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— Matt Caldwell e Leslie Murry —
(Matt Cadwell: Texas Tycoon)
Diana Palmer
Série Homens do Texas 22
Digitalizado: Chris
Rico, atraente e sedutor.
Matt Caldwell era o sonho de toda mulher: um magnata texano rico, atraente e sedutor. Embora
muitas pretendentes houvessem tentado conquistar o solteiro mais cobiçado de Jacobsville,
nenhuma conseguira chamar a atenção de Matt. Porém, a misteriosa Leslie Murry estava prestes a
mudar isso. A nova funcionária da empresa o estava afetando mais do que ele queria admitir. Por
mais que Matt tentasse negar, a doce vulnerabilidade de Leslie tinha o poder de despertar seu
instinto protetor. Bastara alguns beijos para Matt sentir-se tentado a possuir a bela e desejável
Leslie, embora ela não parecesse muito disposta a querer receber o que ela tinha a oferecer.
Ainda assim, prometeu a si mesmo que só se entregaria aos encantos de Leslie se ela lhe contasse
qual era o segredo do passado que mantinha tão bem escondido.
El soltero más codiciado (2000) Serie: Hombres de Texas
Título Original: Matt Caldwell: Texas tycoon (2000)
Editorial: Harlequin Ibérica Sello / Colección: Súper Jazmín 391
Género: Contemporáneo
Protagonistas: Matt Caldwell y Leslie Murry
Sinopse:
Ele era um Texano rico, poderoso e algo cínico, e embora muitas mulheres tinham tentado
ganhar o coração do Matt Caldwell, o solteiro mais cobiçado de Jacobsville, nenhuma o tinha
conseguido. Mas com a Leslie Murry todo ia ser diferente. Matt se sentia muito atraído por essa
misteriosa secretária que lutava por deixar pra atrás um passado traumático. Apesar de que a
princípio não queria admiti-lo, a vulnerabilidade da Leslie despertava nele todo seu instinto de
proteção e, depois do primeiro beijo, já não pôde resistir a fazer sua aquela mulher tão
necessitada da ternura de um homem; mas não estava disposto a baixar a guarda até havê-la
convencido de que lhe entregasse também seu coração.
Sinopse:
Ed levou Leslie para Jacobsville para que ela pudesse recomeçar de forma pacífica uma vida
tumultuada. Ele só não contava que a amiga fosse despertar a atenção do primo dele, o solteiro mais
cobiçado da região, Matt. E justamente por não se apaixonar à primeira vista, não fazer o possível
para seduzi-lo, inclusive, não suportar que ele a toque. Matt desconfia de que Leslie esconde algo, a
começar pelo motivo que a levava a mancar e só deixar Ed cuidar dela. Por isso, ele decide tirar a
história a limpo, mas pode ser que a verdade seja demais para ele… e faça Leslie fugir mais uma vez.
CAPÍTULO 1
No alto da colina, via-se um homem sentado elegantemente em seu cavalo e uma jovem a
observá-lo. Ele admirava o amplo pasto que se estendia diante deles. A fazenda era pequena para os
padrões texanos, mas, em Jacobsville, era grande o suficiente para colocar seu dono entre os dez
maiores fazendeiros da região.
— Empoeirada, não? — perguntou Ed Caldwell com um sorriso, alheio ao fato de ambos estarem
sendo observados por outro cavaleiro a distância.
— Dou graças a Deus por trabalhar na corporação e não aqui. Gosto de respirar um ar mais
fresco e despoluído.
Leslie Murry sorriu. Seu rosto de traços clássicos não chegava a ser exatamente bonito, mas era
muito marcante. Os cabelos loiros lhe chegavam até acima dos ombros e tinham um bonito caimento
natural. Em seu semblante, o que mais se destacava eram os expressivos olhos acinzentados e os
lábios bem delineados.
Leslie tinha uma personalidade bastante reclusa, mas nem sempre havia sido assim. Na época
da adolescência, ela fora uma jovem muito ani5mada e expansiva. Mas no presente, com vinte e três
anos, lembrava mais uma monja do que uma mulher em plena juventude. Para quem a conhecera
antes, a mudança fora radical. Conhecera Ed Caldwell na época da faculdade, em Houston. Ele se
formara quando Leslie estava no segundo ano. Mas ela desistira do curso no semestre seguinte, para
ir trabalhar como secretária na firma de advocacia do pai dele, em Houston. A situação acabara se
complicando por lá, e Ed a “socorrera” mais uma vez. Na verdade, fora por causa dele que ela havia
acabado de ser contratada como secretária executiva da Empresa Caldwell, que pertencia ao primo
dele.
Leslie não conhecia Mather Gilbert Caldwell, ou Matt, como ele costumava ser chamado. As
pessoas costumavam dizer que ele era uma pessoa gentil e agradável. O próprio Ed vivia afirmando
isso. De fato, estavam ali para que Ed pudesse apresentá-la ao primo dele, mas, até aquele momento,
só haviam se deparado com poeira, gado e cowboys.
— Espere aqui — disse Ed. — Vou dar uma volta pelas redondezas para ver se encontro Matt.
Dizendo isso, ele esporeou o cavalo e saiu em uma cavalgada meio desajeitada. Enquanto o via
se afastar, Leslie teve de se esforçar para conter o riso diante da maneira canhestra como Ed
cavalgava. Ficou evidente que ele se sentia mais à vontade ao volante de um carro do que sobre a
sela de um cavalo. Mas, evidentemente, ela não iria cometer a indelicadeza de dizer isso a ele. Afinal,
Ed era o único amigo com o qual ela sempre pudera contar e a última coisa que desejava no mundo
era magoá-lo. Ele também era o único que sabia tudo sobre seu passado.
Leslie não tinha noção de que também estava sendo observada naquele momento. O
desconhecido, que até então se mantivera a certa distância, decidiu se aproximar, sentindo-se
estranhamente atraído por aquela figura feminina. O modo como ele se aproximou foi tão sorrateiro
que sua presença só foi notada quando o cavalo resfolegou, poucos metros atrás dela. Somente então
Leslie olhou para trás.
O desconhecido trajava uma roupa de trabalho, como a dos outros cowboys, mas a semelhança
entre eles terminava aí, pois a aparência daquele homem era muito mais bem cuidada do que a dos
outros que ela vira na fazenda. A atitude dele parecia um tanto intimidadora, com aquele ar
determinado e a mão pousada sobre a coxa.
Naquele momento, os olhos negros de Matt Caldwell encontraram os dela.
— imagino qué Ed a tenha trazido até aqui — ele foi o primeiro a falar.
Leslie segurou as rédeas com mais força. A voz dele tinha um tom profundo, inquietador.
— Eu… Sim. Ele… Ele me trouxe até aqui.
Matt estava surpreso com aquilo. Seu primo costumava gostar de mulheres glamourosas e
sofisticadas. Vivia levando-as à fazenda para impressioná-las, mas Matt não se importava com isso.
Contudo, tivera uma manhã difícil e não estava com muita disposição para servir de anfitrião.
— Então gosta dos ares da fazenda? — disse ele, sem fazer muita questão de parecer simpático.
— Se quiser, posso arranjar uma corda para você tentar laçar o gado.
Leslie se tornou ainda mais tensa. Quanta indelicadeza!
Eu… vim conhecer o primo de Ed. Ele é um homem muito rico. — Leslie se arrependeu no
mesmo instante de haver dito aquilo. Como pudera dizer algo tão idiota a um estranho? — Quero
dizer, ele é o dono da empresa onde Ed trabalha. Onde eu trabalho — acrescentou.
Ele se inclinou um pouco para frente, estreitando o olhar.
— Qual é o verdadeiro motivo de você ter vindo até aqui com Ed?
Leslie engoliu em seco. Aquele olhar intenso tinha um poder quase hipnotizador.
— Não creio que isso seja da sua conta — respondeu.
Ele não disse nada e apenas continuou a olhá-la.
— Por favor, pare de me olhar desse jeito — pediu ela. — Está me deixando nervosa.
— Veio conhecer o chefe, certo? — indagou ele. — Ninguém lhe disse que ele não é uma
pessoa fácil?
Leslie engoliu em seco mais uma vez.
— Dizem que ele é uma boa pessoa e que costuma ser gentil com os funcionários — falou ela.
— Algo que aposto que ninguém nunca disse a seu respeito — acrescentou, indignada com a ousadia
dele. Ele arqueou as sobrancelhas.
— Como sabe que não sou bom e gentil? — indagou ele, esforçando-se para conter o riso.
Pela sua atitude, está evidente que você não é im: pessoa confiável — respondeu ela, sem
titubear. Nie manobrou o cavalo e se aproximou o suficiente :ira fazê-la estremecer. Gostava de
mulheres que não se intimidavam com seu mau humor.
— Se não sou uma pessoa confiável, em que situação isso a coloca nesse momento? — indagou
com deliberada sensualidade.
Leslie ficou tão abalada com aquela súbita aproximação que tentou se afastar no mesmo
instante. Segurando as rédeas com força, agitou-as com tanto empenho que o cavalo se assustou e
ergueu-se Nobre as patas traseiras, fazendo-a ir parar no chão. A queda foi violenta, machucando o
quadril e o ombro esquerdo de Leslie.
Em questão de segundos, o desconhecido já estava ao lado dela, tentando levantá-la com
cuidado.
Leslie tentou se desvencilhar do contato, ainda assustada com o que acabara de acontecer.
— Não! — bradou ela, em um certo momento, levando Matt a afastar a mão que havia pousado
sobre o braço dela.
Ele a olhou com um ar de curiosidade e de preocupação ao mesmo tempo.
— Leslie! — gritou uma voz a certa distância. Ed se aproximou com seu’ cavalo o mais rápido
possível e assim que desmontou da sela ajoelhou-se ao lado dela.
Sinto muito — disse ela, recusando-se a olhar para o desconhecido que provocara o acidente. —
Eu puxei as rédeas com muita força e assustei o cavalo. Leslie notou que Ed olhou por cima do ombro
para o desconhecido, que havia ficado de pé.
— Você está bem? — perguntou Ed, voltando a olhá-la.
Ela assentiu. Porém, ambos notaram que Leslie estava muito trêmula.
— Hum, vocês já se apresentaram? — indagou Ed, olhando de um para o outro.
Matt olhou para o primo. Ficara aborrecido com a reação da namorada de Ed. Ela o estava
olhando como se ele houvesse feito aquilo de propósito quando, na verdade, ele fora o primeiro a
tentar ajudá-la.
— Da próxima vez em que decidir trazer uma maluca para minha fazenda, avise-me antes —
disse ele, voltando a montar no cavalo. — E melhor ir buscar o carro para levá-la embora. Ela não
parece se dar muito bem com animais.
— Mas ela monta muito bem — salientou Ed.
— Está bem, então. Até mais tarde.
Leslie viu quando o outro puxou o chapéu para frente e saiu galopando com elegância.
— Puxa — disse Ed, assim que ficou sozinho com Leslie —, faz tempo que não o vejo tão mal-
humorado. Nem imagino o que o fez ficar assim. Em geral, ele é a cortesia em pessoa, principalmente
quando há alguém ferido por perto.
Leslie limpou o jeans e olhou para o amigo.
— Ele veio até mim e se aproximou demais enquanto estávamos conversando. Entrei em pânico.
Espero que seu primo não o despeça por isso.
Ed arqueou uma sobrancelha.
— Não ouviu quando ele disse “minha fazenda”? Aquele é meu primo, Leslie.
Ela arregalou os olhos.
— Aquele era Matt Caldwell?
Ele assentiu. Ela deixou escapar um longo suspiro.
— Essa não. Que boa maneira de se apresentar ao patrão antes de começar em um novo
trabalho.
— Ele não sabe nada a seu respeito.
— E nem você vai falar — replicou ela, com firmeza. — Estou falando sério, Ed. Não quero ver
meu passado sendo vasculhado novamente. Vim para cá porque quero ficar longe de repórteres e de
produtores de cinema, e é assim que pretendo me manter. Já cortei os cabelos, comprei roupas
diferentes e estou usando lentes de contato. Fiz tudo que me pareceu viável para não ser reconhecida
e não vou abrir mão do que conquistei. Já faz seis anos — acrescentou ela, com tristeza.
— Por que essas pessoas não me deixam em paz?
— O repórter estava apenas seguindo uma indicação — disse Ed, em um tom gentil. — Um dos
homens que a atacou foi preso por estar dirigindo bêbado e alguém ligou o nome dele ao que
aconteceu com sua mãe, O pai dele é um político importante em Houston. Em um ano de eleição, era
de se esperar que a imprensa fosse tentar descobrir qual era o envolvimento do filho dele no caso de
sua mãe.
— Sim, eu sei, e foi justamente isso que levou aquele produtor idiota a pensar em fazer o grande
filme do ano. Era só o que me faltava. E eu que pensei que tudo isso já houvesse terminado. Que
ingenuidade a minha. — Após uma breve pausa, ela prosseguiu: — Eu gostaria de ser rica e famosa.
Talvez, assim, pudesse comprar um pouco de paz e privacidade.
Ed continuou a ouvi-la, em silêncio. Olhando na direção para onde Matt havia seguido, Leslie
continuou:
— Eu disse algumas indelicadezas para seu primo porque não sabia quem ele era. Acho que ele
vai mandar que me despeçam na segunda-feira logo cedo.
— Só passando por cima do meu cadáver — disse Ed. — Posso ser apenas um primo para ele,
mas também tenho minha cota de influência na empresa. Se ele a despedir, eu a defenderei.
— Faria mesmo isso por mim, Ed?
— Claro.
Ela sorriu.
— Fico feliz em poder contar com você. Realmente não suporto que… — Ela engoliu em seco. —
Você sabe que eu não suporto que nenhum homem se aproxime fisicamente de mim. O terapeuta
disse que é possível que eu consiga mudar isso algum dia, com o homem certo. Mas eu não sei…
— Não se preocupe com isso. Venha. Vou levá-la de volta para a cidade e lhe oferecer um
sorvete de baunilha. Que tal?
Leslie sorriu para ele.
— Obrigada, Ed.
Ele deu de ombros.
— Esse é apenas mais um exemplo do meu excelente caráter — brincou. Olhando na direção
para onde o primo seguira, acrescentou: — Matt não está muito normal hoje — disse como que para si
mesmo. — Vamos?
A distância, Matt Caldwell ficou observando os dois seguirem em direção ao carro de Ed. Seu
mau humor piorara depois daquele incidente. A namorada de Ed o fizera se sentir um verdadeiro idiota
e ele detestava se sentir assim.
Não deixou de notar que ela permitira que Ed a tocasse enquanto caminhavam, sendo que,
minutos antes, repelira seu contato como se ele tivesse alguma doença contagiosa.
Ed arranjara uma namorada esquisita dessa vez. Mas as preferências de seu primo não lhe
diziam respeito, concluiu, virando o cavalo e dirigindo-se ao local onde o gado se encontrava reunido,
mais adiante. Talvez o trabalho ajudasse seu mau humor a desaparecer.
Ed levou Leslie até o prédio de apartamentos onde ela morava.
— Acha mesmo que ele não vai me despedir?
— perguntou ela, preocupada.
Ed balançou a cabeça negativamente.
— Não, ele não vai despedi-la. Eu já lhe disse que não deixarei que isso aconteça. Agora pare de
se preocupar, está bem? Leslie forçou um sorriso.
— Obrigada mais uma vez, Ed.
— Não há de quê. Até segunda-feira.
— Até.
Leslie ficou olhando o belo carro esporte desaparecer a distância. Em seguida, subiu pensativa
para seu apartamento. Naquele dia, fizera um inimigo sem querer, mas esperava que isso não
acabasse afetando sua vida. De qualquer maneira, não havia mais como voltar atrás no que dissera a
Matt Caldwell.
Na segunda-feira de manhã, Leslie chegou à mesa de trabalho dez minutos antes do horário, a
fim de causar uma boa impressão. Simpatizara com Connie e Jackie, as outras duas mulheres que
dividiriam com ela a organização das tarefas administrativas de Ed, o vice-presidente de marketing e
pesquisa da empresa.
O trabalho não era difícil e o ambiente lhe pareceu agradável. A empresa ocupava todo um
prédio no centro de Jacobsville. Na verdade, tratava-se de uma antiga mansão em estilo vitoriano, que
Matt havia mandado reformar para usar como sede de sua empresa. Havia dois andares de escritórios
e uma cantina no local onde antes existira uma cozinha e uma sala de jantar.
Matt passava boa parte do tempo fora do escritório, resolvendo problemas externos. Além disso,
viajava com freqüência, pois além de seu próprio negócio, ele também fazia parte da diretoria de
outras empresas. Sem dúvida, Matt Caldwell era um homem muito bem-sucedido.
— Ele deve sair muito, não? — dissera ela, certa vez, quando Ed contara que o primo havia
viajado para Nova York, para participar de um jantar de gala.
— Com mulheres? — Ed sorriu. — Ele vive tendo de dispensá-las. Matt é um dos solteirões mais
cobiçados do Texas, mas nunca leva nenhuma mulher suficientemente a sério. Para ele, acho que
elas servem apenas para serem exibidas em festas. Talvez ele não queira se ligar a ninguém por
haver tido uma infância difícil.
— O que aconteceu? — Leslie franziu o cenho.
— A mãe dele o abandonou quando ele estava com seis anos de idade.
Ela conteve o fôlego.
— Por quê?
— Ela arranjou um namorado que não gostava de crianças. Ele disse que não iria criar Matt,
então ela o deu para meu pai. Por isso ele foi criado comigo. Essa é a razão de sermos tão próximos.
— E quanto ao pai dele?
— Nós… não falamos sobre o pai dele. Na verdade, achamos que nem a mãe dele sabia quem
era o pai de Matt. Houve muitos homens na vida dela.
— Mas o marido dela…
— Que marido? — Ed a interrompeu.
— Pensei que ela fosse casada.
— Beth não era do tipo que se casa. Ela não queria se prender a nada nem a ninguém. Ela
também não queria ter Matt, mas os pais dela fizeram um escândalo quando ela falou sobre aborto.
Eles queriam muito ter um neto e acolheram Beth e Matt assim que ele nasceu.
— Mas você disse que foi seu pai quem o criou — lembrou Leslie.
— E verdade. Nossos avós morreram em um acidente de carro e, um mês depois disso, a casa
deles foi destruída por um incêndio. Houve rumores de que o acidente foi intencional para o
recebimento do seguro, mas nada foi provado. Quando o incêndio aconteceu, Matt estava no jardim
com Beth, logo cedo pela manhã. Ela o havia levado para ver as rosas do jardim, o que não foi uma
atitude lá muito comum da parte dela. Essa foi a sorte de Matt, porque ele teria morrido se houvesse
ficado na casa, O dinheiro pago pelo seguro foi suficiente para Beth comprar algumas roupas novas e
um carro. Depois disso, ela deixou Matt com meu pai e foi embora com o primeiro homem que
apareceu.
O tom de voz de Ed estava repleto de indignação.
— Meu avô deixou algumas ações da fazenda para ele, junto com uma pequena herança que ele
só poderia obter ao completar vinte e um anos. E foi isso que impediu Beth de colocar as mãos nisso
também. Quando ele herdou a herança, mostrou logo que tinha talento para administrá-la e foi
aumentando a fortuna.
— E o que aconteceu à mãe dele? — perguntou Leslie.
— Ouvimos dizer que ela morreu há alguns anos. Matt nunca fala nela.
— Puxa, ele teve uma vida difícil.
— Sim — anuiu Ed. — Mas você também sabe o que é isso melhor do que ninguém.
Leslie sorriu, com ar de frustração.
— Acho que sim. Meu pai morreu há vários anos. Minha mãe fez o melhor, que pôde para nos
sustentar. Ela não era muito inteligente, mas era bonita e usou o que tinha a seu dispor. — Leslie
suspirou. — Ainda não consegui perdoar o que ela fez. Não é horrível você destruir sua própria vida e
a de várias outras pessoas em uma questão de segundos? E tudo por quê? Por ciúme, quando não
havia sequer motivo para isso. Ele não se importava comigo, queria apenas se divertir à custa de uma
garota inocente. Ele e os amigos bêbados. — Ela estremeceu, sob o efeito das lembranças dolorosas.
— Minha mãe pensava que o amava, mas o acesso de ciúme dela não o poupou, e ele acabou
morto.
— Concordo que ela não deveria ter atirado, mas não há desculpa para o que ele e os amigos
estavam fazendo com você, Leslie.
Ela assentiu.
— Eu sei. Mas prefiro esquecer tudo isso e seguir em frente.
Felizmente, para ela, Ed não tocou mais naquele assunto.
Matt apareceu no escritório alguns dias depois, naquela mesma semana. Leslie não pôde deixar
de se perguntar qual o tamanho do problema que criara para si mesma naquele primeiro encontro.
Ela estava digitando alguns relatórios no computador e levantou a vista assim que sentiu a
presença dele à porta. Seus olhares se encontraram.
Matt trajava um elegante terno cinza, com camisa branca e gravata verde-escura. Estava
segurando um cigarro apagado, e Leslie torceu para ele não acender o cigarro ali, pois ela era alérgica
à fumaça de tabaco.
— Então você é a nova secretária de Ed — falou ele.
— Sim — ela concordou.
— O que você fez para conseguir o emprego? — perguntou Matt, com ironia. — E com que
freqüência?
Leslie pestanejou. Não estava entendendo direito o que ele estava insinuando Desculpe-me, mas
não entendi a pergunta.
— Por que Ed a escolheu em detrimento de outras dez candidatas mais qualificadas?
— Oh, isso! — Leslie hesitou. Claro que não poderia contar a verdade a ele. — Tenho alguma
experiência nesse ramo de negócios porque trabalhei como assistente do pai dele durante quatro
anos, no escritório de advocacia. Posso não ter o diploma de bacharelado, que seria preferível, mas
tenho experiência. Ed disse que, para ele, isso era suficiente.
— Por que não cursou a faculdade? Ela engoliu em seco.
— Cheguei a cursar alguns anos, mas… tive de parar por problemas pessoais.
— Continua tendo problemas pessoais, srta. Murry — afirmou Matt. — E pode me colocar como
o primeiro deles. Eu tinha outros planos para esse cargo que você está ocupando. Portanto, espero
que seja mesmo tão competente quanto Ed acredita que você seja.
Dizendo isso, levou o cigarro aos lábios. Mas afastou-o logo em seguida e olhou para a ponta
molhada. Então suspirou, voltando a segurá-lo entre os dedos.
— Você fuma? — perguntou Leslie.
— Eu tento.
Enquanto ele falava, uma atraente senhora de meia-idade e com cabelos loiros se aproximou
dele.
