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O novo
jornalismo
da Realidade                                               REVISTA REALIDADE 1966–1968: Tempo da re-
                                                           portagem na imprensa brasileira, de J.A. Faro, é
                                                           um mergulho na saudade, na beleza e na
                                                           nostalgia. Fala de um tempo no qual o Bra-
                                                           sil despertava para a “modernidade”, am-
                                                           pliava horizontes, derrubava tabus. Cami-
                                                           nhando junto com a recém imposta ditadu-
                                                           ra militar, o país se debatia entre o arcaís-
                                                           mo e as mudanças revolucionárias nos cos-
                                                           tumes e na cultura. No meio disso tudo
                                                           acontece o projeto Realidade, uma revista
                                                           que, amparada no espírito do tempo, pro-
                                                           vocou uma mudança radical na maneira de
                                                           fazer jornalismo.
                                                                 Jogando peso na questão cultural,
                                                           Faro consegue estabelecer de forma clara
                                                           como a revista vai se desenhando no cená-
                                                           rio brasileiro e, ao mesmo tempo, redese-
                                                           nhando o próprio cenário a partir de suas
                                                           matérias. Com textos belos, provocativos,
                                                           literários, as reportagens se utilizam do ex-
                                                           tremo realismo para narrar as mazelas soci-
                                                           ais e políticas do país. “Não era só um mo-
                                                           vimento estético-literário”, diz o autor. Ha-
                                                           via um cumplicidade patente com toda a
                                                           revolução cultural que se esboçava na dé-
                                                           cada de 60 e, mais do que isso, havia o de-
                                                           sejo sincero dos jornalistas que faziam a re-
                                                           vista em transformar a cara do país. Naque-
                                                           les dias, a ditadura ainda não havia mostra-
                                                           do sua face mais terrível e havia esperança.
                                                                 A análise de J. A . Faro parte da dis-
                                                           cussão de como foi a formação cultural do
                                                           povo brasileiro, a construção da identida-
                                                           de, a formação do nacionalismo e a obses-
                                                           são de se criar uma imagem nacional unifi-
                                                           cadora. Depois, discute como a indústria
                                                           cultural interfere e influi na produção naci-
                                                           onal, sem contudo determiná-la, fazendo
                                                           questão de frisar que há uma diferença ra-
Elaine Tavares                                             dical no que seja a imprensa em geral, que
Prof. do Depto. de Jornalismo da Univale (SC)              chama de técnica, e o jornalismo, que cha-
Mestranda em Comunicação – PPGC/PUCRS.                     ma de discurso.


136 Revista FAMECOS • Porto Alegre • nº 12 • junho 2000 • semestral
Para ele, a revista Realidade trabalha     seu tempo.
com a abolição dos limites do discurso ra-              Os anos 60 eram tempos de ebulição.
cionalista e tenta superar o caráter mutila-     O mundo todo era sacudido por mudanças
dor da ideologia do cotidiano, abolindo          que iriam transformar para sempre a cara
sem dó nem piedade o mito da objetivida-         do planeta. O Brasil também estava inseri-
de. Os textos de Realidade são construções       do nisso e foi essa percepção, de que havia
literárias, carregadas de impressionismo,        um mundo em mudança, que fez a diferen-
onde o repórter anda, sente, cheira, sente       ça na revista Realidade. Valores até então in-
dor. É um texto quase cinematográfico, que       tocáveis como a idéia de família, por
vai descortinando as personagens, trazen-        exemplo, eram pautas permanentes na re-
do-as às retinas do leitor. Uma narrativa        vista. Aborto, contracepção, feminismo, di-
que rompe com a maneira convencional de          vórcio, jovens transviados, igreja progres-
fazer jornalismo, introduzindo elementos         sista, tudo isso era discutido de forma
ficcionais e de verossimilhança. “Na Reali-      aberta, com várias visões, deixando ao lei-
dade o repórter tinha que se colocar como        tor a possibilidade de tomar posição.
