-
cias regulatórias”, caso contrário, corre-se o risco de voltar à “visão de túnel” das
agências que se insulam em sua competência técnica.57
5  Considerações finais
Do conjunto normativo elencado, é possível afirmar que o uso dos RPAS para
fins comerciais encontra respaldo regulatório, em que pese a baixa densidade nor-
mativa conferida ao tema. Esta exploração, todavia, está condicionada à outorga
de autorizações pela ANAC, que será emitida casuisticamente. Contudo, o formato
carece de elementos suficientes para propiciar o respaldo necessário a incentivar
particulares a buscarem o acesso destas ferramentas, assim como também cria bar-
reiras ao desenvolvimento tecnológico, ante a fragilidade regulatória do instrumento
criado pela norma.
Foi com base nessas premissas que este estudo tentou realizar indicações dos
entraves que deverão ser considerados para fins de uma regulação definitiva. Assim
também foram realizadas algumas indicações de possíveis ferramentas de governan-
ça regulatória que poderão conferir maior segurança aos stakeholders com interesse
na imediata regulação da operação de RPAS para exploração de atividade econômica.
Assim como a ampliação do uso dos drones para finalidades civis, novas ir-
rupções ocorrerão fatalmente, e o direito não pode ser o algoz do desenvolvimento.
Steve Jobs, em 2005, proferiu um discurso marcante na Universidade de Stanford,
cuja expressão se traduz em “continue faminto, continue tolo”. O aprimoramento e
a vontade de mudar a partir do estudo é a novo eixo motriz propiciado pela quarta
revolução industrial, exercendo o Direito um papel fundamental, o de azeitar estas
engrenagens em uma dosagem equilibrada.
Referências
ARAGÃO, Alexandre Santos de. Análise de Impacto Regulatório – AIR. Revista de Direito Público da
Economia – RDPE, Belo Horizonte, ano 8, n. 32, out./dez. 2010.
ARAGÃO, Alexandre Santos de. Direito dos Serviços Públicos. 3. ed. Rio de Janeiro: Forense, 2013.
56
	 Cf. OLIVEIRA, Rafael Carvalho Rezende. Novo perfil da regulação estatal: Administração Pública de resultados e
análise de impacto regulatório. Rio de Janeiro: Forense, 2015. p. 260; ARAGÃO, Alexandre Santos de. Análise
de Impacto Regulatório – AIR. Revista de Direito Público da Economia – RDPE, Belo Horizonte, ano 8, n. 32,
out./dez. 2010.
57
	 ARAGÃO, Alexandre Santos de. Análise de Impacto Regulatório – AIR. Revista de Direito Público da Economia
– RDPE, Belo Horizonte, ano 8, n. 32, out./dez. 2010.
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CONTRIBUIÇÕES PARA O NOVO MARCO REGULATÓRIO DOS DRONES – ENTRE NOBRES OBJETIVOS...
BANDEIRA DE MELO, Oswaldo Aranha. Princípios gerais de direito administrativo. 2. ed. Rio de Janeiro:
Forense, 1979. v. 1.
BOANOVA FILHO, José Luiz. Aeronaves não tripuláveis no Brasil e sua regulação. Revista Brasileira
de Direito Aeronáutico e Espacial (RBDAE), n. 96, p. 49-51, dez. 2014.
BROOKER, Peter. Introducing Unmanned Aircraft Systems into a High Reliability ATC System. Journal
of Navigation. London, Cambridge Journals Online, v. 66, n. 5, p. 719-735, 2013.
CÂMARA, Jacintho Arruda. As autorizações da Lei Geral de Telecomunicações e a teoria geral do
direito administrativo. Revista de Direito da Informática e Telecomunicações – RDIT, Belo Horizonte,
n. 3, p. 55-68, jul./dez. 2007.
CARVALHO, André Castro. Drones já são uma preocupação jurídica. Huffpost Brasil, 24 abr. 2014.
Disponível em: <http://www.brasilpost.com.br/andre-castro-carvalho/drones-ja-sao-uma-preocupacao-
juridica_b_5199971.html>.
CRETELLA JÚNIOR, José. Definição da autorização administrativa. Revista dos Tribunais, São Paulo,
v. 92, n. 813, p. 763, jul. 2003.
DI PIETRO, Maria Sylvia Zanella. Parcerias na Administração Pública. Concessão. Permissão. Franquia.
Terceirização e Outras Formas. 3. ed. São Paulo: Atlas, 1999.
FARIA, José Eduardo. Direito e conjuntura. 2. ed. São Paulo: Saraiva, 2010.
HAVEL, Brian F.; MULLIGAN, John Q. Unmanned Aircraft Systems: a challenge to global regulators. 65
DePaul Law Review, 107, Fall, 2015.
HEVERLY, Robert A. The State of Drones: State authority to regulate drones. Albany Government Law
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JUSTEN FILHO, Marçal. O direito das agências reguladoras independentes. São Paulo: Dialética, 2002.
KATYAL, Neal. Disruptive Technologies and the Law. The Georgetown Law Jornal, v. 102, 2014.
MARQUES NETO, Floriano de Azevedo. Bens públicos: função social e exploração econômica: o regime
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MCNEAL, Gregory S. Drones and Aerial Surveillance: Considerations for Legislators. Brookings
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MING, Celso. Não são aviões de carreira. O Estado de S.Paulo, 1º maio 2016. Disponível em: <http://
economia.estadao.com.br/noticias/geral,nao-sao-avioes-de-carreira,10000048310>.
MOREIRA NETO, Diogo de Figueiredo. Curso de direito administrativo. 16. ed. Rio de Janeiro: Forense,
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OLIVEIRA, Rafael Carvalho Rezende. Curso de Direito Administrativo. 4. ed. São Paulo: Método, 2016.
OLIVEIRA, Rafael Carvalho Rezende. Novo perfil da regulação estatal: Administração Pública de
resultados e análise de impacto regulatório. Rio de Janeiro: Forense, 2015.
RODRIGUES, Elder Soares. Aspectos Regulatórios da Operação de Veículo Aéreo Não Tripulado. In:
CONGRESSO RIO DE TRANSPORTES, 13., jun. 2015.
SCHWAB, Klaus. The Fourth Industrial Revolution: What It Means and How to Respond. Foreign Affairs,
Dez. 2015.
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70 R. bras. de Dir. Público – RBDP | Belo Horizonte, ano 14, n. 54, p. 51-70, jul./set. 2016
RAFAEL CARVALHO REZENDE OLIVEIRA, CAIO CESAR FIGUEIROA
SLOBOGIN, Christopher. Panvasive Surveillance, Political Process Theory, and the Nondelegation
Doctrine. The Georgetown Law Jornal, v. 102, p. 1721-1776, 2014.
SOUTO, Marcos Juruena Villela. Agências Reguladoras. Revista de Direito Administrativo, Rio de
Janeiro, n. 216, p. 125-162, abr./jun. 1999.
SUNDFELD, Carlos Ari. Autorização de Serviços de Telecomunicações: os requisitos para sua obtenção.
Revista de Direito Administrativo e Constitucional, v. 15, p. 200, 2004.
SUNDFELD, Carlos Ari. Direito Administrativo Ordenador. São Paulo: Malheiros, 2003.
TÔRRES, Heleno Taveira. Conflitos de competência entre agências reguladoras: um caso: competência
constitucional da ANP para regulação do transporte marítimo de petróleo em face das competências
da ANTAQ. Interesse Público, Belo Horizonte, v. 8, n. 36, maio 2006.
VILLAMIZAR, Fernando. Drones, ¿Hacia una guerra sin regulación jurídica internacional? Revista de
Relaciones Internacionales, Estrategia y Seguridad, 10, 2, 2015.
Informação bibliográfica deste texto, conforme a NBR 6023:2002 da Associação
Brasileira de Normas Técnicas (ABNT):
OLIVEIRA, Rafael Carvalho Rezende; FIGUEIROA, Caio Cesar. Contribuições para o
novo marco regulatório dos drones – Entre nobres objetivos e inadequados procedi-
mentos. Revista Brasileira de Direito Público – RBDP, Belo Horizonte, ano 14, n. 54,
p. 51-70, jul./set. 2016.
