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Minha Dor também era Secreta, diz Mulher que Sofreu Mutilação Genital
THAIS FASCINA, Folha de São Paulo 08/03/2015
H., 30, foi submetida à mutilação genital feminina aos 12 anos em Serra Leoa. O corte do
clitóris, uma tradição local que marca a transformação de meninas em mulheres, foi feito
pela própria mãe. A prática deve atingir 200 milhões de mulheres em 15 anos.
H. fugiu para o Brasil há um ano. Ela se mudou para Brasilândia (SP) e trabalha no centro
como cabeleireira. Decidiu fugir quando a mãe, já idosa, a ameaçou de morte porque ela se
recusou a substituí-la na função de mutilar mulheres.
Era cedo, ainda pela manhã. Sempre é de manhã, já que o sol forte pode piorar ainda mais a
hemorragia que viria com o corte. Éramos 12 meninas no porão de uma residência em
Freetown , onde eu nasci e morava. Não sabíamos de nada. Ninguém nos falava por que
estávamos ali e muito menos o que ia acontecer. Quando alguma de nós perguntava, diziam
que era uma festa. Eu era jovem, tinha 12 anos, mas lembro desse lugar. Havia muitas
mulheres vestidas e pintadas de branco nas mãos, no rosto, tudo. Eram só mulheres. Parecia
mesmo uma festa, com dança e tambores que não paravam de tocar. Depois descobri o
porquê. Minha mãe me mutilou ali, arrancou com uma lâmina meu clitóris e costurou minha
vagina. Assim como mutilou as outras meninas que me acompanhavam. Ela era líder da
"Bundu Society" [espécie de sociedade secreta em que mulheres mais velhas têm a
responsabilidade de preparar meninas para a idade adulta]. Atendia pelo nome de "Chairlady".
De uma coisa eu lembro: de gritar enquanto meu clitóris era arrancado. E quanto mais eu
gritava, mais as mulheres tocavam
os tambores e cantavam. Assim, a
minha dor também era secreta.
Para cicatrizar o corte, evitar a
hemorragia e infecções, colocaram
uma pasta à base de folhas na
minha vagina.
Como presente, me deram para
comer uma papa doce misturada
com arroz. Permaneci nesse lugar
por duas ou três semanas para me
recuperar, não me lembro direito.
A tradição tem um ritual completo.
No último dia, fomos andando
pelas ruas até a margem de um rio
que não era tão profundo. As
mulheres mais velhas jogavam
objetos nas águas para que nós
pegássemos. Era o final, estávamos voltando para casa. Neste dia, lembro que escolhi a minha
roupa. Vestido novo, sapatos bonitos, colar, brinco e pulseira. Eu estava muito bonita e tinha
me tornado uma mulher. Se eu tive raiva? Não, não tive. Éramos jovens e a tradição, forte
demais. Todas as minhas amigas passavam pela mesma coisa.
Não tinha como fugir. Não me lembro de nenhuma garota dizendo "não quero fazer isso", mas
se ocorresse elas seriam agarradas à força. Ninguém ia escutar se alguém gritasse pedindo
socorro por causa dos tambores altos e do canto. As mulheres da "Bundu Society" eram fortes
e poderiam segurar alguém com violência. O destino era sempre o mesmo.
Um dia me apaixonei por um rapaz, que hoje é meu marido. No início, ele me perguntou se eu
tinha feito a mutilação. Eu disse que sim, mas não acho que isso tenha sido essencial para ele.
Há homens de onde eu venho que só querem mulheres mutiladas, outros não se importam
tanto com a tradição.
Sinto dor durante o sexo. Até hoje. Se transo com meu marido em um dia, a próxima vez só
será daqui a uma ou duas semanas. Às vezes fujo dele porque simplesmente não quero sexo,
mas ele quer. Por causa da mutilação, minha vagina foi costurada. Nunca sofri com nenhuma
infecção ou doença. Nada. Mas tive problemas no parto. Tenho duas filhas. Quando engravidei
da minha primeira, não tive complicações porque ela era pequena. Quando fui dar à luz à
segunda, foi diferente. Ela era grande, os médicos tiveram que abrir os cortes para ela passar.
Depois fui operada.
A relação com a minha mãe
continuou a mesma depois da
mutilação. Eu era pequena e
continuei fazendo o que ela
mandava. Tinha respeito. Mas tudo
mudou no dia que soube do meu
destino como filha mais velha. Com
minha mãe já idosa, eu deveria
tomar seu lugar na sociedade
secreta. Meu futuro era ser
"Chairlady" e cortar meninas. Disse
não. Olhei para minha mãe, que
estava com o dedo apontado na
minha direção: "Se você não fizer
isso, eu te mato".
