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I
SENAC EDUCAÇÃO A DISTÂNCIA
PÓS-GRADUAÇÃO LATO SENSU EM ARTES VISUAIS, CULTURA E CRIAÇÃO
MAKALI ANDREZZO
MERCADO PÚBLICO DE FLORIANÓPOLIS
UM NOVO OLHAR SOBRE A PAISAGEM DE MARTINHO DE HARO
FLORIANÓPOLIS
2011
II
MAKALI ANDREZZO
MERCADO PÚBLICO DE FLORIANÓPOLIS
UM NOVO OLHAR SOBRE A PAISAGEM DE MARTINHO DE HARO
Trabalho de Conclusão de Curso de Pós-
Graduação apresentado à banca examinadora da
SENAC Educação a Distância como requisito
parcial para a obtenção do título de Especialista
em Artes Visuais: Cultura e Criação.
Orientadora: FERNANDA MARIA TRENTINI CARNEIRO
FLORIANÓPOLIS
2011
III
MAKALI ANDREZZO
MERCADO PÚBLICO DE FLORIANÓPOLIS
UM NOVO OLHAR SOBRE A PAISAGEM DE MARTINHO DE HARO
Trabalho de Conclusão de Curso de Pós-
Graduação apresentado à banca examinadora da
SENAC Educação a Distância como requisito
parcial para a obtenção do título de Especialista
em Artes Visuais: Cultura e Criação.
Aprovado em 07 de julho de 2011.
BANCA EXAMINADORA
_____________________________________________
Profª. MSc. Fernanda Maria Trentini Carneiro - Orientadora
SENAC EDUCAÇÃO A DISTÂNCIA
_____________________________________________
Profº. Esp. Luis Fernando Keller Albalustro - Examinador
SERVIÇO NACIONAL DE APRENDIZAGEM COMERCIAL
Departamento Regional de Santa Catarina
_____________________________________________
Profª. MSc. Lidiane Goedert – Representante Institucional
SENAC EDUCAÇÃO A DISTÂNCIA
IV
A todos que colaboram de alguma forma
com a preservação da memória visual de Florianópolis.
V
AGRADECIMENTOS
Às tutoras Brígida, Lucila e Fernanda, por terem nos acompanhado de perto em todos
os momentos, fazendo-nos sentir próximos mesmo à distância.
À tutora Fernanda, pela orientação.
Aos colegas, por terem compartilhado suas experiências e conhecimentos.
VI
RESUMO
Este trabalho parte de um estudo sobre fatores históricos que levaram à descaracterização do
Centro Histórico de Florianópolis e alteraram a percepção visual do espaço urbano na região
do Mercado Público, no período compreendido entre 1851 (data de inauguração do primeiro
Mercado) até os dias atuais. O trabalho propõe, com base no estudo da representação das
cidades pela arte moderna e contemporânea, a criação de três imagens que representam
sensações diante da paisagem urbana atual. A partir da apropriação de três obras de Martinho
de Haro que retratam o Mercado Público, o trabalho propõe como processo de criação, um
diálogo entre Martinho de Haro e outros três artistas: René Magritte, M.C. Escher, e Giorgio
de Chirico.
Palavras-chave: Mercado Público de Florianópolis; Martinho de Haro; Apropriação.
VII
ABSTRACT
This paper uses as a reference a study on historical factors that led to the mischaracterization
of the historic center of Florianopolis and the altered visual perception of urban space in the
region of the Public Market for the period between 1851 (date of opening of the first market)
until the present day. The paper proposes, based on the study of the representation of cities by
modern and contemporary art, creating three images that represent feelings on the current
urban landscape. From the ownership of three works of Martinho de Haro portraying the
Public Market, the paper proposes the creation process as a dialogue between Martinho de
Haro and three other artists: René Magritte, M.C. Escher and Giorgio de Chirico.
Key words: Public Market of Florianópolis; Martinho de Haro; Ownership.
VIII
LISTA DE FIGURAS
FIGURA 01: Praça Fernando Machado, século XIX ....................................................... 15
FIGURA 02: Victor Meirelles. Vista do Desterro (1851) ................................................ 16
FIGURA 03: Trapiche Municipal, 1922. Início das obras do Miramar ............................16
FIGURA 04: Miramar, sem data....................................................................................... 17
FIGURA 05: Mercado Novo, 1914 .................................................................................. 17
FIGURA 06: Mercado Novo, 1928 .................................................................................. 18
FIGURA 07: Prédio da Alfândega, 1960 ......................................................................... 19
FIGURA 08: Miramar, Mercado e Ponte, sem data ......................................................... 20
FIGURA 09: Área Central, 1985 ......................................................................................21
FIGURA 10: Gustave Caillebot. A ponte da Europa (1876) ........................................... 26
FIGURA 11: Claude Monet. A ponte da Europa (1877) ................................................. 27
FIGURA 12: Ernst Ludwig Kirchner. Berlin Street Scene (1913) .................................. 28
FIGURA 13: Ernst Ludwig Kirchner. Nollendorfplatz (1912) ........................................ 28
FIGURA 14: Martinho de Haro. Mercado Público (1970-1975) ..................................... 30
FIGURA 15: Martinho de Haro. Mercado Público (1975-1980) ..................................... 31
FIGURA 16: Martinho de Haro. Largo da Alfândega com ocaso violeta
(1980-1985) ................................................................................................ 31
FIGURA 17: M.C. Escher. Metamorphosis I (1937) ........................................................32
FIGURA 18: Giorgio de Chirico. Piazza d’Italia (1913) .................................................32
FIGURA 19: René Magritte. Le Blanc-sign (1965) ......................................................... 33
FIGURA 20: Giorgio de Chirico. Methaphisical Interior with hand
of David (1968) .......................................................................................... 35
FIGURA 21: John Baldesari. The Duress Series: Person Climbing Exterior
Wall of Buiding/ Person on Large of Tall Building/ Person on
Girders of Unfinished Tall Building (2003) ............................................... 35
IX
FIGURA 22: Estudo preliminar ....................................................................................... 38
FIGURA 23: Intervenção I ............................................................................................... 40
FIGURA 24: Intervenção II ..............................................................................................42
FIGURA 25: Intervenção III .............................................................................................44
X
SUMÁRIO
1 INTRODUÇÃO .................................................................................................... 11
2 DESENVOLVIMENTO PRÁTICO E TEÓRICO............................................ 14
2.1 O Mercado Público de Florianópolis................................................................... 14
2.2 Mudanças na paisagem urbana do Centro Histórico ........................................19
2.3 A Florianópolis de Martinho de Haro................................................................. 22
2.4 A modernidade.......................................................................................................25
2.5 O processo criativo ............................................................................................... 29
2.5.1 Referências visuais............ ..................................................................................... 29
2.5.2 Recursos técnicos ........... ....................................................................................... 36
2.5.3 Estudo preliminar ............ ...................................................................................... 37
2.5.4 Intervenção I ......... .................................................................................................38
2.5.5 Intervenção II ..........................................................................................................40
2.5.6 Intervenção III ........................................................................................................ 43
3 CONCLUSÃO........................................................................................................45
4 REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS ............................................................... 46
ANEXOS
ANEXO A – Levantamento fotográfico: Mercado Público – Espaço interno ....... 49
ANEXO B – Levantamento fotográfico: A região do Mercado
vista do aterro da Baía Sul................................................................. 52
ANEXO C – Monumento Miramar ........................................................................54
ANEXO D – Intervenções I, II e III – Etapas de desenvolvimento ....................... 56
1 – INTRODUÇÃO
Toda cidade tem o seu mercado público municipal, onde é possível encontrar todo tipo
de mercadoria. Geralmente vendem-se produtos típicos do lugar, como produtos exóticos,
artesanatos, suvenir, e principalmente mantimentos, dos mais variados: de temperos até
animais vivos para o abate (como galinhas e leitões), passando por doces caseiros, frutas e
verduras fresquinhas.
Os mercados têm suas particularidades, pois constituem ambientes muito próprios dos
lugares onde se encontram. Ali trabalham e circulam pessoas nativas e habitantes da região e
seu modo muito específico de viver e de ver o mundo. Estão representados ali elementos
específicos como a geografia, que está diretamente ligada à produção agrícola da região,
objetos representativos de crenças, costumes alimentares, enfim, valores subjetivos que
representam a essência cultural de um lugar. No entanto, nenhum mercado é igual ao outro,
apesar de muitas características comuns.
Em Florianópolis não é diferente. Também temos o nosso mercado, onde o produto
principal é o pescado: peixes diversos e frutos do mar frescos, trazidos por pescadores dos
arredores da ilha e das cidades vizinhas. Além das peixarias, há também bares e restaurantes
típicos, famosos por seus petiscos que atraem tanto os ilhéus e habitantes da ilha, quanto os
turistas na alta temporada de verão. Os demais boxes oferecem diversos produtos, como
roupas, sapatos, acessórios, filhotes de animais, aviamentos, utensílios para cozinha, entre
outros.
A região do Mercado Público de Florianópolis sofreu várias transformações ao longo
da história. Transformações estas decorrentes do crescimento desordenado da cidade e da
descaracterização do Centro Histórico. Mas o esforço dos comerciantes fez com que o
Mercado continuasse ativo como fonte de consumo de peixes e outros produtos, como
referência na gastronomia e local de lazer. A construção, localizada à Rua Conselheiro Mafra
tem pouco mais de cem anos, mas já é uma tradição na cidade. Assim como a ponte Hercílio
Luz, a Praça XV e a Catedral, o Mercado Público também se tornou um símbolo de
Florianópolis.
A sua arquitetura preservada contrasta com o seu entorno, cercado de avenidas e
prédios modernos. Mesmo não estando mais tão perto do mar, ainda conserva a tradição da
venda do pescado. O conjunto das atividades realizadas no Mercado é a razão de sua
existência, e este é um dos fatores que contribui para que a cidade não perca a sua identidade.
12
A preservação do Mercado Público, tanto no seu aspecto funcional, quanto como
elemento visual de valor contemplativo de destaque no Centro Histórico, foi o que motivou a
escolha desse espaço específico para a realização de uma pesquisa visual sobre a percepção
do espaço urbano.
A comparação entre imagens antigas e atuais da cidade foi fundamental para revelar
diferenças marcantes de percepção desse mesmo espaço em diferentes épocas. Por isso, com o
intuito de propor uma reflexão sobre as sensações provocadas diante dessas transformações
do espaço físico da cidade, foi realizado um trabalho de criação visual baseado na percepção
do espaço urbano atual de Florianópolis.
Num primeiro momento foi realizado um estudo sobre a história do Mercado desde
sua inauguração em 1851 até os dias atuais, contextualizando o Mercado Público na história
da cidade e no processo de transformação do Centro Histórico.
Num segundo momento, buscaram-se na memória visual da cidade, as paisagens de
Martinho de Haro, realizando-se um breve histórico do artista, algumas considerações sobre a
importância de sua obra, e sua íntima relação com a paisagem de Florianópolis.
Em seguida, realizou-se um estudo das cidades como tema na história da arte moderna
e contemporânea, o que levou a uma reflexão sobre a relação dos artistas com a representação
da paisagem urbana, no contexto da modernidade.
O processo criativo, fundamentado nessas referências teóricas, se deu na prática
propondo um diálogo entre Martinho de Haro e outros três artistas da modernidade: René
Magritte, Giorgio de Chirico e M.C. Escher. Do conjunto de obras de Martinho, foram
tomadas como principais referências visuais três obras que representam a região do Mercado
Público antes da chegada do progresso. Por meio da estratégia da apropriação, as imagens de
Martinho foram modificadas de acordo com uma nova leitura visual da paisagem, que dialoga
com as ideias e com os estilos dos outros três artistas. Procurou-se dessa forma representar
possíveis sensações diante da paisagem transformada.
Os resultados visuais ao final do trabalho foram motivados principalmente pelo
conceito de estranhamento diante da descaracterização da paisagem urbana, o que impôs
mudanças nas relações entre a cidade e seus habitantes. Fragmentação, descontinuidade e
contraste também foram conceitos trabalhados, percebidos diante da invasão de elementos da
modernidade que passaram a dividir o mesmo espaço com alguns exemplares do antigo
casario colonial. Sem relação entre si, passaram a formar um conjunto desarmônico e confuso.
Esses conceitos começaram a se formar ainda na fase da pesquisa histórica, e foram
confirmados no estudo comparativo das imagens da cidade ao longo de sua existência.
13
Ao final foram apresentados os três resultados visuais do desenvolvimento desse
trabalho e algumas considerações sobre o do processo criativo de cada um.
14
2 – DESENVOLVIMENTO PRÁTICO E TEÓRICO
2.1 - O Mercado Público de Florianópolis
No espaço urbano da cidade o Mercado se destaca como ponto de referência. Para a
maioria das pessoas o seu significado está relacionado com a sua função principal que é a
comercialização de produtos, caracterizando uma atitude ativa com relação ao Mercado. Uma
atitude contemplativa, voltada para uma apreciação estética do lugar valoriza o Mercado
dentro do espaço visual da cidade, mesmo diante das transformações ocorridas no crescente
processo de urbanização. Argan explica a relação entre função e valor dos dados visuais das
cidades tomando como exemplos uma estação de trem e o Coliseu, em Roma:
A estação continua sendo o que é; minha atitude é que muda, e a atitude
contemplativa faz parte da existência e é modo de experiência tanto quanto a
atitude ativa. Isso explica porque uma arquitetura pode conservar o valor
estético inclusive quando cessa sua funcionalidade objetiva – como o
Coliseu, justamente, que conservou e talvez até aumentou seu valor estético,
embora já não sirva para os espetáculos do circo. (ARGAN, 1998, p. 229).
Um bom exemplo dentro de Florianópolis, compartilhando a ideia de Argan de relação
entre função e valor, seria a Ponte Hercílio Luz. Mesmo desativada ainda é mantida por seus
valores estético, histórico e cultural. Dentre as demais construções históricas ainda existentes,
apenas algumas como o Mercado Público, continuam cumprindo sua função de origem. Mas
em sua maioria, assumiram funções e significados diversos ao longo do tempo,
completamente diferentes aos que foram destinadas quando construídas.
Considerado um marco histórico-cultural importante no desenvolvimento de
Florianópolis, sua estrutura preservada se justifica por ser um monumento que faz parte da
história dos antigos moradores da ilha.
Mascates, oleiros, pescadores e colonos se aglomeram desde os meados de
1700 na região em frente à Catedral. Favorecidos pelo fácil desembarque no
porto existente e a proximidade com a população, criam na praia defronte à
praça o ponto ideal para o comércio. Em barracas, ou mesmo vendendo seus
produtos nas canoas, os feirantes atendem não só aos habitantes, como
também aos viajantes. (MESQUITA, 2002, p. 17).
15
A necessidade de se organizar esse comércio deu origem à primeira edificação
destinada aos feirantes, em 1851 na Praça do Mercado (figura 01), onde atualmente é a Praça
Fernando Machado.
Figura 01 – Praça Fernando Machado, século XIX.
Fonte: Acervo Casa da Memória de Florianópolis.
A antiga Florianópolis dessa mesma época foi tema das primeiras pinturas do artista
catarinense Victor Meirelles (1832-1903). Na descrição de Mallmann1
sobre a paisagem em
que cresceu o artista,
a vila não era na época maior do que a maioria das cidades coloniais, com
um casario possível de se contar num dia, ruas de terra batida e um ritmo
social e cotidiano compatível com um núcleo urbano fincado numa ilha
distante menos de um quilômetro do território continental.
Na tela Vista do Desterro (figura 02), Victor Meirelles retratou o panorama do centro
da cidade em 1851, onde podemos observar à direita as torres da Igreja da Ordem Terceira de
São Francisco da Penitência, construída em 1802 na esquina da rua Deodoro com a rua Felipe
Schmidt, próxima à rua Conselheiro Mafra, onde em 1899, seria construída a primeira ala do
novo prédio destinado ao Mercado.
1
MALLMANN, Regis. Os passos do maior pintor brasileiro do século XIX entre Desterro, Paris e o Rio de
Janeiro. Disponível em: <http://www.museuvictormeirelles.org.br/artista/regis_mallmann.htm>. Acesso em: 30
abr. 2011.
16
Figura 02 - Victor Meirelles. Vista do Desterro (1851).
Disponível em: <http://www.museuvictormeirelles.org.br>, acesso em 30 abr. 2011.
O Mercado antigo tornou-se insuficiente para comportar os comerciantes e os
compradores, e seria então demolido no ano de 1896 depois de 45 anos em funcionamento.
No mesmo local, como relata Veiga (1993), seria aberta a pracinha que receberia a estátua do
coronel Fernando Machado, em frente ao Largo da Matriz e próximo ao Trapiche Municipal.
Este, usado como um dos pontos de desembarque no centro da cidade, que até então tinha
como principal meio de comunicação com o continente, pequenas embarcações que
transportavam animais, cargas e pessoas. No ano de 1928, em substituição ao antigo Trapiche
Municipal, seria inaugurado o elegante Bar Miramar (figuras 03 e 04).
Figura 03 – Trapiche Municipal, 1922. Início das obras do Miramar.
Fonte: Acervo Casa da Memória de Florianópolis.
17
Figura 04 – Miramar, sem data.
Fonte: Acervo Casa da Memória de Florianópolis.
A primeira ala do novo Mercado (figura 05), inaugurada em 1899, foi construída à rua
Conselheiro Mafra, entre as atuais ruas Deodoro e Jerônimo Coelho, tendo uma de suas
extensões toda voltada para o mar, unida a este por um alpendre.
Figura 05 – Mercado Novo, 1914.
Fonte: Acervo Casa da Memória de Florianópolis.
18
Em 1931 foi inaugurada a ampliação do Mercado com o objetivo de atender melhor ao
público e dar melhores condições de trabalho aos comerciantes. O conjunto foi ganhando aos
poucos a aparência atual (figura 06), como relata Veiga:
Em 1928, na administração Heitor Blum, foi edificado, pelo lado do cais,
mais um edifício, semelhante à primeira ala, e ligado a ela por duas pontes
construídas sobre torreões, que compensavam a horizontalidade dos longos
pavilhões. Ao centro dos dois blocos formou-se um pátio sobre o leito
interrompido da rua Francisco Tolentino. (VEIGA, 1993, p. 284).
Figura 06 – Mercado Novo, 1928.
Fonte: Acervo Casa da Memória de Florianópolis.
Na região hoje conhecida como Largo da Alfândega, ao lado do Mercado Público,
encontra-se, nas palavras de Veiga, “o melhor exemplar da arquitetura neoclássica na capital”
(VEIGA, 1993, p. 278). Trata-se do edifício da Alfândega (figura 07), inaugurado em 18762
,
para funcionamento do antigo posto de arrecadação e controle do fluxo de riquezas. O edifício
se mantém até os dias atuais como ponto turístico e de vendas do artesanato local.
2
O atual edifício da Alfândega foi construído oito anos após a explosão da antiga Alfândega e Provedoria da
Fazenda Real, situada na esquina da Praça XV de Novembro com a Rua Conselheiro Mafra. (VEIGA, 1993, p.
200).
19
Figura 07 – Prédio da Alfândega, 1960.
Fonte: Acervo Casa da Memória de Florianópolis.