— Preciso que assine isto aqui, sr. Caldwell. E o sr. Bailey está esperando-o na sua sala, para
falar sobre aquela comissão da qual o senhor quer que ele participe.
— Obrigado, Edna.
Edna Jones sorriu.
— Bom dia, srta. Murry. Está se mantendo muito ocupada por aqui?
— Sim — respondeu Leslie, com um sorriso sincero.
— Não deixe que ele acenda isso — continuou Edna, apontando para o cigarro de Matt. — Se
precisar de uma dessas… — Ela mostrou a pistola d’água que estava segurando. — Posso
providenciar uma para você. — Ela sorriu para Matt, que continuou sério. — Aposto que ficará
contente em saber que já equipei cada uma das garotas das outras salas com uma destas, sr.
Caldwell. Portanto, pode contar conosco para ajudá-lo a parar de fumar.
Matt continuou olhando para ela, que riu feito uma garota vinte anos mais nova, antes de acenar
para Leslie e sair andando pelo corredor. Matt pensou em fazer uma careta de zombaria, mas se
conteve a tempo. Não era bom demonstrar nenhuma fraqueza ao inimigo.
Olhou com frieza para Leslie, ignorando o brilho de divertimento nos olhos dela. Então assentiu e
seguiu Edna pelo corredor, com o cigarro molhado entre os dedos.
CAPÍTULO 2
Desde aquele primeiro encontro no trabalho, ficou muito claro que Leslie que Matt desaprovava
totalmente o fato de ela estar ali. A implicância de Matt chegava ao ponto de ele pedir a ela que fizesse
tarefas desnecessárias, como digitar dados a respeito do gado de dez anos antes e que nunca haviam
sido passados para o computador.
Até mesmo Ed ficou aborrecido ao saber daquilo.
— Temos secretárias para fazer esse tipo de serviço — resmungou ele, olhando as páginas
impressas sobre a mesa dela. — Preciso de você para os projetos.
— Então diga isso a seu primo.
Ed balançou a cabeça negativamente.
— Não com o humor que ele tem andado. Matt anda meio esquisito ultimamente.
— Sabia que a secretária dele anda armada?
— brincou Leslie. — Ela carrega uma pistola d’água consigo.
Ed riu.
— Matt pediu a ela que o ajudasse a parar de fumar. Comprou uma porção daqueles brinquedos
e deu uma para cada secretária. Todas as vezes que Matt leva um cigarro aos lábios, elas “atiram”
nele.
— Garotas perigosas — falou ela, rindo.
— Pode apostar que sim. Eu já vi…
— Não há nada para fazer por aqui?
Uma forma firme e grave soou atrás de Ed.
— Desculpe-me, Matt — Ed disse imediatamente. — Eu estava apenas inteirando Leslie a
respeito de algumas coisas. Deseja alguma coisa?
— Preciso de uma atualização a respeito das cabeças de gado que mandamos para Balienger —
disse ele. Então voltou-se para Leslie e estreitou o olhar. — Esse tipo de trabalho é seu, não? Ela
assentiu, engolindo em seco. Ed foi até a sala dele, logo ao lado, atender ao telefone que havia
começado a tocar. Leslie se tornou tensa quando Matt se aproximou de sua mesa e pegou alguns
papéis para examinar.
— Pensei que você tivesse experiência nisso — disse a ela. — Metade do texto está digitado
errado.
Leslie olhou para os papéis e assentiu.
— Sim, está, sr. Caldwell. Sinto muito, mas não fui eu quem datilografou isso.
Claro que não havia sido ela. Aqueles papéis tinham mais de dez anos!, pensou indignada.
Matt se afastou da mesa, enquanto examinava o restante dos papéis.
— Então passe isso também para o computador, junto com todos os outros relatórios — mandou
ele. — Isso está um lixo.
Pelo visto, ele queria mesmo provocá-la de alguma maneira. Leslie sabia que havia centenas de
relatórios como aqueles para serem digitados e que o trabalho não demoraria horas nem dias, mas
meses para ser completado. Mas já que ele era o dono da empresa, claro que teria de obedecê-lo.
— Seu desejo é uma ordem, chefe — disse em um tom seco, recebendo um olhar surpreso por
parte dele. — Então devo deixar de lado tudo que Ed me pediu para fazer e passar os próximos meses
me dedicando a isso?
A brusca mudança de atitude de Leslie pegou-o desprevenido.
— Não estipulei um limite de tempo para isso — disse a ela. — Só mandei que fizesse.
— Oh, sim. Claro, senhor — ela concordou de imediato.
Ele respirou fundo, parecendo impaciente.
— Está se mostrando muito solícita, srta. Murry. Ou isso é apenas porque eu sou seu patrão?
— Sempre tento fazer aquilo que me pedem, sr. Caldwell. Bem, quase sempre. Desde que haja
um motivo plausível.
Ele arqueou uma sobrancelha.
— E o que você definiria como “motivo plausível’?
— Um motivo que contenha um fundo profissional e não uma implicância pessoal — respondeu
ela, de pronto.
Leslie se surpreendeu quando ele a olhou de uma maneira diferente e não respondeu. Então ele
foi até a porta da sala de Ed e olhou para dentro.
— Ed, já conseguiu aquele relatório que Angus nos prometeu? — disse ele.
Ed terminou o telefonema com algumas poucas palavras e mostrou a Matt a pasta que estava
segurando.
— Está aqui. Não lhe entreguei antes porque queria verificar os últimos índices de crescimento e
de ganho de peso do gado. Eu queria colocar isso em sua mesa ainda hoje, mas acabei ficando sem
tempo de examiná-lo.
Matt pegou a pasta e examinou os papéis por alguns segundos.
— Está aceitável. Ele fez um bom trabalho.
Enquanto ele falava, Leslie o observou discretamente. Sentiu um aperto no peito ao pensar no
garoto de seis anos que fora abandonado pela mãe. Sua própria infância também não havia sido fácil,
mas a de Matt fora ainda pior.
Ao sentir que estava sendo observado, ele olhou para ela. Embaraçada, Leslie desviou o olhar
no mesmo instante. Matt se perguntou o que ela estivera pensando para ter aquela reação.
— Precisa de mais alguma coisa? — a pergunta de Ed interrompeu-lhe os pensamentos.
Matt deu de ombros.
— Por enquanto, não. — Olhou mais uma vez para Leslie. — Não se esqueça de refazer os
arquivos que eu pedi.
Depois que Matt saiu, Ed continuou olhando para a porta fechada durante algum tempo.
— Que arquivos?
Leslie explicou os detalhes a ele.
— Mas aquilo está desatualizado — murmurou Ed, pensativo. — E ele nunca se importou com
aqueles dados. Não entendo por que ele lhe pediu isso.
Ela se inclinou para frente.
— Porque foi uma forma de me irritar e de me fazer trabalhar mais ainda! — cochichou Leslie,
em um tom irritado.
Ed arqueou as sobrancelhas.
— Mas Matt não é do tipo que faz esse tipo.
— Isso é o que você pensa. — Leslie pegou os papéis que Matt havia deixado sobre a mesa —
Começarei por esses quando terminar de organizar sua correspondência. Acha que ele vai querer que
eu fique depois do expediente? Mas vai ter de me pagar as horas extras. — Sorriu ao acrescentar: —
Quem sabe isso não o desanime um pouco?
— Deixe-me primeiro perguntar a Matt — Ed se voluntariou. — Faça seu trabalho normal, por
enquanto.
— Tudo bem. Obrigada, Ed.
Ele deu de ombros.
— Para que servem os amigos? — disse, com um sorriso.
O escritório era um ótimo lugar para se trabalhar. Leslie se divertia vendo as outras secretárias
“sabotando” as tentativas de fumar de Matt. Um dos momentos divertidos que ela presenciou foi
quando Matt estava tentando acender um cigarro e a secretária dele se escondeu atrás de uma das
plantas do escritório e mirou a pistola d’água no cigarro, apagando-o.
Outro incidente engraçado foi quando ele deixou cigarro aceso sobre a mesa de Bessie David e
ela “acidentalmente” o deixou cair na xícara de café dele, que se encontrava logo ao lado. Matt olhou
para a xícara, então lançou um olhar acusador para Bessie.
— O senhor nos deu permissão para isso — lembrou Bessie.
Com uma careta de desgosto, ele deixou a xícara para trás e saiu. Leslie presenciara tudo de um
canto da sala, de onde não fora vista. Durante todo o tempo, tivera de se esforçar para conter o riso.
Surpreendia-se com a maneira como Matt era amigável e gentil com os empregados. Com ela, no
entanto, ele continuava mantendo uma atitude implicante. Em certos momentos, perguntava-se o que
ele faria se ela usasse a pistola d’água que a secretária dele havia lhe dado. Quando deu por si,
estava rindo, imaginando Matt Caldwell correndo atrás dela, furioso, pela rua principal de Jacobsville.
Alguns dias depois, Matt apareceu no escritório de Ed segurando um cigarro entre os dedos.
Apesar da atitude das outras secretárias, Leslie não disse nada ao vê-lo segurando o cigarro apagado.
— Quero ver a resposta da Associação dos Criadores de Gado sobre o teste de brucelose.
Leslie olhou para ele.
— Desculpe-me?
Matt olhou-a em silêncio por um instante. Ele estava se acostumando à presença dela cada vez
mais, e não estava gostando nada disso.
— Ed me disse que você tinha uma cópia do relatório — disse ele. — Chegou junto com a
correspondência de ontem.
— Está bem.
Leslie sabia onde a correspondência fora deixada. Em silêncio, foi até a caixa de entrada e
pegou o envelope com o símbolo da Associação dos Criadores de Gado. Então o entregou a Matt.
Durante o tempo em que a observara, Matt notou que ela estava mancando um pouco. Não era
possível ver as pernas dela, porque Leslie estava usando uma saia longa, como tantas outras com as
quais ele já a vira vestida. Era como se Leslie não gostasse de chamar atenção sobre seu corpo.
— Você está mancando. Foi consultar um médico depois da queda que sofreu na minha
fazenda?
— Não foi preciso — respondeu ela, sem hesitar. Foi um machucado leve que agora está
dolorido.
Só isso.
Matt apertou o botão do interfone sobre a mesa dela.
— Edna, marque uma consulta para a srta. Murry com Lou Coltrain o mais rápido possível. Ela
caiu de um cavalo, na minha fazenda, e ainda está mancando. Quero que ela faça alguns exames
para ver se está tudo bem.
— Não! — Leslie protestou.
— Avise-a quando a consulta estiver marcada. Obrigado — ele agradeceu e desligou. — Então
os olhos negros encontraram os de Leslie. — Você irá ao médico, sim.
Ela desviou o olhar. Detestava médicos. O médico da sala de emergência, em Houston, um
homem já aposentado e que não parecia haver sido muito dedicado à profissão, havia feito com que
ela se sentisse totalmente humilhada enquanto a examinava, dizendo coisas horríveis a respeito de
sua moral. Ela nunca se recuperara daquele trauma duplo, apesar do esforço dos terapeutas com os
quais ela havia se tratado depois.
Enrijeceu o maxilar e olhou para Matt mais uma vez.
— Eu já disse que não estou machucada.
— Você trabalha aqui. Eu sou seu patrão e você será examinada. Ponto final.
Leslie sentiu vontade de pedir demissão. Gostaria de poder fazê-lo, mas não teria para onde ir se
saísse dali. Houston estava fora de cogitação. Sabia que seria encontrada pelos repórteres assim que
colocasse os pés na cidade, apesar de seu disfarce.
Ela respirou fundo, tentando se controlar. Matt pareceu surpreso com aquela atitude.
— Não quer se certificar de que o ferimento não a deixará manca permanentemente?
Leslie levantou o queixo, com ar de orgulho.
— Sr. Caldwell, eu sofri um acidente quando tinha dezessete anos e minha perna ficou com uma
lesão permanente. Eu sempre manquei um pouco. Portanto, não foi a queda do cavalo que provocou
isso.
Matt pareceu conter o fôlego por alguns segundos.
— Mais um motivo para você ir fazer os exames — replicou ele. — Pelo visto, gosta de viver
perigosamente porque não deveria nem haver montado naquele cavalo.
— Ed disse que o cavalo era manso. Na verdade, foi por minha culpa que ele empinou. Eu o
assustei quando puxei as rédeas de repente.
Matt estreitou o olhar.
— Sim, eu lembro. Estava tentando se afastar de mim. Pelo visto, acha que eu tenho alguma
doença contagiosa.
— Não é isso — refutou Legue. — Só não gosto de se tocada.
Ed a toca quando quer.
Leslie não imaginou como responder aquilo sem ter de contar tudo a ele. E não suportaria que
ele soubesse a verdade sórdida sobre seu passado.
— Não gosto de ser tocada por estranhos — disse apenas. — Mas eu e Ed nos conhecemos há
muitos anos. E… diferente com ele.
Matt estreitou o olhar.
— Deve ser.
O sorriso irônico que ele mostrou em seguida deixou-a aborrecida.
— Você parece um rolo compressor, não? — falou de repente. — Só porque é rico e poderoso
acha que nenhuma mulher é capaz de resistir a você.
Matt não gostou de ouvir aquilo. Um brilho perigoso surgiu nos olhos dele.
— Não deveria dar ouvidos a fofocas — disse ele, em um tom perigosamente calmo. — Ela era
uma garotinha mimada que pensava que o pai poderia comprar o homem que ela quisesse. Mas
quando ela descobriu que isso não era possível, começou a trabalhar para um amigo meu e passou
algumas semanas me perseguindo por Jacobsville. Até que cheguei em casa uma noite e a encontrei
na minha cama, vestida apenas com um lençol. Eia a coloquei para fora, mas ela saiu dizendo para
todo mundo que eu a havia atacado. Ela continuou dizendo isso no tribunal, até minha governanta
testemunhar e dizer toda a verdade.
— Ah, meu Deus — murmurou Leslie.
Então, além dos problemas que ele havia tido com a mãe, Matt ainda tivera de enfrentar aquilo?
Não sabia nada sobre aquele incidente do passado dele, mas, pelo visto, seu comentário o levara a
pensar que ela sabia.
Os lábios dele se curvaram em um sorriso amargo.
— Mas, até o julgamento, ela conseguiu fazer com que me prendessem e me acusassem de um
crime que eu não cometi — continuou ele. — Fiquei famoso na época. O sujeito com um passado
imaculado que de repente virara um criminoso. Depois ela tentou o mesmo truque com um empresário
do ramo de petróleo, em Houston. Só que ele me chamou para testemunhar a favor dele. Quando ele
ganhou a causa, fez com que ela fosse indiciada por fraude e extorsão. E ela foi presa.
Leslie sentiu o estômago revirar. Matt também já havia passado momentos realmente difíceis na
vida. Aquilo explicava por que ele não se casara. Casamento era um compromisso que envolvia
confiança e, pelo visto, ele não confiava em nenhuma mulher.
E, certamente, isso também explicava a hostilidade que Matt demonstrara em relação a ela.
Talvez estivesse pensando que começara a trabalhar na empresa com a intenção de cometer algum
golpe ou até de causar algum escândalo público. Se pelo menos pudesse dizer a ele que era
justamente disso que ela estava fugindo…
— Talvez esteja pensando que eu sou desse tipo — disse, após um momento de silêncio. — Mas
eu não sou.
— Então por que age como se eu fosse atacá-la sempre que chego perto de você? — indagou
Matt.
— Ed é seu amante? — insistiu ele, quando Leslie permaneceu em silêncio.
— Pergunte a ele.
Matt rolou o cigarro apagado entre os dedos, olhando para ela.
— Você é como se fosse um quebra-cabeça para mim — confessou ele.
— Mas eu me considero muito simples — disse Leslie, forçando um sorriso. Em seguida voltou a
ficar séria ao dizer: — Não gosto de médicos. Principalmente do sexo masculino.
Lou é uma médica — salientou Matt. — Ela e o marido são médicos e têm um filho pequeno.
—Oh…
Uma mulher. Isso tornaria as coisas mais fáceis, pensou Leslie. Mas, mesmo assim, não queria
ser examinada. O exame poderia denunciar qual havia sido a origem do problema, e ela não poderia
confiar que a médica manteria segredo.
— A decisão a respeito disso não depende de você — falou Matt. — Está trabalhando na minha
empresa e sofreu o acidente na minha fazenda, portanto, sou responsável por isso.
Leslie fitou-o nos olhos. De fato, não podia culpá-lo por sentir-se assim.
— Está bem — respondeu. — Deixarei que ela me examine.
— Sem mais protestos? — Matt arqueou uma sobrancelha.
Ela deu de ombros.
— O senhor é o patrão por aqui. Então, farei o que quer. Essa dra. Coltrain é a médica da
empresa?
— Sim.
Leslie mordeu o lábio inferior.
— E ela guarda o resultado dos exames como assunto confidencial, certo? — acrescentou ela,
com ar preocupado.
Matt não respondeu de imediato, ainda movendo o cigarro entre os dedos.
— Sim — ele disse. — E confidencial. Está me deixando curioso, srta. Murry. Por acaso está
escondendo algum segredo?
— Todos nós guardamos segredos — replicou Leslie. — Alguns mais sombrios do que outros.
Ele bateu o polegar na ponta do cigarro.
— E qual é o seu? Atirou em seu amante?
Leslie não ousou demonstrar nenhuma reação diante do comentário. Felizmente, conseguiu
permanecer impassível. Matt guardou o cigarro no bolso.
— Edna vai avisá-la quando a consulta com Lou estiver marcada — declarou ele, olhando para o
relógio. Então indicou o envelope. — Diga a Ed que peguei isso. Depois falarei com ele sobre esse
assunto.
— Sim, senhor.
Matt á estava a caminho da porta, mas resistiu ao impulso de olhar para Leslie. Quanto mais
descobria a respeito dela, mas intrigado se sentia. Ela tinha o poder de inquietá-lo. De uma maneira
que ele não sabia explicar.
Não houve como escapar da consulta ao médico. Leslie falou brevemente com a dra. Coltrain,
antes de ser mandada para a sala onde eram feitos os exames de raios X.
Uma hora depois, ela estava de volta ao consultório de Lou, observando a médica examinar as
chapas sobre uma placa iluminada. Lou pareceu preocupada.
— Não há nenhuma lesão pela queda, exceto alguns machucados — disse ela. Olhando para
Leslie, acrescentou: — Mas as fraturas em sua perna são mais antigas.
Leslie enrijeceu o maxilar e não respondeu nada. Lou voltou a se sentar à mesa, diante de Leslie.
— Não quer falar sobre isso, não é? — disse a médica, com gentileza. — Não vou insistir. Mas
você sabe que os ossos não cicatrizaram devidamente na época, não sabe? Por isso está mancando
até hoje. Eu deveria encaminhá-la para um cirurgião ortopedista.
— Pode me encaminhar, mas eu não irei — avisou Leslie.
Lou uniu as mãos sobre a mesa.
— Sei que não me conhece o suficiente para confiar em mim. Mas depois que estiver em
Jacobsville por algum tempo, saberá que sou de confiança. Não falo com ninguém sobre meus
pacientes, nem mesmo com meu marido. Prometo que não direi nada a Matt.
Leslie permaneceu em silêncio. Como sempre, era difícil se abrir com estranhos. Já havia sido
suficientemente difícil fazer isso com o terapeuta no passado.
A médica suspirou.
— Tudo bem, não vou insistir. Mas se precisar de alguém com quem conversar, pode contar
comigo.
Leslie levantou a vista para ela.
— Obrigada, doutora— agradeceu, com sinceridade.
— Você não é a companhia preferida de Matt, acertei? — Lou perguntou de repente.
Legue não conteve o riso.
— Não, não sou. Mais cedo ou mais tarde, acho que ele acabará encontrando uma maneira de
me despedir.
— Estranho, porque Matt se dá bem com todo mundo. Ele é muito gentil com as pessoas que
estima.
— Ele é um rolo compressor — afirmou Leslie.
— Parece que só consegue falar com as pessoas se estiver por cima delas — acrescentou e
cruzou os braços, parecendo pouco à vontade.
Então é isso, pensou Lou, imaginando se Legue tinha idéia do que sua linguagem corporal
estava denunciando. Alguém causara aquele ferimento na perna de Legue. Provavelmente um
homem.
— Você não gosta que as pessoas a toquem — disse Lou.
Leslie se endireitou na cadeira.
— Não.
Lou observou as roupas conservadoras que Leslie usava, porém não disse mais nada. Por fim,
ficou de pé e sorriu com gentileza.
— Não houve nenhuma lesão nessa última queda — explicou. — Mas volte a me procurar se a
dor piorar.
Leslie franziu o cenho.
— Como sabe que eu estava com dor? — perguntou ela, lembrando-se de que não havia
mencionado esse detalhe à médica.
— Matt disse que você estava fazendo uma expressão de dor todas as vezes que levantava da
cadeira.
Leslie se surpreendeu.
— Não imaginei que ele houvesse notado.
— Ele é muito observador.
Lou prescreveu um analgésico para a dor e avisou mais uma vez para Leslie procurá-la se a dor
não passasse.
Leslie assentiu e saiu do consultório em meio a uma espécie de torpor, imaginando o que mais
Matt Caldwell deduzira sobre ela apenas por meio de observação. Sentiu-se pouco à vontade com a
idéia.
Fazia menos de dez minutos que ela havia chegado ao escritório quando Matt apareceu à porta.
— E então? — perguntou ele.
— Eu estou bem — Leslie respondeu. — Fiquei apenas com alguns hematomas. Mas fique
tranqüilo, não vou processá-lo.
Matt não demonstrou nenhuma reação, embora estivesse aborrecido. Lou. não havia lhe dito
nada, exceto que Leslie era fechada feito uma concha.
Mas isso ele já sabia.
— Diga a Ed que eu vou ficar fora por alguns dias — avisou ele.
— Sim, senhor.
Matt olhou-a uma última vez e se retirou. Mas somente quando Leslie teve certeza de que ele já
havia se afastado suficientemente foi que ela começou a relaxar.
CAPÍTULO 3
Leslie voltou a ter pesadelos naquela noite. Na verdade, ela já havia deduzido que iria tê-los,
devido à consulta com a dra. Coltrain e ao exame de raios X.
Ter de usar sapatos de salto alto para trabalhar também não contribuíra muito para sua
recuperação. Como se não bastasse ter aqueles pesadelos horríveis, a dor em sua perna estava
quase insuportável.
No meio da noite, tomou duas aspirinas, na esperança de que o remédio amenizasse um pouco
a dor. Enquanto esperava o remédio fazer efeito, chegou à conclusão de que teria de abrir mão da
moda e voltar a usar sapatos baixos.
Contudo, isso não passou despercebido por Matt quando ele voltou para o escritório, três dias
depois. Ele estreitou o olhar ao vê-la andar em direção à sala dela.