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Contribuições para o novo marco regulatório dos drones: entre nobres objetivos e inadequados procedimentos

  • 1. 51R. bras. de Dir. Público – RBDP | Belo Horizonte, ano 14, n. 54, p. 51-70, jul./set. 2016 Contribuições para o novo marco regulatório dos drones – Entre nobres objetivos e inadequados procedimentos Rafael Carvalho Rezende Oliveira Pós-doutor pela Fordham University School of Law (New York). Doutor em Direito pela UVA/ RJ. Mestre em Teoria do Estado e Direito Constitucional pela PUC/RJ. Especialista em Di- reito do Estado pela UERJ. Membro do Instituto de Direito Administrativo do Estado do Rio de Janeiro (IDAERJ). Professor de Direito Administrativo do IBMEC, da EMERJ e do CURSO FORUM. Professor dos cursos de Pós-Graduação da FGV e Cândido Mendes. Advogado, árbi- tro e consultor jurídico. Caio Cesar Figueiroa Especialista em Direito Administrativo pela FGV Direito SP (GV Law). Professor assistente de Direito Econômico da Universidade Ibirapuera (UNIB). Advogado em Direito Público. Resumo: O trabalho tem por objetivo apresentar toda a arquitetura regulatória vigente pela qual os Sis- temas de Aeronaves Não Tripuladas (Unmanned Aircraft Systems – UAS), popularmente conhecido como drones, estão submetidos. A insegurança jurídica decorrente do vácuo regulatório sobre o uso destes equi- pamentos com fins lucrativos tem inviabilizado o desenvolvimento de um amplo mercado, além de resfriar os entusiastas em aprimorar esta tecnologia no território nacional. O pluralismo de entes reguladores en- volvidos, muitas vezes abordando o mesmo objeto, também contribui para este cenário. Assim o presente artigo se concentrará na proposta de regulação da Agência Nacional de Aviação Civil para o uso de tais equipamentos com finalidade na exploração de atividade econômica, seja de modo direto ou intermediário. Palavras-chave: Regulação. Sistemas de Aeronaves Remotamente Pilotadas. Drones. Remotely Piloted Aircraft Systems (RPAS). Disrupção. Sumário: 1 Introdução – 2 Aspectos regulatórios para Sistemas de Aeronaves Remotamente Pilotadas (RPAS) – 3 Lacunas regulatórias e insegurança jurídica – 4 Contribuições para disposições regulatórias futuras – 5 Considerações finais – Referências 1 Introdução Acredita-se que a humanidade está atravessando um período de transição, o na- tural devir decorrente da luta pela sobrevivência, ou, como preferem os economistas, o aperfeiçoamento da administração dos recursos escassos, de modo a maximizar a satisfação das necessidades, minimizando os custos decorrentes deste processo. Este foi justamente o tema debatido na última edição do Fórum Econômico Mundial, MIOLO_RBDP_54.indd 51 14/10/2016 09:15:57
  • 2. 52 R. bras. de Dir. Público – RBDP | Belo Horizonte, ano 14, n. 54, p. 51-70, jul./set. 2016 RAFAEL CARVALHO REZENDE OLIVEIRA, CAIO CESAR FIGUEIROA que ocorreu em janeiro, na cidade de Davos, na Suíça. O evento, que ocorre anual- mente desde 1971, reuniu os principais líderes empresariais e políticos para discu- tir as questões mais urgentes enfrentadas mundialmente. Segundo Klaus Schwab, presidente e fundador do organismo, é possível inferir, a partir das mais recentes transformações nas relações de produção, que o mundo está passando pela sua quarta revolução industrial.1 É inegável que o tema das inovações tecnológicas está cada vez mais em pau- ta, principalmente em decorrência dos impactos que essas criações têm propiciado nos mais diversos ambientes. Em certas ocasiões, o grau de inovação proporciona mudanças tão radicais que afetam toda a estrutura do modelo atingido, de modo a quebrar sua linha de condução anterior. Trata-se da disrupção tecnológica, que, sob o prisma econômico, pressiona o movimento de competição a ponto de destronar empresas antes consolidadas, assim como gera preocupações para o direito, que se vê sempre na ânsia de regular o uso de novas tecnologias. E há razões para que o direito se preocupe com este gap. O fenômeno da disrup- ção era encarado como um efeito secundário da inovação, um processo eventualmen- te voluntário e mais demorado, concedendo um significativo período de tempo para que os agentes reguladores pudessem se adequar com a sua gradual implementação antes de delimitar o uso dos produtos decorrentes da evolução.2 Atualmente, a dis- rupção tem sido um processo abrupto, tornando-se um fim em si mesmo.3 Vale, por essa razão, um alerta: o desenvolvimento intencional e constante de tecnologias dis- ruptivas sem ponderar outros elementos e valores que não só a eficiência poderá ser problemático. A grande questão se restringe à previsibilidade e controle dos riscos decorrentes deste fenômeno. Neste sentido, este artigo pretende trabalhar com alguns possíveis problemas decorrentes do uso exponencial de tecnologias disruptivas, mais precisamente a ex- ploração de atividade econômica com o uso auxiliar de drones, formalmente conheci- dos por Sistemas de Aeronaves Não Tripuladas (Unmanned Aircraft Systems – UAS).4 1 Klaus Schwab sintetiza as quatro revoluções nos seguintes termos: “The First Industrial Revolution used water and steam power to mechanize production. The Second used electric power to create mass production. The Third used electronics and information technology to automate production. Now a Fourth Industrial Revolution is building on the Third, the digital revolution that has been occurring since the middle of the last century. It is characterized by a fusion of technologies that is blurring the lines between the physical, digital, and biological spheres” (SCHWAB, Klaus. The Fourth Industrial Revolution: What It Means and How to Respond. Foreign Affairs, Dez. 2015. Disponível em: <https://www.foreignaffairs.com/articles/2015-12-12/fourth-industrial- revolution>. Acesso em: 11 jun. 2016. 2 Fala-se hoje em transformações cada vez mais precoces, em ritmo de progressão geométrica, afetando sen- sivelmente a capacidade do direito em se adequar a mudanças tão bruscas de um novo padrão sem ter tempo suficiente de aperfeiçoar o modelo revogado. Involuntariamente, aqueles que não se adaptarem estarão fora do jogo ou à mercê dos ditames da evolução tecnológica. Nesse sentido, FARIA, José Eduardo. Direito e con- juntura. 2. ed. São Paulo: Saraiva, 2010. 3 Cf. KATYAL, Neal. Disruptive Technologies and the Law. The Georgetown Law Jornal, v. 102, 2014. 4 De acordo com o prefácio da Instrução do Comando da Aeronáutica (ICA) nº 100-40/2015, aprovada pela Portaria DECEA nº 415/DGCEA, de 09.11.2015, e considerada a principal norma nacional regulamentando o MIOLO_RBDP_54.indd 52 14/10/2016 09:15:57
  • 3. 53R. bras. de Dir. Público – RBDP | Belo Horizonte, ano 14, n. 54, p. 51-70, jul./set. 2016 CONTRIBUIÇÕES PARA O NOVO MARCO REGULATÓRIO DOS DRONES – ENTRE NOBRES OBJETIVOS... A aplicação destes dispositivos pela iniciativa privada apresenta uma série de vanta- gens no aspecto econômico, reduzindo significativamente os altos custos decorren- tes de manutenção e operação de aeronaves tripuladas e as despesas decorrentes da contratação de equipe de tripulação, por exemplo.5 Para se ter uma ideia da sua abrangência de uso, André Castro Carvalho con- seguiu enumerar uma ampla gama de aplicações, tais como logística – que envolve principalmente o transporte de bens; atividade jornalística; publicidade e marketing; agropecuária; construção civil e pesada; extração de recursos naturais; mapeamento de uso do solo urbano e rural; atividades de resgate e socorro médico; inspeções em infraestruturas, como linhas férreas, rodovias, dutos, represas, antenas ou linhas de transmissão; cinema, fotografia e teledramaturgia; radares, GPS, microfones ópticos a laser e outros tipos de sensores; courier, como entrega de encomendas e alimen- tos; dentre outros casos que certamente serão ainda desenvolvidos pela criatividade dos empreendedores.6 O uso indiscriminado de UAS é matéria que ainda tem suscitado debates entre agentes reguladores internacionais com o intuito de compreender os verdadeiros ris- cos advindos desta tecnologia. No Brasil, o estado da arte é de incompletude, que embora já tenha delimitado os contornos mínimos para o uso experimental em ativi- dades científicas, o seu emprego para exploração de atividade econômica encontra-se em estágio embrionário. Apesar do recente corpo de normas infralegais que tentaram viabilizar um mar- co provisório àqueles que anseiam pelo uso das aeronaves com intuito comercial, até que seja possível entender todas as nuances de sua operação, é necessário, desde já, apontar algumas das circunstâncias que ensejam “entraves” – como a acesso do espaço aéreo por “Sistemas de Aeronaves Remotamente Pilotadas”, drones, no Brasil, a aludida nomenclatura foi adotada em substituição ao termo Veículos Aéreos Não Tripulados (VANT), hodiernamente tido por obsoleto segundo a comunidade aeronáutica internacional, uma vez que o uso de tais equipamentos não depende exclusivamente da aeronave, mas de todo um aparato integrado, inclusive em solo, de modo que todo o sistema necessita ser considerado (BOANOVA FILHO, José Luiz. Aeronaves não tripuláveis no Brasil e sua regulação. Revista Brasileira de Direito Aeronáutico e Espacial – RBDAE, n. 96, p. 49-51, dez. 2014). Desse gênero, desdobram-se duas categorias, os Remotely Piloted Aircraft Systems (RPAS), compreendendo as aeronaves que dependam de comandos remotos para sua plena operação, e as aeronaves totalmente autônomas que, uma vez programadas, não sofrem qualquer tipo de interferência durante a execução da operação. Em boa parte do mundo as aeronaves autônomas são proibidas, inclusive no Brasil, conforme enunciado pelo próprio DECEA, que ao tecer comentários sobre as premissas básicas da regulamentação sobredita, afirma que “as aeronaves totalmente autônomas não serão objeto de regulamentação e seu voo não está autorizado”. 5 Segundo Robert A. Heverly, esta tendência da instrumentalização da atividade econômica pelo uso destas aeronaves atinge os mais diversos nichos de mercado, “Companies such as Amazon, Facebook, Google and others are investing in drone development for a variety of tasks, including delivery of retail goods to consumers, creation of sky-based computer networks, and even crop dusting in the agricultural community” (HEVERLY, Robert A. The State of Drones: State authority to regulate drones. Albany Government Law Review, 8, 29, 2015). 6 CARVALHO, André Castro. Drones já são uma preocupação jurídica. Huffpost Brasil, 24 abr. 2014. Disponível em: <http://www.brasilpost.com.br/andre-castro-carvalho/drones-ja-sao-uma-preocupacao-juridica_b_5199971. html>. Acesso em: 04 jul. 2016. MIOLO_RBDP_54.indd 53 14/10/2016 09:15:57
