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24/07/2018
Número: 0008547-20.2018.8.17.9000
Classe: AGRAVO DE INSTRUMENTO
Órgão julgador colegiado: Segunda Turma da Primeira Câmara Regional de Caruaru
Órgão julgador: Gabinete do Des. Evio Marques da Silva
Última distribuição : 23/07/2018
Valor da causa: R$ 100.000,00
Assuntos: Multas e demais Sanções
Segredo de justiça? NÃO
Justiça gratuita? SIM
Pedido de liminar ou antecipação de tutela? SIM
Tribunal de Justiça de Pernambuco
PJe - Processo Judicial Eletrônico
Partes Procurador/Terceiro vinculado
2º Promotor de Justiça de Cidadania de Garanhuns
(AGRAVANTE)
ESTADO DE PERNAMBUCO (AGRAVADO)
MUNICIPIO DE GARANHUNS (AGRAVADO)
Documentos
Id. Data da
Assinatura
Documento Tipo
44029
29
23/07/2018 13:59 Petição Inicial Petição Inicial
44029
71
23/07/2018 13:59 Resposta Secretaria de Cultura Documento de Comprovação
44160
68
24/07/2018 19:30 Decisão Decisão
1.
EXCELENTÍSSIMO SENHOR DESEMBARGADOR RELATOR DA ______ TURMA DA CÂMARA
REGIONAL DE CARUARU, DO EGRÉGIO TRIBUNAL DE JUSTIÇA DE PERNAMBUCO:
O Ministério Público do Estado de Pernambuco, por meio da 2ª Promotoria de Justiça de Defesa da
Cidadania, no uso de suas atribuições legais, vem perante V. Exa., nos termos dos artigos 1.015 e
seguintes do Código de Processo Civil, pelas razões adiante expostas, interpor AGRAVO DE
INSTRUMENTO da decisão do Exmo. Sr. Juiz de Direito da Vara da Fazenda Pública da Comarca de
Garanhuns, que negou pedido de tutela provisória de urgência nos autos da Ação Civil Pública nº
0003751-54.2018.8.17.2640.
RELATÓRIO
O Ministério Público ingressou com ação civil pública de obrigação de fazer, com pedido de tutela
provisória de urgência antecipada, em face do Estado de Pernambuco e do Município de Garanhuns, em
defesa do direito difuso a um Estado e a um Município garantidores de uma sociedade fraterna, pluralista
e sem preconceitos, como previsto pelo constituinte já no preâmbulo da Constituição Federal, e que não
se submetam a qualquer tipo de discriminação.
Aduziu o Ministério Público, em síntese: o Governo do Estado anunciou enfaticamente o Festival de
Inverno de Garanhuns – FIG 2018, com o tema “Um Viva à Liberdade!”, divulgando no dia 25/06/2018,
que “o FIG será novamente um território livre para fruição da nossa diversidade, da liberdade criativa e
de todas as vivências artísticas e culturais, expressão da nossa própria identidade como povo”; em
29/06/2018, em entrevista a rádio local, o Sr. Prefeito afirmou que não permitiria a apresentação, em
prédio público do Município, do monólogo “O Evangelho Segundo Jesus, Rainha do Céu", justificando
que adotou a atitude “como cristão e em respeito à população cristã de Garanhuns, que é a grande
maioria, 99 ou 100% da população”; após a manifestação do prefeito, a presidente da Fundarpe, Márcia
Souto, afirmou que a peça estava programada pra ser encenada no Sesc local, voltada para público adulto,
às 23h, com capacidade entre 70 e 100 pessoas; o secretário de cultura reiterou que havia ainda outras
alternativas de espaço para a exibição e que a escolha da peça, como as demais, foi um processo de
curadoria pública que o Festival de Inverno faz há décadas; aatriz protagonista do monólogo, Renata
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1.
1.
Carvalho, declarou-se aberta ao diálogo com os opositores da peça e expôs como propósito do monólogo
a reflexão sobre a exclusão, criminalização e violência contra os travestis e transexuais; após
manifestações da Câmara Municipal e da Diocese de Garanhuns contra a inclusão da referida peça na
programação, o Governo do Estado recuou e anunciou em 30/06, por meio de nota, a sua exclusão da
Mostra de Teatro Alternativa do Festival de Inverno de Garanhuns de 2018, “diante da polêmica (...) e
da possibilidade de prejuízos das parcerias estratégicas e nobres que o viabilizam”; em face da situação
que se tornou pública e notória e do recuo do Estado diante das pressões recebidas, e após verificar que a
peça, ao contrário do apregoado por alguns setores, trata-se de um drama e não apresenta o propósito de
fazer ofensa a nenhuma crença, mas sim o de estimular a reflexão sobre a discriminação social,
especialmente dos travestis e transexuais, recorrendo aos valores cristãos do amor, do perdão, da
tolerância e da solidariedade, estando em conformidade com o princípio da dignidade da pessoa humana,
esta Promotoria de Justiça, em conjunto com integrantes da Comissão de Promoção dos Direitos
Homoafetivos do Ministério Público de Pernambuco e do Núcleo Regional da Defensoria Pública do
Estado, recomendou ao secretário estadual de cultura e à presidente da Fundarpe a revisão da decisão de
cancelamento da peça – ressalvada a discricionariedade administrativa, a qual, todavia, não admite
submissão a qualquer forma de discriminação; diante do não acolhimento da recomendação, o Ministério
Público ingressou com ação civil pública, requerendo a condenação do Estado e do Município pela prática
de discriminação contra a população homoafetiva - especialmente os transexuais -, e da violação do seu
dever de garantidores de uma sociedade fraterna, pluralista e sem preconceitos, condenando-os ao
pagamento de indenização por danos morais coletivos a ser revertida em campanhas contra a
discriminação da população homoafetiva, especialmente dos transexuais; o Ministério Público requereu
ainda a tutela provisória de urgência para que sejadeterminado aoEstado de Pernambuco a reinclusão, em
24 horas, na grade de programação do FIG/2018 - “Um viva à liberdade!” - da referida apresentação
teatral que foi regularmente selecionada pela Curadoria do Festival, sendo prevista para o dia 26/7,
destinada a um público adulto, às 23h, com capacidade entre 70 e 100 pessoas, conforme a própria
secretaria estadual de cultura e Fundarpe informaram – determinando-se também ao Estado e ao
Município que diligenciem para estimular o diálogo entre os produtores da peça e os demais parceiros e a
população em geral, desfazendo mal-entendidos e preconceitos, e garantindo a segurança necessária à
referida apresentação.
Após ouvir o Estado, o juízo “a quo” indeferiu o pedido de tutela provisória de urgência, afirmando, em
síntese, que o cancelamento seria um ato discricionário do Estado, baseou-se em “critérios que traduzem o
princípio do respeito ao sentimento religioso da comunidade” e que não haveria o periculum in mora
porque a peça já teria conseguido recursos para se apresentar de maneira particular.
É o breve relatório.
DAS RAZÕES RECURSAIS
. DA EXTRAPOLAÇÃO DOS LIMITES DA DISCRICIONARIEDADE
ADMINISTRATIVA PELO ESTADO DE PERNAMBUCO
A oportunidade e a conveniência que integram o conceito de discricionariedade não se confundem com a
oportunidade e a conveniência da Administração ou de sua gestão, mas devem convergir com o interesse
público.
Permitam-nos, por adequar-se à questão em tela, invocar as seguintes lições dos professores Carlos
Alexandre Michaello Marques, Clarice Gonçalves Pires Marques (disponível em
http://www.ambito-juridico.com.br/site/index.php?artigo_id=11083&n_link=revista_artigos_leitura)., ,
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Número do documento: 18072313574653800000004382699
“Demonstrando pioneirismo e posição de destaque na doutrina nacional, Celso Antônio Bandeira de
Mello (2005, p. 53) resolve a celeuma conceituando Interesse Público como: “o interesse resultante do
conjunto dos interesses que os indivíduos pessoalmente têm quando considerados em sua qualidade de
membros da Sociedade e pelo simples fato de o serem”.
Por estar-se diante de um conceito jurídico indeterminado, é importante fazer algumas distinções para
melhor situar o conceito deste iminente autor. A Administração Pública, quando analisada, traz sempre
consigo a importância de considerar a supremacia do interesse público sobre o interesse privado, inclusive
por sua função de princípio implícito do Direito Administrativo.
Desse modo, deve-se ter claramente que os interesses individuais, particulares ou de um grupo de
influência não podem e não devem ter o condão de incutir novas formas de operar na Administração em
que não estejam presentes os ditames legais e principiológicos, porquanto esses interesses não
representam o bem geral, o bem comum.
A grande problemática estabelecida nos últimos séculos, superada essa distinção preliminar, é oriunda
principalmente dos conceitos de Estado existentes a partir de 1500. A identidade reconhecida entre o
interesse público, interesse do Estado e o interesse soberano neste período não prospera nos dias atuais,
sob pena de subverter-se todo sentido dado ao interesse público.
(...)
Convém salientar que o interesse público não pode ser considerando como o interesse do aparato
administrativo ou da pessoa do agente público. O Estado através de seus braços administrativos e por
relacionar-se com os demais entes públicos ou privados torna-se um sujeito de direito. Por essa premissa
pode deter conveniências em relação à sociedade e aos demais sujeitos, deixando em segundo plano o
interesse público.
(...)
Thêmis Limberger parafraseando Eduardo García Enterría, expoente maior da doutrina, explica que:
“[...] a discricionariedade é essencialmente uma liberdade de eleição entre alternativas igualmente justas,
ou seja, entre critérios extrajurídicos (de oportunidade, econômicos etc.), não previstos na lei, e conferidos
ao critério subjetivo do administrador. Os conceitos jurídicos indeterminados constituem-se em um caso
de aplicação da lei, já que se trata de subsumir em uma categoria legal.” (1998, p. 111)”
Aplicando tais lições ao caso concreto, verifica-se que não há justiça na exclusão de uma apresentação
que, até prova em contrário, foi prévia e regularmente selecionada pela curadoria responsável por aprovar
a programação do FIG 2018, quando essa exclusão dá-se em face de manifestações contrárias, ainda que
compreensíveis, mas não assimiláveis pelo estado democrático de direito na medida em que exigem a
retirada da peça, dada a manifesta intolerância de tal exigência, aliás, intolerância reconhecida pelo
próprio Estado na resposta escrita da Secretaria de Cultura à recomendação do Ministério Público
(documento em anexo).
Ora, se o próprio Estado de Pernambuco reconhece a intolerância das manifestações contrárias que
visaram a impedir a apresentação, não existe, no caso, espaço para a discricionariedade administrativa,
pois o ordenamento jurídico não se submete a preconceitos e discriminações – “Constituem objetivos
fundamentais da República Federativa do Brasil: I - construir uma sociedade livre, justa e solidária; (…)
IV - promover o bem de todos, sem preconceitos de origem, raça, sexo, cor, idade e quaisquer outras
formas de discriminação” (artigo 3º da Constituição Federal).
2.2. DO CARÁTER INDETERMINADO DO CONCEITO JURÍDICO DE SENTIMENTO RELIGIOSO
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Datissima vênia, a respeitabilíssima decisão recorrida invoca um conceito jurídico indeterminado –
“sentimento religioso” – para justificar o cancelamento da apresentação – sem, contudo, dizer qual a
relação desse conceito com o caso concreto.
O artigo 489 do Código de Processo Civil estabelece:
“§ 1o Não se considera fundamentada qualquer decisão judicial, seja ela interlocutória, sentença ou
acórdão, que:
(...)
II - empregar conceitos jurídicos indeterminados, sem explicar o motivo concreto de sua incidência no
caso;”
Em que, concretamente, consiste esse “respeito ao sentimento religioso da comunidade”?
A qual sentimento religioso o Estado deve se curvar?
Ao sentimento religioso da fraternidade, da justiça e da igualdade e do amor universal?
Ou ao “sentimento religioso” da intolerância?
Esse “sentimento religioso” é reconhecido aos transexuais e aos homoafetivos em geral?
Ou o “sentimento religioso da comunidade” e a espiritualidade são propriedade exclusiva dos
heterossexuais?
Em que uma peça que invoca ficticiamente – e até prova em contrário de forma respeitosa - a figura de
Jesus Cristo para tratar da discriminação e da exclusão dos transexuais, significa desrespeito ao
“sentimento religioso da comunidade”?
A não ser que façamos uma associação automática entre transexualidade e ofensa, o que seria uma
conclusão preconceituosa.
Verifica-se, assim, que, ao se referir a conceito indeterminado - “sentimento religioso” - sem explicar o
motivo concreto de sua incidência no caso, a decisão, datissima vênia, não foi suficientemente
fundamentada, devendo ser reformada também nesse aspecto.
2.3. DA NECESSIDADE DE APROFUNDAMENTO DO EXAME DA RELAÇÃO ENTRE OS
PRINCÍPIOS DO SENTIMENTO RELIGIOSO, DA LIBERDADE DE EXPRESSÃO E DA
DISCRICIONARIEDADE ADMINISTRATIVA
A justa relação entre os princípios do sentimento religioso e da liberdade de expressão - tão caros e
arduamente conquistados pela sociedade no Estado Democrático-Liberal de Direito - precisa ser
aprofundada, de maneira a se evitarem extremismos, de um lado ou de outro, e de maneira que a
Administração Pública não acolha manifestações açodadas, preconceituosas ou danosas.
O Estado não pode admitir que o sentimento religioso, corolário da liberdade de crença – de natureza
pessoal ou comunitária -, impeça outras manifestações igualmente legítimas – inclusive, como no caso
sob exame, também de conteúdo religioso - e que em nada impedem ou ofendam objetivamente o
exercício de qualquer direito de crença e a celebração dos cultos correlatos.
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Referência nesse tema é o caso abordado pelo STF – Supremo Tribunal Federal, em 11/04/2014, ao
examinar a existência de repercussão geral no Recurso Extraordinário com Agravo 790.813.
Embora o STF não tenha apreciado o Recurso Extraordinário, por entender ausente o requisito da
repercussão geral (apesar de entendimento diverso do relator origina), o histórico do caso, abaixo
transcrito, aponta luzes para a questão, sendo útil, mutatis mutandi, ao caso concreto objeto deste agravo
(os destaques são nossos):
Decisã o so bre Rep ercu ssão Ger al
SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL
11/04/2014 PLENÁRIO
REPERCUSSÃO GERAL NO RECURSO EXTRAORDINÁRIO COM AGRAVO
790.813 SÃO PAULO
RELATOR :MIN. MARCO AURÉLIO
REDATOR DO ACÓRDÃO: MIN. DIAS TOFFOLI
RECTE.(S) :INSTITUTO JUVENTUDE PELA VIDA E OUTRO(A/S)
ADV.(A/S) :RENATO RESENDE BENEDUZI E OUTRO(A/S)
RECDO.(A/S) :ABRIL COMUNICAÇÕES S/A
ADV.(A/S) :ALEXANDRE FIDALGO
ADV.(A/S) :ANA PAULA FULIARO E OUTRO(A/S)
Direito constitucional. Convivência entre princípios. Limites. Recurso extraordinário em que se discute a
existência de violação do princípio do sentimento religioso em face do princípio da liberdade de
expressão artística e de imprensa. Publicação, em revista para público adulto, de ensaio fotográfico em
que modelo posou portando símbolo cristão.Litígio que não extrapola os limites da situação concreta e
específica. Plenário Virtual. Embora o Tribunal, por unanimidade, tenha reputado constitucional a
questão, reconheceu, por maioria, a inexistência de sua repercussão geral.
Decisão: O Tribunal, por unanimidade, reputou constitucional a questão. O Tribunal, por maioria,
reconheceu a inexistência de repercussão geral da questão constitucional suscitada, vencidos os
Ministros Marco Aurélio e Luiz Fux. Não se manifestou o Ministro
Roberto Barroso.
