1. Universidade Técnica de Lisboa
Faculdade de Motricidade Humana
INFLUÊNCIA DA FADIGA NAS CARACTERÍSTICAS
CINEMÁTICAS DA TÉCNICA DE COSTAS
Dissertação elaborada com vista à obtenção do Grau de Mestre
na especialidade de Treino de Alto Rendimento
Orientador: Professor Doutor Francisco José Bessone Ferreira Alves
Júri
Presidente: Professor Doutor José Henriques Fuentes Gomes Pereira
Vogais: Professor Doutor João Paulo Vilas-Boas Soares Campos
Professor Doutor António Prieto Veloso
Professor Doutor Francisco José Bessone Ferreira Alves
Luís Miguel Carneiro Cardoso
2004
2. KINEMATICAL CHANGES INDUCED BY FATIGUE ON BACKSTROKE SWIMMING
Keywords: Backstroke, fatigue, kinematics, technical analysis
In race situation fatigue is the critical factor disturbing technical efficiency. The aim of this study
is to verify fatigue-induced changes in the kinematic characteristics of backstroke swimming.
Six international swimmers performed 6x50m with 10’’ interval at a swim velocity
corresponding to the race pace of 200m backstroke. The swim were filmed whole body at the 2nd
and 6th repetitions, for a complete stroke cycle, with two video cameras (two underwater, two
above the water) for 3D kinematical analysis (APAS). In spite of a clear decrement of swim
velocity from 2nd to 6th repetition (p<0.05) there were no changes on the stroke cycle, on the
spatial and temporal structures of the arm stroke and on the intracycle variation of the horizontal
velocity of the body center of mass (CM).
However, it was observed a larger vertical displacement of the CM, together with a decrease in
joint movement amplitude in the hip and knee.
These group of swim, in spite of their high technical level, showed strong assimetry between arm
stroke, concerning the under water pattern.
3. AGRADECIMENTOS
Ao Prof. Doutor Francisco Alves, meu treinador, professor e orientador, pela sua notável
qualidade científica e empenho demonstrados na resolução dos vários problemas e questões
que se foram colocando ao longo das várias etapas deste mestrado. Um orientador cuja postura
transcende em muito a condição de Académico.
Ao Prof. Doutor Gomes Pereira, director do curso, cuja disponibilidade científica é, a todos os
níveis de referência.
Ao Prof. Doutor António Veloso, cujos ensinamentos e aconselhamentos me permitiram
ultrapassar o “papão” da Biomecânica… pelo menos em parte.
Ao Prof. Doutor João Paulo Vilas-Boas, cuja intervenção em dado momento, me permitiu
ultrapassar uma das primeiras contrariedades deste trabalho.
À Federação Portuguesa de Natação, pela possibilidade e apoio dado durante toda a realização
deste trabalho.
Ao EUL e ao CPJ, nas pessoas dos seus responsáveis, pela disponibilidade incondicional
demonstrada ao longo da realização da parte experimental.
Ao Xico, que para além de me ter ensinado a nadar, transmitiu-me muitos dos ensinamentos e
valores fundamentais, da vida e do desporto, que hoje preservo.
Ao Paulo Cunha, amigo e colega de trabalho que aturou os meus momentos de desespero e
desnorteio, mesmo quando ele próprio não tinha tempo.
Ao Luís Rama, pela sua preciosa colaboração na concepção experimental, e pela sua amizade
e apoio ao longo de todo o trabalho.
Ao amigo e colega Zé Machado, companheiro de labuta, dúvidas, desesperos e alegrias em
todos os momentos deste trabalho.
Ainda aos colegas de mestrado, Aliete, Ana Teresa, Hugo, Marta, pelo apoio e pelas inúmeras
horas passadas na piscina, aquando da fase experimental.
i
4. Aos colegas e amigos do departamento técnico da FPN, pelo seu apoio e incentivo constantes.
A todo o pessoal administrativo da FPN.
À SFUAP, Carlos Freitas e José de Freitas pelas inúmeras possibilidades que me deram e por
terem acreditado em mim.
A todos os colegas e amigos treinadores, com quem tenho trabalhado, convivido e sobretudo
aprendido.
Aos então treinadores dos clubes SFUAP, SCP, SAD, GESLoures, GCF, SCB, FCP, CNMaia,
CFV e CNA, pela sua disponibilidade.
A todos os nadadores que, de modo voluntarioso, se prestaram a colaborar sacrificando
algumas, das suas já escassas, horas livres. Sem eles nunca seria possível.
À minha mãe, que sempre me acompanhou mesmo antes de nascer e ao meu pai que, embora
já longe, sempre esteve perto. A eles devo tudo o que sei e o que sou, e o facto incondicional
de estar aqui hoje. Muito Obrigado
À minha irmã, minha melhor amiga, pelo apoio e carinho nos bons e maus momentos.
À Beta, minha Mulher em todos os momentos…
À Sara, que não sei se alguma vez compreenderá porque o pai passa tantas horas ao
computador ao invés de brincar com ela.
A todos aqueles que, directa ou indirectamente, possibilitaram a realização deste trabalho e
que por um lapso imperdoável meu, não os mencionei directamente.
ii
5. ÍNDICE GERAL
AGRADECIMENTOS ……………………………………………………. i
ÍNDICE GERAL …………………………………………………………. iii
ÍNDICE DE FIGURAS .………………………………………………….. viii
ÍNDICE DE QUADROS ………………………………………………… xi
LISTA DE ABREVIATURAS …………………………………………….. xiii
CAPÍTULO I – INTRODUÇÃO ………………………………….............. 1
1. PREÂMBULO …...……………………………………………………... 2
2. APRESENTAÇÃO DO PROBLEMA …...………………………………….. 3
3. DEFINIÇÃO DO PROBLEMA ….………………………………….……... 5
4. OBJECTIVOS GERAIS …………………………………….…………… 6
5. OBJECTIVOS ESPECÍFICOS …...………………………………….……. 6
6. PROBLEMAS EXPERIMENTAIS ………………………………………… 7
CAPÍTULO II – REVISÃO DA LITERATURA ………………………….. 8
1. PRESTAÇÃO EM NATAÇÃO ….………………………………….……... 9
1.1 FORÇA DE RESISTÊNCIA HIDRODINÂMICA …………………………….… 9
1.2 CRIAÇÃO DE FORÇA PROPULSIVA …………………………………….... 10
1.2.1 AS PRIMEIRAS TEORIAS EXPLICATIVAS ……………………………… 11
1.2.2 A COMPONENTE ASCENSIONAL DA FORÇA PROPULSIVA ……………...... 12
iii
6. 1.2.3 A FORMAÇÃO DE VÓRTICES ………………………………….…….. 14
1.2.4 AS DÚVIDAS À APLICABILIDADE DO TEOREMA DE BERNOULLI ………… 15
1.2.5 O ESTADO ACTUAL …..…………………………….………………. 16
2. DESEMPENHO E FADIGA EM NATAÇÃO ……………………………….. 19
2.1 DESEMPENHO E ENERGIA …………………………………….……….. 20
2.2 A FADIGA ………………………………………….…………….…. 21
2.3 ALTERAÇÕES DOS PARÂMETROS DE CICLO DECORRENTES DA FADIGA ...... 23
3. EFICIÊNCIA PROPULSIVA E ANTROPOMETRIA …...………………….… 26
4. TÉCNICA DE COSTAS ……………………………………………….…. 29
4.1 INTRODUÇÃO ……………………………………………………….… 29
4.2 DESCRIÇÃO TÉCNICA E MODELO BIOMECÂNICO …..………………….… 30
4.2.1 POSIÇÃO DO CORPO 31
…………………………………………….….
4.2.2 ALINHAMENTO HORIZONTAL 31
…...……………………………….….
4.2.3 ALINHAMENTO LATERAL 32
…..…………………………………….…
4.2.4 ACÇÃO DOS MEMBROS SUPERIORES 32
………………………………....
4.2.4.1 Entrada ……………………………………………………... 32
4.2.4.2 Acção Descendente Inicial (ADI) ……………………………... 32
4.2.4.3 Acção Ascendente (AA) ……………………………………… 33
4.2.4.4 Acção Descendente Final (ADF) ……………………………… 33
4.2.4.5 Acção Ascendente Adicional (AAA) …………………………... 34
4.2.4.6 Saída ………………………………………………………... 35
iv
7. 4.2.4.7 Recuperação ……………………………………………........ 35
4.2.5 ACÇÃO DOS MEMBROS INFERIORES (MI) 35
……………………….........
4.2.5.1 Acção ascendente ………………………................................. 36
4.2.5.2 Acção descendente ………………………............................... 36
4.2.6 SINCRONIZAÇÃO 36
………………………...........................................
4.2.6.1 Membros superiores e inferiores ………………………........... 36
4.2.6.2 Membros superiores ………………………............................. 36
4.2.7 RESPIRAÇÃO 37
………………………................................................
4.2.8 ROLAMENTO DO CORPO 37
……………………….................................
4.3 CARACTERIZAÇÃO CINEMÁTICA ……………..……………………..... 38
4.3.1 VARIAÇÃO INTRACÍCLICA DA VELOCIDADE 39
………………………......