2.2 - Mudanças na paisagem urbana do Centro Histórico
Até o início do século XX a paisagem do centro histórico era banhada pelo mar (figura
08) e Florianópolis mantinha certo ar de cidade do interior. O principal acesso à ilha era feito
por embarcações. A cidade manteve essa característica até 1926, quando foi inaugurada a
primeira ligação rodoviária entre ilha e continente, a Ponte Hercílio Luz. Vaz define o período
que se inicia na década de vinte e se estende até os anos oitenta, como o período de
“transformação da cidade pela passagem da dominância estrutural do modo de transporte
marítimo para o rodoviário” (VAZ, 1991, p. 50).
20
Figura 08 – Miramar, Mercado e Ponte, sem data.
Fonte: Acervo Casa da Memória de Florianópolis.
Florianópolis perde então sua característica portuária gradativamente. No interior do
Estado, uma nova rede de rodovias federais permite o transporte da produção agrícola para os
grandes centros consumidores do país. Na cidade, as diversas obras urbanas do governo
Hercílio Luz, como a construção da ponte pênsil e a instalação do aeroporto causam visível
impacto, como relata Vaz:
O impacto daquelas obras na cidade fez-se sentir nos alargamentos das vias
de acesso à ponte, no crescimento da frota de veículos automotores, no
adensamento das atividades concentradas junto ao porto e na intensificação
da circulação nas áreas públicas do centro. (VAZ, 1991, p. 51)
Segundo o mesmo autor, o processo de modernização, que engloba os avanços
tecnológicos nos sistemas de transportes e de comunicações, incentivou o desenvolvimento do
comércio e viabilizou a centralização dos serviços públicos em Florianópolis, introduzindo
novos padrões de comportamento que se expressam na paisagem reconstruída do Centro
Histórico.
Os indícios mais evidentes da modernização expressos na arquitetura e no
espaço urbano do Centro Histórico surgiram marcados em sua paisagem pelo
intenso trabalho da construção civil. Eram a verticalização das edificações, a
ocupação de todos os vazios, o avanço sobre o mar e as encostas, a
21
construção de grandes obras de infra-estrutura e transportes, etc. Também
transpareceram mudanças nas atividades que a população exercia nessa área:
o seu adensamento, a perda do sentido paroquial das relações sociais, a
especialização em atividades comerciais, de serviços e gestão pública e o
deslocamento da função residencial para fora do Centro Histórico. (VAZ,
1991, p. 48)
A década de 1970 é marcada por grandes obras como o aterro da baía Sul, a ponte
Colombo Sales e a Avenida Beira-Mar Norte. O avanço sobre o mar foi a opção para a
construção de novas rodovias, que simbolizam progresso e desenvolvimento. Em 1973 o
aterro chega ao Mercado Público, afastando-o do mar para sempre (figura 09). Em 1974 é
demolido o Miramar3
. Trapiches, escadas e rampas que ligavam a cidade ao mar
desapareceram, anulando a maritimidade desta região e provocando uma ruptura na relação
das pessoas com o seu meio, que se reflete, por exemplo, nos hábitos e nas formas de produzir
cultura.
Atualmente, uma sensação de vazio se instala entre o Mercado Público e o mar. O
espaço onde antes ficavam atracados os barcos é hoje ocupado por rodovias, viadutos,
estacionamentos e terminais de transporte urbano.
Figura 09 – Área central, 1985.
Fonte: Acervo Casa da Memória de Florianópolis.
3
Em 2001 foi erguido o Memorial Miramar, no mesmo local do antigo bar e restaurante. O projeto do arquiteto
Joel Pacheco mantém o desenho da planta baixa, e de acordo com Panariello (2007, p.27), a obra, que consiste
em pilares perdidos no meio da Praça, representa uma leitura superficial de tudo que representou o velho
trapiche na antiga Florianópolis.
22
O desenvolvimento do transporte rodoviário na ilha testemunhou o crescimento da
atividade turística, principalmente no verão, quando pessoas procuram por lazer nas regiões
de praias. Essa atividade favoreceu o centro da cidade, ampliando a demanda de comércio,
serviços e lazer.
O Mercado Público, diante de toda essa transformação urbana, mantém sua atividade
econômica, sendo referência no comércio de pescados e frutos do mar. Além disso, mesmo
com a concorrência de grandes redes de supermercados e vendas pela internet, mantém a
tradição de oferecer vários outros tipos de produtos4
. É atualmente ponto de visitação
turística, oferecendo também o conforto de bares e cafés que se destacam na gastronomia da
ilha. Em 1984 foi inaugurado o Espaço Cultural Luiz Henrique Rosa, no vão central,
destinado a exibições folclóricas, exposições de artesanato e apresentações musicais.
O conjunto arquitetônico, conhecido cartão-postal da cidade, foi tombado como
Patrimônio Histórico em 1984. De acordo com a Secretaria Executiva5
do município,
“segundo a legislação de proteção do patrimônio histórico, o monumento deverá ser
totalmente preservado, tanto nas suas características internas, como externas”.
Diante do violento processo de transformação ocorrido no Centro Histórico de
Florianópolis, existiram pessoas que se preocuparam em registrar a imagem da antiga cidade,
que desaparecia a cada dia para dar lugar a prédios modernos e avenidas. O casario antigo
próximo ao mar, e elementos particulares como as Igrejas, o Miramar, e o Mercado Público
foram temas constantes nas paisagens retratadas por fotógrafos e representadas por artistas
plásticos em suas pinturas. Essas pessoas foram fundamentais para que a cidade tivesse sua
memória visual preservada para as gerações seguintes.
2.3 - A Florianópolis de Martinho de Haro
Considerado um indiscutível memorialista da cidade de Florianópolis, Martinho de
Haro nasceu em 1907, na cidade de São Joaquim, e morreu em 1985, em Florianópolis.
Dedicou toda a sua vida ao trabalho artístico, deixando um conjunto de obras que representam
nus femininos, naturezas mortas, retratos, paisagens, tipos e costumes de sua região. Sua
primeira exposição individual foi em 1926, no Conselho Municipal de Florianópolis.
4
vide Anexo A.
5
PREFEITURA Municipal de Florianópolis. Secretaria Executiva. Serviços Públicos. Mercado Público.
Disponível em: < http://portal.pmf.sc.gov.br/entidades/sesp/index.php?cms=mercado+publico&menu=0>
Acesso em 26 maio 2011.
23
Seu talento o levou a ser premiado com duas bolsas de estudos. A primeira para a
Escola Nacional de Belas Artes, no Rio de Janeiro, onde estudou de 1927 a 1937. A segunda
o levou à Paris em 1938, para estudos na Academie de La Grand Chaumie. No exterior teve
contato com os movimentos das vanguardas artísticas do início do século XX, convivendo
com artistas e visitando museus e exposições.
Devido à iminência da Primeira Guerra Mundial, teve sua viagem interrompida e
voltou ao Brasil em 1939. No início da década de 1940 estabeleceu-se em Florianópolis, e
iniciou uma estreita relação com a imagem da cidade, a qual captou em inúmeras
composições que retratam vistas da cidade, o modo de vida e a cultura da ilha, manifestas em
suas tradições.
Sobre a técnica utilizada pelo artista, Mattos (2007) relata o uso de folhas de eucatex
de ambos os lados, conforme a intenção de aproveitar a textura do material. Sobre o método,
descreve: “De acordo com o costume pós-impressionista, desenvolvia as pinturas no ateliê,
após anotações meticulosas que realizava fora. Vez por outra aventurou-se de barco pela Baía
Sul para situar-se no ponto de vista desejado” (MATTOS, 2007, p. 47). Martinho de Haro
testemunhou a progressiva desaparição dos monumentos arquitetônicos, mas ainda teve o
privilégio de presenciar a beleza da cidade sem as intervenções trazidas pelo progresso. A
Florianópolis desse tempo ficaria gravada para sempre na memória, e na obra do artista.
O Mercado Público, o cais da rua Francisco Tolentino e o Largo da Alfândega, esses
próximos ao Mercado, foram locais retratados pelo artista por repetidas vezes. De acordo com
Menezes6
, essa repetição não significa uma preocupação em registrar a evolução urbana.
Fazia parte da pesquisa plástica do artista, e de sua inquietação e busca por captar algo que lhe
tivesse escapado. Algo além da forma externa visível, uma busca pela subjetividade. Ou como
detalha Mattos:
O que move Martinho parece-nos ser aquela inquietação que levou Cézanne
a se deter na montanha de Santa Vitória ou o que levou Morandi a pintar
garrafas durante toda sua vida: o desafio para que o pintor busque em seu
reservatório criativo novos acordos cromáticos, novas organizações das
correspondências espaciais, novas combinações dos esquemas arbitrários,
novas curiosidades para as baquigráficas anotações da forma, novas ocasiões
de inserção de seu leit-motiv: aquele cinza azulado que torna o céu
emblemático, ainda que específico. (MATTOS, 2007, p. 44).
6
MENEZES DE FARIA, Priscilla; CHEREM, Rosangela Miranda. Permanência e deriva: o cais de Martinho
de Haro. DAPesquisa. Revista de investigação em Artes - ISSN: 1808-3129 – Vol. 3, Nº 2, Ano 6 - Ago/2008 –
Jul/2009. Disponível em:
<http://www.ceart.udesc.br/revista_dapesquisa/volume4/numero1/plasticas/permanenciaederiva.pdf>. Acesso
em: 19 mai. 2011.
24
Martinho consegue se manter fiel aos aspectos de verossimilhança sem se prender a
detalhes da paisagem observada, o que reduziria sua obra a mera representação do real. Assim
como Cézanne, “buscou extrair do objeto não sua superfície reconhecível, mas aquilo que
pulsava, que era denso e vivo em um corpo.” (MENEZES DE FARIA, 2009, p.3).
Artista considerado pertencente ao Modernismo Brasileiro, Martinho como outros
modernistas seus contemporâneos se decidiu pela síntese, pela simplificação de formas e
espaços. Seu geometrismo foi à maneira de Cézanne, buscando a pureza das formas e
estabelecendo um diálogo com a aplicação das cores, diferente de outros modernistas
brasileiros que usavam a geometria em busca da abstração.
No que se refere à cor, Martinho se expressa por uma palheta reduzida. Amarelos,
carmins, salmão, e cinzas de todos os matizes que unificam a composição cromática entre
azuis e verdes. Suas paisagens serenas não revelam contrastes. “Opta pela matéria diluída não
circunscrita por contornos, mas criadora de sensações construtivas de espaço-volume-cor, de
acordo com o bom cezannismo.” (MATTOS, 2007, p.47).
O artista tomou Florianópolis como seu tema favorito, buscando a impressão do
instante de uma paisagem efêmera. Céu e mar são marcantes em suas paisagens, ora calmos,
ora revoltos, estão em harmonia com os casarios e a presença discreta de pessoas nas ruas.
Nesse sentido, de acordo com Makowiecky (2008) Martinho pode ser citado dentro do
movimento Modernista no Brasil “pela busca de raízes culturais e étnicas e pelo regionalismo
através do qual se procura o genuinamente brasileiro” (MAKOWIECKY, 2008, p.8). No
entanto, não seguiu tendências. Foi fiel aos temas e procurou aprofundar-se em suas próprias
formas de expressão plástica, o que fortaleceu sua poética pessoal.
Segundo a Instituição Itaú Cultural7
, o movimento Modernista no Brasil tem como
marco simbólico A Semana de Arte Moderna (São Paulo, 1922), que representa o rompimento
com o tradicionalismo cultural associado às correntes literárias vigentes (simbolismo e
parnasianismo) e à arte acadêmica. Participaram do evento, representantes da literatura e da
música dentre os quais Mário de Andrade, Oswald de Andrade e Heitor Villa-Lobos; mas
especialmente os participantes das artes plásticas, como Anita Malfatti e Di Cavalcanti,
formam a base do movimento, que marcou um período de renovação estética, e busca por uma
linguagem própria ligada à valorização do genuinamente brasileiro. Pode-se dizer que o
movimento, que teve início em São Paulo e influenciou artistas em todo o Brasil, está
7
ENCICLOPÉDIA Itaú Cultural. Artes Visuais. Termos e Conceitos. Modernismo no Brasil Disponível em: <
http://www.itaucultural.org.br/aplicexternas/enciclopedia_ic/index.cfm?fuseaction=termos_texto&cd_verbete=3
59&lst_palavras=&cd_idioma=28555&cd_item=8> Acesso em 20 maio 2011.
25
diretamente ligado ao desenvolvimento da cidade de São Paulo, sua industrialização e
urbanização, e foi beneficiado artisticamente pelo contato estreito com as vanguardas
artísticas europeias.
2.4 – A modernidade
O Modernismo na história da arte surge no fim do século XIX no contexto da nova
estrutura social e econômica gerada pela Revolução Industrial na Europa, evento que marca o
início da modernidade. O progresso tecnológico transformava não só a economia e o modo de
vida nas cidades, mas se fazia sentir também nas novas tendências artísticas. Segundo Argan
(1992, p.187), os artistas buscavam uma arte em conformidade com sua época, o que invoca a
renúncia aos modelos clássicos, tanto na temática como no estilo. A problemática sobre qual
seria o papel da arte nesse novo contexto procura soluções através da liberdade de
experimentação, da descoberta de novas linguagens que dialogassem com as experiências da
vida moderna.
O Impressionismo foi uma corrente artística do Modernismo que marcou uma nova
relação entre a representação e o objeto, manifestando uma atitude sensitiva diante da
realidade. Claude Monet, seu maior representante, dedicava-se a pesquisa sobre as variações
cromáticas em decorrência da incidência da luz do sol na paisagem, em diferentes horas do
dia ou épocas do ano. Seu estilo inovador rompeu radicalmente com as técnicas tradicionais
de representação.
Uma das características no modernismo de Monet, segundo Frascina (1993), é a ênfase
nas questões técnicas e formais, o que distancia sua obra de uma representação crítica sobre a
modernidade. Um exemplo citado pelo autor é a série de pinturas da cidade de Argenteuil, em
que se percebe a decisão do artista por minimizar os sinais da industrialização, preferindo
“deixar de fora a realidade contraditória da efêmera vida contemporânea no processo de
modernização.” (FRASCINA, 1993, p.126).
Nesse ponto pode-se traçar um paralelo com a representação de Martinho de Haro, no
que se refere à opção do artista por minimizar os efeitos da modernização sobre a paisagem de
Florianópolis. Percebe-se em sua obra a aparição discreta e gradual de prédios no conjunto
urbano, dispostos de maneira harmônica na composição, sendo esse um dos poucos sinais dos
tempos modernos. Talvez como Monet, Martinho tenha preferido expressar sua visão pessoal
da paisagem, motivado pela dedicação ao estudo da cor, da forma e da composição.
26
No entanto, entre os pintores modernistas, a experiência da vida moderna despertava o
interesse pela temática urbana. A Paris modernizada com suas grandiosas obras de engenharia
surge nas telas do impressionista Gustave Caillebot (figura 10). O mesmo local é retratado
também por Monet (figura 11). A comparação entre as duas imagens permite perceber que
Monet, ao contrário de seu colega, dedica atenção maior à pintura do que ao próprio tema,
considerado ousado para a época. Monet busca a sensação luminosa de um instante
passageiro, no ambiente esfumaçado próximo à estação de trem.
Enquanto os Impressionistas se dedicavam ao estudo dos efeitos da luz, Cézanne, o pai
da pintura moderna, se aprofundava no estudo da forma e da cor buscando a sensação da
estrutura e peso dos objetos, desintegrada pela pintura impressionista. Cézanne via o mundo
como uma unidade de relações entre formas e cores. Segundo Cavalcanti (1981, p. 102), seus
motivos podem ser considerados um pretexto para suas pesquisas pictóricas, pois não estava
interessado em associar sua pintura a simbolismos, nem atribuir-lhes significados históricos.
Ao reduzir as formas dos objetos e dos elementos da natureza a figuras geométricas básicas
(cilindros, esferas e cones) Cézanne alcança a liberdade de interpretação da realidade, o que
mais tarde iria abrir caminhos para o cubismo e para a abstração geométrica.
Figura 10 - Gustave Caillebot. A ponte da Europa (1876).
Disponível em: <http://www.gustavcaillebotte.org/The-Pont-Du-Europe.html>, acesso em 06 jun. 2011.
27
Figura 11 – Claude Monet. A ponte da Europa (1877).
Disponível em: <http://www.claudemonetgallery.org/The-Pont-De-L-Europe--Saint-Lazare-Station.html>,
acesso em 06 jun. 2011.
As pesquisas de Cézanne e dos impressionistas levaram a arte moderna a romper com
a função da representação da realidade. Esse rompimento se concretiza com o surgimento dos
movimentos de vanguarda na Europa (início do século XX), em que os artistas deixam de
imitar a realidade para fazer de sua arte um meio de expressão. De acordo com Siqueira, “com
esse sentido de expressão pessoal, a arte passou a se interessar pela contribuição individual do
artista. Não bastava o registro de uma realidade exterior, mas a presença de elementos
interiores, de uma certa experiência sensível ou emocional que o artista transpunha para a sua
obra” 8
.
Um exemplo dessa “expressão pessoal” pode ser observado nas obras do
expressionista Ernst Ludwig Kirchner “Nollendorfplatz”, de 1912 (figura 12) e “Cena de Rua
Berlinense”, de 1913 (figura 13), esta citada por Kuster (2006, p.10). Segundo a autora,
8
SIQUEIRA, Vera Beatriz. Destino da arte: arte e cultura no mundo moderno e contemporâneo. Curso de
Especialização em Artes Visuais: Cultura e Criação. Rede EaD SENAC. (p. 4). Disponível em:
<http://senac.eduead.com.br/ead2010/mod/resource/view.php?inpopup=true&id=74065>. Acesso em 17 maio
2011.
28
O expressionismo desenvolveu-se quase que simultaneamente em países
diversos, nascido da necessidade de externar os sentimentos de angústia e
desânimo de seus representantes, face a um mundo desequilibrado pela
impessoalidade decorrente da exacerbação da máquina. A „Brücke‟ foi um
dos movimentos expressionistas alemães que surgiu na primeira década do
século XX; e seus integrantes usavam imagens da cidade moderna para
transmitir - com figuras e cores distorcidas - a idéia de um mundo hostil e
alienante. Os espaços urbanos são retratados com seus aspectos sombrios
enfatizados, através dos ângulos agudos, dos tons frios e escuros; (...) a
multidão urbana é vista com os semblantes carregados de angústia e
hostilidade conforme retratada em “Cena de Rua Berlinense”. (KUSTER,
2006, p.10).
A vida nas cidades tornou-se cada vez mais complexa, resultado de um mundo
dominado pelo capitalismo e pelas inovações tecnológicas. O ambiente urbano e seu
dinamismo continuou sendo inspiração para os artistas modernos, que expressavam suas
diferentes sensações perante a experiência da modernidade: angústia, ironia, admiração,
dentre tantas outras. Na contemporaneidade a cidade tornou-se palco para outros tipos de
manifestações artísticas. Por meio de performances e intervenções urbanas, os artistas
contemporâneos propõem reflexões sobre a relação entre as pessoas e os ambientes das
cidades.
Todas essas possibilidades de expressão, de levantar questionamentos e propor
reflexões sobre inúmeros temas, incluindo-se o ambiente urbano, são possíveis hoje graças ao
Figura 12 - Ernst Ludwig Kirchner. Berlin Street
Scene (1913). Disponível em:
<http://images.artnet.com/images_US/magazine/f
eatures/huttenlauch/huttenlauch11-7-1.jpg>,
acesso em 06 jun. 2011.