Ministro DIAS TOFFOLI
Redator para o acórdão
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Manife staçã o sob re a Rep erc ussão Ger al
REPERCUSSÃO GERAL NO RECURSO EXTRAORDINÁRIO COM AGRAVO
790.813 SÃO PAULO
Repercussão Geral no Recurso Extraordinário Com Agravo 790.813
São Paulo
RELATOR :MIN. MARCO AURÉLIO
RECTE.(S) :INSTITUTO JUVENTUDE PELA VIDA E OUTRO(A/S)
ADV.(A/S) :RENATO RESENDE BENEDUZI E OUTRO(A/S)
RECDO.(A/S) :ABRIL COMUNICAÇÕES S/A
ADV.(A/S) :ALEXANDRE FIDALGO
ADV.(A/S) :ANA PAULA FULIARO E OUTRO(A/S)
DECISÃO E PRONUNCIAMENTO
RECURSO EXTRAORDINÁRIO –REVISTA “PLAYBOY” – FOTO DE ATRIZ DESPIDA COM
ROSÁRIO À MÃO – CONFLITO DE PRINCÍPIOS – TUTELA DO SENTIMENTO RELIGIOSO
VERSUS LIBERDADE DE EXPRESSÃO ARTÍTISTICA – VEDAÇÃO DE CENSURA PRÉVIA –
ARTIGOS 5º, INCISO VI, E 220 DA CARTA DA
REPÚBLICA – AGRAVO PROVIDO NOS PRÓPRIOS AUTOS – SEQUÊNCIA – REPERCUSSÃO
GERAL –CONFIGURAÇÃO.
1. O Gabinete prestou as seguintes informações:
O Instituto Juventude Pela Vida e Luiz Carlos Lodi da Cruz interpuseram recurso extraordinário,
inadmitido nab re a Rep erc ussão Ger alorigem, com o objetivo de reformar julgado da Oitava Câmara
de Direito Privado do Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo, cujo acórdão está assim resumido:
Imprensa. Pedido de proibição de veiculação de revista. Desrespeito ao sentimento religioso. Matéria
com fotos que, na visão dos autores, ofendem este sentimento. Censura prévia vedada. Ação
improcedente. Recurso provido.
Os recorrentes formalizaram ação de obrigação de não fazer contra a Editora Abril com o propósito de
inibir a circulação da edição de agosto de 2008 da revista “Playboy”, porquanto veiculada foto da atriz
Carol Castro despida, em página inteira, tendo à mão direita um rosário identificado pelas contas e pelo
crucifixo. Alegaram ofensa ao sentimento
religioso. Foi deferida, parcialmente, tutela antecipada para impedir a distribuição de novas revistas
presente a imagem contestada, mantidas, nas bancas e em outros pontos de comércio, aquelas já postas
em venda. No mérito, o Juízo deu provimento parcial ao pedido nos termos assentados quando do
pronunciamento liminar.
O Tribunal de origem reformou o julgado, asseverando não ser a inadequação da imagem suficiente a
inviabilizar a divulgação da edição do periódico, ausente prova de ofensa objetiva a indivíduo ou a
instituição específica. Ressaltou pressupor “considerações ideológico-subjetivas” o acolhimento da
pretensão dos autores, o que extrapolaria os estreitos limites de motivação de toda e qualquer prestação
jurisdicional. Ante o fato de haver-se buscado, no ensaio fotográfico, retratar
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personagens femininos de Jorge Amado, consignou revelarem as obras do autor “instrumentos
adequados de educação e visualização cultural de um povo em determinado espaço e tempo”. Evocou a
decisão do Supremo na Medida Cautelar na Ação Direta de Inconstitucionalidade nº 4.451/DF, relator
ministro Ayres Britto, julgada em 2 de setembro de 2010, para concluir pela transgressão, no caso
concreto, à liberdade de expressão, configurada censura ao ato de proibir a circulação da revista. Frisou
ainda ausência de afronta aos artigos 187 do Código Civil e 5º, inciso XXXV, da Carta da República.
No extraordinário, interposto com alegada base na alínea “a” do permissivo constitucional, os
recorrentes sustentam, em preliminar, a repercussão geral da questão veiculada. Quanto ao mérito, dizem
do equívoco, no acórdão atacado, relativamente a entender tutela judicial preventiva, envolvidas
liberdades de expressão e de imprensa, como censura prévia.
Afirmam ser esse um “perigoso precedente generalizante”.
Apontam o artigo 5º, inciso XXXV, da Carta, para destacarem que o direito constitucional à proteção
jurisdicional, incluída a apreciação de ameaça a direito, alcança a imprensa e, com mais
razão, atividades pornográficas, que não podem ser equiparadas àquela ou a jornalismo. Mencionam que
a censura prévia proibida é a administrativa, a qual não se confunde com o exercício de jurisdição pelo
Poder Judiciário.
Aduzem que a exibição de um rosário em imagem erótica consubstancia abuso da liberdade de expressão
e ofensa ao sentimento religioso, tutelado nos artigos 5º, inciso VI, da Constituição e 208 do Código
Penal. Salientam não haver motivo político, jornalístico ou artístico a justificar a publicação, apenas o
desejo de causar polêmica e, assim, aumentar os lucros. Assinalam não ser a proibição pleiteada
limitação à evolução da sociedade ou ao acesso à cultura e à própria democracia. Pedem seja dado
provimento ao recurso e reformado o acórdão atacado, para impedir a recorrida de publicar fotografias
que vilipendiem símbolos religiosos.
A Editora Abril, em contrarrazões, defende o acerto do pronunciamento recorrido. Em preliminar,
aponta a deficiência de fundamentação quanto à inobservância ao artigo 5º, inciso XXXV, da Carta de
1988, a pretensão de reexame fático e probatório bem como a ausência de prequestionamento e de
repercussão geral da matéria.
No mérito, sustenta ser a fotografia impugnada “uma verdadeira manifestação de arte” “dentro dos
valores constitucionais permitidos no Estado Democrático de Direito” – artigos 5º, inciso IX, e 220 da
Constituição. Alega não configurarem pornografia as publicações da revista Playboy, mas atividade de
imprensa. Cita a autonomia e o discernimento de senso crítico do público adulto, alvo do periódico.
Ressalta que não foi utilizada, no acórdão recorrido, a “imunidade judicial do ofensor ” como
fundamentação, mas que apenas veio a ser assentada a inexistência de violação ao sentimento religioso.
Sublinha o propósito de homenagear Jorge Amado ante a correlação entre o título da matéria – “Carol,
Cravo e Canela” – e a memorável obra do autor – “Gabriela, Cravo e Canela”.
Argumenta serem as personagens de Jorge Amado mulheres católicas praticantes, religiosas, mas
“também sensuais”, que “despertam desejos de outros personagens”, razões pelas quais ter sido montada
a fotografia da forma como foi, sem que isso representasse desrespeito ao catolicismo ou a qualquer
crença.
Aduz competir à sociedade definir o que é moral e eticamente aceitável em uma democracia, não
podendo o Judiciário substituí-la. Alude à laicidade da República brasileira e ao dever de tratamento
igualitário ao pluralismo de culto religioso – artigo 19, inciso I, da Carta.
O recurso foi inadmitido na origem, sob os fundamentos da ausência de repercussão geral no tocante à
afronta ao princípio do devido processo legal e de impossibilidade do
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reexame de questões de fato.
No agravo, interposto visando a sequência do extraordinário, os recorrentes sustentam o equívoco da
decisão, porque não estariam envolvidas discussão concernente ao devido processo legal e revisão de
provas.
Em contrarrazões, a recorrida diz do acerto do pronunciamento.
O recurso foi protocolado no prazo legal e subscrito por profissional regularmente habilitado.
2. Eis controvérsia a ser solucionada por um Tribunal encarregado da guarda maior da Carta da
República.
Conforme asseverado, o Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo assentou consubstanciar censura
prévia e violação da liberdade de expressão artística a proibição de circulação de revista contendo foto
de mulher despida com rosário à mão. Os recorrentes alegam que atividades pornográficas não se
confundem com imprensa e que a associação do rosário a imagem erótica revela abuso da liberdade de
expressão e ofensa
ao sentimento religioso.
Presente conflito entre direitos fundamentais, compete ao Supremo definir, com vista à orientação de
casos futuros, o equilíbrio adequado entre bens tão caros à Constituição e à sociedade brasileira como o
são as liberdades religiosa e de expressão artística. Cabe elucidar se a jurisprudência do Tribunal acerca
das garantias de imprensa é observável
no tocante às publicações destinadas ao público adulto, ou mesmo se essas, por si sós, são merecedoras
da tutela prevista nos artigos 5º, inciso IX, e 220 da Carta Federal.
3. Conheço do agravo e o provejo, determinando a sequência do extraordinário e reconhecendo
configurada a repercussão geral.
4. Insiram o recurso no denominado Plenário Virtual.
5. Ao Gabinete, para acompanhar a tramitação do incidente.
6. Uma vez admitido o citado fenômeno, colham o parecer da Procuradoria Geral da República.
7. Publiquem.
Brasília, 26 de fevereiro de 2014.
Ministro MARCO AURÉLIO
Relator
Depreende-se que o ordenamento jurídico, conforme entendimento do Tribunal de Justiça de São Paulo,
acima exposto, não admite o impedimento ou a discriminação de atividade artística em função de
“sentimentos religiosos” puramente subjetivos e indefinidos; do contrário, estaríamos frustrando uma
forma básica de expressão do ser humano – a livre manifestação artística, que não poucas vezes é
Num. 4402929 - Pág. 8Assinado eletronicamente por: DOMINGOS SAVIO PEREIRA AGRA - 23/07/2018 13:57:46
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1.
apontada como caminho para o espiritual - e a própria noção de espiritualidade, que pressupõe a liberdade
do indivíduo para buscá-la e desenvolvê-la – não podendo ser resultado de imposições e restrições que
não encontram amparo no Direito.
Nesse sentido, o Estado não pode alegar discricionariedade administrativa para se submeter a restrições
sem amparo jurídico.
Deve o Estado, diante do conflito de interesses com reflexos em princípios constitucionais, ouvir os
interessados e promover o DIÁLOGO entre os mesmos, com serenidade e firmeza, sem, todavia, jamais,
submeter-se a exigências da intolerância, mas sim promovendo o respeito mútuo e a convivência pacífica
entre diferentes.
Verifica-se na resposta da Secretaria Estadual de Cultura, através de seu próprio parecer técnico, que “a
apresentação do espetáculo teatral O evangelho segundo Jesus, Rainha do Céu contribui ao evento e à
difusão do Teatro em Pernambuco, por seus atributos técnicos, artísticos e profissionais” e que a
apresentação está de acordo com “as respectivas políticas públicas (art. 16 da Lei nº 14.104/2010)”.
Dizer que os selecionados para o FIG não têm direito líquido e certo à efetiva contratação, como afirma a
secretaria estadual de cultura - não dá o aval para excluí-los em face de pressões resultantes de
intolerância reconhecida pelo próprio Estado.
2.4. DO PERICULUM IN MORA NO CASO CONCRETO
Acolhendo alegação do Estado, o respeitável magistrado a quo afirma que não haveria mais urgência do
pedido porque a peça já teria obtido a garantia de sua apresentação particular.
Ocorre que, como destacamos na ação civil pública, o cerne do pedido do Ministério Público não é a peça
teatral, mas o dever do Estado de ser garantidor da liberdade e de uma sociedade fraterna, pluralista e sem
preconceitos, não se subordinando o Estado a qualquer forma de discriminação. A apresentação particular
depende exclusivamente do grupo privado e não é objeto da ação civil pública, a qual busca sanear
evidente caso de discriminação institucional praticada pelo Estado de Pernambuco e pelo Município de
Garanhuns, numa clara violação ao princípio basilares do estado democrático-liberal de direito,
patrimônio social de todos os brasileiros.
A urgência do pedido decorre exatamente do transcurso do Festival de Inverno de Garanhuns – que segue
até o dia 28/7 - e da iminência da data inicialmente prevista para apresentação da referida peça – 26/7.
DO PEDIDO
Diante de todo o exposto, Exmo. Sr. Desembargador Relator, o Ministério Público requer a concessão da
tutela provisória de urgência satisfativa para que seja determinado ao Estado de Pernambuco que reinclua,
em 24 horas, na grade de programação do FIG/2018 - “Um viva à liberdade!” - a referida apresentação
teatral regularmente selecionada, que estava prevista para o dia 26/7, para um público adulto, às 23h, com
capacidade entre 70 e 100 pessoas, conforme a própria secretaria estadual de cultura e Fundarpe
informaram – determinando-se também ao Estado e ao Município que diligenciem para estimular o
diálogo entre os produtores da peça e os demais parceiros e a população em geral, desfazendo
mal-entendidos e preconceitos, e garantindo a segurança necessária à referida apresentação.
Garanhuns, 23 de julho de 2018.
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Domingos Sávio Pereira Agra
Promotor de Justiça
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1ª CÂMARA REGIONAL DE CARUARU – 2ª TURMA
AGRAVO DE INSTRUMENTO - PJE - Nº 0008547-20.2018.8.17.9000
Garanhuns/PE – Vara da Fazenda PúblicaCOMARCA:
Ministério Público do Estado de PernambucoAGRAVANTE:
Estado de Pernambuco e o Município de GaranhunsAGRAVADOS:
DECISÃO INTERLOCUTÓRIA
Trata-se de Agravo de Instrumento interposto pelo Ministério Público do Estado de Pernambuco contra a
decisão interlocutória proferida pelo Juízo da Vara da Fazenda Pública de Garanhuns, que indeferiu o
pedido de tutela provisória de urgência, formulado nos autos da Ação Civil Pública nº
0003751-54.2018.8.17.2640.
Na inicial, o autor requereu que fosse determinado ao Estado de Pernambuco que reincluísse, em 24
horas, na grade de programação do FIG/2018 - “Um viva à liberdade!” - a apresentação da peça teatral O
Evangelho Segundo Jesus, Rainha do Céu, prevista para o dia 26/7, voltada para um público adulto, às
23h, conforme informaram a Secretaria Estadual de Cultura, e a Fundarpe, determinando-se também ao
Estado e ao Município que diligenciem para estimular o diálogo entre os produtores da peça e os demais
parceiros e a população em geral, desfazendo mal-entendidos e preconceitos, e garantindo a segurança
.necessária à referida apresentação
Insatisfeito com a decisão, o Ministério Público do Estado de Pernambuco interpôs o presente agravo de
instrumento, pugnando pela revogação da decisão vergastada, sob o fundamento de que: a) o Poder
Público teria extrapolado os limites da discricionariedade administrativa; b) o julgador utilizou-se de
conceito jurídico indeterminado (sentimento religioso) para justificar o indeferimento da tutela colimada,
sem explicar, contudo, o motivo concreto de sua incidência no caso; c) a necessidade de ponderação dos
princípios do sentimento religioso, da liberdade de expressão e da discricionariedade administrativa.
Eis, suscintamente, o relatório.
DECIDO.
Agravo regular e tempestivo, cabível em face de decisão atacada , encontrando-se presentes os demais[1]
requisitos de admissibilidade.
Nos termos do artigo 1.019 do Código Processual Civil, pode o Relator atribuir efeito suspensivo ao
recurso ou deferir, em antecipação de tutela, total ou parcialmente, a pretensão recursal.
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A antecipação de tutela recursal, por ser medida excepcional, pressupõe o preenchimento dos seguintes
requisitos: possibilidade de lesão grave de difícil ou incerta reparação e probabilidade de provimento do
recurso.
