O documento descreve quatro correntes paradigmáticas na educação de adultos: progressista, humanista, crítica e progressista. A corrente progressista enfatiza a aprendizagem baseada na experiência e reflexão para promover o progresso social e democrático. A corrente humanista vê o adulto como tendo necessidade de auto-desenvolvimento e aprendizagem autodirigida. A corrente crítica critica as outras por não considerarem o contexto social e enfatiza a educação para promover a participação cívica e mudança social.
2. Paradigmas na
Educação de Adultos
Corrente Progressista
Corrente Humanista
Corrente Crítica
3. Corrente Progressista
A industrialização massiva do início do século XX obriga à
especialização da mão de obra.
Grandes obras de engenharia enaltecem o espírito
empreendedor da humanidade (Canal Panamá, Titanic).
O indivíduo visto como possuidor de um grande potencial, ao
serviço da sociedade, com o dever de contribuir para o
progresso da mesma.
A formação é o meio para dar resposta às necessidades da
sociedade e do indivíduo, particularmente face às profundas
transformações sociais operadas com a industrialização.
4. Corrente Progressista
O movimento progressista entende que o progresso tem de
se basear na interligação entre educação e democracia.
Desta corrente destacam-se sobretudo dois autores: John
Dewey e Eduard Lindeman.
A educação deve promover o contínuo crescimento e
desenvolvimento ao longo da vida, contribuindo, desta forma,
para a construção da comunidade democrática.
A educação deve acentuar o papel activo do indivíduo no
processo de aprendizagem.
A aprendizagem tem de estar intimamente associada com o
fazer: aprender fazendo (learning by doing).
A aprendizagem baseia-se na experiência da pessoa: toda a
educação genuína nasce da experiência.
5. Corrente Progressista –Lindeman
"Uma das grandes distinções entre a educação de adultos e a
educação convencional encontra-se no próprio processo de
aprendizagem. Nenhum outro, senão o humilde pode vir a ser um
bom professor de adultos. Para o aprendente adulto a experiência
tem o mesmo peso que o conhecimento do professor. (…) Este
caminho duplo reflecte também na divisão de autoridade. Na
educação convencional o aluno adapta-se ao currículo oferecido,
mas na educação de adultos, o aluno ajuda na formulação do
currículo" (Lindeman,1926, p.166)
“Todo adulto está envolvido em situações específicas de trabalho,
de lazer, de família, da comunidade, etc. - situações essas que
exigem ajustamentos. O adulto começa nesse ponto. (...). Textos e
professores têm um papel secundário nesse tipo de educação;
eles devem dar a máxima importância ao aprendente." (Lindeman,
1926, p. 8-9)
6. Corrente Progressista
A reflexão está intimamente ligada à análise da experiência individual,
pois é a partir dela que o indivíduo identifica o sentido e interpretações
comuns do contexto social que o envolve, permitindo a tomada de
estratégias com vista à transformação do comportamento individual e
colectivo.
Nesse sentido, Lindeman (1926) observa que a educação de adultos
deve radicar na reflexão sobre a experiência das pessoas. A reflexão
não fica, contudo, fechada numa dimensão individual.
A experiência da pessoa está contextualizada na história e na cultura
da sociedade em que vive: assim, a reflexão leva a que o indivíduo se
dê conta da importância das influências de natureza histórica e cultural
que o marcam.
A reflexão sobre o contexto histórico-cultural deve levar as pessoas a
serem agentes activos e participativos nesse mesmo contexto. Desta
forma, segundo Lindeman, a educação de adultos deve promover a
participação democrática, contribuindo para a acção e transformação
social.
7. Corrente Progressista
O centro da experiência como fonte de
aprendizagem, implica uma mudança do centro
de aprendizagem: o adulto, com reflexos
evidentes na relação entre professor e aluno.
A reflexão sobre a experiência tem de implicar
mudança social: construção da sociedade
democrática.
O papel da educação de adultos deve ser o de
desenvolver a consciência social.
Os interesses do aprendente adulto não podem
de forma alguma ser menosprezados.