um pesquisador, nenhum detalhe, nenhu-                  No trabalho de Faro cada tema desses
ma personagem, nenhuma causa e efeito,           é discutido com vagar. Há um capítulo es-
nada podia faltar. Texto igual só no new         pecífico para a mulher, a igreja, a política, a
jornalismo americano”, diz Faro.                 economia, a sociedade, visões de mundo,
      Como uma boa história, o livro vai         América Latina, cotidiano, ciência, educa-
carregando a gente pelo mundo da reporta-        ção, vida urbana. E em cada um deles se
gem. E das páginas saltam João do Rio e          pode encontrar parte dos textos originais
Euclides da Cunha, os precursores dessa          publicados na revista. Trata-se, pois, de um
categoria hoje quase em extinção: o repór-       livro que todo o bom jornalista deveria ler,
ter. Faro lembra que tanto um quanto o ou-       para se deliciar com as construções narrati-
tro não chegaram a inaugurar uma escola,         vas daquele grupo de repórteres que ou-
pois faziam sua obra de forma isolada. Eu-       sou sair dos velhos caminhos, da estrada
clides, narrando Canudos; João do Rio, re-       asfaltada do jornalismo convencional, e se
velando a vida real das ruas, dos bairros        perder nos labirintos das estradas secundá-
do velho Rio. Depois o autor vai contextua-      rias, da experimentação, da beleza, da au-
lizando historicamente a trajetória da re-       toria.
portagem pelos anos 30 e 40, até os anos 50,            O autor encerra seu trabalho sobre es-
quando a revista O Cruzeiro amplia a idéia       ses primeiros dois anos da revista Realidade
desse gênero narrativo.                          afirmando que ela foi mesmo um divisor
      O projeto Realidade, nos anos 60, vai      de águas, que mudou concepções, que
ser então o ponto culminante da reporta-         abriu caminhos para reformulações até no
gem no Brasil. E é sobre ele que Faro dis-       jornalismo diário, como no Jornal da Tarde,
corre, mostrando quem eram os jornalistas        que materializou a utopia do texto inde-
que produziam as reportagens, de onde vi-        pendente. Mas, segundo ele, esse tipo de
nham, quais seus projetos políticos. Acaba       jornalismo foi fruto de uma determinada
revelando que havia uma estreita relação         conjuntura, de um momento histórico bem
entre aquelas pessoas e os anseios sociais,      específico no país. Encerra dizendo que
típicos daqueles tempos. Havia um país           pensar em retomar esse projeto é absoluta-
que queria compreender-se e havia um             mente impossível.
grupo, articulado numa determinada pu-                  Depois de viajar por cada letrinha da
blicação, que estava disposto a desvendar        bem construída história de Faro, esse final
esse país, compreendendo-o e compreen-           deixa um gosto meio amargo na boca. E
dendo-se. O profissional da imprensa, na         remete a uma reflexão sobre sua conclusão
Realidade, é mostrado como um militante do       tão definitiva. A história é sempre um tur-


                                      Revista FAMECOS • Porto Alegre • nº 12 • junho 2000 • semestral   137
bilhão e, se considerarmos o seu movimen-
to contínuo, quem garante que esse texto
impressionista não possa voltar, dialética-
mente, num outro nível, de uma outra for-
ma?
       O jornalismo belo, utópico, impressi-
onista, realista, de autor, continua aí laten-
te, talvez um pouco escondido nas estradas
laterais, secundárias, nos jornais alternati-
vos, nos jornais comunitários, em algumas
publicações do interior, e até nos grandes
veículos nacionais. Talvez seja necessária
uma nova conjuração de astros, como a que
houve em 60, para que esse tipo de jorna-
lismo venha a ser, se não hegemônico, pelo
menos mais visível. Mas que ele ainda
existe, disso não tenho dúvidas. Assim sen-
do, retomá-lo não é impossível. Impossível
é não acreditar que ainda é possível fazer
reportagem com o mesmo amor, com a
mesma gana, com o mesmo compromisso
político-social daqueles que fizeram acon-
tecer a Realidade.