4.3.2 PADRÕES PROPULSIVOS E DINÂMICA DOS MEMBROS SUPERIORES 40
………
4.3.2.1 Padrão de um pico ………………………...…………………... 41
4.3.2.2 Padrão de dois picos ………………………............................... 41
4.3.2.3 Padrão de três picos ………………………................................ 42
4.3.3 VARIÁVEIS BIOMECÂNICAS DE CICLO ………………………............... 43
4.3.4 SINCRONIZAÇÃO E ROTAÇÃO DAS CINTURAS ………………………..... 46
5. ANÁLISE CINEMÁTICA……………... ……………………….................. 48
5.1 INTRODUÇÃO ………………………...………………………........... 48
5.2 ANÁLISE TRIDIMENSIONAL ………………………...………………… 51
v
8. 5.3 DETERMINAÇÃO DA VELOCIDADE DE DESLOCAMENTO (VCM vs VANCA) ……. 52
CAPÍTULO III – METODOLOGIA ………………………....................... 54
1. CONCEPÇÃO EXPERIMENTAL ………………………...………………… 55
2. AMOSTRA ………………………...………………………..................... 55
3. PROCEDIMENTOS E ORGANIZAÇÃO ………………………..................... 57
3.1 PROTOCOLO DA PROVA ………………………...……………………… 57
3.2 ANÁLISE CINEMÁTICA ………………………........................................ 59
3.2.1 PROCEDIMENTOS ……………………….......................................... 59
3.2.1.1 Volume de Calibração ………………………............................. 59
3.2.1.2 Registo de Imagens ……..……………...................................... 60
3.2.1.3 Determinação dos pontos anatómicos de referência ……………... 63
3.2.3 TRATAMENTO DOS DADOS ……………………….............................. 64
3.3 MEDIÇÃO DAS VARIÁVEIS ANTROPOMÉTRICAS ………………………...... 65
3.4 MEDIÇÃO CRONOMÉTRICA ………………………................................. 67
3.5 VARIÁVEIS DO ESTUDO ………………………....................................... 67
3.6 ANÁLISE ESTATÍSTICA ………………………........................................ 70
CAPÍTULO IV – APRESENTAÇÃO E DISCUSSÃO DOS RESULTADOS ... 72
1. INTRODUÇÃO ………………………...……………………….............. 73
2. A VARIAÇÃO INTRA E INTER-INDIVIDUAL DA TÉCNICA ……………...... 73
2.1. CARACTERÍSTICAS ESPACIAIS DOS TRAJECTOS SEGMENTARES………….. 73
2.1.1. MEMBROS SUPERIORES ………………………............................... 73
vi
9. 2.1.2. MEMBROS INFERIORES ………………………................................ 80
2.2. DESLOCAMENTO DO CENTRO DE MASSA ……........................................... 82
2.3. VELOCIDADES E ACELERAÇÕES ………………………....................... 84
2.3.1. MEMBROS SUPERIORES ………………………............................... 84
2.3.2. CENTRO DE MASSA ………………………..................................... 87
2.4. CARACTERIZAÇÃO TEMPORAL ………………………........................... 94
2.4.1. MEMBROS SUPERIORES ………………………............................... 94
2.4.2. SINCRONIZAÇÃO E ROTAÇÃO DA CINTURA ESCAPULAR E PÉLVICA …… 96
3. AS ALTERAÇÕES DA TÉCNICA COM O ESFORÇO ………………………. 98
3.1. PADRÃO DAS ACÇÕES SEGMENTARES….………….................................. 99
3.1.1. MEMBROS SUPERIORES ………………………............................... 99
3.1.1.1. Deslocamentos ………………………................................... 99
3.1.1.2. Velocidades e acelerações ………………………................... 101
3.1.2. MEMBROS INFERIORES ………………………................................ 102
3.2. CINÉTICA DO CENTRO DE MASSA …………............................................ 103
3.2.1.1. Deslocamentos ………………………................................... 103
3.2.1.2. Velocidades e acelerações ………………………................... 104
3.3. CARACTERIZAÇÃO TEMPORAL ………………………......................... 107
3.3.1. MEMBROS SUPERIORES ………………………............................... 107
3.3.2. SINCRONIZAÇÃO E ROTAÇÃO DA CINTURA ESCAPULAR E PÉLVICA …... 109
4. VARIÁVEIS ANTROPOMÉTRICAS E PRESTAÇÃO ………………………... 110
Capítulo V – Conclusões……………………………………………… 111
vii
11. ÍNDICE DE FIGURAS
Figura 1: Esquema representativo das componentes vectoriais L e FpD da Rpefec,
num padrão do trajecto dos braços em costas (adaptado de Schleihauf, 1977)…...... 13
Figura 2: Exemplo de um padrão de um pico para a velocidade de nado a costas.
relativamente às várias fases subaquáticas de nado, 1-2 ADI; 2-3 AA; 3-4 ADF; 4-5
Saída (adp. de Maglischo, 2003)………………………………………………………….. 41
Figura 3: Exemplo de um padrão de dois picos para a velocidade de nado a costas,
relativamente às várias fases subaquáticas de nado, 1-2 ADI; 2-3 AA; 3-4 ADF; 4-5
AAA/S (adp. de Maglischo, 2003)…………………………………………………………. 42
Figura 4: Padrão de três picos para a velocidade de nado do Olímpico Lopez-Zubero
costas, relativamente às várias fases subaquáticas de nado em 2 ciclos de braços.
(adp. de Maglischo, 2003 e Capaert et al., 1995)……………………………………….. 43
Figura 5: Registo fotográfico dos trajectos subaquáticos da mão e padrão da braçada
de costas, através de técnicas optoeléctricas (adp. de Counsilman, 1977)………….. 49
Figura 6: Esquema dos procedimentos adoptados para o registo de imagens e
posterior análise tri-dimensional (adp. de Costill et al., 1992)………………………….. 50
Figura 7: Esquema descritivo das dimensões do volume de calibração e da definição
dos três eixos do espaço 3d (x,y, e z )……………………………………………………. 60
Figura 8: Caixa subaquática IKELITE® utilizada para albergar as câmaras……………. 61
Figura 9: Esquema do dispositivo luminoso para a sincronização das imagens,
abaixo e acima da superfície da água…………………………………………………….. 62
Figura 10: Esquema geral de organização da situação experimental e disposição
relativa das câmaras e restante equipamento, na piscina……………………………… 63
Figura 11: Caracterização espacial do trajecto subaquático da mão e das variáveis
espaciais definidas no plano zOy………………………………………………………….. 68
Figura 12: Caracterização espacial do trajecto subaquático da mão e das variáveis
espaciais definidas no plano zOx………………………………………………………….. 68
Figura 13: Esquema do ângulo α calculado relativamente ao plano de água
(horizontal) para efeitos da determinação da rotação das cinturas escapular e
pélvica………………………………………………………………………………………… 70
Figura 14: Esquema das fases do trajecto subaquático da mão consideradas para o
estudo………………………………………………………………………………………… 70
ix
12. Figura 15: Exemplos de padrões de trajectórias completas das duas mãos de três
nadadores N1, N2 e N5, representadas no plano sagital (direita) e no plano
horizontal (esquerda). É possível verificar que o nadador N1, em cima, apresenta
uma ADI profunda e uma AA muito ténue que condiciona uma ADF mais curta, a
amplitude lateral (x) é mais significativa o que permite uma AAA mais lateralizante.
O nadador N5, apresenta uma ADI curta e medianamente profunda, com uma AA
quase até à superfície da água, o que permite a execução de uma ADF marcada e
profunda e o consequente aproveitamento da AAA quase na vertical. O nadador N2
apresenta padrões intra-individuais nitidamente diferenciados para a trajectória das
suas duas mãos, notando-se ainda uma maior lateralização dos trajectos
subaquáticos, quando comparativamente aos dois outros nadadores………………... 75
Figura 16: Exemplos de padrões de trajectórias completas (Dxz) em dois nadadores
(N4 e N6). É notória a assimetria entre os membros durante a recuperação. MD –
mão direita; ME – mão esquerda………………………………………………………..
76
Figura 17: Exemplos do deslocamento dos pés em z (Dz) em ordem ao tempo. No
gráfico da esquerda o nadador N4 foi o único elemento a apresentar uma
sincronização de 4 batimentos de pernas por ciclo de braços. À direita um exemplo
do nadador N6, que efectua uma sincronização de 6 batimentos de pernas por ciclo
de braços, característica dos restantes nadadores e mais adequada para o
costas…………………………………………………………………………………………. 82
Figura 18: Velocidade da mão (direita e esquerda) nas várias fases de um ciclo de
braços completo. MD – mão direita; ME – mão esquerda …....................................... 85
Figura 19: Aceleração da mão (direita e esquerda), nas várias fases de um ciclo
completo de braços. MD – mão direita; ME – mão esquerda ….……………………… 87
Figura 20: Velocidade horizontal do centro de massa durante as fases do ciclo
completo dos 2 braços. VyCM – velocidade horizontal do CM; MD – mão direita;
ME – mão esquerda………………………………………………. ……………………….. 89
Figura 21: Velocidade horizontal do centro de massa ao longo de um ciclo completo
de braços para os nadadores N1 e N5. As fases da braçada estão balizadas por
linhas verticais e identificadas para cada uma das acções dos braços. O nadador
N5 apresenta um padrão da VyCM com 3 picos para os dois braços enquanto que
o nadador N1 apresenta um padrão de 3 picos para o braço direito e 2 picos para o
esquerdo. Os dados de origem foram filtrados a 4Hz no sentido de tornar mais
perceptível o padrão de comportamento de VyCM. VyCM – velocidade horizontal
do CM………………………………………………………………………………………… 90
Figura 22: Valores médios da velocidade horizontal do CM para cada fase
subaquática da braçada, direita e esquerda. Esq – braço esquerdo; Dto – braço
direito…………………………………………………………………………………………. 90
Figura 23: Aceleração média do CM nas fases da braçada para um ciclo completo.
ACM – aceleração média do CM. MD – mão direita; ME – mão esquerda…………..... 93
Figura 24: Duração relativa de cada fase para a totalidade do ciclo completo (gráfico
da esquerda) e da duração relativa de cada fase para a totalidade do totalidade da
fase subaquática da braçada (gráfico da direita). E – esquerda; D – direita….……..