Figura 13 - Ernst Ludwig Kirchner.
Nollendorfplatz (1912). Disponível em:
<http://www.stadtmuseum.de/php/sammlung
en/sreb.php?id=238>, acesso em 06 jun.
2011.
29
primeiro passo dado pelos modernistas, que romperam com as tradições e alcançaram a
liberdade na arte de representar.
Essa liberdade de expressão também está presente na paisagem de Martinho de Haro.
Percebe-se, como já citado pelos autores consultados, a influência de Cézanne, no que se
refere à simplificação da forma e às relações cromáticas na composição. Mas Martinho
também expressou suas sensações sobre a cidade. Em seus depoimentos em vídeo9
, Sandra
Makowiecky10
e Janga11
identificam na paisagem de Martinho uma sensação de partida, de
infinito; uma nostalgia, um sentimento de saudade; uma preocupação em preservar a memória
registrando o casario colonial, e sua parcela de responsabilidade com a identidade da cidade.
Com base nos estudos sobre a obra de Martinho de Haro, e da representação das
cidades pela arte no contexto da modernidade, teve início o processo de criação, com a
pesquisa de referências visuais que pudessem contribuir para expressar através da produção
de uma imagem, algumas sensações diante das transformações ocorridas na cidade de
Florianópolis em decorrência da modernização.
2.5 – O processo criativo
2.5.1 – Referências visuais
As primeiras referências visuais sobre o tema apareceram ainda na etapa da pesquisa
teórica. Trata-se de fotografias do fim do século XIX e início do século XX que mostram o
Centro Histórico de Florianópolis naquele tempo, e ajudam a compreender como se deram as
modificações do Centro Histórico e o quanto essas transformações alteraram a percepção
visual do espaço urbano, especificamente na região do Mercado Público.
Desse acervo fotográfico foram selecionadas algumas imagens (figuras 01 a 09) que
retratam um panorama na região do Mercado desde o tempo que ainda era banhado pelo mar e
sem a presença de prédios modernos, até fotografias mais recentes das décadas de 1980 e
1990, onde é possível constatar o nível de descaracterização ocorrido nesse curto espaço de
tempo.
9
MARTINHO de Haro. A cidade reinventada. Da série alma de artista. Direção e roteiro: Chico Pereira.
Produção: Bruno Vieira da Cunha. Realização: Fundação Cultural de Florianópolis Franklin Cascaes e Prefeitura
de Florianópolis. Florianópolis: 2007. DVD.
10
Professora de Artes Visuais
11
Crítico de Artes.
30
Além das referências fotográficas de valor documental, teve-se acesso também a um
acervo de imagens produzidas por artistas plásticos locais que adotaram a cidade como tema
principal de suas pinturas. Esses artistas tinham em comum o interesse em preservar a
memória de uma cidade que teve parte de seu patrimônio arquitetônico destruído em nome da
modernidade. Dedicaram-se então a eternizar imagens de uma Florianópolis encantadora, que
infelizmente, se perderia para sempre.
Dentre os artistas pesquisados, tomou-se como referência principal a obra do
modernista Martinho de Haro e sua forma muito particular de representar o conjunto que
caracterizava a Florianópolis antiga, com seu casario cercado de céu e mar. Diante do amplo
repertório do artista, algumas obras foram selecionadas como referências visuais para a
realização do trabalho prático, especificamente, as que representam a região do Mercado
Público (figura 14), o cais da Rua Francisco Tolentino (figura 15), e o Largo da Alfândega
(figura 16).
A partir desse conjunto de obras selecionadas, foi feito um levantamento fotográfico12
do local na atualidade, buscando ângulos aproximados da visão do artista. O contexto atual
impõe uma nova percepção do espaço visual da cidade, o que permite fazer um comparativo
entre o olhar do artista e novas possibilidades de olhar sobre a mesma paisagem, agora
desfigurada.
Figura 14 - Martinho de Haro. Mercado Público (1970/ 1975).
Fonte: CORREA NETO (2007, p. 32).
12
ANEXO B.
31
Figura 15 – Martinho de Haro. Mercado Público (1975/ 1980).
Fonte: CORREA NETO (2007, p. 25).
Figura 16 – Martinho de Haro. Largo da Alfândega com ocaso violeta (1980/ 1985).
Fonte: CORREA NETO (2007, p. 38).
No estudo da representação desse novo contexto onde está inserido o antigo Mercado
Público, a pesquisa de referências visuais se ampliou, propondo um diálogo entre Martinho e
outros três artistas: M.C Escher, Giorgio de Chirico e René Magritte, na intenção de
representar possíveis metáforas diante do estranhamento provocado pela chegada do
progresso à cidade de Florianópolis.
Em oposição à harmonia presente nas paisagens de Martinho de Haro, pode-se
observar na paisagem atual um imenso contraste entre o novo e o antigo, o passado e o
presente. Este conceito é percebido nas referências visuais pesquisadas, quando se faz a
comparação entre imagens antigas e atuais da cidade. Para representar esse contraste
32
resultante da transformação do espaço urbano, buscou-se como referência visual a obra
Metamorphosis I (1937), de M.C. Escher (figura 17), onde figuras encadeadas se transformam
em outras figuras, num ritmo equilibrado, que no seu conjunto dão sensação de tempo e
movimento.
Figura 117 – M.C. Escher. Metamorphosis I (1937).
Disponível em: <http://www.mcescher.com/>, acesso em 06 jun. 2011.
Na obra de Martinho a presença do mar é uma constante. Ora um espelho d‟água
refletindo o casario, ora um mar revolto em movimento, que em parceria com o céu dá vida a
paisagem retratada. No entanto o aterro abafou o barulho do mar, e o espaço foi tomado por
um imenso silêncio, até ser ocupado por rodovias, terminais urbanos e estacionamentos. Essa
paisagem quase desértica remete às primeiras obras de Giorgio de Chirico (figura 18).
Enigmáticas e melancólicas, as paisagens urbanas de De Chirico referem-se às cidades
italianas, com suas praças sem vida em tardes quentes, o céu azul e longas sombras que
indicam o calor intenso do verão (FARTHING, 2009, p. 356).
Figura 18 – Giorgio de Chirico. Piazza d’Italia (1913).
Disponível em: <http://www.abcgallery.com/C/chirico/chirico10.html>, acesso em 06 jun. 2011.
33
O ponto de vista específico que buscava Martinho ao se aventurar nos mares da Baía
Sul, poderíamos hoje encontrar facilmente num passeio à pé pelas calçadas do aterro, não
fossem tantos os anteparos que impedem a visualização do antigo cais da Alfândega. A
paisagem surge confusa, entre postes, coqueiros, sinais de trânsito e árvores. Essa situação
remete à obra de René Magritte (figura 19), onde uma amazona é vista cavalgando num
bosque. Segundo Rodrigues (2010), a fragmentação e a descontinuidade da figura central
rompem com a ilusão da perspectiva representada pela sensação de profundidade no
posicionamento das árvores. Dessa forma, o artista une em uma única superfície os planos da
imagem, causando uma sensação de simultaneidade de espaço e de tempo.
Figura 19 - René Magritte. Le Blanc-seing (1965)
Disponível em: <http://obviousmag.org/archives/2006/03/rene_magritte_1.html>, acesso em 06 jun. 2011.
Apesar da descaracterização física e visual da paisagem de Florianópolis, observa-se a
permanência do Mercado Público como um dos monumentos arquitetônicos preservados no
contexto atual. Este fato motivou o uso da apropriação como método de criação para este
trabalho.
A “apropriação” pode ser entendida como um procedimento realizado pelo artista que
no seu processo de criação, toma para si objetos não-artísticos e outras imagens preexistentes
para elaborar sua obra, atribuindo novos significados ao elemento apropriado.
Por imagens preexistentes compreende-se todo o universo das imagens criadas até o
presente momento, que pertencem ao imaginário da história da humanidade. Ao contrário dos
modernos, a arte contemporânea não está em busca do novo, e nem quer negar o passado. Os
34
artistas contemporâneos transitam livremente no tempo e no espaço, em busca de algo que
possa expressar o seu pensamento.
Ao apropriar-se de uma imagem, o artista pode resolver apoderar-se do tema proposto
na obra original, ou “tomar emprestado” o estilo de outro artista. Pode ainda tomar para si
parte da obra e inseri-la em um novo contexto, ou intervir sobre ela. Ou ainda apropriar-se da
obra por inteiro, o que vem levantar questões sobre autenticidade e originalidade. Para o
artista contemporâneo, as imagens do mundo se transformam em signos dos quais ele se
apodera e manipula para produzir novos significados.
A fotografia, o cinema e a televisão, tecnologias inicialmente criadas para registrar o
momento presente, passam a ser fontes de pesquisa visual para a elaboração de novos
trabalhos. O fácil acesso à informação por meios eletrônicos, as técnicas de reprodução de
imagens como xérox e scanner, e o uso de softwares gráficos para a manipulação de imagens
possibilita ao artista inúmeras possibilidades de pesquisa e de criação. Perez (2008 apud
Cristofaro, 2005) ainda salienta
que o fato de o artista se apropriar de imagens não põe em risco sua
expressividade individual ou sua visão do mundo, pois seu critério seletivo,
define, em última instância, suas ideias, suas inquietações, sua inventividade
e seu pensamento associativo. Assim, a apropriação justifica-se por permitir
ao artista criar um novo código de leitura que vai além dos significados
originários dessas imagens, transportando-lhes nova compreensão e
atribuindo-lhes novo sentido. Logo, uma das razões possíveis para o uso da
apropriação na arte contemporânea parece estar evidenciada numa
necessidade de revisionismo própria de nossa era.
Diante dos inúmeros exemplos de apropriação pesquisados na história da arte, alguns
apresentaram maior possibilidade de diálogo com a proposta deste trabalho e foram inseridos
no conjunto das referências visuais.
O primeiro deles é Methaphisical Interior with Hand of David (figura 20). Ao inserir o
desenho da mão de David de Michelangelo (1501-1504) em sua obra, De Chirico apropriou-
se de parte da obra original, criando para esse fragmento um novo significado no contexto de
sua pintura metafísica.
35
Figura 120 – Giorgio de Chirico. Methaphisical Interior with Hand of David (1968).
Disponível em: <http://www.fondazionedechirico.it/en/1960-70>, acesso em 06 jun. 2011.
A obra do artista americano John Baldessari (figura 21) representa um ambiente
urbano com silhuetas destacadas em cores sólidas, que representam pessoas em momentos de
grande estresse físico ou perigo. Segundo o site The Metropolitan Museum of Art13
, o artista
fotografou cenas de filmes na televisão e interferiu sobre a imagem, isolando as figuras para
criar um efeito de alívio superficial.
Figura 21 – John Baldessari. The Duress Series: Person Climbing Exterior Wall of Tall Building / Person
on Ledge of Tall Building / Person on Girders of Unfinished Tall Building (2003). Disponível em: <
http://www.metmuseum.org/special/john_baldessari/view_1.asp?item=19>, acesso em 01 jun. 2011.
13
THE METROPOLITAN Museum of Art. Special Exhibitions. John Baldessari: Pure Beauty. Disponível em:
<http://www.metmuseum.org/special/john_baldessari/view_1.asp?item=19>. Acesso em: 01 junho 2011.
36
Percebe-se nessas duas imagens o isolamento de parte da obra original e a proposta de
inserção em um novo contexto. Em De Chirico, a referência a uma obra clássica do
Renascimento contrasta com o entorno surreal em que foi inserida. Baldessari, por sua vez,
propõe um deslocamento das figuras, isolando-as com cores contrastantes, sugerindo assim
uma mudança de situação de perigo para de não perigo.
O conjunto dessas imagens dialogam com a ideia de apropriação de parte da obra de
Martinho de Haro através do isolamento da figura do Mercado. As possibilidades de criação
de novos cenários para esta figura, partindo de uma interpretação das possíveis sensações
provocadas pelo processo de transformação da cidade, propõe novas reflexões sobre as
mudanças na paisagem e seus possíveis significados.
2.5.2 – Recursos técnicos
A apropriação da obra de Martinho de Haro se deu por meio da reprodução por
digitalização das imagens de um livro14
, usando-se para isso o livro, um scanner e um
computador. Recurso técnico fundamental no processo, o computador permite o
armazenamento de imagens e infinitas possibilidades de intervenção através de softwares
gráficos de desenho e de manipulação de imagens. Nesse trabalho em particular, optou-se
pelas possibilidades de desenho vetorial por computador para recriar o cenário ao redor da
imagem apropriada.
As imagens digitalizadas foram importadas para a área de trabalho do software Adobe
Illustrator CS3, no qual se iniciou o processo de isolamento das figuras de maior interesse.
Nessa etapa, as figuras foram redesenhadas sobre a imagem, e posteriormente o cenário
original foi encoberto por uma máscara (ANEXO D). A partir desse resultado, recorreu-se às
referências visuais já citadas para estudos de composição dos cenários.
14
CORRÊA NETO, Yilmar; PRADE, Péricles. A Florianópolis de Martinho de Haro. Florianópolis: Tempo
Editorial, 2007. (p. 25, 32, e 38)
37
2.5.3 – Estudo preliminar
O primeiro estudo realizado (figura 22) foi feito para experimentar as possibilidades
de representação do cenário atual por meio do desenho vetorial. Para isso, tomou-se como
referência principal a obra Mercado Público (figura 14) em que a figura do Mercado foi
redesenhada sobre a imagem, seguindo os traços do artista.
Nessa etapa foi importante observar na obra original o estilo de Martinho de Haro. Sua
opção pela simplificação da forma e omissão de detalhes foi mantida no novo desenho do
mercado, e serviu como parâmetro para estudos de composição do novo cenário.
O levantamento fotográfico feito no local (ANEXO B) foi a principal referência para a
composição do cenário com prédios e rodovias. Observou-se a disposição dos prédios, o
desenho das ruas, e principalmente como se relacionam esses elementos com a imagem do
Mercado. Em certos ângulos de visão, o excesso de construções, bancas de camelôs e de
revistas, e outros elementos como árvores, postes de energia elétrica e telefones públicos
impedem a visualização do prédio por inteiro, em oposição do que é possível observar na
representação de Martinho de Haro. Mesmo assim, o Mercado se destaca no conjunto urbano
principalmente por seu estilo arquitetônico.
As fotografias mostram o intenso movimento de pessoas e de veículos automotivos de
todos os tipos e tamanhos trafegando na rodovia Paulo Fontes, hoje um importante acesso ao
centro da cidade. Observou-se também uma intensa atividade comercial nos arredores do
Mercado Público, o que contribuiu para a descaracterização da paisagem, principalmente na
Rua Francisco Tolentino. No entanto, optou-se por não retratar essas características na
representação gráfica do cenário atual, seguindo novamente o estilo de Martinho, em que
figuras humanas, charretes e automóveis raramente aparecem, e de forma muito discreta.
O resultado desse primeiro estudo demonstra a opção pela representação simplificada
dos prédios, resumidos a silhuetas retangulares dispostas em perspectiva no espaço, o que
revela a ocupação intensa desses elementos na paisagem ao redor do Mercado. No que se
refere à rodovia lateral, optou-se por representá-la em linhas curvas, enfatizando o seu aspecto
estático em contraste com o dinamismo do mar presente na representação de Martinho.
A partir desse estudo preliminar, iniciou-se o trabalho de criação propriamente dito,
em que se procurou representar por meio da produção de três imagens, possíveis sensações
diante da visível descaracterização da cidade. Nessa etapa recorreu-se também às imagens da
antiga Florianópolis, num estudo comparativo entre o passado e o presente. Para atingir esses
38
resultados, procurou-se estabelecer diálogos entre as obras de Martinho de Haro e as
referências visuais citadas, pela estratégia da apropriação.
Figura 22 – Estudo preliminar. Fonte: Autora (2011).
2.5.4 - Intervenção I
No primeiro trabalho tomou-se como referência principal a obra Mercado Público
(figura 14) de Martinho de Haro. Como segunda referência foi escolhida a obra Le Blanc-
seing (figura 19) de René Magritte.
O primeiro passo foi o isolamento das figuras do Mercado Público e do prédio da
Alfândega na obra de Martinho de Haro (ANEXO D), caracterizando a apropriação de
fragmentos da obra. Optou-se por manter o prédio da Alfândega no novo cenário, por ser esse
um monumento arquitetônico também preservado e presente no contexto atual. A partir desse
ponto, iniciou-se um processo de análise na obra de Magritte, a procura de elementos que
também pudessem ser apropriados para compor o trabalho final.
39
Observa-se no conjunto da obra do surrealista René Magritte, certa dose de
ambiguidade e contradição. O artista adota uma representação muito próxima da realidade,
porém cria relações absurdas e incongruentes entre os elementos que compõem a cena. Pode-
se observar um questionamento constante sobre a realidade e a representação dessa mesma
realidade, nas ilusões de ótica e nas relações entre a representação do espaço real e do espaço
ilusório. A pintura surrealista extrapola o nível da percepção e atinge um nível psicológico, à
medida que rompe com a normalidade, e propõe reflexões por meio de novas combinações de
elementos reais no espaço da representação artística. Argan, sobre a obra dos surrealistas diz:
“as imagens não são modificadas, modificam-se as relações com que normalmente as imagens
se associam entre elas” (ARGAN, 1992, p. 480).
Na obra Le Blanc-sign, observa-se certo estranhamento no ato da observação. A
princípio a obra apresenta-se como uma paisagem naturalista. Um olhar mais atento revela
detalhes que explicam o porquê da sensação de estranheza diante da obra. Segundo Rodrigues
(2010, p.105), a imagem apresenta certa artificialidade devido à homogeneidade das cores e
das formas que contradizem o efeito de perspectiva dado pelo posicionamento das árvores.
Segundo a mesma autora,
o maior efeito de diluição da perspectiva clássica, porém, é obtido pela cisão
da figura da amazona e do cavalo e de sua interpolação pelos diversos planos
– há uma relativização entre o que estaria mais no fundo e o que estaria nos
planos anteriores. A imagem da amazona apresenta-se ora oculta por um
tronco que estaria num plano posterior da tela, ora encobrindo caules que
estariam num plano à frente. (RODRIGUES, 2010, p.105).
As imagens apresentam-se fragmentadas e descontínuas num mesmo plano de
representação, o que causa uma estranha sensação de simultaneidade no tempo e no espaço.
Levando-se em conta essas observações, optou-se pela apropriação dos conceitos de
fragmentação, descontinuidade e simultaneidade presentes na obra de Magritte, representados
pela figura da amazona entrecortada pelo plano das árvores.
O cenário criado a partir desses conceitos (figura 23) traz as figuras do Mercado, da
Alfândega e o desenho dos prédios, todos entrecortados por coqueiros estilizados. Esse
resultado foi obtido com base na observação do cenário atual, onde inúmeros obstáculos
impedem uma apreciação da paisagem tal qual a retratada por Martinho em sua pintura. O que
se observa atualmente é uma imagem confusa, onde elementos de origens diversas competem
por atenção, confundindo a visão do observador.
40
A fragmentação da figura principal propõe uma reflexão sobre a relação do Mercado
com a paisagem em que está inserido atualmente. Uma questão que se pode pensar é o quanto
a nova realidade interfere na compreensão da relação entre o monumento arquitetônico
preservado e seus referenciais históricos. Diante disso, optou-se pelo uso de cinzas para cobrir
a paisagem moderna, em contraste com o colorido da figura apropriada de Martinho incluindo
um pedacinho de céu e de mar, o que evoca a presença de um passado distante, mas ainda
vivo na memória de muitos cidadãos.