  • 4. 54 R. bras. de Dir. Público – RBDP | Belo Horizonte, ano 14, n. 54, p. 51-70, jul./set. 2016 RAFAEL CARVALHO REZENDE OLIVEIRA, CAIO CESAR FIGUEIROA própria iniciativa privada costuma denominar7 – para o escorreito desenvolvimento da atividade, se mantidas no âmbito do marco regulatório definitivo, prometido pela ANAC desde 2014. Antes de alcançar estas circunstâncias, todavia, serão discutidas as razões que levaram o Poder Público a se preocupar com a regulação do uso de tais equi- pamentos, considerando perspectivas relacionadas com oportunidades econômicas, condições de mercado, segurança, privacidade e desenvolvimento tecnológico. Por conseguinte, será imprescindível apresentar os conceitos e limites legais já traçados, para então voltar a tocar nas exigências atuais que merecem ser consideradas para uma proposta definitiva de regulação. 2  Aspectos regulatórios para Sistemas de Aeronaves Remotamente Pilotadas (RPAS) 2.1  Por que regular? O gap entre o direito e as novas tecnologias não é nenhuma novidade. É natural que os fatos se sobressaiam. Diante do desejo de agir estatal através da ampla gama de instrumentos de regulação, surge a seguinte questão: há necessidade para se regular a atividade dos RPAS? Ou de forma mais precisa, em que medida são cabíveis ações para regular a relação entre os RPAS e a sua iminente integração com o espaço aéreo? Antes de partir para a resposta de tais indagações, é preciso relembrar dos fun- damentos de validade para a regulação estatal em face do desempenho de atividades econômicas em sentido estrito, incluindo as inovações.8 Um dos pilares do Estado brasileiro é justamente a livre iniciativa (art. 1º, inciso IV da Constituição), o que significa que é livre o exercício e o desempenho da atividade econômica (art. 170, ca- put), observadas as ponderações impostas por força do princípio da Legalidade (art. 5º, inciso II c/c art. 170, parágrafo único). Tais ponderações exsurgem a partir das necessidades cotidianas para o equilíbrio das garantias e direitos dos indivíduos que almejam viver em sociedade, e se concretizam por meio de condicionamentos criados pelo Estado, limitando o desempenho de algumas atividades, mas sem perder de 7 Conforme noticiado pelo Jornal da Globo, a iniciativa privada tem pressionado o Poder Público a expedir uma regulamentação do exercício da atividade para fins comerciais desde 2013. Disponível em: <http://g1.globo. com/sp/vale-do-paraiba-regiao/noticia/2013/04/em-reuniao-industria-pede-anac-regulacao-de-drone-com- urgencia.html>. Acesso em: 04 jul. 2016. 8 Em um dos mais recentes artigos sobre Direito Regulatório, Egon Bockmann Moreira aborda a evolução e o tratamento da regulação econômica pelo ordenamento brasileiro, levantando pertinentes indagações quanto ao futuro dos mecanismos de intervenção indireta do Estado (MOREIRA, Egon Bockmann. Qual é o futuro da regulação no Brasil? In: SUNDFELD, Carlos Ari; ROSILHO, André (Coord.). Direito da Regulação e Políticas Públicas. São Paulo: Malheiros, 2014. p. 108-139). MIOLO_RBDP_54.indd 54 14/10/2016 09:15:58
  • 5. 55R. bras. de Dir. Público – RBDP | Belo Horizonte, ano 14, n. 54, p. 51-70, jul./set. 2016 CONTRIBUIÇÕES PARA O NOVO MARCO REGULATÓRIO DOS DRONES – ENTRE NOBRES OBJETIVOS... vista aquelas mesmas necessidades (decorrentes de eventuais conflitos de direitos) que lhe deram azo. É a partir dessa noção, de liberdade sendo a regra e a intervenção (condicio- namento) a exceção, que se perquire sobre as razões de intervenção estatal nos espaços da iniciativa privada, pois vige em nosso ordenamento a regra da mínima in- tervenção.9 No caso dos RPAS, é interessante acrescentar a ideia de que a inovação propiciada, em verdade, se dá pelo seu uso na esfera civil, deixando de ser uma ex- clusividade do Estado,10 para se tornar uma ferramenta de uso privado, em movimen- to inverso do que geralmente ocorre no campo dos serviços públicos (publicatio).11 Não é necessário dispender muitos minutos de reflexão para se apontar as preocupações mais latentes pelo uso inadequado de RPAS pela sociedade civil, sen- do o aspecto da segurança indubitavelmente o mais relevante. Nesse ponto, pesa a dificuldade dos agentes reguladores locais em construir um arcabouço normativo que permita o uso controlado de RPAS, resguardando a segurança de terceiros, sem obs- tar, por outro lado, o aprimoramento da tecnologia e a expansão da utilidade destas ferramentas pela iniciativa privada.12 Apesar dessa dificuldade, o principal organismo internacional de aviação civil – International Civil Aviation Organization (ICAO) – tomou postura mais proativa em detrimento dos agentes reguladores nacionais, tendo lança- do em 2015 o RPAS Manual, visando à integração do espaço aéreo, de modo que os RPAS possam operar concomitantemente com as aeronaves tripuladas.13 É, portanto, a segurança operacional o principal elemento considerado nos as- pectos da regulação, de forma a minimizar os riscos no compartilhamento do espaço aéreo com aeronaves tripuladas como também para segurança de pessoas e bens no solo.14 Outro aspecto posto em questionamento abrange a relação de privacidade. 9 Carlos Ari Sundfeld destaca que “Todo condicionamento é constrangimento sobre a liberdade. Esta, sendo valor protegido pelo Direito, só pode ser comprimida quando inevitável para a realização de interesses pú- blicos. Daí a enunciação do princípio da mínima intervenção estatal na vida privada. Por força dele, todo constrangimento imposto aos indivíduos pelo Estado deve justificar-se pela necessidade de realização do interesse público. O legislador não pode cultivar o prazer do poder pelo poder, isto é, constranger os indivíduos sem que tal constrangimento seja teleologicamente orientado” (SUNDFELD, Carlos Ari. Direito Administrativo Ordenador. São Paulo: Malheiros, 2003. p. 68). Em sentido análogo, vide SCHIRATO, Vitor Rhein. Livre inicia- tiva nos serviços públicos. Belo Horizonte: Fórum, 2012. p. 310-311). 10 Os drones foram inicialmente utilizados para fins bélicos, desenvolvidos para o atendimento de diversas fun- ções no campo militar, tais como: informação de movimentação de tropas inimigas, apoio em locais de difícil acesso, espionagem e inclusive o combate. VILLAMIZAR, Fernando. Drones, ¿Hacia una guerra sin regulación jurídica internacional? Revista de Relaciones Internacionales, Estrategia y Seguridad, 10(2), p. 89-109, 2015. 11 Cf. ARAGÃO, Alexandre Santos de. Direito dos Serviços Públicos. 3. ed. Rio de Janeiro: Forense, 2013. 12 Cf. HAVEL, Brian F.; MULLIGAN, John Q. Unmanned Aircraft Systems: a challenge to global regulators. 65 DePaul Law Review, 107, Fall, 2015. 13 Material disponível em: <http://www.wyvernltd.com/wp-content/uploads/2015/05/ICAO-10019-RPAS.pdf>. Acesso em: 26 maio 2016. Sobre os estudos mais recentes dos riscos advindos na introdução de UAS no es- paço aéreo não segregado, vide BROOKER, Peter. Introducing Unmanned Aircraft Systems into a High Reliability ATC System. Journal of Navigation, London, Cambridge Journals Online, v. 66, n. 5, p. 719-735; RODRIGUES, Elder Soares. Aspectos Regulatórios da Operação de Veículo Aéreo Não Tripulado. In: CONGRESSO RIO DE TRANSPORTES, 13., jun. 2015. 14 Em 2013, por exemplo, durante um dos eventos mais tradicionais de Virgínia, foi noticiada a queda de um drone sobre a arquibancada durante as gravações da “Great Bull Run”. Disponível em: <https://www. MIOLO_RBDP_54.indd 55 14/10/2016 09:15:58
  • 6. 56 R. bras. de Dir. Público – RBDP | Belo Horizonte, ano 14, n. 54, p. 51-70, jul./set. 2016 RAFAEL CARVALHO REZENDE OLIVEIRA, CAIO CESAR FIGUEIROA John Horgan aponta as tendências de evolução dos drones para objetos cada vez menores, possibilitando o uso para fins de vigilância, por exemplo.15 Enquanto que no campo da segurança, o controle estatal se torna mais factível pelo condicionamento das operações por meio de autorizações, o risco da vigilância clandestina é uma barreira mais complexa, ainda que se imponham exigências de identificação destas aeronaves.16 O desvirtuamento do uso dos RPAS, todavia, não pode ser impedimento para que o Estado abdique do seu papel regulador, de modo a rechaçar as externalidades apontadas, assim como também não pode provocar asfixias regulatórias no desem- penho da atividade econômica.17 É desse movimento pendular entre maior e menor intervenção que se travam as propostas de regulação, cuja mora na resposta destes problemas à sociedade acaba afetando, consequentemente, o desenvolvimento tec- nológico nacional, ou agravando as preocupações do seu uso sem o devido contro- le. Em seguida, serão expostas as respostas normativas dadas pelo ordenamento brasileiro. 2.2  Legislação vigente Antes de aprofundar o estudo das normas que integram o quadro de regulação preliminar dos RPAS, deve ser apresentada uma ressalva inicial: a imposição de condicionamentos para a operação destes equipamentos não se confunde com as li- mitações impostas para o uso do espaço aéreo, sendo este último considerado como bem público da União.18 Contudo, como o tema da inovação implica significativos washingtonpost.com/local/drone-crashes-into-virginia-bull-run-crowd/2013/08/26/424e0b9e-0e00-11e3- 85b6-d27422650fd5_story.html>. Acesso em: 05 jul. 2016. 15 HORGAN, John. Why drones should make you afraid very afraid. Scientific American, feb. 2013. Disponível em: <http://blogs.scientificamerican.com/cross-check/why-drones-should-make-you-afraid-very-afraid/>. Acesso em: 03 jun. 2016. O MIT e Harvard têm desenvolvido alguns projetos de microaeronaves, reproduzindo em escala de insetos, como o RoboBee. Disponível em: <http://bgr.com/2016/05/20/harvard-mit-robobee-perching/>. Acesso em: 28 jun. 2016. 