94
x
13. Figura 25: Deslocamentos (Dz) do ombro e coxo-femural do mesmo lado, de dois
nadadores (N5 e N6). A representação gráfica mostra a sincronização temporal entre
a rotação das cinturas pélvica e escapular……….......................................................... 97
Figura 26: Exemplos de padrões de trajectórias completas dos dois braços de um
nadador (N1) sobrepostos nos dois momentos de registo (P2 e P6), para os três
planos, plano frontal (Dxy), plano sagital (Dyz) e plano horizontal (Dxz). Podemos
verificar a constância no padrão do trajecto das mãos entre os dois momentos e
entre as assimetrias dos dois lados do corpo. (produzido pelo módulo
APASview)…………………………………………………………………………………. 99
Figura 27: Deslocamento da mão nos dois momentos de análise (P2 e P6) e para os
dois lados, esquerdo e direito (gráficos esquerdo e direito respectivamente). Dz1 -
distância vertical máxima entre o ponto de entrada da mão e o final da ADI; Dz2 –
distância vertical máxima entre o ponto de entrada da mão e o final da AA da mão;
Dz3 - distância vertical máxima entre o ponto de entrada da mão e o final da ADF
da mão; Dymão – deslocamento horizontal máximo da mão; Dzmão –
deslocamento vertical máximo da mão; Dxmão – deslocamento lateral máximo da
mão……………………………………………………………………………………………. 100
Figura 28: Amplitude e flexão máxima do cotovelo nos dois momentos de análise (P2
e P6). CEsq – cotovelo esquerdo; CDto – cotovelo direito……………………….…….. 101
Figura 29: Velocidades e acelerações médias das mãos, nos dois momentos de
análise (P2 e P6) fase a fase. MDP2 – mão direita no 1º momento; MDP6 – mão
direita no 2º momento; MDE2 – mão esquerda no 1º momento; MDP6 – mão
esquerda no 2º momento…………………………………………………………………… 101
Figura 30: Variação (coeficiente de variação) da velocidade horizontal média do CM
entre os dois momentos de análise (P2 e P4) para a totalidade da amostra………… 104
Figura 31: Sobreposição das curvas de velocidade horizontal do CM para o nadador
N3 nos dois momentos de análise. VyCM – velocidade horizontal do CM; CMP2 –
1º momento de análise de VyCM; CMP6 – 2º momento de análise de VyCM……….. 105
Figura 32: Velocidade horizontal média do CM (VyCM), nos dois momentos de
análise (P2 e P6) para as várias fases da braçada. MDP2 – mão direita no 1º
momento; MDP6 – mão direita no 2º momento; MDE2 – mão esquerda no 1º
momento; MDP6 – mão esquerda no 2º momento; * - diferenças significativas para
p<0.05………………………………………………………………………………………… 106
Figura 33: Duração relativa de cada fase para a totalidade da braçada (2 gráficos
superiores) e para a fase subaquática (2 gráficos inferiores) nos dois momentos de
análise. P2 – 1º momento de análise; P6 - 2º momento de análise…………………… 107
Figura 34: Deslocamentos (Dz) do ombro e coxo-femural do mesmo lado,
relativamente aos dois momentos de análise (P2 e P6), para o nadador N2. CD –
coxo-femural direita; OD – ombro direito………………………….……………………… 109
xi
14. ÍNDICE DE QUADROS
Quadro 1: Participação relativa de cada uma das fontes energéticas para a distância
da competição. (adp. de Alves, 2000) ……………………………………………………. 21
Quadro 2: Velocidade de nado, distâncias de ciclo e frequências de ciclo para a
técnica de costas em alguns estudos de referência…………………………………….. 44
Quadro 3: Caracterização geral da amostra para a técnica e correspondência para a
pontuação do IPS do nível de prestação (MT) nos 200m costas……………………… 55
Quadro 4: Características antropométricas do grupo masculino e feminino da
amostra………………………………………………………………..……………………... 56
Quadro 5: Valores cronométricos para os parciais do teste experimental e diferença
percentual para o MT de prova dos primeiros 200m de todos os nadadores da
amostra……………………………………………………………………………………….. 58
Quadro 6: Caracterização da trajectória subaquática das mãos. Dz1 - Distância
vertical máxima entre o ponto de entrada da mão e o final da ADI;·Dz2 – Distância
vertical máxima entre o ponto de entrada da mão e o final da AA da mão;·Dz3 -
Distância vertical máxima entre o ponto de entrada da mão e o final da ADF da
mão;·Dy(e-s) – Distância horizontal máxima entre entrada e saída da mão na água;
Dymão – Deslocamento horizontal máximo da mão;·Dzmão – Deslocamento
vertical máximo da mão;·Dxmão – Deslocamento lateral máximo da
mão……………………………………………………………………… 77
Quadro 7: Índices de simetria, em percentual das diferenças intra-individuais dos
deslocamentos das mãos dos dois lados do corpo para os seis nadadores da
amostra (N1 a N6). IsiDz1 – Índice de simetria da Dzmão; IsiDz1, IsiDz2 e IsiDz3 –
índices de simetria das distâncias Dz1, Dz2 e Dz3; IsiDxmão – índice de simetria
de Dxmão…………………………………………………………………………………….. 78
Quadro 8: Amplitude de movimento, índice de simetria (IsiAmplitudeCot) flexão
máxima (ângulo 3d) das articulações dos cotovelos (AngCot)...………….…………… 79
Quadro 9: Amplitude dos movimentos dos MIs, com base nos valores extremos das
coordenadas em x e z dos pés. AmplZpé – amplitude do pé na vertical; AmplXpé –
amplitude do pé na horizontal; IsiAmplZpé, IsiAmplXpé – índice de simetria para as
amplitudes em z e x………………………………………….. 80
Quadro 10: Amplitude de movimento, índice de simetria (IsiAmplJoe) e valores
máximos de flexão (ângulo 3D) do Joelho (AngJoe)………………………………….... 81
Quadro 11: Amplitude de movimento, índice de simetria (IsiAmplCox) e flexão
máxima (ângulo 3D) da articulação coxo-femural (AngCox)……………..……………. 81
xii
15. Quadro 12: Deslocamentos do centro de massa (CM) nos três planos do espaço.
DyCM – deslocamento horizontal do CM para o grupo masculino (♂) e feminino (♀);
DxCM – deslocamento lateral do CM no eixo dos y; DzCM – deslocamento vertical do
CM…………………………………………………………………………………………….. 83
Quadro 13: Índices de simetria nas suas várias fases. IsiVmãoE/ADI – índice de
simetria para a velocidade média da mão na E/ADI; IsiVmãoAA – índice de simetria
para velocidade média da mão na AA; IsiVmãoADF – índice de simetria para a
velocidade média da mão na ADF; IsiVmãoAAA/S – índice de simetria para a
velocidade média da mão na S/AAA; IsiVmãoRec – índice de simetria para a
velocidade média da mão na Rec…………………………………………………………. 85
Quadro 14: Coeficientes de correlação (r) entre as variáveis da velocidade média
das mãos por fase do trajecto e a velocidade média de nado no ciclo, (p<0.05). …... 86
Quadro 15: Coeficiente de variação da velocidade do centro de massa (CovVycmTC)
ou variação da velocidade intracíclica, de cada elemento da amostra………………... 88
Quadro 16: Coeficientes de correlação entre a velocidade horizontal do CM de um
ciclo completo e as velocidades parciais do CM de cada fase dos 2 braços. VyCM –
velocidade horizontal do CM; VyCME/ADI, VyCMAA, VyCMADF, VyCMAAA/S, VyCMRec
- velocidade horizontal do CM nas respectivas fases……………..……………………. 92
Quadro 17: Índices de simetria da velocidade horizontal do CM nas fases da
braçada. (IsiVyCM)…………………………………………………..……………………… 92
Quadro 18: Duração relativa de cada fase para a totalidade do ciclo completo e para
a totalidade da fase subaquática, tempo de ciclo e frequência de ciclo. Tciclo -
tempo total do ciclo; Fc - Frequência de Ciclo; Tsub – tempo da fase
subaquática……………………………………………………….…………………………. 95
Quadro 19: Variáveis de ciclo para a totalidade da amostra, com e sem
descriminação de género. Dc – distância de ciclo; Fc - frequência de ciclo; Ic -
índice de ciclo…………………………...…………………………………………………. 96
Quadro 20: Ângulos máximos obtidos entre a linha transversal que passa pelas
cinturas e a horizontal. AngCE – ângulo entre a horizontal e a cintura escapular,
AngCP – ângulo entre a horizontal e a cintura pélvica………………………………… 97
Quadro 21: Amplitudes de movimento da articulação do joelho e coxo-femural para
os dois momentos (P2 e P6) e respectivos índices de simetria. AmplJoe –
amplitude de movimento do joelho; AmplCox – amplitude de movimento da coxo-
femural……………………………………………………………………………………….. 102
Quadro 22: Deslocamentos do centro de massa (CM) nos dois momentos de registo
(P2 e P6). DyCM – deslocamento horizontal do CM para o grupo masculino (♂) e
feminino (♀); DxCM – deslocamento lateral do CM no eixo dos y; DzCM –
deslocamento vertical do CM………………………………………………………..…….. 103
Quadro 23: Variáveis de ciclo para a totalidade da amostra (sem descriminação de
género) para os dois momentos P2 e P6. Dc – distância de ciclo; Fc - frequência de
ciclo; Ic - índice de ciclo………………………………………………………....………… 108
Quadro 24: Coeficientes de correlação, com significância, entre o melhor tempo de
prova (MT) e as variáveis antropométricas: Altura; prega crural; prega tricipital;
110
densidade corporal; percentagem de massa gorda………………………………….…
xiii
16. LISTA DE ABREVIATURAS
AA – Acção ascendente
AAA - Acção ascendente adicional
AAA/S – Acção ascendente adicional/saída
AcmAAA/S - Aceleração média do centro de massa na AAA/S
AcmADF – Aceleração média do centro de massa na ADF
AcmADI – Aceleração média do centro de massa na ADI
AcmE/AA – Aceleração média do centro de massa na E/AA
ACMRec - Aceleração média do centro de massa na Rec.
ADF – Acção descendente final
ADI – Acção descendente inicial
Amão – Aceleração da mão
AmãoAA – Aceleração média da mão na AA
AmãoADF – Aceleração média da mão na ADF
AmãoE/ADI – Aceleração média da mão na E/ADI
AmãoRec – Aceleração média da mão na Rec.
AmãoS/AAA – Aceleração média da mão na S/AAA
Ampl(abreviatura da articulação) – Amplitude de movimento das articulações mencionadas.
AmplXpé – Amplitude horizontal da acção do pé
AmplZpé – Amplitude vertical da acção do pé
AngCE – Ângulo da cintura escapular com a horizontal
AngCot – Ângulo do Cotovelo (3d)
AngCox – Ângulo da coxo-femural (3d)
AngCP - Ângulo da cintura pélvica com a horizontal
AngJoe – Ângulo do Joelho (3d)
CFD –Dinâmica de fluidos computorizada
CM – Centro de massa
CM/LM – Índice de longitudinalidade da mão;
CovVycmTC - Coeficiente de variação da VycmTC
CP/LP - Índice de longitudinalidade do pé;
D – Força de resistência hidrodinâmica
Dact - Resistência hidrodinâmica activa
Dc – Distância de ciclo
Df – Resistência de fricção
DLT – Direct Linear Transformation
Dw - Resistência de onda
Dp – Resistência de forma ou pressão
Dpass - Resistência hidrodinâmica passiva
DxCM - Deslocamento lateral máximo do CM
Dxmão – Deslocamento lateral máximo da mão.
Dy(e-s) – Distância horizontal máxima entre entrada e saída da mão na água
DyCM – Deslocamento horizontal máximo do CM (igual a Dc)
Dymão – Deslocamento horizontal máximo da mão
Dz/Dy – Índice de verticalidade do trajecto subaquático.
Dz1 - Distância vertical máxima entre o ponto de entrada da mão e o final da ADI
xiv
17. Dz2 – Distância vertical máxima entre o ponto de entrada da mão e o final da AA da mão
Dz3 - Distância vertical máxima entre o ponto de entrada da mão e o final da ADF da mão
DzCM - Deslocamento vertical máximo do CM
Dzmão – Deslocamento vertical máximo da mão
E – Entrada
Fp – Força propulsiva
FpD - Força de resistência propulsiva
Ic – Índice de ciclo
IdC – Índice de coordenação
Isi – Índice de simetria
L – Força ascensional
MI – Membros inferiores
MS – Membros superiores
MT – Melhor tempo
P2 – Segundo parcial de 50 metros
P6 – Sexto parcial de 50 metros
Rec – Recuperação de braços
Rpef - Resultante propulsiva efectiva
Rpefec – Força propulsiva efectiva (resultante efectiva)
Spm/o – Instante em que ocorre a sobreposição das coordenadas da mão com as coordenadas do
ombro em y.
T%AA – Duração relativa da AA
T%AAA/S – Duração relativa da AAA/S
T%ADF – Duração relativa da ADF
T%E/ADI – Duração relativa da ADI
T%recMS – Duração relativa da fase de recuperação do MS
T%subMS – Duração relativa da fase subaquática de MS
Tciclo – Duração total do ciclo
Tsub – Duração total do trajecto subaquático
VANCA – Velocidade horizontal da anca.
