O documento descreve um recrutador chamado Balbino que estava tendo dificuldades em recrutar trabalhadores para um seringal no Amazonas. A extração de borracha era lucrativa, mas os preços estavam caindo devido à produção asiática. Balbino geralmente recrutava homens pobres e desesperados do Ceará, que vinham sozinhos em busca de trabalho e dinheiro.
1. Comemoraçãodo121ºAniversáriodeFerreiradeCastro–24demaio
Momento de Leitura por Ferreira de Castro
(1898 – 1974)
Um tio desnaturado
O senhor Balbino terminava na cidade de Belém o recrutamento de novos
trabalhadores para o seringal. Não havia sido um verdadeiro sucesso esta empreitada
que o patrão Juca Tristão lhe confiara; pelo contrário, via-se numa delicada situação,
pois três dos trabalhadores cearenses que arrebanhara tinham-lhe fugido.
---- Uma malandragem! Uma canalha! – desabafava.
Esta tarefa de recrutamento era uma etapa importantíssima para que o patrão
continuasse a ter trabalhadores que explorassem a seringueira, pois quanto mais
matéria-prima fosse recolhida, maior seria com certeza o seu lucro.
No meio da selva amazónica haviam-se instalado dezenas de seringais. Nestes
campos de trabalho extraía-se das seringueiras o magnífico suco que originava a
borracha, a qual se usava para fabricar, por exemplo, os pneus dos automóveis.
Muitos haviam enriquecido principescamente, de tal maneira que acendiam charutos
com as notas de dinheiro esbanjavam a sua fortuna nos cafés e nas buates, ou ainda
em todo o tipo de extravagâncias que caracterizam estes egocêntricos recém-
milionários.
Foi assim até que o preço da seringa começou a descer porque ela já não se
produzia apenas na selva amazónica do nosso país irmão – outros negociantes a
haviam plantado no continente asiático, para mal dos seringueiros do Brasil.
Ainda assim, o lucro era sedutor. Os ambiciosos continuavam febris, dinâmicos e
ainda menos escrupulosos. Alguém haveria de pagar a diferença de preço. E não
eram os patrões.
Balbino encontrava os trabalhadores para o seringal sobretudo no Ceará. Neste
estado brasileiro fustigado pela seca extrema, os homens desesperam por água e por
pão e sabem que, se dali não saírem, o seu destino está irremediavelmente traçado.
Balbino, sempre engomado e luzidio e de cabeça enroscada num chapéu de palha,
havia conseguido trazer alguns homens, que vinham na esperança de trabalho e de
dinheiro. Muito raramente traziam consigo a família….
In José Carlos Soares, José Emídio, Era uma vez… a Selva, Letras & Coisas, SMF, 2012, pp.7-8.