Este estudo caracterizou a mineralização do carbono em amostras de cama de frango e seu biocarvão. A taxa de mineralização do carbono foi maior na cama de frango (49,7%) do que no biocarvão (5,1%), indicando que o biocarvão é mais estável. O tratamento dos solos com biocarvão aumentou sua capacidade de troca catiônica devido ao aumento do pH. Ambos os materiais, cama de frango e biocarvão, melhoraram o teor de carbono no solo.
Efeitos do biocarvão de cama de frango na CTC e mineralização do carbono no solo
1. Pesq. agropec. bras., Brasília, v.50, n.5, p.407-416, maio 2015
DOI: 10.1590/S0100-204X2015000500008
Mineralização e efeitos de biocarvão de cama de frango
sobre a capacidade de troca catiônica do solo
Cristiano Alberto de Andrade(1)
, Maria Paula Silveira Bibar(2)
, Aline Reneé Coscione(3)
,
Adriana Marlene Moreno Pires(1)
e Álvaro Guedes Soares(4)
(1)
Embrapa Meio Ambiente, Rodovia SP 340, Km 127,5, Caixa Postal 69, CEP 13820‑000 Jaguariúna, SP, Brasil. E‑mail:
cristiano.andrade@embrapa.br, adriana.pires@embrapa.br (2)
JBS Ambiental, Rodovia BR 040, Km 22,5, Caixa Postal 44, Zona Rural,
CEP 72814‑970 Luziânia, GO, Brasil. E‑mail: paulabibar@yahoo.com.br (3)
Instituto Agronômico, Laboratório de Qualidade do Solo, Avenida Barão
de Itapura, no
1.481, Caixa Postal 28, CEP 13012‑970 Campinas, SP, Brasil. E‑mail: aline@iac.sp.gov.br (4)
SPPT Pesquisas Tecnológicas Ltda.,
Avenida Geraldo Potiguara Silveira Franco, no
950, Parque da Empresa, CEP 13803‑280, Mogi Mirim, SP, Brasil. E‑mail: alvaro@sppt.com.br
Resumo – O objetivo deste trabalho foi caracterizar o processo de mineralização do C em amostras de cama
de frango e de seu respectivo biocarvão, além de determinar a capacidade de troca catiônica (CTC) e as taxas
de mineralização do C nos solos tratados com cama de frango e biocarvão. A mineralização do C foi avaliada
em experimento com quantificação do C‑CO2 liberado a partir de incubação (64 dias) de misturas de solo com
cama de frango e de solo com biocarvão, em doses equivalentes a 0, 1.000, 2.000, 4.000 e 8.000 mg kg‑1
de
C. Ao final da incubação, determinaram-se, nas amostras de solo, o teor de C, o pH e a CTC. A mineralização
do C dos materiais obedeceu à cinética química de primeira ordem. Os fluxos de C‑CO2 foram mais intensos
dos 20 aos 40 dias de incubação, seguidos da redução desses fluxos até a estabilização no tempo. As taxas de
mineralização do C da cama de frango e de seu biocarvão foram respectivamente de 49,7 e 5,1%. Incrementos
da CTC foram observados nos tratamentos com biocarvão, em consequência da elevação do pH, e, em ambos
os materiais, em consequência de alterações do teor de C no solo.
Termos para indexação: biochar, carbono do solo, mineralização do carbono, pH do solo, sequestro de carbono,
taxa de mineralização.
Mineralization and effects of poultry litter biochar on soil
cation exchange capacity
Abstract – The objective of this work was to characterize carbon mineralization process in poultry litter samples
and in its biochar, as well as to determine the soil cation exchange capacity (CEC) and the C mineralization rates
in soils treated with poultry litter and biochar. Carbon mineralization was evaluated through the quantification
of released C‑CO2 from mixtures of soil and poultry litter and of soil and biochar at doses equivalent to 0,
1,000, 2,000, 4,000, and 8,000 mg kg‑1
C, in a 64‑day incubation experiment. At the end of the incubation
period, carbon content, pH, and CEC were determined in soil samples. Carbon mineralization of the materials
fitted to first order kinetics equation. Fluxes of C‑CO2 were more intense from 20 to 40 days of incubation,
followed by flux decreases until their stabilization. Carbon mineralization rates of poultry litter and its biochar
were respectively 49.7 and 5.1%. Increases of CEC were observed in the biochar treatments, as a consequence
of pH rising, and in both materials due to soil‑carbon content alterations.
Index terms: biochar, soil carbon, carbon mineralization, soil pH, carbon sequestration, mineralization rate.
