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UNIVERSIDADE DE BRASÍLIA UnB 
Programa de Pós-graduação – PPG/IdA 
Linha: Processos Composicionais para a Cena 
Disciplina: Teoria e História do Teatro 
Professora: Marcus Mota 
Aluna: Kaise Helena Teixeira Ribeiro 
Matrícula: 09/17532 
Trabalho 5 – Sobre o Teatro de Marionetes 
Em “Sobre o Teatro de Marionetes”, obra do escritor prussiano Heinrich von Kleist (1777-1811) temos um interessante diálogo entre dois personagens que aborda questões pertinentes a uma discussão acerca da performance. 
A estrutura geral do texto, em princípio, é a de um conto. No entanto, por apresentar alguns dados que suscitam reflexões importantes que serão aqui tratadas, o texto pode ser considerado também um ensaio. Uma particularidade que se apresenta desde o início é a de que cada personagem e lugar é denominado apenas por uma letra, de modo que o diálogo se dá no lugar M., entre o senhor C e o seu interlocutor, não identificado. Outros personagens citados também são tratados por letras. Essa opção do autor pela despersonalização e por um não espaço-tempo específico enfatiza a discussão que se desenvolve. 
A história é o encontro do personagem não identificado, mas claramente estabelecido como um narrador - participante que interpela o outro personagem, o senhor C, primeiro bailarino da ópera da cidade, recentemente admitido, mas de grande sucesso, a partir da assistência a uma função de um teatro de marionetes na praça do mercado. O teatro de marionetes é o mote do contato que estabelecem. 
O texto traz uma série de temas que, pensando no universo do teatro de bonecos, são relevantes tais como: 1) a aprendizagem do bailarino a partir da observação da marionete; 2) O controle dos movimentos da marionete tendo como referencial o mecanismo inerente a ele e a gravidade inerente ao material; 3) a comparação do movimento do „operador‟ da marionete à uma dança; 4) A conexão de movimentos entre „operador‟ e a marionete; 5) A alusão à mecanicidade minimizadora da complexidade na relação entre „operador‟ e a marionete; 6) O hibridismo humano- máquina; 7) A relação do conhecimento em estruturas mecânicas de objetos e a construção de marionetes; 8) A „vantagem‟ da marionete sobre o humano no quesito „afetação‟; 9) As especificidades da matéria (marionete) em relação a gravidade; 10) A
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„afetação‟ causada pelo conhecimento e o exercício do deslocamento de lugar de „poder‟. Antes de discorrer acerca desses pontos, acrescentarei algumas especificidades relativas ao teatro de bonecos para evidenciar algumas características que lhe são inerentes. 
No teatro de bonecos, uma das categorias do Teatro de Formas Animadas ou Teatro de Animação (que envolve bonecos, máscaras, objetos, sombras), há uma diversidade considerável de técnicas de manipulação e de tipos de bonecos. Temos bonecos de luva com e sem articulação de boca e de olhos; marotes, bonecos de luva com articulação de boca, bonecos de vara (de manipulação de baixo para cima), bonecos de bengala (manipulação de cima para baixo), bonecos de manipulação direta (com um, dois ou três manipuladores), bonecos de fio (marionetes), enfim, cada técnica exigindo do ator-manipulador um conjunto de habilidades diferentes e com resultados em cena também bem distintos. Algumas especificidades da marionete são: o aparecimento do boneco de corpo inteiro completo1; o comum detalhamento de proporções e articulações; a exigência de uma espécie de mapeamento dos fios com articulações; a partituração das ações; a predominância do movimento em relação à fala; as possibilidades gerais e específicas de cada marionete a partir da sua estrutura física. Dentre tantas técnicas, a marionete divide com o boneco de manipulação direta uma maior aproximação de um conjunto de ações mais semelhantes às humanas, sendo a marionete a que as executa de maneira mais estilizada. 
A seguir, então, tratarei dos pontos que destaquei. Considero ainda que a análise de um ponto possa ser pertinente também a outro. 
1) A aprendizagem do bailarino a partir da observação da marionete – o que liga o trabalho do bailarino à marionete em cena? A ênfase no movimento, dentro de uma estrutura pré-estabelecida. A comparação que faço se dá não a um „bailarino‟ de qualquer dança, mas de ballet clássico e uma marionete. Ambos em cena estão trabalhando dentro de uma prévia definição. Essa apologia a aprendizagem do humano com um objeto criado, feito em forma humana, remete-nos a uma valorização proposital por parte do autor do impessoal, do não-personalizado, do não „afetado‟ como veremos a frente. 