Inicialmente, destaco que, para a concessão da tutela de urgência há a necessidade da existência dos
elementos que evidenciem a probabilidade do direito e o perigo de dano ou o risco ao resultado útil do
processo (CPC, art. 300).
A análise perfunctória, ínsita a esta fase processual, permite-me concluir que existem nos autos elementos
aptos a demonstrar a probabilidade do direito do ora agravante.
Da questão de fundo constitucional
O princípio da liberdade de expressão, previsto no art. 5º, incisos IV e IX, da Constituição Federal,
consiste, segundo Celso BASTOS, no “direito de exprimir e divulgar livremente o seu pensamento. É o
direito de não ser impedido de exprimir-se. Ao titular da liberdade de expressão é conferido o poder de
agir, pelo qual contará com a abstenção ou com a não interferência de quem quer que seja no exercício
de seu direito.”[2]
O festejado doutrinador Marcelo Novelino acerca do âmbito de proteção do aludido princípio destaca que:
“O homem não se contenta apenas em ter suas próprias opiniões. Ele quer expressá-las e, não raro,
convencer os outros de suas ideias. As convicções íntimas podem existir independentemente do Direito,
mas a liberdade para exteriorizar suas ideias e opiniões pessoais necessita de proteção jurídica. A
liberdade de manifestação do pensamento impede que o Poder Público estabeleça punições para os que
rejeitam opiniões amplamente aceitas ou censure discursos não aprovados pelo governo.”[3]
Infere-se, portanto, que toda forma de expressão do pensamento, desde que compatível com o texto
constitucional, decorre do princípio da liberdade de manifestação, não cabendo ao Poder Público
promover censura prévia no exercício de tal liberdade pública, sob pena de esvaziar o próprio Estado
Democrático de Direito.
Nesse sentido, calha destacar decisão do Pretório Excelso sobre a conhecida “Marcha da Maconha”, na
qual restou consignada a relevância do princípio da livre manifestação do pensamento e seus correlatos:
"Marcha da Maconha". Manifestação legítima, por cidadãos da República, de duas liberdades individuais
revestidas de caráter fundamental: o direito de reunião (liberdade-meio) e o direito à livre expressão do
pensamento (liberdade-fim). (...) Vinculação de caráter instrumental entre a liberdade de reunião e a
liberdade de manifestação do pensamento. (...) A liberdade de expressão como um dos mais preciosos
privilégios dos cidadãos em uma república fundada em bases democráticas. O direito à livre
manifestação do pensamento: núcleo de que se irradiam os direitos de crítica, de protesto, de
Abolição penal ( ) de determinadasdiscordância e de livre circulação de ideias. abolitio criminis
condutas puníveis. Debate que não se confunde com incitação à prática de delito nem se identifica com
apologia de fato criminoso. Discussão que deve ser realizada de forma racional, com respeito entre
interlocutores e sem possibilidade legítima de repressão estatal, ainda que as ideias propostas possam ser
consideradas, pela maioria, estranhas, insuportáveis, extravagantes, audaciosas ou inaceitáveis. O sentido
de alteridade do direito à livre expressão e o respeito às ideias que conflitem com o pensamento e os
valores dominantes no meio social. Caráter não absoluto de referida liberdade fundamental (CF, art. 5º,
IV, V e X; Convenção Americana de Direitos Humanos, art. 13, § 5º). A proteção constitucional à
liberdade de pensamento como salvaguarda não apenas das ideias e propostas prevalecentes no âmbito
social, mas, sobretudo, como amparo eficiente às posições que divergem, ainda que radicalmente, das
concepções predominantes em dado momento histórico-cultural, no âmbito das formações sociais. O
princípio majoritário, que desempenha importante papel no processo decisório, não pode legitimar
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a supressão, a frustração ou a aniquilação de direitos fundamentais, como o livre exercício do
direito de reunião e a prática legítima da liberdade de expressão, sob pena de comprometimento da
A função contramajoritária da jurisdiçãoconcepção material de democracia constitucional.
constitucional no Estado Democrático de Direito. Inadmissibilidade da "proibição estatal do dissenso".
Necessário respeito ao discurso antagônico no contexto da sociedade civil compreendida como espaço
privilegiado que deve valorizar o conceito de "livre mercado de ideias". O sentido da existência do free
como elemento fundamental e inerente ao regime democrático ( /RS,marketplace of ideas AC 2.695 MC
rel. min. Celso de Mello). A importância do conteúdo argumentativo do discurso fundado em convicções
divergentes. A livre circulação de ideias como signo identificador das sociedades abertas, cuja
natureza não se revela compatível com a repressão ao dissenso e que estimula a construção de
espaços de liberdade em obséquio ao sentido democrático que anima as instituições da República.
As plurissignificações do art. 287 do CP: necessidade de interpretar esse preceito legal em harmonia com
as liberdades fundamentais de reunião, de expressão e de petição. Legitimidade da utilização da técnica
da interpretação conforme à Constituição nos casos em que o ato estatal tenha conteúdo polissêmico.
[ , rel. min. Celso de Mello, j. 15-6-2011, P, de 29-5-2014.]ADPF 187 DJE
Vide ADI 4.274, rel. min. Ayres Britto, j. 23-11-2011, P, DJE de 2-5-2012
Consoante se vê dos autos, a peça teatral, previamente escolhida através de seleção pública, foi descartada
do Festival de Inverno de Garanhuns (FIG 2018), sob o pretexto de atender manifestações cívicas
contrárias à execução do espetáculo.
Ora, se é certo que a peça decorre do gozo de liberdade de expressão artística (art. 5º, IX, da CF),
afigura-se proibido ao Poder Público promover ainda que indiretamente uma censura prévia ao
espetáculo, para atender um suposto sentimento religioso da sociedade local, porquanto vedada toda e
qualquer forma de censura de natureza política, ideológica e artística (art. 220, § 2º da CF).
Nesse sentido também já se pronunciou a jurisprudência do Supremo Tribunal Federal:
O art. 220 da Constituição radicaliza e alarga o regime de plena liberdade de atuação da imprensa,
porquanto fala: a) que os mencionados direitos de personalidade (liberdade de pensamento, criação,
expressão e informação) estão a salvo de qualquer restrição em seu exercício, seja qual for o suporte
físico ou tecnológico de sua veiculação; b) que tal exercício não se sujeita a outras disposições que não
sejam as figurantes dela própria, Constituição. (...) O art. 220 é de instantânea observância quanto ao
desfrute das liberdades de pensamento, criação, expressão e informação que, de alguma forma, se
veiculem pelos órgãos de comunicação social. Isto sem prejuízo da aplicabilidade dos seguintes incisos do
art. 5º da mesma CF: vedação do anonimato (parte final do inciso IV); do direito de resposta (inciso V);
direito a indenização por dano material ou moral à intimidade, à vida privada, à honra e à imagem das
pessoas (inciso X); livre exercício de qualquer trabalho, ofício ou profissão, atendidas as qualificações
profissionais que a lei estabelecer (inciso XIII); direito ao resguardo do sigilo da fonte de informação,
quando necessário ao exercício profissional (inciso XIV). Lógica diretamente constitucional de calibração
temporal ou cronológica na empírica incidência desses dois blocos de dispositivos constitucionais (o art.
220 e os mencionados incisos do art. 5º). Noutros termos, primeiramente, assegura-se o gozo dos
"sobredireitos" de personalidade em que se traduz a "livre" e "plena" manifestação do pensamento, da
criação e da informação. Somente depois é que se passa a cobrar do titular de tais situações jurídicas
ativas um eventual desrespeito a direitos constitucionais alheios, ainda que também densificadores da
personalidade humana. Determinação constitucional de momentânea paralisia à inviolabilidade de
certas categorias de direitos subjetivos fundamentais, porquanto a cabeça do art. 220 da
Constituição veda qualquer cerceio ou restrição à concreta manifestação do pensamento (vedado o
anonimato), bem assim todo cerceio ou restrição que tenha por objeto a criação, a expressão e a
informação, seja qual for a forma, o processo, ou o veículo de comunicação social. Com o que a Lei
Fundamental do Brasil veicula o mais democrático e civilizado regime da livre e plena circulação
Num. 4416068 - Pág. 3Assinado eletronicamente por: SILVIO NEVES BAPTISTA FILHO - 24/07/2018 19:30:42
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das ideias e opiniões, assim como das notícias e informações, mas sem deixar de prescrever o direito
. Direito dede resposta e todo um regime de responsabilidades civis, penais e administrativas
resposta e responsabilidades que, mesmo atuando , infletem sobre as causas para inibir abusosa posteriori
no desfrute da plenitude de liberdade de imprensa. (...) Incompatibilidade material insuperável entre a Lei
5.250/1967 e a Constituição de 1988. Impossibilidade de conciliação que, sobre ser do tipo material ou de
substância (vertical), contamina toda a Lei de Imprensa: a) quanto ao seu entrelace de comandos, a
serviço da prestidigitadora lógica de que para cada regra geral afirmativa da liberdade é aberto um leque
de exceções que praticamente tudo desfaz; b) quanto ao seu inescondível efeito prático de ir além de um
simples projeto de governo para alcançar a realização de um projeto de poder, este a se eternizar no tempo
e a sufocar todo pensamento crítico no País.
[ , rel. min. Ayres Britto, j. 30-4-2009, P, de 6-11-2009.]ADPF 130 DJE
, rel. min. Ayres Britto, j. 2-9-2010, P, de 24-8-2012Vide ADI 4.451 MC-REF DJE
, rel. min. Roberto Barroso, j. 6-3-2018, 1ªT,Vide Rcl 22.328 Informativo 893
Saliente-se que a peça que ora se pretende a exibição já foi objeto de prévias restrições que acarretaram na
atuação do Judiciário:
DECISÃO ULTRA PETITA - Nulidade de decisão - Rejeição - Interpretação do pedido que
deve levar em conta o conjunto da postulação - Agravada que requereu no final de sua peça inicial
a concessão de liminar a fim de que a ré se abstenha de apresentar a peça “O Evangelho
” sem especificar data - Preliminar rejeitada.Segundo Jesus, Rainha do Céu
OBRIGAÇÃO DE FAZER - Deferimento da tutela provisória com o objetivo de obstar a apresentação da
peça “O Evangelho Segundo Jesus, Rainha do Céu” - Inconformismo do réu - Acolhimento -
Proibição da exibição da peça que viola a atividade artística prevista no art. 5º, inc. IX, da
Carta Magna - Peça que tem caráter ficcional e objetiva fomentar o debate sobre
- Decisão reformada - Recurso provido.os transgêneros sem ultrajar a Fé Cristã
(TJSP – Agravo de Instrumento nº 2180296-90.2017.8.26.0000. Relator: Des. J. L. Mônaco da Silva,
julgado em 19/02/2018).
DECISÃO INTERLOCUTÓRIA
Processo nº: 0566408-05.2017.8.05.0001
Classe Assunto: Procedimento Comum - Direito de Imagem Autor: Alexandre Santa Rosa Oliveira e
outros Réu: FUNDACAO GREGORIO DE MATOS
Vistos etc.
(...)
Num. 4416068 - Pág. 4Assinado eletronicamente por: SILVIO NEVES BAPTISTA FILHO - 24/07/2018 19:30:42
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Número do documento: 18072419304280300000004395632
As partes autoras suscitaram na peça vestibular, em síntese, que o réu pôs em cartaz para as datas de
26.10.2017 e 27.10.2017, ambos com início as 20:00, a apresentação de uma peça teatral cujo tema é: "O
"; que a peça referia-se a um monólogo em queEvangelho Segundo Jesus, Rainha do Céu
Jesus Cristo (filho de Deus bíblico), estaria vivendo em dias atuais e que ele seria uma
mulher transgênero; que a peça revelou ainda, que eram histórias bíblicas conhecidas, mas que
foram recontadas em uma perspectiva "contemporânea”, propondo uma reflexão sobre a
intolerância sofrida por transgêneros e minorias em geral; que a questão da identidade travesti era
elemento chave do espetáculo; esclareceu que a peça era atentatória a dignidade à fé cristã/católica e
todos aqueles que acreditaram e respeitaram Jesus como filho do Deus criador do universo, sem que
olvidasse ainda o personagem histórico que ele representou e sua filosofia de vida em suas
palavras; salientou ainda que tal peça teatral era extremamente ofensiva a moral da humanidade que era
em sua grande maioria crente no homem JESUS como filho de Deus e grande personagem histórico do
mundo, tal qual foi, BUDA, MAOMÉ, GANDHY, e outros grandes expoentes da história que
deixaram legado para a humanidade; que a divulgação do evento informava que se o
Cristo estivesse presente em nosso meio nos dias hodiernos ele seria um transgênero; que expôs ao
ridículo os símbolos nacionalmente encontrados, como a cruz e o próprio homem; que a peça
incitou crime de ódio e feriu a liberdade e a dignidade humana; que o artigo 5.º da
Constituição Federal previu o direito à liberdade religiosa, somado ao artigo 208 do Código Penal que
definiu os parâmetros de liberdade no tratamento desse tema; que configuração do crime era previsto no
art. 20, § 2º, da Lei N.º 7.716/89 (Lei Caó), que pressupôs violação aos limites impostos à liberdade de
manifestação religiosa e à liberdade de expressão; que a parte acionada violou o art..208 DO CP; as
partes acionantes ponderaram no sentido do dever do Estado tutelar por ordem constitucional expressa no
art. 5.º, inciso VI, da Constituição Federal, a qual dispõe que “é inviolável a liberdade de consciência e de
crença, sendo assegurado o livre exercício dos cultos religioso se garantida, na forma da lei, a
proteção aos locais de culto e as suas liturgias”; que presentes estavam os requisitos para a concessão da
tutela provisória de urgência antecipada; e as partes autoras solicitaram que a parte ré se abstivesse de
promover a realização do evento nos dias 26 de outubro de 2017 e 27 de outubro de 2017.
Decido.
(...)
Ao fazermos um juízo de valor cauteloso, prudente e provisório em relação aos documentos de
fls.23/24, na qual especificou os dias da apresentação da peça, chega-se a ilação de que,
provavelmente, as partes suplicantes se encontram em situação de prejuízo nos seus
interesses jurídicos. O princípio da laicidade comporta o respeito de toda confissão religiosa por
parte do Estado. Laicidade, corretamente entendida, significa que o Estado deve
proteger amplamente a liberdade religiosa tanto em sua dimensão pessoal como social, e não
impor, por meio de leis e decretos, nenhuma verdade especificamente religiosa ou filosófica, mas
elaborar as leis com base nas verdades morais naturais. O fundamento do direito à
liberdade religiosa se encontra na própria dignidade da pessoa humana. Um Estado não deve
tenta impedir a vivência religiosa do povo, especialmente o Cristianismo, com uma ação hostil ao
fenômeno religioso e a tentativa de encerrá-lo unicamente na esfera privada. Ao que parece a
parte acionada desrespeitou o princípio constitucional no art. 5.º, inciso VI, da
Constituição Federal a qual dispõe que “é inviolável a liberdade de consciência e de
crença, sendo assegurado o livre exercício dos cultos religioso se garantida, na forma da lei, a
proteção aos locais de culto e as suas liturgias” . Compreendo que não se pode
tentar, assim, eliminar os símbolos/crenças religiosos mais tradicionais do povo, com
narrativas debochadas e fantasiosas, como que lhe arrancando as raízes.
(...)
Salvador-BA, 27 de outubro de 2017. PAULO ALBIANI ALVES - JUIZ DE DIREITO -
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Da aplicação dos tratados internacionais à matéria
A liberdade de expressão é tema cuja análise não pode ser dissociada dos elementos normativos
internacionais dos quais a República Federativa do Brasil é adotante, como a Declaração Universal dos
direitos Humanos de 1948 (art. 19), o Pacto Internacional de Direitos Civis e Políticos (art. 19) e a
Convenção Americana Sobre Direitos Humanos (art. 13).