Introdução
O solo agrícola – entendido como compartimento
global que regula fluxos de matéria e energia com a
hidrosfera, atmosfera e biosfera – tem remetido à ideia
de qualidade do sistema edáfico relacionada às suas
funções no ambiente e a promoção da produção agrícola
(Doran & Parkin, 1994; Araújo et al., 2012). Pelo fato
de a qualidade do solo não ser diretamente mensurável,
utilizam-se indicadores para essa avaliação, dentre os
quais destaca-se o status de carbono (C) ou de matéria
orgânica edáfica no solo (Reeves, 1997; Vezzani &
Mielniczuk, 2009). Nesse sentido, sistemas produtivos
vêm sendo redesenhados de forma a privilegiar
aportes de C e minimizar perdas, estas últimas
caracterizadas principalmente pela emissão de CO2,
em consequência da atividade microbiana edáfica.
O plantio direto – com rotação de culturas, múltiplos
ciclos produtivos no ano e mobilização do solo restrita
à linha de plantio/semeadura – é exemplo e síntese de
2. 408 C.A. de Andrade et al.
Pesq. agropec. bras., Brasília, v.50, n.5, p.407-416, maio 2015
DOI: 10.1590/S0100-204X2015000500008
eficiência no sequestro de C pelo solo (Corazza et al.,
1999; Lovato et al., 2004; Seben Júnior et al., 2014).
Outras alternativas, também fundamentais no balanço
entre aportes e saídas, passam pela aplicação de fonte
externa de C no solo, como na reciclagem agrícola de
resíduos orgânicos.
A pirólise da biomassa à temperatura máxima
de 700o
C e com baixa ou zero concentração de O2
tende a incrementar a estabilidade de C no biocarvão
produzido, em comparação à biomassa original
(Lehmann et al., 2006). Assim, a aplicação do
biocarvão deve representar alternativa mais efetiva
para o sequestro de C em sistemas agrícolas. Entretanto,
permanecem dúvidas acerca da influência do biocarvão
sobre a dinâmica da matéria orgânica original do solo
(Steinbeiss et al., 2009) e sobre a ocorrência de outros
benefícios, normalmente associados à elevação do teor
de C edáfico. Em consequência da maior estabilidade
dos compostos de carbono no biocarvão, em relação
aos compostos orgânicos de resíduos vegetais e do
solo, decréscimos da matéria orgânica original do solo
podem ser esperados (Wardle et al., 2008).
Em consequência da expansão do setor avícola
no Brasil, de 1,7 para 12,3 milhões de t por ano de
carne de frango, de 1987 a 2013 (União Brasileira de
Avicultura, 2007, 2014), e da proibição de uso da cama
de frango na alimentação animal (União Brasileira de
Avicultura, 2007, 2014), um excesso desse resíduo é
gerado. Entre as alternativas para destinação final da
cama de frango tem-se seu uso direto no solo agrícola,
comofontedematériaorgânicaenutrientes,ouusoapós
compostagem para esta mesma finalidade; ou, ainda, a
produção de energia e biofertilizante em biodigestores.
A pirólisedacamadefrangoparaobtençãodebiocarvão
representaria uma opção adicional para reciclagem
desse resíduo na agricultura, principalmente visando
sequestro de C no solo. No entanto, o sequestro de
C no solo não deve ser a motivação exclusiva para
o uso agrícola de biocarvão, pois os pagamentos por
serviços ambientais e créditos de carbono não estão
bem estabelecidos ou regulamentados (Cunha et al.,
2013). O estabelecimento da relação entre possíveis
incrementos de C, em solos tratados com biocarvão,
e benefícios outros associados a tais incrementos
tornam-se fundamentais. Ao se considerar que a fração
orgânica, em solos muito intemperizados, responde
por 56 a 91% da CTC (Van Raij, 1969), uma motivação
interessante seria o uso de biocarvão para aumento da
CTC. Os biocarvões apresentam variação na CTC em
função, principalmente, da biomassa utilizada como
matéria prima (Singh et al., 2010) e da temperatura
utilizada na pirólise (Song & Guo, 2012). O efeito
sobre a CTC pode ser associado à desprotonação de
H+
a partir da superfície de partículas minerais ou
orgânicas com carga variável, em consequência do
aumento do pH pela alcalinidade do biocarvão (Van
Zwieten et al., 2010), embora reações de oxidação
abiótica e carboxilação, na superfície das partículas do
biocarvão, possam contribuir para a geração de cargas
de superfície e incremento na CTC (Cheng et al., 2006).