1 Refiro-me assim quanto a marionete porque o corpo inteiro de um tipo de boneco, como o de luva por exemplo, pode não ser „completo‟ – não ter pés, ou mãos às vezes, apenas braços, há traços muitas vezes mais sintéticos.
3 
2) O controle dos movimentos da marionete tendo como referenciais o mecanismo inerente a ele e a gravidade inerente ao material – para a manipulação de um boneco é preciso ter conhecimento de suas características constitutivas. Essa é uma construção de relação com o material (pessoa com o objeto - marionete) que está relacionada a distribuição de peso das partes do boneco e sua conseqüente resposta de movimento durante o estudo de manipulação e a cena propriamente dita. Se o marionetista é também o construtor do boneco, essa relação se estabelece durante a sua confecção. A distribuição do peso do boneco está diretamente relacionada à densidade de seus movimentos controlados e intencionais, não controlados e intencionais e não controlados e não intencionais. 
3) A comparação do movimento do ‘operador’ da marionete a uma dança e, 4) A conexão de movimentos entre ‘operador’ e a marionete – em uma das raras escolas do mundo de teatro de bonecos, na China, por exemplo, aprende-se dança moderna para se aprender a trabalhar com bonecos. É assim porque há a idéia de que o corpo do ator é uma extensão do corpo do boneco. O ator entra em cena com a mesma indumentária do boneco que manipula, o ator aparece de corpo inteiro. Se o boneco, numa cena de luta levanta a perna direita para golpear, o ator faz o mesmo movimento, com a sua perna direita, causando uma sensação de duplicidade, de mesmo personagem em „micro‟ e „macro‟ dimensão. Creio que a cena pensada dessa maneira só explicita uma relação que acontece em maior ou menor escala no momento da manipulação de um boneco. O corpo do manipulador está em consonância com a movimentação do boneco – controlado pelo primeiro. E, dentro da musicalidade das ações, intenções, reações, interações que acontecem em cena com a marionete, o corpo do manipulador está implicado. Muitas vezes essa implicação é sutil, pouco observável, mas é invariavelmente refletida na movimentação do boneco. 
5) A alusão à mecanicidade minimizadora da complexidade na relação entre o ‘operador’ e a marionete – 
“Entretanto, ele acreditava que este último rasgo de espírito, do qual vinha falando, podia ser afastado da marionete, que sua dança podia ser completamente
4 
transposta para o reino das forças mecânicas, produzindo-se por meio de uma manivela (...) (p. 15.)2 
A mecanicidade do controle de uma marionete onde podemos ter, em lugar do ser humano, uma fonte diversa de energia é questão que permeia várias áreas de trabalho e de conhecimento neste campo. No teatro de bonecos, tendo em vista a necessidade de circulação de espetáculos vinculada à sustentabilidade financeira do bonequeiro, e/ou a necessidade de experimentação estética e artística, geraram o uso do mecanismo alimentado a energia elétrica, embora não seja muito comum. Paulo Nazareno3, por exemplo, desenvolveu um sistema elétrico de manipulação de vários bonecos, personagens tocadores de capoeira, onde ele aciona um botão e todos tocam, enquanto ele, sozinho, na frente manipula seu boneco capoeirista, com um sistema que mistura manipulação direta, de fio e de luva. Mestre Saúba4 é reconhecido pela construção de bonecos inventivos, com várias técnicas, dentre elas a „casa de farinha‟ que é uma caixa de madeira, por dentro dela todo o mecanismo, por fora, em cima fica um coletivo de bonecos, em uma cena controlada por uma manivela que está ligada a todos eles. Não há necessidade de ser acionada exclusivamente por uma pessoa, as ações dos bonecos podem ser aceleradas ou desacelaradas, mas a cena está dada. Não há uma grande difusão da mecanização do boneco, da animação por meios não-humanos. Por um lado creio que isso se dá por um receio, por parte dos artistas de serem substituídos pela „máquina‟, por outro, a resistência pode ser pela simples distância atribuída entre a arte e a ciência, questão polêmica, mas que está muito arraigada nos meios „práticos‟ do teatro como um todo e no teatro de bonecos. 