Figura 23 – Intervenção I. Fonte: Autora (2011).
2.5.5 – Intervenção II
No segundo trabalho, tomou-se como referência principal a obra Largo da Alfândega
com ocaso violeta (figura 16) de Martinho de Haro. Observa-se nessa pintura a inexistência de
elementos que evoquem a chegada da modernidade, como os discretos prédios presentes em
outras obras do artista. Além disso, é possível observar na paisagem a ausência da Ponte
Hercílio Luz, monumento construído na década de 1920. Pode-se concluir que o artista retrata
a Florianópolis do fim do século XIX e início do século XX.
41
A composição destaca principalmente o prédio da Alfândega e o Mercado, com seus
respectivos trapiches avançando sobre o mar. Ao fundo a presença de outros elementos do
casario colonial e as torres da Igreja São Francisco. O tom violeta da imagem remete a um pôr
do sol, causando uma sensação de paz e tranquilidade. O mar calmo reflete o casario e o céu
coberto de nuvens que chegam anunciando o fim do dia.
Esse quadro é da década de 1980, época em que a paisagem urbana de Florianópolis já
se encontrava totalmente modificada. Diante desse fato, percebe-se a decisão do artista por
continuar pintando a paisagem inspiradora que ele viu desaparecer, e contribuir com sua arte
para a preservação da memória da cidade.
Como já foi visto Martinho não se prendia a detalhes. Numa atitude modernista,
rompeu com o estilo tradicional de representação da realidade. No entanto, sua paisagem
consegue transmitir exatamente o que era Florianópolis antes da chegada do progresso.
Uma visão muito diferente se tem hoje do mesmo lugar, quando observado por um
ângulo aproximado ao ângulo de visão representado pelo artista. O local, que na década de
1970 também sofreu alterações decorrentes da construção do aterro da Baía Sul, apresenta
hoje em frente ao prédio da Alfândega, uma grande praça com quiosques de venda de
cerâmica, bancos para sentar e um lago com chafariz. O antigo cais foi transformado num
ponto de encontro da população. Na década de 1980, como mostra a figura 09, o local
abrigava um enorme estacionamento.
Para dialogar com a obra de Martinho, foi escolhido o trabalho Metamorphosis I, de
M.C. Escher (figura 17). Como o próprio título sugere, a imagem representa figuras em
processo de transformação. Uma figura humana estilizada que se transforma em figuras
geométricas planas, aos poucos assume a aparência tridimensional de cubos, que dão origem a
uma cidade à beira mar.
O uso da geometria foi uma constante no trabalho de Escher. Vários trabalhos
apresentam a divisão de planos em figuras geométricas que se repetem, se refletem e se
transformam umas nas outras. Assim como Magritte, Escher desenvolveu muitos trabalhos
usando a ilusão de ótica. Também não estava interessado na representação da realidade, ao
contrário, criava mundos impossíveis, muito parecidos com o mundo real, repleto de ilusões
espaciais que confundem a percepção.
O primeiro passo para a realização do segundo trabalho foi o isolamento, na imagem
original da obra de Martinho de Haro, das figuras do Mercado Público, do prédio da
Alfândega e das torres da Igreja São Francisco. Mais uma vez, optou-se pela apropriação de
outras figuras além do Mercado, por ainda existirem na paisagem atual (ANEXO D).
42
O principal ponto de partida para a construção de um novo cenário foi o espelho
d‟água presente na obra de Martinho. O espelho d‟água pode ser compreendido como um
elemento que representa uma relação íntima de um povo com o seu lugar de origem, e por
isso reflete toda a sua formação cultural em decorrência dessa experiência de vida.
O fato de a cidade ter se originado de um povoado localizado numa ilha reforça essa
estreita relação com o mar, importante para a realização de atividades básicas ligadas à
alimentação e ao transporte. A chegada do progresso, a construção das pontes e dos aterros, o
desaparecimento de diversos exemplares do casario colonial, tudo isso causou profundas
transformações no modo de vida dos cidadãos de Florianópolis. Aos poucos a relação com o
mar se quebrou, e pode-se dizer que todo esse processo provocou certa perda de identidade da
cidade com o seu povo.
Com base nessas ideias, construiu-se um cenário fragmentado, como um espelho
quebrado que reflete a paisagem apenas em partes. Junto aos cacos de espelho, observam-se
pedaços em tons de cinza, que se unem e formam um conjunto de prédios que contrastam com
a antiga imagem da cidade. Optou-se pelo fundo preto para destacar os elementos de valor
histórico e cultural.
A relação com o trabalho de Escher pode ser identificada na divisão do espaço por
formas geométricas, porém de forma aleatória. A imagem refletida nos cacos do espelho
representa a parcela de responsabilidade dos monumentos arquitetônicos com a formação da
identidade de uma cidade. O resultado está representado pela figura 24.
Figura 24 – Intervenção II. Fonte: Autora (2011).
43
2.5.6 – Intervenção III
Para o terceiro e último trabalho foi tomada como referência principal a obra Mercado
Público (figura 15), de Martinho de Haro. O primeiro passo nesse trabalho também foi o
isolamento das figuras. Nesse caso em particular, optou-se por apropriar-se não só da imagem
do Mercado, mas de toda a representação do casario, e também de outros elementos
significativos como os barcos, o automóvel, a charrete e o Miramar (ANEXO D).
Nessa composição de Martinho, percebe-se a presença discreta de elementos da
modernidade como os prédios e o automóvel. Como em outras obras, a força da imagem está
na representação do céu em conjunto com a água do mar, numa perfeita harmonia. Para
dialogar com essa imagem foi escolhida como referência visual a obra Piazza d’Italia (figura
18) de Giorgio de Chirico.
De Chirico é conhecido na história da arte como criador da pintura metafísica, junto
com Carlo Carrá, em Ferrara, na Itália. Sua paisagem é melancólica e enigmática e reflete a
atitude do artista de negação ao tempo presente e à realidade moderna. Segundo o Itaú
Cultural15
, De Chirico se colocava contrário ao movimento futurista que ansiava pela
aceleração do tempo e pela transformação da sociedade. O artista buscava algo além da
realidade. Seus cenários com torres, monumentos e praças, constroem paradoxalmente
espaços vazios e misteriosos. Argan (1992, p. 496) descreve o espaço na representação
metafísica de De Chirico como “pura figura perspectiva, profundidade sem capacidade,
intransitável e inabitável. As cores são quentes e profundas, mas duras e como que
solidificadas nos objetos; a luz é intensa e imóvel, sem vibrações nem raios”.
A paisagem enigmática criada por De Chirico foi a base para a criação do terceiro
cenário. Procurou-se reproduzir o estilo da pintura metafísica de De Chirico com o intuito de
criar um ambiente que transmitisse a mesma sensação de vazio presente na obra original.
Depois do isolamento das figuras, traçou-se o limite entre o chão e o céu. Em seguida
foi feito o desenho das sombras dos barcos e das construções. Nesse momento optou-se por
fazer uma referência ao Monumento Miramar (ANEXO C), por meio de uma representação
simbólica de suas colunas perdidas na paisagem. Foi acrescentado então o efeito de luz, pelo
rebaixamento da luminosidade do conjunto representativo do casario.
15
ENCICLOPÉDIA Itaú Cultural. Artes Visuais. Pintura Metafísica. Disponível em: <
http://www.itaucultural.org.br/aplicexternas/enciclopedia_ic/index.cfm?fuseaction=termos_texto&cd_verbete=8
90&lst_palavras=&cd_idioma=28555&cd_item=8>. Acesso em: 10 jun. 2011.
44
Uma comparação com a obra original de Martinho revela a transformação de uma
paisagem viva em um cenário inerte, com barcos e colunas perdidos num conjunto que perdeu
totalmente o seu sentido de ser. A paisagem parece representar um instante de incerteza entre
o que passou e o que virá a seguir. Ou seja, a sensação de vazio e perda de identidade causada
pela descaracterização da paisagem, e a impotência diante dessa situação. O resultado pode
ser observado na figura 25.
Figura 25 – Intervenção III. Fonte: Autora (2011).
As três Intervenções envolveram processos criativos semelhantes. Em cada uma delas
procurou-se analisar quais elementos poderiam ser apropriados além da figura do Mercado.
Comparando-se as imagens antigas e atuais da cidade, tomou-se a decisão de manter aqueles
elementos que continuam presentes no conjunto urbano do Centro Histórico. Com isso, essas
construções ganharam destaque no desenho dos novos cenários como elementos de
importância histórica e cultural, propondo uma reflexão sobre a percepção visual que se tem
hoje da cidade, e quais elementos presentes no contexto atual estão diretamente ligados às
origens do povoado de Nossa Senhora do Desterro, hoje cidade de Florianópolis.
45
3 – CONCLUSÃO
A realização desse trabalho possibilitou, em primeiro lugar, uma compreensão maior
sobre processo criativo e suas implicações. Ficou claro que a criação visual não depende
apenas de momentos de inspiração, mas está diretamente ligada ao estudo mais aprofundado
de tudo que se relacione ao tema proposto, e que seja considerado relevante no decorrer do
processo em busca de um resultado satisfatório.
A pesquisa histórica sobre o Mercado e sobre a cidade foi de grande relevância para o
processo de criação, pois tornou possível conhecer as razões que levaram a cidade a sofrer
profundas transformações, o que resultou na alteração da percepção visual do espaço urbano.
O conhecimento histórico, o acesso às fotografias antigas e o contato diário com a região do
Centro Histórico proporcionou um exercício de olhar para a cidade de uma forma diferente,
numa atitude de reconhecer o valor artístico, histórico e cultural de tudo que não foi destruído.
Um olhar em busca de elementos que pudessem representar o sentimento de perda com o
afastamento do mar e o desaparecimento da maior parte das construções coloniais.
A pesquisa por referências visuais me levou a ter contato com a obra de Martinho de
Haro, e me fez compreender melhor esse sentimento, explícito na opção do artista por retratar
variações de uma paisagem que já não existia.
Apropriar-se de elementos presentes das imagens de Martinho de Haro, apagando
literalmente o seu entorno e desenhando sobre ele versões de uma nova paisagem representou
para mim, uma atitude que corresponde ao processo real de descaracterização do Centro
Histórico.
O contato com a história da arte me fez reconhecer na obra de outros artistas modernos
a referência ao tema urbano, na representação das cidades e na expressão de sentimentos
diversos decorrentes da experiência da modernidade, o que foi uma referência teórica e visual
importante.
Todos esses fatores foram fundamentais para o desenvolvimento do processo criativo,
contribuindo para a elaboração cuidadosa das composições, de forma que pudessem ser
compreendidas como uma visão muito própria do que significa para mim, a descaracterização
da cidade.
Todo esse processo contribuiu para que os resultados atingissem seus objetivos iniciais
de representação do espaço urbano atual de Florianópolis, propondo uma reflexão sobre os
significados das transformações ocorridas em decorrência da modernização da cidade.
46
4 – REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
ESCHER, Maurits Cornelis. Gravuras e Desenhos. Tradução: Maria Odete Gonçalves-
Koller. Taschen, 2002.
ARGAN, Giulio Carlo. A História da Arte como História da Cidade. São Paulo: Martins
Fontes, 1998.
ARGAN, Giulio Carlo. Arte Moderna. Tradução: Denise Bottmann e Frederico Carotti. São
Paulo: Companhia das Letras, 1992.
CAVALCANTI, Carlos. Como entender a pintura moderna. 5ª edição. Rio de Janeiro: Ed.
Rio, 1981.
CORRÊA NETO, Yilmar; PRADE, Péricles. A Florianópolis de Martinho de Haro.
Florianópolis: Tempo Editorial, 2007.
ENCICLOPÉDIA Itaú Cultural. Artes Visuais. Termos e Conceitos. Apropriação.
Disponível em:
<http://www.itaucultural.org.br/aplicexternas/enciclopedia_ic/index.cfm?fuseaction=termos_t
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2011.
ENCICLOPÉDIA Itaú Cultural. Artes Visuais. Termos e Conceitos. Modernismo no Brasil
Disponível em:
<http://www.itaucultural.org.br/aplicexternas/enciclopedia_ic/index.cfm?fuseaction=termos_t
exto&cd_verbete=359&lst_palavras=&cd_idioma=28555&cd_item=8>. Acesso em: 20 mai.
2011.
ENCICLOPÉDIA Itaú Cultural. Artes Visuais. Pintura Metafísica. Disponível em
<http://www.itaucultural.org.br/aplicexternas/enciclopedia_ic/index.cfm?fuseaction=termos_t
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2011.
FARTHING, Stephen. 501 Grandes Artistas. Rio de Janeiro: Sextante, 2009.
FRANSCINA, Francis et al. Modernidade e Modernismo. A Pintura francesa no século
XIX. São Paulo: Cosac e Naify Edições, 1998.
KUSTER, E. M. P. A cidade na história da arte: a dimensão artística do espaço urbano
em diferentes momentos históricos. In: I Seminário Arte & Cidade, 2006, Salvador - BA. I
Seminário Arte & Cidade, 2006. Disponível em: <http://pt.scribd.com/doc/7017058/A-
Cidade-Na-Historia-Da-Arte-Kuster>. Acesso em: 21 abr. 2011.
MAKOWIECKY, Sandra. História e Cultura Visual em Martinho de Haro - um
modernista singular. In: XIII Encontro de História Anpuh- Rio, 2008. Disponível em:
<http://www.encontro2008.rj.anpuh.org/resources/content/anais/1211932463_ARQUIVO_An
puh-2008Sandramakowiecky-MartinhodeHarofinal.pdf>. Acesso em: 12 mai. 2011.
47
MALLMANN, Regis. Os passos do maior pintor brasileiro do século XIX entre Desterro,
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<http://www.museuvictormeirelles.org.br/artista/regis_mallmann.htm>. Acesso em: 30 abr.
2011.
MARTINHO de Haro. A cidade reinventada. Da série alma de artista. Direção e roteiro:
Chico Pereira. Produção: Bruno Vieira da Cunha. Realização: Fundação Cultural de
Florianópolis Franklin Cascaes e Prefeitura de Florianópolis. Florianópolis: 2007. DVD.
MATTOS, Tarcísio (Org.); CORRÊA NETO, Ylmar; ANDRADE FILHO, João Evangelista.
Martinho de Haro. 1907-1985. Edição comemorativa do centenário de nascimento do
artista. Florianópolis: Tempo Editorial, 2007.
MENEZES DE FARIA, Priscilla; CHEREM, Rosangela Miranda. Permanência e deriva: o
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desdobramentos na Arte Contemporânea. Revista Digital Art& - ISSN 1806-2962 - Ano VI -
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Acesso em: 26 mai. 2011.
RODRIGUES, Ana Paula Dias. Lygia Fagundes Telles e René Magritte: diálogos entre
textos e telas. 2010. 125f. Dissertação (Mestrado em Teoria da Literatura). Universidade
Estadual Paulista, São José do Rio Preto, 2010. Disponível em:
<http://www.athena.biblioteca.unesp.br/exlibris/bd/brp/33004153015P2/2010/rodrigues_apd_
me_sjrp.pdf>. Acesso em: 03 jun. 2011.
SIQUEIRA, Vera Beatriz. Destino da arte: arte e cultura no mundo moderno e
contemporâneo. Curso de Especialização em Artes Visuais: Cultura e Criação. Rede EaD
SENAC. Disponível em:
<http://senac.eduead.com.br/ead2010/mod/resource/view.php?inpopup=true&id=74065>.
Acesso em 17 mai. 2011.
48
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Beauty. Disponível em:
<http://www.metmuseum.org/special/john_baldessari/view_1.asp?item=19>. Acesso em: 01
jun. 2011.
VAZ, Nelson Popini. O Centro Histórico de Florianópolis. Espaço Público do Ritual.
Florianópolis: FCC Ed.,/ Ed. Da UFSC, 1991.
VEIGA, Eliane Veras da. Florianópolis - Memória Urbana. Florianópolis: Editora da UFSC
e Fundação Franklin Cascaes, 1993.
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS DAS IMAGENS
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http://www.claudemonetgallery.org/The-Pont-De-L-Europe--Saint-Lazare-Station.html,
acesso em 06 jun. 2011.
ERNST LUDWIG KIRCHNER. Nollendorfplatz (1912). Disponível em:
http://www.stadtmuseum.de/php/sammlungen/sreb.php?id=238, acesso em 06 jun. 2011.
ERNST LUDWIG KIRCHNER. Cena de Rua Berlinense (1913). Disponível em:
http://images.artnet.com/images_US/magazine/features/huttenlauch/huttenlauch11-7-1.jpg,
acesso em 06 jun. 2011.
GIORGIO DE CHIRICO. Methaphisical Interior with Hand of David (1968).
Disponível em: http://www.fondazionedechirico.it/en/1960-70, acesso em 06 jun. 2011.
GIORGIO DE CHIRICO. Piazza d‟Italia (1913). Disponível em:
http://www.abcgallery.com/C/chirico/chirico10.html, acesso em 06 jun. 2011.
GUSTAVE CAILLEBOT. A Ponte da Europa (1876). Disponível em:
http://www.gustavcaillebotte.org/The-Pont-Du-Europe.html, acesso em 06 jun. 2011.
JOHN BALDESSARI. The Duress Series: Person Climbing Exterior Wall of Tall Building /
Person on Ledge of Tall Building / Person on Girders of Unfinished Tall Building (2003).
Disponível em: http://www.metmuseum.org/special/john_baldessari/view_1.asp?item=19,
acesso em 01 jun. 2011.
M.C. ESCHER. Metamorphosis I (1937). Disponível em: http://www.mcescher.com/, acesso
em 06 jun. 2011.
RENÉ MAGRITTE. Le Blanc-seing (1965). Disponível em:
http://obviousmag.org/archives/2006/03/rene_magritte_1.html, acesso em 06 jun. 2011.
VICTOR MEIRELLES. Vista do Desterro (1851). Disponível em:
http://www.museuvictormeirelles.org.br, acesso em 30 abr. 2011.
49
ANEXO A – Levantamento fotográfico: Mercado Público – Espaço interno
50
51
52
ANEXO B – Levantamento fotográfico: A região do Mercado vista do aterro da Baía Sul
53
54
ANEXO C – Monumento Miramar
55
ANEXO D – Intervenções I, II e III – Etapas de desenvolvimento.