Consta deste último diploma internacional, denominado também de Pacto de San José da Costa Rica, no
art. 13, o seguinte dispositivo:
“I. Toda pessoa tem direito à liberdade de pensamento e de expressão. Esse direito compreende a
liberdade de buscar, receber e difundir informações e idéias de toda natureza, sem consideração de
fronteiras, verbalmente ou por escrito, ou em forma impressa ou artística, ou por qualquer outro
processo de sua escolha.
II. O exercício do direito previsto no inciso precedente não pode estar sujeito a censura prévia, mas a
e ser necessárias pararesponsabilidades ulteriores, que devem ser expressamente fixadas pela lei
assegurar:
a) o respeito aos direitos ou à reputação das demais pessoas; ou
b) a proteção da segurança nacional, da ordem pública, ou da saúde ou da moral públicas.
III. Não se pode restringir o direito de expressão por vias ou meios indiretos, tais como o abuso de
controles oficiais ou particulares de papel de imprensa, de frequências radioelétricas ou de equipamentos
e aparelhos usados na difusão de informação, nem por quaisquer outros meios destinados a obstar a
comunicação e a circulação de idéias e opiniões.
IV. A lei pode submeter os espetáculos públicos a censura prévia, com o objetivo exclusivo de
, sem prejuízo do dispostoregular o acesso a eles, para proteção moral da infância e da adolescência
no inciso 2.
V. A lei deve proibir toda propaganda a favor da guerra, bem como toda apologia ao ódio nacional,
.”racial ou religioso que constitua incitação à discriminação, à hostilidade, ao crime ou à violência
Destaque-se que, conquanto sejam admitidas limitações à referida liberdade individual – por meio da
técnica da ponderação, o exercício do direito previsto no aludido artigo não pode estar sujeito à censura
prévia, mas a responsabilidades ulteriores, através de lei, conforme disposto no inciso II do art. 13 do
referido Tratado.
Sobre o caso específico dos espetáculos públicos, há, como se pode observar, expressa disposição acerca
da excepcional possibilidade de censura prévia, todavia, com o objetivo exclusivo de regular o acesso aos
referidos espetáculos e para proteção moral da infância e da adolescência, o que não é o caso dos autos.
Outrossim, no caso concreto não se vislumbra a hipótese prevista no inciso V, pois não resta evidenciada
incitação à discriminação, à hostilidade, ao crime ou à violência - muito pelo contrário. Como se observa
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de anteriores decisões a respeito do próprio espetáculo, a obra destina-se a propalar a necessidade de
inclusão na sociedade de grupos LGBT, propondo reflexão a respeito dos princípios cristãos, possuindo
nítido caráter ficcional.
Portanto, a prevalecer o entendimento da decisão agravada, os expoentes da nossa cultura não teriam
liberdade de criar as suas obras para que o público pudesse deleitá-las, estando sujeitos à vedada e prévia
censura estatal, ainda que por meio indireto, eis que retirada igualdade de tratamento na oferta do
espetáculo ao público, por meio do cancelamento de qualquer tipo de subvenção, inclusive econômica.
Tal posicionamento colide frontalmente com os tratados internacionais dos quais o Brasil é signatário, e
fere os contornos universais do direito à liberdade de expressão.
Do mérito administrativo
É sabido que o Poder Judiciário, dentro de sua competência de fiscalizar a atuação da Administração,
pode adentrar na análise do mérito administrativo, a fim de garantir a observância das leis e dos princípios
que regem os atos administrativos.
A Lei Estadual nº 11.781, de 06.06.2000, que regulamenta o processo administrativo no âmbito da
Administração Pública Estadual, estabelece:
“Art. 2º - A Administração Púbica Estadual obedecerá, dentre outros, aos princípios da legalidade,
finalidade, , razoabilidade, proporcionalidade, moralidade, ,motivação ampla defesa, contraditório
segurança jurídica, impessoalidade e .interesse público
............................................................................................................omissis
Art. 50. Os atos administrativos deverão ser motivados, com indicação dos fatos e dos fundamentos
jurídicos, quando:
I - neguem, limitem ou afetem direitos ou interesses;
II - imponham ou agravem deveres, encargos ou sanções;
III - decidam processos administrativos de concurso, licitações ou seleção pública;
............................................................................................................omissis
VIII - importem em anulação, revogação, suspensão ou convalidação de ato administrativo.
§ 1º A motivação deve ser explícita, clara e congruente, podendo consistir em declaração de concordância
com fundamentos de anteriores pareceres, informações, decisões ou propostas, que, neste caso, serão
parte integrante do ato.”
A decisão administrativa que excluiu a peça teatral ora sob análise pressupôs um juízo de conveniência e
oportunidade por parte do administrador. A utilização dessa prerrogativa administrativa deve privilegiar
razões de interesse público, pertinentes e suficientes para justificar tal conduta.
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Veja-se que os atos discricionários da Administração estão sujeitos ao controle pelo Judiciário quanto à
legalidade formal e substancial, cabendo observar os motivos embasadores dos atos administrativos que
vinculam a Administração, conferindo-lhes legitimidade e validade. (STJ, AgRg no REsp 1280729/RJ, 2ª
Turma, Rel. Min. Humberto Martins, j. 10/04/2012, p. DJe 19/04/2012.)
A propósito, cabe trazer a lume os ensinamentos de Celso Antônio Bandeira de Mello, que a respeito do
tema assim se manifestou:
"Assim como ao Judiciário compete fulminar todo o comportamento ilegítimo da Administração que
apareça como frontal violação da ordem jurídica, compete-lhe, igualmente, fulminar qualquer
comportamento administrativo que, a pretexto de exercer apreciação ou decisão discricionária, ultrapassar
as fronteiras dela, isto é, desbordar dos limites de liberdade que lhe assistiam, violando, por tal modo, os
ditames normativos que assinalam os confins da liberdade discricionária."[4]
Ora, o caso sob exame trata de convite da Administração devidamente aceito pela produção da peça
teatral. Havendo a divulgação do calendário e das suas atrações, pressupõe-se que esse ato administrativo
atendeu aos princípios do e da , porquanto tal peça se mostrouinteresse público impessoalidade
adequada à proposta do festival, cujo lema é “Um viva à liberdade!”
A atração nada mais é do que um drama teatral, que busca conscientizar e estimular a reflexão sobre a
discriminação social de uma minoria, especialmente das transexuais e travestis.
O “ ” e aforte clima de intolerância que se estabeleceu nas redes sociais “reação da Prefeitura de
”, conforme ressaltado na justificativa da FUNDARPE ( ) não éGaranhuns e da Diocese id 4402971
motivo suficiente para excluir da programação do festival a peça teatral ora sob exame.
A exclusão da apresentação prévia e regularmente selecionada pela curadoria responsável por aprovar a
programação do festival demonstra um comportamento contraditório da administração (venire contra
máxime porque se anteriormente a peça já haviafactum proprium) vedado pelo ordenamento jurídico,
sido incluída na programação do FIG/2018 por atender aos critérios estabelecidos no edital, não poderia o
Poder Público, de forma contraditória, sem justa motivação, excluí-la das festividades.
Não seria o caso, frise-se, de aplicação do art. 49 da Lei Geral de Licitações (Lei nº 8.666/93), consoante
justifica a Administração Pública ( ), porque, para tanto, a revogação do ato administrativo seid 4402971
pautaria por razões de interesse público, por fato superveniente e devidamente comprovado. Verifica-se,
no entanto, que tal não é o caso dos autos: inexistiu motivação idônea para o cancelamento do convite e
tampouco houve fato superveniente apto a justificar tal conduta. Some-se a isso o fato de que não se trata
de licitação propriamente dita, o que reforça o afastamento do referido dispositivo legal.
Num. 4416068 - Pág. 8Assinado eletronicamente por: SILVIO NEVES BAPTISTA FILHO - 24/07/2018 19:30:42
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Número do documento: 18072419304280300000004395632
A decisão administrativa violou os princípios da motivação, da ampla defesa e do contraditório, pois
sequer foi dada oportunidade aos produtores do evento teatral de manifestarem-se acerca de tal exclusão.
Houve, de fato, uma aplicação sumária do tribunal das redes sociais, dominado por setores barulhentos da
sociedade, mas que não necessariamente reflete o pensamento da maioria.
Por outro lado, o perigo pela demora na prestação jurisdicional é evidente, eis que a data do agendamento
inicial da peça teatral se avizinha (dia 26/07/2018), não podendo aguardar-se pela manifestação da parte
contrária, uma vez que tal postergação poderá tornar inútil a apreciação do pleito recursal.
Ante todo o exposto, convencido da ilegalidade da decisão administrativa, DEFIRO O PEDIDO DE
determinando ao Estado deANTECIPAÇÃO DOS EFEITOS DA TUTELA RECURSAL,
Pernambuco que reinclua, , na grade de programação do FIG/2018 - “Um viva àem até 24 horas
liberdade!” – a peça teatral regularmente selecionada,“O Evangelho Segundo Jesus, Rainha do Céu”
que estava prevista para o dia 26/07/2018, para um público adulto, às 23h, garantindo ainda toda a
segurança necessária a consecução do evento, bem como que o Município de Garanhuns se abstenha de
embaraçar o cumprimento da presente tutela.
Fixo desde já multa no importe de R$ 50.000,00 (cinquenta mil reais) pelo descumprimento da presente
decisão.
Oficie-se ao Juízo de origem com urgência, comunicando o teor desta decisão.
Cópia da presente decisão servirá como OFÍCIO.
Intimem-se os agravados, , para: cumprirem o presente de formacom a máxima urgência a) decisum
imediata; ) no prazo legal, apresentarem contrarrazões.b
Em seguida, intime-se o Ministério Público nos moldes do artigo 1.019, III, CPC.
Publique-se. Intimem-se. Cumpra-se.
Caruaru, 24 de julho de 2018.
Num. 4416068 - Pág. 9Assinado eletronicamente por: SILVIO NEVES BAPTISTA FILHO - 24/07/2018 19:30:42
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Número do documento: 18072419304280300000004395632
Des. Silvio Neves Baptista Filho
Relator Substituto
[1] Art. 1.015. Cabe agravo de instrumento contra as decisões interlocutórias que versarem sobre: I -
tutelas provisórias;
[2] “Os limites à liberdade de expressão na Constituição da República”, pág. 43.
[3] NOVELINO, Marcelo. Manual de Direito Constitucional – volume único. 8ª Ed. – Rio de Janeiro:
Forense; São Paulo: MÉTODO, 201, pág. 501.
[4] Curso de Direito Administrativo, Editora Malheiros, 15ª Edição.
Num. 4416068 - Pág. 10Assinado eletronicamente por: SILVIO NEVES BAPTISTA FILHO - 24/07/2018 19:30:42
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0008547 20.2018.8.17.9000

  • 1. 24/07/2018 Número: 0008547-20.2018.8.17.9000 Classe: AGRAVO DE INSTRUMENTO Órgão julgador colegiado: Segunda Turma da Primeira Câmara Regional de Caruaru Órgão julgador: Gabinete do Des. Evio Marques da Silva Última distribuição : 23/07/2018 Valor da causa: R$ 100.000,00 Assuntos: Multas e demais Sanções Segredo de justiça? NÃO Justiça gratuita? SIM Pedido de liminar ou antecipação de tutela? SIM Tribunal de Justiça de Pernambuco PJe - Processo Judicial Eletrônico Partes Procurador/Terceiro vinculado 2º Promotor de Justiça de Cidadania de Garanhuns (AGRAVANTE) ESTADO DE PERNAMBUCO (AGRAVADO) MUNICIPIO DE GARANHUNS (AGRAVADO) Documentos Id. Data da Assinatura Documento Tipo 44029 29 23/07/2018 13:59 Petição Inicial Petição Inicial 44029 71 23/07/2018 13:59 Resposta Secretaria de Cultura Documento de Comprovação 44160 68 24/07/2018 19:30 Decisão Decisão
  • 2. 1. EXCELENTÍSSIMO SENHOR DESEMBARGADOR RELATOR DA ______ TURMA DA CÂMARA REGIONAL DE CARUARU, DO EGRÉGIO TRIBUNAL DE JUSTIÇA DE PERNAMBUCO: O Ministério Público do Estado de Pernambuco, por meio da 2ª Promotoria de Justiça de Defesa da Cidadania, no uso de suas atribuições legais, vem perante V. Exa., nos termos dos artigos 1.015 e seguintes do Código de Processo Civil, pelas razões adiante expostas, interpor AGRAVO DE INSTRUMENTO da decisão do Exmo. Sr. Juiz de Direito da Vara da Fazenda Pública da Comarca de Garanhuns, que negou pedido de tutela provisória de urgência nos autos da Ação Civil Pública nº 0003751-54.2018.8.17.2640. RELATÓRIO O Ministério Público ingressou com ação civil pública de obrigação de fazer, com pedido de tutela provisória de urgência antecipada, em face do Estado de Pernambuco e do Município de Garanhuns, em defesa do direito difuso a um Estado e a um Município garantidores de uma sociedade fraterna, pluralista e sem preconceitos, como previsto pelo constituinte já no preâmbulo da Constituição Federal, e que não se submetam a qualquer tipo de discriminação. Aduziu o Ministério Público, em síntese: o Governo do Estado anunciou enfaticamente o Festival de Inverno de Garanhuns – FIG 2018, com o tema “Um Viva à Liberdade!”, divulgando no dia 25/06/2018, que “o FIG será novamente um território livre para fruição da nossa diversidade, da liberdade criativa e de todas as vivências artísticas e culturais, expressão da nossa própria identidade como povo”; em 29/06/2018, em entrevista a rádio local, o Sr. Prefeito afirmou que não permitiria a apresentação, em prédio público do Município, do monólogo “O Evangelho Segundo Jesus, Rainha do Céu", justificando que adotou a atitude “como cristão e em respeito à população cristã de Garanhuns, que é a grande maioria, 99 ou 100% da população”; após a manifestação do prefeito, a presidente da Fundarpe, Márcia Souto, afirmou que a peça estava programada pra ser encenada no Sesc local, voltada para público adulto, às 23h, com capacidade entre 70 e 100 pessoas; o secretário de cultura reiterou que havia ainda outras alternativas de espaço para a exibição e que a escolha da peça, como as demais, foi um processo de curadoria pública que o Festival de Inverno faz há décadas; aatriz protagonista do monólogo, Renata Num. 4402929 - Pág. 1Assinado eletronicamente por: DOMINGOS SAVIO PEREIRA AGRA - 23/07/2018 13:57:46 https://pje.tjpe.jus.br:443/2g/Processo/ConsultaDocumento/listView.seam?x=18072313574653800000004382699 Número do documento: 18072313574653800000004382699