O presente trabalho foi realizado partindo-se da
hipótese de que a estabilidade de C no biocarvão da
cama de frango é superior à encontrada na biomassa
original, e de que os incrementos de C, nos solos
tratados com biocarvão, são acompanhados por
aumentos da CTC.
O objetivo deste trabalho foi caracterizar o processo
de mineralização do C em amostras de cama de frango
e seu respectivo biocarvão, além de determinar a CTC
e as taxas de mineralização do C nos solos tratados
com cama de frango e biocarvão.
Material e Métodos
O trabalho foi desenvolvido em condições
controladas, em laboratório, a partir de amostras de
cama de frango e biocarvão incubadas com solo ou
areia. A amostra de cama de frango – uma mistura de
casca de arroz e dejeção de aves – foi obtida na região
metropolitana de Campinas, SP, e seca em estufa a
38o
C até obtenção de massa constante. Posteriormente,
o material foi homogeneizado, moído e passado em
peneira de malha 2 mm.
O biocarvão foi produzido a partir da amostra seca
e moída de cama de frango, por meio de pirólise lenta,
em reator de laboratório tipo leito fixo (Figura 1).
O reator (Figura 1, item 2), de formato cilíndrico,
fabricado com aço inoxidável AISI 310S, apresenta
um volume útil de 3 L e opera em regime de batelada.
O reator foi hermeticamente fechado e posicionado no
interior de uma mufla (Figura 1, item 1) com controle
de temperatura. A pirólise foi realizada a 400o
C, e a
taxa de aquecimento foi de 10°C min‑1
. Através de
um capilar (no
4 – Figura 1), gás nitrogênio ao fluxo
de 1 L min‑1
foi injetado no lado oposto à tubulação
de tiragem de vapores e gases não condensáveis (no
5
3. Mineralização e efeitos do biocarvão de cama de frango 409
Pesq. agropec. bras., Brasília, v.50, n.5, p.407-416, maio 2015
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– Figura 1). Esta corrente de gás nitrogênio tem dupla
função: eliminar o ar atmosférico, inicialmente contido
no reator, e prover o arraste dos vapores e gases não
condensáveis gerados no processo. Posicionado no
centro do reator, um tubo fechado em uma extremidade
(Figura 1, item 3), permite a inserção de termopar e a
mensuração da temperatura na região central do reator.
Esta temperatura é a considerada como temperatura de
processo. Os vapores e gases não condensáveis gerados
são resfriados em condensador externo refrigerado
com água (Figura 1, item 6) e o bio‑óleo é coletado
em um frasco (Figura 1, item 7). A corrente de gases
não condensáveis (Figura 1, item 9) é passada através
de borbulhador de água (Figura 1, item 8). Considera-
se finalizado o processo de pirólise, à temperatura de
trabalho pré‑definida, quando o borbulhamento se torna
função exclusiva da corrente gasosa de gás nitrogênio.
É possível aferir visualmente o encerramento de
produção de gases não condensáveis, fechando-se
momentaneamente a corrente de N gasoso. Durante
o resfriamento, a corrente de N gasoso é mantida.
No resfriamento do biocarvão, o material adsorve os
gases no interior do reator e há a tendência de se gerar
vácuo. Durante o resfriamento, o N gasoso impede
a ocorrência deste vácuo e a consequente entrada de
ar atmosférico no interior do reator, o que poderia
alterar as características do biocarvão. O tempo de
processamento depende da característica do reator
e das condições de troca térmica. No caso do reator
de laboratório (leito fixo), com diâmetro de 114 mm
e espessura de parede de 3 mm, nas condições de
processo descritas, o tempo de processo situa-se entre
30 e 45 minutos. Estabeleceu-se então o tempo de
60 minutos,apósseratingidaatemperaturadeprocesso,
para desligamento da mufla. O reator de pirólise de
laboratório possui uma válvula de segurança montada
na tubulação de injeção de N gasoso, não mostrada na
Figura 1, para alívio de pressão do interior do reator,
para o caso de entupimento do condensador.
