1) A vida humana é marcada por uma busca de sentido e esperança, mas estas questões são relativizadas hoje em dia pela falta de uma fonte unificadora de significado. 2) A fé não é algo óbvio ou cômodo, requer humildade para aceitar que precisamos de ajuda para ser libertados do "eu" e receber o amor de Deus. 3) Testemunhar a fé é transmitir a inquietação da busca e a paz do encontro com Deus, convidando os outros a se reconciliarem com Ele durante a Quaresma.
1. MENSAGEM PARA A QUARESMA
DA CRUZ AO AMOR
A busca de Deus no desafio da fé
1. A raiz de cada vida humana está profunda e dramaticamente marcada por uma
procura de sentido e de esperança. São várias as questões inquietantes, pessoais e
colectivas, que atravessam a nossa existência. Hoje infelizmente, estas questões,
parecem ser relativizadas, porque se romperam quer ao nível cultural quer social as
fronteiras com aquela fonte unitária de sentido, que nos revela o significado pleno e
luminoso da própria existência.
Abandonar a busca do sentido da vida, deixarmos de questionar sobre o seu
significado ou resignarmo-nos a uma falta de esperança conduzir-nos-á a
empobrecermos a qualidade da vida para nós próprios e para os outros.
O Tempo Santo da Quaresma, ao convidar-nos a uma revisão sincera da nossa
vida à luz da fé em Jesus Cristo, Evangelho vivo de Deus, é o tempo propício e fecundo
para o aprofundamento sobre o sentido da nossa própria vida e da qualidade que damos
à nossa existência de peregrinos neste mundo.
As Catequeses quaresmais que vamos realizar nos diversos espaços da freguesia
em cada Domingo, neste Tempo da Quaresma, este ano sobre o Tema geral: "Da cruz
ao amor", ajudar-nos-ão neste percurso, que desejamos possa ser uma profunda
caminhada espiritual, que nos encaminhe ao encontro de Deus Pai em Cristo Jesus, Seu
filho e nos faça redescobrir com renovado encanto e beleza a Sua presença viva entre
nós .
.2. Como. nos diz o Santo Padre Bento XVI na Mensagem para esta Quaresma: "a fé não
.é um facto natural, cómodo, óbvio: é necessário humildade para aceitar que se precisa
que um Outro me liberte do "meu" para me dar gratuitamente o "seu".
Isto significa aceitar que aquilo que mais precisamos para ser felizes não pode
ser garantido simplesmente por lei ou por doutrina. Para gozarmos de uma existência
em plenitude precisamos de algo mais íntimo que nos é concedido gratuitamente: o
amor, que nos toma imagem e semelhança de Deus. Só Deus é a fonte pura e fecunda
do amor. E nós somos de Deus, pertencemos-lhe.
Crer nesta verdade não é, antes de mais, concordar com uma demonstração clara
ou com um projecto sem incógnitas: não se crê em qualquer coisa que se possa possuir e
gerir para própria segurança e prazer.
Crer é confiar: em alguém, aderir ao seu chamamento, colocar a própria vida nas
mãos de um outro, afim de que seja ele o único e o verdadeiro Senhor. Fé é entrega,
abandono, acolhimento de deus, que primeiro nos procura e se dá; não é posse, garantia
ou segurança humanas; "Crer significa estar à beira do abismo escuro, e ouvir uma voz
que grita: atira-te, receber-te-eÍ nos meus braços" e aceitar fazê-lo não como um acto
irracional mas na certeza do amor.
A Deus só chegamos pela via da amizade, cultivando intimidade, entrega em
verdadeiro amor. Sem me entregar, Deus permanece mistério longínquo, obscuridade.
Só a amizade profunda e verdadeira nos transforma. Também assim com Deus. Só na
fragilidade com que nos damos nos reencontramos e isso é amar. Só amamos quando
frágeis, nos entregamos, inteiramente, ao outro.
2. E quem crê, porque ama tem necessidade de renovar todos os dias o seu
encontro. Na busca sincera e honesta capaz de arriscar e de entregar-se ao outro
acontece o encontro, a revelação. Só quando fazemos alguma coisa juntos acontece o
amor.
Acredita quem confessa o amor de Deus apesar da não evidência do amor, quem
espera contra toda a esperança, quem está disposto e disponível a escutá-lo no silêncio
da consciência, no segredo do coração. Há sempre uma luz que nos é dada para iluminar
o caminho: um grande sinal nos é oferecido, Cristo, crucificado e ressuscitado, morto e
glorioso, que está vivo na· graça e no amor' confiados à família dos seus discípulos, a
Igreja.
3. Testemunhar a fé não é dar respostas prontas mas transmitir a inquietação da procura
e a paz do encontro. No apelo ardente de Paulo esta verdade soa hoje para nós com estas
impressionantes palavras: " Nós vos pedimos em nome de Cristo, reconciliai-vos com
Deus ... não recebais em vão a sua graça".
A Deus, elevamos, no início desta caminhada quaresmal, com confiança a
vontade de acolher este convite.
Façamo-lo com as palavras beIíssimas de Santo Agostinho:
"Meu Senhor,
minha única esperança,
faz que cansado, eu não cesse de Te buscar,
mas procure o teu rosto sempre com ardor.
Dá-me força para te procurar
Tu que te sabes fazer encontrar,
e me deste a esperança
de Te encontrar sempre.
Diante de Ti está a minha força
e a minha debilidade:
conserva aquela e cura esta.
Diante de Ti está a minha ciência
e a minha ignorância;
onde me abri acolhe o meu entrar;
onde me fechei, abre-me quando bater.
Faz que me lembre de Ti,
que Te escute, que Te ame. Amén!