  • 3. 1. 1. Carvalho, declarou-se aberta ao diálogo com os opositores da peça e expôs como propósito do monólogo a reflexão sobre a exclusão, criminalização e violência contra os travestis e transexuais; após manifestações da Câmara Municipal e da Diocese de Garanhuns contra a inclusão da referida peça na programação, o Governo do Estado recuou e anunciou em 30/06, por meio de nota, a sua exclusão da Mostra de Teatro Alternativa do Festival de Inverno de Garanhuns de 2018, “diante da polêmica (...) e da possibilidade de prejuízos das parcerias estratégicas e nobres que o viabilizam”; em face da situação que se tornou pública e notória e do recuo do Estado diante das pressões recebidas, e após verificar que a peça, ao contrário do apregoado por alguns setores, trata-se de um drama e não apresenta o propósito de fazer ofensa a nenhuma crença, mas sim o de estimular a reflexão sobre a discriminação social, especialmente dos travestis e transexuais, recorrendo aos valores cristãos do amor, do perdão, da tolerância e da solidariedade, estando em conformidade com o princípio da dignidade da pessoa humana, esta Promotoria de Justiça, em conjunto com integrantes da Comissão de Promoção dos Direitos Homoafetivos do Ministério Público de Pernambuco e do Núcleo Regional da Defensoria Pública do Estado, recomendou ao secretário estadual de cultura e à presidente da Fundarpe a revisão da decisão de cancelamento da peça – ressalvada a discricionariedade administrativa, a qual, todavia, não admite submissão a qualquer forma de discriminação; diante do não acolhimento da recomendação, o Ministério Público ingressou com ação civil pública, requerendo a condenação do Estado e do Município pela prática de discriminação contra a população homoafetiva - especialmente os transexuais -, e da violação do seu dever de garantidores de uma sociedade fraterna, pluralista e sem preconceitos, condenando-os ao pagamento de indenização por danos morais coletivos a ser revertida em campanhas contra a discriminação da população homoafetiva, especialmente dos transexuais; o Ministério Público requereu ainda a tutela provisória de urgência para que sejadeterminado aoEstado de Pernambuco a reinclusão, em 24 horas, na grade de programação do FIG/2018 - “Um viva à liberdade!” - da referida apresentação teatral que foi regularmente selecionada pela Curadoria do Festival, sendo prevista para o dia 26/7, destinada a um público adulto, às 23h, com capacidade entre 70 e 100 pessoas, conforme a própria secretaria estadual de cultura e Fundarpe informaram – determinando-se também ao Estado e ao Município que diligenciem para estimular o diálogo entre os produtores da peça e os demais parceiros e a população em geral, desfazendo mal-entendidos e preconceitos, e garantindo a segurança necessária à referida apresentação. Após ouvir o Estado, o juízo “a quo” indeferiu o pedido de tutela provisória de urgência, afirmando, em síntese, que o cancelamento seria um ato discricionário do Estado, baseou-se em “critérios que traduzem o princípio do respeito ao sentimento religioso da comunidade” e que não haveria o periculum in mora porque a peça já teria conseguido recursos para se apresentar de maneira particular. É o breve relatório. DAS RAZÕES RECURSAIS . DA EXTRAPOLAÇÃO DOS LIMITES DA DISCRICIONARIEDADE ADMINISTRATIVA PELO ESTADO DE PERNAMBUCO A oportunidade e a conveniência que integram o conceito de discricionariedade não se confundem com a oportunidade e a conveniência da Administração ou de sua gestão, mas devem convergir com o interesse público. Permitam-nos, por adequar-se à questão em tela, invocar as seguintes lições dos professores Carlos Alexandre Michaello Marques, Clarice Gonçalves Pires Marques (disponível em http://www.ambito-juridico.com.br/site/index.php?artigo_id=11083&n_link=revista_artigos_leitura)., , Num. 4402929 - Pág. 2Assinado eletronicamente por: DOMINGOS SAVIO PEREIRA AGRA - 23/07/2018 13:57:46 https://pje.tjpe.jus.br:443/2g/Processo/ConsultaDocumento/listView.seam?x=18072313574653800000004382699 Número do documento: 18072313574653800000004382699
  • 4. “Demonstrando pioneirismo e posição de destaque na doutrina nacional, Celso Antônio Bandeira de Mello (2005, p. 53) resolve a celeuma conceituando Interesse Público como: “o interesse resultante do conjunto dos interesses que os indivíduos pessoalmente têm quando considerados em sua qualidade de membros da Sociedade e pelo simples fato de o serem”. Por estar-se diante de um conceito jurídico indeterminado, é importante fazer algumas distinções para melhor situar o conceito deste iminente autor. A Administração Pública, quando analisada, traz sempre consigo a importância de considerar a supremacia do interesse público sobre o interesse privado, inclusive por sua função de princípio implícito do Direito Administrativo. Desse modo, deve-se ter claramente que os interesses individuais, particulares ou de um grupo de influência não podem e não devem ter o condão de incutir novas formas de operar na Administração em que não estejam presentes os ditames legais e principiológicos, porquanto esses interesses não representam o bem geral, o bem comum. A grande problemática estabelecida nos últimos séculos, superada essa distinção preliminar, é oriunda principalmente dos conceitos de Estado existentes a partir de 1500. A identidade reconhecida entre o interesse público, interesse do Estado e o interesse soberano neste período não prospera nos dias atuais, sob pena de subverter-se todo sentido dado ao interesse público. (...) Convém salientar que o interesse público não pode ser considerando como o interesse do aparato administrativo ou da pessoa do agente público. O Estado através de seus braços administrativos e por relacionar-se com os demais entes públicos ou privados torna-se um sujeito de direito. Por essa premissa pode deter conveniências em relação à sociedade e aos demais sujeitos, deixando em segundo plano o interesse público. (...) Thêmis Limberger parafraseando Eduardo García Enterría, expoente maior da doutrina, explica que: “[...] a discricionariedade é essencialmente uma liberdade de eleição entre alternativas igualmente justas, ou seja, entre critérios extrajurídicos (de oportunidade, econômicos etc.), não previstos na lei, e conferidos ao critério subjetivo do administrador. Os conceitos jurídicos indeterminados constituem-se em um caso de aplicação da lei, já que se trata de subsumir em uma categoria legal.” (1998, p. 111)” Aplicando tais lições ao caso concreto, verifica-se que não há justiça na exclusão de uma apresentação que, até prova em contrário, foi prévia e regularmente selecionada pela curadoria responsável por aprovar a programação do FIG 2018, quando essa exclusão dá-se em face de manifestações contrárias, ainda que compreensíveis, mas não assimiláveis pelo estado democrático de direito na medida em que exigem a retirada da peça, dada a manifesta intolerância de tal exigência, aliás, intolerância reconhecida pelo próprio Estado na resposta escrita da Secretaria de Cultura à recomendação do Ministério Público (documento em anexo). Ora, se o próprio Estado de Pernambuco reconhece a intolerância das manifestações contrárias que visaram a impedir a apresentação, não existe, no caso, espaço para a discricionariedade administrativa, pois o ordenamento jurídico não se submete a preconceitos e discriminações – “Constituem objetivos fundamentais da República Federativa do Brasil: I - construir uma sociedade livre, justa e solidária; (…) IV - promover o bem de todos, sem preconceitos de origem, raça, sexo, cor, idade e quaisquer outras formas de discriminação” (artigo 3º da Constituição Federal). 2.2. DO CARÁTER INDETERMINADO DO CONCEITO JURÍDICO DE SENTIMENTO RELIGIOSO Num. 4402929 - Pág. 3Assinado eletronicamente por: DOMINGOS SAVIO PEREIRA AGRA - 23/07/2018 13:57:46 https://pje.tjpe.jus.br:443/2g/Processo/ConsultaDocumento/listView.seam?x=18072313574653800000004382699 Número do documento: 18072313574653800000004382699
  • 5. Datissima vênia, a respeitabilíssima decisão recorrida invoca um conceito jurídico indeterminado – “sentimento religioso” – para justificar o cancelamento da apresentação – sem, contudo, dizer qual a relação desse conceito com o caso concreto. O artigo 489 do Código de Processo Civil estabelece: “§ 1o Não se considera fundamentada qualquer decisão judicial, seja ela interlocutória, sentença ou acórdão, que: (...) II - empregar conceitos jurídicos indeterminados, sem explicar o motivo concreto de sua incidência no caso;” Em que, concretamente, consiste esse “respeito ao sentimento religioso da comunidade”? A qual sentimento religioso o Estado deve se curvar? Ao sentimento religioso da fraternidade, da justiça e da igualdade e do amor universal? Ou ao “sentimento religioso” da intolerância? Esse “sentimento religioso” é reconhecido aos transexuais e aos homoafetivos em geral? Ou o “sentimento religioso da comunidade” e a espiritualidade são propriedade exclusiva dos heterossexuais? Em que uma peça que invoca ficticiamente – e até prova em contrário de forma respeitosa - a figura de Jesus Cristo para tratar da discriminação e da exclusão dos transexuais, significa desrespeito ao “sentimento religioso da comunidade”? A não ser que façamos uma associação automática entre transexualidade e ofensa, o que seria uma conclusão preconceituosa. Verifica-se, assim, que, ao se referir a conceito indeterminado - “sentimento religioso” - sem explicar o motivo concreto de sua incidência no caso, a decisão, datissima vênia, não foi suficientemente fundamentada, devendo ser reformada também nesse aspecto. 2.3. DA NECESSIDADE DE APROFUNDAMENTO DO EXAME DA RELAÇÃO ENTRE OS PRINCÍPIOS DO SENTIMENTO RELIGIOSO, DA LIBERDADE DE EXPRESSÃO E DA DISCRICIONARIEDADE ADMINISTRATIVA A justa relação entre os princípios do sentimento religioso e da liberdade de expressão - tão caros e arduamente conquistados pela sociedade no Estado Democrático-Liberal de Direito - precisa ser aprofundada, de maneira a se evitarem extremismos, de um lado ou de outro, e de maneira que a Administração Pública não acolha manifestações açodadas, preconceituosas ou danosas. O Estado não pode admitir que o sentimento religioso, corolário da liberdade de crença – de natureza pessoal ou comunitária -, impeça outras manifestações igualmente legítimas – inclusive, como no caso sob exame, também de conteúdo religioso - e que em nada impedem ou ofendam objetivamente o exercício de qualquer direito de crença e a celebração dos cultos correlatos. Num. 4402929 - Pág. 4Assinado eletronicamente por: DOMINGOS SAVIO PEREIRA AGRA - 23/07/2018 13:57:46 https://pje.tjpe.jus.br:443/2g/Processo/ConsultaDocumento/listView.seam?x=18072313574653800000004382699 Número do documento: 18072313574653800000004382699
  • 6. Referência nesse tema é o caso abordado pelo STF – Supremo Tribunal Federal, em 11/04/2014, ao examinar a existência de repercussão geral no Recurso Extraordinário com Agravo 790.813. Embora o STF não tenha apreciado o Recurso Extraordinário, por entender ausente o requisito da repercussão geral (apesar de entendimento diverso do relator origina), o histórico do caso, abaixo transcrito, aponta luzes para a questão, sendo útil, mutatis mutandi, ao caso concreto objeto deste agravo (os destaques são nossos): Decisã o so bre Rep ercu ssão Ger al SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL 11/04/2014 PLENÁRIO REPERCUSSÃO GERAL NO RECURSO EXTRAORDINÁRIO COM AGRAVO 790.813 SÃO PAULO RELATOR :MIN. MARCO AURÉLIO REDATOR DO ACÓRDÃO: MIN. DIAS TOFFOLI RECTE.(S) :INSTITUTO JUVENTUDE PELA VIDA E OUTRO(A/S) ADV.(A/S) :RENATO RESENDE BENEDUZI E OUTRO(A/S) RECDO.(A/S) :ABRIL COMUNICAÇÕES S/A ADV.(A/S) :ALEXANDRE FIDALGO ADV.(A/S) :ANA PAULA FULIARO E OUTRO(A/S) Direito constitucional. Convivência entre princípios. Limites. Recurso extraordinário em que se discute a existência de violação do princípio do sentimento religioso em face do princípio da liberdade de expressão artística e de imprensa. Publicação, em revista para público adulto, de ensaio fotográfico em que modelo posou portando símbolo cristão.Litígio que não extrapola os limites da situação concreta e específica. Plenário Virtual. Embora o Tribunal, por unanimidade, tenha reputado constitucional a questão, reconheceu, por maioria, a inexistência de sua repercussão geral. Decisão: O Tribunal, por unanimidade, reputou constitucional a questão. O Tribunal, por maioria, reconheceu a inexistência de repercussão geral da questão constitucional suscitada, vencidos os Ministros Marco Aurélio e Luiz Fux. Não se manifestou o Ministro Roberto Barroso. Ministro DIAS TOFFOLI Redator para o acórdão Num. 4402929 - Pág. 5Assinado eletronicamente por: DOMINGOS SAVIO PEREIRA AGRA - 23/07/2018 13:57:46 https://pje.tjpe.jus.br:443/2g/Processo/ConsultaDocumento/listView.seam?x=18072313574653800000004382699 Número do documento: 18072313574653800000004382699
  • 7. Manife staçã o sob re a Rep erc ussão Ger al REPERCUSSÃO GERAL NO RECURSO EXTRAORDINÁRIO COM AGRAVO 790.813 SÃO PAULO Repercussão Geral no Recurso Extraordinário Com Agravo 790.813 São Paulo RELATOR :MIN. MARCO AURÉLIO RECTE.(S) :INSTITUTO JUVENTUDE PELA VIDA E OUTRO(A/S) ADV.(A/S) :RENATO RESENDE BENEDUZI E OUTRO(A/S) RECDO.(A/S) :ABRIL COMUNICAÇÕES S/A ADV.(A/S) :ALEXANDRE FIDALGO ADV.(A/S) :ANA PAULA FULIARO E OUTRO(A/S) DECISÃO E PRONUNCIAMENTO RECURSO EXTRAORDINÁRIO –REVISTA “PLAYBOY” – FOTO DE ATRIZ DESPIDA COM ROSÁRIO À MÃO – CONFLITO DE PRINCÍPIOS – TUTELA DO SENTIMENTO RELIGIOSO VERSUS LIBERDADE DE EXPRESSÃO ARTÍTISTICA – VEDAÇÃO DE CENSURA PRÉVIA – ARTIGOS 5º, INCISO VI, E 220 DA CARTA DA REPÚBLICA – AGRAVO PROVIDO NOS PRÓPRIOS AUTOS – SEQUÊNCIA – REPERCUSSÃO GERAL –CONFIGURAÇÃO. 1. O Gabinete prestou as seguintes informações: O Instituto Juventude Pela Vida e Luiz Carlos Lodi da Cruz interpuseram recurso extraordinário, inadmitido nab re a Rep erc ussão Ger alorigem, com o objetivo de reformar julgado da Oitava Câmara de Direito Privado do Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo, cujo acórdão está assim resumido: Imprensa. Pedido de proibição de veiculação de revista. Desrespeito ao sentimento religioso. Matéria com fotos que, na visão dos autores, ofendem este sentimento. Censura prévia vedada. Ação improcedente. Recurso provido. Os recorrentes formalizaram ação de obrigação de não fazer contra a Editora Abril com o propósito de inibir a circulação da edição de agosto de 2008 da revista “Playboy”, porquanto veiculada foto da atriz Carol Castro despida, em página inteira, tendo à mão direita um rosário identificado pelas contas e pelo crucifixo. Alegaram ofensa ao sentimento religioso. Foi deferida, parcialmente, tutela antecipada para impedir a distribuição de novas revistas presente a imagem contestada, mantidas, nas bancas e em outros pontos de comércio, aquelas já postas em venda. No mérito, o Juízo deu provimento parcial ao pedido nos termos assentados quando do pronunciamento liminar. O Tribunal de origem reformou o julgado, asseverando não ser a inadequação da imagem suficiente a inviabilizar a divulgação da edição do periódico, ausente prova de ofensa objetiva a indivíduo ou a instituição específica. Ressaltou pressupor “considerações ideológico-subjetivas” o acolhimento da pretensão dos autores, o que extrapolaria os estreitos limites de motivação de toda e qualquer prestação jurisdicional. Ante o fato de haver-se buscado, no ensaio fotográfico, retratar Num. 4402929 - Pág. 6Assinado eletronicamente por: DOMINGOS SAVIO PEREIRA AGRA - 23/07/2018 13:57:46 https://pje.tjpe.jus.br:443/2g/Processo/ConsultaDocumento/listView.seam?x=18072313574653800000004382699 Número do documento: 18072313574653800000004382699