VCM – Velocidade média do centro de massa
Vic – Velocidade intracíclica
Vmão – Velocidade da mão
VmãoAA – Velocidade média da mão na AA
VmãoAAA/S – Velocidade média da mão na AAA/S
VmãoADF – Velocidade média da mão na ADF
VmãoE/ADI – Velocidade média da mão na E/ADI
VmãoRec – Velocidade média da mão na Rec.
VN – Velocidade de nado
VNm – Velocidade média de nado
VyCM – Velocidade horizontal do centro de massa
VycmAA – Velocidade média do centro de massa na AA
VycmAAA/S - Velocidade média do centro de massa na AAA/S
VycmADF – Velocidade média do centro de massa na ADF
VycmADI – Velocidade média do centro de massa na ADI
VycmTs – Velocidade horizontal do centro de massa no trajecto subaquático do MS
xv
18. CAPÍTULO I – INTRODUÇÃO
7. PREÂMBULO
8. APRESENTAÇÃO DO PROBLEMA
9. DEFINIÇÃO DO PROBLEMA
10. OBJECTIVOS GERAIS
11. OBJECTIVOS ESPECÍFICOS
12. PROBLEMAS EXPERIMENTAIS
19. _______________________________________________________________________________Introdução
CAPÍTULO I – INTRODUÇÃO
1. PREÂMBULO
À semelhança do que sempre tem acontecido com o conhecimento, quanto mais perscrutamos
e procuramos saber o porquê das coisas, mais nos deparamos com uma imensidão de
interrogações e problemas que, sucessivamente, nos vão colocando novos objectivos.
Esta ideia esteve desde sempre presente no espírito do ser humano ao longo da sua busca pelo
conhecimento, e já no longínquo ano de 470 a.C., Sócrates partilhava deste pensamento
quando proferia a célebre afirmação, só sei que nada sei.
A investigação no Desporto, em geral, tem tido uma evolução comedida ao longo dos tempos,
acompanhando de certa maneira as grandes organizações de eventos desportivos e a crescente
projecção mediática e social.
É neste sentido que podemos dizer que o ressurgimento dos Jogos Olímpicos da era moderna
vieram contribuir de forma catalisadora para a evolução da Ciência do Desporto. Este facto foi
igualmente acompanhado e sustentado pelos significativos avanços tecnológicos e científicos,
verificados nas mais variadas áreas do conhecimento, fenómeno este típico de todo o passado
séc. XX.
Na natação em particular, apesar da sua relativa juventude, a investigação tem sido rica em
qualidade e quantidade, sobretudo quando a comparamos com algumas outras modalidades, o
que significa que cada vez mais se abrem campos e áreas de estudo com uma emergente
necessidade de compreensão. Também, à semelhança do que ocorre na maior parte dos
desportos, a investigação na natação procura desvendar e estudar os vários factores que
condicionam e determinam a prestação em competição.
A própria evolução da modalidade, dos resultados e dos desempenhos traduz, em grande parte
e à semelhança do que foi dito para outras modalidades, a evolução dos estudos e
investigações que paralelamente se vão fazendo aos mais variados níveis.
2
20. _______________________________________________________________________________Introdução
Quando dizemos em parte, queremos salientar o facto de que muitas das teorias que marcaram
a evolução e a história da investigação em natação resultaram da observação, pura e
sistemática, dos próprios executantes de alto nível e não da apropriação e aplicação, por parte
destes, de uma qualquer inovação em termos de investigação nas técnicas de nado. São bom
exemplo deste fenómeno os estudos pioneiros de Counsilman (1968, 1971) e a maior parte dos
estudos que têm sido realizados na tentativa de compreensão da propulsão em natação.
Ao propormo-nos elaborar este trabalho, não temos a pretensão de aspirar à obtenção de
resultados inovadores ou pioneiros relativamente ao estudo em questão, não só porque as
condicionantes temporais o não permitem mas também porque eventualmente, correríamos o
risco de ultrapassar alguns dos objectivos inerentes a um trabalho desta natureza. Contudo,
muito nos congratularemos se, pelo menos, conseguirmos confirmar algumas das mais
recentes investigações realizadas no âmbito da biomecânica e cinemática da técnica de costas,
se possível, contribuindo para uma melhor caracterização e conhecimento da própria natação
nacional, com inferências úteis para o processo de treino desportivo.
2. APRESENTAÇÃO DO PROBLEMA
É por demais sabido que múltiplos são os factores condicionantes da prestação em natação.
Segundo Alves (1995), o desempenho do nadador é determinado pela sua capacidade de
produzir energia num período de tempo definido, pela optimização da função neuromuscular,
pelas suas características de mobilidade articular próprias, não esquecendo os factores de
ordem psicológica e de envolvência.
Verificamos, deste modo, que são cada vez mais vastas as áreas das Ciências às quais, e nas
quais, se vão produzindo e colhendo os conhecimentos necessários à compreensão e
optimização do rendimento do nadador.
A Fisiologia e a Biomecânica são duas dessas grandes áreas de investigação, nas quais se tem
produzido grande parte do conhecimento dos últimos anos. Embora a Fisiologia possa levar
alguma vantagem no que toca ao volume e generalização do conhecimento produzido,
3
21. _______________________________________________________________________________Introdução
verifica-se uma tendência, por parte dos “novos” investigadores em Biomecânica, na
exploração e na aplicabilidade prática dos conhecimentos resultantes das mais recentes
investigações, tornando assim mais acessível o que, até então, não era de fácil generalização e
aplicabilidade prática.
A Biomecânica, e mais concretamente, as técnicas de análise do nado são mais difíceis de
aplicar do que as suas correspondentes para, praticamente, qualquer outro gesto ou técnica
desportiva (Hay, 1973 cit. por Alves, 1995). Este facto, longe de constituir uma desculpa,
origina e motiva que os conhecimentos biomecânicos dos factores que mais influenciam a
prestação de alto rendimento sejam algo vagos e demasiado centrados no indivíduo em estudo
(Alves, 1995).
Tal como referimos, a prestação em natação ou, mais concretamente, a velocidade de nado
depende não só das reservas energéticas como também da capacidade de transformação, dessa
energia química em energia mecânica e da consequente potência mecânica gerada, não
esquecendo, ainda, todos o factores que gravitam e influenciam a resistência hidrodinâmica e a
eficiência na produção de força propulsiva.
Deste modo, um dos aspectos importantes da investigação biomecânica passa pela tentativa da
identificação e definição das componentes de um modelo técnico de referência para cada uma
das técnicas de nado. Importa todavia perceber que a apologia fechada deste conceito de
modelização do gesto técnico pode conduzir, por si só, à impossibilidade de optimização da
prestação na variabilidade dos indivíduos e dos contextos existentes.
Cavanagh (1989) introduz a ideia da necessidade de existir aquilo que poderemos chamar de
modelização dinâmica, ou seja, um atleta de alto nível é no fundo aquele que melhor adequa a
técnica às suas características anatomofisiológicas, psicológicas e do envolvimento. Só deste
modo se pode explicar alguma da variabilidade existente ao mais alto nível, e também, à
necessidade da flexibilidade necessária para a aplicação dos modelos técnico no processo de
ensino das técnicas de nado.
A partir de determinado nível de prestação competitiva, contrariamente ao que se possa
pensar, o desenvolvimento da técnica é fundamental e primordial para se atingirem objectivos
cada vez mais audaciosos. Apesar da necessidade crescente do aumento progressivo das cargas
de treino (volume e intensidade), a técnica deve sempre ocupar o seu espaço na preparação
4
22. _______________________________________________________________________________Introdução
fundamental do nadador. Segundo Pendergast et al. (1978), o potencial de desenvolvimento
técnico dos nadadores é superior ao desenvolvimento das qualidades e adaptações
morfológicas e funcionais.
Alves (2000, 2002) refere que a natação pura desportiva é muitas vezes erradamente
considerada como uma modalidade dependente quase exclusivamente da força e da
resistência, quando, de facto, o aspecto técnico é fundamental para o seu desenvolvimento.
Podemos pois dizer que o factor técnico é um aspecto decisivo e prioritário para o
desenvolvimento da natação pura desportiva (Vilas Boas, 1998).
Apesar de tudo isto, e contrariamente ao que foi referido, lembremos Fernandes (2001), que
num estudo efectuado com um grupo de 101 nadadores pré-juniores da selecção da ANNP
encontrou para a técnica de costas o maior percentual de incorrecções técnicas em ambos os
sexos. Este facto deveria remeter-nos para uma preocupação maior no que concerne ao
trabalho de treino e avaliação técnica dos nossos nadadores e muito particularmente para a
técnica de costas que, pela sua aparente “facilidade” de execução, poderá com alguma
displicência, ser remetida para uma menor preocupação no seu processo de ensino e treino.
A compreensão e o conhecimento da técnica de nado, das suas variantes e das suas relações
com as características do executante tornam-se, em nossa opinião, um aspecto fundamental
para a compreensão e intervenção no desempenho de alto nível.
3. DEFINIÇÃO DO PROBLEMA
Quando nos referimos à análise técnica, podemos constatar que nadadores de alto rendimento
apresentam, opções de optimização da força propulsiva diferentes e individualizadas que, na
maior parte das vezes, produzem resultados finais muito semelhantes (Schleihauf, 1977,
Maglischo et al. 1989, Maglischo, 2003).
Estas características próprias e individualizadas na técnica de execução dos nadadores leva,
provavelmente, a justificar a grande variabilidade individual encontrada para a economia de
nado. Este facto é confirmado por diversos estudos relativos à técnica de crol (Holmér, 1974;
Pendergast et al., 1977; Monpetit et al., 1983; Toussaint, 1988, 1992; Alves 1995). No entanto,
5
23. _______________________________________________________________________________Introdução
no relativo à técnica de costas, têm sido poucos os estudos mais conclusivos, destacando-se, a
nível nacional, os estudos de Madeira & Alves, 1995, Alves, 1995 e Costa, 1997.
É nossa intenção continuar o processo de exploração das características cinemáticas da técnica
de costas, numa perspectiva o mais global possível, pesquisando as adequações técnicas e suas
possíveis relações intra e inter-individuais, ao longo de um esforço máximo e correspondente à
distância maior para as competições desta técnica. Mais ainda, tentar verificar da adequação
das estratégias individuais na execução da técnica, em função da ocorrência dos vastos e
complexos fenómenos de fadiga, bem como de outros que, embora não sendo objecto de
estudo, influenciam as referidas estratégias individuais de optimização do nado.
4. OBJECTIVOS GERAIS
· Estudar a variação das características biomecânicas e cinemáticas, para a técnica de
costas ao longo de um esforço máximo característico de uma prova de 200m.
· Verificar as possíveis relações existentes entre as adaptações técnicas individuais
decorrentes da fadiga ao longo do esforço definido.
· Verificar as possíveis simetrias e assimetrias entre as acções segmentares dos dois lados
do corpo.