Deixei minhas duas filhas, de seis
e nove anos, com a mãe do meu
marido. Consegui protegê-las da
mutilação e hoje elas estão
seguras.
Conversei com meu marido e
fugimos para o Brasil. Era um lugar
de que ouvíamos falar desde muito
jovens. Não quero voltar para a
África. Amo o Brasil, principalmente
a comida. A única tristeza que sinto
é ter deixado minhas filhas em
Serra Leoa. Trazer as duas para
morar comigo aqui seria o meu maior sonho. Mas vou fazer isso de que jeito?
Quando cheguei ao Brasil não consegui nada, nem português eu sei falar. Acabei arranjando
uma vaga de cabeleireira na Galeria do Rock. Não tenho raiva, nem penso no que aconteceu
comigo. Tento não lembrar desse passado e sigo em frente. Daqui a pouco vou ter um menino,
estou grávida de seis meses. Quero ensiná-lo a ser homem de verdade. Na África, mulheres
são responsáveis por limpar, lavar, cuidar dos filhos e do marido. O homem tem que ir trabalhar
para trazer o sustento pra família. É assim sempre.
Atividades
1) Explique o que é a clitoredoctomia e indique como esse procedimento médico é realizado.
2) Qual a importância cultural da clitoredoctomia nas sociedades africanas?
3) Indique os países africanos que possuem as maiores quantidades de mulheres que
passaram pela circuncisão feminina.
4) Explique quais as consequências da mutilação genital para as mulheres.
5) Indique outras cinco formas de violência contra a mulher encontradas no mundo atualmente.
6) Atualmente a Organização das Nações Unidas condena e proíbe a prática de mutilação
genital feminina mas a tradição ainda é realizada em muitos países. Como a ONU, o Brasil e as
organizações sociais podem coibir essa prática no mundo?
7) Indique quatro características socioculturais e políticas dos países que possuem o maior
número de mulheres mutiladas.
8) Identifique práticas culturais, sociais e políticas existentes ao longo da história que tentaram
diminuir ou até mesmo anular o prazer feminino.

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Mutilação Genital Feminina: A Dor Secreta de H

  • 1. Minha Dor também era Secreta, diz Mulher que Sofreu Mutilação Genital THAIS FASCINA, Folha de São Paulo 08/03/2015 H., 30, foi submetida à mutilação genital feminina aos 12 anos em Serra Leoa. O corte do clitóris, uma tradição local que marca a transformação de meninas em mulheres, foi feito pela própria mãe. A prática deve atingir 200 milhões de mulheres em 15 anos. H. fugiu para o Brasil há um ano. Ela se mudou para Brasilândia (SP) e trabalha no centro como cabeleireira. Decidiu fugir quando a mãe, já idosa, a ameaçou de morte porque ela se recusou a substituí-la na função de mutilar mulheres. Era cedo, ainda pela manhã. Sempre é de manhã, já que o sol forte pode piorar ainda mais a hemorragia que viria com o corte. Éramos 12 meninas no porão de uma residência em Freetown , onde eu nasci e morava. Não sabíamos de nada. Ninguém nos falava por que estávamos ali e muito menos o que ia acontecer. Quando alguma de nós perguntava, diziam que era uma festa. Eu era jovem, tinha 12 anos, mas lembro desse lugar. Havia muitas mulheres vestidas e pintadas de branco nas mãos, no rosto, tudo. Eram só mulheres. Parecia mesmo uma festa, com dança e tambores que não paravam de tocar. Depois descobri o porquê. Minha mãe me mutilou ali, arrancou com uma lâmina meu clitóris e costurou minha vagina. Assim como mutilou as outras meninas que me acompanhavam. Ela era líder da "Bundu Society" [espécie de sociedade secreta em que mulheres mais velhas têm a responsabilidade de preparar meninas para a idade adulta]. Atendia pelo nome de "Chairlady". De uma coisa eu lembro: de gritar enquanto meu clitóris era arrancado. E quanto mais eu gritava, mais as mulheres tocavam os tambores e cantavam. Assim, a minha dor também era secreta. Para cicatrizar o corte, evitar a hemorragia e infecções, colocaram uma pasta à base de folhas na minha vagina. Como presente, me deram para comer uma papa doce misturada com arroz. Permaneci nesse lugar por duas ou três semanas para me recuperar, não me lembro direito. A tradição tem um ritual