8. Corrente Humanista
Insere-se no período pós-guerra, particularmente no final da
década de 50 individuo de 60.
Teve uma influência notável em numerosos investigadores
do campo de educação de adultos, particularmente sobre o
conceito de andragogia de Malcom Knowles, investigador
incontornável neste campo.
Tem como fundamento o trabalho de Carl Rogers e Maslow,
baseando-se em princípios não directivos.
Trata-se de uma corrente que tem uma visão naturalmente
positiva acerca da pessoa humana, para a qual o indivíduo
tem uma necessidade inata de auto-actualização, auto
desenvolvimento e autodirecção: ou seja com vista à sua
maturação
9. Corrente Humanista
“O humanista assume que existe a tendência natural para
as pessoas aprenderem e que a aprendizagem
desenvolver-se-á se forem providenciados ambientes
encorajadores e favoráveis. Implementando a teoria
humanista no contexto da aprendizagem poderá
significar providenciar opções múltiplas de pessoas,
recursos e materiais; torná-las livremente disponíveis
para todos; ajudar os aprendentes a pensar através do
que eles querem aprender e como desejam aprendê-lo;
fazer poucos juízos de valor acerca da natureza ou
qualidade das experiências de aprendizagem.” (Cross,
1984, p. 228).
10. Corrente Humanista
O centro desta perspectiva é a pessoa, e a sua necessidade
de auto desenvolvimento (Maslow, 1970; Rogers, 1961).
A maturação é entendida como um processo de contínuo
crescimento.
No processo de auto desenvolvimento, a pessoa assume a
primeira responsabilidade pela sua própria aprendizagem.
A aprendizagem significativa é adquirida através da acção,
sendo a experiência a maior autoridade e critério de validade
para a pessoa.
O supervisor / formador / professor tem apenas o papel de
facilitar a aprendizagem, com vista a tornar o aprendente
plenamente funcional.
11. Corrente Humanista – Maslow
Maslow (1970) considera que a motivação
humana é caracterizada pela gratificação de
necessidades.
O ser humano é marcado por uma dinâmica
crescente de satisfação de necessidades, com
diferentes hierarquias:
necessidades fisiológicas,
necessidades de segurança,
necessidades de pertença e amor,
necessidades de estima,
necessidades de auto-actualização.
12. Corrente Humanista - Maslow
“A dinâmica principal que anima esta organização é a emergência, na
pessoa saudável, de necessidades menos poderosas a partir da
gratificação de necessidades mais poderosas. As necessidades
fisiológicas, quando não satisfeitas, dominam o organismo, pressionando
todas as capacidades para o seu serviço e organizando estas capacidades
para que possam ser o mais eficientes neste serviço. A relativa gratificação
submerge-as e permite que o nível seguinte mais elevado na hierarquia
surja, domine e organize a personalidade, de forma a que o ser deixe de
estar obsessivamente ligado à comida, para se tornar obsessivamente
preocupado com a segurança. O princípio é o mesmo para os outros
conjuntos de necessidades na hierarquia, isto é, amor, estima, e auto-actualização.”
(Maslow, 1979, p. 59)
13. Corrente Humanista - Maslow
Maslow identifica o nível mais alto da hierarquia, com a
maturidade. A maturação do indivíduo apresenta as seguintes
características:
Maior eficiência na percepção da realidade e relações mais confortáveis
com o mesmo.
Aceitação (eu, outros, natureza).
Espontaneidade, simplicidade, naturalidade.
Focalização em problemas.
A necessidade de privacidade.
Independência da cultura e do ambiente.
Novidade contínua nas apreciações.
Experiência mística.
Sentimento social.
Relações interpessoais.
Carácter de estrutura democrática. Distinção entre meios e fins, entre bem
e mal.
Senso de humor não hostil. Criatividade.
14. Corrente Humanista - Rogers
Rogers considera que o desenvolvimento da
pessoa é um processo com vista a torná-la
totalmente funcional.
A pessoa humana tem uma tendência natural
para crescer e para se auto-actualizar, não sendo
por isso determinada à partida.