Acamadefrangoeobiocarvãoforamcaracterizados,
em triplicata, quanto ao pH, umidade e teores de C, N, P,
K, Ca, Mg e S (Tabela 1), por meio de métodos descritos
em Andrade & Abreu (2006). A CTC dos materiais foi
determinada conforme método oficial do Ministério da
Agricultura, Pecuária e Abastecimento (Brasil, 2007)
para fertilizantes orgânicos, que emprega lavagens com
solução HCl 0,5 mol L‑1
, acetato de cálcio 0,5 mol L‑1
e
posterior titulação com NaOH. Além disso, a CTC foi
também quantificada por meio de método alternativo
(Glória et al., 1965), com solução de acetato de
amônio a pH 7,0 e adaptações descritas em Andrade
et al. (2006). O método se fundamenta no uso do NH4
+
como cátion‑índice, fornecido via solução de acetato
de amônio (CH3COONH4, pH 7,0) e deslocamento do
NH4
+
, por meio de troca iônica com Ca+2
fornecido via
solução de acetato de cálcio (Ca(CH3COO)2, pH 7,0).
O NH4
+
foi determinado pelo método de destilação a
vapor (Cantarella & Trivelin, 2001).
Os experimentos com incubação, para avaliação da
dinâmica de mineralização de C da cama de frango e
Figura 1. Representação do reator utilizado para a pirólise
da amostra de cama de frango e produção de seu respectivo
biocarvão: 1, mufla (1.000°C); 2, reator de aço oxidável; 3,
tubo central para fixação de termopar tipo K; 4, entrada de gás
inerte (GN2); 5, saída dos gases reagentes; 6, condensador
resfriado a água; 7, coletor do condensado; 8, frasco para
lavagem de gases (funciona como válvula de não retorno); e
9, exaustão de gases.
Tabela 1. Caracterização química da cama de frango e do
seu respectivo biocarvão.
Atributo Cama de frango Biocarvão
pHCaCl2 7,8±0,0 10,2±0,1
Umidade (%) 6,2±0,1 2,8±0,0
C total (g kg‑1
) 376±1 429±0
N total (g kg‑1
) 36,8±0,3 31,8±0,0
Relação C/N 10 13
Fósforo (g kg‑1
) 10,5±0,3 29,4±0,6
Potássio (g kg‑1
) 26,9±0,9 47,2±1,0
Cálcio (g kg‑1
) 21,1±0,8 48,3±0,7
Magnésio (g kg‑1
) 3,8±0,1 14,6±2,0
Enxofre (g kg‑1
) 6,4±0,1 10,0±0,4
CTC(1)
(mmolc kg‑1
) 555±28 80±4
CTC(2)
(mmolc kg‑1
) 521±4 196±4
(1)
CTC potencial a pH 7,0, conforme método indicado pelo Ministério da
Agricultura, Pecuária e Abastecimento (Brasil, 2007), com uso de lavagens
com HCl e acetato de cálcio. (2)
CTC potencial a pH 7,0, conforme método
adaptado de Glória et al. (1965), apresentado por Andrade et al. (2006),
com uso de acetato de amônio.
4. 410 C.A. de Andrade et al.
Pesq. agropec. bras., Brasília, v.50, n.5, p.407-416, maio 2015
DOI: 10.1590/S0100-204X2015000500008
do biocarvão, foram instalados com a mistura de doses
desses materiais e amostras de solo ou areia.
A amostra de solo da camada de 0 a 20 cm foi obtida
de área com Latossolo Vermelho‑Amarelo distroférrico
(Santoset al.,2006),pertencenteaoInstitutoAgronômico
(IAC), no Centro Experimental Central, em Campinas,
SP. Após secagem ao ar e passagem em peneira com
malha 2 mm, três subamostras foram encaminhadas para
determinaçõesdeatributosquímicosquantoàfertilidade,
conformeVanRaijet al.(2001),eanálisegranulométrica,
conforme Camargo et al. (2009). O solo apresentou
as seguintes características: pH em CaCl2, 4,8±0,1;
C, 18±0 g kg‑1
; P extraído com resina, 2±0 mg dm‑3
;
K+
, 2,6±0,1 mmolc dm‑3
; Ca+2
, 17±1 mmolc dm‑3
;
Mg+2
, 6±0 mmolc dm‑3
; H+Al (acidez potencial),
31±2 mmolc dm‑3
; saturação por bases, 45±2%; e teores
de argila e areia iguais a, respectivamente, 299 g kg‑1
e
622 g kg‑1
.
Utilizou-se também para incubação areia para filtro
de piscina e o preparo consistiu de queima em mufla a
550o
C e posterior lavagem com solução de HCl a 10%
e água deionizada, de forma a garantir a eliminação de
qualquer material orgânico porventura presente.
A estabilidade das fontes de C foi avaliada por
meio de incubação, com duração de 64 dias, tendo-se
utilizado 300 g de solo ou areia em mistura com doses
dos materiais, conforme Coscione & Andrade (2006).