Intervenção I - 1 – Referência visual
Intervenção I - 2 – Máscara e traços do cenário
56
Intervenção I - 3 – Referência visual
Intervenção I - 4 – Trabalho finalizado
57
Intervenção II - 1 – Referência visual
Intervenção II - 2 - Máscara
58
Intervenção II - 3 – Referência visual
Intervenção II - 4 – Trabalho finalizado
59
Intervenção III - 1 – Referência visual
Intervenção III - 2 - Máscara
60
Intervenção III - 3 – Referência visual
Intervenção III - 4 – Trabalho finalizado

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Uma nova visão sobre o Mercado Público de Florianópolis

  • 1. I SENAC EDUCAÇÃO A DISTÂNCIA PÓS-GRADUAÇÃO LATO SENSU EM ARTES VISUAIS, CULTURA E CRIAÇÃO MAKALI ANDREZZO MERCADO PÚBLICO DE FLORIANÓPOLIS UM NOVO OLHAR SOBRE A PAISAGEM DE MARTINHO DE HARO FLORIANÓPOLIS 2011
  • 2. II MAKALI ANDREZZO MERCADO PÚBLICO DE FLORIANÓPOLIS UM NOVO OLHAR SOBRE A PAISAGEM DE MARTINHO DE HARO Trabalho de Conclusão de Curso de Pós- Graduação apresentado à banca examinadora da SENAC Educação a Distância como requisito parcial para a obtenção do título de Especialista em Artes Visuais: Cultura e Criação. Orientadora: FERNANDA MARIA TRENTINI CARNEIRO FLORIANÓPOLIS 2011
  • 3. III MAKALI ANDREZZO MERCADO PÚBLICO DE FLORIANÓPOLIS UM NOVO OLHAR SOBRE A PAISAGEM DE MARTINHO DE HARO Trabalho de Conclusão de Curso de Pós- Graduação apresentado à banca examinadora da SENAC Educação a Distância como requisito parcial para a obtenção do título de Especialista em Artes Visuais: Cultura e Criação. Aprovado em 07 de julho de 2011. BANCA EXAMINADORA _____________________________________________ Profª. MSc. Fernanda Maria Trentini Carneiro - Orientadora SENAC EDUCAÇÃO A DISTÂNCIA _____________________________________________ Profº. Esp. Luis Fernando Keller Albalustro - Examinador SERVIÇO NACIONAL DE APRENDIZAGEM COMERCIAL Departamento Regional de Santa Catarina _____________________________________________ Profª. MSc. Lidiane Goedert – Representante Institucional SENAC EDUCAÇÃO A DISTÂNCIA
  • 4. IV A todos que colaboram de alguma forma com a preservação da memória visual de Florianópolis.
  • 5. V AGRADECIMENTOS Às tutoras Brígida, Lucila e Fernanda, por terem nos acompanhado de perto em todos os momentos, fazendo-nos sentir próximos mesmo à distância. À tutora Fernanda, pela orientação. Aos colegas, por terem compartilhado suas experiências e conhecimentos.
  • 6. VI RESUMO Este trabalho parte de um estudo sobre fatores históricos que levaram à descaracterização do Centro Histórico de Florianópolis e alteraram a percepção visual do espaço urbano na região do Mercado Público, no período compreendido entre 1851 (data de inauguração do primeiro Mercado) até os dias atuais. O trabalho propõe, com base no estudo da representação das cidades pela arte moderna e contemporânea, a criação de três imagens que representam sensações diante da paisagem urbana atual. A partir da apropriação de três obras de Martinho de Haro que retratam o Mercado Público, o trabalho propõe como processo de criação, um diálogo entre Martinho de Haro e outros três artistas: René Magritte, M.C. Escher, e Giorgio de Chirico. Palavras-chave: Mercado Público de Florianópolis; Martinho de Haro; Apropriação.
  • 7. VII ABSTRACT This paper uses as a reference a study on historical factors that led to the mischaracterization of the historic center of Florianopolis and the altered visual perception of urban space in the region of the Public Market for the period between 1851 (date of opening of the first market) until the present day. The paper proposes, based on the study of the representation of cities by modern and contemporary art, creating three images that represent feelings on the current urban landscape. From the ownership of three works of Martinho de Haro portraying the Public Market, the paper proposes the creation process as a dialogue between Martinho de Haro and three other artists: René Magritte, M.C. Escher and Giorgio de Chirico. Key words: Public Market of Florianópolis; Martinho de Haro; Ownership.
  • 8. VIII LISTA DE FIGURAS FIGURA 01: Praça Fernando Machado, século XIX ....................................................... 15 FIGURA 02: Victor Meirelles. Vista do Desterro (1851) ................................................ 16 FIGURA 03: Trapiche Municipal, 1922. Início das obras do Miramar ............................16 FIGURA 04: Miramar, sem data....................................................................................... 17 FIGURA 05: Mercado Novo, 1914 .................................................................................. 17 FIGURA 06: Mercado Novo, 1928 .................................................................................. 18 FIGURA 07: Prédio da Alfândega, 1960 ......................................................................... 19 FIGURA 08: Miramar, Mercado e Ponte, sem data ......................................................... 20 FIGURA 09: Área Central, 1985 ......................................................................................21 FIGURA 10: Gustave Caillebot. A ponte da Europa (1876) ........................................... 26 FIGURA 11: Claude Monet. A ponte da Europa (1877) ................................................. 27 FIGURA 12: Ernst Ludwig Kirchner. Berlin Street Scene (1913) .................................. 28 FIGURA 13: Ernst Ludwig Kirchner. Nollendorfplatz (1912) ........................................ 28 FIGURA 14: Martinho de Haro. Mercado Público (1970-1975) ..................................... 30 FIGURA 15: Martinho de Haro. Mercado Público (1975-1980) ..................................... 31 FIGURA 16: Martinho de Haro. Largo da Alfândega com ocaso violeta (1980-1985) ................................................................................................ 31 FIGURA 17: M.C. Escher. Metamorphosis I (1937) ........................................................32 FIGURA 18: Giorgio de Chirico. Piazza d’Italia (1913) .................................................32 FIGURA 19: René Magritte. Le Blanc-sign (1965) ......................................................... 33 FIGURA 20: Giorgio de Chirico. Methaphisical Interior with hand of David (1968) .......................................................................................... 35 FIGURA 21: John Baldesari. The Duress Series: Person Climbing Exterior Wall of Buiding/ Person on Large of Tall Building/ Person on Girders of Unfinished Tall Building (2003) ............................................... 35
  • 9. IX FIGURA 22: Estudo preliminar ....................................................................................... 38 FIGURA 23: Intervenção I ............................................................................................... 40 FIGURA 24: Intervenção II ..............................................................................................42 FIGURA 25: Intervenção III .............................................................................................44
  • 10. X SUMÁRIO 1 INTRODUÇÃO .................................................................................................... 11 2 DESENVOLVIMENTO PRÁTICO E TEÓRICO............................................ 14 2.1 O Mercado Público de Florianópolis................................................................... 14 2.2 Mudanças na paisagem urbana do Centro Histórico ........................................19 2.3 A Florianópolis de Martinho de Haro................................................................. 22 2.4 A modernidade.......................................................................................................25 2.5 O processo criativo ............................................................................................... 29 2.5.1 Referências visuais............ ..................................................................................... 29 2.5.2 Recursos técnicos ........... ....................................................................................... 36 2.5.3 Estudo preliminar ............ ...................................................................................... 37 2.5.4 Intervenção I ......... .................................................................................................38 2.5.5 Intervenção II ..........................................................................................................40 2.5.6 Intervenção III ........................................................................................................ 43 3 CONCLUSÃO........................................................................................................45 4 REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS ............................................................... 46 ANEXOS ANEXO A – Levantamento fotográfico: Mercado Público – Espaço interno ....... 49 ANEXO B – Levantamento fotográfico: A região do Mercado vista do aterro da Baía Sul................................................................. 52 ANEXO C – Monumento Miramar ........................................................................54 ANEXO D – Intervenções I, II e III – Etapas de desenvolvimento ....................... 56
  • 11. 1 – INTRODUÇÃO Toda cidade tem o seu mercado público municipal, onde é possível encontrar todo tipo de mercadoria. Geralmente vendem-se produtos típicos do lugar, como produtos exóticos, artesanatos, suvenir, e principalmente mantimentos, dos mais variados: de temperos até animais vivos para o abate (como galinhas e leitões), passando por doces caseiros, frutas e verduras fresquinhas. Os mercados têm suas particularidades, pois constituem ambientes muito próprios dos lugares onde se encontram. Ali trabalham e circulam pessoas nativas e habitantes da região e seu modo muito específico de viver e de ver o mundo. Estão representados ali elementos específicos como a geografia, que está diretamente ligada à produção agrícola da região, objetos representativos de crenças, costumes alimentares, enfim, valores subjetivos que representam a essência cultural de um lugar. No entanto, nenhum mercado é igual ao outro, apesar de muitas características comuns. Em Florianópolis não é diferente. Também temos o nosso mercado, onde o produto principal é o pescado: peixes diversos e frutos do mar frescos, trazidos por pescadores dos arredores da ilha e das cidades vizinhas. Além das peixarias, há também bares e restaurantes típicos, famosos por seus petiscos que atraem tanto os ilhéus e habitantes da ilha, quanto os turistas na alta temporada de verão. Os demais boxes oferecem diversos produtos, como roupas, sapatos, acessórios, filhotes de animais, aviamentos, utensílios para cozinha, entre outros. A região do Mercado Público de Florianópolis sofreu várias transformações ao longo da história. Transformações estas decorrentes do crescimento desordenado da cidade e da descaracterização do Centro Histórico. Mas o esforço dos comerciantes fez com que o Mercado continuasse ativo como fonte de consumo de peixes e outros produtos, como referência na gastronomia e local de lazer. A construção, localizada à Rua Conselheiro Mafra tem pouco mais de cem anos, mas já é uma tradição na cidade. Assim como a ponte Hercílio Luz, a Praça XV e a Catedral, o Mercado Público também se tornou um símbolo de Florianópolis. A sua arquitetura preservada contrasta com o seu entorno, cercado de avenidas e prédios modernos. Mesmo não estando mais tão perto do mar, ainda conserva a tradição da venda do pescado. O conjunto das atividades realizadas no Mercado é a razão de sua existência, e este é um dos fatores que contribui para que a cidade não perca a sua identidade.
  • 12. 12 A preservação do Mercado Público, tanto no seu aspecto funcional, quanto como elemento visual de valor contemplativo de destaque no Centro Histórico, foi o que motivou a escolha desse espaço específico para a realização de uma pesquisa visual sobre a percepção do espaço urbano. A comparação entre imagens antigas e atuais da cidade foi fundamental para revelar diferenças marcantes de percepção desse mesmo espaço em diferentes épocas. Por isso, com o intuito de propor uma reflexão sobre as sensações provocadas diante dessas transformações do espaço físico da cidade, foi realizado um trabalho de criação visual baseado na percepção do espaço urbano atual de Florianópolis. Num primeiro momento foi realizado um estudo sobre a história do Mercado desde sua inauguração em 1851 até os dias atuais, contextualizando o Mercado Público na história da cidade e no processo de transformação do Centro Histórico. Num segundo momento, buscaram-se na memória visual da cidade, as paisagens de Martinho de Haro, realizando-se um breve histórico do artista, algumas considerações sobre a importância de sua obra, e sua íntima relação com a paisagem de Florianópolis. Em seguida, realizou-se um estudo das cidades como tema na história da arte moderna e contemporânea, o que levou a uma reflexão sobre a relação dos artistas com a representação da paisagem urbana, no contexto da modernidade. O processo criativo, fundamentado nessas referências teóricas, se deu na prática propondo um diálogo entre Martinho de Haro e outros três artistas da modernidade: René Magritte, Giorgio de Chirico e M.C. Escher. Do conjunto de obras de Martinho, foram tomadas como principais referências visuais três obras que representam a região do Mercado Público antes da chegada do progresso. Por meio da estratégia da apropriação, as imagens de Martinho foram modificadas de acordo com uma nova leitura visual da paisagem, que dialoga com as ideias e com os estilos dos outros três artistas. Procurou-se dessa forma representar possíveis sensações diante da paisagem transformada. Os resultados visuais ao final do trabalho foram motivados principalmente pelo conceito de estranhamento diante da descaracterização da paisagem urbana, o que impôs mudanças nas relações entre a cidade e seus habitantes. Fragmentação, descontinuidade e contraste também foram conceitos trabalhados, percebidos diante da invasão de elementos da modernidade que passaram a dividir o mesmo espaço com alguns exemplares do antigo casario colonial. Sem relação entre si, passaram a formar um conjunto desarmônico e confuso. Esses conceitos começaram a se formar ainda na fase da pesquisa histórica, e foram confirmados no estudo comparativo das imagens da cidade ao longo de sua existência.
  • 13. 13 Ao final foram apresentados os três resultados visuais do desenvolvimento desse trabalho e algumas considerações sobre o do processo criativo de cada um.
  • 14. 14 2 – DESENVOLVIMENTO PRÁTICO E TEÓRICO 2.1 - O Mercado Público de Florianópolis No espaço urbano da cidade o Mercado se destaca como ponto de referência. Para a maioria das pessoas o seu significado está relacionado com a sua função principal que é a comercialização de produtos, caracterizando uma atitude ativa com relação ao Mercado. Uma atitude contemplativa, voltada para uma apreciação estética do lugar valoriza o Mercado dentro do espaço visual da cidade, mesmo diante das transformações ocorridas no crescente processo de urbanização. Argan explica a relação entre função e valor dos dados visuais das cidades tomando como exemplos uma estação de trem e o Coliseu, em Roma: A estação continua sendo o que é; minha atitude é que muda, e a atitude contemplativa faz parte da existência e é modo de experiência tanto quanto a atitude ativa. Isso explica porque uma arquitetura pode conservar o valor estético inclusive quando cessa sua funcionalidade objetiva – como o Coliseu, justamente, que conservou e talvez até aumentou seu valor estético, embora já não sirva para os espetáculos do circo. (ARGAN, 1998, p. 229). Um bom exemplo dentro de Florianópolis, compartilhando a ideia de Argan de relação entre função e valor, seria a Ponte Hercílio Luz. Mesmo desativada ainda é mantida por seus valores estético, histórico e cultural. Dentre as demais construções históricas ainda existentes, apenas algumas como o Mercado Público, continuam cumprindo sua função de origem. Mas em sua maioria, assumiram funções e significados diversos ao longo do tempo, completamente diferentes aos que foram destinadas quando construídas. Considerado um marco histórico-cultural importante no desenvolvimento de Florianópolis, sua estrutura preservada se justifica por ser um monumento que faz parte da história dos antigos moradores da ilha. Mascates, oleiros, pescadores e colonos se aglomeram desde os meados de 1700 na região em frente à Catedral. Favorecidos pelo fácil desembarque no porto existente e a proximidade com a população, criam na praia defronte à praça o ponto ideal para o comércio. Em barracas, ou mesmo vendendo seus produtos nas canoas, os feirantes atendem não só aos habitantes, como também aos viajantes. (MESQUITA, 2002, p. 17).
  • 15. 15 A necessidade de se organizar esse comércio deu origem à primeira edificação destinada aos feirantes, em 1851 na Praça do Mercado (figura 01), onde atualmente é a Praça Fernando Machado. Figura 01 – Praça Fernando Machado, século XIX. Fonte: Acervo Casa da Memória de Florianópolis. A antiga Florianópolis dessa mesma época foi tema das primeiras pinturas do artista catarinense Victor Meirelles (1832-1903). Na descrição de Mallmann1 sobre a paisagem em que cresceu o artista, a vila não era na época maior do que a maioria das cidades coloniais, com um casario possível de se contar num dia, ruas de terra batida e um ritmo social e cotidiano compatível com um núcleo urbano fincado numa ilha distante menos de um quilômetro do território continental. Na tela Vista do Desterro (figura 02), Victor Meirelles retratou o panorama do centro da cidade em 1851, onde podemos observar à direita as torres da Igreja da Ordem Terceira de São Francisco da Penitência, construída em 1802 na esquina da rua Deodoro com a rua Felipe Schmidt, próxima à rua Conselheiro Mafra, onde em 1899, seria construída a primeira ala do novo prédio destinado ao Mercado. 1 MALLMANN, Regis. Os passos do maior pintor brasileiro do século XIX entre Desterro, Paris e o Rio de Janeiro. Disponível em: <http://www.museuvictormeirelles.org.br/artista/regis_mallmann.htm>. Acesso em: 30 abr. 2011.
  • 16. 16 Figura 02 - Victor Meirelles. Vista do Desterro (1851). Disponível em: <http://www.museuvictormeirelles.org.br>, acesso em 30 abr. 2011. O Mercado antigo tornou-se insuficiente para comportar os comerciantes e os compradores, e seria então demolido no ano de 1896 depois de 45 anos em funcionamento. No mesmo local, como relata Veiga (1993), seria aberta a pracinha que receberia a estátua do coronel Fernando Machado, em frente ao Largo da Matriz e próximo ao Trapiche Municipal. Este, usado como um dos pontos de desembarque no centro da cidade, que até então tinha como principal meio de comunicação com o continente, pequenas embarcações que transportavam animais, cargas e pessoas. No ano de 1928, em substituição ao antigo Trapiche Municipal, seria inaugurado o elegante Bar Miramar (figuras 03 e 04). Figura 03 – Trapiche Municipal, 1922. Início das obras do Miramar. Fonte: Acervo Casa da Memória de Florianópolis.
  • 17. 17 Figura 04 – Miramar, sem data. Fonte: Acervo Casa da Memória de Florianópolis. A primeira ala do novo Mercado (figura 05), inaugurada em 1899, foi construída à rua Conselheiro Mafra, entre as atuais ruas Deodoro e Jerônimo Coelho, tendo uma de suas extensões toda voltada para o mar, unida a este por um alpendre. Figura 05 – Mercado Novo, 1914. Fonte: Acervo Casa da Memória de Florianópolis.
  • 18. 18 Em 1931 foi inaugurada a ampliação do Mercado com o objetivo de atender melhor ao público e dar melhores condições de trabalho aos comerciantes. O conjunto foi ganhando aos poucos a aparência atual (figura 06), como relata Veiga: Em 1928, na administração Heitor Blum, foi edificado, pelo lado do cais, mais um edifício, semelhante à primeira ala, e ligado a ela por duas pontes construídas sobre torreões, que compensavam a horizontalidade dos longos pavilhões. Ao centro dos dois blocos formou-se um pátio sobre o leito interrompido da rua Francisco Tolentino. (VEIGA, 1993, p. 284). Figura 06 – Mercado Novo, 1928. Fonte: Acervo Casa da Memória de Florianópolis. Na região hoje conhecida como Largo da Alfândega, ao lado do Mercado Público, encontra-se, nas palavras de Veiga, “o melhor exemplar da arquitetura neoclássica na capital” (VEIGA, 1993, p. 278). Trata-se do edifício da Alfândega (figura 07), inaugurado em 18762 , para funcionamento do antigo posto de arrecadação e controle do fluxo de riquezas. O edifício se mantém até os dias atuais como ponto turístico e de vendas do artesanato local. 2 O atual edifício da Alfândega foi construído oito anos após a explosão da antiga Alfândega e Provedoria da Fazenda Real, situada na esquina da Praça XV de Novembro com a Rua Conselheiro Mafra. (VEIGA, 1993, p. 200).
  • 19. 19 Figura 07 – Prédio da Alfândega, 1960. Fonte: Acervo Casa da Memória de Florianópolis. 2.2 - Mudanças na paisagem urbana do Centro Histórico Até o início do século XX a paisagem do centro histórico era banhada pelo mar (figura 08) e Florianópolis mantinha certo ar de cidade do interior. O principal acesso à ilha era feito por embarcações. A cidade manteve essa característica até 1926, quando foi inaugurada a primeira ligação rodoviária entre ilha e continente, a Ponte Hercílio Luz. Vaz define o período que se inicia na década de vinte e se estende até os anos oitenta, como o período de “transformação da cidade pela passagem da dominância estrutural do modo de transporte marítimo para o rodoviário” (VAZ, 1991, p. 50).