completo. No último dia, fomos andando pelas ruas até a margem de um rio que não era tão profundo. As mulheres mais velhas jogavam objetos nas águas para que nós pegássemos. Era o final, estávamos voltando para casa. Neste dia, lembro que escolhi a minha roupa. Vestido novo, sapatos bonitos, colar, brinco e pulseira. Eu estava muito bonita e tinha me tornado uma mulher. Se eu tive raiva? Não, não tive. Éramos jovens e a tradição, forte demais. Todas as minhas amigas passavam pela mesma coisa. Não tinha como fugir. Não me lembro de nenhuma garota dizendo "não quero fazer isso", mas se ocorresse elas seriam agarradas à força. Ninguém ia escutar se alguém gritasse pedindo socorro por causa dos tambores altos e do canto. As mulheres da "Bundu Society" eram fortes e poderiam segurar alguém com violência. O destino era sempre o mesmo. Um dia me apaixonei por um rapaz, que hoje é meu marido. No início, ele me perguntou se eu tinha feito a mutilação. Eu disse que sim, mas não acho que isso tenha sido essencial para ele. Há homens de onde eu venho que só querem mulheres mutiladas, outros não se importam tanto com a tradição. Sinto dor durante o sexo. Até hoje. Se transo com meu marido em um dia, a próxima vez só será daqui a uma ou duas semanas. Às vezes fujo dele porque simplesmente não quero sexo, mas ele quer. Por causa da mutilação, minha vagina foi costurada. Nunca sofri com nenhuma
  • 2. infecção ou doença. Nada. Mas tive problemas no parto. Tenho duas filhas. Quando engravidei da minha primeira, não tive complicações porque ela era pequena. Quando fui dar à luz à segunda, foi diferente. Ela era grande, os médicos tiveram que abrir os cortes para ela passar. Depois fui operada. A relação com a minha mãe continuou a mesma depois da mutilação. Eu era pequena e continuei fazendo o que ela mandava. Tinha respeito. Mas tudo mudou no dia que soube do meu destino como filha mais velha. Com minha mãe já idosa, eu deveria tomar seu lugar na sociedade secreta. Meu futuro era ser "Chairlady" e cortar meninas. Disse não. Olhei para minha mãe, que estava com o dedo apontado na minha direção: "Se você não fizer isso, eu te mato". Deixei minhas duas filhas, de seis e nove anos, com a mãe do meu marido. Consegui protegê-las da mutilação e hoje elas estão seguras. Conversei com meu marido e fugimos para o Brasil. Era um lugar de que ouvíamos falar desde muito jovens. Não quero voltar para a África. Amo o Brasil, principalmente a comida. A única tristeza que sinto é ter deixado minhas filhas em Serra Leoa. Trazer as duas para morar comigo aqui seria o meu maior sonho. Mas vou fazer isso de que jeito? Quando cheguei ao Brasil não consegui nada, nem português eu sei falar. Acabei arranjando uma vaga de cabeleireira na Galeria do Rock. Não tenho raiva, nem penso no que aconteceu comigo. Tento não lembrar desse passado e sigo em frente. Daqui a pouco vou ter um menino, estou grávida de seis meses. Quero ensiná-lo a ser homem de verdade. Na África, mulheres são responsáveis por limpar, lavar, cuidar dos filhos e do marido. O homem tem que ir trabalhar para trazer o sustento pra família. É assim sempre. Atividades 1) Explique o que é a clitoredoctomia e indique como esse procedimento médico é realizado. 2) Qual a importância cultural da clitoredoctomia nas sociedades africanas? 3) Indique os países africanos que possuem as maiores quantidades de mulheres que passaram pela circuncisão feminina. 4) Explique quais as consequências da mutilação genital para as mulheres. 5) Indique outras cinco formas de violência contra a mulher encontradas no mundo atualmente. 6) Atualmente a Organização das Nações Unidas condena e proíbe a prática de mutilação genital feminina mas a tradição ainda é realizada em muitos países. Como a ONU, o Brasil e as organizações sociais podem coibir essa prática no mundo? 7) Indique quatro características socioculturais e políticas dos países que possuem o maior número de mulheres mutiladas. 8) Identifique práticas culturais, sociais e políticas existentes ao longo da história que tentaram diminuir ou até mesmo anular o prazer feminino.