16 SLOBOGIN, Christopher. Panvasive Surveillance, Political Process Theory, and the Nondelegation Doctrine. The Georgetown Law Jornal, v. 102, p. 1721-1776, 2014; MCNEAL, Gregory S. Drones and Aerial Surveillance: Considerations for Legislators. Brookings Institution: The Robots Are Coming: The Project on Civilian Robotics, Nov. 2014. 17 Em comentários já apresentados em obra própria, há que se considerar que dessa busca incessante pelo equilíbrio na regulação estatal, há que se considerar os problemas decorrentes dos extremos, isto é, enquanto que na regulação de menos intensidade desconsidera-se a preocupação com a distribuição de riquezas, fa- vorecendo a ampliação das desigualdades, o exagero contribui para a ineficiência da economia, e da própria máquina estatal (OLIVEIRA, Rafael Carvalho Rezende. Novo perfil da regulação estatal: Administração Pública de resultados e análise de impacto regulatório. Rio de Janeiro: Forense, 2015. p. 139). 18 O espaço aéreo é a área acima do território, terrestre ou hídrico, nacional. Floriano de Azevedo Marques Neto sustenta que o espaço aéreo nacional é bem público de uso especial pertencente ao domínio da União. MARQUES NETO, Floriano de Azevedo. Bens públicos: função social e exploração econômica: o regime jurídico das utilidades públicas. Belo Horizonte: Fórum, 2009. p. 145-146. De outro lado, Diogo de Figueiredo Moreira Neto afirma que o espaço aéreo é bem público de uso comum. MOREIRA NETO, Diogo de Figueiredo. Curso de direito administrativo. 16. ed. Rio de Janeiro: Forense, 2014. p. 403-404. Independentemente da natureza MIOLO_RBDP_54.indd 56 14/10/2016 09:15:58
  • 7. 57R. bras. de Dir. Público – RBDP | Belo Horizonte, ano 14, n. 54, p. 51-70, jul./set. 2016 CONTRIBUIÇÕES PARA O NOVO MARCO REGULATÓRIO DOS DRONES – ENTRE NOBRES OBJETIVOS... impactos que deverão ser considerados para evitar a segregação aeroespacial entre aeronaves tripuladas e não tripuladas, o assunto teve que ser revisitado. Sabe-se que a Constituição Federal conferiu competência à União para explorar, diretamente ou mediante autorização, concessão ou permissão, a navegação aérea (art. 21, inciso XII, alínea “c”), previsão regulamentada pela Lei nº 7.565/86 (Código Brasileiro de Aeronáutica – CBA), que, embora anterior à Constituição de 1988, foi por ela recepcionada. O CBA, por sua vez, sofreu significativas alterações sobre a divisão de competências, que, inicialmente, concentravam-se nas mãos do Ministério da Aeronáutica,19 mas que, com a promulgação da Lei nº 11.182/2005, algumas destas foram repartidas com a Agência Nacional de Aviação Civil (ANAC). Preservou-se, contudo, a competência do controle de acesso ao espaço aéreo, que atualmente é exercida pelo Departamento de Controle do Espaço Aéreo (DECEA), vinculado ao Comando da Aeronáutica. A estrutura do DECEA é composta por órgãos regionais, com o intuito de facilitar a navegação aérea, de modo seguro e eficiente, nas áreas de suas respectivas jurisdições, compostas pelo total de cinco blocos delineados sobre o território nacional.20 Para fins de tráfego aéreo, os RPAS são equiparados a aeronaves tripuladas, estando o seu acesso ao espaço aéreo sujeito às normas do DECEA e às respectivas autorizações de seus órgãos regionais, no teor do que dispõe o art. 20 do Código Brasileiro de Aeronáutica.21 Dessa maneira, não sendo o RPAS de uso recreativo, o seu acesso ao espaço aéreo dependerá de prévia autorização especial fornecida pelo órgão regional competente do DECEA, cujo procedimento de requerimento foi minuciosamente descrito pela recente ICA nº 100-40/2015.22 jurídica do espaço aéreo, a União possui competência privativa para legislar sobre a utilização do espaço aéreo, especialmente as condições para a navegação aérea e aeroespacial (arts. 22, X, e 48, V, da CRFB), bem como para explorar, diretamente ou mediante autorização, concessão ou permissão a navegação aérea, aeroespacial e a infraestrutura aeroportuária (art. 21, XII, “c”, da CRFB). A concessão de uso do espaço aéreo encontra-se prevista no art. 8º do Decreto-Lei nº 271/1967. Sobre o tema, vide: OLIVEIRA, Rafael Carvalho Rezende. Curso de Direito Administrativo. 4. ed. São Paulo: Método, 2016. p. 647. 19 Hoje, Comando da Aeronáutica, nos termos do art. 19 da Lei Complementar nº 97/1999. 20 Os órgãos regionais que compõem o DECEA são os Centros Integrados de Defesa Aérea e Controle de Tráfego Aéreo (CINDACTA) I, II, III e IV e o Serviço Regional de Proteção ao Voo de São Paulo (SRPV-SP), cada qual com sua jurisdição definida. Desta forma, para solicitar a autorização de uso do espaço aéreo, será preciso observar a localidade em que se pretende operar. As exatas dimensões das zonas de competência podem ser conferidas nos termos do ICA nº 100-40/2015. 21 Art. 20. Salvo permissão especial, nenhuma aeronave poderá voar no espaço aéreo brasileiro, aterrissar no território subjacente ou dele decolar, a não ser que tenha: I – marcas de nacionalidade e matrícula, e esteja munida dos respectivos certificados de matrícula e aeronavegabilidade (artigos 109 a 114); II – equipamentos de navegação, de comunicações e de salvamento, instrumentos, cartas e manuais necessários à segurança do vôo, pouso e decolagem; III – tripulação habilitada, licenciada e portadora dos respectivos certificados, do Diário de Bordo (artigo 84, parágrafo único) da lista de passageiros, manifesto de carga ou relação de mala postal que, eventualmente, transportar. 22 Conforme destacado anteriormente, o ICA 100-40 foi aprovado pela Portaria nº 415 do Departamento de Controle do Espaço Aéreo (DECEA), de 09.11.2015, com o intuito de regulamentar os procedimentos e responsabilidades necessários para o acesso seguro ao espaço aéreo nacional por Sistemas de Aeronaves Remotamente Pilotadas (RPAS). Antes de sua vigência, vigorava desde 2010 a AIC nº 21/2010, que tratava MIOLO_RBDP_54.indd 57 14/10/2016 09:15:58
  • 8. 58 R. bras. de Dir. Público – RBDP | Belo Horizonte, ano 14, n. 54, p. 51-70, jul./set. 2016 RAFAEL CARVALHO REZENDE OLIVEIRA, CAIO CESAR FIGUEIROA Voltando às preocupações destinadas à operação de RPAS, dentre as normas vigentes, deve-se distinguir a finalidade do uso de tais equipamentos, lembrando que este artigo focará nos casos destinados à exploração de atividade econômica. É im- portante, contudo, desde já, fazer a ressalva de que o uso com propósitos recreativos de tais aeronaves teve tratamento equiparado à prática de aeromodelismo, disciplina- do conforme a Portaria DAC nº 207/STE/1999, do antigo Departamento de Aviação Civil (vinculado, à época, ao Ministério da Aeronáutica),23 na qual os equipamentos devem respeitar a restrição de não operar nas zonas de aproximação e decolagem de aeródromos e nunca ultrapassar altura superior a 400 pés (aproximadamente 120 metros) mantendo-se o equipamento sempre ao alcance da visão do piloto. Para fins de pesquisa e desenvolvimento, o Código Brasileiro de Aeronáutica pre- viu no seu art. 119 que tais voos estariam sujeitos à emissão prévia de Certificados de Autorização de Voo Experimental (CAVE).24 Para atender a esta exigência, no cam- po dos RPAS com a finalidade científica, de pesquisa e desenvolvimento bem como para o treinamento de pilotos, vigora a Instrução Suplementar nº 21-001 de 2012 da Agência Nacional de Aviação Civil (ANAC), que detalha o procedimento e os requisitos necessários para a obtenção do CAVE. Conforme já mencionado, diferentemente da regulamentação para o uso recreativo (aeromodelismo), esta autorização da ANAC não exclui a competência de outros agentes reguladores, como o DECEA, por exem- plo, em que pese as autorizações serem de finalidades distintas.25 Em que pese as diversas propostas apresentadas pela ANAC para a regulação do uso de RPAS com fins comerciais, a lacuna regulatória ainda persiste, assim como em outros países.26 Resta ponderar os principais traços vertidos nas propostas apre- sentadas pela Agência Reguladora, conforme se verá no próximo subitem. da concessão de autorizações para RPAS, mas que, se comparada à atual regulamentação, condicionava o uso dos equipamentos a requisitos mais genéricos. 23 Cabe ressaltar que o DAC foi extinto em 2006, sendo suas atividades e responsabilidades absorvidas pela ANAC. 24 Art. 119. As aeronaves em processo de homologação, as destinadas à pesquisa e desenvolvimento para fins de homologação e as produzidas por amadores estão sujeitas à emissão de certificados de autorização de voo experimental e de marca experimental (artigos 17, Parágrafo único, e 67, §1º). 25 Acerca das distinções entre autorizações operacionais, como as concedidas pela ANAC para a operação dos RPAS e autorizações por operação, como a que o DECEA outorga para o acesso e uso do espaço aéreo, o elemento principal a ser considerado é a natureza do vínculo entre o Poder Público e o autorizatário, sendo no primeiro caso instrumentos mais estáveis, orientando a atividade em conformidade com estratégias setoriais, ao passo que a última se esgota a partir da realização da operação episódica que a fundamentou (ARAGÃO, Alexandre Santos de. Direito dos Serviços Públicos. 3. ed. Rio de Janeiro: Forense, 2013. p. 204). 26 Os Estados Unidos tiveram que enfrentar forte resistência popular ante a intenção de regulamentação do uso civil de drones, pois o seu uso sempre foi associado com finalidades bélicas (HEVERLY, Robert A. The State of Drones: State authority to regulate drones. Albany Government Law Review, 8, 29, 2015). Apesar disso, no dia 21 de junho de 2016 foi publicada a primeira regulamentação oficial pela Federal Aviation Administration (FAA), órgão responsável pela regulação do espaço aéreo, das aeronaves e a respectiva infraestrutura, visando ao uso destes equipamentos para exploração econômica. Disponível em: <http://www1.folha.uol.com.br/ mercado/2016/06/1784244-governo-americano-divulga-regras-para-uso-de-drones-comerciais.shtml>. Acesso em: 22 jun. 2016. MIOLO_RBDP_54.indd 58 14/10/2016 09:15:58