       FARO, J. A. – Revista Realidade 1966–
1968: Tempo da reportagem na imprensa brasi-
leira. Canoas,RS: Editora da Ulbra, 1999 s




138 Revista FAMECOS • Porto Alegre • nº 12 • junho 2000 • semestral

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O Novo Jornalismo da Realidade

  • 1. RESENHA O novo jornalismo da Realidade REVISTA REALIDADE 1966–1968: Tempo da re- portagem na imprensa brasileira, de J.A. Faro, é um mergulho na saudade, na beleza e na nostalgia. Fala de um tempo no qual o Bra- sil despertava para a “modernidade”, am- pliava horizontes, derrubava tabus. Cami- nhando junto com a recém imposta ditadu- ra militar, o país se debatia entre o arcaís- mo e as mudanças revolucionárias nos cos- tumes e na cultura. No meio disso tudo acontece o projeto Realidade, uma revista que, amparada no espírito do tempo, pro- vocou uma mudança radical na maneira de fazer jornalismo. Jogando peso na questão cultural, Faro consegue estabelecer de forma clara como a revista vai se desenhando no cená- rio brasileiro e, ao mesmo tempo, redese- nhando o próprio cenário a partir de suas matérias. Com textos belos, provocativos, literários, as reportagens se utilizam do ex- tremo realismo para narrar as mazelas soci- ais e políticas do país. “Não era só um mo- vimento estético-literário”, diz o autor. Ha- via um cumplicidade patente com toda a revolução cultural que se esboçava na dé- cada de 60 e, mais do que isso, havia o de- sejo sincero dos jornalistas que faziam a re- vista em transformar a cara do país. Naque- les dias, a ditadura ainda não havia mostra- do sua face mais terrível e havia esperança. A análise de J. A . Faro parte da dis- cussão de como foi a formação cultural do povo brasileiro, a construção da identida- de, a formação do nacionalismo e a obses- são de se criar uma imagem nacional unifi- cadora. Depois, discute como a indústria cultural interfere e influi na produção naci- onal, sem contudo determiná-la, fazendo questão de frisar que há uma diferença ra- Elaine Tavares dical no que seja a imprensa em geral, que Prof. do Depto. de Jornalismo da Univale (SC) chama de técnica, e o jornalismo, que cha- Mestranda em Comunicação – PPGC/PUCRS. ma de discurso. 136 Revista FAMECOS • Porto Alegre • nº 12 • junho 2000 • semestral
  • 2. Para ele, a revista Realidade trabalha seu tempo. com a abolição dos limites do discurso ra- Os anos 60 eram tempos de ebulição. cionalista e tenta superar o caráter mutila- O mundo todo era sacudido por mudanças dor da ideologia do cotidiano, abolindo que iriam transformar para sempre a cara sem dó nem piedade o mito da objetivida- do planeta. O Brasil também estava inseri- de. Os textos de Realidade são construções do nisso e foi essa percepção, de que havia literárias, carregadas de impressionismo, um mundo em mudança, que fez a diferen- onde o repórter anda, sente, cheira, sente ça na revista Realidade. Valores até então in- dor. É um texto quase cinematográfico, que tocáveis como a idéia de família, por vai descortinando as personagens, trazen- exemplo, eram pautas permanentes na re- do-as às retinas do leitor. Uma narrativa vista. Aborto, contracepção, feminismo, di- que rompe com a maneira convencional de vórcio, jovens transviados, igreja progres- fazer jornalismo, introduzindo elementos sista, tudo isso era discutido de forma ficcionais e de verossimilhança. “Na Reali- aberta, com várias visões, deixando ao lei- dade o repórter tinha que se colocar como tor a possibilidade de tomar posição. um pesquisador, nenhum detalhe, nenhu- No trabalho de Faro cada tema desses ma personagem, nenhuma causa e efeito, é discutido com vagar. Há um capítulo es- nada podia faltar. Texto igual só no new