5. OBJECTIVOS ESPECÍFICOS
· Estudar o trajecto propulsivo dos membros superiores segundo um modelo
tridimensional, determinando as suas amplitudes e padrão espacial;
· Estudar e verificar as possíveis assimetrias e simetrias espácio-temporais, das acções
segmentares dos membros inferiores e superiores entre os dois momentos de análise;
· Estudar a cinemática das várias fases propulsivas de membros superiores relacionando-
as com a velocidade do centro de massa (CM);
6
24. _______________________________________________________________________________Introdução
· Estudar as relações angulares entre os segmentos perna/coxa, coxa/tronco, e
antebraço/braço, através dos seus valores extremos e ocorrência em fases específicas da
braçada;
· Estudar as amplitudes e relações entre as rotações das cinturas, escapular e pélvica, no
eixo longitudinal;
· Estudar os padrões dimensionais dos trajectos e de sincronização dos membros
inferiores;
· Verificar as possíveis relações entre as características antropométricas e a prestação.
6. PROBLEMAS EXPERIMENTAIS
Na sequência do exposto até ao momento, seguidamente enumeraremos as principais questões
de estudo a que tentaremos dar resposta:
- Quais os efeito da fadiga na dinâmica cinemática e simetria das acções segmentares na
técnica de costas?
- Quais as características cinemáticas e dinâmicas da amostra (nadadores portugueses)
em estudo?
- Que relações existem entre a rotação das cinturas no sentido longitudinal e o padrão
geral da técnica?
- Quais as características antropométricas da amostra e quais delas se relacionam com a
velocidade de nado em costas?
7
25. CAPÍTULO II – REVISÃO DA LITERATURA.
6. PRESTAÇÃO EM NATAÇÃO
6.1 FORÇA DE RESISTÊNCIA HIDRODINÂMICA
6.2 CRIAÇÃO DE FORÇA PROPULSIVA
1.2.1 AS PRIMEIRAS TEORIAS EXPLICATIVAS
1.2.2 A COMPONENTE ASCENSIONAL DA FORÇA PROPULSIVA
1.2.3 A FORMAÇÃO DE VÓRTICES
1.2.4 AS DÚVIDAS À APLICABILIDADE DO TEOREMA DE BERNOULLI
1.2.5 O ESTADO ACTUAL
7. DESEMPENHO E FADIGA EM NATAÇÃO
7.1 DESEMPENHO E ENERGIA
7.2 A FADIGA
7.3 ALTERAÇÕES DOS PARÂMETROS DE CICLO DECORRENTES DA FADIGA
8. EFICIÊNCIA PROPULSIVA E ANTROPOMETRIA
9. TÉCNICA DE COSTAS
9.1 INTRODUÇÃO
9.2 DESCRIÇÃO TÉCNICA E MODELO BIOMECÂNICO
9.2.1 POSIÇÃO DO CORPO
9.2.2 ALINHAMENTO HORIZONTAL
9.2.3 ALINHAMENTO LATERAL
9.2.4 ACÇÃO DOS MEMBROS SUPERIORES
9.2.4.1 Entrada
9.2.4.2 Acção Descendente Inicial (ADI)
9.2.4.3 Acção Ascendente (AA)
9.2.4.4 Acção Descendente Final (ADF)
9.2.4.5 Acção Ascendente Adicional (AAA)
9.2.4.6 Saída
9.2.4.7 Recuperação
9.2.5 ACÇÃO DOS MEMBROS INFERIORES (MI)
9.2.5.1 Acção ascendente
9.2.5.2 Acção descendente
9.2.6 SINCRONIZAÇÃO
9.2.6.1 Membros superiores e inferiores
9.2.6.2 Membros superiores
9.2.7 RESPIRAÇÃO
9.2.8 ROLAMENTO DO CORPO
9.3 CARACTERIZAÇÃO CINEMÁTICA
9.3.1 VARIAÇÃO INTRACÍCLICA DA VELOCIDADE
9.3.2 PADRÕES PROPULSIVOS E DINÂMICA DOS MEMBROS SUPERIORES
4.3.2.1 Padrão de um pico
4.3.2.2 Padrão de dois picos
4.3.2.3 Padrão de três picos
4.3.3 VARIÁVEIS BIOMECÂNICAS DE CICLO
4.3.4 SINCRONIZAÇÃO E ROTAÇÃO DAS CINTURAS
10. ANÁLISE CINEMÁTICA
10.1 INTRODUÇÃO
10.2 ANÁLISE TRIDIMENSIONAL
10.3 DETERMINAÇÃO DA VELOCIDADE DE DESLOCAMENTO (VCM vs VANCA)
26. _______________________________________________________________________Revisão da Literatura
CAPÍTULO II – REVISÃO DA LITERATURA
1. PRESTAÇÃO EM NATAÇÃO
Como foi referido, vários são os factores que determinam a prestação em natação. Duas das
formas de o fazer são, reduzir a resistência ao avanço e aumentar a capacidade de produção de
força propulsiva.
Estes dois factores estão intimamente relacionados e têm sido, desde sempre, alvo de
investigação no sentido da sua caracterização e quantificação, objectivando-se a optimização
do desempenho desportivo. Nem sempre tem sido fácil esta quantificação, o que não impede
que se continuem a promover estratégias de redução da resistência e promoção da propulsão.
1.1 FORÇA DE RESISTÊNCIA HIDRODINÂMICA
Designamos de força de resistência hidrodinâmica (D), aquela que encerra o somatório das
forças que se opõem ao avanço do corpo na água. É causada pelo choque entre o corpo e as
moléculas de água à medida que este se desloca, forçando-as a fluírem ao longo do corpo e a
preencher o espaço que vai sendo deixado na traseira do nadador. Este fluxo de água ao longo
do corpo não surge de modo ordenado mas sim de modo turbulento.
O diferente comportamento da água ao longo do corpo do nadador e a interacção com este
originam o aparecimento de diferentes formas de resistência ao avanço. Assim, podemos
distinguir três formas de resistência: resistência de forma ou pressão (Dp); a resistência de
fricção (Df) e a resistência de onda (Dw) (Karpovich, 1933 cit. por Cureton, 1971).
Baseando-nos em Toussaint (2002), podemos de modo sucinto dizer que, Dp resulta do
diferencial criado entre a zona frontal e posterior do corpo do nadador, e é proporcional àquele
diferencial de pressões, vezes a área de secção transversa do corpo. Por sua vez, Df é resultado
das forças que tendem a diminuir o fluxo de água ao longo do corpo do nadador e é
9
27. _______________________________________________________________________Revisão da Literatura
dependente da velocidade do fluxo relativamente ao corpo, das características da superfície e
da totalidade da área superficial do corpo. Por fim Do é originada pela formação de ondas à
superfície como resultado do constante diferencial de pressões induzido pelas diferenças de
velocidades dos escoamentos ao longo do corpo.
Assim D total pode ser calculado como:
D = D p + D f + Dw (Sanders et al., 2001; Toussaint et al., 2000)
A compreensão de D para o nosso problema, no relativo à técnica de costas, será importante
nos aspectos determinantes do equilíbrio dinâmico e dos alinhamentos lateral e horizontal.
Ainda no que concerne a D, importa distinguir a resistência hidrodinâmica passiva (Dpass) da
resistência hidrodinâmica activa (Dact). Embora a primeira seja relativamente fácil de ser
mensurada, já que é calculada com o corpo numa posição estável e fixa, no relativo à segunda
a questão revela-se de maior complexidade já que a sua mensuração é calculada em situação
dinâmica de nado.
Verificamos assim que a procura da mais correcta mensuração de Dact tem sido um aspecto de
extrema importância para a compreensão da optimização do rendimento, apesar da sua
complexidade. Presentemente são vários os estudos de relevo e destaque normalmente
associados à optimização da propulsão e mecânica do nado (Nigg, 1983; De Groot & Van
Ingen Schenau, 1988; Hollander et al., 1988; Huijing et al., 1988; Toussaint et al., 1988, 1990,
2000, 2002; Toussaint, 1992).
1.2 CRIAÇÃO DE FORÇA PROPULSIVA
A criação de força propulsiva e a procura dos melhores meios para o fazer, continuam a
constituir matéria de investigação e de uma dinâmica e discussão, saudáveis. Contudo, a
complexidade e a dificuldade na completa explicação do fenómeno da propulsão humana em
meio aquático, apesar da grande evolução verificada nos últimos anos, induz alguma
variabilidade nas suas teorias explicativas.
10
28. _______________________________________________________________________Revisão da Literatura
As particularidades de viscosidade e de deformação do meio aquático conferem-lhe
determinadas características que levam a uma maior dificuldade na compreensão dos referidos
mecanismos propulsivos. Contrariamente ao que sucede em meio terrestre no qual os apoios
são fixos, na água parte da energia mecânica aplicada dissipa-se em energia cinética conferida
às partículas do fluído, tornando-se mais complexo o processo de mensuração das variáveis
relacionadas com o trabalho executado.
Também o facto do deslocamento do corpo na água ser realizado à custa da cinética da maior
parte dos seus segmentos, dificulta a compreensão da dinâmica dos escoamentos e
comportamento da água em torno do corpo. Como iremos verificar este constitui um dos
principais obstáculos, e ao mesmo tempo desafio, que se coloca aos investigadores.
1.2.1 AS PRIMEIRAS TEORIAS EXPLICATIVAS
As primeiras teorias explicativas da propulsão em meio aquático mantiveram-se fiéis às bases
contidas na 3ª Lei de Newton1, à luz da qual a força propulsiva (Fp) era resultado da força de
resistência propulsiva (FpD). Deste modo o nadador deveria empurrar a água directamente para
trás através de um trajecto o mais longo possível, procurando posicionar as suas superfícies
propulsoras perpendicularmente relativamente ao plano de deslocamento (Counsilman, 1968;
Silvia, 1970 cit. por Maglischo, 2003).
Todavia a observação mais precisa dos padrões da braçada subaquática de nadadores de
elevado nível, mostravam trajectos curvilíneos em forma de S, com fases oblíquas
relativamente ao deslocamento, o que faria pressupor a possibilidade da existência de qualquer
outra força que não apenas FpD.
1.2.2 A COMPONENTE ASCENSIONAL DA FORÇA PROPULSIVA
Brown & Counsilman (1970), apresentam um modelo explicativo do fenómeno propulsivo, na
água, que introduz componentes mecânicas normalmente presentes na aerodinâmica. Segundo
1
Lei da acção reacção, segundo a qual a aplicação de uma determinada força num objecto tem por efeito a
produção de outra força com a mesma intensidade e sentido contrário.
11
29. _______________________________________________________________________Revisão da Literatura
esta concepção, a observação de componentes lateralizantes e diagonalizantes dos trajectos
propulsivos de nadadores de elite, realizada a partir de registos fotográficos2, não poderia
explicar, por si só, a totalidade da força propulsiva produzida só com base na interpretação
simplificada da 3ª Lei de Newton. Surge assim o conceito de força de sustentação
hidrodinâmica (L) como componente para a resultante propulsiva total ou resultante
propulsiva efectiva (Rpef).