As doses de C foram igualadas entre os materiais e
corresponderam à aplicação de 0, 1.000, 2.000, 4.000
e 8.000 mg kg‑1
, equivalentes a 0, 2, 4, 8, 16 t ha‑1
.
Utilizou-se o delineamento experimental inteiramente
casualizado, com quatro repetições.
A cama de frango e o biocarvão foram aplicados
secos e com granulometria inferior a 2 mm, com
a finalidade de homogeneização das misturas e de
padronização do tamanho das partículas.
Além dos tratamentos com cama de frango e
biocarvão, adicionou-se um tratamento com sacarose
p.a. à dose de 2.000 mg kg‑1
de C, para servir de
referência quanto à rapidez do processo de degradação
dos materiais, uma vez que é substrato de C facilmente
mineralizável pela microbiota.
A incubação foi realizada em potes de plástico
herméticos (1,5 L), colocados em ambiente escuro e à
temperatura controlada de 28±1°C. A umidade do solo
ou da areia com os respectivos tratamentos foi mantida
a 70% da capacidade de retenção de água.
O C‑CO2 liberado foi capturado com solução
padronizada de NaOH 0,5 mol L‑1
colocada em frascos,
no interior dos potes de 1,5 L, e trocadas diariamente
nos primeiros cinco dias de incubação e a cada três
ou quatro dias no restante do período de incubação.
A quantificação do C‑CO2 que reagiu com a solução de
NaOH foi feita por meio de leitura da condutividade
elétrica (Rodella & Saboya, 1999).
Os valores do C‑CO2 liberado, descontado o
controle, foram acumulados no tempo, para posterior
ajuste à equação de cinética química de primeira
ordem Cmineralizado = C0× (1 ‑ e‑kt
), em que: Cmineralizado é a
quantidade (mg kg‑1
) de C liberado, na forma de CO2,
no tempo t; C0 é a fração (mg kg‑1
) potencialmente
mineralizável; k é a constante de velocidade da reação
de mineralização de C (por dia); e t é o tempo em dias.
Ressalta-se que C0 e k são coeficientes do ajuste ao
modelo de cinética química dos resultados de C‑CO2
liberado em função do tempo. Tais valores são válidos
para a caracterização do processo de mineralização,
quando o ajuste é significativo a 5% de probabilidade
pelo teste t.
Ao final da incubação, o solo foi seco ao ar,
peneirado em malha 2 mm e encaminhado para
análises de CTC efetiva (pH natural). O método
utilizado para determinação da CTC efetiva foi o de
Glória et al. (1965), com adaptações descritas em
Andrade et al. (2006), em que o K+
é utilizado como
cátion‑índice fornecido via solução de KCl 1,0 mol L‑1
e, posteriormente, deslocado por troca iônica pelo
Ca+2
fornecido via solução de CaCl2 0,5 mol L‑1
.
A determinação do K+
no extrato foi realizada em
fotometria de emissão de chama.
A CTC potencial foi estimada por meio da
determinação dos teores de K+
, Ca+2
, Mg+2
e H+Al,
conforme Van Raij et al. (2001), com K, Ca e Mg
extraídos por resina de troca iônica, e o H+Al obtido
indiretamente por meio de leitura do pH SMP.
Subamostras de solo foram moídas finamente,
passadas em peneira com malha de 0,149 mm, secas
a 38o
C e utilizadas para quantificação do teor total de
C, por combustão a seco em analisador elementar CN.
Os resultados foram tratados estatisticamente com
análise de variância e posterior aplicação do teste
de Tukey, a 5% de probabilidade (cama de frango e
biocarvão), e de regressão (doses).
Resultados e Discussão
A cama de frango estimulou a atividade microbiana
edáfica, que foi evidenciada pelos fluxos de C, na forma
5. Mineralização e efeitos do biocarvão de cama de frango 411
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de CO2 (C‑CO2), enquanto o estímulo provocado pelo
biocarvão foi menos evidente (Figura 2). É importante
destacar que fluxos semelhantes de C‑CO2 entre o solo
tratado com biocarvão e o solo‑controle, em diversas
datas de avaliação, são indicativos de que não ocorreu
prejuízo à atividade microbiana em função da aplicação
do material pirolisado.
A liberação de C‑CO2 foi mais intensa nos primeiros
20–40 dias de incubação da cama de frango ou nos
20 dias iniciais, no caso dos tratamentos‑controle e
solo com adição de glicose ou biocarvão (Figura 2).