6) O hibridismo humano-máquina; 7) A relação do conhecimento em estruturas mecânicas de objetos e a construção de marionetes - A idéia do homem- máquina é antiga e remete a uma abordagem meio mágica da figura humana. No texto, é citado o caso de um homem que teve sua perna amputada e que passou a andar com uma recém inventada prótese. O bailarino afirma que ele dança com sua nova perna, apesar das suas limitações. O corpo do boneco também é limitado. Mas suas limitações 
2 Kleist, H. Sobre o teatro de marionetes. Tradução Pedro de Sussekind. 2ª Ed. 7Letras: Rio de Janeiro, 2005. 
3 Bonequeiro de Rio do Sul, SC. 
4 Mestre de Mamulengo de Carpina, PE.
5 
são as geradoras da exploração das suas possibilidades de movimento, da síntese poética. 
Ainda hoje o hibridismo humano-máquina gera interesse e curiosidade. A questão perpassa uma idealização do ser humano onde, conhecidos os seus limites próprios, poderia se superar por meio da máquina. É a máquina que estende os potenciais do corpo e da imaginação humana. O papel do humano nessa relação é o do controle, o da consciência. Os mecanismos devem servir aos interesses do humano. O conhecimento acerca da de um mecanismo de movimento eficiente é o que caracteriza um bom artesão do boneco, da marionete. 
A marionete, já foi dito antes, é um boneco com muitas articulações. O que compõe as articulações é uma estrutura conhecida como „alma‟, que funciona de forma semelhante a uma dobradiça. É o seu perfeito ajuste, associado à habilidade do marionetista o que permite uma manipulação „dançada‟, conectada a variações de um determinado andamento de ações pré-determinado. 
8) A ‘vantagem’ da marionete sobre o humano no quesito ‘afetação’ – Kleist responde a uma determinada época, a um determinado estilo de atuação, onde quem „realiza‟ está sendo considerado em primeiro plano. Havia (ainda há) um tipo de vaidade muito cultivada nos meios artísticos e isso transparece na atuação em cena, na dança e no teatro, o „eu‟ importando mais do que a própria arte. No teatro de bonecos, de certa maneira, abdicar do „eu‟ em favor de uma outra figura que aparece no primeiro plano da cena já é, em si, o exercício oposto da situação antes descrita. A marionete, por sua vez, não se afeta como o ator ou o bailarino dessa época. Ela permanece impassível o que para Kleist parece ser exemplo a ser seguido. A impassividade da marionete não é a do marionetista, que controla e acompanha/observa a cena, simultaneamente. A marionete não tem „psicologia‟ em sua atuação de acordo com o que mais convém, se seu manipulador se afetar ele tem um limite mais estreito para manifestar-se, pois a destreza do outro (a marionete) depende de seu controle. 
Quem manipula o corpo do bailarino? Se for ele mesmo a se guiar por sua emoção, sua „afetação‟ onde estará sua arte? Kleist assim define a afetação: “A afetação aparece, (...), quando a alma (vix motrix) encontra-se em qualquer outro ponto que não seja o centro de gravidade do movimento.” 5 Kleist descreve a afetação como um 
5 Idem. p. 20.
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desequilíbrio. Do ponto de vista da emoção no teatro esse desequíbrio é contraproducente, pois, afasta o performer da situação de controle. Se há descontrole, há aleatoriedade, há o acidental. 
9) As especificidades da matéria (marionete) em relação a gravidade 
Primeiramente, a marionete é constituída de partes separadas e compreendidas dentro de uma observância ao esquema corporal de um ser humano. A relação dos pesos de cada parte deve, preferencialmente, ter um equilíbrio aproximado para garantir um „caimento‟ do corpo como um todo ou de partes. O boneco é pensado como um corpo dentro e fora do que se pensa humano, é um objeto de sentido ampliado. 
O boneco oferece em suas limitações uma amplitude de possibilidades que o ser humano não pode alcançar se grandes aparatos técnicos. Algumas das especificidades das marionetes são: poder desmontar-se corporalmente em cena; poder multiplicar-se dentro de uma mesma caracterização ou em caracterizações diferentes; poder variar em proporções; ser antigravitacional: poder flutuar, voar, ter diversos pontos de apoio no corpo em relação ao chão (verossímeis ou não), ter diversos pontos de apoio no espaço físico. 