Este processo de se tornar pessoa está orientado
para a direcção positiva da totalidade, integração,
integridade e autonomia.
15. Corrente Humanista - Rogers
Este caminho para a autonomia implica em primeiro lugar liberdade. Ser
pessoa totalmente funcional implica ser capaz de liberdade de escolha,
assumindo uma nova perspectiva na relação entre liberdade e
determinismo.
A maturação da pessoa envolve também uma forma de estar criativa e não
conformista, “pois o indivíduo continua a evoluir em direcção a tornar-se
ele próprio, e a agir de forma a providenciar a máxima satisfação das suas
necessidades mais profundas.” (1971, p. 194).
O indivíduo maduro não está fechado em si próprio, vivendo de uma
forma defensiva, estando aberto a um leque muito mais alargado de
necessidades (ambientais, sociais, etc.).
Existe sentimento de confiança na natureza humana, pois à medida que se
torna pessoa, mais sente a necessidade de abertura aos outros. Este
processo implica, por isso, uma maior riqueza de vida, pois “envolve o
aumentar e crescer tornar-se mais e mais nas suas próprias
potencialidades. Envolve coragem de ser. Significa lançar-se
completamente na corrente da vida.” (1971, p. 196).
16. Corrente Crítica
A corrente crítica é influenciada pela corrente progressista, pela ideologia marxista,
acentuando a importância do contexto sócio-cultural que envolve a pessoa. Insere-se
no pós 2ª grande guerra, num período de lutas ideológicas.
É uma corrente bastante heterogénea, mas nela destaca-se o trabalho desenvolvido
por Jürgen Habermas (escola de Frankfurt) e de Paulo Freire.
O papel da educação é de esclarecer as pessoas sobre a forma como têm sido
subjugadas, e mostrar-lhes a forma de mudarem e se libertarem: o processo de
emancipação.
A perspectiva crítica foca a sua atenção na “mudança da presente ordem social,
política e económica através do questionamento das suposições tomadas pelos
aprendentes acerca do mundo no qual vivem e trabalham.
Esta corrente é muito crítica quanto à excessivo destaque às necessidades
individuais do adulto (corrente humanista), esquecendo que a pessoa não é uma
ilha isolada e que está imersa num contexto histórico-sócio-cultural, e que a
educação de adultos tem de necessariamente promover a alteração das estruturas
sociais opressivas.
17. Corrente crítica
Esta corrente critica a excessiva ênfase sobre a mudança
individual esquecendo a transformação social (Cunningham, 1993;
Heaney, 1996; Newman, 1993).
A mudança individual não pode ser dissociada da mudança social,
e que essa mudança não pode ser descontextualizada.
O indivíduo é marcado pelo contexto sociocultural, e a sua acção
não pode ser 'retirada' desse mesmo contexto social: a mudança
individual tem de implicar necessariamente a mudança social.
A corrente da pedagogia crítica tem muita dificuldade em aceitar
uma abordagem da aprendizagem centrada no indivíduo, sendo
também muito crítica para conceitos como reflexão crítica e
aprendizagem autodirigida.
18. Corrente Crítica
A educação de adultos tem que promover a participação
comunitária, devendo estar ligada à participação na luta pelos
direitos cívicos dos cidadãos.
A educação de adultos não é apenas dar a conhecer novos factos.
É ajudar a conhecer o que se sabe, reflectindo sobre a experiência
pessoal, tornando esse mesmo conhecimento poder de acção.
A educação de adultos é a tarefa de dar nome ao nosso mundo, vir
a conhecer as conexões entre elementos dispersos da nossa
experiência, conhecer a nossa realidade em ordem a controlá-la.
(…) A literacia não é apenas a aquisição de palavras, mas a
aquisição de voz em assuntos que afectam a nossa vida do dia a
dia. (Heaney, 1993, p. 2)
A educação deve promover a reflexão sobre os problemas que
afectam a comunidade, conduzindo a uma maior participação dos
cidadãos.