Este modelo explicativo assente nos princípios de Bernoulli, viria a tomar cada vez mais
importância ao longo dos anos oitenta sendo referenciado por alguns dos autores mais
relevantes, e confirmada em estudos experimentais vários Barthels & Adrian, (1975);
Schleihauf, (1977, 1978, 1979); Reischle, (1979); Schleihauf et al. (1988), e também
Onoprienko, (1981) e Rumyantsev, (1982) citados por Vorontsov & Rumyantsev, (2000).
Foi ainda Schleihauf (1977), quem introduziu os conceitos de ângulo de ataque e ângulo de
orientação3 das superfícies propulsivas, efectuando dos primeiros trabalhos experimentais de
modelização tridimensional dos membros superiores de nadadores de elevado nível,
procurando quantificar as componentes ascensional e de resistência propulsiva ao longo das
várias fases da braçada para as quatro técnicas da natação pura e estabelecendo várias relações
entre os diferentes ângulos de ataque e de orientação possíveis.
Segundo aquele modelo, os nadadores ao efectuarem trajectos subaquáticos oblíquos com
determinados ângulos de ataque das mãos, conseguem produzir força propulsiva de duas
maneiras, conjugando uma componente de força resistiva propulsiva com uma componente de
força ascensional. A Rpef, pode assim ser decomposta em duas forças, cujas relações entre si
são normalmente proporcionalmente inversas.
2
Registos fotográficos de um sistema fotoeléctrico colocado nas mãos.
3
Ângulo de ataque é o angulo formado pela inclinação da palma da mão em relação ao sentido do seu
deslocamento na água. Ângulo de orientação refere a direcção do fluxo da água ao longo da mão, sendo o
ângulo formado entre o eixo director do segmento e a direcção do seu deslocamento (direcção do escoamento).
12
30. _______________________________________________________________________Revisão da Literatura
Figura 1: Esquema representativo das L
componentes vectoriais L e FpD da Rpef, Rpef
num padrão do trajecto dos braços em
FpD
costas (adaptado de Schleihauf, 1977).
Schleihauf (1979) e Hay & Guimarães (1983) referem que a propulsão deriva de uma
combinação das duas forças, força de resistência propulsiva e força ascensional hidrodinâmica,
essencialmente produzida nos membros superiores.
Independentemente da actual dialéctica em torno da definição de qual o melhor pressuposto
explicativo dos fenómenos de propulsão do homem na água, os trabalhos de Schleihauf foram
sem dúvida um marco importante na pesquisa laboratorial e experimental da biomecânica da
natação pura.
Também Maglischo (1982) contribui decisivamente para que este novo pressuposto
explicativo fosse amplamente divulgado e aplicado por muitos treinadores no seu processo de
treino, já que segundo ele o teorema de Bernoulli providenciava uma explicação científica e
racional para o padrão diagonal dos trajectos das superfícies propulsoras dos nadadores. No
entanto, como iremos ver adiante, Maglischo (1993, 2003) revê em grande parte aquela
primeira concepção de grande dominância de produção de força propulsiva à custa da
componente ascensional da força.
1.2.3 A FORMAÇÃO DE VÓRTICES
Outro pressuposto teórico explicativo da produção de Fp, e que oferece uma explicação de
como a força ascensional poderá desempenhar um papel mais vasto na propulsão, foi proposto
13
31. _______________________________________________________________________Revisão da Literatura
por Colwin (1985a, 1985b). Este pressuposto é baseado nos princípios da força ascensional, e
assente na formação de vórtices4.
Para este autor quando estudamos a propulsão não nos devemos cingir unicamente, à
observação das execuções dos nadadores e daí deduzir as características das forças produzidas.
Assim, importa também observar os efeitos na água decorrentes das acções dos nadadores e
estudar essas dinâmicas em torno das superfícies propulsivas, tendo por base os princípios da
dinâmica dos fluidos e o seu comportamento em volta de superfícies semelhantes ou com
perfis tipo asa (aerofoils, hidrofoils). Ao fazê-lo, Collwin identifica basicamente o
aparecimento de dois tipos vórtices típicos, os vórtices de extremidade e os vórtices em anel,
respectivamente relacionados com a primeira e segunda metades da fase propulsiva da
braçada.
Um aspecto interessante nesta teoria assenta no facto de que a formação de vórtices pode
manter o diferencial de pressões entre a face dorsal e ventral da mão do nadador, em regimes
de escoamento turbulento (Colwin, 1992). Deste modo poder-se-á atribuir a existência de
força ascensional, decorrente dos mecanismos dos vórtices, mesmo quando há ruptura da
camada limite.
Os vórtices de extremidade estão associados ao comportamento dos fluídos em redor de um
aerofoil, comportamento este que, como iremos verificar, é difícil de ser constatado para
superfícies propulsivas como as de um nadador em situação dinâmica. Já os vórtices em anel
pressupõem mudanças bruscas de direcção das superfícies propulsivas, comportamento este
que parece encontrar alguma semelhança na acção de pernas, em crol, costas e mariposa,
aquando da transição da acção ascendente para a acção descendente e vice-versa.
Curiosamente, e no que se refere aos membros superiores, apenas na técnica de costas
parecem existir condições para a formação de vórtices em anel, na transição da acção
descendente final para a acção ascendente adicional ou saída.
Segundo Ungerechts (1988) a formação de vórtices em anel permite a transferência de uma
quantidade de movimento do fluído para o corpo, acelerando-o em direcção contrária. Ainda
Ungerechts et al., (1999), apresenta três algoritmos diferentes para o cálculo do momento
4
Vórtice é uma massa de um fluido em rotação.
14
32. _______________________________________________________________________Revisão da Literatura
transmitido a partir da formação de vórtices, decorrentes das acções de propulsão de alguns
nadadores vertebrados com características ondulatórias. Permanece no entanto a dúvida se,
algum dos mencionados algoritmos se adequa aos vórtices criados pelas acções propulsivas
dos nadadores.
1.2.4 AS DÚVIDAS À APLICABILIDADE DO TEOREMA DE BERNOULLI
Como foi referido, a explicação de L tem por base o teorema de Bernoulli que, contudo,
apresenta dificuldades para o cálculo da referida componente quando aplicado a corpos em
situação dinâmica e em regimes de escoamentos não laminares, como é o caso do corpo do
nadador em nado real (Sprigings & Koehler, 1990). Os mesmos autores referem ainda que o
modelo de Bernoulli, não permite o cálculo da componente da resistência hidrodinâmica D,
pelo que sugerem a necessidade de se retornar à explicação da propulsão com base no modelo
Newtoniano.
Nesta sequência, Rushall (1994) entre outros autores, advogam a necessidade de se fazerem
algumas correcções aos estudos que suportam o papel determinante de L para a obtenção de
uma elevada força propulsiva total. Este autor reconhece, contudo, que para a técnica de
bruços, na qual as trajectórias dos segmentos propulsivos são mais lateralizantes, a
componente L é importante.
Podemos assim constatar que um dos problemas, e principal argumento, contra a
aplicabilidade dos princípios do teorema de Bernoulli ao nado real, ressalta do facto de que os
dados obtidos resultam de modelos contextualizados numa quasy-steady situação, ou seja, em
regimes de escoamento praticamente estacionários. Em situação de nado real a dinâmica das
superfícies propulsivas associada à velocidade do corpo conjugam-se, determinando diferentes
comportamentos dos fluidos e dos seus escoamentos ao longo das superfícies corporais. Esta
conjunção de factos determina a “rotura” da camada limite e por conseguinte cessam as
condições para que se produza L com base nos princípios de Bernoulli.
15
33. _______________________________________________________________________Revisão da Literatura
Esta questão não determina, todavia, a negação da possibilidade da existência de uma
componente L para a Rpef, mas sim o conceito de que L é a componente determinante para
Rpef.
Não é difícil calcular as direcções de L e FpD nas várias fases da braçada, pois para além de
serem perpendiculares entre si, FpD é exercida na mesma direcção e sentido contrário ao do
movimento da mão. A dificuldade está assim na mensuração da magnitude daquelas duas
forças (Maglischo, 2003).
Para Alves (1995), embora muitos dos trabalhos experimentais posteriores, tenham
confirmado a teoria da força ascensional como parte explicativa da propulsão, verificaram-se
algumas interpretações abusivas e excessivas que colocavam, praticamente, como única
componente da resultante propulsiva, a força ascensional.
Assim, é comum considerar-se que as forças de sustentação serão dominantes na técnica de
bruços, sendo a força de resistência propulsiva dominante na técnica de costas e nalgumas
fases das técnicas de crol e mariposa.
1.2.5 O ESTADO ACTUAL
Mais recentemente alguns autores como Berger et al., (1995); Sanders, (1999); Bixler &
Riewald (2001) e Riewald & Bixler (2001), procuram aperfeiçoar os primeiros passos de
Schleihauf estudando modelos tridimensionais, mais aperfeiçoados, de superfícies propulsivas,
em diferentes regimes de escoamento com diferentes ângulos de ataque, no sentido de se
verificar valores de FpD .
Toussaint et al. (2002), num estudo efectuado a nadadores com o objectivo de conhecer os
regimes de escoamento e dinâmica de fluidos em volta das mão e antebraços, colocaram tufos
de tecido nos referidos segmentos e filmaram o nado a diversas velocidades. Puderam
constatar que o fluxo de água em torno das superfícies não se coadunava com escoamentos
uniformes, não podendo pois manter-se intacta a camada limite e por conseguinte as
superfícies propulsivas dificilmente se poderiam comportar como asas em situação dinâmica.
Deste modo, estes autores referem que neste momento nem as teorias da força ascensional
16
34. _______________________________________________________________________Revisão da Literatura
nem as teorias da força de resistência propulsiva parecem explicar claramente os mecanismos
da propulsão, avançado para a necessidade de se efectuarem mais estudos de dinâmica de
fluidos e seus comportamentos em torno das superfícies propulsivas, do nadador, em situação
real de nado.
Ainda Toussaint et al. (1990, 1999, 2000) em estudos efectuados no sentido de comparar os
dados existentes sobre o cálculo da força propulsiva em modelos estáticos, com os obtidos no
MAD system5 (Toussaint et al., 1988, 1999), verificaram valores discrepantes relativamente
aquilo que seria de esperar, pois os dados obtidos no MAD system mostravam valores que
eram frequentemente mais elevados. O mesmo autor (Toussaint, 2002), refere ainda estudos
efectuados com modelos de insectos, nos quais o cálculo da resultante propulsiva era tal que,
se os assumíssemos como correctos, chegaríamos à conclusão de que o insecto, em causa, não
conseguiria voar. Este facto reforça a necessidade do estudo do comportamento da água e seus
escoamentos, em torno das superfícies propulsivas do nadador, em situação dinâmica.