  • 8. personagens femininos de Jorge Amado, consignou revelarem as obras do autor “instrumentos adequados de educação e visualização cultural de um povo em determinado espaço e tempo”. Evocou a decisão do Supremo na Medida Cautelar na Ação Direta de Inconstitucionalidade nº 4.451/DF, relator ministro Ayres Britto, julgada em 2 de setembro de 2010, para concluir pela transgressão, no caso concreto, à liberdade de expressão, configurada censura ao ato de proibir a circulação da revista. Frisou ainda ausência de afronta aos artigos 187 do Código Civil e 5º, inciso XXXV, da Carta da República. No extraordinário, interposto com alegada base na alínea “a” do permissivo constitucional, os recorrentes sustentam, em preliminar, a repercussão geral da questão veiculada. Quanto ao mérito, dizem do equívoco, no acórdão atacado, relativamente a entender tutela judicial preventiva, envolvidas liberdades de expressão e de imprensa, como censura prévia. Afirmam ser esse um “perigoso precedente generalizante”. Apontam o artigo 5º, inciso XXXV, da Carta, para destacarem que o direito constitucional à proteção jurisdicional, incluída a apreciação de ameaça a direito, alcança a imprensa e, com mais razão, atividades pornográficas, que não podem ser equiparadas àquela ou a jornalismo. Mencionam que a censura prévia proibida é a administrativa, a qual não se confunde com o exercício de jurisdição pelo Poder Judiciário. Aduzem que a exibição de um rosário em imagem erótica consubstancia abuso da liberdade de expressão e ofensa ao sentimento religioso, tutelado nos artigos 5º, inciso VI, da Constituição e 208 do Código Penal. Salientam não haver motivo político, jornalístico ou artístico a justificar a publicação, apenas o desejo de causar polêmica e, assim, aumentar os lucros. Assinalam não ser a proibição pleiteada limitação à evolução da sociedade ou ao acesso à cultura e à própria democracia. Pedem seja dado provimento ao recurso e reformado o acórdão atacado, para impedir a recorrida de publicar fotografias que vilipendiem símbolos religiosos. A Editora Abril, em contrarrazões, defende o acerto do pronunciamento recorrido. Em preliminar, aponta a deficiência de fundamentação quanto à inobservância ao artigo 5º, inciso XXXV, da Carta de 1988, a pretensão de reexame fático e probatório bem como a ausência de prequestionamento e de repercussão geral da matéria. No mérito, sustenta ser a fotografia impugnada “uma verdadeira manifestação de arte” “dentro dos valores constitucionais permitidos no Estado Democrático de Direito” – artigos 5º, inciso IX, e 220 da Constituição. Alega não configurarem pornografia as publicações da revista Playboy, mas atividade de imprensa. Cita a autonomia e o discernimento de senso crítico do público adulto, alvo do periódico. Ressalta que não foi utilizada, no acórdão recorrido, a “imunidade judicial do ofensor ” como fundamentação, mas que apenas veio a ser assentada a inexistência de violação ao sentimento religioso. Sublinha o propósito de homenagear Jorge Amado ante a correlação entre o título da matéria – “Carol, Cravo e Canela” – e a memorável obra do autor – “Gabriela, Cravo e Canela”. Argumenta serem as personagens de Jorge Amado mulheres católicas praticantes, religiosas, mas “também sensuais”, que “despertam desejos de outros personagens”, razões pelas quais ter sido montada a fotografia da forma como foi, sem que isso representasse desrespeito ao catolicismo ou a qualquer crença. Aduz competir à sociedade definir o que é moral e eticamente aceitável em uma democracia, não podendo o Judiciário substituí-la. Alude à laicidade da República brasileira e ao dever de tratamento igualitário ao pluralismo de culto religioso – artigo 19, inciso I, da Carta. O recurso foi inadmitido na origem, sob os fundamentos da ausência de repercussão geral no tocante à afronta ao princípio do devido processo legal e de impossibilidade do Num. 4402929 - Pág. 7Assinado eletronicamente por: DOMINGOS SAVIO PEREIRA AGRA - 23/07/2018 13:57:46 https://pje.tjpe.jus.br:443/2g/Processo/ConsultaDocumento/listView.seam?x=18072313574653800000004382699 Número do documento: 18072313574653800000004382699
  • 9. reexame de questões de fato. No agravo, interposto visando a sequência do extraordinário, os recorrentes sustentam o equívoco da decisão, porque não estariam envolvidas discussão concernente ao devido processo legal e revisão de provas. Em contrarrazões, a recorrida diz do acerto do pronunciamento. O recurso foi protocolado no prazo legal e subscrito por profissional regularmente habilitado. 2. Eis controvérsia a ser solucionada por um Tribunal encarregado da guarda maior da Carta da República. Conforme asseverado, o Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo assentou consubstanciar censura prévia e violação da liberdade de expressão artística a proibição de circulação de revista contendo foto de mulher despida com rosário à mão. Os recorrentes alegam que atividades pornográficas não se confundem com imprensa e que a associação do rosário a imagem erótica revela abuso da liberdade de expressão e ofensa ao sentimento religioso. Presente conflito entre direitos fundamentais, compete ao Supremo definir, com vista à orientação de casos futuros, o equilíbrio adequado entre bens tão caros à Constituição e à sociedade brasileira como o são as liberdades religiosa e de expressão artística. Cabe elucidar se a jurisprudência do Tribunal acerca das garantias de imprensa é observável no tocante às publicações destinadas ao público adulto, ou mesmo se essas, por si sós, são merecedoras da tutela prevista nos artigos 5º, inciso IX, e 220 da Carta Federal. 3. Conheço do agravo e o provejo, determinando a sequência do extraordinário e reconhecendo configurada a repercussão geral. 4. Insiram o recurso no denominado Plenário Virtual. 5. Ao Gabinete, para acompanhar a tramitação do incidente. 6. Uma vez admitido o citado fenômeno, colham o parecer da Procuradoria Geral da República. 7. Publiquem. Brasília, 26 de fevereiro de 2014. Ministro MARCO AURÉLIO Relator Depreende-se que o ordenamento jurídico, conforme entendimento do Tribunal de Justiça de São Paulo, acima exposto, não admite o impedimento ou a discriminação de atividade artística em função de “sentimentos religiosos” puramente subjetivos e indefinidos; do contrário, estaríamos frustrando uma forma básica de expressão do ser humano – a livre manifestação artística, que não poucas vezes é Num. 4402929 - Pág. 8Assinado eletronicamente por: DOMINGOS SAVIO PEREIRA AGRA - 23/07/2018 13:57:46 https://pje.tjpe.jus.br:443/2g/Processo/ConsultaDocumento/listView.seam?x=18072313574653800000004382699 Número do documento: 18072313574653800000004382699
  • 10. 1. apontada como caminho para o espiritual - e a própria noção de espiritualidade, que pressupõe a liberdade do indivíduo para buscá-la e desenvolvê-la – não podendo ser resultado de imposições e restrições que não encontram amparo no Direito. Nesse sentido, o Estado não pode alegar discricionariedade administrativa para se submeter a restrições sem amparo jurídico. Deve o Estado, diante do conflito de interesses com reflexos em princípios constitucionais, ouvir os interessados e promover o DIÁLOGO entre os mesmos, com serenidade e firmeza, sem, todavia, jamais, submeter-se a exigências da intolerância, mas sim promovendo o respeito mútuo e a convivência pacífica entre diferentes. Verifica-se na resposta da Secretaria Estadual de Cultura, através de seu próprio parecer técnico, que “a apresentação do espetáculo teatral O evangelho segundo Jesus, Rainha do Céu contribui ao evento e à difusão do Teatro em Pernambuco, por seus atributos técnicos, artísticos e profissionais” e que a apresentação está de acordo com “as respectivas políticas públicas (art. 16 da Lei nº 14.104/2010)”. Dizer que os selecionados para o FIG não têm direito líquido e certo à efetiva contratação, como afirma a secretaria estadual de cultura - não dá o aval para excluí-los em face de pressões resultantes de intolerância reconhecida pelo próprio Estado. 2.4. DO PERICULUM IN MORA NO CASO CONCRETO Acolhendo alegação do Estado, o respeitável magistrado a quo afirma que não haveria mais urgência do pedido porque a peça já teria obtido a garantia de sua apresentação particular. Ocorre que, como destacamos na ação civil pública, o cerne do pedido do Ministério Público não é a peça teatral, mas o dever do Estado de ser garantidor da liberdade e de uma sociedade fraterna, pluralista e sem preconceitos, não se subordinando o Estado a qualquer forma de discriminação. A apresentação particular depende exclusivamente do grupo privado e não é objeto da ação civil pública, a qual busca sanear evidente caso de discriminação institucional praticada pelo Estado de Pernambuco e pelo Município de Garanhuns, numa clara violação ao princípio basilares do estado democrático-liberal de direito, patrimônio social de todos os brasileiros. A urgência do pedido decorre exatamente do transcurso do Festival de Inverno de Garanhuns – que segue até o dia 28/7 - e da iminência da data inicialmente prevista para apresentação da referida peça – 26/7. DO PEDIDO Diante de todo o exposto, Exmo. Sr. Desembargador Relator, o Ministério Público requer a concessão da tutela provisória de urgência satisfativa para que seja determinado ao Estado de Pernambuco que reinclua, em 24 horas, na grade de programação do FIG/2018 - “Um viva à liberdade!” - a referida apresentação teatral regularmente selecionada, que estava prevista para o dia 26/7, para um público adulto, às 23h, com capacidade entre 70 e 100 pessoas, conforme a própria secretaria estadual de cultura e Fundarpe informaram – determinando-se também ao Estado e ao Município que diligenciem para estimular o diálogo entre os produtores da peça e os demais parceiros e a população em geral, desfazendo mal-entendidos e preconceitos, e garantindo a segurança necessária à referida apresentação. Garanhuns, 23 de julho de 2018. Num. 4402929 - Pág. 9Assinado eletronicamente por: DOMINGOS SAVIO PEREIRA AGRA - 23/07/2018 13:57:46 https://pje.tjpe.jus.br:443/2g/Processo/ConsultaDocumento/listView.seam?x=18072313574653800000004382699 Número do documento: 18072313574653800000004382699
  • 11. Domingos Sávio Pereira Agra Promotor de Justiça Num. 4402929 - Pág. 10Assinado eletronicamente por: DOMINGOS SAVIO PEREIRA AGRA - 23/07/2018 13:57:46 https://pje.tjpe.jus.br:443/2g/Processo/ConsultaDocumento/listView.seam?x=18072313574653800000004382699 Número do documento: 18072313574653800000004382699
  • 12. Num. 4402971 - Pág. 1Assinado eletronicamente por: DOMINGOS SAVIO PEREIRA AGRA - 23/07/2018 13:57:46 https://pje.tjpe.jus.br:443/2g/Processo/ConsultaDocumento/listView.seam?x=18072313574666600000004382738 Número do documento: 18072313574666600000004382738
  • 13. Num. 4402971 - Pág. 2Assinado eletronicamente por: DOMINGOS SAVIO PEREIRA AGRA - 23/07/2018 13:57:46 https://pje.tjpe.jus.br:443/2g/Processo/ConsultaDocumento/listView.seam?x=18072313574666600000004382738 Número do documento: 18072313574666600000004382738
  • 14. Num. 4402971 - Pág. 3Assinado eletronicamente por: DOMINGOS SAVIO PEREIRA AGRA - 23/07/2018 13:57:46 https://pje.tjpe.jus.br:443/2g/Processo/ConsultaDocumento/listView.seam?x=18072313574666600000004382738 Número do documento: 18072313574666600000004382738
  • 15. Num. 4402971 - Pág. 4Assinado eletronicamente por: DOMINGOS SAVIO PEREIRA AGRA - 23/07/2018 13:57:46 https://pje.tjpe.jus.br:443/2g/Processo/ConsultaDocumento/listView.seam?x=18072313574666600000004382738 Número do documento: 18072313574666600000004382738
  • 16. Num. 4402971 - Pág. 5Assinado eletronicamente por: DOMINGOS SAVIO PEREIRA AGRA - 23/07/2018 13:57:46 https://pje.tjpe.jus.br:443/2g/Processo/ConsultaDocumento/listView.seam?x=18072313574666600000004382738 Número do documento: 18072313574666600000004382738
  • 17. Num. 4402971 - Pág. 6Assinado eletronicamente por: DOMINGOS SAVIO PEREIRA AGRA - 23/07/2018 13:57:46 https://pje.tjpe.jus.br:443/2g/Processo/ConsultaDocumento/listView.seam?x=18072313574666600000004382738 Número do documento: 18072313574666600000004382738
  • 18. Num. 4402971 - Pág. 7Assinado eletronicamente por: DOMINGOS SAVIO PEREIRA AGRA - 23/07/2018 13:57:46 https://pje.tjpe.jus.br:443/2g/Processo/ConsultaDocumento/listView.seam?x=18072313574666600000004382738 Número do documento: 18072313574666600000004382738
  • 19. Num. 4402971 - Pág. 8Assinado eletronicamente por: DOMINGOS SAVIO PEREIRA AGRA - 23/07/2018 13:57:46 https://pje.tjpe.jus.br:443/2g/Processo/ConsultaDocumento/listView.seam?x=18072313574666600000004382738 Número do documento: 18072313574666600000004382738
  • 20. Num. 4402971 - Pág. 9Assinado eletronicamente por: DOMINGOS SAVIO PEREIRA AGRA - 23/07/2018 13:57:46 https://pje.tjpe.jus.br:443/2g/Processo/ConsultaDocumento/listView.seam?x=18072313574666600000004382738 Número do documento: 18072313574666600000004382738
  • 21. Num. 4402971 - Pág. 10Assinado eletronicamente por: DOMINGOS SAVIO PEREIRA AGRA - 23/07/2018 13:57:46 https://pje.tjpe.jus.br:443/2g/Processo/ConsultaDocumento/listView.seam?x=18072313574666600000004382738 Número do documento: 18072313574666600000004382738
  • 22. Num. 4402971 - Pág. 11Assinado eletronicamente por: DOMINGOS SAVIO PEREIRA AGRA - 23/07/2018 13:57:46 https://pje.tjpe.jus.br:443/2g/Processo/ConsultaDocumento/listView.seam?x=18072313574666600000004382738 Número do documento: 18072313574666600000004382738
  • 23. Num. 4402971 - Pág. 12Assinado eletronicamente por: DOMINGOS SAVIO PEREIRA AGRA - 23/07/2018 13:57:46 https://pje.tjpe.jus.br:443/2g/Processo/ConsultaDocumento/listView.seam?x=18072313574666600000004382738 Número do documento: 18072313574666600000004382738
  • 24. Num. 4402971 - Pág. 13Assinado eletronicamente por: DOMINGOS SAVIO PEREIRA AGRA - 23/07/2018 13:57:46 https://pje.tjpe.jus.br:443/2g/Processo/ConsultaDocumento/listView.seam?x=18072313574666600000004382738 Número do documento: 18072313574666600000004382738
  • 25. Num. 4402971 - Pág. 14Assinado eletronicamente por: DOMINGOS SAVIO PEREIRA AGRA - 23/07/2018 13:57:46 https://pje.tjpe.jus.br:443/2g/Processo/ConsultaDocumento/listView.seam?x=18072313574666600000004382738 Número do documento: 18072313574666600000004382738
  • 26. Num. 4402971 - Pág. 15Assinado eletronicamente por: DOMINGOS SAVIO PEREIRA AGRA - 23/07/2018 13:57:46 https://pje.tjpe.jus.br:443/2g/Processo/ConsultaDocumento/listView.seam?x=18072313574666600000004382738 Número do documento: 18072313574666600000004382738
  • 27. Num. 4402971 - Pág. 16Assinado eletronicamente por: DOMINGOS SAVIO PEREIRA AGRA - 23/07/2018 13:57:46 https://pje.tjpe.jus.br:443/2g/Processo/ConsultaDocumento/listView.seam?x=18072313574666600000004382738 Número do documento: 18072313574666600000004382738
  • 28. Num. 4402971 - Pág. 17Assinado eletronicamente por: DOMINGOS SAVIO PEREIRA AGRA - 23/07/2018 13:57:46 https://pje.tjpe.jus.br:443/2g/Processo/ConsultaDocumento/listView.seam?x=18072313574666600000004382738 Número do documento: 18072313574666600000004382738