19. Corrente Crítica - Habermas
O conhecimento resulta de diferentes tipos de interesses: técnico,
prático, e emancipatório.
O interesse técnico centra-se na resolução das relações causa -
efeito, sendo uma forma de conhecimento em que o indivíduo se
relaciona com o ambiente / contexto que o envolve. A ciência é
vista como a detentora das respostas para a compreensão da
globalidade do mundo, eliminando, assim, todas as interpretações
baseadas na suposição, mito, ou crença.
A crítica de Habermas a este tipo de racionalidade técnico -
instrumental prende-se com esta tentativa de constituir-se como
explicação por excelência da realidade, procurando que todo o
conhecimento se enquadre nesse mesmo tipo de racionalidade.
"As ciências da natureza perderam parte da sua função de suporte
de uma imagem do mundo a favor da produção de saber
tecnicamente aplicável." (Habermas, 1987, p. 6).
20. Corrente Crítica - Habermas
O interesse prático caracteriza-se pela acção subjectiva,
onde indivíduo se relaciona com os outros. O interesse
prático do saber é marcado pela procura de consenso entre
os diversos indivíduos.
A inter-subjectividade garante que este saber não seja
totalmente subjectivo e arbitrário, pois ele é fruto do
consenso entre as diversas pessoas, requerendo que os
sujeitos interajam e partilhem um conjunto de significados.
O diálogo racional tem um papel essencial na validação de
significados.
Apesar de neste tipo de saber as pessoas se entenderem
mutuamente, esse entendimento pode, contudo, basear-se
em pressupostos distorcidos.
21. Corrente Crítica - Habermas
O interesse emancipatório permite às pessoas libertarem-se das forças
contextuais, institucionais e egocêntricas: este conhecimento identifica-se
com o auto conhecimento ou a auto-reflexão.
Este tipo de saber relaciona-se com o poder, pois é pelo conhecimento
emancipatório que o indivíduo se emancipa dos diversos tipos de
dominação que limitam o controlo sobre a sua vida, adquirindo pela auto-reflexão
a sua autodeterminação.
A reflexão crítica assume desta forma, um papel central na construção do
conhecimento emancipatório. O interesse crítico - emancipatório envolve a
capacidade de ser crítico em relação a si próprio e em relação à realidade
sócio - cultural envolvente, pelo processo de questionamento pessoal e
questionamento do mundo.
Estas diversas forças (ideologias, preconceitos, distorções psicológicas,
etc.) limitam o controlo racional do sujeito sobre a sua própria vida,
perpetuando relações de dependência. Pelo conhecimento emancipatório
o indivíduo é capaz de compreender melhor a sua pessoa, os outros e o
meio que o envolve.
22. Corrente Crítica – Paulo Freire
Freire observa que as pessoas, em processo de
alfabetização, aprendem melhor se as palavras
estiverem carregadas de significado político e
estiverem em íntima relação com a situação de
opressão em que essas mesmas pessoas vivem.
O objectivo da reflexão crítica é o de levar as
pessoas a "profundamente darem-se conta da
realidade sóciocultural que molda as suas vidas,
bem como da capacidade de transformar essa
mesma realidade agindo nela" (Freire, 1970, p.
27).
23. Corrente Crítica – Paulo Freire
O processo de tomada de consciência das estruturas de opressão,
que envolvem o indivíduo, é denominado de conscientização:
este processo nunca é solitário
O processo de conscientização é caracterizado por quatro etapas:
consciência intransitiva, onde as pessoas estão apenas preocupadas
em satisfazer as suas mais elementares necessidades;
consciência semi-intransitiva, onde existe uma cultura de silêncio e
repressão e a vida é entendida através de noções como fatalidade, ou
destino, e onde os oprimidos assimilam os valores e concepções dos que
os oprimem;
consciência semi-transitiva, onde as pessoas começam a ser capazes
de questionar as suas vidas e a perceber que a realidade sóciocultural é
determinada pelo ser humano;
conscientização, onde os indivíduos são capazes de se envolver num
processo dialógico de questionamento e validação das normas sociais,
dos códigos culturais, e das ideologias.