A rápida degradação da cama de frango ou de dejetos de
galinha, após aplicação no solo, em geral, é conhecida
e esperada como consequência da estreita relação
C/N do material, próxima de 10:1 (Vanegas Chacón,
2006; Pitta et al., 2012). Também é fato relatado na
literatura especializada que, durante os primeiros dias
de incubação, compostos orgânicos mais lábeis são
preferencialmente consumidos pelos microrganismos,
e materiais mais recalcitrantes são acessados pela
microbiota com o decorrer do tempo e a menores taxas
(Giacomini et al., 2003; Andrade et al., 2006).
Observados os resultados de C‑CO2 acumulado no
tempo, para a dose de 2.000 mg kg‑1
de C aplicada, ficou
evidente que o C aplicado ao solo via biocarvão é mais
estável do que o C presente nos compostos orgânicos
da cama de frango (Figura 3). O C‑CO2 acumulado
no tratamento com biocarvão foi inferior a 30% do
liberado nos outros dois tratamentos e a estabilização
dos fluxos ocorreu em menos de 10 dias. Para sacarose
e cama de frango, a estabilização dos fluxos de C‑CO2
ocorreu com cerca de 20 dias de incubação.
Quando a cama de frango, o biocarvão e a sacarose
foram incubados com areia previamente queimada
e lavada, os tratamentos com sacarose e biocarvão
praticamente não exibiram liberação de C‑CO2,
durante os primeiros 18 dias de incubação, para a
dose de 2.000 mg kg‑1
(Figura 3 B). A explicação está
relacionada ao preparo da areia para a incubação e a
inocuidade microbiológica tanto da sacarose, quanto
do biocarvão. A queima da areia a 550o
C deve ter
eliminado a comunidade microbiana previamente
existente no material, bem como o processo de pirólise
deve ter afetado de forma semelhante a comunidade
microbiana previamente existente na cama de
frango. No caso da sacarose, utilizou-se reagente
p.a. e, portanto, com baixa carga microbiológica.
Nos tratamentos com cama de frango, não foram
verificados atrasos no processo de mineralização de C,
uma vez que o próprio material serviu de inóculo de
microrganismos na incubação.
No 18o
dia de incubação aplicaram-se 2 g de solo (o
mesmo usado no experimento) sobre a superfície das
misturas com areia, com o objetivo de servir de inóculo
de microrganismos, o que deu início ao processo de
mineralização de C, evidenciado pela liberação de
C‑CO2 (Figura 3).
Figura 2. Valores médios acumulados de C, como CO2
(C‑CO2), em função do tempo de até 64 dias de incubação
de amostras de solo, misturadas com cama de frango (A)
e biocarvão (B), em doses de 0, 1.000, 2.000, 4.000 e
8.000 mg kg‑1
de C, além de sacarose à dose de 2.000 mg kg‑1
de C.
6. 412 C.A. de Andrade et al.
Pesq. agropec. bras., Brasília, v.50, n.5, p.407-416, maio 2015
DOI: 10.1590/S0100-204X2015000500008
Em geral, na mistura dos materiais com areia, os
valores de C‑CO2 ficaram abaixo dos verificados na
mistura com solo, exceto no caso da sacarose, em que
o valor final acumulado foi semelhante entre as duas
situações.
O compartimento potencialmente mineralizável de
C dos materiais foi avaliado por meio dos resultados
de C0, obtidos nos ajustes ao modelo de cinética
química. Na menor dose aplicada, o compartimento
mineralizável da cama de frango incubada com solo foi
2,4 vezes maior do que o verificado para o biocarvão,
e a diferença entre as fontes de C aumentou com o
incremento da dose (Figura 4 A).
Percebe-se, portanto, que a pirólise concentrou
C na massa final do biocarvão (Tabela 1) e alterou
a qualidade dos compostos de C presentes, em
comparação ao material original. A maior estabilidade
de C no biocarvão é resultante de perdas variáveis de
H, O, C e N durante a pirólise, em que se preserva
relativamente mais C e, assim, se reduzem as relações
H/C, O/C e (O+N)/C (Novak et al., 2009). Essas
alterações da pirólise da cama de frango correspondem
ao incremento do pico principal de arilas (compostos
aromáticos) e redução das alquilas, metilenos e
carboidratos (celulose e hemicelulose), em que estes
últimos tendem a zero a temperaturas acima de 350o
C.
(Cimò et al., 2014).
As taxas de mineralização de C da cama de frango
e do biocarvão corresponderam aos coeficientes
angulares das retas apresentadas na Figura 4.