Colman et al. (1999), Silva (2000) e Silva et al. (2001), mostram igualmente trabalhos de
investigação no âmbito da explicação dos fenómenos propulsivos em situação dinâmica,
partindo da observação do comportamento das massas de água (massas de água adicionais) e
dos seus escoamentos, em torno dos nadadores, nas técnicas simultâneas cujas características
ondulatórias se poderão assemelhar às características de locomoção de alguns vertebrados
aquáticos (Ungerechts et al., 1999).
Maglischo (2003), avança para algumas considerações explicativas e importantes no que
concerne a sua revisão da predominância de L para FpD. Assim, segundo este autor, embora o
melhor método para produzir força propulsiva pareça ser o de empurrar a água directamente
para trás, este facto não é confirmado pelas observações reais do nado. Segundo Bixler, 1999
cit. por Maglischo 2003, a sua investigação demonstrou através da dinâmica de fluidos
computorizada (Computational Fluid Dynamycs - CFD) que o escoamento em torno de um
modelo computacional de uma mão, sugere que a força propulsiva produzida com um padrão
5
Measure Active Drag system, é um dispositivo que permite o cálculo da potência utilizada pelo nadador, em crol,
para superar a resistência mediante a mensuração da pressão exercida pelas mãos dos nadadores em pás fixas
a distâncias adaptadas.
17
35. _______________________________________________________________________Revisão da Literatura
de trajectória diagonal é ligeiramente menor quando comparado com um padrão de trajecto
directo para trás.
Dado que quando um nadador efectua um trajecto directo para trás, percorre uma menor
distância e, ao mesmo tempo, terá de usar maior força muscular para acelerar rapidamente, as
mãos e braços, até ao final da braçada de modo a manter uma pressão constante sobre as
massas de água já em movimento, parece razoável que o faça efectuando um trajecto mais
oblíquo. Este trajecto oblíquo origina um menor dispêndio energético e uma maior distância
por ciclo. Mesmo que tal implique uma ligeira redução na potência da braçada, embora não
confirmado experimentalmente, não significa que a totalidade da força propulsiva gerada por
uma braçada mais oblíqua não seja superior. Maglischo refere ainda que as acções verticais e
laterais da braçada são necessárias para que a aplicação da força se faça mais eficientemente.
Outro facto deriva dos vários estudos (Schleihauf, 1979) efectuados com modelos plásticos de
mãos que demonstram que, consoante os vários ângulos de ataque, se obtém maiores ou
menores valores de coeficiente de arrastamento propulsivo ou ascensional. Verificando-se
ainda, seg. Maglischo, que a maior parte dos nadadores talentosos, que serviram de base para a
construção dos modelos de estudo, usam ângulos de ataque entre os 50º e 70º o que indicia
uma maior produção de FpD em detrimento de L em pelo menos três das técnicas de nado,
ficando o bruços como uma possível excepção.
Thayer (1990) cit. por Maglischo (2003), apresenta resultados referentes à quantificação de L
e FpD em duas situações distintas de escoamentos (estacionário e dinâmico) usando um motor
que movimentava um modelo de um braço e mão. Estes dados mostram que em situação
estática (escoamento estacionário) os valores de FpD são inferiores aos verificados em situação
dinâmica, o que sugere que os valores de FpD produzidos pelos nadadores são superiores em
situação de nado real. Também podemos verificar que os valores de L são superiores aos de
FpD quando em situação estática e na porção média da fase subaquática, mostrando-se
inferiores a FpD ao longo de toda a fase da braçada, quando em situação dinâmica. Outro
aspecto importante e que vêm reforçar a necessidade de se estudar a dinâmica de fluidos em
situação de nado real é o facto de no estudo em causa, os valores de FpD são duas a três vezes
superiores aos valores de L produzidos durante toda a fase subaquática simulada pelo modelo.
18
36. _______________________________________________________________________Revisão da Literatura
Parece-nos pois, que os estudos em situação estática sobrevalorizam L em detrimento de FpD,
para a Rpef.
Maglischo refere ainda que os ângulos de ataque, usados pelos nadadores, não são mais do que
a tentativa destes para manter a palma da mão virada para trás durante as trajectórias diagonais
da fase subaquática. Este facto encontra concordância num outro estudo de Riewald & Bixler
(2001) onde são calculadas (através da análise por CFD) acelerações e velocidades da mão e
braço em situação de escoamento dinâmico, concluindo-se que: os nadadores devem manter
uma aceleração das suas superfícies propulsivas o máximo que puderem; as mãos devem
colocar-se numa posição que maximize FpD durante a fase de aceleração de um ciclo; o
máximo de força propulsiva produzida pelas mãos pode ser obtida posicionando a palma da
mão directamente para trás, mesmo que o trajecto da braçada seja oblíquo.
Para as técnicas alternadas, o crol tem sido, praticamente, o alvo privilegiado dos
investigadores, pelo que os estudos na técnica de costas são escassos e nem sempre realizados
em nadadores de elevado nível de rendimento desportivo.
2. DESEMPENHO E FADIGA EM NATAÇÃO
Não sendo o estudo ou caracterização da fadiga objectivo do nosso trabalho, devem-se a ela as
possíveis alterações no padrão técnico do nado e a impossibilidade de manter, no decorrer de
um esforço máximo, uma constância no desempenho. Seria pois incorrecto não fazer qualquer
menção, mesmo que resumida e sintética, dos seus aspectos mais importantes e determinantes
bem como da sua relação com a técnica e duração máxima da competição em causa.
2.1 DESEMPENHO E ENERGIA
Segundo Gomes Pereira (1994), a natação deve ser considerada como uma modalidade de
resistência, baseando a sua classificação em factores como as características das competições
19
37. _______________________________________________________________________Revisão da Literatura
reconhecidas oficialmente, as características do tipo de treino implantado e as particularidades
fisiológicas do nadador de alto nível.
Ainda segundo Silva (1997), é vital o conhecimento dos processos energéticos predominantes
numa determinada competição reconhecida oficialmente. Só assim será possível limitar e
atrasar os mecanismos desencadeadores de fadiga.
Como sabemos, a participação relativa de cada sistema de produção energética depende da
duração e da intensidade de execução. No nosso caso concreto, a distância máxima para uma
prova na técnica de costas são os 200 metros, que normalmente é caracterizada como um
esforço de elevada intensidade e curta duração, onde os sistemas, de produção de energia,
anaeróbio lácticos e aeróbios são fundamentais.
Vários estudos têm sido realizados no sentido de se quantificar as percentagens de
comparticipação dos diferentes sistemas de produção de energia relativamente às diferentes
distâncias, técnicas e tempo de competição (Troup & Daniels, 1986; Troup 1992; Maglischo,
1992; Alves 2000). Contudo se no relativo às distâncias extremas 50, 800 e 1500 metros os
resultados parecem ser homogéneos e concordantes, é nas distâncias mais frequentes, 100 e
200 metros principalmente, que assistimos aos resultados mais discordantes, reflectindo de
algum modo a multiplicidade de factores e condicionantes de vária ordem, que provocam
alguma variabilidade nos resultados.
No quadro 1, encontram-se resumidas, de modo abrangente e com a necessária margem, as
participações energéticas relativas de cada sistema de produção em relação a cada uma das
distâncias competitivas.
20
38. _______________________________________________________________________Revisão da Literatura
Quadro 1: Participação relativa de cada uma das fontes energéticas para a distância da
competição. (adp. de Alves, 2000)
Distância (%) Anaeróbio (%) Anaeróbio (%) Aeróbio
(m) Aláctico Láctico
50 20-50 10-30 10-20
100 30-60 20-40 20-30
200 15-30 35-45 35-55
400 8-15 15-25 60-75
800 5-8 6-12 80-90
1500 1-3 5-10 88-94
Podemos pois sintetizar que, apesar de haver alguma margem de variabilidade na maior ou
menor preponderância dos processos aeróbio e anaeróbio láctico, no que concerne à sua
comparticipação para a produção energética total referente a uma prova de 200 metros, não
parece haver dúvidas de que a capacidade láctica secundada pela potência aeróbia, são
determinantes para a prestação em 200 metros.
A técnica de costas é considerada como a 2ª técnica mais económica, logo a seguir a crol no
que se reporta ao seu custo energético (Holmér, 1975; Cappeli et al., 1998; Pendergast et al.,
1997, 1998). De facto esta relativa economia de nado é comum às técnicas alternadas, cujas
acções permitem menores variações da velocidade intracíclica. Assim, a distribuição mais
uniforme das acções propulsivas ao longo do ciclo gestual, demonstra um factor de eficiência
de nado fundamental (Alves et al., 1994b)
É de notar que foram encontrados em nadadores de nível técnico elevado, valores de custo
energético próximos ou ligeiramente inferiores aos de crol (Alves et al., 1994a, 1995).
2.2 A FADIGA
A fadiga pode assumir várias formas, local, geral a nível central e periférico de cariz
neuromuscular, ao nível psicológico, entre outras formas.
Para Gomes Pereira (1992), existirão tantos tipos de fadiga quantos os processos de energia e
as condições em que ocorrem.
21
39. _______________________________________________________________________Revisão da Literatura
Costill et al. (1992), refere que a fadiga resulta de uma variedade e complexidade de
fenómenos que implicam diversos aspectos dos processos de produção energética, tornando-se
muito difícil identificar um só factor. Podemos no entanto identificar os pressupostos teóricos,
mais vulgarmente aceites, e que procuram explicar as causas de fadiga:
· deplecção da energia necessária para o nado de Sprint;
· acumulação de produtos derivados do metabolismo (Ex: ácido láctico);
· alterações no equilíbrio electrolítico do músculo;
· alterações no processo de coordenação neuromuscular.
Ainda Wilmore & Costill, (1999) consideram que alguns dos sinais que mostram a sua
presença são, a diminuição da velocidade de execução de um determinado gesto técnico e a
diminuição dos níveis de produção de força sub-máximos.
A discussão em torno da etiologia da fadiga e das suas várias manifestações é vasta e ainda
longe da sua compreensão total. Todavia não caberá neste espaço o seu estudo mais
pormenorizado, dado que a nossa preocupação se dirige para os seus efeitos, mais frequentes e
facilmente observados na prestação competitiva, concretamente, na técnica de nado.
Lembremos que um dos aspectos discriminantes dos nadadores de alto nível,
comparativamente aos restantes, diz respeito à capacidade que os primeiros têm de conseguir
nadar mais tempo à velocidade máxima, mantendo mais estáveis os seus padrões de execução
técnica.
Para uma prova de 200 metros, podemos referir sinteticamente alguns dos aspectos que a
limitam:
· a taxa de produção de energia à custa do ATP-CP6 e o nível de creatina armazenado;
· a taxa de produção de energia à custa do sistema Anaeróbio láctico, sobretudo no que
se refere à sua capacidade;
· a capacidade de tamponamento do ácido láctico;
· a velocidade de nado e a capacidade neuromuscular de a manter;
· a potência do sistema aeróbio, embora numa menor importância.
6
ATP/CP – Sistema Anaeróbio aláctico ou da fosfocreatina.