  • 9. 59R. bras. de Dir. Público – RBDP | Belo Horizonte, ano 14, n. 54, p. 51-70, jul./set. 2016 CONTRIBUIÇÕES PARA O NOVO MARCO REGULATÓRIO DOS DRONES – ENTRE NOBRES OBJETIVOS... 2.3  Proposta regulatória (ainda) em discussão A ANAC divulgou pela primeira vez a sua intenção de regulação de RPAS na esfe- ra civil em 2011, expedindo, primeiramente, a Instrução Suplementar nº 21, voltada especificamente para o seu emprego em pesquisas científicas. Excepcionalmente, e por pressão da iniciativa privada, a Agência concedeu algumas autorizações para a utilização de drones com finalidades adversas, como para ajudar no combate contra a dengue,27 e até mesmo para execução de eventos culturais, como o Carnaval do Rio de Janeiro,28 todas expedidas com base no art. 20 do CBA combinado com a Lei nº 11.182/05.29 No início de 2014, foi apresentada a primeira proposta de regulação do uso de RPAS para exploração de atividade econômica,30 e mesmo após ampla gama de sugestões o projeto não movimentou. Até que, em setembro de 2015, a Agência comunicou a intenção de retomar o projeto, apresentando concomitantemente a abertura de datas para realização de consulta e audiência pública. Não obstante a concretização destas etapas, até o presente momento, nada foi apresentado perante a sociedade civil, sendo que os pedidos de autorização estão sendo analisados ca- suisticamente pela área técnica da Agência, com ulterior apreciação do pedido pela Diretoria Colegiada.31 27 Disponível em: <http://g1.globo.com/sc/santa-catarina/noticia/2015/05/anac-libera-drone-com-camera-para- combate-dengue-em-chapeco-sc.html>. Acesso em: 05 jul. 2016. 28 Disponível em: <http://g1.globo.com/rio-de-janeiro/carnaval/2016/noticia/2016/02/anac-notifica-beija-flor- por-uso-de-drone-durante-desfile-no-rio.html>. Acesso em: 05 jul. 2016. 29 Tratando da possibilidade de requerimento da autorização “inominada” para uso de drones sem fins lucrativos, José Luiz Boa Nova Filho pondera que “mesmo não estando regulada a operação para fins não experimentais, pode-se requerer à ANAC uma autorização para esse tipo de operação. [...] Tal procedimento encontra respaldo na Lei nº 7.565, de 19 de dezembro de 1986, o Código Brasileiro de Aeronáutica, que estabelece: [...]” (BOANOVA FILHO, José Luiz. Aeronaves não tripuláveis no Brasil e sua regulação. Revista Brasileira de Direito Aeronáutico e Espacial – RBDAE, n. 96, dez. 2014, p. 49-51). Ademais, sobre o rol de competências da ANAC, dispõe o art. 8º da Lei nº 11.182/05: “Art. 8º Cabe à ANAC adotar as medidas necessárias para o atendimento do interesse público e para o desenvolvimento e fomento da aviação civil, da infra-estrutura aeronáutica e aeroportuária do País, atuando com independência, legalidade, impessoalidade e publicidade, competindo-lhe: [...] XVII – proceder à homologação e emitir certificados, atestados, aprovações e autorizações, relativos às atividades de competência do sistema de segurança de voo da aviação civil, bem como licenças de tripulantes e certificados de habilitação técnica e de capacidade física e mental, observados os padrões e normas por ela estabelecidos;” 30 A proposta foi apresentada durante o 2º Workshop sobre RPAS, organizado pela ANAC e realizado em fevereiro de 2014, em São José dos Campos-SP. 31 De acordo com a coluna de Celso Ming, em O Estado de S.Paulo, “a diretoria da ANAC permaneceu incompleta por quase um ano e esse foi um dos fatores que certamente atrasaram o processo. Para a tomada de decisões que impactam a sociedade são necessários pelo menos três diretores, sendo que por quase todo o ano de 2015, a Agência passou com apenas dois. Desde o início de abril, no entanto, a diretoria está completa e a expectativa é a de que a regulamentação saia logo” (MING, Celso. Não são aviões de carreira. O Estado de S.Paulo, 1º maio 2016. Disponível em: <http://economia.estadao.com.br/noticias/geral,nao-sao-avioes- de-carreira,10000048310>. Acesso em: 05 jul. 2016). Além disso, segundo consta do sítio eletrônico da ANAC, o processo de deliberação da proposta apresentada e submetida à consulta pública, autuado sob o nº 00066.020773/2014-51, teria como previsão de conclusão o mês de junho de 2016 (http://www.anac.gov.br/ participacao-social/agenda-regulatoria/temas-2015-2016/tema-24-spo-regulamentacao-acerca-da-certificacao- e-vigilancia-continuada-de-operadores-de-veiculo-aereo-nao-tripulado-vant). MIOLO_RBDP_54.indd 59 14/10/2016 09:15:58
  • 10. 60 R. bras. de Dir. Público – RBDP | Belo Horizonte, ano 14, n. 54, p. 51-70, jul./set. 2016 RAFAEL CARVALHO REZENDE OLIVEIRA, CAIO CESAR FIGUEIROA O conteúdo das propostas até o momento apresentadas pela ANAC revela, em grande parte, a preocupação com as questões de segurança, de forma a delimitar a distância mínima entre os RPAS de pessoas que não tenham declarado ciência da presença do equipamento. A regulação também se mostrou mais intensa – leia-se exigente – quanto mais pesada for a aeronave.32 Esta metodologia teve por embasa- mento a regulamentação francesa, cujas preocupações de segurança variam entre o peso do equipamento e a distância de voo.33 Do material até o momento divulgado pela ANAC, nada foi mencionado em re- lação ao procedimento para a obtenção da autorização da operação de RPAS. A dis- cricionariedade na concessão de autorizações neste nicho é inadequada com os fins que se espera alcançar com um marco regulatório bem definido, qual seja, a atração de investimentos e o desenvolvimento da economia interna, sendo imprescindível, todavia, um nível mínimo de segurança jurídica, considerando os elevados aportes necessários que os setores de pesquisa e desenvolvimento acabam demandando. Ante este vácuo regulatório, e até que venha a ser propriamente apresentado um modelo definitivo, é preciso rechaçar algumas das circunstâncias que causam in- segurança àqueles que pretendem se arriscar neste mercado, que além da ausência de um procedimento administrativo bem definido para a concessão da autorização de operação com fins lucrativos, falta a garantia do diálogo institucional entre os entes reguladores, de modo a evitar normas conflitantes ou políticas regulatórias com alto custo de implementação, com definições de competências claras, como também rever algumas exigências que foram além do que seria necessário para atender as necessidades que justificariam a intervenção estatal neste domínio. São os temas que serão abordados no próximo capítulo. 32 Segundo a classificação proposta pela Agência, conforme a apresentação disponível no sítio eletrônico da própria ANAC (http://www.anac.gov.br/assuntos/paginas-tematicas/drones), na Classe 1 estão os drones com peso maior que 150 quilos, na Classe 2 os com 25 até 150 quilos e, na Classe 3, os de peso menor ou igual a 25 quilos. Para os equipamentos das Classes 1 e 2, será exigido que os pilotos sejam maiores de 18 anos, tenham licença e habilitação para pilotar e apresentem o registro de todos os voos. Também será preciso ter certificado médico aeronáutico. Os equipamentos da Classe 3 não exigirão o registro dos voos, nem o certificado médico aeronáutico, mas sim que o operador seja maior de 18 anos. A licença e a habilitação só serão obrigatórias para quem pretende operar acima de 400 pés (120 metros), em conformidade com as normas preexistentes sobre o uso de RPAS recreativos. 33 Para mais detalhes sobre a solução adotada pioneiramente pela França, em relação ao uso de RPAS com fins comerciais, consultar: <http://www.developpement-durable.gouv.fr/IMG/pdf/tableau-synthese-aeronefs- telepilotes.pdf>. Acesso em: 28 jun. 2016. MIOLO_RBDP_54.indd 60 14/10/2016 09:15:58
  • 11. 61R. bras. de Dir. Público – RBDP | Belo Horizonte, ano 14, n. 54, p. 51-70, jul./set. 2016 CONTRIBUIÇÕES PARA O NOVO MARCO REGULATÓRIO DOS DRONES – ENTRE NOBRES OBJETIVOS... 3  Lacunas regulatórias e insegurança jurídica 3.1  O pluralismo de agentes reguladores e o risco de sobreposição de competências Como visto, há diversas prescrições infralegais disciplinando a operação de RPAS, ainda que de maneira esparsa e desorganizada. Em suma, coube ao DECEA o planejamento, a disciplina e a fiscalização no acesso e uso do espaço aéreo,34 e à ANAC a regulação e fiscalização de aeronaves, tripulação e da parte de infraestrutura aeroportuária.35 Mas há outros envolvidos neste contexto, como por exemplo a Agência Nacional de Telecomunicações (ANATEL), responsável por administrar e fiscalizar o uso das radiofrequências utilizadas para o controle (enlace) das aeronaves.36 Foi também constatada a tentativa de regulação do uso de RPAS em sede municipal37 e estadual.38 A autorização da ANAC é condição necessária, porém não suficiente, para a ope- ração desses equipamentos, pois também, conforme já descrito, há permissões a serem concedidas pela ANATEL e DECEA. Em tese, é possível afirmar que se trata de funções distintas e bem delineadas, embora, complementares para o uso adequado do espaço aéreo. Na prática, contudo, evidentemente, diante de tantos entes concomitantemente tentarem se valer de sua parcela de polícia para regular a operação das atividades de RPAS surge o risco de coexistirem no quadro regulatório normas conflitantes tratando de um mesmo objeto (antinomia), ou ainda a postergação prejudicial da concretização de regulação do tema em virtude dos possíveis conflitos de competência entre os agentes reguladores (anomia).39 34 Segundo o ICA 100-40/2015, item 1.2, compete ao DECEA legislar sobre os procedimentos de acesso ao espaço aéreo, cabendo aos demais entes, que porventura venham a participar da regulação de atividades que sejam desempenhadas neste espaço, “tratar dos assuntos dentro de sua área de atuação”. 35 Lei nº 11.182/05: “Art. 2º Compete à União, por intermédio da ANAC e nos termos das políticas estabelecidas pelos Poderes Executivo e Legislativo, regular e fiscalizar as atividades de aviação civil e de infra-estrutura aeronáutica e aeroportuária. [...] Art. 8º Cabe à ANAC adotar as medidas necessárias para o atendimento do interesse público e para o desenvolvimento e fomento da aviação civil, da infra-estrutura aeronáutica e aeroportuária do País, atuando com independência, legalidade, impessoalidade e publicidade, competindo-lhe: [...]”. 36 A Lei nº 9.472/1997 dispôs no art. 163 sobre a Autorização de Uso de Radiofrequência. O sistema de radio- comunicação entre a aeronave e a sua respectiva estação de pilotagem é fundamental para o funcionamento e operação de voos por meio de RPAS, mas, além da aludida autorização, cabe ainda buscar a certificação e a homologação dos equipamentos de comunicação, sem prejuízo da licença para funcionamento da estação, nos termos da vasta legislação da ANATEL. A agência criou um manual para auxiliar aqueles que necessitem se enquadrar dentro das condicionantes mencionadas. O manual encontra-se disponível em: <http://www. anatel.gov.br/Portal/verificaDocumentos/documento.asp?numeroPublicacao=342842&filtro=1&documentoP ath=342842.pdf>. Acesso em: 03 jun. 2016. 37 Trata-se do caso de Curitiba, e a tentativa de regular a atividade via Plano Diretor. Consoante a Secretaria Municipal de Informação e Tecnologia do município, a regulamentação proposta partiria das normas já delineadas pela ANAC. Disponível em: <http://www.gazetadopovo.com.br/vida-e-cidadania/curitiba-define- regras-para-os-drones-ec8e9tjmzrwfixwxpgyddmxce>. Acesso em: 04 jun. 2016. 38 O caso envolve a Secretaria de Estado de Ciência, Tecnologia, Inovação e Educação Profissional do Governo do Estado do Espírito Santo. Disponível em: <http://www.sectti.es.gov.br/drone>. Acesso em: 04 jun. 2016. 39 Acerca destes riscos, destaca-se o alerta já feito em outras oportunidades: “A especialização e a forte auto- nomia das agências reguladoras tiveram por objetivo principal garantir a despolitização de setores regulados, MIOLO_RBDP_54.indd 61 14/10/2016 09:15:59