Na mistura com solo, as taxas de mineralização de C
da cama de frango e do biocarvão foram 49,7 e 5,1%,
respectivamente (Figura 4A). Valor semelhante de taxa
de mineralização foi obtido por Sigua et al. (2014), que
determinaram que 4,3% do total de C do biocarvão de
cama de frango foi liberado como CO2, após mistura
com solo a 5.110 mg kg‑1
de C e incubação por 50 dias.
Os resultados de mineralização de C nos materiais
avaliados suportam, pelo menos em parte, a afirmação
Figura 4. Carbono potencialmente mineralizável (C0), em
função de doses de carbono aplicadas via cama de frango e
biocarvão, após mistura com solo (A) ou areia (B). Barras
verticais representam a diferença mínima significativa, pelo
teste de Tukey, a 5% de probabilidade.
Figura 3. Valores médios acumulados de carbono, liberado
como CO2 (C‑CO2), em função do tempo de incubação até
64 dias de amostras de solo ou areia com cama de frango,
biocarvão e sacarose, à dose de 2.000 mg kg‑1
de C. Barras
verticais representam os valores de desvio‑padrão.
7. Mineralização e efeitos do biocarvão de cama de frango 413
Pesq. agropec. bras., Brasília, v.50, n.5, p.407-416, maio 2015
DOI: 10.1590/S0100-204X2015000500008
de Lehmann et al. (2006), de que produtos pirolisados
são mais eficazes para sequestrar C no solo e auxiliar
a mitigação do efeito estufa. No entanto, é oportuno
lembrar que o balanço de C, a partir da biomassa
original, deve considerar a eficiência de recuperação de
C no biocarvão. Quanto à cama de frango, Song & Guo
(2012) definiram que a eficiência de recuperação de C
no biocarvão foi de 64%, em pirólise lenta a 300o
C, e
que o efeito do aumento da temperatura até 600o
C é
inversamente proporcional à eficiência de recuperação
de C no biocarvão. Considerando-se que a diferença de
mineralização entre a cama de frango e o biocarvão foi
de cerca de 45%, e assumindo-se que a recuperação de
C no biocarvão produzido a 400o
C tenha sido igual a
52% (Song & Guo, 2012), fica evidente que os gases e
o óleo gerados na pirólise são fundamentais para uma
avaliação mais completa do desempenho ambiental do
biocarvão.
Com os resultados de C‑CO2 da incubação com
areia, a taxa de mineralização de C do biocarvão foi
3,1%, enquanto o C da cama de frango alcançou valor
semelhante ao verificado no solo, 47,6% (Figura 4 B).
A ocorrência de efeito “priming” – aceleração
da degradação de matéria orgânica –, causada pelo
biocarvão, foi observada tanto por Wardle et al. (2008),
no material orgânico na interface solo‑liteira, quanto
por Luo et al. (2011), na matéria orgânica original.
Na pesquisa de Wardle et al. (2008), conduzida por dez
anos, em condição de campo na Suécia, ou seja, sob
variação da distribuição de chuvas, efeitos indiretos do
biocarvão sobre a manutenção da umidade na interface
solo‑liteira, bem como sobre a retenção de nutrientes,
podem explicar o favorecimento à degradação do
material vegetal, em presença do pirolisado (Bruun &
El‑Zehery, 2012). Em laboratório, cujas condições de
temperatura e umidade para degradação dos compostos
orgânicos são controladas, o efeito “priming” pode
ocorrer como consequência de compostos orgânicos
solúveis no biocarvão (Luo et al., 2011). Esses
compostos são responsáveis pelo estímulo à atividade
microbiana, em curto período, na incubação do
biocarvão com solo, o que define inclusive a taxa de
mineralização de C do biocarvão (Smith et al., 2010;
Cross & Sohi, 2011; Bruun & El‑Zehery, 2012).
A ocorrência ou não de efeito “priming” é associada
a características quantitativas e qualitativas da matéria
orgânica do próprio solo, à dose de biocarvão utilizada
e à fração solúvel de C no biocarvão (Luo et al., 2011).
Na presente pesquisa, a menor mineralização de C
ocorrida quando o biocarvão foi incubado com areia,
pode ser atribuída ao atraso no início do processo,
conforme destacado anteriormente, mas não se
descarta a possibilidade de estímulo à mineralização
adicional de C do solo pela mistura com biocarvão, o
que configuraria o efeito “priming”.