pecífico para a mulher, a igreja, a política, a jornalismo americano”, diz Faro. economia, a sociedade, visões de mundo, Como uma boa história, o livro vai América Latina, cotidiano, ciência, educa- carregando a gente pelo mundo da reporta- ção, vida urbana. E em cada um deles se gem. E das páginas saltam João do Rio e pode encontrar parte dos textos originais Euclides da Cunha, os precursores dessa publicados na revista. Trata-se, pois, de um categoria hoje quase em extinção: o repór- livro que todo o bom jornalista deveria ler, ter. Faro lembra que tanto um quanto o ou- para se deliciar com as construções narrati- tro não chegaram a inaugurar uma escola, vas daquele grupo de repórteres que ou- pois faziam sua obra de forma isolada. Eu- sou sair dos velhos caminhos, da estrada clides, narrando Canudos; João do Rio, re- asfaltada do jornalismo convencional, e se velando a vida real das ruas, dos bairros perder nos labirintos das estradas secundá- do velho Rio. Depois o autor vai contextua- rias, da experimentação, da beleza, da au- lizando historicamente a trajetória da re- toria. portagem pelos anos 30 e 40, até os anos 50, O autor encerra seu trabalho sobre es- quando a revista O Cruzeiro amplia a idéia ses primeiros dois anos da revista Realidade desse gênero narrativo. afirmando que ela foi mesmo um divisor O projeto Realidade, nos anos 60, vai de águas, que mudou concepções, que ser então o ponto culminante da reporta- abriu caminhos para reformulações até no gem no Brasil. E é sobre ele que Faro dis- jornalismo diário, como no Jornal da Tarde, corre, mostrando quem eram os jornalistas que materializou a utopia do texto inde- que produziam as reportagens, de onde vi- pendente. Mas, segundo ele, esse tipo de nham, quais seus projetos políticos. Acaba jornalismo foi fruto de uma determinada revelando que havia uma estreita relação conjuntura, de um momento histórico bem entre aquelas pessoas e os anseios sociais, específico no país. Encerra dizendo que típicos daqueles tempos. Havia um país pensar em retomar esse projeto é absoluta- que queria compreender-se e havia um mente impossível. grupo, articulado numa determinada pu- Depois de viajar por cada letrinha da blicação, que estava disposto a desvendar bem construída história de Faro, esse final esse país, compreendendo-o e compreen- deixa um gosto meio amargo na boca. E dendo-se. O profissional da imprensa, na remete a uma reflexão sobre sua conclusão Realidade, é mostrado como um militante do tão definitiva. A história é sempre um tur- Revista FAMECOS • Porto Alegre • nº 12 • junho 2000 • semestral 137
  • 3. bilhão e, se considerarmos o seu movimen- to contínuo, quem garante que esse texto impressionista não possa voltar, dialética- mente, num outro nível, de uma outra for- ma? O jornalismo belo, utópico, impressi- onista, realista, de autor, continua aí laten- te, talvez um pouco escondido nas estradas laterais, secundárias, nos jornais alternati- vos, nos jornais comunitários, em algumas publicações do interior, e até nos grandes veículos nacionais. Talvez seja necessária uma nova conjuração de astros, como a que houve em 60, para que esse tipo de jorna- lismo venha a ser, se não hegemônico, pelo menos mais visível. Mas que ele ainda existe, disso não tenho dúvidas. Assim sen- do, retomá-lo não é impossível. Impossível é não acreditar que ainda é possível fazer reportagem com o mesmo amor, com a mesma gana, com o mesmo compromisso político-social daqueles que fizeram acon- tecer a Realidade. FARO, J. A. – Revista Realidade 1966– 1968: Tempo da reportagem na imprensa brasi- leira. Canoas,RS: Editora da Ulbra, 1999 s 138 Revista FAMECOS • Porto Alegre • nº 12 • junho 2000 • semestral