10) A ‘afetação’ causada pelo conhecimento e o exercício do deslocamento de lugar de ‘poder’ – O autor parece crer que a afetação funciona como uma perda da inocência que está relacionada ao conhecimento. O encanto preciso que há na marionete, no manequim, segundo ele, não há no ser humano. Isso é trazido como dois extremos ligados por um anel. Para exemplificar, o senhor C. narra três histórias em que exemplifica, em tom breve o que quer dizer. Nas três ele descreve a perda da „inocência‟ como um problema. A primeira narrativa é acerca de um rapaz „inocente‟ que feriu o pé. Em princípio era como se nada tivesse se modificado nele, mas, diante dos risos como reação do Senhor C., modificou-se inexplicavelmente perdendo sua „graciosidade‟ e sua inocência. A segunda narrativa, sobre o encontro com outro jovem que se julgava bom sabedor em esgrima e que foi vencido por ele, desloca o rapaz, identificado com o seu lugar de poder de realização auto-suficiente para o Senhor C., que é confrontado, portanto numa terceira narrativa. Nesta, ele descreve que foi levado então, após vencer o rapaz, a confrontar um urso em uma luta. O urso não se deixa iludir pelos falsos movimentos do Senhor C., defende-se sem esforço de cada golpe e demonstra exíminio discernimento em reconhecer o movimento intencionalmente
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„verdadeiro‟. O autor nesse ponto parece sustentar a idéia de até um animal sabe reconhecer o quanto a „afetação‟ interfere do desempenho do performer. O lugar de „poder‟ é deslocado do que sabe para o que não sabe. 
Nesta obra Kleist, com clareza, evidencia-se a importância do objeto (marionete) e do animal em relação ao humano. Ele considera exagerada a exaltação do homem, em especial do que está „afetado‟ por um conhecimento julgado suficiente. O homem, para Kleist, deveria se igualar ao objeto e ao animal, destituir-se da sua posição de „poder‟, recuperar a sua inocência, aceitar-se marionete de deus. A árvore do conhecimento deveria estar de novo a nossa frente, segundo ele, deveríamos comer novamente dela para recuperar nossa inocência.

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  • 1. 1 UNIVERSIDADE DE BRASÍLIA UnB Programa de Pós-graduação – PPG/IdA Linha: Processos Composicionais para a Cena Disciplina: Teoria e História do Teatro Professora: Marcus Mota Aluna: Kaise Helena Teixeira Ribeiro Matrícula: 09/17532 Trabalho 5 – Sobre o Teatro de Marionetes Em “Sobre o Teatro de Marionetes”, obra do escritor prussiano Heinrich von Kleist (1777-1811) temos um interessante diálogo entre dois personagens que aborda questões pertinentes a uma discussão acerca da performance. A estrutura geral do texto, em princípio, é a de um conto. No entanto, por apresentar alguns dados que suscitam reflexões importantes que serão aqui tratadas, o texto pode ser considerado também um ensaio. Uma particularidade que se apresenta desde o início é a de que cada personagem e lugar é denominado apenas por uma letra, de modo que o diálogo se dá no lugar M., entre o senhor C e o seu interlocutor, não identificado. Outros personagens citados também são tratados por letras. Essa opção do autor pela despersonalização e por um não espaço-tempo específico enfatiza a discussão que se desenvolve. A história é o encontro do personagem não identificado, mas claramente estabelecido como um narrador - participante que interpela o outro personagem, o senhor C, primeiro bailarino da ópera da cidade, recentemente admitido, mas de grande sucesso, a partir da assistência a uma função de um teatro de marionetes na praça do mercado. O teatro de marionetes é o mote do contato que estabelecem. O texto traz uma série de temas que, pensando no universo do teatro de bonecos, são relevantes tais como: 1) a aprendizagem do bailarino a partir da observação da marionete; 2) O controle dos movimentos da marionete tendo como referencial o mecanismo inerente a ele e a gravidade inerente ao material; 3) a comparação do movimento do „operador‟ da marionete à uma dança; 4) A conexão de movimentos entre „operador‟ e a marionete; 5) A alusão à mecanicidade minimizadora da complexidade na relação entre „operador‟ e a marionete; 6) O hibridismo humano- máquina; 7) A relação do conhecimento em estruturas mecânicas de objetos e a construção de marionetes; 8) A „vantagem‟ da marionete sobre o humano no quesito „afetação‟; 9) As especificidades da matéria (marionete) em relação a gravidade; 10) A
