Uma nova pista do Jurássico final produzida por um dinossáurio teropode gigantesco deslocando-se a uma velocidade relativamente elevada.
A new upper Jurassic dinossaur trackway left by a gigantic theropod moving at a high speed.
2. PALEOETOLOGIA
Inferir comportamentos para
animais modernos é difícil;
para animais extintos é ainda
mais complexo.
Perseguir e capturar presas é um factor vital
na vida dos predadores; conseguir fugir
destes e evitar ser morto é também
importante para as presas. Assim, não
surpreende que a estimativa da
velocidade de deslocação de animais
extintos tenha tanto interesse para os
paleontólogos.
3. Sendo as pegadas/pistas fósseis o reflexo directo dos
movimentos destes animais, o registo icnológico constitui a
base para inferências de comportamentos deste tipo.
4. FINALIDADES
1. Testar a fiabilidade de estimativas de velocidades de deslocação
de dinossáurios Mesozóicos, que empregam a fórmula de Alexander
(1976).
V= 0,25g0,5P1,67h-1,173,6
(Km/h)
Admite-se que a força da gravidade (g) seria também nos tempos
Mesozóicos de 9,81 m/s². O valor da passada (P) pode ser medido
directamente nas pistas. Mas um dos maiores problemas é o cálculo
da altura da anca (h).
Entre os vários modelos apresentados, as
melhores estimativas para a altura de anca
são alcançadas com a fórmula simples: h =
comprimento da pegada (L) x 4.
(Henderson 2003).
5. 2. Verificar se os predadores gigantescos (peso > 3
toneladas e altura de anca ≥ a 2,5 metros) conseguiam
deslocar-se a velocidades elevadas.
6. ESTUDOS NEOICNOLÓGICOS I
As ratites são as maiores aves terrestres vivas, os parentes mais próximos
dos teropodes Mesozóicos. As emas, ratites Paleognathae, são bípedes de
passada larga com um pé tridáctilo, digitígradas e constituem os melhores
análogos para os dinossáurios predadores cursoriais.
Têm mais características em comum com os teropodes: gregárias; crias
precociais; taxa de crescimento exponencial; cuidados parentais.
7. Para verificarmos a fiabilidade da equação de Alexander,
registámos séries contínuas de pegadas produzidas por várias
emas e por um nandu, em estado semi-selvagem.
8. As pistas, depois de fotografadas e filmadas, foram analisadas
(parâmetros métricos e angulares). A altura da anca e o
comprimento dos pés foram medidos.
TABELA 1 ratites adultas / monte selvagem
h (cm) L (cm) P (cm) P/h Distância (m) Tempo (s) vel. medida (Km/h)
vel. estimada (Km/h) –
Alexander
ema A 80 17 102 1,3 21 20 3,8 4,6
ema A 80 17 320 4,0 37 5 26,6 30,9
ema B 78 17 130 1,7 32 21 5,5 6,9
ema C 82 19 220 2,7 36 9,5 13,6 14,5
ema C 82 19 270 3,3 14 3 16,8 20,4
ema D 80 20 105 1,3 27 26 3,7 3,9
ema D 80 20 110 1,4 21 23 3,3 4,3
nandu 70 16 140 2,0 14 6 8,4 8,3
Resultados da observação experimental de pistas de ratites adultas e cálculo
das velocidades de deslocação e estimada (Alexander 1976).
9. A condução de experiências de campo com as emas tem a
vantagem dos animais vivos produzirem pegadas e pistas em
todos os aspectos dinâmicos das sua progressão.
Comparação entre Velocidade Medida
com a Estimada para emas e nandu
(km/h)
35
30
25
20
15
10
5
0
0 10 20 30 40
Velocidade Medida
Velocidade segundo
Alexander
10. Existe uma relação empírica entre velocidade, altura de
anca e comprimento da passada (P/h=2,3(v2 /9,8h)0,3),
baseada em números de Froude ((v2)/(9,8h)).
Simulação
Medida Medida P/h=2,3(v2/9,8h)0,3 Alexander
P/h (v2)/(9,8h) P/h eq (v2)/(9,8h)
1,3 0,141 1,277 0,206
4,0 6,985 4,121 9,379
1,7 0,304 1,609 0,475
2,7 1,787 2,738 2,019
3,3 2,710 3,102 4,000
1,3 0,138 1,268 0,155
1,4 0,106 1,174 0,181
2,0 0,794 2,146 0,780
11. Verificamos que o erro
médio quadrático é muito
reduzido. Os valores
obtidos para (P/h) versus
número de Froude e a
comparação com a relação
empírica e com as
velocidades estimadas
(Alexander), mostram uma
elevada sobreposição.
Confirma-se o elevado grau de fiabilidade da aplicação da fórmula de
Alexander para a estimativa da velocidade de animais bípedes.
12. ESTUDOS NEOICNOLÓGICOS
II
Os humanos raramente têm sido utilizados como análogos para os
dinossáurios teropodes, porque nenhum animal marcha ou corre como os
homens. Utilizamos humanos deslocando-se na praia por uma questão de
facilidade e por serem igualmente bípedes (correndo e marchando).
