O documento discute as novas regras para financiamento habitacional no Brasil em 2005, que prometem aquecer o mercado imobiliário. Bancos públicos e privados disponibilizarão R$ 23,8 bilhões em empréstimos, volume recorde. As regras facilitam o acesso ao crédito com taxas menores, prazos maiores e valores de imóveis mais baixos. No entanto, especialistas alertam que pode ser difícil absorver todo o dinheiro disponível e que a desconfiança dos consumidores ainda é um obstáculo.
Novas regras prometem aquecer mercado imobiliário com financiamento facilitado
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HABITAÇÃO Novas regras que entram em vigor este ano prometem aquecer o mercado imobiliário
Quase metade
Compra de casa deve ficar mais fácil MAURO VIEIRA, BANCO DE DADOS/ZH – 24/09/2004
da América
Latina vive mal
ALEXANDRE DE SANTI
x Especial/ZH Um novo ciclo previsto para o mercado da casa própria Cerca de 44% da popula-
ção da América Latina vive
Nunca houve tanto dinheiro em favelas ou bairros com
para quem quer financiar um infra-estrutura precária, se-
imóvel no Brasil. Somente neste gundo estudo divulgado on-
ano, bancos públicos e privados tem pela Comissão Econômi-
vão colocar à disposição R$ ca para a América Latina e
23,8 bilhões para o setor. Caribe (Cepal), órgão ligado
O montante cresceu como às Nações Unidas (ONU).
nunca por conta de uma deci-
ntre os bairros pobres,
são do Banco Central de corri-
gir distorções que permitiam as E apenas 24% não sofrem
com a falta de serviços básicos
instituições não usarem todos
os recursos para o financiamen- – como água, esgoto e ilumi-
to da casa própria. nação – e com problemas de
regularização de terrenos e
esta forma, os bancos priva- moradias. Nas áreas metropoli-
D dos ficaram obrigados a ofe-
recer este ano R$ 12,8 bilhões, a
tanas, as condições de vida são
menos agudas, mas seus habi-
totalidade dos depósitos dos Os recursos e a estimativa incorporador e os titulares de direitos sobre o terreno firmem tantes são menos favorecidos
clientes em caderneta de poupan- um “termo de afetação”. quanto ao acesso regulamenta-
s R$ 23,8 bilhões para empréstimos este ano, volume
ça, a novos mutuários. Em 2004, do a residências no que diz res-
recorde que soma recursos da Caixa e de bancos privados Recursos da Caixa para imóveis a preço de custo
o valor disponível nas instituições peito à posse.
s R$ 50 milhões estão garantidos para financiamento de s A Caixa Econômica Federal lançou no último dia 10 uma
privadas somou apenas R$ 2,8 bi- O trabalho também mostra
imóveis a preço de custo no Rio Grande do Sul linha de crédito de R$ 1 bilhão para construção de casas e
lhões. Além disso, a Caixa Eco- que a região é uma das mais
s 30% é o aumento na venda de imóveis novos previsto pelo prédios a preço de custo. No Estado, a Caixa espera financiar
nômica Federal pôs R$ 11 bilhões urbanizadas do mundo e que
Sinduscon/RS para 2005 2,5 mil unidades dentro desta modalidade, o que significa um
em recursos do Fundo de Ampa- há tendência de crescimento
ro ao Trabalhador e do Fundo de montante de R$ 50 milhões para os gaúchos. dos centros urbanos onde já
Garantia do Tempo de Serviço Por que deve ficar mais fácil comprar imóvel s O banco avalia que o valor médio dos imóveis do novo existe uma acentuada pobreza.
para a aquisição de imóveis, ante próprio programa, batizado de Carta de Crédito Associativo em Nos próximos 15 anos, a popu-
R$ 7 bilhões do ano passado. Flexibilização do financiamento Condições Especiais – Imóvel na Planta a Preço de Custo, lação das grandes cidades da
– Isso é inédito. Nunca houve s Os bancos privados e as construtoras acertaram um acordo deve girar em torno dos R$ 25 mil, beneficiando famílias com região aumentará cerca de 2%
tanto dinheiro para a construção para facilitar o financiamento de imóveis para famílias de renda de até R$ 1,5 mil. O valor máximo do empréstimo é de por ano – 3% nos países mais
civil – garante o consultor Durval baixa renda. O valor mínimo do imóvel caiu de R$ 80 mil para R$ 35 mil e a obra pode custar até R$ 72 mil por unidade. A pobres (Bolívia, Guatemala,
Pedroso, especialista no setor. R$ 60 mil, e o prazo de pagamento aumentou de 15 para 20 taxa de juro é 6% e o mutuário terá 20 anos para pagar o Haiti, Honduras e Paraguai).