— Lou deveria ter lhe receitado algum remédio para dor — disse ele, parando à porta.
Leslie havia acabado de tirar uma pasta do arquivo.
— E foi o que ela fez. Mas analgésicos me deixam muito sonolenta e não seria produtivo
trabalhar assim.
— Ficar sentindo a dor também não é produtivo. Ela assentiu.
— Eu sei disso. Tenho algumas aspirinas na bolsa, mas a dor não está muito forte. São apenas
alguns hematomas que logo desaparecerão. A própria dra. Coltrajn disse isso.
— Mas você não deveria ainda estar mancando depois de uma semana. Quero que vá se
consultar com Lou mais uma vez…
— Eu ando deste jeito há seis anos, sr. Caldwell — afirmou Leslie, com calma. — Se não gosta
de me ver mancando, talvez seja melhor não ficar me olhando.
Ele arqueou as sobrancelhas.
— Os médicos não podem fazer nada para curála disso?
Leslje o encarou.
— Eu odeio médicos!
A veemência da afirmação espantou Matt. A expressão de Leslie ficara totalmente alterada,
muito diferente do semblante tranqüilo que ela Costumava manter.
— Nem todos eles são ruins — salientou ele.
— Eu sei, mas eles não podem fazer milagres. Reconstituir um osso esmigalhado não é tarefa
fácil.
Leslie se arrependeu assim que terminou de falar. Não pretendia contar a ele detalhes sobre sua
fratura.
No mesmo instante, um ar de questionameno surgiu no rosto dele. Felizmente, porém, Leslie foi
salva de ter de dar mais explicações quando Ed saiu da saladele de repente.
— Matt! Que bom que já voltou. Acabei de falar com Bill Payton e ele queria saber se você vai
comparecer ao jantar, no sábado à noite. Haverá música ao vivo e tudo mais — acrescentou ele, com
um sorriso.
Sim, eu irei — respondeu Matt, com ar ausente. — Diga a ele para reservar dois convites para
mim. Você também vai?
— Pensei em ir e levar Leslie comigo. — Voltando-se para ela, Ed explicou: — Será o jantar
anual da Associação de Criadores de Gado de Jacobsville. Teremos de assistir a algumas palestras,
mas se você sobreviver a elas e à galinha “borrachenta” servida no jantar, poderemos até dançar um
pouco.
— Não sei se ela vai conseguir dançar muito — salientou Matt, olhando para Leslie. Ed arqueou
as sobrancelhas.
— Você ficaria surpreso se a visse dançar, Matt — falou ele, evidentemente não entendendo a
que o primo se referira. — Leslie adora músicas latinas. — Voltando-se para ela, Ed acrescentou: —
Matt também gosta de música latina. Você não acreditaria no que ele é capaz de fazer ao ouvir um
mambo ou uma rumba, isso sem falar em tango. Ele namorou uma professora de dança durante
alguns meses, mas o talento que ele já tinha ajudou bastante.
Matt não disse nada. Continuou observando o semblante de Leslie enquanto se perguntava se.
Ed saberia algo sobre aquele problema na perna dela, e se conseguiria obter mais informações a
respeito disso.
— Podem ir comigo, se quiserem — sugeriu Matt. — Vou alugar a limusine de Jack Bailey e
talvez isso ofereça um pouco de aventura à sua secretária.
Será uma aventura para mim também — afirmou Ed. — Obrigado, Matt. Detesto ficar procurando
um lugar para estacionar quando há alguma festa no clube.
— Então somos dois.
Uma das secretárias das outras salas avisou Matt de que havia um telefonema para ele. Matt se
retirou e Ed saiu logo depois dele para uma reunião.
Leslie se perguntou como agüentaria passar uma festa inteira na companhia de Matt Caldwell, e
talvez até dançando com ele, sem se envolver demais. Sem dúvida, seria um desafio.
Leslie tinha apenas um vestido que seria adequado para a festa no clube. Tratava-se de um
longo reto azul-royal cujo maior charme eram as alças finíssimas que deixavam seus ombros à mostra.
Os sapatos pretos tinham o salto confortavelmente baixo, sem abrir mão da elegância. Ela havia
prendido os cabelos em um coque frouxo, deixando alguns fios soltos ao redor do rosto e do pescoço.
Ed suspirou ao avistá-la, enquanto a limusine parava diante da casa dela. Ele saiu do carro e foi
ao encontro dela na varanda. Leslie segurava uma pequena bolsa preta e mal conseguia disfarçar a
ansiedade diante de sua primeira festa desde os dezessete anos. Estava incrivelmente nervosa.
— Estou bem assim? — perguntou a Ed, hesitante.
Ele sorriu.
— Está linda.
— Você também não está nada mal com esse smoking — observou ela, também sorrindo.
— Não deixe que Matt perceba quanto você está nervosa — falou Ed, enquanto os dois se
encaminhavam para o carro. — Alguém telefonou e o tirou do sério pouco antes de sairmos da minha
casa. Carolyn está quase chorando.
— Carolyn? — Leslie franziu o cenho.
— A mais nova namorada dele. Ela pertence a urna das famílias mais tradicionais de Houston.
Veio passar alguns dias na casa da tia, por isso estava disponível para nos acompanhar esta noite. Ela
passou meses tentando conquistar Matt.
— Ela é bonita?
— Muito — respondeu ele. — Em alguns momentos, ela me faz lembrar de Franny.
Franny fora a noiva de Ed, que morrera durante um assalto ao banco onde ela trabalhava. O
trágico incidente acontecera na mesma época em que Leslie tivera complicações em casa, por isso a
amizade dos dois havia se tornado ainda mais intensa.
— Deve ser difícil para você — supôs ela, em um tom solidário.
Ed olhou-a com ar de curiosidade quando eles chegaram ao carro.
— Leslie, você nunca se apaixonou? Ela deu de ombros.
— O que aconteceu comigo me deixou desconfiada em relação aos homens.
— Não é de admirar.
Ele esperou o chofer abrir a porta da limusine para eles. Leslie entrou primeiro, seguida por Ed.
Quando Leslie se acomodou no assento, deparou-se com uma belíssima loira. Trajava um vestido
preto, reto, e usava inúmeros brilhantes.
— Você deve se lembrar do meu primo, Ed — disse Matt, sentado ao lado dela. — Essa é a
secretária dele, srta. Murry. Esta é Carolyn Engles — acrescentou, apresentando a loira a Leslie.
Depois de trocarem alguns cumprimentos, Leslie observou o luxuoso interior do carro, que mais
lembrava um pequeno apartamento sobre rodas.
— Nunca esteve em uma limusine antes? — perguntou Matt, com ar de divertimento.
— Para ser sincera, não — Leslie respondeu.
— Obrigada pela oportunidade que está me dando de conhecer uma.
Por um momento, Matt pareceu desconcertado com a resposta. Dirigindo-se ao primo, ele falou:
— Amanhã, logo cedo, quero que você suspenda todo o dinheiro de patrocínio que estamos
fornecendo a Marcus Boles. Ninguém, e eu estou dizendo ninguém, vai me envolver em um negócio
escuso como esse.
— Estou surpreso que não tenhamos enxergado quem ele era desde o início — disse Ed.
— Ele comprou uma propriedade na América do Sul — falou Matt. — Ouvi dizer que ele vai
morar lá. Se tiver sorte, amanhã conseguirá chegar ao aeroporto antes de se deparar comigo.
A ameaça implícita no comentário continuou pairando no ar durante algum tempo. Leslie
estremeceu. Das pessoas ali presentes, ela, mais do que ninguém, sabia o que a agressão física era
capaz de causar. Suas lembranças eram enevoadas e confusas, mas sempre se tornavam muito
nítidas nos pesadelos que tinha constantemente.
— Calma, querido — Carolyn disse a Matt com gentileza. — Está assustando a srta. Marley.
— Murry — Ed a corrigiu. — Que estranho, Carolyn, não lembro de você ter memória fraca para
nomes.
Carolyn limpou a garganta.
— Que bom que a noite está agradável, não?
— Ela mudou de assunto de repente. — Nenhum indício de chuva e a lua está maravilhosa.
— Sim, é verdade.
Matt lançou um olhar severo para o primo, que respondeu com um sorriso vago. Leslie se divertia
com a maneira como Ed era capaz de fingir inocência Conhecia-o muito bem para saber que ele
estava fingindo.
Matt, por sua vez, não parava de admirar Leslie, trajando aquele vestido simples, mas muito
elegante. Sua pele parecia uma pálida superfície de veludo e ele se perguntou se ela seria tão macia
ao toque quanto parecia ser. Leslie não era uma mulher de beleza extraordinária, mas tinha um
encanto todo próprio, algo que o atraía de uma maneira que ele não sabia explicar.
— De onde você é, srta. Murbery? — Carolyn perguntou.
— Murry — Leslie a corrigiu discretamente. — Sou de uma cidade pequena ao norte de Houston.
— Uma genuína texana — brincou Ed, sorrindo para ela.
— Qual o nome da cidade? — Matt indagou.
— Nem vale a pena dizer porque tenho certeza de que nunca ouviram falar dela — respondeu
Leslie, sem querer fornecer maiores detalhes.
— Seus pais são fazendeiros? — Matt insistiu.
Ela balançou a cabeça negativamente.
— Meu pai era agroquímico.
— O quê? — Carolyn franziu o cenho.
— Alguém com conhecimento químico em agronomia — explicou Leslie. — Ele… morreu devido
ao trabalho.
— Pesticidas — concluiu Matt. — O que diabos é preciso para que o governo…
— Matt, será que poderíamos deixar a política de lado pelo menos esta noite? — pediu Ed. — Eu
gostaria de me divertir um pouco.
Matt lançou um olhar de censura para o primo, mas logo relaxou e se recostou no assento,
passando o braço pelos ombros de Carolyn e puxando-a para si. O brilho de divertimento em seu olhar
pareceu denunciar que ele apreciara o desconforto que seu gesto provocara em Leslie.
Se ele estava querendo provocá-la com aquilo, estava conseguindo.
O clube ficava às margens de um lago, formando um bonito cenário todo iluminado. Os
chafarizes e os arcos em volta do prédio contribuíam ainda mais para tornar o local encantador,
fazendo dele um dos orgulhos dos moradores de Jacobsville.
E como Ed previra, não havia sequer uma vaga disponível para estacionar o carro. Matt anotou o
número do pager do motorista, e ficou de chamá-lo quando fosse necessário. Os quatro foram
recebidos por um comitê de boas-vindas à porta do clube.
Havia uma banda tocando música ao vivo. Leslie foi logo se animando ao distinguir o agradável
ritmo de bossa nova. Ela sempre se sentia muito viva quando ouvia música. Qualquer tipo de música.
Na infância, a música havia sido seu meio de escapar daquele ambiente que às vezes se tornava
quase insuportável. Não aprendera a tocar nenhum instrumento, mas sabia dançar muito bem. De fato,
o amor pela dança era a única coisa que ela e a mãe tinham em comum. Marie havia ensinado todos
os passos que Leslie conhecia, e não eram poucos. Por isso se tornara ainda mais irônico o fato de
seu amor pela dança haver sido drasticamente afetado pelo evento ocorrido quando ela estava com
dezessete anos.
— Prepare seu prato — disse Ed, aproximando-se com ela da mesa do bufê. — Está precisando
engordar um pouco.
Leslie sorriu para ele.
— Não estou magra, Ed.
— Está sim — respondeu ele, em um tom sério.
— Vamos lá, esqueça um pouco os problemas e divirta-se. Aproveite a noite ao máximo! Coma,
beba e seja feliz!
“Por que amanhã você voltará a ser a mesma”, completou Leslie, em pensamento. Colocou
alguns canapês em um prato e serviu-se de refrigerante, em vez de bebida alcoólica.
Ed encontrou duas cadeiras desocupadas próximas à pista de dança, de onde eles poderiam
ouvir a música com nitidez e observar os casais dançarem.
A vocalista da banda era uma bonita morena com cabelos compridos, dona de uma belíssima
voz. Ela estava tocando violão e cantando uma canção tão romântica que fez Leslie suspirar alto.
Quando deu por si, um sorriso estava curvando seus lábios.
Mesmo estando do outro lado do salão, Matt notou a mudança em Leslie. Ela adorava música. E
podia apostar que ela também adorava dançar, concluiu, sentindo seus dedos se contraírem junto ao
prato.
— Vamos nos sentar com os Devore, querido?
— sugeriu Carolyn, indicando um casal de ótima aparência, que ocupava uma mesa do outro
lado do salão.
— Acho melhor continuarmos acompanhando meu primo — respondeu ele. — Ed não está
acostumado a esse tipo de evento.
Para mim, ele parece bastante familiarizado com o ambiente — observou Carolyn, olhando na
mesma direção que ele. — Na verdade, é a acompanhante dele que está parecendo pouco à vontade.
Meus Deus, ela está batendo o pé no ritmo da música! Que atitude deselegante!
— Carolyn, não acredito que nunca tenha feito isso na vida — ironizou Matt. — Ou será que já
nasceu assim, tão completa e aborrecidamente sofisticada?
Ela arregalou os olhos. Matt nunca havia falado com ela daquela maneira.
— Desculpe-me — disse ele, percebendo que se excedera. — Ainda estou aborrecido com
Boles.
— Eu… notei — falou ela, ainda abalada.
Os dois seguiram em direção à mesa ocupada por Ed e Leslie. Matt sentou-se diante de Leslie,
que se tornou tensa no mesmo instante.
— Carolyn, troque de lugar comigo — disse Matt de repente, forçando um sorriso. — Esta
cadeira está baixa demais para mim.
— Não acho que a minha seja muito mais alta do que a sua, querido, mas se é o que você
quer…
— respondeu Carolyn, em um tom adocicado.
Leslie relaxou. Lançou um sorriso tímido para Carolyn, então voltou a prestar atenção na
vocalista da banda.
— Ela não é maravilhosa? — indagou Carolyn.
— Ela é de Yucatán.
— Além de talentosa, é também muito bonita — acrescentou Ed. — Adoro este ritmo.
— Oh, eu também — anuiu Leslie, comendo um canapê sem desviar a atenção do palco.
Matt se pôs a observá-la, surpreso com a desinibição de Leslie diante da música. Quando
haviam chegado, ela parecera pouco à vontade, mas bastara começar a ouvir a música para se tornar
uma pessoa diferente. Estava tendo uma amostra de como ela era antes de se transformar naquela
pessoa desconfiada, que temia a aproximação física dos outros. O que teria acontecido para deixá-la
assim? Sentia-se intrigado a esse respeito, mas não sabia por onde começar a encontrar respostas.
Leslie parecia uma pessoa de personalidade complexa.
Ed notou o olhar atento de Matt sobre Leslie. Teve vontade de chamar o primo a um canto e
contar toda a triste história a ele. Sabia que Matt estava curioso a respeito de Leslie, e que ele era
muito persistente quando queria descobrir uma coisa. Ele acabaria questionando Leslie a respeito
disso e ela iria se encolher na concha que as experiências desagradáveis haviam criado em torno
dela. Leslie estava começando a sair ao sol e lá estava Matt prestes empurrá-la de volta para a
sombra.
Por que seu primo não conseguia se contentar com a adoração de Carolyn? O problema era que,
diferentemente das outras mulheres, Leslie não vivia se jogando aos pés dele. E Ed tinha certeza de
que era justamente por isso que Matt se sentia atraído por ela. No íntimo, estava receoso pelo que
Matt poderia causar aos frágeis sentimentos de Leslie.
Naquele momento, as pessoas começaram a aplaudir, a canção havia terminado. A cantora
agradeceu e apresentou os membros da banda, antes que os primeiros acordes envolventes de
Aquarela do Brasil começassem a tocar. Aquela era uma das músicas preferidas de Leslie, e ela
deixou transparecer isso de imediato. Com um brilho de entusiasmo no olhar, começou a tamborilar os
dedos sobre a mesa, morrendo de vontade de dançar ao som daquela música de ritmo contagiante.
Como que entendendo a mensagem, Matt ficou de pé. E antes que Leslie tivesse tempo de
hesitar ou de recusar o convite, ele a conduziu gentilmente até a pista de dança.
Seus olhos encontraram os dela, enquanto a envolvia pela cintura e segurava-lhe a mão
esquerda no ar.
— Não vou fazer nenhuma virada súbita — prometeu ele.
Então assentiu uma vez, para marcar o ritmo. O que aconteceu em seguida foi a realização de
um sonho para Leslie. Conteve o fôlego ao notar a habilidade de Matt e simplesmente se esqueceu de
ter medo dele. Esqueceu-se de que deveria estar apreensiva ao se ver tão perto de um homem. Sem
nenhum traço de temor, deixou-se levar pelo ritmo e pela satisfação de ter um parceiro que sabia
dançar com perfeição ao som do ritmo brasileiro.
— Você dança muito bem — elogiou Matt, sorrindo com sinceridade enquanto eles se moviam
pela pista.
— Você também. — Leslie também sorriu.
— Se sentir algo na perna avise-me, e eu a levarei de volta para a mesa, está bem?
— Sim.
— Então vamos continuar.
Matt a conduziu pela pista de dança com a habilidade de um dançarino profissional, e Leslie o
acompanhou com tanta perfeição que os outros casais pararam de dançar para admirá-los.
Envolvidos pela música, Leslie e Matt nem prestaram atenção na expressão de admiração das
pessoas e no sorriso dos componentes da banda.
Quando soaram os acordes finais da música, Matt puxou-a para si e inclinou-a com elegância,
em uma finalização admirável, mas dolorosa.
Os aplausos que se seguiram foram entusiasmados. Matt levantou Leslie e somente então notou
quanto ela estava pálida.
— Muita coisa em pouco tempo, não? — murmurou ele, com ar preocupado. — Venha, vamos
para a mesa.
Sem se aproximar muito dela, Matt ofereceu-lhe o braço, para que ela sê apoiasse. Leslie o
acompanhou com certa dificuldade, devido à dor, mas não se arrependeu nem por um momento.
De fato, só se deu conta de que havia falado sobre a dor quando ouviu Matt dizer:
— Por acaso trouxe uma aspirina nessa bolsa minúscula?
Ela riu, balançando a cabeça negativamente.
— Voltarei em um instante — disse ele, antes de se afastar.
Ed se aproximou e segurou a mão dela com delicadeza.
— Dançou maravilhosamente, Leslie — elogiou ele. — Foi incrível! Nunca imaginei que você
dançasse tão bem.
— Nem eu — brincou ela.
— Foi uma exibição e tanto anuiu Carolyn, em um tom frio. — Mas foi tolice fazer algo tão
doloroso para você. Agora aposto que Matt vai passar o resto da noite se culpando e procurando uma
aspirina para você.
Após dizer isso, ela se afastou para o outro lado do salão.
— Ela ficou de mau humor — asseverou Ed.
— Eu não deveria ter feito isso — murmurou Leslie. — Mas foi tão divertido, Ed! Nunca me senti
tão viva!
— Eu notei. — Ele sorriu. — Foi bom ver seus olhos brilhando novamente.
Ela demonstrou um ar de preocupação.
— Arruinei a noite de Carolyn.
— Foi uma troca justa — respondeu ele. — Ela arruinou a minha no instante em que entrou na
limusine e disse que eu estava com cheiro de confeitaria de shopping.
— Seu perfume está ótimo — falou Leslie.
Ele sorriu.
— Obrigado.
Matt apareceu logo em seguida, trazendo Lou Coltrain consigo.
— Puxa — murmurou ela, olhando para Leslie —, pensei que você estivesse morrendo pela
maneira como Matt segurou meu braço e me trouxe até aqui.
— Eu não trouxe nenhuma aspirina — falou Leslie. — Sinto muito…
— Não há nada a lamentar — Lou a interrompeu, tocando a mão de Leslie. — Mas você estava
com um hematoma feio e esse não era o tipo de exercício que eu recomendaria. Ossos fraturados
nunca se recuperam completamente, mesmo depois de recompostos, o que não é exatamente o caso
da sua fratura.
Embaraçada, Leslie mordeu o lábio.
— Você vai ficar bem — prometeu Lou, com um sorriso gentil. — Na verdade, exercício é bom
para os músculos que apóiam esse osso, para torná-lo mais forte. Mas não repita isso por algumas
semanas. Tome isto — acrescentou, abrindo a bolsa. — Sempre carrego aspirinas comigo.
Dizendo isso, entregou a ela um pequeno recipiente de metal contendo as aspirinas. Matt encheu
um copo com água e o entregou a ela. Então permaneceu sério, observando ela tomar duas aspirinas
de uma única vez.
— Obrigada — Leslie agradeceu a Lou.
— Vá ao meu consultório na segunda-feira — falou Lou em um tom de voz seguro. — Vou lhe
prescrever algo que possa facilitar um pouco sua vida. Nada de narcóticos — acrescentou com um
sorriso. — Apenas anti-inflamatórios. Eles farão muita diferença.
— Obrigada. E uma ótima médica — disse Leslie, em um tom agradecido.
Lou estreitou o olhar.
— Conheceu algum médico ruim, Leslie?
— Sim — respondeu Leslie, com frieza. Então sorriu novamente. — Mas você me fez mudar de
idéia sobre os médicos.
— Ponto para mim. — Lou também sorriu. — Vou agora mesmo contar isso a Cooper — disse,
olhando na direção do marido, do outro lado do salão. — Ele vai ficar impressionado.
— Poucas coisas impressionam o dr. Coltrain
— falou Matt, depois que Lou se retirou. Então, olhando de Leslie para Ed, perguntou: — Onde
está Carolyn?
— Sumiu de repente — respondeu Ed, em um tom evasivo.
— Vou procurá-la. Tem certeza de que ficará bem? — Matt perguntou a Leslie.
— Sim, e obrigada por haver trazido Lou. As aspirinas já estão aliviando a dor.
Ele assentiu, antes de ir à procura de Carolyn.
— Acho que também arruinei a noite dele — disse Leslie, com ar pesaroso.
— Não deve se culpar por isso — falou Ed. — Fazia tempo que eu não via Matt se divertir tanto.
A maioria das mulheres daqui não sabem dar mais do que dois passos em uma pista de dança. Vocês
dançaram incrivelmente bem.
— Eu adoro dançar. — Leslie suspirou. — Sempre adorei. Minha mãe também era assim. — Seu
olhar adquiriu um brilho saudosista. — Eu ficava encantada quando a via dançar com meu pai. Eles
tinham um ritmo e uma leveza impressionantes.
— De súbito, o brilho sumiu dos olhos dela. — Ela pensou que eu encorajei Mike e os outros…
Quando ela atirou nele e a bala o atravessou e atingiu minha perna…
— Então foi assim que tudo aconteceu — Ed a interrompeu.