  • 2. 2 „afetação‟ causada pelo conhecimento e o exercício do deslocamento de lugar de „poder‟. Antes de discorrer acerca desses pontos, acrescentarei algumas especificidades relativas ao teatro de bonecos para evidenciar algumas características que lhe são inerentes. No teatro de bonecos, uma das categorias do Teatro de Formas Animadas ou Teatro de Animação (que envolve bonecos, máscaras, objetos, sombras), há uma diversidade considerável de técnicas de manipulação e de tipos de bonecos. Temos bonecos de luva com e sem articulação de boca e de olhos; marotes, bonecos de luva com articulação de boca, bonecos de vara (de manipulação de baixo para cima), bonecos de bengala (manipulação de cima para baixo), bonecos de manipulação direta (com um, dois ou três manipuladores), bonecos de fio (marionetes), enfim, cada técnica exigindo do ator-manipulador um conjunto de habilidades diferentes e com resultados em cena também bem distintos. Algumas especificidades da marionete são: o aparecimento do boneco de corpo inteiro completo1; o comum detalhamento de proporções e articulações; a exigência de uma espécie de mapeamento dos fios com articulações; a partituração das ações; a predominância do movimento em relação à fala; as possibilidades gerais e específicas de cada marionete a partir da sua estrutura física. Dentre tantas técnicas, a marionete divide com o boneco de manipulação direta uma maior aproximação de um conjunto de ações mais semelhantes às humanas, sendo a marionete a que as executa de maneira mais estilizada. A seguir, então, tratarei dos pontos que destaquei. Considero ainda que a análise de um ponto possa ser pertinente também a outro. 1) A aprendizagem do bailarino a partir da observação da marionete – o que liga o trabalho do bailarino à marionete em cena? A ênfase no movimento, dentro de uma estrutura pré-estabelecida. A comparação que faço se dá não a um „bailarino‟ de qualquer dança, mas de ballet clássico e uma marionete. Ambos em cena estão trabalhando dentro de uma prévia definição. Essa apologia a aprendizagem do humano com um objeto criado, feito em forma humana, remete-nos a uma valorização proposital por parte do autor do impessoal, do não-personalizado, do não „afetado‟ como veremos a frente. 1 Refiro-me assim quanto a marionete porque o corpo inteiro de um tipo de boneco, como o de luva por exemplo, pode não ser „completo‟ – não ter pés, ou mãos às vezes, apenas braços, há traços muitas vezes mais sintéticos.
  • 3. 3 2) O controle dos movimentos da marionete tendo como referenciais o mecanismo inerente a ele e a gravidade inerente ao material – para a manipulação de um boneco é preciso ter conhecimento de suas características constitutivas. Essa é uma construção de relação com o material (pessoa com o objeto - marionete) que está relacionada a distribuição de peso das partes do boneco e sua conseqüente resposta de movimento durante o estudo de manipulação e a cena propriamente dita. Se o marionetista é também o construtor do boneco, essa relação se estabelece durante a sua confecção. A distribuição do peso do boneco está diretamente relacionada à densidade de seus movimentos controlados e intencionais, não controlados e intencionais e não controlados e não intencionais. 3) A comparação do movimento do ‘operador’ da marionete a uma dança e, 4) A conexão de movimentos entre ‘operador’ e a marionete – em uma das raras escolas do mundo de teatro de bonecos, na China, por exemplo, aprende-se dança moderna para se aprender a trabalhar com bonecos. É assim porque há a idéia de que o corpo do ator é uma extensão do corpo do boneco. O ator entra em cena com a mesma indumentária do boneco que manipula, o ator aparece de corpo inteiro. Se o boneco, numa cena de luta levanta a perna direita para golpear, o ator faz o mesmo movimento, com a sua perna direita, causando uma sensação de duplicidade, de mesmo personagem em „micro‟ e „macro‟ dimensão. Creio que a cena pensada dessa maneira só explicita uma relação que acontece em maior ou menor escala no momento da manipulação de um boneco. O corpo do manipulador está em consonância com a movimentação do boneco – controlado pelo primeiro. E, dentro da musicalidade das ações, intenções, reações, interações que acontecem em cena com a marionete, o corpo do manipulador está implicado. Muitas vezes essa implicação é sutil, pouco observável, mas é invariavelmente refletida na movimentação do boneco. 5) A alusão à mecanicidade minimizadora da complexidade na relação entre o ‘operador’ e a marionete – “Entretanto, ele acreditava que este último rasgo de espírito, do qual vinha falando, podia ser afastado da marionete, que sua dança podia ser completamente