Apesar da euforia, bancos e anos. financiamento. Esta modalidade só será aberta a sindicatos, Esse quadro representa um
construtores estão preocupados s Além disso, as taxas de juros (que hoje são de 12% ao ano) cooperativas, associações e pessoas jurídicas voltadas à aumento na necessidade de in-
sobre a real capacidade do merca- passarão para 9% para imóveis entre R$ 60 mil e R$ 80 mil e produção habitacional. vestimentos para evitar que ha-
do de absorver os recursos, o que subirão gradualmente conforme aumenta o valor do bem, até ja deterioração maior das con-
pode implicar em penalidades pa- o teto de 12%. O que pode ainda dificultar dições de vida das populações
ra as instituições financeiras. Por s A novidade também atinge as classes mais altas porque o s Os construtores alertam que o grande déficit imobiliário está
da região. “O grande desafio é
isso, avaliam a flexibilização dos valor máximo do imóvel a ser financiado passará de R$ 300 concentrado nas famílias que podem pagar imóveis até R$ 80
prover de saneamento adequa-
financiamentos, o que resultaria mil para R$ 450 mil. O nível de comprometimento máximo da mil e que as mudanças propostas pela Abecip e pela Cbic não
do cerca da metade dos lares
em recursos para mais clientes. renda do mutuário com as parcelas também sobe, de 20% a seriam suficientes para aquecer o mercado como esperado.
pobres existentes nos centros
Bancos e construtores se com- 25%. Os bancos se comprometem a financiar até 80% do Além disso, o vice-presidente do Sinduscon/RS, Carlos Aita,
urbanos”, diz o documento.
prometeram a oferecer dinheiro valor do imóvel. acredita que seja necessário definir metas para implantação
Joan Mac Donald, responsá-
para imóveis mais baratos a taxas das medidas, para que os bancos não deixem para implantar
vel pelo estudo, propõe que es-
de juros menores, além de recur- Consumidores ganham mais segurança as mudanças somente no final do ano.
ses países estabeleçam um pla-
sos para imóveis mais caros. O s Uma alteração na Lei de Incorporações Imobiliárias prevê s Outra dificuldade apontada pelos especialistas é a
no de emergência para que as
acordo depende de aprovação do que os compradores assumam a obra em caso de falência da desconfiança dos consumidores para financiamentos de
cidades da região possam redu-
governo federal devido a contra- construtora. O patrimônio de afetação, como foi batizado o longo prazo.
zir os quadros atuais de carên-
partidas previstas na proposta: os dispositivo, separa a contabilidade de cada empreendimento – Quando a esmola é demais, o santo desconfia – diz a
cias e exclusão social.
bancos pedem maior remunera- e do patrimônio da construtora. Assim, os consumidores têm diretora administrativa da Associação Brasileira dos Mutuários
ção dos depósitos compulsórios mais garantias em receber o imóvel pronto. A empresa que da Habitação (ABMH) no RS, Luciane Adames, sobre a Estudo aponta
da poupança e as construtoras optar por esse modelo (não é compulsório) terá tributação
querem acesso a capital de giro, simplificada – alíquota de 7% da receita mensal recebida.
flexibilização dos financiamentos. bolsões de miséria
Para o consultor Durval Pedroso, especialista do setor da
que viriam dos R$ 12,8 bilhões. s Os bancos financiadores também correm menos riscos. construção civil, o desemprego e o achatamento da renda
Outro estudo da ONU divul-
Outros dois fatores agitam o se- Para constituir um patrimônio de afetação, basta que o afasta muitos consumidores na hora de comprar um imóvel.
gado ontem avalia que o Brasil
tor. O primeiro é uma mudança deve atingir as metas fixadas
na Lei de Incorporações Imobiliá- JÚLIO CORDEIRO/ZH
pela instituição para o fim da
rias, permitindo que os compra-
dores assumam a obra em caso
Construir por grupos pobreza extrema até 2015, mas
terá que dar atenção a 13 bol-
de falência da construtora, o que Programas de crédito associativo são uma alternati- sões de miséria que englobam
dá mais seguranças para os mu- va para construção de imóveis por grupos como o da 600 municípios em regiões
tuários. E a Caixa Econômica Fe- cooperativa habitacional dos funcionários da Assem- com 26 milhões de pessoas.
deral lançou um programa especí- bléia Legislativa do Estado, que já entregou dois em- Na avaliação do Programa
fico para construção de moradias preendimentos nesse modelo e hoje vê no plano da das Nações Unidas para o De-
a preço de custo, destinado a fa- Caixa Econômica Federal uma chance de lançar ain- senvolvimento (PNUD), os
mílias de renda até R$ 1,5 mil, da em 2005 um novo condomínio. bolsões de miséria brasileira
faixa onde está concentrado 92% O empreendimento mais recente, de quatro anos não estão em regiões do inte-
do déficit habitacional do país. atrás, abriga 42 famílias na zona sul da Capital. As rior e, na verdade, se agravam
Especialistas dizem que ainda é unidades custaram entre R$ 95 mil e R$ 110 mil, nas metrópoles como Rio e
cedo prever se o consumidor vai mas foram erguidas por preços abaixo do mercado. São Paulo. A ONU considera
aderir em massa aos novos finan- – Os apartamentos seriam, no mínimo, 30% mais pobreza extrema pessoas que
ciamentos. O Sindicato da Indús- caros – opina o presidente da cooperativa, Flávio Dall vivem com menos de US$ 1
tria da Construção Civil do Esta- Agnol (foto ao lado). por dia e sem serviços como
do prevê que a venda de imóveis A escolha da construtora é feita por licitação, que água tratada e esgoto.
financiados cresça 30% em 2005. avalia aspectos técnicos e de saúde financeira.