  • 20. 20 Figura 08 – Miramar, Mercado e Ponte, sem data. Fonte: Acervo Casa da Memória de Florianópolis. Florianópolis perde então sua característica portuária gradativamente. No interior do Estado, uma nova rede de rodovias federais permite o transporte da produção agrícola para os grandes centros consumidores do país. Na cidade, as diversas obras urbanas do governo Hercílio Luz, como a construção da ponte pênsil e a instalação do aeroporto causam visível impacto, como relata Vaz: O impacto daquelas obras na cidade fez-se sentir nos alargamentos das vias de acesso à ponte, no crescimento da frota de veículos automotores, no adensamento das atividades concentradas junto ao porto e na intensificação da circulação nas áreas públicas do centro. (VAZ, 1991, p. 51) Segundo o mesmo autor, o processo de modernização, que engloba os avanços tecnológicos nos sistemas de transportes e de comunicações, incentivou o desenvolvimento do comércio e viabilizou a centralização dos serviços públicos em Florianópolis, introduzindo novos padrões de comportamento que se expressam na paisagem reconstruída do Centro Histórico. Os indícios mais evidentes da modernização expressos na arquitetura e no espaço urbano do Centro Histórico surgiram marcados em sua paisagem pelo intenso trabalho da construção civil. Eram a verticalização das edificações, a ocupação de todos os vazios, o avanço sobre o mar e as encostas, a
  • 21. 21 construção de grandes obras de infra-estrutura e transportes, etc. Também transpareceram mudanças nas atividades que a população exercia nessa área: o seu adensamento, a perda do sentido paroquial das relações sociais, a especialização em atividades comerciais, de serviços e gestão pública e o deslocamento da função residencial para fora do Centro Histórico. (VAZ, 1991, p. 48) A década de 1970 é marcada por grandes obras como o aterro da baía Sul, a ponte Colombo Sales e a Avenida Beira-Mar Norte. O avanço sobre o mar foi a opção para a construção de novas rodovias, que simbolizam progresso e desenvolvimento. Em 1973 o aterro chega ao Mercado Público, afastando-o do mar para sempre (figura 09). Em 1974 é demolido o Miramar3 . Trapiches, escadas e rampas que ligavam a cidade ao mar desapareceram, anulando a maritimidade desta região e provocando uma ruptura na relação das pessoas com o seu meio, que se reflete, por exemplo, nos hábitos e nas formas de produzir cultura. Atualmente, uma sensação de vazio se instala entre o Mercado Público e o mar. O espaço onde antes ficavam atracados os barcos é hoje ocupado por rodovias, viadutos, estacionamentos e terminais de transporte urbano. Figura 09 – Área central, 1985. Fonte: Acervo Casa da Memória de Florianópolis. 3 Em 2001 foi erguido o Memorial Miramar, no mesmo local do antigo bar e restaurante. O projeto do arquiteto Joel Pacheco mantém o desenho da planta baixa, e de acordo com Panariello (2007, p.27), a obra, que consiste em pilares perdidos no meio da Praça, representa uma leitura superficial de tudo que representou o velho trapiche na antiga Florianópolis.
  • 22. 22 O desenvolvimento do transporte rodoviário na ilha testemunhou o crescimento da atividade turística, principalmente no verão, quando pessoas procuram por lazer nas regiões de praias. Essa atividade favoreceu o centro da cidade, ampliando a demanda de comércio, serviços e lazer. O Mercado Público, diante de toda essa transformação urbana, mantém sua atividade econômica, sendo referência no comércio de pescados e frutos do mar. Além disso, mesmo com a concorrência de grandes redes de supermercados e vendas pela internet, mantém a tradição de oferecer vários outros tipos de produtos4 . É atualmente ponto de visitação turística, oferecendo também o conforto de bares e cafés que se destacam na gastronomia da ilha. Em 1984 foi inaugurado o Espaço Cultural Luiz Henrique Rosa, no vão central, destinado a exibições folclóricas, exposições de artesanato e apresentações musicais. O conjunto arquitetônico, conhecido cartão-postal da cidade, foi tombado como Patrimônio Histórico em 1984. De acordo com a Secretaria Executiva5 do município, “segundo a legislação de proteção do patrimônio histórico, o monumento deverá ser totalmente preservado, tanto nas suas características internas, como externas”. Diante do violento processo de transformação ocorrido no Centro Histórico de Florianópolis, existiram pessoas que se preocuparam em registrar a imagem da antiga cidade, que desaparecia a cada dia para dar lugar a prédios modernos e avenidas. O casario antigo próximo ao mar, e elementos particulares como as Igrejas, o Miramar, e o Mercado Público foram temas constantes nas paisagens retratadas por fotógrafos e representadas por artistas plásticos em suas pinturas. Essas pessoas foram fundamentais para que a cidade tivesse sua memória visual preservada para as gerações seguintes. 2.3 - A Florianópolis de Martinho de Haro Considerado um indiscutível memorialista da cidade de Florianópolis, Martinho de Haro nasceu em 1907, na cidade de São Joaquim, e morreu em 1985, em Florianópolis. Dedicou toda a sua vida ao trabalho artístico, deixando um conjunto de obras que representam nus femininos, naturezas mortas, retratos, paisagens, tipos e costumes de sua região. Sua primeira exposição individual foi em 1926, no Conselho Municipal de Florianópolis. 4 vide Anexo A. 5 PREFEITURA Municipal de Florianópolis. Secretaria Executiva. Serviços Públicos. Mercado Público. Disponível em: < http://portal.pmf.sc.gov.br/entidades/sesp/index.php?cms=mercado+publico&menu=0> Acesso em 26 maio 2011.
  • 23. 23 Seu talento o levou a ser premiado com duas bolsas de estudos. A primeira para a Escola Nacional de Belas Artes, no Rio de Janeiro, onde estudou de 1927 a 1937. A segunda o levou à Paris em 1938, para estudos na Academie de La Grand Chaumie. No exterior teve contato com os movimentos das vanguardas artísticas do início do século XX, convivendo com artistas e visitando museus e exposições. Devido à iminência da Primeira Guerra Mundial, teve sua viagem interrompida e voltou ao Brasil em 1939. No início da década de 1940 estabeleceu-se em Florianópolis, e iniciou uma estreita relação com a imagem da cidade, a qual captou em inúmeras composições que retratam vistas da cidade, o modo de vida e a cultura da ilha, manifestas em suas tradições. Sobre a técnica utilizada pelo artista, Mattos (2007) relata o uso de folhas de eucatex de ambos os lados, conforme a intenção de aproveitar a textura do material. Sobre o método, descreve: “De acordo com o costume pós-impressionista, desenvolvia as pinturas no ateliê, após anotações meticulosas que realizava fora. Vez por outra aventurou-se de barco pela Baía Sul para situar-se no ponto de vista desejado” (MATTOS, 2007, p. 47). Martinho de Haro testemunhou a progressiva desaparição dos monumentos arquitetônicos, mas ainda teve o privilégio de presenciar a beleza da cidade sem as intervenções trazidas pelo progresso. A Florianópolis desse tempo ficaria gravada para sempre na memória, e na obra do artista. O Mercado Público, o cais da rua Francisco Tolentino e o Largo da Alfândega, esses próximos ao Mercado, foram locais retratados pelo artista por repetidas vezes. De acordo com Menezes6 , essa repetição não significa uma preocupação em registrar a evolução urbana. Fazia parte da pesquisa plástica do artista, e de sua inquietação e busca por captar algo que lhe tivesse escapado. Algo além da forma externa visível, uma busca pela subjetividade. Ou como detalha Mattos: O que move Martinho parece-nos ser aquela inquietação que levou Cézanne a se deter na montanha de Santa Vitória ou o que levou Morandi a pintar garrafas durante toda sua vida: o desafio para que o pintor busque em seu reservatório criativo novos acordos cromáticos, novas organizações das correspondências espaciais, novas combinações dos esquemas arbitrários, novas curiosidades para as baquigráficas anotações da forma, novas ocasiões de inserção de seu leit-motiv: aquele cinza azulado que torna o céu emblemático, ainda que específico. (MATTOS, 2007, p. 44). 6 MENEZES DE FARIA, Priscilla; CHEREM, Rosangela Miranda. Permanência e deriva: o cais de Martinho de Haro. DAPesquisa. Revista de investigação em Artes - ISSN: 1808-3129 – Vol. 3, Nº 2, Ano 6 - Ago/2008 – Jul/2009. Disponível em: <http://www.ceart.udesc.br/revista_dapesquisa/volume4/numero1/plasticas/permanenciaederiva.pdf>. Acesso em: 19 mai. 2011.
  • 24. 24 Martinho consegue se manter fiel aos aspectos de verossimilhança sem se prender a detalhes da paisagem observada, o que reduziria sua obra a mera representação do real. Assim como Cézanne, “buscou extrair do objeto não sua superfície reconhecível, mas aquilo que pulsava, que era denso e vivo em um corpo.” (MENEZES DE FARIA, 2009, p.3). Artista considerado pertencente ao Modernismo Brasileiro, Martinho como outros modernistas seus contemporâneos se decidiu pela síntese, pela simplificação de formas e espaços. Seu geometrismo foi à maneira de Cézanne, buscando a pureza das formas e estabelecendo um diálogo com a aplicação das cores, diferente de outros modernistas brasileiros que usavam a geometria em busca da abstração. No que se refere à cor, Martinho se expressa por uma palheta reduzida. Amarelos, carmins, salmão, e cinzas de todos os matizes que unificam a composição cromática entre azuis e verdes. Suas paisagens serenas não revelam contrastes. “Opta pela matéria diluída não circunscrita por contornos, mas criadora de sensações construtivas de espaço-volume-cor, de acordo com o bom cezannismo.” (MATTOS, 2007, p.47). O artista tomou Florianópolis como seu tema favorito, buscando a impressão do instante de uma paisagem efêmera. Céu e mar são marcantes em suas paisagens, ora calmos, ora revoltos, estão em harmonia com os casarios e a presença discreta de pessoas nas ruas. Nesse sentido, de acordo com Makowiecky (2008) Martinho pode ser citado dentro do movimento Modernista no Brasil “pela busca de raízes culturais e étnicas e pelo regionalismo através do qual se procura o genuinamente brasileiro” (MAKOWIECKY, 2008, p.8). No entanto, não seguiu tendências. Foi fiel aos temas e procurou aprofundar-se em suas próprias formas de expressão plástica, o que fortaleceu sua poética pessoal. Segundo a Instituição Itaú Cultural7 , o movimento Modernista no Brasil tem como marco simbólico A Semana de Arte Moderna (São Paulo, 1922), que representa o rompimento com o tradicionalismo cultural associado às correntes literárias vigentes (simbolismo e parnasianismo) e à arte acadêmica. Participaram do evento, representantes da literatura e da música dentre os quais Mário de Andrade, Oswald de Andrade e Heitor Villa-Lobos; mas especialmente os participantes das artes plásticas, como Anita Malfatti e Di Cavalcanti, formam a base do movimento, que marcou um período de renovação estética, e busca por uma linguagem própria ligada à valorização do genuinamente brasileiro. Pode-se dizer que o movimento, que teve início em São Paulo e influenciou artistas em todo o Brasil, está 7 ENCICLOPÉDIA Itaú Cultural. Artes Visuais. Termos e Conceitos. Modernismo no Brasil Disponível em: < http://www.itaucultural.org.br/aplicexternas/enciclopedia_ic/index.cfm?fuseaction=termos_texto&cd_verbete=3 59&lst_palavras=&cd_idioma=28555&cd_item=8> Acesso em 20 maio 2011.
  • 25. 25 diretamente ligado ao desenvolvimento da cidade de São Paulo, sua industrialização e urbanização, e foi beneficiado artisticamente pelo contato estreito com as vanguardas artísticas europeias. 2.4 – A modernidade O Modernismo na história da arte surge no fim do século XIX no contexto da nova estrutura social e econômica gerada pela Revolução Industrial na Europa, evento que marca o início da modernidade. O progresso tecnológico transformava não só a economia e o modo de vida nas cidades, mas se fazia sentir também nas novas tendências artísticas. Segundo Argan (1992, p.187), os artistas buscavam uma arte em conformidade com sua época, o que invoca a renúncia aos modelos clássicos, tanto na temática como no estilo. A problemática sobre qual seria o papel da arte nesse novo contexto procura soluções através da liberdade de experimentação, da descoberta de novas linguagens que dialogassem com as experiências da vida moderna. O Impressionismo foi uma corrente artística do Modernismo que marcou uma nova relação entre a representação e o objeto, manifestando uma atitude sensitiva diante da realidade. Claude Monet, seu maior representante, dedicava-se a pesquisa sobre as variações cromáticas em decorrência da incidência da luz do sol na paisagem, em diferentes horas do dia ou épocas do ano. Seu estilo inovador rompeu radicalmente com as técnicas tradicionais de representação. Uma das características no modernismo de Monet, segundo Frascina (1993), é a ênfase nas questões técnicas e formais, o que distancia sua obra de uma representação crítica sobre a modernidade. Um exemplo citado pelo autor é a série de pinturas da cidade de Argenteuil, em que se percebe a decisão do artista por minimizar os sinais da industrialização, preferindo “deixar de fora a realidade contraditória da efêmera vida contemporânea no processo de modernização.” (FRASCINA, 1993, p.126). Nesse ponto pode-se traçar um paralelo com a representação de Martinho de Haro, no que se refere à opção do artista por minimizar os efeitos da modernização sobre a paisagem de Florianópolis. Percebe-se em sua obra a aparição discreta e gradual de prédios no conjunto urbano, dispostos de maneira harmônica na composição, sendo esse um dos poucos sinais dos tempos modernos. Talvez como Monet, Martinho tenha preferido expressar sua visão pessoal da paisagem, motivado pela dedicação ao estudo da cor, da forma e da composição.
  • 26. 26 No entanto, entre os pintores modernistas, a experiência da vida moderna despertava o interesse pela temática urbana. A Paris modernizada com suas grandiosas obras de engenharia surge nas telas do impressionista Gustave Caillebot (figura 10). O mesmo local é retratado também por Monet (figura 11). A comparação entre as duas imagens permite perceber que Monet, ao contrário de seu colega, dedica atenção maior à pintura do que ao próprio tema, considerado ousado para a época. Monet busca a sensação luminosa de um instante passageiro, no ambiente esfumaçado próximo à estação de trem. Enquanto os Impressionistas se dedicavam ao estudo dos efeitos da luz, Cézanne, o pai da pintura moderna, se aprofundava no estudo da forma e da cor buscando a sensação da estrutura e peso dos objetos, desintegrada pela pintura impressionista. Cézanne via o mundo como uma unidade de relações entre formas e cores. Segundo Cavalcanti (1981, p. 102), seus motivos podem ser considerados um pretexto para suas pesquisas pictóricas, pois não estava interessado em associar sua pintura a simbolismos, nem atribuir-lhes significados históricos. Ao reduzir as formas dos objetos e dos elementos da natureza a figuras geométricas básicas (cilindros, esferas e cones) Cézanne alcança a liberdade de interpretação da realidade, o que mais tarde iria abrir caminhos para o cubismo e para a abstração geométrica. Figura 10 - Gustave Caillebot. A ponte da Europa (1876). Disponível em: <http://www.gustavcaillebotte.org/The-Pont-Du-Europe.html>, acesso em 06 jun. 2011.
  • 27. 27 Figura 11 – Claude Monet. A ponte da Europa (1877). Disponível em: <http://www.claudemonetgallery.org/The-Pont-De-L-Europe--Saint-Lazare-Station.html>, acesso em 06 jun. 2011. As pesquisas de Cézanne e dos impressionistas levaram a arte moderna a romper com a função da representação da realidade. Esse rompimento se concretiza com o surgimento dos movimentos de vanguarda na Europa (início do século XX), em que os artistas deixam de imitar a realidade para fazer de sua arte um meio de expressão. De acordo com Siqueira, “com esse sentido de expressão pessoal, a arte passou a se interessar pela contribuição individual do artista. Não bastava o registro de uma realidade exterior, mas a presença de elementos interiores, de uma certa experiência sensível ou emocional que o artista transpunha para a sua obra” 8 . Um exemplo dessa “expressão pessoal” pode ser observado nas obras do expressionista Ernst Ludwig Kirchner “Nollendorfplatz”, de 1912 (figura 12) e “Cena de Rua Berlinense”, de 1913 (figura 13), esta citada por Kuster (2006, p.10). Segundo a autora, 8 SIQUEIRA, Vera Beatriz. Destino da arte: arte e cultura no mundo moderno e contemporâneo. Curso de Especialização em Artes Visuais: Cultura e Criação. Rede EaD SENAC. (p. 4). Disponível em: <http://senac.eduead.com.br/ead2010/mod/resource/view.php?inpopup=true&id=74065>. Acesso em 17 maio 2011.
  • 28. 28 O expressionismo desenvolveu-se quase que simultaneamente em países diversos, nascido da necessidade de externar os sentimentos de angústia e desânimo de seus representantes, face a um mundo desequilibrado pela impessoalidade decorrente da exacerbação da máquina. A „Brücke‟ foi um dos movimentos expressionistas alemães que surgiu na primeira década do século XX; e seus integrantes usavam imagens da cidade moderna para transmitir - com figuras e cores distorcidas - a idéia de um mundo hostil e alienante. Os espaços urbanos são retratados com seus aspectos sombrios enfatizados, através dos ângulos agudos, dos tons frios e escuros; (...) a multidão urbana é vista com os semblantes carregados de angústia e hostilidade conforme retratada em “Cena de Rua Berlinense”. (KUSTER, 2006, p.10). A vida nas cidades tornou-se cada vez mais complexa, resultado de um mundo dominado pelo capitalismo e pelas inovações tecnológicas. O ambiente urbano e seu dinamismo continuou sendo inspiração para os artistas modernos, que expressavam suas diferentes sensações perante a experiência da modernidade: angústia, ironia, admiração, dentre tantas outras. Na contemporaneidade a cidade tornou-se palco para outros tipos de manifestações artísticas. Por meio de performances e intervenções urbanas, os artistas contemporâneos propõem reflexões sobre a relação entre as pessoas e os ambientes das cidades. Todas essas possibilidades de expressão, de levantar questionamentos e propor reflexões sobre inúmeros temas, incluindo-se o ambiente urbano, são possíveis hoje graças ao Figura 12 - Ernst Ludwig Kirchner. Berlin Street Scene (1913). Disponível em: <http://images.artnet.com/images_US/magazine/f eatures/huttenlauch/huttenlauch11-7-1.jpg>, acesso em 06 jun. 2011. Figura 13 - Ernst Ludwig Kirchner. Nollendorfplatz (1912). Disponível em: <http://www.stadtmuseum.de/php/sammlung en/sreb.php?id=238>, acesso em 06 jun. 2011.