A CTC determinada no biocarvão variou com o
método de determinação (Tabela 1); pelo método oficial
para fertilizantes orgânicos e condicionadores de solo
(Brasil, 2007), o valor de CTC situou-se em torno de
41% do valor determinado com o uso de acetato de
amônio, adaptado de Glória et al. (1965) (Andrade
et al., 2006). O valor de CTC de 196 mmolc kg‑1
é mais
próximo de outros citados na literatura para biocarvão
de cama de frango, produzido entre 400 e 550 o
C, na
faixa de 400 a 600 mmolc kg‑1
(Gaskin et al., 2008;
Song & Guo, 2012; Van Zwieten et al., 2013), em
que o método utilizado também é fundamentado na
saturação dos sítios de troca com amônio fornecido via
solução de acetato de amônio.
Na mistura com o solo, houve efeito linear das
doses de C sobre a CTC efetiva dos tratamentos com
biocarvão e, em média, a CTC efetiva do solo com
biocarvão foi superior à proporcionada pela aplicação
da cama de frango somente nas doses de 4.000 e
8.000 mg kg‑1
de C (Figura 5 A). A alcalinidade do
biocarvão incrementou o pH do solo (Figura 5 B) e
foi responsável, pelo menos em parte, pelo aumento
da CTC efetiva, o que pode ser comprovado pela
correlação significativa entre pH e CTC efetiva nos
tratamentos com biocarvão (Figura 5 C).
Ao avaliar a CTC potencial, por meio da soma
de cátions trocáveis e da acidez potencial a pH 7,0,
observaram-se incrementos de 3 e 4 mmolc dm‑3
a cada
1.000 g kg‑1
de C aplicado via biocarvão e cama de
frango, respectivamente (Figura 6 A).
Na maior parte das doses de C estudadas, os valores
de CTC potencial proporcionados pela cama de frango
foram superiores aos verificados para o biocarvão
(Figura 6 A), o que mostra que a cama de frango foi mais
efetiva na geração de cargas no solo. Deve-se, ainda,
ressaltar que houve mineralização de cerca de 50% do
C inicialmente aplicado ao solo como cama de frango,
enquanto para o biocarvão esse valor foi somente de
5%. Tal fato implica num remanescente de C no solo
tratado com biocarvão superior ao remanescente de C
no solo com cama, o que é confirmado pelos teores de
C no solo ao final da incubação (Figura 6 B). A taxa
8. 414 C.A. de Andrade et al.
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DOI: 10.1590/S0100-204X2015000500008
Figura 5. CTC efetiva (A), valores de pH do solo (B) e
correlações entre estas variáveis (C), em função da aplicação
de doses de cama de frango e biocarvão. Barras verticais
representam a diferença mínima significativa, pelo teste de
Tukey, a 5% de probabilidade.
Figura 6. Valores de CTC potencial, a pH 7,0 (A), teores
totais de carbono no solo, após incubação (B), e relação
CTC potencial/C, em amostras de solo tratadas com
doses de cama de frango e biocarvão (C). Barras verticais
representam a diferença mínima significativa, pelo teste de
Tukey, a 5% de probabilidade.
9. Mineralização e efeitos do biocarvão de cama de frango 415
Pesq. agropec. bras., Brasília, v.50, n.5, p.407-416, maio 2015
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de acúmulo de C no solo com biocarvão foi de 80%
do adicionado e, para a cama de frango, esse valor foi
de 40%.
A relação CTC/C evidenciou maior quantidade de
cargas negativas por unidade de C, nas misturas de
solo e cama de frango, do que nas misturas de solo e
biocarvão. O envelhecimento do biocarvão no solo e
a ocorrência de reações de oxidação abiótica em sua
superfície tendem a incrementar a CTC com o tempo,
principalmente pela formação de grupos carboxílicos
(Cheng et al., 2006), cuja magnitude dependerá
também do pH do sistema (Lee et al., 2010). Como o C
do biocarvão é recalcitrante no ambiente, incrementos
adicionais na CTC devem ser esperados com o tempo,
principalmente em caso de reaplicações do material
numa mesma área.
Conclusões
1. A mineralização do carbono presente em
compostos orgânicos na cama de frango e no seu
respectivo biocarvão, após aplicação no solo, é
caracterizada por período inicial com fluxos mais
intensos de C-CO2 e redução desses fluxos com
o tempo, segundo modelo de cinética química de
primeira ordem.
2. As taxas de mineralização do carbono da cama
de frango (49,7%) e do biocarvão (5,1%) evidenciam
a recalcitrância de C nos compostos orgânicos após a
pirólise.
3. A capacidade de troca de cátions do solo é
incrementada com o uso de doses de biocarvão, com
ganhos em carbono; porém, a quantidade de cargas por
unidade de C no solo com biocarvão é inferior à de
cargas no solo com cama de frango.
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