  • 12. 62 R. bras. de Dir. Público – RBDP | Belo Horizonte, ano 14, n. 54, p. 51-70, jul./set. 2016 RAFAEL CARVALHO REZENDE OLIVEIRA, CAIO CESAR FIGUEIROA Em relação ao segundo caso, isto é, na hipótese de conflito de competências entre policymakers, reguladores e entes federativos não se trata de uma peculia- ridade apenas do setor aéreo. Por exemplo, a Lei nº 9.472/97, no art. 19, inciso XIX, conferiu competência à ANATEL para o controle, prevenção e repressão de infra- ções à ordem econômica, embora coincidam com a competência geral exercida pelo Conselho Administrativo de Defesa Econômica (CADE). Da mesma forma, no setor de gás para termoelétricas, envolvendo competências da ANP e da ANEEL, respectiva- mente, que apesar de envolver a princípio apenas entes da União, remanesce ainda competência dos estados para o serviço público de distribuição de gás canalizado. Uma vez constatado o conflito de competências, há que se ponderar as esferas de poder da Federação envolvidas. Se do mesmo plano, a solução poderá ocorrer no exercício do poder hierárquico da Administração, já em hipótese da pluralidade de agentes de unidades distintas, caberá ao Supremo Tribunal Federal dar a palavra final sobre a distribuição de competências.40 3.2  O regime das autorizações e a sua precariedade para o uso de RPAS com fins lucrativos Um dos pontos mais controvertidos do quadro normativo em vigência, e que poderá ser repetido na regulação a ser implementada, diz respeito à exigência de autorização para o uso dos RPAS com fins lucrativos, condicionado à prévia análise por parte dos órgãos técnicos da ANAC, e deliberadas, caso a caso, pela Diretoria Colegiada, sem prever, todavia, qualquer critério que paute o procedimento para a concessão (ou não) da aludida autorização, nem quanto à estabilidade do título.41 O fundamento para esta autorização de finalidade ainda não catalogada pela ANAC se dá com base no art. 20 do CBA, combinado com o art. 8º, XVII, da Lei nº 11.182/05. viabilizando, dessa forma, tratamento técnico aos desafios apresentados pelos setores do mercado. O insula- mento das agências, todavia, gerou a fragmentação regulatória, com a fixação de normas e políticas setori- ais sem maiores preocupações com os impactos gerados de forma global em outros setores econômicos” (OLIVEIRA, Rafael Carvalho Rezende. Novo perfil da regulação estatal: Administração Pública de resultados e análise de impacto regulatório. Rio de Janeiro: Forense, 2015. p. 220). 40 Cf. SOUTO, Marcos Juruena Villela. Agências Reguladoras. Revista de Direito Administrativo, Rio de Janeiro, n. 216, p. 125-162, abr./jun. 1999; TÔRRES, Heleno Taveira. Conflitos de competência entre agências regulado- ras: um caso: competência constitucional da ANP para regulação do transporte marítimo de petróleo em face das competências da ANTAQ. Interesse Público, Belo Horizonte, v. 8, n. 36, maio 2006. 41 De antemão, adverte-se ao leitor que este artigo não pretende se aprofundar na discussão jurídica acerca do instituto das autorizações, se ato vinculado ou discricionário, ou ainda se precária ou estável, considerando os mares de tinta já gastos pela doutrina pátria sobre o tema. Dentre as principais referências, vide ARAGÃO, Alexandre Santos de. Direito dos Serviços Públicos. 3. ed. Rio de Janeiro: Forense, 2013. p. 209-214; SUNDFELD, Carlos Ari. Autorização de Serviços de Telecomunicações: os requisitos para sua obtenção. Revista de Direito Administrativo e Constitucional, v. 15, p. 200, 2004; DI PIETRO, Maria Sylvia Zanella. Parcerias na Administração Pública. Concessão. Permissão. Franquia. Terceirização e Outras Formas. 3. ed. São Paulo: Atlas, 1999. p. 126-127. MIOLO_RBDP_54.indd 62 14/10/2016 09:15:59
  • 13. 63R. bras. de Dir. Público – RBDP | Belo Horizonte, ano 14, n. 54, p. 51-70, jul./set. 2016 CONTRIBUIÇÕES PARA O NOVO MARCO REGULATÓRIO DOS DRONES – ENTRE NOBRES OBJETIVOS... O condicionamento do exercício de atividade econômica à prévia autorização é prática usual em outros setores regulados, sendo que em cada caso, os interesses públicos visados (justificando, assim, a intervenção estatal) coadunam-se com os requisitos exigidos para a sua emissão.42 O uso da autorização, enquanto típico ins- trumento regulatório, é o mecanismo concebido pela legislação de modo a dotar o Poder Público de ferramentas para exercer a fiscalização sobre as atividades desem- penhadas em regime privado. A sua exigência encontra como fundamento de validade o pleno exercício do poder de polícia, de modo a estabelecer requisitos previamente ao exercício de uma ou mais etapas de suas respectivas cadeias, visando, em última instância, ao desempenho equilibrado, eficiente, seguro ou outras finalidades públi- cas de relevo. No contexto do uso de UAS, isto é, abrangendo todos os tipos de aeronaves não tripuladas, o art. 8º da Convenção sobre Aviação Civil Internacional (Convenção de Chicago) – firmada pelo Brasil em 29 de maio de 1945, ratificada em 8 de junho de 1946 e promulgada pelo Decreto federal nº 21.713/46 – determina a exigên- cia dos Estados Signatários que regulamentem a autorização especial como con- dicionante operacional, de modo a assegurar o controle sobre o voo desses novos instrumentos.43 O que mais preocupa o setor, certamente, é o vácuo legislativo em não contar com um procedimento claro, como nos demais casos mencionados, voltados para a exploração comercial do uso destes equipamentos. Ademais, as propostas até o momento apresentadas pela ANAC em momento algum deram indícios de como seria este procedimento, sugerindo apenas critérios das possíveis exigências de enquadra- mento dos equipamentos conforme a variação do seu peso. Conforme orientado pelo DECEA, deverá ser encaminhado à ANAC um requeri- mento, “destacando as características da operação pretendida e do projeto do RPAS, de modo a demonstrar à ANAC que o nível de segurança do projeto é compatível com os riscos associados à operação (riscos a outras aeronaves em voo e a pes- soas e bens no solo)”. Nesse interregno, qualquer indivíduo que queira inovar neste 42 No setor de telecomunicações, por exemplo, a autorização da ANATEL é demandada para as atividades a serem prestadas em regime privado, assegurando que o particular detenha as condições mínimas para a execução dos serviços, nos termos do art. 131, da Lei nº 9.472/97. No mercado financeiro, o Banco Central é o agente responsável por emitir a autorização para os interessados que serão fiscalizados no desempenho de suas atividades ao longo de toda sua existência, conforme o art. 18, da Lei nº 4.595/64, considerando a relevância destas atividades para o sistema econômico do país. No setor de infraestrutura e logística (portos, aeroportos, rodovias etc.), as autorizações visam assegurar a qualidade mínima dos serviços e a correlata proteção dos usuários. 43 Convenção sobre Aviação Civil Internacional. Art. 8º – Aeronave Sem Piloto. Nenhuma aeronave capaz de navegar sem piloto, poderá sobrevoar sem piloto o território de um Estado contratante sem autorização es- pecial do citado Estado e de conformidade com os termos da mesma autorização. Cada Estado contratante se compromete a tomar as disposições necessárias para que o voo sem piloto de tal aeronave nas regiões acessíveis de aeronaves civis seja controlada de modo a evitar todo perigo para as aeronaves civis. MIOLO_RBDP_54.indd 63 14/10/2016 09:15:59
  • 14. 64 R. bras. de Dir. Público – RBDP | Belo Horizonte, ano 14, n. 54, p. 51-70, jul./set. 2016 RAFAEL CARVALHO REZENDE OLIVEIRA, CAIO CESAR FIGUEIROA sentido, terá que empreender sob o risco de depender de uma decisão segundo a conveniência e oportunidade da ANAC ou, no mínimo, ter que responder a processos administrativos. No contexto da legislação sob análise e a partir das projeções da regulação que está em vias de desenvolvimento, portanto, não há respaldo ou segurança necessária de que, uma vez preenchidos os requisitos preestabelecidos pelo regulador, a autori- zação seria expedida sem qualquer embargo, ou de que seus efeitos perdurariam por tempo razoável. Este poço de incertezas, naturalmente, tende a frustrar particulares que pretendessem fazer o uso dos RPAS em suas atividades, assim como também alveja os incentivos para o desenvolvimento deste tipo de tecnologia em território na- cional, considerando os altos investimentos envolvidos para sustentar tais projetos.44 Ainda que a autorização a ser previamente outorgada pela ANAC busque preservar os bens jurídicos vistos nos parágrafos anteriores (notadamente, a segurança da coleti- vidade, de forma a possibilitar um uso racional do espaço aéreo em condições técnicas adequadas), a lacuna de definições mais precisas quanto aos critérios utilizados para a concessão ou não da autorização inviabiliza os objetivos maiores pelo Estado, como a promoção de incentivos ao desenvolvimento tecnológico (art. 218 da CF).45 Dessa maneira, eventual discussão sobre as prospecções de um futuro marco regulatório definitivo deverá considerar que a legitimidade da autorização não pode se desvencilhar dos demais objetivos preconizados pela Constituição. Assim, sua legalidade depende da aderência a tal pauta finalística, devendo os requisitos neces- sários para sua obtenção observar a proporcionalidade aos fins visados, sob pena de infringir, inclusive, a livre iniciativa. Por isso, é importante frisar que, ainda que haja interesses coletivos relevantes que justifiquem a limitação do uso do espaço aéreo, tais atividades continuam sendo exercidas sob o regime privado e a sua pedra basilar continua sendo a livre iniciativa. A regulação pela autorização deverá observar os limites de intervenção em re- lação aos ônus que poderão ser impostos aos interessados em obter e mantê-la para o uso de RPAS na exploração de atividade econômica. Entre eles, a regulação implicará a observância de dois limites: (i) os requisitos para sua obtenção e fruição não deverão ser excessivos, de modo a impedir o uso por outros atores interessados; (ii) é imprescindível a previsão de tais requisitos para obtenção e permanência da autorização na legislação. 