30 metros corrida
Tempo(s) Passada média(m) Altura anca(h)(cm) Comprimento Pegada (L) (cm) Velocidade medida(km/h)
Velocidade
estimada(km/h
7,0 1,95 84,0 21,5 15,4 10,9
7,0 2,50 100,0 25,0 15,4 13,0
7,1 2,40 86,0 22,0 15,2 14,1
6,9 2,40 90,0 21,0 15,6 14,9
8,3 2,23 91,0 25,5 13,0 10,8
8,4 2,07 73,0 21,5 12,9 11,6
7,0 2,20 88,0 22,5 15,4 12,2
8,1 2,33 84,0 23,0 13,3 12,5
8,4 245 97,0 29,0 12,9 10,6
6,5 2,64 94,0 25,0 16,6 13,6
6,9 2,30 83,0 23,5 15,6 12,5
13. 30 metros caminhar
Tempo
(s)
Passada
Média (m)
Altura
Anca (h)(cm)
Comprimento
Pegada (L) (cm)
Velocidade
Medida (km/h)
Velocidade
Estimada1 (km/h)
12,5 1,83 100,0 25,0 8,6 7,7
14,3 1,52 84,0 21,5 7,6 6,6
15,5 1,68 88,0 22,5 7,0 7,4
22,4 1,41 85,0 21,5 4,8 5,8
20,4 1,44 84,0 23,0 5,3 5,7
20,8 1,51 73,0 21,5 5,2 6,9
19,4 1,70 86,0 22,0 5,5 7,9
18,9 1,48 83,0 23,5 5,7 5,7
17,2 1,60 84,0 23,0 6,1 6,8
22,3 1,42 91,0 25,5 4,8 4,8
17,9 1,92 97,0 29,0 6,0 7,0
Surpreendentemente, a aplicação
da equação de Alexander a
humanos fornece resultados
fiáveis, especialmente para
baixas velocidades.
14. Estes dados poderiam não ser representativos para humanos
«vulgares». Assim, analisámos a relação entre P e v em
situações muito controladas, como em provas em que o recorde
do mundo foi batido (masculino e feminino).
Percurso (m) Tempo (s) Passada (m) Velocidade (km/h)
Velocidade Estimada
(km/h)
200 (m) 19,32 4,8 37,3 38,6
200(m) 19,93 4,6 36,1 35,9
100(m) 9,69 4,8 37,2 38,6
100(m) 9,81 4,5 36,7 34,6
200(f) 21,34 4,3 33,7 32,1
400(f) 43,86 4,5 32,8 34,6
Assumindo que estes atletas
têm uma altura de anca de
um metro, simplificando a
equação de Alexander,
obtemos .
v = 0,78 P 1,67.
Mais uma vez, esta equação
apresenta um grau de
aplicação bastante rigoroso.
15. A VELOCIDADE DOS
DINOSSÁURIOS
PREDADORES
Evidência icnológica e evidências anatómicas e biomecânicas
suportam a inferência de que alguma capacidade de corrida rápida
estava plesiomorficamente presente nos teropodes.
As pistas fósseis indicam
que seriam os bípedes de
pequeno e médio porte os
mais velozes, como uma
única excepção.
Pista de teropode médio (L=35
cm) com uma passada de 6,3m
correndo a cerca de 41km/h
(Texas).
Um pequeno bípede,
correndo a mais de
40 km/h( Mongólia).
16. Em Portugal, o registo icnológico apesar de rico e
diversificado, não revela a presença deste tipo de
comportamento.
O teropode «mais rápido»,
com L=33cm e P=2,7m,
progredia a cerca de 10,7 km/h
(P/h=1,9) (jazida descoberta
por alunos do nosso Grupo de
Paleontologia – praia do
Salgado).
17. Para os teropodes de grandes dimensões (L ≥ 60cm; peso
≥ 3 toneladas; h ≥2,5m) só é conhecido uma pista no
mundo – Ardley - em que o predador se deslocava a
grande velocidade – no segmento mais rápido, atingiria os
14,7 km/h.
18. Em 2007, descobrimos uma nova jazida do Jurássico
superior – Gentias (Torres Vedras). A icnocenose é
dominada por grandes dinossáurios carnívoros (L >60
cm), mas inclui também uma componente herbívora
diversificada.
19. Uma das pistas é formada por três pegadas consecutivas, com
comprimento de 65 cm (excluindo a longa impressão posterior
metatarsal), com uma passada de 5,02 m. Aplicando a equação
de Alexander, estimamos que o predador, com 2,8 m de altura de
anca e um peso superior a 3 toneladas, se deslocava a mais de
13,5 km/h.
20. CONCLUSÕES
1. A fórmula de Alexander é o método
mais rigoroso que possuímos para estimar
a velocidade de deslocação de animais
extintos.
Sugerimos que é uma equação fiável,
depois de a termos testado em humanos
e, especialmente, em ratites actuais
bípedes.
2. Confirmamos que estes gigantes
bípedes Mesozóicos se (podiam)
deslocavam a velocidades elevadas.
Um deles seria o equivalente Jurássico
ao grande atleta Obikwelu: forte,
poderoso e rápido.