  • 29. 1ª CÂMARA REGIONAL DE CARUARU – 2ª TURMA AGRAVO DE INSTRUMENTO - PJE - Nº 0008547-20.2018.8.17.9000 Garanhuns/PE – Vara da Fazenda PúblicaCOMARCA: Ministério Público do Estado de PernambucoAGRAVANTE: Estado de Pernambuco e o Município de GaranhunsAGRAVADOS: DECISÃO INTERLOCUTÓRIA Trata-se de Agravo de Instrumento interposto pelo Ministério Público do Estado de Pernambuco contra a decisão interlocutória proferida pelo Juízo da Vara da Fazenda Pública de Garanhuns, que indeferiu o pedido de tutela provisória de urgência, formulado nos autos da Ação Civil Pública nº 0003751-54.2018.8.17.2640. Na inicial, o autor requereu que fosse determinado ao Estado de Pernambuco que reincluísse, em 24 horas, na grade de programação do FIG/2018 - “Um viva à liberdade!” - a apresentação da peça teatral O Evangelho Segundo Jesus, Rainha do Céu, prevista para o dia 26/7, voltada para um público adulto, às 23h, conforme informaram a Secretaria Estadual de Cultura, e a Fundarpe, determinando-se também ao Estado e ao Município que diligenciem para estimular o diálogo entre os produtores da peça e os demais parceiros e a população em geral, desfazendo mal-entendidos e preconceitos, e garantindo a segurança .necessária à referida apresentação Insatisfeito com a decisão, o Ministério Público do Estado de Pernambuco interpôs o presente agravo de instrumento, pugnando pela revogação da decisão vergastada, sob o fundamento de que: a) o Poder Público teria extrapolado os limites da discricionariedade administrativa; b) o julgador utilizou-se de conceito jurídico indeterminado (sentimento religioso) para justificar o indeferimento da tutela colimada, sem explicar, contudo, o motivo concreto de sua incidência no caso; c) a necessidade de ponderação dos princípios do sentimento religioso, da liberdade de expressão e da discricionariedade administrativa. Eis, suscintamente, o relatório. DECIDO. Agravo regular e tempestivo, cabível em face de decisão atacada , encontrando-se presentes os demais[1] requisitos de admissibilidade. Nos termos do artigo 1.019 do Código Processual Civil, pode o Relator atribuir efeito suspensivo ao recurso ou deferir, em antecipação de tutela, total ou parcialmente, a pretensão recursal. Num. 4416068 - Pág. 1Assinado eletronicamente por: SILVIO NEVES BAPTISTA FILHO - 24/07/2018 19:30:42 https://pje.tjpe.jus.br:443/2g/Processo/ConsultaDocumento/listView.seam?x=18072419304280300000004395632 Número do documento: 18072419304280300000004395632
  • 30. A antecipação de tutela recursal, por ser medida excepcional, pressupõe o preenchimento dos seguintes requisitos: possibilidade de lesão grave de difícil ou incerta reparação e probabilidade de provimento do recurso. Inicialmente, destaco que, para a concessão da tutela de urgência há a necessidade da existência dos elementos que evidenciem a probabilidade do direito e o perigo de dano ou o risco ao resultado útil do processo (CPC, art. 300). A análise perfunctória, ínsita a esta fase processual, permite-me concluir que existem nos autos elementos aptos a demonstrar a probabilidade do direito do ora agravante. Da questão de fundo constitucional O princípio da liberdade de expressão, previsto no art. 5º, incisos IV e IX, da Constituição Federal, consiste, segundo Celso BASTOS, no “direito de exprimir e divulgar livremente o seu pensamento. É o direito de não ser impedido de exprimir-se. Ao titular da liberdade de expressão é conferido o poder de agir, pelo qual contará com a abstenção ou com a não interferência de quem quer que seja no exercício de seu direito.”[2] O festejado doutrinador Marcelo Novelino acerca do âmbito de proteção do aludido princípio destaca que: “O homem não se contenta apenas em ter suas próprias opiniões. Ele quer expressá-las e, não raro, convencer os outros de suas ideias. As convicções íntimas podem existir independentemente do Direito, mas a liberdade para exteriorizar suas ideias e opiniões pessoais necessita de proteção jurídica. A liberdade de manifestação do pensamento impede que o Poder Público estabeleça punições para os que rejeitam opiniões amplamente aceitas ou censure discursos não aprovados pelo governo.”[3] Infere-se, portanto, que toda forma de expressão do pensamento, desde que compatível com o texto constitucional, decorre do princípio da liberdade de manifestação, não cabendo ao Poder Público promover censura prévia no exercício de tal liberdade pública, sob pena de esvaziar o próprio Estado Democrático de Direito. Nesse sentido, calha destacar decisão do Pretório Excelso sobre a conhecida “Marcha da Maconha”, na qual restou consignada a relevância do princípio da livre manifestação do pensamento e seus correlatos: "Marcha da Maconha". Manifestação legítima, por cidadãos da República, de duas liberdades individuais revestidas de caráter fundamental: o direito de reunião (liberdade-meio) e o direito à livre expressão do pensamento (liberdade-fim). (...) Vinculação de caráter instrumental entre a liberdade de reunião e a liberdade de manifestação do pensamento. (...) A liberdade de expressão como um dos mais preciosos privilégios dos cidadãos em uma república fundada em bases democráticas. O direito à livre manifestação do pensamento: núcleo de que se irradiam os direitos de crítica, de protesto, de Abolição penal ( ) de determinadasdiscordância e de livre circulação de ideias. abolitio criminis condutas puníveis. Debate que não se confunde com incitação à prática de delito nem se identifica com apologia de fato criminoso. Discussão que deve ser realizada de forma racional, com respeito entre interlocutores e sem possibilidade legítima de repressão estatal, ainda que as ideias propostas possam ser consideradas, pela maioria, estranhas, insuportáveis, extravagantes, audaciosas ou inaceitáveis. O sentido de alteridade do direito à livre expressão e o respeito às ideias que conflitem com o pensamento e os valores dominantes no meio social. Caráter não absoluto de referida liberdade fundamental (CF, art. 5º, IV, V e X; Convenção Americana de Direitos Humanos, art. 13, § 5º). A proteção constitucional à liberdade de pensamento como salvaguarda não apenas das ideias e propostas prevalecentes no âmbito social, mas, sobretudo, como amparo eficiente às posições que divergem, ainda que radicalmente, das concepções predominantes em dado momento histórico-cultural, no âmbito das formações sociais. O princípio majoritário, que desempenha importante papel no processo decisório, não pode legitimar Num. 4416068 - Pág. 2Assinado eletronicamente por: SILVIO NEVES BAPTISTA FILHO - 24/07/2018 19:30:42 https://pje.tjpe.jus.br:443/2g/Processo/ConsultaDocumento/listView.seam?x=18072419304280300000004395632 Número do documento: 18072419304280300000004395632
  • 31. a supressão, a frustração ou a aniquilação de direitos fundamentais, como o livre exercício do direito de reunião e a prática legítima da liberdade de expressão, sob pena de comprometimento da A função contramajoritária da jurisdiçãoconcepção material de democracia constitucional. constitucional no Estado Democrático de Direito. Inadmissibilidade da "proibição estatal do dissenso". Necessário respeito ao discurso antagônico no contexto da sociedade civil compreendida como espaço privilegiado que deve valorizar o conceito de "livre mercado de ideias". O sentido da existência do free como elemento fundamental e inerente ao regime democrático ( /RS,marketplace of ideas AC 2.695 MC rel. min. Celso de Mello). A importância do conteúdo argumentativo do discurso fundado em convicções divergentes. A livre circulação de ideias como signo identificador das sociedades abertas, cuja natureza não se revela compatível com a repressão ao dissenso e que estimula a construção de espaços de liberdade em obséquio ao sentido democrático que anima as instituições da República. As plurissignificações do art. 287 do CP: necessidade de interpretar esse preceito legal em harmonia com as liberdades fundamentais de reunião, de expressão e de petição. Legitimidade da utilização da técnica da interpretação conforme à Constituição nos casos em que o ato estatal tenha conteúdo polissêmico. [ , rel. min. Celso de Mello, j. 15-6-2011, P, de 29-5-2014.]ADPF 187 DJE Vide ADI 4.274, rel. min. Ayres Britto, j. 23-11-2011, P, DJE de 2-5-2012 Consoante se vê dos autos, a peça teatral, previamente escolhida através de seleção pública, foi descartada do Festival de Inverno de Garanhuns (FIG 2018), sob o pretexto de atender manifestações cívicas contrárias à execução do espetáculo. Ora, se é certo que a peça decorre do gozo de liberdade de expressão artística (art. 5º, IX, da CF), afigura-se proibido ao Poder Público promover ainda que indiretamente uma censura prévia ao espetáculo, para atender um suposto sentimento religioso da sociedade local, porquanto vedada toda e qualquer forma de censura de natureza política, ideológica e artística (art. 220, § 2º da CF). Nesse sentido também já se pronunciou a jurisprudência do Supremo Tribunal Federal: O art. 220 da Constituição radicaliza e alarga o regime de plena liberdade de atuação da imprensa, porquanto fala: a) que os mencionados direitos de personalidade (liberdade de pensamento, criação, expressão e informação) estão a salvo de qualquer restrição em seu exercício, seja qual for o suporte físico ou tecnológico de sua veiculação; b) que tal exercício não se sujeita a outras disposições que não sejam as figurantes dela própria, Constituição. (...) O art. 220 é de instantânea observância quanto ao desfrute das liberdades de pensamento, criação, expressão e informação que, de alguma forma, se veiculem pelos órgãos de comunicação social. Isto sem prejuízo da aplicabilidade dos seguintes incisos do art. 5º da mesma CF: vedação do anonimato (parte final do inciso IV); do direito de resposta (inciso V); direito a indenização por dano material ou moral à intimidade, à vida privada, à honra e à imagem das pessoas (inciso X); livre exercício de qualquer trabalho, ofício ou profissão, atendidas as qualificações profissionais que a lei estabelecer (inciso XIII); direito ao resguardo do sigilo da fonte de informação, quando necessário ao exercício profissional (inciso XIV). Lógica diretamente constitucional de calibração temporal ou cronológica na empírica incidência desses dois blocos de dispositivos constitucionais (o art. 220 e os mencionados incisos do art. 5º). Noutros termos, primeiramente, assegura-se o gozo dos "sobredireitos" de personalidade em que se traduz a "livre" e "plena" manifestação do pensamento, da criação e da informação. Somente depois é que se passa a cobrar do titular de tais situações jurídicas ativas um eventual desrespeito a direitos constitucionais alheios, ainda que também densificadores da personalidade humana. Determinação constitucional de momentânea paralisia à inviolabilidade de certas categorias de direitos subjetivos fundamentais, porquanto a cabeça do art. 220 da Constituição veda qualquer cerceio ou restrição à concreta manifestação do pensamento (vedado o anonimato), bem assim todo cerceio ou restrição que tenha por objeto a criação, a expressão e a informação, seja qual for a forma, o processo, ou o veículo de comunicação social. Com o que a Lei Fundamental do Brasil veicula o mais democrático e civilizado regime da livre e plena circulação Num. 4416068 - Pág. 3Assinado eletronicamente por: SILVIO NEVES BAPTISTA FILHO - 24/07/2018 19:30:42 https://pje.tjpe.jus.br:443/2g/Processo/ConsultaDocumento/listView.seam?x=18072419304280300000004395632 Número do documento: 18072419304280300000004395632
  • 32. das ideias e opiniões, assim como das notícias e informações, mas sem deixar de prescrever o direito . Direito dede resposta e todo um regime de responsabilidades civis, penais e administrativas resposta e responsabilidades que, mesmo atuando , infletem sobre as causas para inibir abusosa posteriori no desfrute da plenitude de liberdade de imprensa. (...) Incompatibilidade material insuperável entre a Lei 5.250/1967 e a Constituição de 1988. Impossibilidade de conciliação que, sobre ser do tipo material ou de substância (vertical), contamina toda a Lei de Imprensa: a) quanto ao seu entrelace de comandos, a serviço da prestidigitadora lógica de que para cada regra geral afirmativa da liberdade é aberto um leque de exceções que praticamente tudo desfaz; b) quanto ao seu inescondível efeito prático de ir além de um simples projeto de governo para alcançar a realização de um projeto de poder, este a se eternizar no tempo e a sufocar todo pensamento crítico no País. [ , rel. min. Ayres Britto, j. 30-4-2009, P, de 6-11-2009.]ADPF 130 DJE , rel. min. Ayres Britto, j. 2-9-2010, P, de 24-8-2012Vide ADI 4.451 MC-REF DJE , rel. min. Roberto Barroso, j. 6-3-2018, 1ªT,Vide Rcl 22.328 Informativo 893 Saliente-se que a peça que ora se pretende a exibição já foi objeto de prévias restrições que acarretaram na atuação do Judiciário: DECISÃO ULTRA PETITA - Nulidade de decisão - Rejeição - Interpretação do pedido que deve levar em conta o conjunto da postulação - Agravada que requereu no final de sua peça inicial a concessão de liminar a fim de que a ré se abstenha de apresentar a peça “O Evangelho ” sem especificar data - Preliminar rejeitada.Segundo Jesus, Rainha do Céu OBRIGAÇÃO DE FAZER - Deferimento da tutela provisória com o objetivo de obstar a apresentação da peça “O Evangelho Segundo Jesus, Rainha do Céu” - Inconformismo do réu - Acolhimento - Proibição da exibição da peça que viola a atividade artística prevista no art. 5º, inc. IX, da Carta Magna - Peça que tem caráter ficcional e objetiva fomentar o debate sobre - Decisão reformada - Recurso provido.os transgêneros sem ultrajar a Fé Cristã (TJSP – Agravo de Instrumento nº 2180296-90.2017.8.26.0000. Relator: Des. J. L. Mônaco da Silva, julgado em 19/02/2018). DECISÃO INTERLOCUTÓRIA Processo nº: 0566408-05.2017.8.05.0001 Classe Assunto: Procedimento Comum - Direito de Imagem Autor: Alexandre Santa Rosa Oliveira e outros Réu: FUNDACAO GREGORIO DE MATOS Vistos etc. (...) Num. 4416068 - Pág. 4Assinado eletronicamente por: SILVIO NEVES BAPTISTA FILHO - 24/07/2018 19:30:42 https://pje.tjpe.jus.br:443/2g/Processo/ConsultaDocumento/listView.seam?x=18072419304280300000004395632 Número do documento: 18072419304280300000004395632