44 Consoante os ensinamentos de Vitor Rhein Schirato, o regime jurídico das autorizações, como instrumento condicionante do exercício da livre iniciativa, deverá considerar como premissas: (i) o nível de investimento envolvido para o desempenho da atividade a ser fiscalizada, não havendo que se falar nestes casos em pre- cariedade; e (ii) o enquadramento do instrumento com base nas determinações expressas da lei, evitando con- cepções doutrinárias engessadas (SCHIRATO, Vitor Rhein. Livre Iniciativa nos Serviços Públicos. Belo Horizonte: Fórum, 2012. p. 314). 45 Art. 218. O Estado promoverá e incentivará o desenvolvimento científico, a pesquisa, a capacitação científica e tecnológica e a inovação. MIOLO_RBDP_54.indd 64 14/10/2016 09:15:59
  • 15. 65R. bras. de Dir. Público – RBDP | Belo Horizonte, ano 14, n. 54, p. 51-70, jul./set. 2016 CONTRIBUIÇÕES PARA O NOVO MARCO REGULATÓRIO DOS DRONES – ENTRE NOBRES OBJETIVOS... Partindo do pressuposto de que o exercício da discricionariedade pelo regulador somente pode se dar na medida estabelecida pela norma,46 e, no caso, não havendo parâmetros definidos, é natural o ambiente de insegurança propiciado ao setor, tendo em vista que competirá única e exclusivamente ao regulador decidir quanto à validade e eficácia da autorização. Daí a importância de revisitar, mais uma vez, o instituto da autorização no direito público moderno enquanto ferramenta de caráter vinculada e estável. Isso porque hodiernamente não é mais possível cogitar o uso de autorização apenas para objetos simples, como para a instalação de bancas de jornal (em que prescindiam de grandes investimentos por parte do particular autorizado). O instituto das autorizações, conforme mencionado, hoje é utilizado em diversos setores, precipuamente para a regulação de atividades econômicas que demandam grandes investimentos por parte dos interessados, implicando, consequentemente, o afastamento da doutrina clássica e a sua concepção de instrumento precário, outor- gada de maneira discricionária.47 É, portanto, imprescindível que a nova regulamenta- ção venha a considerar esse novo papel das autorizações, rechaçando reproduções automáticas da doutrina que hoje já estão superadas.48 Para fins de definição de prazos, é relevante retomar o fundamento da autoriza- ção para fins de assegurar interesses públicos elencados pela norma que a instituiu. Por outro lado, vige também o respeito à livre iniciativa, segundo a qual a vigência das autorizações deverá ser extensa o suficiente de modo a garantir o livre desempenho da atividade autorizada e desde que não comprometa o cumprimento dos interesses públicos inicialmente indicados. O prazo deverá também ser proporcional às exigên- cias impostas para sua obtenção, de modo também que não inviabilize os retornos financeiros estimados considerando o custo de oportunidade do mercado. 46 Nesse sentido, Floriano Azevedo Marques Neto leciona que “[s]ó haverá margem de discricionariedade (e, portanto, campo para que o administrador exerça juízo de conveniência ou oportunidade de manejar a com- petência conferida pelo legislador ou de escolher uma dentre várias medidas possíveis para atingir a finalidade legal) quando o legislador não tiver determinado, de forma cabal e precisa, a conduta a ser adotada diante da situação de fato. Tendo a lei previsto de forma fechada a hipótese de aplicação da competência adminis- trativa, a providência a ser adotada, a mensuração (ponderação) da providência e a finalidade a ser atingida, descaberá falar em discricionariedade. Diante de tal prescrição legal, não pode o administrador agir para além dos limites nela previstos ou deixar de atuar conforme o comando legal (princípio da função). Em ambos os casos incorrerá em ilegalidade” (MARQUES NETO, Floriano Peixoto de Azevedo. Discricionariedade e regulação setorial: o caso do controle dos atos de concentração por regulador setorial. In: ARAGÃO, Alexandre Santos de (Org.). O poder normativo das agências reguladoras. 2. ed. Rio de Janeiro: Forense, 2011. p. 431). 47 Nesse sentido MEIRELLES, Hely Lopes. Direito administrativo brasileiro. 37. ed. São Paulo: Malheiros, 2011. p. 192; BANDEIRA DE MELO, Oswaldo Aranha. Princípios gerais de direito administrativo. 2. ed. Rio de Janeiro: Forense, 1979. v. 1, p. 552. Vale, todavia, a ressalva, que mesmo a doutrina clássica admitia-se a outorga de autorização por prazo determinado, constituindo autorização qualificada (CRETELLA JÚNIOR, José. Definição da autorização administrativa. Revista dos Tribunais, São Paulo, v. 92, n. 813, p. 763, jul. 2003). 48 Cf. CÂMARA, Jacintho Arruda. As autorizações da Lei Geral de Telecomunicações e a teoria geral do direito administrativo. Revista de Direito da Informática e Telecomunicações – RDIT, Belo Horizonte, n. 3, p. 55-68, jul./dez. 2007. MIOLO_RBDP_54.indd 65 14/10/2016 09:15:59
  • 16. 66 R. bras. de Dir. Público – RBDP | Belo Horizonte, ano 14, n. 54, p. 51-70, jul./set. 2016 RAFAEL CARVALHO REZENDE OLIVEIRA, CAIO CESAR FIGUEIROA 3.3  A apólice de seguro como obrigação regulatória acessória Outro ponto que é tratado dentro da atual regulamentação, nos termos do Regulamento Brasileiro de Homologação Aeronáutica (RBHA) nº 47, proferido pela ANAC, consiste na obrigatoriedade de contratação de apólice de seguro. O ICA nº 100-40/2015, recém-editado pelo DECEA, trata da exigência específica de aquisição de seguro para operação de RPAS no espaço aéreo, cujo prêmio consiga cobrir os riscos decorrentes da operação.49 Tal exigência, como condicionante para a operação de RPAS com finalidade comercial, é inviável em relação à necessidade de conferir maior segurança durante a integração do uso do espaço aéreo, por duas razões. A primeira, de ordem mercadológica, que em virtude das magnitudes dos da- nos envolvidos nos riscos da operação, como, por exemplo, a colisão de um RPAS com um avião comercial, dificilmente trará incentivos para que o mercado securitário comercialize produtos que possam atender às exigências da ANAC. Além disso, pela inexistência de uma norma bem definida em relação às obrigações e riscos sobre a exploração comercial de RPAS, é natural que o mercado securitário também se sinta acuado. Em um segundo ponto, a sua exigência poderá restringir o acesso à tecnologia, concentrando desnecessariamente a exploração de atividade econômica por RPAS, sem uma justificativa plausível para tanto, uma vez que os critérios da identifica- ção obrigatória da aeronave atrelada ao ordenamento jurídico (como as hipóteses de responsabilidade civil decorrentes do risco da atividade, nos termos do art. 927 do Código Civil) dariam respaldo suficiente e necessário para fins de responsabilização perante terceiros.50 Seria uma boa oportunidade rever esta exigência na regulação definitiva a ser planejada pela ANAC, ou pelo menos ponderá-la consoante as categorias dos equipa- mentos operados, de modo que não se crie uma nova barreira aos incentivos de uso e exploração de RPAS para fins comerciais, sobretudo, quanto ao desenvolvimento da própria tecnologia. 49 De acordo com as respostas fornecidas em sede da última rodada de perguntas da Audiência Pública nº 013/2015 da ANAC, a exigência do seguro se estende aos RPAS de qualquer finalidade, com ressalva aos operados por órgãos públicos ou enquadrados como aeromodelos. 50 A esse respeito, leciona Alexandre Santos de Aragão: “Assim, por exemplo, as atividades privadas regula- mentadas podem ser condicionadas à prévia autorização administrativa (art. 170, parágrafo único), mas não pode o Legislador ou a Administração Pública disciplinar tal autorização de forma que inviabilize ou restrinja excessivamente a entrada ou a permanência no mercado regulado” (ARAGÃO, Alexandre Santos de. Direito dos Serviços Públicos. 3. ed. Rio de Janeiro: Forense, 2013. p. 195). MIOLO_RBDP_54.indd 66 14/10/2016 09:15:59