  • 29. 29 primeiro passo dado pelos modernistas, que romperam com as tradições e alcançaram a liberdade na arte de representar. Essa liberdade de expressão também está presente na paisagem de Martinho de Haro. Percebe-se, como já citado pelos autores consultados, a influência de Cézanne, no que se refere à simplificação da forma e às relações cromáticas na composição. Mas Martinho também expressou suas sensações sobre a cidade. Em seus depoimentos em vídeo9 , Sandra Makowiecky10 e Janga11 identificam na paisagem de Martinho uma sensação de partida, de infinito; uma nostalgia, um sentimento de saudade; uma preocupação em preservar a memória registrando o casario colonial, e sua parcela de responsabilidade com a identidade da cidade. Com base nos estudos sobre a obra de Martinho de Haro, e da representação das cidades pela arte no contexto da modernidade, teve início o processo de criação, com a pesquisa de referências visuais que pudessem contribuir para expressar através da produção de uma imagem, algumas sensações diante das transformações ocorridas na cidade de Florianópolis em decorrência da modernização. 2.5 – O processo criativo 2.5.1 – Referências visuais As primeiras referências visuais sobre o tema apareceram ainda na etapa da pesquisa teórica. Trata-se de fotografias do fim do século XIX e início do século XX que mostram o Centro Histórico de Florianópolis naquele tempo, e ajudam a compreender como se deram as modificações do Centro Histórico e o quanto essas transformações alteraram a percepção visual do espaço urbano, especificamente na região do Mercado Público. Desse acervo fotográfico foram selecionadas algumas imagens (figuras 01 a 09) que retratam um panorama na região do Mercado desde o tempo que ainda era banhado pelo mar e sem a presença de prédios modernos, até fotografias mais recentes das décadas de 1980 e 1990, onde é possível constatar o nível de descaracterização ocorrido nesse curto espaço de tempo. 9 MARTINHO de Haro. A cidade reinventada. Da série alma de artista. Direção e roteiro: Chico Pereira. Produção: Bruno Vieira da Cunha. Realização: Fundação Cultural de Florianópolis Franklin Cascaes e Prefeitura de Florianópolis. Florianópolis: 2007. DVD. 10 Professora de Artes Visuais 11 Crítico de Artes.
  • 30. 30 Além das referências fotográficas de valor documental, teve-se acesso também a um acervo de imagens produzidas por artistas plásticos locais que adotaram a cidade como tema principal de suas pinturas. Esses artistas tinham em comum o interesse em preservar a memória de uma cidade que teve parte de seu patrimônio arquitetônico destruído em nome da modernidade. Dedicaram-se então a eternizar imagens de uma Florianópolis encantadora, que infelizmente, se perderia para sempre. Dentre os artistas pesquisados, tomou-se como referência principal a obra do modernista Martinho de Haro e sua forma muito particular de representar o conjunto que caracterizava a Florianópolis antiga, com seu casario cercado de céu e mar. Diante do amplo repertório do artista, algumas obras foram selecionadas como referências visuais para a realização do trabalho prático, especificamente, as que representam a região do Mercado Público (figura 14), o cais da Rua Francisco Tolentino (figura 15), e o Largo da Alfândega (figura 16). A partir desse conjunto de obras selecionadas, foi feito um levantamento fotográfico12 do local na atualidade, buscando ângulos aproximados da visão do artista. O contexto atual impõe uma nova percepção do espaço visual da cidade, o que permite fazer um comparativo entre o olhar do artista e novas possibilidades de olhar sobre a mesma paisagem, agora desfigurada. Figura 14 - Martinho de Haro. Mercado Público (1970/ 1975). Fonte: CORREA NETO (2007, p. 32). 12 ANEXO B.
  • 31. 31 Figura 15 – Martinho de Haro. Mercado Público (1975/ 1980). Fonte: CORREA NETO (2007, p. 25). Figura 16 – Martinho de Haro. Largo da Alfândega com ocaso violeta (1980/ 1985). Fonte: CORREA NETO (2007, p. 38). No estudo da representação desse novo contexto onde está inserido o antigo Mercado Público, a pesquisa de referências visuais se ampliou, propondo um diálogo entre Martinho e outros três artistas: M.C Escher, Giorgio de Chirico e René Magritte, na intenção de representar possíveis metáforas diante do estranhamento provocado pela chegada do progresso à cidade de Florianópolis. Em oposição à harmonia presente nas paisagens de Martinho de Haro, pode-se observar na paisagem atual um imenso contraste entre o novo e o antigo, o passado e o presente. Este conceito é percebido nas referências visuais pesquisadas, quando se faz a comparação entre imagens antigas e atuais da cidade. Para representar esse contraste
  • 32. 32 resultante da transformação do espaço urbano, buscou-se como referência visual a obra Metamorphosis I (1937), de M.C. Escher (figura 17), onde figuras encadeadas se transformam em outras figuras, num ritmo equilibrado, que no seu conjunto dão sensação de tempo e movimento. Figura 117 – M.C. Escher. Metamorphosis I (1937). Disponível em: <http://www.mcescher.com/>, acesso em 06 jun. 2011. Na obra de Martinho a presença do mar é uma constante. Ora um espelho d‟água refletindo o casario, ora um mar revolto em movimento, que em parceria com o céu dá vida a paisagem retratada. No entanto o aterro abafou o barulho do mar, e o espaço foi tomado por um imenso silêncio, até ser ocupado por rodovias, terminais urbanos e estacionamentos. Essa paisagem quase desértica remete às primeiras obras de Giorgio de Chirico (figura 18). Enigmáticas e melancólicas, as paisagens urbanas de De Chirico referem-se às cidades italianas, com suas praças sem vida em tardes quentes, o céu azul e longas sombras que indicam o calor intenso do verão (FARTHING, 2009, p. 356). Figura 18 – Giorgio de Chirico. Piazza d’Italia (1913). Disponível em: <http://www.abcgallery.com/C/chirico/chirico10.html>, acesso em 06 jun. 2011.
  • 33. 33 O ponto de vista específico que buscava Martinho ao se aventurar nos mares da Baía Sul, poderíamos hoje encontrar facilmente num passeio à pé pelas calçadas do aterro, não fossem tantos os anteparos que impedem a visualização do antigo cais da Alfândega. A paisagem surge confusa, entre postes, coqueiros, sinais de trânsito e árvores. Essa situação remete à obra de René Magritte (figura 19), onde uma amazona é vista cavalgando num bosque. Segundo Rodrigues (2010), a fragmentação e a descontinuidade da figura central rompem com a ilusão da perspectiva representada pela sensação de profundidade no posicionamento das árvores. Dessa forma, o artista une em uma única superfície os planos da imagem, causando uma sensação de simultaneidade de espaço e de tempo. Figura 19 - René Magritte. Le Blanc-seing (1965) Disponível em: <http://obviousmag.org/archives/2006/03/rene_magritte_1.html>, acesso em 06 jun. 2011. Apesar da descaracterização física e visual da paisagem de Florianópolis, observa-se a permanência do Mercado Público como um dos monumentos arquitetônicos preservados no contexto atual. Este fato motivou o uso da apropriação como método de criação para este trabalho. A “apropriação” pode ser entendida como um procedimento realizado pelo artista que no seu processo de criação, toma para si objetos não-artísticos e outras imagens preexistentes para elaborar sua obra, atribuindo novos significados ao elemento apropriado. Por imagens preexistentes compreende-se todo o universo das imagens criadas até o presente momento, que pertencem ao imaginário da história da humanidade. Ao contrário dos modernos, a arte contemporânea não está em busca do novo, e nem quer negar o passado. Os
  • 34. 34 artistas contemporâneos transitam livremente no tempo e no espaço, em busca de algo que possa expressar o seu pensamento. Ao apropriar-se de uma imagem, o artista pode resolver apoderar-se do tema proposto na obra original, ou “tomar emprestado” o estilo de outro artista. Pode ainda tomar para si parte da obra e inseri-la em um novo contexto, ou intervir sobre ela. Ou ainda apropriar-se da obra por inteiro, o que vem levantar questões sobre autenticidade e originalidade. Para o artista contemporâneo, as imagens do mundo se transformam em signos dos quais ele se apodera e manipula para produzir novos significados. A fotografia, o cinema e a televisão, tecnologias inicialmente criadas para registrar o momento presente, passam a ser fontes de pesquisa visual para a elaboração de novos trabalhos. O fácil acesso à informação por meios eletrônicos, as técnicas de reprodução de imagens como xérox e scanner, e o uso de softwares gráficos para a manipulação de imagens possibilita ao artista inúmeras possibilidades de pesquisa e de criação. Perez (2008 apud Cristofaro, 2005) ainda salienta que o fato de o artista se apropriar de imagens não põe em risco sua expressividade individual ou sua visão do mundo, pois seu critério seletivo, define, em última instância, suas ideias, suas inquietações, sua inventividade e seu pensamento associativo. Assim, a apropriação justifica-se por permitir ao artista criar um novo código de leitura que vai além dos significados originários dessas imagens, transportando-lhes nova compreensão e atribuindo-lhes novo sentido. Logo, uma das razões possíveis para o uso da apropriação na arte contemporânea parece estar evidenciada numa necessidade de revisionismo própria de nossa era. Diante dos inúmeros exemplos de apropriação pesquisados na história da arte, alguns apresentaram maior possibilidade de diálogo com a proposta deste trabalho e foram inseridos no conjunto das referências visuais. O primeiro deles é Methaphisical Interior with Hand of David (figura 20). Ao inserir o desenho da mão de David de Michelangelo (1501-1504) em sua obra, De Chirico apropriou- se de parte da obra original, criando para esse fragmento um novo significado no contexto de sua pintura metafísica.
  • 35. 35 Figura 120 – Giorgio de Chirico. Methaphisical Interior with Hand of David (1968). Disponível em: <http://www.fondazionedechirico.it/en/1960-70>, acesso em 06 jun. 2011. A obra do artista americano John Baldessari (figura 21) representa um ambiente urbano com silhuetas destacadas em cores sólidas, que representam pessoas em momentos de grande estresse físico ou perigo. Segundo o site The Metropolitan Museum of Art13 , o artista fotografou cenas de filmes na televisão e interferiu sobre a imagem, isolando as figuras para criar um efeito de alívio superficial. Figura 21 – John Baldessari. The Duress Series: Person Climbing Exterior Wall of Tall Building / Person on Ledge of Tall Building / Person on Girders of Unfinished Tall Building (2003). Disponível em: < http://www.metmuseum.org/special/john_baldessari/view_1.asp?item=19>, acesso em 01 jun. 2011. 13 THE METROPOLITAN Museum of Art. Special Exhibitions. John Baldessari: Pure Beauty. Disponível em: <http://www.metmuseum.org/special/john_baldessari/view_1.asp?item=19>. Acesso em: 01 junho 2011.
  • 36. 36 Percebe-se nessas duas imagens o isolamento de parte da obra original e a proposta de inserção em um novo contexto. Em De Chirico, a referência a uma obra clássica do Renascimento contrasta com o entorno surreal em que foi inserida. Baldessari, por sua vez, propõe um deslocamento das figuras, isolando-as com cores contrastantes, sugerindo assim uma mudança de situação de perigo para de não perigo. O conjunto dessas imagens dialogam com a ideia de apropriação de parte da obra de Martinho de Haro através do isolamento da figura do Mercado. As possibilidades de criação de novos cenários para esta figura, partindo de uma interpretação das possíveis sensações provocadas pelo processo de transformação da cidade, propõe novas reflexões sobre as mudanças na paisagem e seus possíveis significados. 2.5.2 – Recursos técnicos A apropriação da obra de Martinho de Haro se deu por meio da reprodução por digitalização das imagens de um livro14 , usando-se para isso o livro, um scanner e um computador. Recurso técnico fundamental no processo, o computador permite o armazenamento de imagens e infinitas possibilidades de intervenção através de softwares gráficos de desenho e de manipulação de imagens. Nesse trabalho em particular, optou-se pelas possibilidades de desenho vetorial por computador para recriar o cenário ao redor da imagem apropriada. As imagens digitalizadas foram importadas para a área de trabalho do software Adobe Illustrator CS3, no qual se iniciou o processo de isolamento das figuras de maior interesse. Nessa etapa, as figuras foram redesenhadas sobre a imagem, e posteriormente o cenário original foi encoberto por uma máscara (ANEXO D). A partir desse resultado, recorreu-se às referências visuais já citadas para estudos de composição dos cenários. 14 CORRÊA NETO, Yilmar; PRADE, Péricles. A Florianópolis de Martinho de Haro. Florianópolis: Tempo Editorial, 2007. (p. 25, 32, e 38)
  • 37. 37 2.5.3 – Estudo preliminar O primeiro estudo realizado (figura 22) foi feito para experimentar as possibilidades de representação do cenário atual por meio do desenho vetorial. Para isso, tomou-se como referência principal a obra Mercado Público (figura 14) em que a figura do Mercado foi redesenhada sobre a imagem, seguindo os traços do artista. Nessa etapa foi importante observar na obra original o estilo de Martinho de Haro. Sua opção pela simplificação da forma e omissão de detalhes foi mantida no novo desenho do mercado, e serviu como parâmetro para estudos de composição do novo cenário. O levantamento fotográfico feito no local (ANEXO B) foi a principal referência para a composição do cenário com prédios e rodovias. Observou-se a disposição dos prédios, o desenho das ruas, e principalmente como se relacionam esses elementos com a imagem do Mercado. Em certos ângulos de visão, o excesso de construções, bancas de camelôs e de revistas, e outros elementos como árvores, postes de energia elétrica e telefones públicos impedem a visualização do prédio por inteiro, em oposição do que é possível observar na representação de Martinho de Haro. Mesmo assim, o Mercado se destaca no conjunto urbano principalmente por seu estilo arquitetônico. As fotografias mostram o intenso movimento de pessoas e de veículos automotivos de todos os tipos e tamanhos trafegando na rodovia Paulo Fontes, hoje um importante acesso ao centro da cidade. Observou-se também uma intensa atividade comercial nos arredores do Mercado Público, o que contribuiu para a descaracterização da paisagem, principalmente na Rua Francisco Tolentino. No entanto, optou-se por não retratar essas características na representação gráfica do cenário atual, seguindo novamente o estilo de Martinho, em que figuras humanas, charretes e automóveis raramente aparecem, e de forma muito discreta. O resultado desse primeiro estudo demonstra a opção pela representação simplificada dos prédios, resumidos a silhuetas retangulares dispostas em perspectiva no espaço, o que revela a ocupação intensa desses elementos na paisagem ao redor do Mercado. No que se refere à rodovia lateral, optou-se por representá-la em linhas curvas, enfatizando o seu aspecto estático em contraste com o dinamismo do mar presente na representação de Martinho. A partir desse estudo preliminar, iniciou-se o trabalho de criação propriamente dito, em que se procurou representar por meio da produção de três imagens, possíveis sensações diante da visível descaracterização da cidade. Nessa etapa recorreu-se também às imagens da antiga Florianópolis, num estudo comparativo entre o passado e o presente. Para atingir esses
  • 38. 38 resultados, procurou-se estabelecer diálogos entre as obras de Martinho de Haro e as referências visuais citadas, pela estratégia da apropriação. Figura 22 – Estudo preliminar. Fonte: Autora (2011). 2.5.4 - Intervenção I No primeiro trabalho tomou-se como referência principal a obra Mercado Público (figura 14) de Martinho de Haro. Como segunda referência foi escolhida a obra Le Blanc- seing (figura 19) de René Magritte. O primeiro passo foi o isolamento das figuras do Mercado Público e do prédio da Alfândega na obra de Martinho de Haro (ANEXO D), caracterizando a apropriação de fragmentos da obra. Optou-se por manter o prédio da Alfândega no novo cenário, por ser esse um monumento arquitetônico também preservado e presente no contexto atual. A partir desse ponto, iniciou-se um processo de análise na obra de Magritte, a procura de elementos que também pudessem ser apropriados para compor o trabalho final.
  • 39. 39 Observa-se no conjunto da obra do surrealista René Magritte, certa dose de ambiguidade e contradição. O artista adota uma representação muito próxima da realidade, porém cria relações absurdas e incongruentes entre os elementos que compõem a cena. Pode- se observar um questionamento constante sobre a realidade e a representação dessa mesma realidade, nas ilusões de ótica e nas relações entre a representação do espaço real e do espaço ilusório. A pintura surrealista extrapola o nível da percepção e atinge um nível psicológico, à medida que rompe com a normalidade, e propõe reflexões por meio de novas combinações de elementos reais no espaço da representação artística. Argan, sobre a obra dos surrealistas diz: “as imagens não são modificadas, modificam-se as relações com que normalmente as imagens se associam entre elas” (ARGAN, 1992, p. 480). Na obra Le Blanc-sign, observa-se certo estranhamento no ato da observação. A princípio a obra apresenta-se como uma paisagem naturalista. Um olhar mais atento revela detalhes que explicam o porquê da sensação de estranheza diante da obra. Segundo Rodrigues (2010, p.105), a imagem apresenta certa artificialidade devido à homogeneidade das cores e das formas que contradizem o efeito de perspectiva dado pelo posicionamento das árvores. Segundo a mesma autora, o maior efeito de diluição da perspectiva clássica, porém, é obtido pela cisão da figura da amazona e do cavalo e de sua interpolação pelos diversos planos – há uma relativização entre o que estaria mais no fundo e o que estaria nos planos anteriores. A imagem da amazona apresenta-se ora oculta por um tronco que estaria num plano posterior da tela, ora encobrindo caules que estariam num plano à frente. (RODRIGUES, 2010, p.105). As imagens apresentam-se fragmentadas e descontínuas num mesmo plano de representação, o que causa uma estranha sensação de simultaneidade no tempo e no espaço. Levando-se em conta essas observações, optou-se pela apropriação dos conceitos de fragmentação, descontinuidade e simultaneidade presentes na obra de Magritte, representados pela figura da amazona entrecortada pelo plano das árvores. O cenário criado a partir desses conceitos (figura 23) traz as figuras do Mercado, da Alfândega e o desenho dos prédios, todos entrecortados por coqueiros estilizados. Esse resultado foi obtido com base na observação do cenário atual, onde inúmeros obstáculos impedem uma apreciação da paisagem tal qual a retratada por Martinho em sua pintura. O que se observa atualmente é uma imagem confusa, onde elementos de origens diversas competem por atenção, confundindo a visão do observador.
  • 40. 40 A fragmentação da figura principal propõe uma reflexão sobre a relação do Mercado com a paisagem em que está inserido atualmente. Uma questão que se pode pensar é o quanto a nova realidade interfere na compreensão da relação entre o monumento arquitetônico preservado e seus referenciais históricos. Diante disso, optou-se pelo uso de cinzas para cobrir a paisagem moderna, em contraste com o colorido da figura apropriada de Martinho incluindo um pedacinho de céu e de mar, o que evoca a presença de um passado distante, mas ainda vivo na memória de muitos cidadãos. Figura 23 – Intervenção I. Fonte: Autora (2011). 2.5.5 – Intervenção II No segundo trabalho, tomou-se como referência principal a obra Largo da Alfândega com ocaso violeta (figura 16) de Martinho de Haro. Observa-se nessa pintura a inexistência de elementos que evoquem a chegada da modernidade, como os discretos prédios presentes em outras obras do artista. Além disso, é possível observar na paisagem a ausência da Ponte Hercílio Luz, monumento construído na década de 1920. Pode-se concluir que o artista retrata a Florianópolis do fim do século XIX e início do século XX.