Leslie olhou para ele, parecendo não ter muita noção dó que acabara de dizer. Por fim, assentiu
e continuou:
— O médico da sala de emergência deixou claro que achava que a culpa havia sido toda minha.
Por isso minha perna não foi devidamente curada. Ele removeu a bala, mas não fez tudo que era
preciso. Um outro médico percebeu isso algum tempo depois e recomeçou o tratamento, mas, a essa
altura, eu já havia começado a mancar. E não tinha mais dinheiro para fazer o tratamento da maneira
adequada. Minha mãe havia ido para a prisão e eu estava sozinha. Se não fosse pela família de
Jéssica, minha melhor amiga, eu não teria nem mesmo tido onde ficar. Eles me levaram para morar
com eles, apesar das fofocas, e eu pude continuar estudando por mais algum tempo.
— Nem sei como você conseguiu entrar na faculdade e começar a cursá-la, com toda aquela
pressão e as sessões no tribunal ocorrendo quase todos os dias — observou Ed.
— Não foi fácil — admitiu ela. — Mas isso também me deixou mais forte.
Sim, você se tornou uma mulher forte. Leslie sorriu para ele.
— Obrigada pelo apoio que você tem me dado e que sempre me deu, Ed.
— Diga isso a Matt. Quem sabe ele mude um pouco de opinião a meu respeito.
Ela sorriu.
— Até que ele não é tão cruel assim. Dança feito um anjo.
Ed olhou para o outro lado do salão, localizando Matt e Carolyn. Porém, sentiu uma onda de
apreensão ao ver o primo encará-lo e começar a andar em direção a eles. Não gostava nem um pouco
daquela expressão de Matt. O primo só o encarava daquela maneira e andava lentamente daquele
jeito quando estava perigosamente aborrecido.
CAPÍTULO 4
Pelo olhar, Leslie sabia que Matt estava aborrecido. Embora não se lembrasse de haver feito
qualquer coisa que pudesse deixá-lo naquele estado de humor, tinha a impressão de ser a
responsável por tal mudança. Enquanto se aproximava, ele fez uma chamada rápida ao telefone
celular, voltando-o a guardá-lo no bolso em seguida.
— Sinto muito, mas teremos de ir embora — falou Matt, em tom gélido. — Carolyn disse que está
com uma enxaqueca insuportável.
— Tudo bem — respondeu Leslie, sorrindo aliviada por não ser a causa do mau humor dele.
— Eu não poderia mesmo dançar de novo, apesar de haver gostado muito da experiência.
Ele não respondeu. Apenas estreitou o olhar de maneira pouco amistosa.
— Ed, você poderia ir até a porta da frente para esperar o carro? Já telefonei para o motorista.
— Claro — respondeu Ed, hesitando de maneira visível por um momento.
Matt continuou a fitar Leslie com tanta intensidade que a fez sentir-se desconfortável.
— Você acabou se mostrando um verdadeiro “fogo de palha” — falou ele, em tom sóbrio. — Mas
algo me diz que as coisas são diferentes do que aparentam, não é? Tenho a impressão de que era
uma ótima dançarina antes de ter esse problema na perna.
Leslie estranhou o tom dele.
— Aprendi a dançar assim com minha mãe — respondeu ela, com sinceridade. —
Costumávamos treinar juntas.
— Tente outra — murmurou Matt, estreitando.
Depois das demonstrações de repulsa à sua proximidade, chegara o momento da conveniente e
bem planejada mudança de atitude, pensou Matt. Era um truque antigo do qual ele já havia sido vítima:
fazer-se de difícil para estimulá-lo a tomar a iniciativa. Como não percebera aquilo antes? Mas, já que
estava no jogo, pretendia descobrir quão longe ela chegaria.
— O quê? — questionou Leslie franzindo o cenho, pois não conseguira ouvi-lo.
— Nada, nada. Ed já deve estar lá fora com o motorista. Podemos ir?
Estendendo a mão na direção dela, colocou-a de pé de maneira abrupta.
O movimento brusco lhe causou dor. Mesmo sem se ver no espelho, sabia que ficara pálida,
tanto por causa da dor como por causa do modo dominador como Matt a segurava. Foi preciso
esforçar-se para não entrar em pânico, pois aquilo a fez lembrar-se de outra situação de seu passado.
Naquela época ainda não sabia como reagir, mas tal condição mudara bastante.
Virando o braço com rapidez, forçou-o para baixo contra o polegar da mão dele livrando-se no
mesmo instante, como ensinara seu instrutor de defesa pessoal.
Matt a fitou com ar surpreso.
— Onde aprendeu isso? Com sua mãe?
— Não. Com meu professor de Tae Kwon Do, em Huston. Apesar do problema na minha perna,
posso me defender muito bem.
— Oh, disso eu tenho certeza — respondeu ele, estreitando o olhar. — Você realmente não é o
que parece ser, srta. Murry. Vou me empenhar em descobrir a verdade a seu respeito.
Leslie sentiu um mal-estar repentino. A última coisa que queria era alguém remexendo seu
passado. Passara os últimos anos fugindo e se escondendo dele. Por que teria que voltar a fugir, justo
quando começava a sentir-se segura?
Ao ver a expressão assustada dela, Matt teve certeza de que quase caíra em outra armadilha
ardilosa. Como era possível que, apesar de tudo que já aprendera a respeito das mulheres, não
houvesse percebido a farsa dela mais cedo? Lembrou-se de sua própria mãe e sentiu uma onda gélida
percorrer-lhe o corpo. Com aqueles cabelos claros, Leslie até mesmo se parecia com ela.
Segurando-a pela parte superior do braço, apertou-o com mais força ainda ao notar a dificuldade
dela em andar.
— Por favor — falou ela, com a voz entrecortada —, vamos mais devagar. Estou com dor.
Parando de repente ao perceber que a estava forçando além do limite, Matt soltou o fôlego de
maneira. aborrecida. Esquecem-se do problema fisico na perna dela, considerando-o como se fosse
parte da atuação.
— O problema da perna é real — murmurou Matt, como se estivesse falando consigo mesmo.
— Mas e o resto?
O olhar dela encontrou o dele.
— Sr. CaIdwell, independentemente de quem ou do quê eu seja, não represento nenhum perigo
para você. Não gosto de ser tocada, mas gostei do modo como dançamos, Havia anos que não eu
dançava.
— As vezes você me parece tão familiar que é como se eu já a tivesse visto antes — disse ele
em tom severo, lembrando-se de sua própria mãe e do modo como ela o decepcionara e o magoara
anos antes.
Mas Leslie não sabia disso. Cerrando os dentes de dor, tentou não demonstrar o medo que
sentiu. Era provável que a tivesse mesmo visto, como todo o restante do pais a vira, em capas de
revistas e em primeiras páginas de tablóides. Os jornalistas a haviam fotografado até a exaustão na
noite em que os paramédicos a retiraram do apartamento de sua mãe em uma maca, chorando de dor
e de horror e com a perna sangrando muito. Mas, naquela época, usava cabelos escuros e óculos.
Seria possível que ele a tivesse reconhecido?
— Devo ter aquele tipo de rosto comum — falou ela, fazendo uma careta e se movendo um
pouco, para apoiar o peso do corpo sobre a perna saudável.
— Poderíamos ir logo? A dor está quase insuportável.
Matt ficou imóvel por um momento, então se curvou de repente e a ergueu nos braços,
começando a carregá-la por entre a admirada multidão.
— Sr… sr. Caldwell… — protestou Leslie, enrijecendo as costas.
Jamais fora carregada por um homem antes, mas ficou tão encantada observando-o de perto e
sentindo aqueles braços fortes sob seu corpo que não sentiu o medo usual. Depois de haverem
dançado, a proximidade fisica dele se tornou algo aceitável.
Enquanto se esforçava para conter o estranho impulso que sentia, de levar a mão aos cabelos
ondulados dele para acariciá-los, viu-o encará-la com uma das sobrancelhas arqueadas. Isso a deixou
sem fôlego e sem forças. Era preciso dizer algo. Qualquer coisa.
— V-você é… muito forte.
O tom de voz de Leslie o tocou no íntimo. Sustentando o olhar dela por um instante, desviou a
atenção para aqueles lábios delicados e convidativos, fitando-os longamente enquanto diminuía a
velocidade de seu caminhar.
Ela se segurou com força na lapela do smoking dele, passando então a observar os lábios dele
também. Jamais desejara ser beijada desde a experiência traumática que tivera, pois seu agressor a
beijara à força, deixando-a enojada.
Com Matt seria diferente, disso Leslie tinha certeza. Sabia instintivamente que não sentiria
aversão às carícias dele. Estava observando-o com curiosidade e avidez quando o ouviu puxar o
fôlego de maneira abrupta. Aquilo a fez encará-lo no mesmo instante.
— Cuidado — alertou ele, em tom profundo. — A curiosidade matou o gato.
Hein?
— Você caiu de um cavalo tentando evitar qualquer contato físico comigo. Agora me olha como
se fosse capaz de fazer qualquer coisa ,para ter meus lábios sobre os seus. Por quê?
— Não sei — murmurou ela, apertando a mão sobre a lapela do traje dele. — Gosto de senti-lo
próximo. Engraçado. Jamais desejei ficar assim perto de alguém.
Matt parou de repente. Aqueles braços fortes que a sustentavam pareceram estremecer um
pouco e a apertaram contra aquele peito másculo, fazendo um de seus seios pressioná-lo. A
respiração dele se tornou audível. Era como se as pessoas ao redor deles, no alto da escadaria, nem
existissem.
Leslie sentiu um delicioso arrepio percorrer-lhe o corpo, fazendo-a soltar um riso trêmulo e suave
diante daquela sensação maravilhosa.
— Então é assim que se sente… — murmurou ela.
—O quê?
O olhar de Leslie encontrou o de Matt.
— Desejo.
Daquela vez o corpo inteiro dele estremeceu. Seus braços se contraíram e a ergueram ainda
mais. Sentindo o perfume de rosas do corpo feminino e o toque daquela pele macia e quente contra
seu corpo, abaixou o rosto e tomou aqueles lábios perfeitos nos seus. Ela o desejava. Recebeu-o com
a graça e a expectativa de uma adolescente curiosa, mas aquele corpo era o de uma mulher.
Então um som conhecido de passos rápidos, emitido por elegantes sapatos de salto alto,
fizeram-no romper o contato e endireitar-se. Voltando a andar, soltou o fôlego de maneira exasperada
enquanto se dirigia para a rua.
— Chega de jogos — falou ele, fitando-a com uma expressão de ardor. — Vou levá-la para
minha casa.
Leslie abriu a boca para responder, mas Carolyn contornou a última curva do corredor e os
alcançou quase na calçada.
— Ela precisa mesmo ser carregada? — perguntou ela, em tom sarcástico. — Engraçado, acho
que a vi dançando lépida e fagueira alguns minutos atrás.
— Leslie tem um problema sério na perna — respondeu Matt, recuperando o autocontrole. — Ali
está o carro.
A limusine parou diante deles e Ed saiu do veículo, franzindo o cenho ao ver sua amiga sendo
carregada.
— Está tudo bem? — indagou ele, aproximando-se depressa.
— Ela não deveria ter dançado — respondeu Matt, com secura, enquanto cobria a pequena
distância que o separava do veículo antes de acomodá-la sobre o assento de couro. — A perna dela
piorou.
Carolyn estava pálida, mas mesmo assim lançou um olhar sarcástico para Leslie ao se acomodar
na limusine.
— Uma dança e já temos de partir! — reclamou ela em tom furioso.
Matt se sentou ao lado de Ed e fechou a porta com um estrondo, encarando-a e estreitando o
olhar.
— Pensei que estivéssemos partindo por causa de sua enxaqueca, querida — falou ele,
concluindo em tom gélido.
Sua paciência se esgotara. Estava tomado pela sensação de desejo frustrado. Lançando um
olhar para Leslie, pensou a respeito de quanto ela era boa em manipular os outros. Quase o dominara
por completo, despertando seu desejo. Era provável que estivesse rindo por dentro, divertindo-se em
silêncio à sua custa. Bem, iria certificar-se de fazê-la pagar por isso.
Carolyn, ao vê-lo olhar daquela maneira para Leslie, soltou um gemido de desgosto e se virou
para a janela, olhando de maneira vazia para fora.
Para surpresa de Ed, o motorista o deixou em casa primeiro. Quando tentou argumentar, Matt se
mostrou irredutível. Carolyn foi a próxima. Acompanhando-a até a porta da casa, virou-se e foi até o
carro antes do beijo de boa-noite. Ela fechou a porta da casa com tanta força ao entrar que o ruído
ecoou até mesmo dentro da limusine, que estava com os vidros fechados.
Leslie mordeu o lábio inferior ao vê-lo acomodar-se à sua frente no interior do carro. Sob a
iluminação suave do veículo de luxo, era possível ver a expressão de desejo ardente naqueles olhos
negros.
— Esse não é o caminho para meu apartamento.
— Não, não é — respondeu ele, soando perigoso. Pouco depois, a limusine parou à porta da
fazenda dele. Depois de ajudá-la a sair, trocou algumas palavras com o motorista, que partiu em
seguida, antes de voltar a erguê-la nos braços.
— Sr. Caldwell… — começou Leslie.
— Matt — corrigiu ele, carregando-a rumo à
entrada da casa.
— Quero ir para casa.
— E irá. Eventualmente.
— Mas você mandou o motorista partir — falou ela, ao ser colocada momentaneamente no chão,
enquanto ele pegava a chave e destrancava a porta da frente.
— Tenho seis carros. Levarei você embora quando for a hora certa.
— Estou muito cansada.
— Então sei qual é o lugar ideal para você — respondeu Matt depois de voltar a fechar a porta
atrás de si, erguendo-a nos braços e a levando por um longo corredor.
Segundos depois, Leslie se viu no meio de uma cama enorme, sobre um cobertor macio,
enquanto aquelas mãos fortes a despiam da echarpe que a aquecia.
A peça foi arremessada sobre uma cadeira,junto com a gravata e o paletó dele. Desabotoando a
camisa, Matt se acomodou ao lado dela na cama, movendo-se em seguida de modo a ficar
praticamente sobre o corpo dela.
Aquela posição trouxe à tona lembranças terríveis, fazendo-a ficar tensa e pálida.
Ele ignorou aquela reação, olhando-a da cabeça aos pés e se demorando em cada curva, até
fixar sua atenção no contorno de seus seios. Uma daquelas mãos fortes deslizou sobre o tecido fino
do vestido, traçando o contorno de um mamilo enrijecido.
O toque surpreendeu Leslie, que não o achou repulsivo como imaginara. Um leve tremor
percorreu-lhe o corpo. Seu olhar, com um misto de medo e curiosidade, encontrou o dele.
— Você se incomoda? — indagou ele, com um leve tom de insolência, enquanto abaixava uma
das alças do vestido dela para expor-lhe um seio.
Ela mal podia acreditar no que estava acontecendo. Os homens lhe causavam repulsa. A idéia
de qualquer tipo de intimidade a enojava. Mas Matt estava olhando seu seio nu e aquilo não estava lhe
inspirando sequer o mínimo impulso de resistir.
O contato daqueles dedos másculos contra seu corpo intocado estava lhe causando tanto prazer
que era como se estivesse sonhando e observando algo irreal.
Ele sorriu com uma leve expressão travessa ao ver o semblante dela.
— Nunca fez isso antes?
— Não.
Embora a resposta dela soasse até mesmo sincera, Matt descartou tal possibilidade de imediato.
Leslie estava calma e submissa demais para alguém inexperiente.
A sobrancelha dele se arqueou, demonstrando curiosidade.
— Vinte e três anos e ainda é virgem?
“Como ele podia saber disso?”, pensou ela, constrangida.
— Ora… sim.
Tecnicamente, era verdade. Emocionalmente, não.
A despeito do que fora feito contra ela, o estupro não chegara a ser concluído, pois sua mãe
chegara em casa segundos antes de a violência se completar.
Matt estava concentrado em tocar-lhe o corpo. O indicador dele contornava-lhe o mamilo
excitado enquanto aqueles olhos negros a observavam arquear-se para reclamar seu toque a cada
afastamento momentâneo de sua mão.
— Está gostando?
Leslie o encarou com intensidade.
— Sim.
Era como se estivesse surpresa por gostar das carícias que recebia.
Sem hesitar, ele a ergueu um pouco e abaixou a outra alça do vestido, deixando-a nua da cintura
para cima. Jamais vira seios perfeitos como os de Leslie. Aquela pele alva e macia parecia um convite
a seu toque. Nenhuma mulher jamais o excitara tanto, nem de maneira tão intensa.
Mesmo sabendo que deveria estar lutando para se livrar dele, para sair dali, Leslie não sentia
vontade de fazê-lo. Por quê? Qual o motivo de o toque dele não deixá-la apavorada?
Quando sentiu os lábios dele junto a seu seio, enrijeceu e arqueou o corpo de imediato.
Matt levantou a cabeça no mesmo instante e a encarou, concluindo que aquilo não era uma
tentativa de esquivar-se dele. A expressão dela era uma mistura de surpresa, prazer e curiosidade.
— Outra primeira vez?
O tom dele foi um pouco arrogante, assim como seu sorriso frio e calculado, mas a mente dela
estava em um turbilhão emocional acelerado demais para aqueles detalhes serem registrados.
Leslie apenas engoliu em seco, balançando a cabeça afirmativamente. Seu corpo, como se
estivesse ignorando sua mente, movia-se da maneira sensual sobre a cama. Jamais imaginara que
pudesse deixar-se acariciar daquela forma. Quando os lábios dele voltaram a tocar-lhe o. seio,
sugando o mamilo rosado, foi impossível conter um gemido alto de prazer.
Ao ouvir aquele som, Matt sentiu-se tomado por uma onda de excitação. Suas carícias ficaram
mais intensas do que planejara. Estava quase perdendo o controle quando se lembrou de que não
deveria se deixar fazer de tolo, mesmo que a desejasse mais do que jamais desejara alguém antes.
Levantando a cabeça, observou-a atentamente. Estava claro que poderia tê-la naquele mesmo
instante. Ela parecia sequiosa por recebê-lo, mas com certeza haveria um preço por isso.
Ao ver o olhar de expectativa e curiosidade dela, sentiu vontade de rir. Era óbvio que Leslie já o
considerava como um “peixe fisgado”. Mas toda aquela aquiescência fora um erro de cálculo grosseiro
da parte dela. Fora a repulsa inicial que o fizera sentir-se atraído.
Sentando-se de maneira abrupta, levantou-a consigo e voltou a colocar o vestido dela no lugar,
levantando as alças.
Ainda em choque por toda aquela experiência, ela o fitava em silêncio. Observou-o levantar-se
da cama e abotoar a camisa, pegando então o paletó e o vestindo. Parando ao pé da cama, olhou-a
com ar especulativo e então sorriu. Mas não era um sorriso agradável.
— Você não é nada má — murmurou Matt, com sarcasmo. — Mas esse ato da virgem fascinada
me tira o prazer. Gosto de experiência.
Leslie piscou os olhos repetidamente, tentando voltar a pensar com clareza.
—O quê?
— Deduzo que seus outros amantes gostaram desse olhar assustado de “Oh, é minha primeira
vez”, não é?
Outros amantes. Teria ele adivinhado algo sobre seu passado? Seu medo se refletiu em sua
expressão.
Matt percebeu. Estava quase lamentando por se tratar de uma farsa. Estava cansado de ser
perseguido por mulheres falsas e oportunistas o tempo todo. Todas o consideravam uma grande
presa, por ser solteiro, rico e por ter boa aparência e a fama de ser um hábil amante. Até então,
sempre deixara claro que jamais iria se casar, o que nunca fora uni problema. Uma jóia cara, um
presente sofisticado ou uma viagem e tudo estava arranjado. Estava exausto daquele jogo. Naquele
momento, sentia-se mais decepcionado do que nunca.
Leslie viu a expressão de desgosto dele e desejou que se abrisse um buraco no chão por onde
pudesse desaparecer. O olhar frio dele a fez sentir-se como se fosse uma vadia, como o médico, a
mídia e sua mãe fizeram.
Ele não saberia explicar o motivo, mas ao ver o olhar de Leslie naquele momento, uma onda de
culpa se apoderou de seu coração, fazendo-o sentir um aperto no peito.
Antes que fizesse alguma tolice, virou-se para o outro lado, pegou a echarpe e a bolsa e as jogou
no colo dela.
— Vamos. Vou levá-la para casa.
Leslie não olhou para ele enquanto o seguiu rumo à entrada, O corredor era bem mais longo do
que lhe parecera antes e, ao chegar à porta, sua perna já estava latejando. A dança já a havia
machucado bastante, mas o tranco que recebera quando ele a forçara a andar depressa no salão
pareceu haver deslocado algo. Mas ela cerrou os dentes, pressionou os lábios e tentou não
demonstrar o que sentia.
Na garagem, Matt escolheu o Mercedes prateado e eles partiram rumo a Jacobsville.
Olhando pela janela, Leslie sentiu-se uma idiota pela maneira como agira. Devia ter dado a
impressão de ser a mulher mais fácil do mundo. Só não conseguia entender o motivo que o levara a
não tirar vantagem da situação. Quanta ironia. Depois de anos evitando os homens, descobrir-se
capaz de sentir um desejo tão intenso justamente por alguém que não a queria era perturbador.
Ele percebeu a tensão na linguagem corporal dela. Era óbvio que estava frustrada por seu plano
sórdido de seduzi-lo haver falhado.
— E isso que Ed ganha quando a leva para casa? — indagou Matt, em um tom indiferente.
Leslie cravou as unhas no couro da bolsa. Com muito esforço, manteve-se calada. Não pretendia
valorizar aquele comentário maldoso com uma resposta.
— Não fique tão abalada — prosseguiu ele. — É que já sou experiente demais para cair nesses
truques. Mas há outros fazendeiros solteiros perto de Jacobsville. Cy Park, por exemplo, é um homem
nervoso e irritadiço como ninguém, mas é viúvo e muito solitário. Oh, mas, pensando melhor, acho que
já houve tragédia o bastante na vida dele. Eu não iria querer vê-la piorar isso ainda mais. Ela estava
tão chocada e magoada que não conseguia falar. Por que tudo em sua vida tinha que terminar mal?
Parecia um eterno pesadelo. Para completar, sua perna doía muito mais do que o normal, forçando-a
a se ajeitar no assento em busca de uma posição mais confortável. Mas não adiantou.
— Como foi que esse osso ficou assim? — questionou Matt, com naturalidade.
— Você não sabe? — perguntou ela, soltando uma risada que parecia uma mistura de sarcasmo
e mágoa.
Se ele sabia mesmo da história, como tudo indicava, aquele era mesmo um jogo de crueldade.