  • 17. 67R. bras. de Dir. Público – RBDP | Belo Horizonte, ano 14, n. 54, p. 51-70, jul./set. 2016 CONTRIBUIÇÕES PARA O NOVO MARCO REGULATÓRIO DOS DRONES – ENTRE NOBRES OBJETIVOS... 4  Contribuições para disposições regulatórias futuras Considerando as premissas adotadas pelo ICA nº 100-40/2015, isto é, do reconhecimento de que o debate sobre a regulamentação proposta estaria longe de ser o modelo desejado, e diante dos pontos de insegurança apresentados no capítulo anterior, seria desejável que a nova regulamentação a ser editada pela ANAC fuja da “visão de túnel”,51 e passe a encarar as ferramentas propiciadas por um modelo de governança regulatória,52 antes de estruturar uma nova arquitetura definitiva. Dentre estas ferramentas, podem-se mencionar as formas de coordenação entre entes reguladores, isto é, uma proposta de diálogo institucionalizado entre todos os entes envolvidos na missão de construir um ambiente livre de incertezas, de modo a atrair investimentos e o bom uso do mercado voltado para RPAS. Tem-se conhecimento do projeto Drone Legal,53 como desmembramento das ações do grupo de trabalho coordenado pela Secretaria de Aviação Civil junto com os Ministérios da Justiça; Defesa; Desenvolvimento, Indústria e Comércio Exterior, Agência Brasileira de Inteligência (ABIN), Polícia Federal, Receita Federal, ANATEL, DECEA e ANAC.54 O diálogo, todavia, deve tomar rumos mais concretos quanto à apresentação de resultados, não bastando apenas a formatação de diálogos com a sociedade civil por meio de audiências e consultas públicas.55 Seria possível partir de projetos de institucionalização do compartilhamento de competências por meio da instituição de atos normativos inter-regulatórios, como as resoluções conjuntas. Ademais, considerando os interesses no jogo de equilibrar incentivos para pro- moção do desenvolvimento, sem deixar de lado as preocupações decorrentes da ope- ração da atividade, deve-se pontuar os custos de transação para todos os envolvidos, desde operadores, fabricantes, terceiros, fiscalizadores e o próprio agente regulador. A razão é óbvia, e relaciona-se primordialmente com o aspecto da segurança jurídica e os custos e benefícios das alternativas regulatórias a serem consideradas. Nesse ponto, o uso da Análise de Impacto Regulatório (AIR) é medida que corrobora com este equilíbrio, visando, em última instância, à eficiência para o alcance das políticas pensadas no modelo a ser implementado. Trata-se, em suma, do planejamento em arquiteturas regulatórias, de forma a contabilizar as relações de custo-benefício incorporadas por este planejamento, 51 JUSTEN FILHO, Marçal. O direito das agências reguladoras independentes. São Paulo: Dialética, 2002. p. 372. 52 OLIVEIRA, Rafael Carvalho Rezende. Novo perfil da regulação estatal: Administração Pública de resultados e análise de impacto regulatório. Rio de Janeiro: Forense, 2015. p. 184. 53 Mais informações sobre o programa disponíveis em: <http://www.aviacao.gov.br/noticias/2015/09/secretaria -lanca-campanha-de-conscientizacao-sobre-o-uso-de-drones>. Acesso em: 27 jun. 2016. 54 A primeira da série de medidas a serem anunciadas pelo grupo de trabalhou consistiu na abertura de consulta pública para a proposta de regulamentação. 55 Não se quer, com essa afirmação, menosprezar a relevância destas ferramentas, principalmente quando sua finalidade é tentar aproximar os stakeholders, de modo a colaborar com a construção de um modelo regu- latório que incentive o desenvolvimento da tecnologia. MIOLO_RBDP_54.indd 67 14/10/2016 09:15:59
  • 18. 68 R. bras. de Dir. Público – RBDP | Belo Horizonte, ano 14, n. 54, p. 51-70, jul./set. 2016 RAFAEL CARVALHO REZENDE OLIVEIRA, CAIO CESAR FIGUEIROA com plena participação social, de modo a conferir maior legitimidade às decisões do agente regulador.56 Nos ensinamentos do Professor Alexandre Santos de Aragão, o uso de AIR deve ser o mais amplo possível, englobando todas as possíveis “instân- cias regulatórias”, caso contrário, corre-se o risco de voltar à “visão de túnel” das agências que se insulam em sua competência técnica.57 5  Considerações finais Do conjunto normativo elencado, é possível afirmar que o uso dos RPAS para fins comerciais encontra respaldo regulatório, em que pese a baixa densidade nor- mativa conferida ao tema. Esta exploração, todavia, está condicionada à outorga de autorizações pela ANAC, que será emitida casuisticamente. Contudo, o formato carece de elementos suficientes para propiciar o respaldo necessário a incentivar particulares a buscarem o acesso destas ferramentas, assim como também cria bar- reiras ao desenvolvimento tecnológico, ante a fragilidade regulatória do instrumento criado pela norma. Foi com base nessas premissas que este estudo tentou realizar indicações dos entraves que deverão ser considerados para fins de uma regulação definitiva. Assim também foram realizadas algumas indicações de possíveis ferramentas de governan- ça regulatória que poderão conferir maior segurança aos stakeholders com interesse na imediata regulação da operação de RPAS para exploração de atividade econômica. Assim como a ampliação do uso dos drones para finalidades civis, novas ir- rupções ocorrerão fatalmente, e o direito não pode ser o algoz do desenvolvimento. Steve Jobs, em 2005, proferiu um discurso marcante na Universidade de Stanford, cuja expressão se traduz em “continue faminto, continue tolo”. O aprimoramento e a vontade de mudar a partir do estudo é a novo eixo motriz propiciado pela quarta revolução industrial, exercendo o Direito um papel fundamental, o de azeitar estas engrenagens em uma dosagem equilibrada. Referências ARAGÃO, Alexandre Santos de. Análise de Impacto Regulatório – AIR. Revista de Direito Público da Economia – RDPE, Belo Horizonte, ano 8, n. 32, out./dez. 2010. ARAGÃO, Alexandre Santos de. Direito dos Serviços Públicos. 3. ed. Rio de Janeiro: Forense, 2013. 56 Cf. OLIVEIRA, Rafael Carvalho Rezende. Novo perfil da regulação estatal: Administração Pública de resultados e análise de impacto regulatório. Rio de Janeiro: Forense, 2015. p. 260; ARAGÃO, Alexandre Santos de. Análise de Impacto Regulatório – AIR. Revista de Direito Público da Economia – RDPE, Belo Horizonte, ano 8, n. 32, out./dez. 2010. 57 ARAGÃO, Alexandre Santos de. Análise de Impacto Regulatório – AIR. Revista de Direito Público da Economia – RDPE, Belo Horizonte, ano 8, n. 32, out./dez. 2010. MIOLO_RBDP_54.indd 68 14/10/2016 09:16:00
  • 19. 69R. bras. de Dir. Público – RBDP | Belo Horizonte, ano 14, n. 54, p. 51-70, jul./set. 2016 CONTRIBUIÇÕES PARA O NOVO MARCO REGULATÓRIO DOS DRONES – ENTRE NOBRES OBJETIVOS... BANDEIRA DE MELO, Oswaldo Aranha. Princípios gerais de direito administrativo. 2. ed. Rio de Janeiro: Forense, 1979. v. 1. BOANOVA FILHO, José Luiz. Aeronaves não tripuláveis no Brasil e sua regulação. Revista Brasileira de Direito Aeronáutico e Espacial (RBDAE), n. 96, p. 49-51, dez. 2014. BROOKER, Peter. Introducing Unmanned Aircraft Systems into a High Reliability ATC System. Journal of Navigation. London, Cambridge Journals Online, v. 66, n. 5, p. 719-735, 2013. CÂMARA, Jacintho Arruda. As autorizações da Lei Geral de Telecomunicações e a teoria geral do direito administrativo. Revista de Direito da Informática e Telecomunicações – RDIT, Belo Horizonte, n. 3, p. 55-68, jul./dez. 2007. CARVALHO, André Castro. Drones já são uma preocupação jurídica. Huffpost Brasil, 24 abr. 2014. Disponível em: <http://www.brasilpost.com.br/andre-castro-carvalho/drones-ja-sao-uma-preocupacao- juridica_b_5199971.html>. CRETELLA JÚNIOR, José. Definição da autorização administrativa. Revista dos Tribunais, São Paulo, v. 92, n. 813, p. 763, jul. 2003. DI PIETRO, Maria Sylvia Zanella. Parcerias na Administração Pública. Concessão. Permissão. Franquia. Terceirização e Outras Formas. 3. ed. São Paulo: Atlas, 1999. FARIA, José Eduardo. Direito e conjuntura. 2. ed. São Paulo: Saraiva, 2010. HAVEL, Brian F.; MULLIGAN, John Q. Unmanned Aircraft Systems: a challenge to global regulators. 65 DePaul Law Review, 107, Fall, 2015. HEVERLY, Robert A. The State of Drones: State authority to regulate drones. Albany Government Law Review, 8, 29, 2015. HORGAN, John. Why drones should make you afraid very afraid. Scientific American, Feb. 2013. JUSTEN FILHO, Marçal. O direito das agências reguladoras independentes. São Paulo: Dialética, 2002. KATYAL, Neal. Disruptive Technologies and the Law. The Georgetown Law Jornal, v. 102, 2014. MARQUES NETO, Floriano de Azevedo. Bens públicos: função social e exploração econômica: o regime jurídico das utilidades públicas. Belo Horizonte: Fórum, 2009. MCNEAL, Gregory S. Drones and Aerial Surveillance: Considerations for Legislators. Brookings Institution: The Robots Are Coming: The Project on Civilian Robotics, Nov. 2014. MEIRELLES, Hely Lopes. Direito administrativo brasileiro. 37. ed. São Paulo: Malheiros, 2011. MING, Celso. Não são aviões de carreira. O Estado de S.Paulo, 1º maio 2016. Disponível em: <http:// economia.estadao.com.br/noticias/geral,nao-sao-avioes-de-carreira,10000048310>. MOREIRA NETO, Diogo de Figueiredo. Curso de direito administrativo. 16. ed. Rio de Janeiro: Forense, 2014. MOREIRA, Egon Bockmann. Qual é o futuro da regulação no Brasil? In: SUNDFELD, Carlos Ari; ROSILHO, André (Coord.). Direito da Regulação e Políticas Públicas. São Paulo: Malheiros, 2014. p. 108-139. OLIVEIRA, Rafael Carvalho Rezende. Curso de Direito Administrativo. 4. ed. São Paulo: Método, 2016. OLIVEIRA, Rafael Carvalho Rezende. Novo perfil da regulação estatal: Administração Pública de resultados e análise de impacto regulatório. Rio de Janeiro: Forense, 2015. RODRIGUES, Elder Soares. Aspectos Regulatórios da Operação de Veículo Aéreo Não Tripulado. In: CONGRESSO RIO DE TRANSPORTES, 13., jun. 2015. SCHWAB, Klaus. The Fourth Industrial Revolution: What It Means and How to Respond. Foreign Affairs, Dez. 2015. MIOLO_RBDP_54.indd 69 14/10/2016 09:16:00
  • 20. 70 R. bras. de Dir. Público – RBDP | Belo Horizonte, ano 14, n. 54, p. 51-70, jul./set. 2016 RAFAEL CARVALHO REZENDE OLIVEIRA, CAIO CESAR FIGUEIROA SLOBOGIN, Christopher. Panvasive Surveillance, Political Process Theory, and the Nondelegation Doctrine. The Georgetown Law Jornal, v. 102, p. 1721-1776, 2014. SOUTO, Marcos Juruena Villela. Agências Reguladoras. Revista de Direito Administrativo, Rio de Janeiro, n. 216, p. 125-162, abr./jun. 1999. SUNDFELD, Carlos Ari. Autorização de Serviços de Telecomunicações: os requisitos para sua obtenção. Revista de Direito Administrativo e Constitucional, v. 15, p. 200, 2004. SUNDFELD, Carlos Ari. Direito Administrativo Ordenador. São Paulo: Malheiros, 2003. TÔRRES, Heleno Taveira. Conflitos de competência entre agências reguladoras: um caso: competência constitucional da ANP para regulação do transporte marítimo de petróleo em face das competências da ANTAQ. Interesse Público, Belo Horizonte, v. 8, n. 36, maio 2006. VILLAMIZAR, Fernando. Drones, ¿Hacia una guerra sin regulación jurídica internacional? Revista de Relaciones Internacionales, Estrategia y Seguridad, 10, 2, 2015. Informação bibliográfica deste texto, conforme a NBR 6023:2002 da Associação Brasileira de Normas Técnicas (ABNT): OLIVEIRA, Rafael Carvalho Rezende; FIGUEIROA, Caio Cesar. Contribuições para o novo marco regulatório dos drones – Entre nobres objetivos e inadequados procedi- mentos. Revista Brasileira de Direito Público – RBDP, Belo Horizonte, ano 14, n. 54, p. 51-70, jul./set. 2016. MIOLO_RBDP_54.indd 70 14/10/2016 09:16:00