  • 4. 4 transposta para o reino das forças mecânicas, produzindo-se por meio de uma manivela (...) (p. 15.)2 A mecanicidade do controle de uma marionete onde podemos ter, em lugar do ser humano, uma fonte diversa de energia é questão que permeia várias áreas de trabalho e de conhecimento neste campo. No teatro de bonecos, tendo em vista a necessidade de circulação de espetáculos vinculada à sustentabilidade financeira do bonequeiro, e/ou a necessidade de experimentação estética e artística, geraram o uso do mecanismo alimentado a energia elétrica, embora não seja muito comum. Paulo Nazareno3, por exemplo, desenvolveu um sistema elétrico de manipulação de vários bonecos, personagens tocadores de capoeira, onde ele aciona um botão e todos tocam, enquanto ele, sozinho, na frente manipula seu boneco capoeirista, com um sistema que mistura manipulação direta, de fio e de luva. Mestre Saúba4 é reconhecido pela construção de bonecos inventivos, com várias técnicas, dentre elas a „casa de farinha‟ que é uma caixa de madeira, por dentro dela todo o mecanismo, por fora, em cima fica um coletivo de bonecos, em uma cena controlada por uma manivela que está ligada a todos eles. Não há necessidade de ser acionada exclusivamente por uma pessoa, as ações dos bonecos podem ser aceleradas ou desacelaradas, mas a cena está dada. Não há uma grande difusão da mecanização do boneco, da animação por meios não-humanos. Por um lado creio que isso se dá por um receio, por parte dos artistas de serem substituídos pela „máquina‟, por outro, a resistência pode ser pela simples distância atribuída entre a arte e a ciência, questão polêmica, mas que está muito arraigada nos meios „práticos‟ do teatro como um todo e no teatro de bonecos. 6) O hibridismo humano-máquina; 7) A relação do conhecimento em estruturas mecânicas de objetos e a construção de marionetes - A idéia do homem- máquina é antiga e remete a uma abordagem meio mágica da figura humana. No texto, é citado o caso de um homem que teve sua perna amputada e que passou a andar com uma recém inventada prótese. O bailarino afirma que ele dança com sua nova perna, apesar das suas limitações. O corpo do boneco também é limitado. Mas suas limitações 2 Kleist, H. Sobre o teatro de marionetes. Tradução Pedro de Sussekind. 2ª Ed. 7Letras: Rio de Janeiro, 2005. 3 Bonequeiro de Rio do Sul, SC. 4 Mestre de Mamulengo de Carpina, PE.
  • 5. 5 são as geradoras da exploração das suas possibilidades de movimento, da síntese poética. Ainda hoje o hibridismo humano-máquina gera interesse e curiosidade. A questão perpassa uma idealização do ser humano onde, conhecidos os seus limites próprios, poderia se superar por meio da máquina. É a máquina que estende os potenciais do corpo e da imaginação humana. O papel do humano nessa relação é o do controle, o da consciência. Os mecanismos devem servir aos interesses do humano. O conhecimento acerca da de um mecanismo de movimento eficiente é o que caracteriza um bom artesão do boneco, da marionete. A marionete, já foi dito antes, é um boneco com muitas articulações. O que compõe as articulações é uma estrutura conhecida como „alma‟, que funciona de forma semelhante a uma dobradiça. É o seu perfeito ajuste, associado à habilidade do marionetista o que permite uma manipulação „dançada‟, conectada a variações de um determinado andamento de ações pré-determinado. 8) A ‘vantagem’ da marionete sobre o humano no quesito ‘afetação’ – Kleist responde a uma determinada época, a um determinado estilo de atuação, onde quem „realiza‟ está sendo considerado em primeiro plano. Havia (ainda há) um tipo de vaidade muito cultivada nos meios artísticos e isso transparece na atuação em cena, na dança e no teatro, o „eu‟ importando mais do que a própria arte. No teatro de bonecos, de certa maneira, abdicar do „eu‟ em favor de uma outra figura que aparece no primeiro plano da cena já é, em si, o exercício oposto da situação antes descrita. A marionete, por sua vez, não se afeta como o ator ou o bailarino dessa época. Ela permanece impassível o que para Kleist parece ser exemplo a ser seguido. A impassividade da marionete não é a do marionetista, que controla e acompanha/observa a cena, simultaneamente. A marionete não tem „psicologia‟ em sua atuação de acordo com o que mais convém, se seu manipulador se afetar ele tem um limite mais estreito para manifestar-se, pois a destreza do outro (a marionete) depende de seu controle. Quem manipula o corpo do bailarino? Se for ele mesmo a se guiar por sua emoção, sua „afetação‟ onde estará sua arte? Kleist assim define a afetação: “A afetação aparece, (...), quando a alma (vix motrix) encontra-se em qualquer outro ponto que não seja o centro de gravidade do movimento.” 5 Kleist descreve a afetação como um 5 Idem. p. 20.