— Como eu poderia saber? — falou ele, olhando-a de lado e fazendo uma careta.
Leslie franziu o cenho. Talvez Matt não soubesse de nada e estivesse apenas cavando
informações. Engolindo em seco, manteve-se quieta e segurou a bolsa com força.
Estacionando o Mercedes em frente à casa de Leslie sem desligar o motor, Matt se virou para
encará-la e repetiu:
— Como eu poderia saber?
— Ora, você acha que sabe tudo a meu respeito.
Os olhos dele se estreitaram de maneira perigosa.
— Há muitas maneiras pelas quais um osso pode ser fraturado. Uma delas é pelo impacto de
uma bala.
Sem conseguir respirar, Leslie ficou imóvel, encarando-o de maneira deliberada.
— O que sabe a respeito de balas? — indagou ela.
— Fui convocado durante a operação Desert Storm e servi em uma unidade de Infantaria.
Aprendi um bocado sobre armas e balas, e sobre como ficam ossos baleados. O que me conduz à
pergunta óbvia: quem atirou em você?
— Eu não disse que fui baleada.
— Mas foi, não é mesmo? — insistiu Matt, sorrindo com frieza. — Quanto ao autor do disparo,
aposto que foi um de seus antigos amantes. Ele a pegou com outro ou ficou furioso por ser provocado
até a beira da insanidade, apenas para receber uma recusa? Não que seu estilo seja recusar — disse
e assumiu um ar de superioridade.
— Não posso dizer que bancou a difícil esta noite.
O ego de Legue caiu por terra. Estava sendo acusada das piores coisas possíveis. Suas
lembranças antigas já eram horríveis, mas vê-lo acusá-la de ser algum tipo de ninfomaníaca era
doloroso demais para suportar. Pela primeira vez na vida sentira um prazer físico íntimo e Matt a
estava fazendo sentir-se como se ela fosse uma qualquer.
Soltando o cinto de segurança, saiu do carro com tanta dignidade quanto possível. Sua perna
jamais doera tanto. Tudo que queria era tomar um analgésico forte e se deitar.
Matt desligou o motor e contornou o veículo, irritado pelo modo como ela insistia em andar
sozinha mesmo mancando.
— Eu a levarei até a porta…
— Não! — disse ela em um tom baixo, evitando o toque dele e se sentindo envergonhada por tê-
lo deixado fazer o que fez.
Seus olhos se encheram de lágrimas de mágoa, frustração e ultraje.
— Mais joguinhos?
Ele não gostou nada de vê-la voltar a se esquivar de seu toque, depois do modo como se
comportara em sua cama.
— Eu não faço… joguinhos — bradou Leslie,
sem conseguir conter o soluço que a interrompeu.
— E você pode ir para o inferno!
Fazendo uma careta ao ver a expressão dela, Matt mal ouviu suas palavras. Leslie estava tão
pálida e tensa que dava a impressão de que algo muito sério a incomodava. Algo mais importante do
que uma mera conquista frustrada.
Enquanto a via virar-se e afastar-se, fazendo um esforço visível para mancar o mínimo possível,
ele se viu tomado por emoções confusas, todas misturadas, de uma forma que jamais sentira antes. A
lembrança do modo como ela lhe dissera “Você não sabe?” não lhe saía da cabeça.
Sentando-se ao volante do Mercedes, ficou parado e com um olhar vazio durante um longo
tempo antes de voltar a ligar o motor. Leslie Murry era um quebra-cabeça que ele pretendia solucionar,
mesmo que isso lhe custasse uma fortuna em honorários de detetives particulares.
CAPÍTULO 5
Leslie chorou durante tanto tempo que lhe pareceu haverem passado horas. As aspirinas não
tiraram a dor que sentia na perna e não havia remédio conhecido pela humanidade para curar seu ego
ferido. Matt a humilhara, fizera pouco de sua inocência e a colocara quase no mesmo patamar de uma
prostituta. Ele agira como aquele médico da sala de emergência, anos antes, que a fizera sentir-se
envergonhada de seu corpo.
Ora, pensou consigo enquanto enxugava as lágrimas, jamais voltaria a cometer o erro de ceder a
seus impulsos outra vez. E Matt Caldwell podia ir direto para o inferno com sua arrogância.
O telefone tocou e Leslie hesitou, mas como poderia ser Ed, optou por atender.
— Demos boas risadas de você — falou Carolyn, sem rodeios. — Imagino que irá pensar duas
vezes antes de se jogar sobre ele outra vez! Matt disse que você foi tão fácil que o enojou…
Trêmula por causa da humilhação, Leslie colocou o telefone no gancho com muita força, fazendo
um estrondo. Então tirou o telefone da tomada. Pelo visto ele não se contentara em arrasá-la e ainda
fora correndo contar para a namorada o que acabara de fazer. Aquilo era tudo de que precisava para
sua noite se tornar completamente horrível.
A dor e a humilhação mantiveram Leslie acordada até o raiar do dia, que foi quando conseguiu
adormecer. Passou a hora do desjejum e então a da missa. Quando despertou, tomou consciência de
que sentia uma dor tão forte quanto a da noite em que fora baleada.
Ao se mover, fez uma careta de dor e soltou um incontrolável gemido de agonia. Quase não
percebeu o som de alguém batendo à porta.
— Entre — falou ela, com a voz embargada. Assim que a porta se abriu, Matt Caldwell surgiu
pela passagem. Não havia se barbeado e estava com olheiras profundas.
As palavras de Carolyn ecoaram na mente dela. Com um movimento instintivo, agarrou a
primeira coisa que lhe veio à mão, uma garrafa de água mineral que estava na mesinha-de-cabeceira,
e a arremessou contra a cabeça dele. Errou por pouco, quase acertando Ed, que vinha logo atrás e se
desviou no último instante.
— Não, obrigado, não quero água — falou Ed, tomando a dianteira e sinalizando para o primo
parar à porta.
O rosto pálido de Leslie era a pura expressão da dor, mas o olhar que dirigia a Matt parecia
quase capaz de fazê-lo queimar onde estava.
— Ei — falou Ed, tentando chamar a atenção dela —, telefonei a manhã toda, mas você não
atendia. — Ele viu o plugue fora da tomada. — Oh, agora sei por quê. Como está a dor?
Estava difícil até para Leslie respirar.
— Forte.
O que era uma palavra fraca demais para definir o que sentia.
— Venha — prosseguiu Ed, em tom decidido.
— Vamos levá-la para o pronto-socorro. Matt, poderia chamar Lou Coltrain e pedir para ela nos
encontrar lá? Otimo. Agora, Leslie, deixe-me ajudá-la a colocar esse robe.
A dor era tanta que ela não disse nada. Apenas saiu da cama, ciente da surpresa que seria para
Matt vê-la com um pijama de flanela que a cobria do pescoço aos tornozelos. Com a criatividade fértil
e malévola dele, deveria tê-la imaginado nua sob o cobertor.
Mas, exceto pelo que dissera à médica ao telefone celular, não emitira mais nenhum som. Ficou
apenas imóvel, à porta, observando Ed ajudá-la. Pelo menos até que Leslie tentou se levantar e não
se sustentou.
Ed a pegou e a ergueu nos braços, interrompendo o movimento instintivo que Matt fez na direção
dela.
— Posso carregá-la — garantiu Ed. — Vamos indo.
— O cartão do convênio… — murmurou ela — .na minha bolsa.
— Deixe essa preocupação para depois — falou Matt, tenso, abrindo a porta do Mercedes para
Ed acomodá-la.
Quando o carro entrou em movimento, Leslie se recostou no assento e fechou os olhos, quase
não suportando a dor.
— Ela não deveria ter sido forçada a dançar — murmurou Matt, em tom desgostoso. — Depois
eu ainda a forcei a andar depressa e a parar de repente. A culpa é minha.
Ed não respondeu. Apenas olhou com ar preocupado para Leslie, acomodada no banco de trás,
rogando para que a pequena exibição da noite anterior não tivesse causado nenhum dano permanente
adicional à perna dela.
Lou Coltrain estava esperando no pronto-socorro quando Ed entrou no recinto com Leslie nos
braços. A médica indicou o caminho até uma das salas, fechando a porta assim que Matt entrou.
Depois de examinar a perna com cuidado, aplicou uma injeção para aliviar a dor e a levou para a
sala de raios X.
Ed a acompanhou, mas o telefone celular de Matt tocou e ele ficou para trás, atendendo uma
chamada internacional. Ao ver a expressão de alívio de Leslie por estarem sozinhos enquanto a
médica se afastou um instante para falar com o técnico de radiografias, Ed falou:
— Calma. Ninguém vai lhe fazer mal. Nem meu primo, nem a doutora.
— Eu odeio seu primo. Ele riu de tudo — murmurou Leslie, voltando a chorar. — Ela disse que
ambos riram de mim e que ele ficou enojado.
— Ela?
— Carolyn. Oh, eu o odeio!
Outra onda de choro a calou.
Lou voltou e acariciou-lhe a cabeça, como se estivesse atendendo uma criança.
— Você terá de esperar lá fora, Ed. Vou acompanhar a seção de radiografias pessoalmente e
depois farei mais alguns testes.
— Tudo bem, doutora. Estarei lá na frente.
Ao sair, foi ao encontro de Matt, que estava na sala de espera, com uma expressão atormentada
no rosto.
— Leslie disse que Carolyn telefonou para ela ontem à noite — começou Ed. — Acho era por
isso que o telefone estava desligado.
Como é?
— Leslie falou que Carolyn telefonou dizendo que vocês dois estavam rindo dela. Mas não me
disse a respeito de quê.
Matt fez uma expressão severa e colocou as mãos nos bolsos, abaixando o olhar.
— Maldição.
Ambos ficaram em silêncio.
— Não magoe Leslie — disse Ed, depois da longa pausa, em tom baixo mas muito intenso. — A
vida dela não foi nada fácil. Trate de não piorar as coisas, pois ela não tem mais nenhum lugar para
onde ir.
Matt encarou o primo, não gostando da ameaça implícita em seu tom de voz, nem do fato de Ed
saber muito mais a respeito dela do que ele próprio. Seriam amantes? Ex-amantes, talvez?
— Sua amiga é cheia de segredos — respondeu ele. — E foi baleada. Quem atirou?
Ed arqueou ambas sobrancelhas de maneira tão surpresa e com tamanho ar de inocência que
conseguiu enganar Matt.
— Quem lhe disse uma coisa dessas?
— Ora… ninguém. Apenas concluí isso. Além do mais, de que outra forma aquele osso poderia
ter sido tão seriamente fraturado?
— Por um atropelamento, uma queda violenta, um acidente de carro…
— Sim, claro. Não sei por que cismei com essa história de tiro. De qualquer maneira, foi a dança
de ontem que a fez piorar. Não percebi a fragilidade dela. Leslie não falou a respeito da gravidade do
problema.
— Ela sempre foi assim — respondeu Ed.
— Como foi que a conheceu?
— Estudamos juntos na faculdade e saímos algumas vezes. Leslie confia em mim.
— Mas é bom que você não confie muito nela. E misteriosa demais. Creio que esteja
escondendo algo de nós, talvez algo muito grave.
Ed não ousou reagir como desejava. Apenas pressionou os lábios por um instante e então sorriu.
— Ela jamais magoou uma pessoa sequer em toda sua vida. E, ãntes que faça mau juízo dela, é
melhor saber que ela tem uma verdadeira espécie de fobia em relação aos homens.
Matt riu com ironia.
— Ora, essa é muito boa. Você deveria tê-la visto ontem à noite, quando estávamos sozinhos.
Ed estreitou o olhar.
— O que está querendo dizer com isso?
— Estou dizendo que ela é fácil.
— Seu idiota — murmurou Ed, cerrando os punhos. — Fácil. Meu Deus! — exclamou antes de se
afastar e sumir de vista, furioso.
Matt ficou confuso pelo comportamento anormal do primo. Talvez ele estivesse com ckime. O
telefone celular tocou, distraindo-o.
— Pensei que viesse cavalgar comigo esta tarde — falou Carolyn ao telefone, em tom animado.
— Onde você está?
— No hospital. O que disse a Leslie na noite passada?
— Como assim?
— Quando telefonou para ela.
— Bem, eu queria saber se a perna dela estava melhor. Aquela dança pareceu haver causado
muita dor à coitadinha.
— O que mais? — exigiu ele, em tom severo. Carolyn riu com sarcasmo.
— Oh, entendo. Estou sendo acusada de alguma indelicadeza, não é? Francamente, Matt,
pensei que você fosse capaz de ver através da falsa fragilidade dela. O que ela disse que eu falei?
Soltando um suspiro, Matt deu de ombros.
— Esqueça. Eu devo ter entendido mal.
-— Com certeza — garantiu ela, com firmeza.
— Eu não telefonaria para alguém que estivesse sofrendo dores atrozes para atormentá-la ainda
mais. Pensei que me conhecesse melhor.
— E conheço.
Conhecia-a mesmo muito bem. Ao que tudo indicava, a srta. Murry estava inventando calúnias
sobre Carolyn. Mas por quê? Por vingança? Para fazê-lo virar-se contra seu primo?
— E quanto à nossa cavalgada? Aliás, o que você está fazendo no hospital?
— Estou com Ed, visitando uma pessoa que ele estima muito. Bem, quanto à cavalgada, é
melhor deixarmos para o próximo fim de semana. Eu telefono.
Matt desligou. Estava irritado e queria que Leslie Murry saísse de sua empresa e de sua vida. Ela
era sinônimo de problemas.
Guardando o telefone celular no bolso, soltou um suspiro exasperado e voltou a se sentar na sala
de espera, para esperar por Ed e Leslie.
A atração proibida do magnata
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  • 1. E En nt tr re eg ga an nd do o o o C Co or ra aç çã ão o — Matt Caldwell e Leslie Murry — (Matt Cadwell: Texas Tycoon) Diana Palmer Série Homens do Texas 22 Digitalizado: Chris Rico, atraente e sedutor. Matt Caldwell era o sonho de toda mulher: um magnata texano rico, atraente e sedutor. Embora muitas pretendentes houvessem tentado conquistar o solteiro mais cobiçado de Jacobsville, nenhuma conseguira chamar a atenção de Matt. Porém, a misteriosa Leslie Murry estava prestes a mudar isso. A nova funcionária da empresa o estava afetando mais do que ele queria admitir. Por mais que Matt tentasse negar, a doce vulnerabilidade de Leslie tinha o poder de despertar seu instinto protetor. Bastara alguns beijos para Matt sentir-se tentado a possuir a bela e desejável Leslie, embora ela não parecesse muito disposta a querer receber o que ela tinha a oferecer. Ainda assim, prometeu a si mesmo que só se entregaria aos encantos de Leslie se ela lhe contasse qual era o segredo do passado que mantinha tão bem escondido.
  • 2. El soltero más codiciado (2000) Serie: Hombres de Texas Título Original: Matt Caldwell: Texas tycoon (2000) Editorial: Harlequin Ibérica Sello / Colección: Súper Jazmín 391 Género: Contemporáneo Protagonistas: Matt Caldwell y Leslie Murry Sinopse: Ele era um Texano rico, poderoso e algo cínico, e embora muitas mulheres tinham tentado ganhar o coração do Matt Caldwell, o solteiro mais cobiçado de Jacobsville, nenhuma o tinha conseguido. Mas com a Leslie Murry todo ia ser diferente. Matt se sentia muito atraído por essa misteriosa secretária que lutava por deixar pra atrás um passado traumático. Apesar de que a princípio não queria admiti-lo, a vulnerabilidade da Leslie despertava nele todo seu instinto de proteção e, depois do primeiro beijo, já não pôde resistir a fazer sua aquela mulher tão necessitada da ternura de um homem; mas não estava disposto a baixar a guarda até havê-la convencido de que lhe entregasse também seu coração. Sinopse: Ed levou Leslie para Jacobsville para que ela pudesse recomeçar de forma pacífica uma vida tumultuada. Ele só não contava que a amiga fosse despertar a atenção do primo dele, o solteiro mais cobiçado da região, Matt. E justamente por não se apaixonar à primeira vista, não fazer o possível para seduzi-lo, inclusive, não suportar que ele a toque. Matt desconfia de que Leslie esconde algo, a começar pelo motivo que a levava a mancar e só deixar Ed cuidar dela. Por isso, ele decide tirar a história a limpo, mas pode ser que a verdade seja demais para ele… e faça Leslie fugir mais uma vez.
  • 3. CAPÍTULO 1 No alto da colina, via-se um homem sentado elegantemente em seu cavalo e uma jovem a observá-lo. Ele admirava o amplo pasto que se estendia diante deles. A fazenda era pequena para os padrões texanos, mas, em Jacobsville, era grande o suficiente para colocar seu dono entre os dez maiores fazendeiros da região. — Empoeirada, não? — perguntou Ed Caldwell com um sorriso, alheio ao fato de ambos estarem sendo observados por outro cavaleiro a distância. — Dou graças a Deus por trabalhar na corporação e não aqui. Gosto de respirar um ar mais fresco e despoluído. Leslie Murry sorriu. Seu rosto de traços clássicos não chegava a ser exatamente bonito, mas era muito marcante. Os cabelos loiros lhe chegavam até acima dos ombros e tinham um bonito caimento natural. Em seu semblante, o que mais se destacava eram os expressivos olhos acinzentados e os lábios bem delineados. Leslie tinha uma personalidade bastante reclusa, mas nem sempre havia sido assim. Na época da adolescência, ela fora uma jovem muito ani5mada e expansiva. Mas no presente, com vinte e três anos, lembrava mais uma monja do que uma mulher em plena juventude. Para quem a conhecera antes, a mudança fora radical. Conhecera Ed Caldwell na época da faculdade, em Houston. Ele se formara quando Leslie estava no segundo ano. Mas ela desistira do curso no semestre seguinte, para ir trabalhar como secretária na firma de advocacia do pai dele, em Houston. A situação acabara se complicando por lá, e Ed a “socorrera” mais uma vez. Na verdade, fora por causa dele que ela havia acabado de ser contratada como secretária executiva da Empresa Caldwell, que pertencia ao primo dele. Leslie não conhecia Mather Gilbert Caldwell, ou Matt, como ele costumava ser chamado. As pessoas costumavam dizer que ele era uma pessoa gentil e agradável. O próprio Ed vivia afirmando isso. De fato, estavam ali para que Ed pudesse apresentá-la ao primo dele, mas, até aquele momento, só haviam se deparado com poeira, gado e cowboys. — Espere aqui — disse Ed. — Vou dar uma volta pelas redondezas para ver se encontro Matt. Dizendo isso, ele esporeou o cavalo e saiu em uma cavalgada meio desajeitada. Enquanto o via se afastar, Leslie teve de se esforçar para conter o riso diante da maneira canhestra como Ed cavalgava. Ficou evidente que ele se sentia mais à vontade ao volante de um carro do que sobre a sela de um cavalo. Mas, evidentemente, ela não iria cometer a indelicadeza de dizer isso a ele. Afinal, Ed era o único amigo com o qual ela sempre pudera contar e a última coisa que desejava no mundo era magoá-lo. Ele também era o único que sabia tudo sobre seu passado. Leslie não tinha noção de que também estava sendo observada naquele momento. O desconhecido, que até então se mantivera a certa distância, decidiu se aproximar, sentindo-se estranhamente atraído por aquela figura feminina. O modo como ele se aproximou foi tão sorrateiro que sua presença só foi notada quando o cavalo resfolegou, poucos metros atrás dela. Somente então Leslie olhou para trás. O desconhecido trajava uma roupa de trabalho, como a dos outros cowboys, mas a semelhança entre eles terminava aí, pois a aparência daquele homem era muito mais bem cuidada do que a dos outros que ela vira na fazenda. A atitude dele parecia um tanto intimidadora, com aquele ar determinado e a mão pousada sobre a coxa. Naquele momento, os olhos negros de Matt Caldwell encontraram os dela. — imagino qué Ed a tenha trazido até aqui — ele foi o primeiro a falar. Leslie segurou as rédeas com mais força. A voz dele tinha um tom profundo, inquietador. — Eu… Sim. Ele… Ele me trouxe até aqui. Matt estava surpreso com aquilo. Seu primo costumava gostar de mulheres glamourosas e sofisticadas. Vivia levando-as à fazenda para impressioná-las, mas Matt não se importava com isso. Contudo, tivera uma manhã difícil e não estava com muita disposição para servir de anfitrião. — Então gosta dos ares da fazenda? — disse ele, sem fazer muita questão de parecer simpático. — Se quiser, posso arranjar uma corda para você tentar laçar o gado. Leslie se tornou ainda mais tensa. Quanta indelicadeza! Eu… vim conhecer o primo de Ed. Ele é um homem muito rico. — Leslie se arrependeu no mesmo instante de haver dito aquilo. Como pudera dizer algo tão idiota a um estranho? — Quero dizer, ele é o dono da empresa onde Ed trabalha. Onde eu trabalho — acrescentou. Ele se inclinou um pouco para frente, estreitando o olhar.