  • 33. As partes autoras suscitaram na peça vestibular, em síntese, que o réu pôs em cartaz para as datas de 26.10.2017 e 27.10.2017, ambos com início as 20:00, a apresentação de uma peça teatral cujo tema é: "O "; que a peça referia-se a um monólogo em queEvangelho Segundo Jesus, Rainha do Céu Jesus Cristo (filho de Deus bíblico), estaria vivendo em dias atuais e que ele seria uma mulher transgênero; que a peça revelou ainda, que eram histórias bíblicas conhecidas, mas que foram recontadas em uma perspectiva "contemporânea”, propondo uma reflexão sobre a intolerância sofrida por transgêneros e minorias em geral; que a questão da identidade travesti era elemento chave do espetáculo; esclareceu que a peça era atentatória a dignidade à fé cristã/católica e todos aqueles que acreditaram e respeitaram Jesus como filho do Deus criador do universo, sem que olvidasse ainda o personagem histórico que ele representou e sua filosofia de vida em suas palavras; salientou ainda que tal peça teatral era extremamente ofensiva a moral da humanidade que era em sua grande maioria crente no homem JESUS como filho de Deus e grande personagem histórico do mundo, tal qual foi, BUDA, MAOMÉ, GANDHY, e outros grandes expoentes da história que deixaram legado para a humanidade; que a divulgação do evento informava que se o Cristo estivesse presente em nosso meio nos dias hodiernos ele seria um transgênero; que expôs ao ridículo os símbolos nacionalmente encontrados, como a cruz e o próprio homem; que a peça incitou crime de ódio e feriu a liberdade e a dignidade humana; que o artigo 5.º da Constituição Federal previu o direito à liberdade religiosa, somado ao artigo 208 do Código Penal que definiu os parâmetros de liberdade no tratamento desse tema; que configuração do crime era previsto no art. 20, § 2º, da Lei N.º 7.716/89 (Lei Caó), que pressupôs violação aos limites impostos à liberdade de manifestação religiosa e à liberdade de expressão; que a parte acionada violou o art..208 DO CP; as partes acionantes ponderaram no sentido do dever do Estado tutelar por ordem constitucional expressa no art. 5.º, inciso VI, da Constituição Federal, a qual dispõe que “é inviolável a liberdade de consciência e de crença, sendo assegurado o livre exercício dos cultos religioso se garantida, na forma da lei, a proteção aos locais de culto e as suas liturgias”; que presentes estavam os requisitos para a concessão da tutela provisória de urgência antecipada; e as partes autoras solicitaram que a parte ré se abstivesse de promover a realização do evento nos dias 26 de outubro de 2017 e 27 de outubro de 2017. Decido. (...) Ao fazermos um juízo de valor cauteloso, prudente e provisório em relação aos documentos de fls.23/24, na qual especificou os dias da apresentação da peça, chega-se a ilação de que, provavelmente, as partes suplicantes se encontram em situação de prejuízo nos seus interesses jurídicos. O princípio da laicidade comporta o respeito de toda confissão religiosa por parte do Estado. Laicidade, corretamente entendida, significa que o Estado deve proteger amplamente a liberdade religiosa tanto em sua dimensão pessoal como social, e não impor, por meio de leis e decretos, nenhuma verdade especificamente religiosa ou filosófica, mas elaborar as leis com base nas verdades morais naturais. O fundamento do direito à liberdade religiosa se encontra na própria dignidade da pessoa humana. Um Estado não deve tenta impedir a vivência religiosa do povo, especialmente o Cristianismo, com uma ação hostil ao fenômeno religioso e a tentativa de encerrá-lo unicamente na esfera privada. Ao que parece a parte acionada desrespeitou o princípio constitucional no art. 5.º, inciso VI, da Constituição Federal a qual dispõe que “é inviolável a liberdade de consciência e de crença, sendo assegurado o livre exercício dos cultos religioso se garantida, na forma da lei, a proteção aos locais de culto e as suas liturgias” . Compreendo que não se pode tentar, assim, eliminar os símbolos/crenças religiosos mais tradicionais do povo, com narrativas debochadas e fantasiosas, como que lhe arrancando as raízes. (...) Salvador-BA, 27 de outubro de 2017. PAULO ALBIANI ALVES - JUIZ DE DIREITO - Num. 4416068 - Pág. 5Assinado eletronicamente por: SILVIO NEVES BAPTISTA FILHO - 24/07/2018 19:30:42 https://pje.tjpe.jus.br:443/2g/Processo/ConsultaDocumento/listView.seam?x=18072419304280300000004395632 Número do documento: 18072419304280300000004395632
  • 34. Da aplicação dos tratados internacionais à matéria A liberdade de expressão é tema cuja análise não pode ser dissociada dos elementos normativos internacionais dos quais a República Federativa do Brasil é adotante, como a Declaração Universal dos direitos Humanos de 1948 (art. 19), o Pacto Internacional de Direitos Civis e Políticos (art. 19) e a Convenção Americana Sobre Direitos Humanos (art. 13). Consta deste último diploma internacional, denominado também de Pacto de San José da Costa Rica, no art. 13, o seguinte dispositivo: “I. Toda pessoa tem direito à liberdade de pensamento e de expressão. Esse direito compreende a liberdade de buscar, receber e difundir informações e idéias de toda natureza, sem consideração de fronteiras, verbalmente ou por escrito, ou em forma impressa ou artística, ou por qualquer outro processo de sua escolha. II. O exercício do direito previsto no inciso precedente não pode estar sujeito a censura prévia, mas a e ser necessárias pararesponsabilidades ulteriores, que devem ser expressamente fixadas pela lei assegurar: a) o respeito aos direitos ou à reputação das demais pessoas; ou b) a proteção da segurança nacional, da ordem pública, ou da saúde ou da moral públicas. III. Não se pode restringir o direito de expressão por vias ou meios indiretos, tais como o abuso de controles oficiais ou particulares de papel de imprensa, de frequências radioelétricas ou de equipamentos e aparelhos usados na difusão de informação, nem por quaisquer outros meios destinados a obstar a comunicação e a circulação de idéias e opiniões. IV. A lei pode submeter os espetáculos públicos a censura prévia, com o objetivo exclusivo de , sem prejuízo do dispostoregular o acesso a eles, para proteção moral da infância e da adolescência no inciso 2. V. A lei deve proibir toda propaganda a favor da guerra, bem como toda apologia ao ódio nacional, .”racial ou religioso que constitua incitação à discriminação, à hostilidade, ao crime ou à violência Destaque-se que, conquanto sejam admitidas limitações à referida liberdade individual – por meio da técnica da ponderação, o exercício do direito previsto no aludido artigo não pode estar sujeito à censura prévia, mas a responsabilidades ulteriores, através de lei, conforme disposto no inciso II do art. 13 do referido Tratado. Sobre o caso específico dos espetáculos públicos, há, como se pode observar, expressa disposição acerca da excepcional possibilidade de censura prévia, todavia, com o objetivo exclusivo de regular o acesso aos referidos espetáculos e para proteção moral da infância e da adolescência, o que não é o caso dos autos. Outrossim, no caso concreto não se vislumbra a hipótese prevista no inciso V, pois não resta evidenciada incitação à discriminação, à hostilidade, ao crime ou à violência - muito pelo contrário. Como se observa Num. 4416068 - Pág. 6Assinado eletronicamente por: SILVIO NEVES BAPTISTA FILHO - 24/07/2018 19:30:42 https://pje.tjpe.jus.br:443/2g/Processo/ConsultaDocumento/listView.seam?x=18072419304280300000004395632 Número do documento: 18072419304280300000004395632
  • 35. de anteriores decisões a respeito do próprio espetáculo, a obra destina-se a propalar a necessidade de inclusão na sociedade de grupos LGBT, propondo reflexão a respeito dos princípios cristãos, possuindo nítido caráter ficcional. Portanto, a prevalecer o entendimento da decisão agravada, os expoentes da nossa cultura não teriam liberdade de criar as suas obras para que o público pudesse deleitá-las, estando sujeitos à vedada e prévia censura estatal, ainda que por meio indireto, eis que retirada igualdade de tratamento na oferta do espetáculo ao público, por meio do cancelamento de qualquer tipo de subvenção, inclusive econômica. Tal posicionamento colide frontalmente com os tratados internacionais dos quais o Brasil é signatário, e fere os contornos universais do direito à liberdade de expressão. Do mérito administrativo É sabido que o Poder Judiciário, dentro de sua competência de fiscalizar a atuação da Administração, pode adentrar na análise do mérito administrativo, a fim de garantir a observância das leis e dos princípios que regem os atos administrativos. A Lei Estadual nº 11.781, de 06.06.2000, que regulamenta o processo administrativo no âmbito da Administração Pública Estadual, estabelece: “Art. 2º - A Administração Púbica Estadual obedecerá, dentre outros, aos princípios da legalidade, finalidade, , razoabilidade, proporcionalidade, moralidade, ,motivação ampla defesa, contraditório segurança jurídica, impessoalidade e .interesse público ............................................................................................................omissis Art. 50. Os atos administrativos deverão ser motivados, com indicação dos fatos e dos fundamentos jurídicos, quando: I - neguem, limitem ou afetem direitos ou interesses; II - imponham ou agravem deveres, encargos ou sanções; III - decidam processos administrativos de concurso, licitações ou seleção pública; ............................................................................................................omissis VIII - importem em anulação, revogação, suspensão ou convalidação de ato administrativo. § 1º A motivação deve ser explícita, clara e congruente, podendo consistir em declaração de concordância com fundamentos de anteriores pareceres, informações, decisões ou propostas, que, neste caso, serão parte integrante do ato.” A decisão administrativa que excluiu a peça teatral ora sob análise pressupôs um juízo de conveniência e oportunidade por parte do administrador. A utilização dessa prerrogativa administrativa deve privilegiar razões de interesse público, pertinentes e suficientes para justificar tal conduta. Num. 4416068 - Pág. 7Assinado eletronicamente por: SILVIO NEVES BAPTISTA FILHO - 24/07/2018 19:30:42 https://pje.tjpe.jus.br:443/2g/Processo/ConsultaDocumento/listView.seam?x=18072419304280300000004395632 Número do documento: 18072419304280300000004395632
  • 36. Veja-se que os atos discricionários da Administração estão sujeitos ao controle pelo Judiciário quanto à legalidade formal e substancial, cabendo observar os motivos embasadores dos atos administrativos que vinculam a Administração, conferindo-lhes legitimidade e validade. (STJ, AgRg no REsp 1280729/RJ, 2ª Turma, Rel. Min. Humberto Martins, j. 10/04/2012, p. DJe 19/04/2012.) A propósito, cabe trazer a lume os ensinamentos de Celso Antônio Bandeira de Mello, que a respeito do tema assim se manifestou: "Assim como ao Judiciário compete fulminar todo o comportamento ilegítimo da Administração que apareça como frontal violação da ordem jurídica, compete-lhe, igualmente, fulminar qualquer comportamento administrativo que, a pretexto de exercer apreciação ou decisão discricionária, ultrapassar as fronteiras dela, isto é, desbordar dos limites de liberdade que lhe assistiam, violando, por tal modo, os ditames normativos que assinalam os confins da liberdade discricionária."[4] Ora, o caso sob exame trata de convite da Administração devidamente aceito pela produção da peça teatral. Havendo a divulgação do calendário e das suas atrações, pressupõe-se que esse ato administrativo atendeu aos princípios do e da , porquanto tal peça se mostrouinteresse público impessoalidade adequada à proposta do festival, cujo lema é “Um viva à liberdade!” A atração nada mais é do que um drama teatral, que busca conscientizar e estimular a reflexão sobre a discriminação social de uma minoria, especialmente das transexuais e travestis. O “ ” e aforte clima de intolerância que se estabeleceu nas redes sociais “reação da Prefeitura de ”, conforme ressaltado na justificativa da FUNDARPE ( ) não éGaranhuns e da Diocese id 4402971 motivo suficiente para excluir da programação do festival a peça teatral ora sob exame. A exclusão da apresentação prévia e regularmente selecionada pela curadoria responsável por aprovar a programação do festival demonstra um comportamento contraditório da administração (venire contra máxime porque se anteriormente a peça já haviafactum proprium) vedado pelo ordenamento jurídico, sido incluída na programação do FIG/2018 por atender aos critérios estabelecidos no edital, não poderia o Poder Público, de forma contraditória, sem justa motivação, excluí-la das festividades. Não seria o caso, frise-se, de aplicação do art. 49 da Lei Geral de Licitações (Lei nº 8.666/93), consoante justifica a Administração Pública ( ), porque, para tanto, a revogação do ato administrativo seid 4402971 pautaria por razões de interesse público, por fato superveniente e devidamente comprovado. Verifica-se, no entanto, que tal não é o caso dos autos: inexistiu motivação idônea para o cancelamento do convite e tampouco houve fato superveniente apto a justificar tal conduta. Some-se a isso o fato de que não se trata de licitação propriamente dita, o que reforça o afastamento do referido dispositivo legal. Num. 4416068 - Pág. 8Assinado eletronicamente por: SILVIO NEVES BAPTISTA FILHO - 24/07/2018 19:30:42 https://pje.tjpe.jus.br:443/2g/Processo/ConsultaDocumento/listView.seam?x=18072419304280300000004395632 Número do documento: 18072419304280300000004395632
  • 37. A decisão administrativa violou os princípios da motivação, da ampla defesa e do contraditório, pois sequer foi dada oportunidade aos produtores do evento teatral de manifestarem-se acerca de tal exclusão. Houve, de fato, uma aplicação sumária do tribunal das redes sociais, dominado por setores barulhentos da sociedade, mas que não necessariamente reflete o pensamento da maioria. Por outro lado, o perigo pela demora na prestação jurisdicional é evidente, eis que a data do agendamento inicial da peça teatral se avizinha (dia 26/07/2018), não podendo aguardar-se pela manifestação da parte contrária, uma vez que tal postergação poderá tornar inútil a apreciação do pleito recursal. Ante todo o exposto, convencido da ilegalidade da decisão administrativa, DEFIRO O PEDIDO DE determinando ao Estado deANTECIPAÇÃO DOS EFEITOS DA TUTELA RECURSAL, Pernambuco que reinclua, , na grade de programação do FIG/2018 - “Um viva àem até 24 horas liberdade!” – a peça teatral regularmente selecionada,“O Evangelho Segundo Jesus, Rainha do Céu” que estava prevista para o dia 26/07/2018, para um público adulto, às 23h, garantindo ainda toda a segurança necessária a consecução do evento, bem como que o Município de Garanhuns se abstenha de embaraçar o cumprimento da presente tutela. Fixo desde já multa no importe de R$ 50.000,00 (cinquenta mil reais) pelo descumprimento da presente decisão. Oficie-se ao Juízo de origem com urgência, comunicando o teor desta decisão. Cópia da presente decisão servirá como OFÍCIO. Intimem-se os agravados, , para: cumprirem o presente de formacom a máxima urgência a) decisum imediata; ) no prazo legal, apresentarem contrarrazões.b Em seguida, intime-se o Ministério Público nos moldes do artigo 1.019, III, CPC. Publique-se. Intimem-se. Cumpra-se. Caruaru, 24 de julho de 2018. Num. 4416068 - Pág. 9Assinado eletronicamente por: SILVIO NEVES BAPTISTA FILHO - 24/07/2018 19:30:42 https://pje.tjpe.jus.br:443/2g/Processo/ConsultaDocumento/listView.seam?x=18072419304280300000004395632 Número do documento: 18072419304280300000004395632
  • 38. Des. Silvio Neves Baptista Filho Relator Substituto [1] Art. 1.015. Cabe agravo de instrumento contra as decisões interlocutórias que versarem sobre: I - tutelas provisórias; [2] “Os limites à liberdade de expressão na Constituição da República”, pág. 43. [3] NOVELINO, Marcelo. Manual de Direito Constitucional – volume único. 8ª Ed. – Rio de Janeiro: Forense; São Paulo: MÉTODO, 201, pág. 501. [4] Curso de Direito Administrativo, Editora Malheiros, 15ª Edição. Num. 4416068 - Pág. 10Assinado eletronicamente por: SILVIO NEVES BAPTISTA FILHO - 24/07/2018 19:30:42 https://pje.tjpe.jus.br:443/2g/Processo/ConsultaDocumento/listView.seam?x=18072419304280300000004395632 Número do documento: 18072419304280300000004395632