  • 6. 6 desequilíbrio. Do ponto de vista da emoção no teatro esse desequíbrio é contraproducente, pois, afasta o performer da situação de controle. Se há descontrole, há aleatoriedade, há o acidental. 9) As especificidades da matéria (marionete) em relação a gravidade Primeiramente, a marionete é constituída de partes separadas e compreendidas dentro de uma observância ao esquema corporal de um ser humano. A relação dos pesos de cada parte deve, preferencialmente, ter um equilíbrio aproximado para garantir um „caimento‟ do corpo como um todo ou de partes. O boneco é pensado como um corpo dentro e fora do que se pensa humano, é um objeto de sentido ampliado. O boneco oferece em suas limitações uma amplitude de possibilidades que o ser humano não pode alcançar se grandes aparatos técnicos. Algumas das especificidades das marionetes são: poder desmontar-se corporalmente em cena; poder multiplicar-se dentro de uma mesma caracterização ou em caracterizações diferentes; poder variar em proporções; ser antigravitacional: poder flutuar, voar, ter diversos pontos de apoio no corpo em relação ao chão (verossímeis ou não), ter diversos pontos de apoio no espaço físico. 10) A ‘afetação’ causada pelo conhecimento e o exercício do deslocamento de lugar de ‘poder’ – O autor parece crer que a afetação funciona como uma perda da inocência que está relacionada ao conhecimento. O encanto preciso que há na marionete, no manequim, segundo ele, não há no ser humano. Isso é trazido como dois extremos ligados por um anel. Para exemplificar, o senhor C. narra três histórias em que exemplifica, em tom breve o que quer dizer. Nas três ele descreve a perda da „inocência‟ como um problema. A primeira narrativa é acerca de um rapaz „inocente‟ que feriu o pé. Em princípio era como se nada tivesse se modificado nele, mas, diante dos risos como reação do Senhor C., modificou-se inexplicavelmente perdendo sua „graciosidade‟ e sua inocência. A segunda narrativa, sobre o encontro com outro jovem que se julgava bom sabedor em esgrima e que foi vencido por ele, desloca o rapaz, identificado com o seu lugar de poder de realização auto-suficiente para o Senhor C., que é confrontado, portanto numa terceira narrativa. Nesta, ele descreve que foi levado então, após vencer o rapaz, a confrontar um urso em uma luta. O urso não se deixa iludir pelos falsos movimentos do Senhor C., defende-se sem esforço de cada golpe e demonstra exíminio discernimento em reconhecer o movimento intencionalmente
  • 7. 7 „verdadeiro‟. O autor nesse ponto parece sustentar a idéia de até um animal sabe reconhecer o quanto a „afetação‟ interfere do desempenho do performer. O lugar de „poder‟ é deslocado do que sabe para o que não sabe. Nesta obra Kleist, com clareza, evidencia-se a importância do objeto (marionete) e do animal em relação ao humano. Ele considera exagerada a exaltação do homem, em especial do que está „afetado‟ por um conhecimento julgado suficiente. O homem, para Kleist, deveria se igualar ao objeto e ao animal, destituir-se da sua posição de „poder‟, recuperar a sua inocência, aceitar-se marionete de deus. A árvore do conhecimento deveria estar de novo a nossa frente, segundo ele, deveríamos comer novamente dela para recuperar nossa inocência.