  • 4. — Qual é o verdadeiro motivo de você ter vindo até aqui com Ed? Leslie engoliu em seco. Aquele olhar intenso tinha um poder quase hipnotizador. — Não creio que isso seja da sua conta — respondeu. Ele não disse nada e apenas continuou a olhá-la. — Por favor, pare de me olhar desse jeito — pediu ela. — Está me deixando nervosa. — Veio conhecer o chefe, certo? — indagou ele. — Ninguém lhe disse que ele não é uma pessoa fácil? Leslie engoliu em seco mais uma vez. — Dizem que ele é uma boa pessoa e que costuma ser gentil com os funcionários — falou ela. — Algo que aposto que ninguém nunca disse a seu respeito — acrescentou, indignada com a ousadia dele. Ele arqueou as sobrancelhas. — Como sabe que não sou bom e gentil? — indagou ele, esforçando-se para conter o riso. Pela sua atitude, está evidente que você não é im: pessoa confiável — respondeu ela, sem titubear. Nie manobrou o cavalo e se aproximou o suficiente :ira fazê-la estremecer. Gostava de mulheres que não se intimidavam com seu mau humor. — Se não sou uma pessoa confiável, em que situação isso a coloca nesse momento? — indagou com deliberada sensualidade. Leslie ficou tão abalada com aquela súbita aproximação que tentou se afastar no mesmo instante. Segurando as rédeas com força, agitou-as com tanto empenho que o cavalo se assustou e ergueu-se Nobre as patas traseiras, fazendo-a ir parar no chão. A queda foi violenta, machucando o quadril e o ombro esquerdo de Leslie. Em questão de segundos, o desconhecido já estava ao lado dela, tentando levantá-la com cuidado. Leslie tentou se desvencilhar do contato, ainda assustada com o que acabara de acontecer. — Não! — bradou ela, em um certo momento, levando Matt a afastar a mão que havia pousado sobre o braço dela. Ele a olhou com um ar de curiosidade e de preocupação ao mesmo tempo. — Leslie! — gritou uma voz a certa distância. Ed se aproximou com seu’ cavalo o mais rápido possível e assim que desmontou da sela ajoelhou-se ao lado dela. Sinto muito — disse ela, recusando-se a olhar para o desconhecido que provocara o acidente. — Eu puxei as rédeas com muita força e assustei o cavalo. Leslie notou que Ed olhou por cima do ombro para o desconhecido, que havia ficado de pé. — Você está bem? — perguntou Ed, voltando a olhá-la. Ela assentiu. Porém, ambos notaram que Leslie estava muito trêmula. — Hum, vocês já se apresentaram? — indagou Ed, olhando de um para o outro. Matt olhou para o primo. Ficara aborrecido com a reação da namorada de Ed. Ela o estava olhando como se ele houvesse feito aquilo de propósito quando, na verdade, ele fora o primeiro a tentar ajudá-la. — Da próxima vez em que decidir trazer uma maluca para minha fazenda, avise-me antes — disse ele, voltando a montar no cavalo. — E melhor ir buscar o carro para levá-la embora. Ela não parece se dar muito bem com animais. — Mas ela monta muito bem — salientou Ed. — Está bem, então. Até mais tarde. Leslie viu quando o outro puxou o chapéu para frente e saiu galopando com elegância. — Puxa — disse Ed, assim que ficou sozinho com Leslie —, faz tempo que não o vejo tão mal- humorado. Nem imagino o que o fez ficar assim. Em geral, ele é a cortesia em pessoa, principalmente quando há alguém ferido por perto. Leslie limpou o jeans e olhou para o amigo. — Ele veio até mim e se aproximou demais enquanto estávamos conversando. Entrei em pânico. Espero que seu primo não o despeça por isso. Ed arqueou uma sobrancelha. — Não ouviu quando ele disse “minha fazenda”? Aquele é meu primo, Leslie. Ela arregalou os olhos. — Aquele era Matt Caldwell? Ele assentiu. Ela deixou escapar um longo suspiro. — Essa não. Que boa maneira de se apresentar ao patrão antes de começar em um novo trabalho. — Ele não sabe nada a seu respeito.
  • 5. — E nem você vai falar — replicou ela, com firmeza. — Estou falando sério, Ed. Não quero ver meu passado sendo vasculhado novamente. Vim para cá porque quero ficar longe de repórteres e de produtores de cinema, e é assim que pretendo me manter. Já cortei os cabelos, comprei roupas diferentes e estou usando lentes de contato. Fiz tudo que me pareceu viável para não ser reconhecida e não vou abrir mão do que conquistei. Já faz seis anos — acrescentou ela, com tristeza. — Por que essas pessoas não me deixam em paz? — O repórter estava apenas seguindo uma indicação — disse Ed, em um tom gentil. — Um dos homens que a atacou foi preso por estar dirigindo bêbado e alguém ligou o nome dele ao que aconteceu com sua mãe, O pai dele é um político importante em Houston. Em um ano de eleição, era de se esperar que a imprensa fosse tentar descobrir qual era o envolvimento do filho dele no caso de sua mãe. — Sim, eu sei, e foi justamente isso que levou aquele produtor idiota a pensar em fazer o grande filme do ano. Era só o que me faltava. E eu que pensei que tudo isso já houvesse terminado. Que ingenuidade a minha. — Após uma breve pausa, ela prosseguiu: — Eu gostaria de ser rica e famosa. Talvez, assim, pudesse comprar um pouco de paz e privacidade. Ed continuou a ouvi-la, em silêncio. Olhando na direção para onde Matt havia seguido, Leslie continuou: — Eu disse algumas indelicadezas para seu primo porque não sabia quem ele era. Acho que ele vai mandar que me despeçam na segunda-feira logo cedo. — Só passando por cima do meu cadáver — disse Ed. — Posso ser apenas um primo para ele, mas também tenho minha cota de influência na empresa. Se ele a despedir, eu a defenderei. — Faria mesmo isso por mim, Ed? — Claro. Ela sorriu. — Fico feliz em poder contar com você. Realmente não suporto que… — Ela engoliu em seco. — Você sabe que eu não suporto que nenhum homem se aproxime fisicamente de mim. O terapeuta disse que é possível que eu consiga mudar isso algum dia, com o homem certo. Mas eu não sei… — Não se preocupe com isso. Venha. Vou levá-la de volta para a cidade e lhe oferecer um sorvete de baunilha. Que tal? Leslie sorriu para ele. — Obrigada, Ed. Ele deu de ombros. — Esse é apenas mais um exemplo do meu excelente caráter — brincou. Olhando na direção para onde o primo seguira, acrescentou: — Matt não está muito normal hoje — disse como que para si mesmo. — Vamos? A distância, Matt Caldwell ficou observando os dois seguirem em direção ao carro de Ed. Seu mau humor piorara depois daquele incidente. A namorada de Ed o fizera se sentir um verdadeiro idiota e ele detestava se sentir assim. Não deixou de notar que ela permitira que Ed a tocasse enquanto caminhavam, sendo que, minutos antes, repelira seu contato como se ele tivesse alguma doença contagiosa. Ed arranjara uma namorada esquisita dessa vez. Mas as preferências de seu primo não lhe diziam respeito, concluiu, virando o cavalo e dirigindo-se ao local onde o gado se encontrava reunido, mais adiante. Talvez o trabalho ajudasse seu mau humor a desaparecer. Ed levou Leslie até o prédio de apartamentos onde ela morava. — Acha mesmo que ele não vai me despedir? — perguntou ela, preocupada. Ed balançou a cabeça negativamente. — Não, ele não vai despedi-la. Eu já lhe disse que não deixarei que isso aconteça. Agora pare de se preocupar, está bem? Leslie forçou um sorriso. — Obrigada mais uma vez, Ed. — Não há de quê. Até segunda-feira. — Até. Leslie ficou olhando o belo carro esporte desaparecer a distância. Em seguida, subiu pensativa para seu apartamento. Naquele dia, fizera um inimigo sem querer, mas esperava que isso não acabasse afetando sua vida. De qualquer maneira, não havia mais como voltar atrás no que dissera a Matt Caldwell. Na segunda-feira de manhã, Leslie chegou à mesa de trabalho dez minutos antes do horário, a fim de causar uma boa impressão. Simpatizara com Connie e Jackie, as outras duas mulheres que
  • 6. dividiriam com ela a organização das tarefas administrativas de Ed, o vice-presidente de marketing e pesquisa da empresa. O trabalho não era difícil e o ambiente lhe pareceu agradável. A empresa ocupava todo um prédio no centro de Jacobsville. Na verdade, tratava-se de uma antiga mansão em estilo vitoriano, que Matt havia mandado reformar para usar como sede de sua empresa. Havia dois andares de escritórios e uma cantina no local onde antes existira uma cozinha e uma sala de jantar. Matt passava boa parte do tempo fora do escritório, resolvendo problemas externos. Além disso, viajava com freqüência, pois além de seu próprio negócio, ele também fazia parte da diretoria de outras empresas. Sem dúvida, Matt Caldwell era um homem muito bem-sucedido. — Ele deve sair muito, não? — dissera ela, certa vez, quando Ed contara que o primo havia viajado para Nova York, para participar de um jantar de gala. — Com mulheres? — Ed sorriu. — Ele vive tendo de dispensá-las. Matt é um dos solteirões mais cobiçados do Texas, mas nunca leva nenhuma mulher suficientemente a sério. Para ele, acho que elas servem apenas para serem exibidas em festas. Talvez ele não queira se ligar a ninguém por haver tido uma infância difícil. — O que aconteceu? — Leslie franziu o cenho. — A mãe dele o abandonou quando ele estava com seis anos de idade. Ela conteve o fôlego. — Por quê? — Ela arranjou um namorado que não gostava de crianças. Ele disse que não iria criar Matt, então ela o deu para meu pai. Por isso ele foi criado comigo. Essa é a razão de sermos tão próximos. — E quanto ao pai dele? — Nós… não falamos sobre o pai dele. Na verdade, achamos que nem a mãe dele sabia quem era o pai de Matt. Houve muitos homens na vida dela. — Mas o marido dela… — Que marido? — Ed a interrompeu. — Pensei que ela fosse casada. — Beth não era do tipo que se casa. Ela não queria se prender a nada nem a ninguém. Ela também não queria ter Matt, mas os pais dela fizeram um escândalo quando ela falou sobre aborto. Eles queriam muito ter um neto e acolheram Beth e Matt assim que ele nasceu. — Mas você disse que foi seu pai quem o criou — lembrou Leslie. — E verdade. Nossos avós morreram em um acidente de carro e, um mês depois disso, a casa deles foi destruída por um incêndio. Houve rumores de que o acidente foi intencional para o recebimento do seguro, mas nada foi provado. Quando o incêndio aconteceu, Matt estava no jardim com Beth, logo cedo pela manhã. Ela o havia levado para ver as rosas do jardim, o que não foi uma atitude lá muito comum da parte dela. Essa foi a sorte de Matt, porque ele teria morrido se houvesse ficado na casa, O dinheiro pago pelo seguro foi suficiente para Beth comprar algumas roupas novas e um carro. Depois disso, ela deixou Matt com meu pai e foi embora com o primeiro homem que apareceu. O tom de voz de Ed estava repleto de indignação. — Meu avô deixou algumas ações da fazenda para ele, junto com uma pequena herança que ele só poderia obter ao completar vinte e um anos. E foi isso que impediu Beth de colocar as mãos nisso também. Quando ele herdou a herança, mostrou logo que tinha talento para administrá-la e foi aumentando a fortuna. — E o que aconteceu à mãe dele? — perguntou Leslie. — Ouvimos dizer que ela morreu há alguns anos. Matt nunca fala nela. — Puxa, ele teve uma vida difícil. — Sim — anuiu Ed. — Mas você também sabe o que é isso melhor do que ninguém. Leslie sorriu, com ar de frustração. — Acho que sim. Meu pai morreu há vários anos. Minha mãe fez o melhor, que pôde para nos sustentar. Ela não era muito inteligente, mas era bonita e usou o que tinha a seu dispor. — Leslie suspirou. — Ainda não consegui perdoar o que ela fez. Não é horrível você destruir sua própria vida e a de várias outras pessoas em uma questão de segundos? E tudo por quê? Por ciúme, quando não havia sequer motivo para isso. Ele não se importava comigo, queria apenas se divertir à custa de uma garota inocente. Ele e os amigos bêbados. — Ela estremeceu, sob o efeito das lembranças dolorosas. — Minha mãe pensava que o amava, mas o acesso de ciúme dela não o poupou, e ele acabou morto. — Concordo que ela não deveria ter atirado, mas não há desculpa para o que ele e os amigos estavam fazendo com você, Leslie.
  • 7. Ela assentiu. — Eu sei. Mas prefiro esquecer tudo isso e seguir em frente. Felizmente, para ela, Ed não tocou mais naquele assunto. Matt apareceu no escritório alguns dias depois, naquela mesma semana. Leslie não pôde deixar de se perguntar qual o tamanho do problema que criara para si mesma naquele primeiro encontro. Ela estava digitando alguns relatórios no computador e levantou a vista assim que sentiu a presença dele à porta. Seus olhares se encontraram. Matt trajava um elegante terno cinza, com camisa branca e gravata verde-escura. Estava segurando um cigarro apagado, e Leslie torceu para ele não acender o cigarro ali, pois ela era alérgica à fumaça de tabaco. — Então você é a nova secretária de Ed — falou ele. — Sim — ela concordou. — O que você fez para conseguir o emprego? — perguntou Matt, com ironia. — E com que freqüência? Leslie pestanejou. Não estava entendendo direito o que ele estava insinuando Desculpe-me, mas não entendi a pergunta. — Por que Ed a escolheu em detrimento de outras dez candidatas mais qualificadas? — Oh, isso! — Leslie hesitou. Claro que não poderia contar a verdade a ele. — Tenho alguma experiência nesse ramo de negócios porque trabalhei como assistente do pai dele durante quatro anos, no escritório de advocacia. Posso não ter o diploma de bacharelado, que seria preferível, mas tenho experiência. Ed disse que, para ele, isso era suficiente. — Por que não cursou a faculdade? Ela engoliu em seco. — Cheguei a cursar alguns anos, mas… tive de parar por problemas pessoais. — Continua tendo problemas pessoais, srta. Murry — afirmou Matt. — E pode me colocar como o primeiro deles. Eu tinha outros planos para esse cargo que você está ocupando. Portanto, espero que seja mesmo tão competente quanto Ed acredita que você seja. Dizendo isso, levou o cigarro aos lábios. Mas afastou-o logo em seguida e olhou para a ponta molhada. Então suspirou, voltando a segurá-lo entre os dedos. — Você fuma? — perguntou Leslie. — Eu tento. Enquanto ele falava, uma atraente senhora de meia-idade e com cabelos loiros se aproximou dele. — Preciso que assine isto aqui, sr. Caldwell. E o sr. Bailey está esperando-o na sua sala, para falar sobre aquela comissão da qual o senhor quer que ele participe. — Obrigado, Edna. Edna Jones sorriu. — Bom dia, srta. Murry. Está se mantendo muito ocupada por aqui? — Sim — respondeu Leslie, com um sorriso sincero. — Não deixe que ele acenda isso — continuou Edna, apontando para o cigarro de Matt. — Se precisar de uma dessas… — Ela mostrou a pistola d’água que estava segurando. — Posso providenciar uma para você. — Ela sorriu para Matt, que continuou sério. — Aposto que ficará contente em saber que já equipei cada uma das garotas das outras salas com uma destas, sr. Caldwell. Portanto, pode contar conosco para ajudá-lo a parar de fumar. Matt continuou olhando para ela, que riu feito uma garota vinte anos mais nova, antes de acenar para Leslie e sair andando pelo corredor. Matt pensou em fazer uma careta de zombaria, mas se conteve a tempo. Não era bom demonstrar nenhuma fraqueza ao inimigo. Olhou com frieza para Leslie, ignorando o brilho de divertimento nos olhos dela. Então assentiu e seguiu Edna pelo corredor, com o cigarro molhado entre os dedos. CAPÍTULO 2 Desde aquele primeiro encontro no trabalho, ficou muito claro que Leslie que Matt desaprovava totalmente o fato de ela estar ali. A implicância de Matt chegava ao ponto de ele pedir a ela que fizesse tarefas desnecessárias, como digitar dados a respeito do gado de dez anos antes e que nunca haviam sido passados para o computador. Até mesmo Ed ficou aborrecido ao saber daquilo.
  • 8. — Temos secretárias para fazer esse tipo de serviço — resmungou ele, olhando as páginas impressas sobre a mesa dela. — Preciso de você para os projetos. — Então diga isso a seu primo. Ed balançou a cabeça negativamente. — Não com o humor que ele tem andado. Matt anda meio esquisito ultimamente. — Sabia que a secretária dele anda armada? — brincou Leslie. — Ela carrega uma pistola d’água consigo. Ed riu. — Matt pediu a ela que o ajudasse a parar de fumar. Comprou uma porção daqueles brinquedos e deu uma para cada secretária. Todas as vezes que Matt leva um cigarro aos lábios, elas “atiram” nele. — Garotas perigosas — falou ela, rindo. — Pode apostar que sim. Eu já vi… — Não há nada para fazer por aqui? Uma forma firme e grave soou atrás de Ed. — Desculpe-me, Matt — Ed disse imediatamente. — Eu estava apenas inteirando Leslie a respeito de algumas coisas. Deseja alguma coisa? — Preciso de uma atualização a respeito das cabeças de gado que mandamos para Balienger — disse ele. Então voltou-se para Leslie e estreitou o olhar. — Esse tipo de trabalho é seu, não? Ela assentiu, engolindo em seco. Ed foi até a sala dele, logo ao lado, atender ao telefone que havia começado a tocar. Leslie se tornou tensa quando Matt se aproximou de sua mesa e pegou alguns papéis para examinar. — Pensei que você tivesse experiência nisso — disse a ela. — Metade do texto está digitado errado. Leslie olhou para os papéis e assentiu. — Sim, está, sr. Caldwell. Sinto muito, mas não fui eu quem datilografou isso. Claro que não havia sido ela. Aqueles papéis tinham mais de dez anos!, pensou indignada. Matt se afastou da mesa, enquanto examinava o restante dos papéis. — Então passe isso também para o computador, junto com todos os outros relatórios — mandou ele. — Isso está um lixo. Pelo visto, ele queria mesmo provocá-la de alguma maneira. Leslie sabia que havia centenas de relatórios como aqueles para serem digitados e que o trabalho não demoraria horas nem dias, mas meses para ser completado. Mas já que ele era o dono da empresa, claro que teria de obedecê-lo. — Seu desejo é uma ordem, chefe — disse em um tom seco, recebendo um olhar surpreso por parte dele. — Então devo deixar de lado tudo que Ed me pediu para fazer e passar os próximos meses me dedicando a isso? A brusca mudança de atitude de Leslie pegou-o desprevenido. — Não estipulei um limite de tempo para isso — disse a ela. — Só mandei que fizesse. — Oh, sim. Claro, senhor — ela concordou de imediato. Ele respirou fundo, parecendo impaciente. — Está se mostrando muito solícita, srta. Murry. Ou isso é apenas porque eu sou seu patrão? — Sempre tento fazer aquilo que me pedem, sr. Caldwell. Bem, quase sempre. Desde que haja um motivo plausível. Ele arqueou uma sobrancelha. — E o que você definiria como “motivo plausível’? — Um motivo que contenha um fundo profissional e não uma implicância pessoal — respondeu ela, de pronto. Leslie se surpreendeu quando ele a olhou de uma maneira diferente e não respondeu. Então ele foi até a porta da sala de Ed e olhou para dentro. — Ed, já conseguiu aquele relatório que Angus nos prometeu? — disse ele. Ed terminou o telefonema com algumas poucas palavras e mostrou a Matt a pasta que estava segurando. — Está aqui. Não lhe entreguei antes porque queria verificar os últimos índices de crescimento e de ganho de peso do gado. Eu queria colocar isso em sua mesa ainda hoje, mas acabei ficando sem tempo de examiná-lo. Matt pegou a pasta e examinou os papéis por alguns segundos. — Está aceitável. Ele fez um bom trabalho.
  • 9. Enquanto ele falava, Leslie o observou discretamente. Sentiu um aperto no peito ao pensar no garoto de seis anos que fora abandonado pela mãe. Sua própria infância também não havia sido fácil, mas a de Matt fora ainda pior. Ao sentir que estava sendo observado, ele olhou para ela. Embaraçada, Leslie desviou o olhar no mesmo instante. Matt se perguntou o que ela estivera pensando para ter aquela reação. — Precisa de mais alguma coisa? — a pergunta de Ed interrompeu-lhe os pensamentos. Matt deu de ombros. — Por enquanto, não. — Olhou mais uma vez para Leslie. — Não se esqueça de refazer os arquivos que eu pedi. Depois que Matt saiu, Ed continuou olhando para a porta fechada durante algum tempo. — Que arquivos? Leslie explicou os detalhes a ele. — Mas aquilo está desatualizado — murmurou Ed, pensativo. — E ele nunca se importou com aqueles dados. Não entendo por que ele lhe pediu isso. Ela se inclinou para frente. — Porque foi uma forma de me irritar e de me fazer trabalhar mais ainda! — cochichou Leslie, em um tom irritado. Ed arqueou as sobrancelhas. — Mas Matt não é do tipo que faz esse tipo. — Isso é o que você pensa. — Leslie pegou os papéis que Matt havia deixado sobre a mesa — Começarei por esses quando terminar de organizar sua correspondência. Acha que ele vai querer que eu fique depois do expediente? Mas vai ter de me pagar as horas extras. — Sorriu ao acrescentar: — Quem sabe isso não o desanime um pouco? — Deixe-me primeiro perguntar a Matt — Ed se voluntariou. — Faça seu trabalho normal, por enquanto. — Tudo bem. Obrigada, Ed. Ele deu de ombros. — Para que servem os amigos? — disse, com um sorriso. O escritório era um ótimo lugar para se trabalhar. Leslie se divertia vendo as outras secretárias “sabotando” as tentativas de fumar de Matt. Um dos momentos divertidos que ela presenciou foi quando Matt estava tentando acender um cigarro e a secretária dele se escondeu atrás de uma das plantas do escritório e mirou a pistola d’água no cigarro, apagando-o. Outro incidente engraçado foi quando ele deixou cigarro aceso sobre a mesa de Bessie David e ela “acidentalmente” o deixou cair na xícara de café dele, que se encontrava logo ao lado. Matt olhou para a xícara, então lançou um olhar acusador para Bessie. — O senhor nos deu permissão para isso — lembrou Bessie. Com uma careta de desgosto, ele deixou a xícara para trás e saiu. Leslie presenciara tudo de um canto da sala, de onde não fora vista. Durante todo o tempo, tivera de se esforçar para conter o riso. Surpreendia-se com a maneira como Matt era amigável e gentil com os empregados. Com ela, no entanto, ele continuava mantendo uma atitude implicante. Em certos momentos, perguntava-se o que ele faria se ela usasse a pistola d’água que a secretária dele havia lhe dado. Quando deu por si, estava rindo, imaginando Matt Caldwell correndo atrás dela, furioso, pela rua principal de Jacobsville. Alguns dias depois, Matt apareceu no escritório de Ed segurando um cigarro entre os dedos. Apesar da atitude das outras secretárias, Leslie não disse nada ao vê-lo segurando o cigarro apagado. — Quero ver a resposta da Associação dos Criadores de Gado sobre o teste de brucelose. Leslie olhou para ele. — Desculpe-me? Matt olhou-a em silêncio por um instante. Ele estava se acostumando à presença dela cada vez mais, e não estava gostando nada disso. — Ed me disse que você tinha uma cópia do relatório — disse ele. — Chegou junto com a correspondência de ontem. — Está bem. Leslie sabia onde a correspondência fora deixada. Em silêncio, foi até a caixa de entrada e pegou o envelope com o símbolo da Associação dos Criadores de Gado. Então o entregou a Matt. Durante o tempo em que a observara, Matt notou que ela estava mancando um pouco. Não era possível ver as pernas dela, porque Leslie estava usando uma saia longa, como tantas outras com as quais ele já a vira vestida. Era como se Leslie não gostasse de chamar atenção sobre seu corpo.