22
40. _______________________________________________________________________Revisão da Literatura
2.3 ALTERAÇÕES DOS PARÂMETROS DE CICLO DECORRENTES DA FADIGA
Para a compreensão da influência da fadiga na prestação importará perceber, para além dos
mecanismos da própria fadiga, quais as variáveis biomecânicas que determinam uma boa
prestação, leia-se velocidade de nado (VN), e que mais são influenciadas pelos referidos
mecanismos de fadiga.
Para vários autores (East, 1971; Craig et al., 1979; Craig & Pendergast, 1979; Hay &
Guimarães, 1983; Vilas Boas, 1987; Alves et al., 1991; Silva, 1999; Smith et al., 2002) as
variáveis biomecânicas relacionam-se com a prestação mecânica da técnica e aplicam-se à
VN7 que por sua vez depende de dois parâmetros: a frequência gestual ou frequência de ciclo
(Fc) e a distância de ciclo (Dc).
Compreende-se pois que a VN dependerá da variação de qualquer um dos outros termos da
expressão. Mais, existe uma relação negativa entre Dc e Fc (Arellano et al., 1994; Adrian et al,
1995), o que implica que Dc pode ser aumentada se reduzirmos a Fc e vice-versa. Importa
ainda reparar que as referidas variações de Fc e Dc podem acontecer sem que entanto a VN
sofra qualquer alteração, donde nem sempre um aumento isolado de um dos termos referidos
terá efeitos benéficos na prestação.
No que concerne às variações da VN em situação de competição, a diversa literatura existente
é mais ou menos consensual no que se refere à sua variação e tendências. Podemos constatar
ainda que para as provas de 200m a VN sofre uma progressiva redução nos sucessivos parciais
de 50m embora, por vezes, no último parcial a VN possa aumentar sem contudo atingir os
valores do primeiro (Madeira & Alves, 1995).
No estudo de Craig & Pendergast (1979), foram igualmente analisadas as variáveis Fc e Dc
para as quatro técnicas. Como é comum verificar, a VN aumentou como resultado de um
aumento da Fc tendo Dc decrescido ligeiramente. Para a técnica de costas, à semelhança de
crol, os nadadores que obtiveram valores de VN mais elevados possuíam as Dc mais elevadas
para VN mais reduzidas o que parece indiciar alguma economia de nado. Os mesmos
7
Velocidade de nado é dada por VN(m/s) = Fc(ciclos/min) x Dc(m/ciclo) /60
23
41. _______________________________________________________________________Revisão da Literatura
nadadores apresentaram, também, maiores diminuições percentuais na Dc para VN máximas,
quando comparados com nadadores menos rápidos.
Ainda Craig et al. (1985) e Hay & Guimarães (1983) mostram as variações de VN e as suas
duas variáveis ao longo de uma prova. Assim, com excepção da última parte da prova, a Dc e
VN diminuem normalmente ao longo da mesma, não tendo sido encontrado um padrão
semelhante para a Fc. Deste modo os autores referem que Dc, mais do que Fc, constituirá um
factor determinante da Velocidade média de nado (VNm).
No mesmo estudo, Hay & Guimarães verificaram que as melhorias na VN ao longo de uma
época se ficaram a dever ao aumento da Dc sem que Fc diminuísse.
Alves et al. (1991) resume a maior parte dos estudos realizados até à data nesta matéria, e
destaca alguns pontos tendênciais relativamente à variação das variáveis biomecânicas:
· a VN sofre redução por percurso nas provas até os 400m, tendo os nadadores de nível
desportivo mais baixo uma acentuação da curva descendente de VN;
· a Dc tem um comportamento semelhante à VN, diminuindo ao longo da prova;
· existe uma tendência geral para o aumento da Fc à medida que a prova decorre e a
fadiga se instala, apresentado os nadadores de nível mais elevado, Fc mais altas para as
provas de 100m e 200m costas.
Adrian et al. (1995) citando Weiss et al. (1988) afirma que os nadadores mais rápidos não só
conseguem percorrer distâncias maiores em cada ciclo de braços, desde o início da prova,
como conseguem perder menos distância, em cada ciclo, quando a fadiga começa a instalar-se
no final da prova.
Vorontsov & Rumyantsev (2000) afirmam que embora a mesma VN possa ser obtida fazendo
variar de diversas formas Fc e Dc, estas apresentam alguma variabilidade inter-individual,
existindo limites a partir dos quais os valores de Fc e Dc não são benéficos para a eficiência de
nado. Assim, valores excessivos de Fc perturbam a coordenação e a correcta aplicação de
força, do mesmo modo para valores excessivos de Dc consequências ao nível da intensidade
24
42. _______________________________________________________________________Revisão da Literatura
de esforço poderão ocorrer, nomeadamente o aumento da fracção anaeróbia da produção
energética total. Ainda segundo aqueles autores, um nadador deverá assim optar pela melhor
relação Fc/Dc, sendo o objectivo principal do treino técnico o desenvolvimento maximal de
Dc para uma determinada e confortável Fc.
Segundo Winter (1990) a curva que nos dá a optimização da frequência gestual, em termos de
custo energético, para uma dada velocidade de deslocamento tem um carácter parabólico.
Deste modo, os desvios relativamente à amplitude escolhida definem uma curva em U, o que
implica que qualquer variação da frequência gestual em torno do seu valor óptimo para cada
indivíduo, se traduz no aumento do custo energético.
Esta opinião é partilhada por Craig et al. (1985) de que a VNm obtida em competição será
resultado da combinação optimizada de Fc e Dc. A Dc pode assim ser considerada como um
dos factores discriminantes entre nadadores de bom nível técnico e nadadores de nível médio
ou medíocre (Alves, 1995).
Como veremos algumas investigações mais recentes, mostram contudo, que a utilização de Dc
deverá ser comedida, sobretudo quando a pretendemos utilizar como variável discriminativa
junto de nadadores de elite, encontrando-se muito esporadicamente correlações significativas
entre aquele parâmetro e a prestação.
Riewald (2001) no seu estudo junto dos nadadores finalistas e semifinalistas de todas as
provas dos Jogos Olímpicos de Sydney 2000, calculou uma Dc normalizada para a altura,
esperando assim encontrar resultados que pudessem suportar a hipótese de que Dc é
determinante para VN e para a prestação competitiva. Verificou todavia não existirem
diferenças significativas para Dc nos grupos de nadadores em questão, apesar dos nadadores
finalistas nadarem com Dc maiores do que os semifinalistas, avançando para a necessidade de
se entrarem em linha de conta com outras variáveis antropométricas na normalização de Dc.
Não esqueçamos ainda que, a este nível competitivo, os nadadores semifinalistas farão
também parte da elite pelo que, as determinantes de sucesso nem sempre serão determinantes
(com significado estatístico).
25
43. _______________________________________________________________________Revisão da Literatura
Chatard et al. (2001) e Girold et al. (2001) analisaram as competições e as estratégias
específicas, dos finalistas e semifinalistas na prova de 200m costas femininos e masculinos
nos jogos Olímpicos de Sydney. Verificaram assim, que as mulheres medalhadas nadaram
significativamente mais rápido, em todos os parciais de 50m, quando comparadas com as
finalistas não medalhadas, fazendo-o à custa de maiores Fc e menores Dc. Resultados
idênticos foram obtidos para os homens no que diz respeito à Dc e Fc, enquanto que no que se
refere aos parciais de 50m, embora nadando mais rápido em todos eles, os medalhados não o
fizeram com diferenças estatisticamente significativas.
Existe ainda outro parâmetro designado de índice de ciclo (IC) e que Costill et al. (1985)
define o como sendo o resultado do produto entre VNm e Dc, e que Lavoie et al. (1985) cit. por
Alves (1995) sugeriu que poderia ser um parâmetro de avaliação da “economia de ciclo” e que
portanto, possibilitaria a estimativa, indirecta, da eficiência de nado em condições práticas de
treino ou competição com base na mensuração do ciclo gestual e na VN. Segundo Vilas Boas
(1992b), quanto maior o Ic maior será a adequação mecânica da técnica.
Sanchez et al. (2002) ao analisarem o IC e as restantes variáveis biomecânicas VN, Dc e Fc
numa amostra8 considerável de nadadores, verificaram que a técnica de costas era a mais
eficiente logo a seguir a crol, e curiosamente para o IC, foi aquela que menos influência sofreu
com o aumento da distância, independentemente do sexo. Consideram os autores que o IC
poderá, assim, ser usado como um indicador do nível de prestação, já que na competição
internacional os valores de IC foram significativamente superiores para todas as técnicas,
quando comparados com os valores da competição nacional.
3. EFICIÊNCIA PROPULSIVA E ANTROPOMETRIA
As características antropométricas desempenham na natação um papel determinante, com
influências decisivas em aspectos como as qualidades hidrodinâmicas (Hay & Guimarães,
8
Amostra de 313 nadadores do I campeonato do mundo de piscina curta e 420 nadadores do 37º campeonato
nacional de Espanha de Inverno.
26
44. _______________________________________________________________________Revisão da Literatura
1983), influenciando também os aspectos da capacidade de produção de Fp (Grimston & Hay,
1986).
Ao longo dos vários anos têm-se procurado diferenciar um perfil morfológico típico do
nadador em função das suas especialidades. Os objectivos principais desta pesquisa prendem-
se com a definição de indicadores para a detecção de talentos, mas também e sobretudo para a
compreensão das correlações possíveis entre alguns dados antropométricos e os mecanismos
complexos da biomecânica da natação. Apesar dos inúmeros estudos já realizados neste
âmbito, não são fáceis as delimitações absolutas das características antropométricas e da sua
relação com a prestação.
Os vários trabalhos no âmbito da antropometria, desenvolvidos por Lindsey Carter (1984,
1985) e Lindsey Carter & Ackland (1994), formam, sem dúvida, uma imensa base de dados de
elevado nível qualitativo e quantitativo referentes à população de atletas de alto nível
desportivo. A natação em particular muito ganhou nesta procura da tipificação, possível, do
perfil antropométrico de nadadores de elevado nível.
Se a totalidade dos aspectos antropométricos não é fácil de se correlacionar com a prestação
em natação, existem contudo algumas variáveis determinantes.
Partindo de um estudo que procurava estabelecer relações entre a forma corporal e a
resistência total na água, Clarys et al. (1974) concluem que as principais influências na
resistência são: 1) o Coeficiente de magreza -Coefficient of Slenderness- ou seja a altura
dividida pela raiz cúbica do volume total do corpo; 2) o quadrado da altura dividido pela área
da superfície corporal do nadador. Quanto maiores estes valores maior será a resistência
encontrada, o que sugere que parâmetros como a altura, a superfície corporal total e a área de
secção transversa determinem o sucesso do nadador.
Sprague (1976) num estudo efectuado em nadadores de várias idades correlacionou
positivamente diversas variáveis antropométricas com a velocidade de nado. Assim, a altura
em relação à idade e o comprimento do pé em relação à altura, são correlacionadas
positivamente com a velocidade de nado.
27