  • 41. 41 A composição destaca principalmente o prédio da Alfândega e o Mercado, com seus respectivos trapiches avançando sobre o mar. Ao fundo a presença de outros elementos do casario colonial e as torres da Igreja São Francisco. O tom violeta da imagem remete a um pôr do sol, causando uma sensação de paz e tranquilidade. O mar calmo reflete o casario e o céu coberto de nuvens que chegam anunciando o fim do dia. Esse quadro é da década de 1980, época em que a paisagem urbana de Florianópolis já se encontrava totalmente modificada. Diante desse fato, percebe-se a decisão do artista por continuar pintando a paisagem inspiradora que ele viu desaparecer, e contribuir com sua arte para a preservação da memória da cidade. Como já foi visto Martinho não se prendia a detalhes. Numa atitude modernista, rompeu com o estilo tradicional de representação da realidade. No entanto, sua paisagem consegue transmitir exatamente o que era Florianópolis antes da chegada do progresso. Uma visão muito diferente se tem hoje do mesmo lugar, quando observado por um ângulo aproximado ao ângulo de visão representado pelo artista. O local, que na década de 1970 também sofreu alterações decorrentes da construção do aterro da Baía Sul, apresenta hoje em frente ao prédio da Alfândega, uma grande praça com quiosques de venda de cerâmica, bancos para sentar e um lago com chafariz. O antigo cais foi transformado num ponto de encontro da população. Na década de 1980, como mostra a figura 09, o local abrigava um enorme estacionamento. Para dialogar com a obra de Martinho, foi escolhido o trabalho Metamorphosis I, de M.C. Escher (figura 17). Como o próprio título sugere, a imagem representa figuras em processo de transformação. Uma figura humana estilizada que se transforma em figuras geométricas planas, aos poucos assume a aparência tridimensional de cubos, que dão origem a uma cidade à beira mar. O uso da geometria foi uma constante no trabalho de Escher. Vários trabalhos apresentam a divisão de planos em figuras geométricas que se repetem, se refletem e se transformam umas nas outras. Assim como Magritte, Escher desenvolveu muitos trabalhos usando a ilusão de ótica. Também não estava interessado na representação da realidade, ao contrário, criava mundos impossíveis, muito parecidos com o mundo real, repleto de ilusões espaciais que confundem a percepção. O primeiro passo para a realização do segundo trabalho foi o isolamento, na imagem original da obra de Martinho de Haro, das figuras do Mercado Público, do prédio da Alfândega e das torres da Igreja São Francisco. Mais uma vez, optou-se pela apropriação de outras figuras além do Mercado, por ainda existirem na paisagem atual (ANEXO D).
  • 42. 42 O principal ponto de partida para a construção de um novo cenário foi o espelho d‟água presente na obra de Martinho. O espelho d‟água pode ser compreendido como um elemento que representa uma relação íntima de um povo com o seu lugar de origem, e por isso reflete toda a sua formação cultural em decorrência dessa experiência de vida. O fato de a cidade ter se originado de um povoado localizado numa ilha reforça essa estreita relação com o mar, importante para a realização de atividades básicas ligadas à alimentação e ao transporte. A chegada do progresso, a construção das pontes e dos aterros, o desaparecimento de diversos exemplares do casario colonial, tudo isso causou profundas transformações no modo de vida dos cidadãos de Florianópolis. Aos poucos a relação com o mar se quebrou, e pode-se dizer que todo esse processo provocou certa perda de identidade da cidade com o seu povo. Com base nessas ideias, construiu-se um cenário fragmentado, como um espelho quebrado que reflete a paisagem apenas em partes. Junto aos cacos de espelho, observam-se pedaços em tons de cinza, que se unem e formam um conjunto de prédios que contrastam com a antiga imagem da cidade. Optou-se pelo fundo preto para destacar os elementos de valor histórico e cultural. A relação com o trabalho de Escher pode ser identificada na divisão do espaço por formas geométricas, porém de forma aleatória. A imagem refletida nos cacos do espelho representa a parcela de responsabilidade dos monumentos arquitetônicos com a formação da identidade de uma cidade. O resultado está representado pela figura 24. Figura 24 – Intervenção II. Fonte: Autora (2011).
  • 43. 43 2.5.6 – Intervenção III Para o terceiro e último trabalho foi tomada como referência principal a obra Mercado Público (figura 15), de Martinho de Haro. O primeiro passo nesse trabalho também foi o isolamento das figuras. Nesse caso em particular, optou-se por apropriar-se não só da imagem do Mercado, mas de toda a representação do casario, e também de outros elementos significativos como os barcos, o automóvel, a charrete e o Miramar (ANEXO D). Nessa composição de Martinho, percebe-se a presença discreta de elementos da modernidade como os prédios e o automóvel. Como em outras obras, a força da imagem está na representação do céu em conjunto com a água do mar, numa perfeita harmonia. Para dialogar com essa imagem foi escolhida como referência visual a obra Piazza d’Italia (figura 18) de Giorgio de Chirico. De Chirico é conhecido na história da arte como criador da pintura metafísica, junto com Carlo Carrá, em Ferrara, na Itália. Sua paisagem é melancólica e enigmática e reflete a atitude do artista de negação ao tempo presente e à realidade moderna. Segundo o Itaú Cultural15 , De Chirico se colocava contrário ao movimento futurista que ansiava pela aceleração do tempo e pela transformação da sociedade. O artista buscava algo além da realidade. Seus cenários com torres, monumentos e praças, constroem paradoxalmente espaços vazios e misteriosos. Argan (1992, p. 496) descreve o espaço na representação metafísica de De Chirico como “pura figura perspectiva, profundidade sem capacidade, intransitável e inabitável. As cores são quentes e profundas, mas duras e como que solidificadas nos objetos; a luz é intensa e imóvel, sem vibrações nem raios”. A paisagem enigmática criada por De Chirico foi a base para a criação do terceiro cenário. Procurou-se reproduzir o estilo da pintura metafísica de De Chirico com o intuito de criar um ambiente que transmitisse a mesma sensação de vazio presente na obra original. Depois do isolamento das figuras, traçou-se o limite entre o chão e o céu. Em seguida foi feito o desenho das sombras dos barcos e das construções. Nesse momento optou-se por fazer uma referência ao Monumento Miramar (ANEXO C), por meio de uma representação simbólica de suas colunas perdidas na paisagem. Foi acrescentado então o efeito de luz, pelo rebaixamento da luminosidade do conjunto representativo do casario. 15 ENCICLOPÉDIA Itaú Cultural. Artes Visuais. Pintura Metafísica. Disponível em: < http://www.itaucultural.org.br/aplicexternas/enciclopedia_ic/index.cfm?fuseaction=termos_texto&cd_verbete=8 90&lst_palavras=&cd_idioma=28555&cd_item=8>. Acesso em: 10 jun. 2011.
  • 44. 44 Uma comparação com a obra original de Martinho revela a transformação de uma paisagem viva em um cenário inerte, com barcos e colunas perdidos num conjunto que perdeu totalmente o seu sentido de ser. A paisagem parece representar um instante de incerteza entre o que passou e o que virá a seguir. Ou seja, a sensação de vazio e perda de identidade causada pela descaracterização da paisagem, e a impotência diante dessa situação. O resultado pode ser observado na figura 25. Figura 25 – Intervenção III. Fonte: Autora (2011). As três Intervenções envolveram processos criativos semelhantes. Em cada uma delas procurou-se analisar quais elementos poderiam ser apropriados além da figura do Mercado. Comparando-se as imagens antigas e atuais da cidade, tomou-se a decisão de manter aqueles elementos que continuam presentes no conjunto urbano do Centro Histórico. Com isso, essas construções ganharam destaque no desenho dos novos cenários como elementos de importância histórica e cultural, propondo uma reflexão sobre a percepção visual que se tem hoje da cidade, e quais elementos presentes no contexto atual estão diretamente ligados às origens do povoado de Nossa Senhora do Desterro, hoje cidade de Florianópolis.
  • 45. 45 3 – CONCLUSÃO A realização desse trabalho possibilitou, em primeiro lugar, uma compreensão maior sobre processo criativo e suas implicações. Ficou claro que a criação visual não depende apenas de momentos de inspiração, mas está diretamente ligada ao estudo mais aprofundado de tudo que se relacione ao tema proposto, e que seja considerado relevante no decorrer do processo em busca de um resultado satisfatório. A pesquisa histórica sobre o Mercado e sobre a cidade foi de grande relevância para o processo de criação, pois tornou possível conhecer as razões que levaram a cidade a sofrer profundas transformações, o que resultou na alteração da percepção visual do espaço urbano. O conhecimento histórico, o acesso às fotografias antigas e o contato diário com a região do Centro Histórico proporcionou um exercício de olhar para a cidade de uma forma diferente, numa atitude de reconhecer o valor artístico, histórico e cultural de tudo que não foi destruído. Um olhar em busca de elementos que pudessem representar o sentimento de perda com o afastamento do mar e o desaparecimento da maior parte das construções coloniais. A pesquisa por referências visuais me levou a ter contato com a obra de Martinho de Haro, e me fez compreender melhor esse sentimento, explícito na opção do artista por retratar variações de uma paisagem que já não existia. Apropriar-se de elementos presentes das imagens de Martinho de Haro, apagando literalmente o seu entorno e desenhando sobre ele versões de uma nova paisagem representou para mim, uma atitude que corresponde ao processo real de descaracterização do Centro Histórico. O contato com a história da arte me fez reconhecer na obra de outros artistas modernos a referência ao tema urbano, na representação das cidades e na expressão de sentimentos diversos decorrentes da experiência da modernidade, o que foi uma referência teórica e visual importante. Todos esses fatores foram fundamentais para o desenvolvimento do processo criativo, contribuindo para a elaboração cuidadosa das composições, de forma que pudessem ser compreendidas como uma visão muito própria do que significa para mim, a descaracterização da cidade. Todo esse processo contribuiu para que os resultados atingissem seus objetivos iniciais de representação do espaço urbano atual de Florianópolis, propondo uma reflexão sobre os significados das transformações ocorridas em decorrência da modernização da cidade.
  • 46. 46 4 – REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS ESCHER, Maurits Cornelis. Gravuras e Desenhos. Tradução: Maria Odete Gonçalves- Koller. Taschen, 2002. ARGAN, Giulio Carlo. A História da Arte como História da Cidade. São Paulo: Martins Fontes, 1998. ARGAN, Giulio Carlo. Arte Moderna. Tradução: Denise Bottmann e Frederico Carotti. São Paulo: Companhia das Letras, 1992. CAVALCANTI, Carlos. Como entender a pintura moderna. 5ª edição. Rio de Janeiro: Ed. Rio, 1981. CORRÊA NETO, Yilmar; PRADE, Péricles. A Florianópolis de Martinho de Haro. Florianópolis: Tempo Editorial, 2007. ENCICLOPÉDIA Itaú Cultural. Artes Visuais. Termos e Conceitos. Apropriação. Disponível em: <http://www.itaucultural.org.br/aplicexternas/enciclopedia_ic/index.cfm?fuseaction=termos_t exto&cd_verbete=3182&lst_palavras=&cd_idioma=28555&cd_item=8>. Acesso em: 17 mai. 2011. ENCICLOPÉDIA Itaú Cultural. Artes Visuais. Termos e Conceitos. Modernismo no Brasil Disponível em: <http://www.itaucultural.org.br/aplicexternas/enciclopedia_ic/index.cfm?fuseaction=termos_t exto&cd_verbete=359&lst_palavras=&cd_idioma=28555&cd_item=8>. Acesso em: 20 mai. 2011. ENCICLOPÉDIA Itaú Cultural. Artes Visuais. Pintura Metafísica. Disponível em <http://www.itaucultural.org.br/aplicexternas/enciclopedia_ic/index.cfm?fuseaction=termos_t exto&cd_verbete=890&lst_palavras=&cd_idioma=28555&cd_item=8>. Acesso em: 10 jun. 2011. FARTHING, Stephen. 501 Grandes Artistas. Rio de Janeiro: Sextante, 2009. FRANSCINA, Francis et al. Modernidade e Modernismo. A Pintura francesa no século XIX. São Paulo: Cosac e Naify Edições, 1998. KUSTER, E. M. P. A cidade na história da arte: a dimensão artística do espaço urbano em diferentes momentos históricos. In: I Seminário Arte & Cidade, 2006, Salvador - BA. I Seminário Arte & Cidade, 2006. Disponível em: <http://pt.scribd.com/doc/7017058/A- Cidade-Na-Historia-Da-Arte-Kuster>. Acesso em: 21 abr. 2011. MAKOWIECKY, Sandra. História e Cultura Visual em Martinho de Haro - um modernista singular. In: XIII Encontro de História Anpuh- Rio, 2008. Disponível em: <http://www.encontro2008.rj.anpuh.org/resources/content/anais/1211932463_ARQUIVO_An puh-2008Sandramakowiecky-MartinhodeHarofinal.pdf>. Acesso em: 12 mai. 2011.
  • 47. 47 MALLMANN, Regis. Os passos do maior pintor brasileiro do século XIX entre Desterro, Paris e o Rio de Janeiro. Disponível em: <http://www.museuvictormeirelles.org.br/artista/regis_mallmann.htm>. Acesso em: 30 abr. 2011. MARTINHO de Haro. A cidade reinventada. Da série alma de artista. Direção e roteiro: Chico Pereira. Produção: Bruno Vieira da Cunha. Realização: Fundação Cultural de Florianópolis Franklin Cascaes e Prefeitura de Florianópolis. Florianópolis: 2007. DVD. MATTOS, Tarcísio (Org.); CORRÊA NETO, Ylmar; ANDRADE FILHO, João Evangelista. Martinho de Haro. 1907-1985. Edição comemorativa do centenário de nascimento do artista. Florianópolis: Tempo Editorial, 2007. MENEZES DE FARIA, Priscilla; CHEREM, Rosangela Miranda. Permanência e deriva: o cais de Martinho de Haro. DAPesquisa. Revista de investigação em Artes - ISSN: 1808-3129 – Vol. 3, Nº 2, Ano 6 - Ago/2008 – Jul/2009. Disponível em: <http://www.ceart.udesc.br/revista_dapesquisa/volume4/numero1/plasticas/permanenciaederi va.pdf>. Acesso em: 19 mai. 2011. MESQUITA, Ricardo Moreira de. Mercado: do Mané ao Turista. 1ª edição. Florianópolis: Ed. Do autor, 2002. PANARIELLO, Ana Luiza Malnati. Do Miramar ao Monumento: a reconstrução do “velho trapiche”. Revista Santa Catarina em História - Florianópolis - UFSC – Brasil, v.1, n.2, 2007. Disponível em: <http://seer.cfh.ufsc.br/index.php/sceh/article/viewFile/53/108>. Acesso em: 21 mai. 2011. PEREZ, Karine Gomes. Apontamentos sobre o conceito de apropriação e seus desdobramentos na Arte Contemporânea. Revista Digital Art& - ISSN 1806-2962 - Ano VI - Número 10 - Novembro de 2008. Disponível em: <http://www.revista.art.br/site-numero- 10/trabalhos/42.htm>. Acesso em 17 mai. 2011. PREFEITURA Municipal de Florianópolis. Secretaria Executiva. Serviços públicos. Mercado Público. Disponível em: <http://portal.pmf.sc.gov.br/entidades/sesp/index.php?cms=mercado+publico&menu=0> Acesso em: 26 mai. 2011. RODRIGUES, Ana Paula Dias. Lygia Fagundes Telles e René Magritte: diálogos entre textos e telas. 2010. 125f. Dissertação (Mestrado em Teoria da Literatura). Universidade Estadual Paulista, São José do Rio Preto, 2010. Disponível em: <http://www.athena.biblioteca.unesp.br/exlibris/bd/brp/33004153015P2/2010/rodrigues_apd_ me_sjrp.pdf>. Acesso em: 03 jun. 2011. SIQUEIRA, Vera Beatriz. Destino da arte: arte e cultura no mundo moderno e contemporâneo. Curso de Especialização em Artes Visuais: Cultura e Criação. Rede EaD SENAC. Disponível em: <http://senac.eduead.com.br/ead2010/mod/resource/view.php?inpopup=true&id=74065>. Acesso em 17 mai. 2011.
  • 48. 48 THE METROPOLITAN Museum of Art. Special Exhibitions. John Baldessari: Pure Beauty. Disponível em: <http://www.metmuseum.org/special/john_baldessari/view_1.asp?item=19>. Acesso em: 01 jun. 2011. VAZ, Nelson Popini. O Centro Histórico de Florianópolis. Espaço Público do Ritual. Florianópolis: FCC Ed.,/ Ed. Da UFSC, 1991. VEIGA, Eliane Veras da. Florianópolis - Memória Urbana. Florianópolis: Editora da UFSC e Fundação Franklin Cascaes, 1993. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS DAS IMAGENS CLAUDE MONET. A Ponte da Europa (1877). Disponível em: http://www.claudemonetgallery.org/The-Pont-De-L-Europe--Saint-Lazare-Station.html, acesso em 06 jun. 2011. ERNST LUDWIG KIRCHNER. Nollendorfplatz (1912). Disponível em: http://www.stadtmuseum.de/php/sammlungen/sreb.php?id=238, acesso em 06 jun. 2011. ERNST LUDWIG KIRCHNER. Cena de Rua Berlinense (1913). Disponível em: http://images.artnet.com/images_US/magazine/features/huttenlauch/huttenlauch11-7-1.jpg, acesso em 06 jun. 2011. GIORGIO DE CHIRICO. Methaphisical Interior with Hand of David (1968). Disponível em: http://www.fondazionedechirico.it/en/1960-70, acesso em 06 jun. 2011. GIORGIO DE CHIRICO. Piazza d‟Italia (1913). Disponível em: http://www.abcgallery.com/C/chirico/chirico10.html, acesso em 06 jun. 2011. GUSTAVE CAILLEBOT. A Ponte da Europa (1876). Disponível em: http://www.gustavcaillebotte.org/The-Pont-Du-Europe.html, acesso em 06 jun. 2011. JOHN BALDESSARI. The Duress Series: Person Climbing Exterior Wall of Tall Building / Person on Ledge of Tall Building / Person on Girders of Unfinished Tall Building (2003). Disponível em: http://www.metmuseum.org/special/john_baldessari/view_1.asp?item=19, acesso em 01 jun. 2011. M.C. ESCHER. Metamorphosis I (1937). Disponível em: http://www.mcescher.com/, acesso em 06 jun. 2011. RENÉ MAGRITTE. Le Blanc-seing (1965). Disponível em: http://obviousmag.org/archives/2006/03/rene_magritte_1.html, acesso em 06 jun. 2011. VICTOR MEIRELLES. Vista do Desterro (1851). Disponível em: http://www.museuvictormeirelles.org.br, acesso em 30 abr. 2011.
  • 49. 49 ANEXO A – Levantamento fotográfico: Mercado Público – Espaço interno
  • 50. 50
  • 51. 51
  • 52. 52 ANEXO B – Levantamento fotográfico: A região do Mercado vista do aterro da Baía Sul
  • 53. 53
  • 54. 54 ANEXO C – Monumento Miramar
  • 55. 55 ANEXO D – Intervenções I, II e III – Etapas de desenvolvimento. Intervenção I - 1 – Referência visual Intervenção I - 2 – Máscara e traços do cenário
  • 56. 56 Intervenção I - 3 – Referência visual Intervenção I - 4 – Trabalho finalizado
  • 57. 57 Intervenção II - 1 – Referência visual Intervenção II - 2 - Máscara
  • 58. 58 Intervenção II - 3 – Referência visual Intervenção II - 4 – Trabalho finalizado
  • 59. 59 Intervenção III - 1 – Referência visual Intervenção III - 2 - Máscara
  • 60. 60 Intervenção III - 3 – Referência visual Intervenção III - 4 – Trabalho finalizado