  • 10. — Você está mancando. Foi consultar um médico depois da queda que sofreu na minha fazenda? — Não foi preciso — respondeu ela, sem hesitar. Foi um machucado leve que agora está dolorido. Só isso. Matt apertou o botão do interfone sobre a mesa dela. — Edna, marque uma consulta para a srta. Murry com Lou Coltrain o mais rápido possível. Ela caiu de um cavalo, na minha fazenda, e ainda está mancando. Quero que ela faça alguns exames para ver se está tudo bem. — Não! — Leslie protestou. — Avise-a quando a consulta estiver marcada. Obrigado — ele agradeceu e desligou. — Então os olhos negros encontraram os de Leslie. — Você irá ao médico, sim. Ela desviou o olhar. Detestava médicos. O médico da sala de emergência, em Houston, um homem já aposentado e que não parecia haver sido muito dedicado à profissão, havia feito com que ela se sentisse totalmente humilhada enquanto a examinava, dizendo coisas horríveis a respeito de sua moral. Ela nunca se recuperara daquele trauma duplo, apesar do esforço dos terapeutas com os quais ela havia se tratado depois. Enrijeceu o maxilar e olhou para Matt mais uma vez. — Eu já disse que não estou machucada. — Você trabalha aqui. Eu sou seu patrão e você será examinada. Ponto final. Leslie sentiu vontade de pedir demissão. Gostaria de poder fazê-lo, mas não teria para onde ir se saísse dali. Houston estava fora de cogitação. Sabia que seria encontrada pelos repórteres assim que colocasse os pés na cidade, apesar de seu disfarce. Ela respirou fundo, tentando se controlar. Matt pareceu surpreso com aquela atitude. — Não quer se certificar de que o ferimento não a deixará manca permanentemente? Leslie levantou o queixo, com ar de orgulho. — Sr. Caldwell, eu sofri um acidente quando tinha dezessete anos e minha perna ficou com uma lesão permanente. Eu sempre manquei um pouco. Portanto, não foi a queda do cavalo que provocou isso. Matt pareceu conter o fôlego por alguns segundos. — Mais um motivo para você ir fazer os exames — replicou ele. — Pelo visto, gosta de viver perigosamente porque não deveria nem haver montado naquele cavalo. — Ed disse que o cavalo era manso. Na verdade, foi por minha culpa que ele empinou. Eu o assustei quando puxei as rédeas de repente. Matt estreitou o olhar. — Sim, eu lembro. Estava tentando se afastar de mim. Pelo visto, acha que eu tenho alguma doença contagiosa. — Não é isso — refutou Legue. — Só não gosto de se tocada. Ed a toca quando quer. Leslie não imaginou como responder aquilo sem ter de contar tudo a ele. E não suportaria que ele soubesse a verdade sórdida sobre seu passado. — Não gosto de ser tocada por estranhos — disse apenas. — Mas eu e Ed nos conhecemos há muitos anos. E… diferente com ele. Matt estreitou o olhar. — Deve ser. O sorriso irônico que ele mostrou em seguida deixou-a aborrecida. — Você parece um rolo compressor, não? — falou de repente. — Só porque é rico e poderoso acha que nenhuma mulher é capaz de resistir a você. Matt não gostou de ouvir aquilo. Um brilho perigoso surgiu nos olhos dele. — Não deveria dar ouvidos a fofocas — disse ele, em um tom perigosamente calmo. — Ela era uma garotinha mimada que pensava que o pai poderia comprar o homem que ela quisesse. Mas quando ela descobriu que isso não era possível, começou a trabalhar para um amigo meu e passou algumas semanas me perseguindo por Jacobsville. Até que cheguei em casa uma noite e a encontrei na minha cama, vestida apenas com um lençol. Eia a coloquei para fora, mas ela saiu dizendo para todo mundo que eu a havia atacado. Ela continuou dizendo isso no tribunal, até minha governanta testemunhar e dizer toda a verdade. — Ah, meu Deus — murmurou Leslie.
  • 11. Então, além dos problemas que ele havia tido com a mãe, Matt ainda tivera de enfrentar aquilo? Não sabia nada sobre aquele incidente do passado dele, mas, pelo visto, seu comentário o levara a pensar que ela sabia. Os lábios dele se curvaram em um sorriso amargo. — Mas, até o julgamento, ela conseguiu fazer com que me prendessem e me acusassem de um crime que eu não cometi — continuou ele. — Fiquei famoso na época. O sujeito com um passado imaculado que de repente virara um criminoso. Depois ela tentou o mesmo truque com um empresário do ramo de petróleo, em Houston. Só que ele me chamou para testemunhar a favor dele. Quando ele ganhou a causa, fez com que ela fosse indiciada por fraude e extorsão. E ela foi presa. Leslie sentiu o estômago revirar. Matt também já havia passado momentos realmente difíceis na vida. Aquilo explicava por que ele não se casara. Casamento era um compromisso que envolvia confiança e, pelo visto, ele não confiava em nenhuma mulher. E, certamente, isso também explicava a hostilidade que Matt demonstrara em relação a ela. Talvez estivesse pensando que começara a trabalhar na empresa com a intenção de cometer algum golpe ou até de causar algum escândalo público. Se pelo menos pudesse dizer a ele que era justamente disso que ela estava fugindo… — Talvez esteja pensando que eu sou desse tipo — disse, após um momento de silêncio. — Mas eu não sou. — Então por que age como se eu fosse atacá-la sempre que chego perto de você? — indagou Matt. — Ed é seu amante? — insistiu ele, quando Leslie permaneceu em silêncio. — Pergunte a ele. Matt rolou o cigarro apagado entre os dedos, olhando para ela. — Você é como se fosse um quebra-cabeça para mim — confessou ele. — Mas eu me considero muito simples — disse Leslie, forçando um sorriso. Em seguida voltou a ficar séria ao dizer: — Não gosto de médicos. Principalmente do sexo masculino. Lou é uma médica — salientou Matt. — Ela e o marido são médicos e têm um filho pequeno. —Oh… Uma mulher. Isso tornaria as coisas mais fáceis, pensou Leslie. Mas, mesmo assim, não queria ser examinada. O exame poderia denunciar qual havia sido a origem do problema, e ela não poderia confiar que a médica manteria segredo. — A decisão a respeito disso não depende de você — falou Matt. — Está trabalhando na minha empresa e sofreu o acidente na minha fazenda, portanto, sou responsável por isso. Leslie fitou-o nos olhos. De fato, não podia culpá-lo por sentir-se assim. — Está bem — respondeu. — Deixarei que ela me examine. — Sem mais protestos? — Matt arqueou uma sobrancelha. Ela deu de ombros. — O senhor é o patrão por aqui. Então, farei o que quer. Essa dra. Coltrain é a médica da empresa? — Sim. Leslie mordeu o lábio inferior. — E ela guarda o resultado dos exames como assunto confidencial, certo? — acrescentou ela, com ar preocupado. Matt não respondeu de imediato, ainda movendo o cigarro entre os dedos. — Sim — ele disse. — E confidencial. Está me deixando curioso, srta. Murry. Por acaso está escondendo algum segredo? — Todos nós guardamos segredos — replicou Leslie. — Alguns mais sombrios do que outros. Ele bateu o polegar na ponta do cigarro. — E qual é o seu? Atirou em seu amante? Leslie não ousou demonstrar nenhuma reação diante do comentário. Felizmente, conseguiu permanecer impassível. Matt guardou o cigarro no bolso. — Edna vai avisá-la quando a consulta com Lou estiver marcada — declarou ele, olhando para o relógio. Então indicou o envelope. — Diga a Ed que peguei isso. Depois falarei com ele sobre esse assunto. — Sim, senhor. Matt á estava a caminho da porta, mas resistiu ao impulso de olhar para Leslie. Quanto mais descobria a respeito dela, mas intrigado se sentia. Ela tinha o poder de inquietá-lo. De uma maneira que ele não sabia explicar.
  • 12. Não houve como escapar da consulta ao médico. Leslie falou brevemente com a dra. Coltrain, antes de ser mandada para a sala onde eram feitos os exames de raios X. Uma hora depois, ela estava de volta ao consultório de Lou, observando a médica examinar as chapas sobre uma placa iluminada. Lou pareceu preocupada. — Não há nenhuma lesão pela queda, exceto alguns machucados — disse ela. Olhando para Leslie, acrescentou: — Mas as fraturas em sua perna são mais antigas. Leslie enrijeceu o maxilar e não respondeu nada. Lou voltou a se sentar à mesa, diante de Leslie. — Não quer falar sobre isso, não é? — disse a médica, com gentileza. — Não vou insistir. Mas você sabe que os ossos não cicatrizaram devidamente na época, não sabe? Por isso está mancando até hoje. Eu deveria encaminhá-la para um cirurgião ortopedista. — Pode me encaminhar, mas eu não irei — avisou Leslie. Lou uniu as mãos sobre a mesa. — Sei que não me conhece o suficiente para confiar em mim. Mas depois que estiver em Jacobsville por algum tempo, saberá que sou de confiança. Não falo com ninguém sobre meus pacientes, nem mesmo com meu marido. Prometo que não direi nada a Matt. Leslie permaneceu em silêncio. Como sempre, era difícil se abrir com estranhos. Já havia sido suficientemente difícil fazer isso com o terapeuta no passado. A médica suspirou. — Tudo bem, não vou insistir. Mas se precisar de alguém com quem conversar, pode contar comigo. Leslie levantou a vista para ela. — Obrigada, doutora— agradeceu, com sinceridade. — Você não é a companhia preferida de Matt, acertei? — Lou perguntou de repente. Legue não conteve o riso. — Não, não sou. Mais cedo ou mais tarde, acho que ele acabará encontrando uma maneira de me despedir. — Estranho, porque Matt se dá bem com todo mundo. Ele é muito gentil com as pessoas que estima. — Ele é um rolo compressor — afirmou Leslie. — Parece que só consegue falar com as pessoas se estiver por cima delas — acrescentou e cruzou os braços, parecendo pouco à vontade. Então é isso, pensou Lou, imaginando se Legue tinha idéia do que sua linguagem corporal estava denunciando. Alguém causara aquele ferimento na perna de Legue. Provavelmente um homem. — Você não gosta que as pessoas a toquem — disse Lou. Leslie se endireitou na cadeira. — Não. Lou observou as roupas conservadoras que Leslie usava, porém não disse mais nada. Por fim, ficou de pé e sorriu com gentileza. — Não houve nenhuma lesão nessa última queda — explicou. — Mas volte a me procurar se a dor piorar. Leslie franziu o cenho. — Como sabe que eu estava com dor? — perguntou ela, lembrando-se de que não havia mencionado esse detalhe à médica. — Matt disse que você estava fazendo uma expressão de dor todas as vezes que levantava da cadeira. Leslie se surpreendeu. — Não imaginei que ele houvesse notado. — Ele é muito observador. Lou prescreveu um analgésico para a dor e avisou mais uma vez para Leslie procurá-la se a dor não passasse. Leslie assentiu e saiu do consultório em meio a uma espécie de torpor, imaginando o que mais Matt Caldwell deduzira sobre ela apenas por meio de observação. Sentiu-se pouco à vontade com a idéia. Fazia menos de dez minutos que ela havia chegado ao escritório quando Matt apareceu à porta. — E então? — perguntou ele. — Eu estou bem — Leslie respondeu. — Fiquei apenas com alguns hematomas. Mas fique tranqüilo, não vou processá-lo.
  • 13. Matt não demonstrou nenhuma reação, embora estivesse aborrecido. Lou. não havia lhe dito nada, exceto que Leslie era fechada feito uma concha. Mas isso ele já sabia. — Diga a Ed que eu vou ficar fora por alguns dias — avisou ele. — Sim, senhor. Matt olhou-a uma última vez e se retirou. Mas somente quando Leslie teve certeza de que ele já havia se afastado suficientemente foi que ela começou a relaxar. CAPÍTULO 3 Leslie voltou a ter pesadelos naquela noite. Na verdade, ela já havia deduzido que iria tê-los, devido à consulta com a dra. Coltrain e ao exame de raios X. Ter de usar sapatos de salto alto para trabalhar também não contribuíra muito para sua recuperação. Como se não bastasse ter aqueles pesadelos horríveis, a dor em sua perna estava quase insuportável. No meio da noite, tomou duas aspirinas, na esperança de que o remédio amenizasse um pouco a dor. Enquanto esperava o remédio fazer efeito, chegou à conclusão de que teria de abrir mão da moda e voltar a usar sapatos baixos. Contudo, isso não passou despercebido por Matt quando ele voltou para o escritório, três dias depois. Ele estreitou o olhar ao vê-la andar em direção à sala dela. — Lou deveria ter lhe receitado algum remédio para dor — disse ele, parando à porta. Leslie havia acabado de tirar uma pasta do arquivo. — E foi o que ela fez. Mas analgésicos me deixam muito sonolenta e não seria produtivo trabalhar assim. — Ficar sentindo a dor também não é produtivo. Ela assentiu. — Eu sei disso. Tenho algumas aspirinas na bolsa, mas a dor não está muito forte. São apenas alguns hematomas que logo desaparecerão. A própria dra. Coltrajn disse isso. — Mas você não deveria ainda estar mancando depois de uma semana. Quero que vá se consultar com Lou mais uma vez… — Eu ando deste jeito há seis anos, sr. Caldwell — afirmou Leslie, com calma. — Se não gosta de me ver mancando, talvez seja melhor não ficar me olhando. Ele arqueou as sobrancelhas. — Os médicos não podem fazer nada para curála disso? Leslje o encarou. — Eu odeio médicos! A veemência da afirmação espantou Matt. A expressão de Leslie ficara totalmente alterada, muito diferente do semblante tranqüilo que ela Costumava manter. — Nem todos eles são ruins — salientou ele. — Eu sei, mas eles não podem fazer milagres. Reconstituir um osso esmigalhado não é tarefa fácil. Leslie se arrependeu assim que terminou de falar. Não pretendia contar a ele detalhes sobre sua fratura. No mesmo instante, um ar de questionameno surgiu no rosto dele. Felizmente, porém, Leslie foi salva de ter de dar mais explicações quando Ed saiu da saladele de repente. — Matt! Que bom que já voltou. Acabei de falar com Bill Payton e ele queria saber se você vai comparecer ao jantar, no sábado à noite. Haverá música ao vivo e tudo mais — acrescentou ele, com um sorriso. Sim, eu irei — respondeu Matt, com ar ausente. — Diga a ele para reservar dois convites para mim. Você também vai? — Pensei em ir e levar Leslie comigo. — Voltando-se para ela, Ed explicou: — Será o jantar anual da Associação de Criadores de Gado de Jacobsville. Teremos de assistir a algumas palestras, mas se você sobreviver a elas e à galinha “borrachenta” servida no jantar, poderemos até dançar um pouco. — Não sei se ela vai conseguir dançar muito — salientou Matt, olhando para Leslie. Ed arqueou as sobrancelhas. — Você ficaria surpreso se a visse dançar, Matt — falou ele, evidentemente não entendendo a que o primo se referira. — Leslie adora músicas latinas. — Voltando-se para ela, Ed acrescentou: — Matt também gosta de música latina. Você não acreditaria no que ele é capaz de fazer ao ouvir um
  • 14. mambo ou uma rumba, isso sem falar em tango. Ele namorou uma professora de dança durante alguns meses, mas o talento que ele já tinha ajudou bastante. Matt não disse nada. Continuou observando o semblante de Leslie enquanto se perguntava se. Ed saberia algo sobre aquele problema na perna dela, e se conseguiria obter mais informações a respeito disso. — Podem ir comigo, se quiserem — sugeriu Matt. — Vou alugar a limusine de Jack Bailey e talvez isso ofereça um pouco de aventura à sua secretária. Será uma aventura para mim também — afirmou Ed. — Obrigado, Matt. Detesto ficar procurando um lugar para estacionar quando há alguma festa no clube. — Então somos dois. Uma das secretárias das outras salas avisou Matt de que havia um telefonema para ele. Matt se retirou e Ed saiu logo depois dele para uma reunião. Leslie se perguntou como agüentaria passar uma festa inteira na companhia de Matt Caldwell, e talvez até dançando com ele, sem se envolver demais. Sem dúvida, seria um desafio. Leslie tinha apenas um vestido que seria adequado para a festa no clube. Tratava-se de um longo reto azul-royal cujo maior charme eram as alças finíssimas que deixavam seus ombros à mostra. Os sapatos pretos tinham o salto confortavelmente baixo, sem abrir mão da elegância. Ela havia prendido os cabelos em um coque frouxo, deixando alguns fios soltos ao redor do rosto e do pescoço. Ed suspirou ao avistá-la, enquanto a limusine parava diante da casa dela. Ele saiu do carro e foi ao encontro dela na varanda. Leslie segurava uma pequena bolsa preta e mal conseguia disfarçar a ansiedade diante de sua primeira festa desde os dezessete anos. Estava incrivelmente nervosa. — Estou bem assim? — perguntou a Ed, hesitante. Ele sorriu. — Está linda. — Você também não está nada mal com esse smoking — observou ela, também sorrindo. — Não deixe que Matt perceba quanto você está nervosa — falou Ed, enquanto os dois se encaminhavam para o carro. — Alguém telefonou e o tirou do sério pouco antes de sairmos da minha casa. Carolyn está quase chorando. — Carolyn? — Leslie franziu o cenho. — A mais nova namorada dele. Ela pertence a urna das famílias mais tradicionais de Houston. Veio passar alguns dias na casa da tia, por isso estava disponível para nos acompanhar esta noite. Ela passou meses tentando conquistar Matt. — Ela é bonita? — Muito — respondeu ele. — Em alguns momentos, ela me faz lembrar de Franny. Franny fora a noiva de Ed, que morrera durante um assalto ao banco onde ela trabalhava. O trágico incidente acontecera na mesma época em que Leslie tivera complicações em casa, por isso a amizade dos dois havia se tornado ainda mais intensa. — Deve ser difícil para você — supôs ela, em um tom solidário. Ed olhou-a com ar de curiosidade quando eles chegaram ao carro. — Leslie, você nunca se apaixonou? Ela deu de ombros. — O que aconteceu comigo me deixou desconfiada em relação aos homens. — Não é de admirar. Ele esperou o chofer abrir a porta da limusine para eles. Leslie entrou primeiro, seguida por Ed. Quando Leslie se acomodou no assento, deparou-se com uma belíssima loira. Trajava um vestido preto, reto, e usava inúmeros brilhantes. — Você deve se lembrar do meu primo, Ed — disse Matt, sentado ao lado dela. — Essa é a secretária dele, srta. Murry. Esta é Carolyn Engles — acrescentou, apresentando a loira a Leslie. Depois de trocarem alguns cumprimentos, Leslie observou o luxuoso interior do carro, que mais lembrava um pequeno apartamento sobre rodas. — Nunca esteve em uma limusine antes? — perguntou Matt, com ar de divertimento. — Para ser sincera, não — Leslie respondeu. — Obrigada pela oportunidade que está me dando de conhecer uma. Por um momento, Matt pareceu desconcertado com a resposta. Dirigindo-se ao primo, ele falou: — Amanhã, logo cedo, quero que você suspenda todo o dinheiro de patrocínio que estamos fornecendo a Marcus Boles. Ninguém, e eu estou dizendo ninguém, vai me envolver em um negócio escuso como esse. — Estou surpreso que não tenhamos enxergado quem ele era desde o início — disse Ed. — Ele comprou uma propriedade na América do Sul — falou Matt. — Ouvi dizer que ele vai morar lá. Se tiver sorte, amanhã conseguirá chegar ao aeroporto antes de se deparar comigo.
  • 15. A ameaça implícita no comentário continuou pairando no ar durante algum tempo. Leslie estremeceu. Das pessoas ali presentes, ela, mais do que ninguém, sabia o que a agressão física era capaz de causar. Suas lembranças eram enevoadas e confusas, mas sempre se tornavam muito nítidas nos pesadelos que tinha constantemente. — Calma, querido — Carolyn disse a Matt com gentileza. — Está assustando a srta. Marley. — Murry — Ed a corrigiu. — Que estranho, Carolyn, não lembro de você ter memória fraca para nomes. Carolyn limpou a garganta. — Que bom que a noite está agradável, não? — Ela mudou de assunto de repente. — Nenhum indício de chuva e a lua está maravilhosa. — Sim, é verdade. Matt lançou um olhar severo para o primo, que respondeu com um sorriso vago. Leslie se divertia com a maneira como Ed era capaz de fingir inocência Conhecia-o muito bem para saber que ele estava fingindo. Matt, por sua vez, não parava de admirar Leslie, trajando aquele vestido simples, mas muito elegante. Sua pele parecia uma pálida superfície de veludo e ele se perguntou se ela seria tão macia ao toque quanto parecia ser. Leslie não era uma mulher de beleza extraordinária, mas tinha um encanto todo próprio, algo que o atraía de uma maneira que ele não sabia explicar. — De onde você é, srta. Murbery? — Carolyn perguntou. — Murry — Leslie a corrigiu discretamente. — Sou de uma cidade pequena ao norte de Houston. — Uma genuína texana — brincou Ed, sorrindo para ela. — Qual o nome da cidade? — Matt indagou. — Nem vale a pena dizer porque tenho certeza de que nunca ouviram falar dela — respondeu Leslie, sem querer fornecer maiores detalhes. — Seus pais são fazendeiros? — Matt insistiu. Ela balançou a cabeça negativamente. — Meu pai era agroquímico. — O quê? — Carolyn franziu o cenho. — Alguém com conhecimento químico em agronomia — explicou Leslie. — Ele… morreu devido ao trabalho. — Pesticidas — concluiu Matt. — O que diabos é preciso para que o governo… — Matt, será que poderíamos deixar a política de lado pelo menos esta noite? — pediu Ed. — Eu gostaria de me divertir um pouco. Matt lançou um olhar de censura para o primo, mas logo relaxou e se recostou no assento, passando o braço pelos ombros de Carolyn e puxando-a para si. O brilho de divertimento em seu olhar pareceu denunciar que ele apreciara o desconforto que seu gesto provocara em Leslie. Se ele estava querendo provocá-la com aquilo, estava conseguindo. O clube ficava às margens de um lago, formando um bonito cenário todo iluminado. Os chafarizes e os arcos em volta do prédio contribuíam ainda mais para tornar o local encantador, fazendo dele um dos orgulhos dos moradores de Jacobsville. E como Ed previra, não havia sequer uma vaga disponível para estacionar o carro. Matt anotou o número do pager do motorista, e ficou de chamá-lo quando fosse necessário. Os quatro foram recebidos por um comitê de boas-vindas à porta do clube. Havia uma banda tocando música ao vivo. Leslie foi logo se animando ao distinguir o agradável ritmo de bossa nova. Ela sempre se sentia muito viva quando ouvia música. Qualquer tipo de música. Na infância, a música havia sido seu meio de escapar daquele ambiente que às vezes se tornava quase insuportável. Não aprendera a tocar nenhum instrumento, mas sabia dançar muito bem. De fato, o amor pela dança era a única coisa que ela e a mãe tinham em comum. Marie havia ensinado todos os passos que Leslie conhecia, e não eram poucos. Por isso se tornara ainda mais irônico o fato de seu amor pela dança haver sido drasticamente afetado pelo evento ocorrido quando ela estava com dezessete anos. — Prepare seu prato — disse Ed, aproximando-se com ela da mesa do bufê. — Está precisando engordar um pouco. Leslie sorriu para ele. — Não estou magra, Ed. — Está sim — respondeu ele, em um tom sério. — Vamos lá, esqueça um pouco os problemas e divirta-se. Aproveite a noite ao máximo! Coma, beba e seja feliz!
  • 16. “Por que amanhã você voltará a ser a mesma”, completou Leslie, em pensamento. Colocou alguns canapês em um prato e serviu-se de refrigerante, em vez de bebida alcoólica. Ed encontrou duas cadeiras desocupadas próximas à pista de dança, de onde eles poderiam ouvir a música com nitidez e observar os casais dançarem. A vocalista da banda era uma bonita morena com cabelos compridos, dona de uma belíssima voz. Ela estava tocando violão e cantando uma canção tão romântica que fez Leslie suspirar alto. Quando deu por si, um sorriso estava curvando seus lábios. Mesmo estando do outro lado do salão, Matt notou a mudança em Leslie. Ela adorava música. E podia apostar que ela também adorava dançar, concluiu, sentindo seus dedos se contraírem junto ao prato. — Vamos nos sentar com os Devore, querido? — sugeriu Carolyn, indicando um casal de ótima aparência, que ocupava uma mesa do outro lado do salão. — Acho melhor continuarmos acompanhando meu primo — respondeu ele. — Ed não está acostumado a esse tipo de evento. Para mim, ele parece bastante familiarizado com o ambiente — observou Carolyn, olhando na mesma direção que ele. — Na verdade, é a acompanhante dele que está parecendo pouco à vontade. Meus Deus, ela está batendo o pé no ritmo da música! Que atitude deselegante! — Carolyn, não acredito que nunca tenha feito isso na vida — ironizou Matt. — Ou será que já nasceu assim, tão completa e aborrecidamente sofisticada? Ela arregalou os olhos. Matt nunca havia falado com ela daquela maneira. — Desculpe-me — disse ele, percebendo que se excedera. — Ainda estou aborrecido com Boles. — Eu… notei — falou ela, ainda abalada. Os dois seguiram em direção à mesa ocupada por Ed e Leslie. Matt sentou-se diante de Leslie, que se tornou tensa no mesmo instante. — Carolyn, troque de lugar comigo — disse Matt de repente, forçando um sorriso. — Esta cadeira está baixa demais para mim. — Não acho que a minha seja muito mais alta do que a sua, querido, mas se é o que você quer… — respondeu Carolyn, em um tom adocicado. Leslie relaxou. Lançou um sorriso tímido para Carolyn, então voltou a prestar atenção na vocalista da banda. — Ela não é maravilhosa? — indagou Carolyn. — Ela é de Yucatán. — Além de talentosa, é também muito bonita — acrescentou Ed. — Adoro este ritmo. — Oh, eu também — anuiu Leslie, comendo um canapê sem desviar a atenção do palco. Matt se pôs a observá-la, surpreso com a desinibição de Leslie diante da música. Quando haviam chegado, ela parecera pouco à vontade, mas bastara começar a ouvir a música para se tornar uma pessoa diferente. Estava tendo uma amostra de como ela era antes de se transformar naquela pessoa desconfiada, que temia a aproximação física dos outros. O que teria acontecido para deixá-la assim? Sentia-se intrigado a esse respeito, mas não sabia por onde começar a encontrar respostas. Leslie parecia uma pessoa de personalidade complexa. Ed notou o olhar atento de Matt sobre Leslie. Teve vontade de chamar o primo a um canto e contar toda a triste história a ele. Sabia que Matt estava curioso a respeito de Leslie, e que ele era muito persistente quando queria descobrir uma coisa. Ele acabaria questionando Leslie a respeito disso e ela iria se encolher na concha que as experiências desagradáveis haviam criado em torno dela. Leslie estava começando a sair ao sol e lá estava Matt prestes empurrá-la de volta para a sombra. Por que seu primo não conseguia se contentar com a adoração de Carolyn? O problema era que, diferentemente das outras mulheres, Leslie não vivia se jogando aos pés dele. E Ed tinha certeza de que era justamente por isso que Matt se sentia atraído por ela. No íntimo, estava receoso pelo que Matt poderia causar aos frágeis sentimentos de Leslie. Naquele momento, as pessoas começaram a aplaudir, a canção havia terminado. A cantora agradeceu e apresentou os membros da banda, antes que os primeiros acordes envolventes de Aquarela do Brasil começassem a tocar. Aquela era uma das músicas preferidas de Leslie, e ela deixou transparecer isso de imediato. Com um brilho de entusiasmo no olhar, começou a tamborilar os dedos sobre a mesa, morrendo de vontade de dançar ao som daquela música de ritmo contagiante.
  • 17. Como que entendendo a mensagem, Matt ficou de pé. E antes que Leslie tivesse tempo de hesitar ou de recusar o convite, ele a conduziu gentilmente até a pista de dança. Seus olhos encontraram os dela, enquanto a envolvia pela cintura e segurava-lhe a mão esquerda no ar. — Não vou fazer nenhuma virada súbita — prometeu ele. Então assentiu uma vez, para marcar o ritmo. O que aconteceu em seguida foi a realização de um sonho para Leslie. Conteve o fôlego ao notar a habilidade de Matt e simplesmente se esqueceu de ter medo dele. Esqueceu-se de que deveria estar apreensiva ao se ver tão perto de um homem. Sem nenhum traço de temor, deixou-se levar pelo ritmo e pela satisfação de ter um parceiro que sabia dançar com perfeição ao som do ritmo brasileiro. — Você dança muito bem — elogiou Matt, sorrindo com sinceridade enquanto eles se moviam pela pista. — Você também. — Leslie também sorriu. — Se sentir algo na perna avise-me, e eu a levarei de volta para a mesa, está bem? — Sim. — Então vamos continuar. Matt a conduziu pela pista de dança com a habilidade de um dançarino profissional, e Leslie o acompanhou com tanta perfeição que os outros casais pararam de dançar para admirá-los. Envolvidos pela música, Leslie e Matt nem prestaram atenção na expressão de admiração das pessoas e no sorriso dos componentes da banda. Quando soaram os acordes finais da música, Matt puxou-a para si e inclinou-a com elegância, em uma finalização admirável, mas dolorosa. Os aplausos que se seguiram foram entusiasmados. Matt levantou Leslie e somente então notou quanto ela estava pálida. — Muita coisa em pouco tempo, não? — murmurou ele, com ar preocupado. — Venha, vamos para a mesa. Sem se aproximar muito dela, Matt ofereceu-lhe o braço, para que ela sê apoiasse. Leslie o acompanhou com certa dificuldade, devido à dor, mas não se arrependeu nem por um momento. De fato, só se deu conta de que havia falado sobre a dor quando ouviu Matt dizer: — Por acaso trouxe uma aspirina nessa bolsa minúscula? Ela riu, balançando a cabeça negativamente. — Voltarei em um instante — disse ele, antes de se afastar. Ed se aproximou e segurou a mão dela com delicadeza. — Dançou maravilhosamente, Leslie — elogiou ele. — Foi incrível! Nunca imaginei que você dançasse tão bem. — Nem eu — brincou ela. — Foi uma exibição e tanto anuiu Carolyn, em um tom frio. — Mas foi tolice fazer algo tão doloroso para você. Agora aposto que Matt vai passar o resto da noite se culpando e procurando uma aspirina para você. Após dizer isso, ela se afastou para o outro lado do salão. — Ela ficou de mau humor — asseverou Ed. — Eu não deveria ter feito isso — murmurou Leslie. — Mas foi tão divertido, Ed! Nunca me senti tão viva! — Eu notei. — Ele sorriu. — Foi bom ver seus olhos brilhando novamente. Ela demonstrou um ar de preocupação. — Arruinei a noite de Carolyn. — Foi uma troca justa — respondeu ele. — Ela arruinou a minha no instante em que entrou na limusine e disse que eu estava com cheiro de confeitaria de shopping. — Seu perfume está ótimo — falou Leslie. Ele sorriu. — Obrigado. Matt apareceu logo em seguida, trazendo Lou Coltrain consigo. — Puxa — murmurou ela, olhando para Leslie —, pensei que você estivesse morrendo pela maneira como Matt segurou meu braço e me trouxe até aqui. — Eu não trouxe nenhuma aspirina — falou Leslie. — Sinto muito… — Não há nada a lamentar — Lou a interrompeu, tocando a mão de Leslie. — Mas você estava com um hematoma feio e esse não era o tipo de exercício que eu recomendaria. Ossos fraturados nunca se recuperam completamente, mesmo depois de recompostos, o que não é exatamente o caso da sua fratura.
  • 18. Embaraçada, Leslie mordeu o lábio. — Você vai ficar bem — prometeu Lou, com um sorriso gentil. — Na verdade, exercício é bom para os músculos que apóiam esse osso, para torná-lo mais forte. Mas não repita isso por algumas semanas. Tome isto — acrescentou, abrindo a bolsa. — Sempre carrego aspirinas comigo. Dizendo isso, entregou a ela um pequeno recipiente de metal contendo as aspirinas. Matt encheu um copo com água e o entregou a ela. Então permaneceu sério, observando ela tomar duas aspirinas de uma única vez. — Obrigada — Leslie agradeceu a Lou. — Vá ao meu consultório na segunda-feira — falou Lou em um tom de voz seguro. — Vou lhe prescrever algo que possa facilitar um pouco sua vida. Nada de narcóticos — acrescentou com um sorriso. — Apenas anti-inflamatórios. Eles farão muita diferença. — Obrigada. E uma ótima médica — disse Leslie, em um tom agradecido. Lou estreitou o olhar. — Conheceu algum médico ruim, Leslie? — Sim — respondeu Leslie, com frieza. Então sorriu novamente. — Mas você me fez mudar de idéia sobre os médicos. — Ponto para mim. — Lou também sorriu. — Vou agora mesmo contar isso a Cooper — disse, olhando na direção do marido, do outro lado do salão. — Ele vai ficar impressionado. — Poucas coisas impressionam o dr. Coltrain — falou Matt, depois que Lou se retirou. Então, olhando de Leslie para Ed, perguntou: — Onde está Carolyn? — Sumiu de repente — respondeu Ed, em um tom evasivo. — Vou procurá-la. Tem certeza de que ficará bem? — Matt perguntou a Leslie. — Sim, e obrigada por haver trazido Lou. As aspirinas já estão aliviando a dor. Ele assentiu, antes de ir à procura de Carolyn. — Acho que também arruinei a noite dele — disse Leslie, com ar pesaroso. — Não deve se culpar por isso — falou Ed. — Fazia tempo que eu não via Matt se divertir tanto. A maioria das mulheres daqui não sabem dar mais do que dois passos em uma pista de dança. Vocês dançaram incrivelmente bem. — Eu adoro dançar. — Leslie suspirou. — Sempre adorei. Minha mãe também era assim. — Seu olhar adquiriu um brilho saudosista. — Eu ficava encantada quando a via dançar com meu pai. Eles tinham um ritmo e uma leveza impressionantes. — De súbito, o brilho sumiu dos olhos dela. — Ela pensou que eu encorajei Mike e os outros… Quando ela atirou nele e a bala o atravessou e atingiu minha perna… — Então foi assim que tudo aconteceu — Ed a interrompeu. Leslie olhou para ele, parecendo não ter muita noção dó que acabara de dizer. Por fim, assentiu e continuou: — O médico da sala de emergência deixou claro que achava que a culpa havia sido toda minha. Por isso minha perna não foi devidamente curada. Ele removeu a bala, mas não fez tudo que era preciso. Um outro médico percebeu isso algum tempo depois e recomeçou o tratamento, mas, a essa altura, eu já havia começado a mancar. E não tinha mais dinheiro para fazer o tratamento da maneira adequada. Minha mãe havia ido para a prisão e eu estava sozinha. Se não fosse pela família de Jéssica, minha melhor amiga, eu não teria nem mesmo tido onde ficar. Eles me levaram para morar com eles, apesar das fofocas, e eu pude continuar estudando por mais algum tempo. — Nem sei como você conseguiu entrar na faculdade e começar a cursá-la, com toda aquela pressão e as sessões no tribunal ocorrendo quase todos os dias — observou Ed. — Não foi fácil — admitiu ela. — Mas isso também me deixou mais forte. Sim, você se tornou uma mulher forte. Leslie sorriu para ele. — Obrigada pelo apoio que você tem me dado e que sempre me deu, Ed. — Diga isso a Matt. Quem sabe ele mude um pouco de opinião a meu respeito. Ela sorriu. — Até que ele não é tão cruel assim. Dança feito um anjo. Ed olhou para o outro lado do salão, localizando Matt e Carolyn. Porém, sentiu uma onda de apreensão ao ver o primo encará-lo e começar a andar em direção a eles. Não gostava nem um pouco daquela expressão de Matt. O primo só o encarava daquela maneira e andava lentamente daquele jeito quando estava perigosamente aborrecido. CAPÍTULO 4
  • 19. Pelo olhar, Leslie sabia que Matt estava aborrecido. Embora não se lembrasse de haver feito qualquer coisa que pudesse deixá-lo naquele estado de humor, tinha a impressão de ser a responsável por tal mudança. Enquanto se aproximava, ele fez uma chamada rápida ao telefone celular, voltando-o a guardá-lo no bolso em seguida. — Sinto muito, mas teremos de ir embora — falou Matt, em tom gélido. — Carolyn disse que está com uma enxaqueca insuportável. — Tudo bem — respondeu Leslie, sorrindo aliviada por não ser a causa do mau humor dele. — Eu não poderia mesmo dançar de novo, apesar de haver gostado muito da experiência. Ele não respondeu. Apenas estreitou o olhar de maneira pouco amistosa. — Ed, você poderia ir até a porta da frente para esperar o carro? Já telefonei para o motorista. — Claro — respondeu Ed, hesitando de maneira visível por um momento. Matt continuou a fitar Leslie com tanta intensidade que a fez sentir-se desconfortável. — Você acabou se mostrando um verdadeiro “fogo de palha” — falou ele, em tom sóbrio. — Mas algo me diz que as coisas são diferentes do que aparentam, não é? Tenho a impressão de que era uma ótima dançarina antes de ter esse problema na perna. Leslie estranhou o tom dele. — Aprendi a dançar assim com minha mãe — respondeu ela, com sinceridade. — Costumávamos treinar juntas. — Tente outra — murmurou Matt, estreitando. Depois das demonstrações de repulsa à sua proximidade, chegara o momento da conveniente e bem planejada mudança de atitude, pensou Matt. Era um truque antigo do qual ele já havia sido vítima: fazer-se de difícil para estimulá-lo a tomar a iniciativa. Como não percebera aquilo antes? Mas, já que estava no jogo, pretendia descobrir quão longe ela chegaria. — O quê? — questionou Leslie franzindo o cenho, pois não conseguira ouvi-lo. — Nada, nada. Ed já deve estar lá fora com o motorista. Podemos ir? Estendendo a mão na direção dela, colocou-a de pé de maneira abrupta. O movimento brusco lhe causou dor. Mesmo sem se ver no espelho, sabia que ficara pálida, tanto por causa da dor como por causa do modo dominador como Matt a segurava. Foi preciso esforçar-se para não entrar em pânico, pois aquilo a fez lembrar-se de outra situação de seu passado. Naquela época ainda não sabia como reagir, mas tal condição mudara bastante. Virando o braço com rapidez, forçou-o para baixo contra o polegar da mão dele livrando-se no mesmo instante, como ensinara seu instrutor de defesa pessoal. Matt a fitou com ar surpreso. — Onde aprendeu isso? Com sua mãe? — Não. Com meu professor de Tae Kwon Do, em Huston. Apesar do problema na minha perna, posso me defender muito bem. — Oh, disso eu tenho certeza — respondeu ele, estreitando o olhar. — Você realmente não é o que parece ser, srta. Murry. Vou me empenhar em descobrir a verdade a seu respeito. Leslie sentiu um mal-estar repentino. A última coisa que queria era alguém remexendo seu passado. Passara os últimos anos fugindo e se escondendo dele. Por que teria que voltar a fugir, justo quando começava a sentir-se segura? Ao ver a expressão assustada dela, Matt teve certeza de que quase caíra em outra armadilha ardilosa. Como era possível que, apesar de tudo que já aprendera a respeito das mulheres, não houvesse percebido a farsa dela mais cedo? Lembrou-se de sua própria mãe e sentiu uma onda gélida percorrer-lhe o corpo. Com aqueles cabelos claros, Leslie até mesmo se parecia com ela. Segurando-a pela parte superior do braço, apertou-o com mais força ainda ao notar a dificuldade dela em andar. — Por favor — falou ela, com a voz entrecortada —, vamos mais devagar. Estou com dor. Parando de repente ao perceber que a estava forçando além do limite, Matt soltou o fôlego de maneira. aborrecida. Esquecem-se do problema fisico na perna dela, considerando-o como se fosse parte da atuação. — O problema da perna é real — murmurou Matt, como se estivesse falando consigo mesmo. — Mas e o resto? O olhar dela encontrou o dele. — Sr. CaIdwell, independentemente de quem ou do quê eu seja, não represento nenhum perigo para você. Não gosto de ser tocada, mas gostei do modo como dançamos, Havia anos que não eu dançava.
  • 20. — As vezes você me parece tão familiar que é como se eu já a tivesse visto antes — disse ele em tom severo, lembrando-se de sua própria mãe e do modo como ela o decepcionara e o magoara anos antes. Mas Leslie não sabia disso. Cerrando os dentes de dor, tentou não demonstrar o medo que sentiu. Era provável que a tivesse mesmo visto, como todo o restante do pais a vira, em capas de revistas e em primeiras páginas de tablóides. Os jornalistas a haviam fotografado até a exaustão na noite em que os paramédicos a retiraram do apartamento de sua mãe em uma maca, chorando de dor e de horror e com a perna sangrando muito. Mas, naquela época, usava cabelos escuros e óculos. Seria possível que ele a tivesse reconhecido? — Devo ter aquele tipo de rosto comum — falou ela, fazendo uma careta e se movendo um pouco, para apoiar o peso do corpo sobre a perna saudável. — Poderíamos ir logo? A dor está quase insuportável. Matt ficou imóvel por um momento, então se curvou de repente e a ergueu nos braços, começando a carregá-la por entre a admirada multidão. — Sr… sr. Caldwell… — protestou Leslie, enrijecendo as costas. Jamais fora carregada por um homem antes, mas ficou tão encantada observando-o de perto e sentindo aqueles braços fortes sob seu corpo que não sentiu o medo usual. Depois de haverem dançado, a proximidade fisica dele se tornou algo aceitável. Enquanto se esforçava para conter o estranho impulso que sentia, de levar a mão aos cabelos ondulados dele para acariciá-los, viu-o encará-la com uma das sobrancelhas arqueadas. Isso a deixou sem fôlego e sem forças. Era preciso dizer algo. Qualquer coisa. — V-você é… muito forte. O tom de voz de Leslie o tocou no íntimo. Sustentando o olhar dela por um instante, desviou a atenção para aqueles lábios delicados e convidativos, fitando-os longamente enquanto diminuía a velocidade de seu caminhar. Ela se segurou com força na lapela do smoking dele, passando então a observar os lábios dele também. Jamais desejara ser beijada desde a experiência traumática que tivera, pois seu agressor a beijara à força, deixando-a enojada. Com Matt seria diferente, disso Leslie tinha certeza. Sabia instintivamente que não sentiria aversão às carícias dele. Estava observando-o com curiosidade e avidez quando o ouviu puxar o fôlego de maneira abrupta. Aquilo a fez encará-lo no mesmo instante. — Cuidado — alertou ele, em tom profundo. — A curiosidade matou o gato. Hein? — Você caiu de um cavalo tentando evitar qualquer contato físico comigo. Agora me olha como se fosse capaz de fazer qualquer coisa ,para ter meus lábios sobre os seus. Por quê? — Não sei — murmurou ela, apertando a mão sobre a lapela do traje dele. — Gosto de senti-lo próximo. Engraçado. Jamais desejei ficar assim perto de alguém. Matt parou de repente. Aqueles braços fortes que a sustentavam pareceram estremecer um pouco e a apertaram contra aquele peito másculo, fazendo um de seus seios pressioná-lo. A respiração dele se tornou audível. Era como se as pessoas ao redor deles, no alto da escadaria, nem existissem. Leslie sentiu um delicioso arrepio percorrer-lhe o corpo, fazendo-a soltar um riso trêmulo e suave diante daquela sensação maravilhosa. — Então é assim que se sente… — murmurou ela. —O quê? O olhar de Leslie encontrou o de Matt. — Desejo. Daquela vez o corpo inteiro dele estremeceu. Seus braços se contraíram e a ergueram ainda mais. Sentindo o perfume de rosas do corpo feminino e o toque daquela pele macia e quente contra seu corpo, abaixou o rosto e tomou aqueles lábios perfeitos nos seus. Ela o desejava. Recebeu-o com a graça e a expectativa de uma adolescente curiosa, mas aquele corpo era o de uma mulher. Então um som conhecido de passos rápidos, emitido por elegantes sapatos de salto alto, fizeram-no romper o contato e endireitar-se. Voltando a andar, soltou o fôlego de maneira exasperada enquanto se dirigia para a rua. — Chega de jogos — falou ele, fitando-a com uma expressão de ardor. — Vou levá-la para minha casa. Leslie abriu a boca para responder, mas Carolyn contornou a última curva do corredor e os alcançou quase na calçada.
  • 21. — Ela precisa mesmo ser carregada? — perguntou ela, em tom sarcástico. — Engraçado, acho que a vi dançando lépida e fagueira alguns minutos atrás. — Leslie tem um problema sério na perna — respondeu Matt, recuperando o autocontrole. — Ali está o carro. A limusine parou diante deles e Ed saiu do veículo, franzindo o cenho ao ver sua amiga sendo carregada. — Está tudo bem? — indagou ele, aproximando-se depressa. — Ela não deveria ter dançado — respondeu Matt, com secura, enquanto cobria a pequena distância que o separava do veículo antes de acomodá-la sobre o assento de couro. — A perna dela piorou. Carolyn estava pálida, mas mesmo assim lançou um olhar sarcástico para Leslie ao se acomodar na limusine. — Uma dança e já temos de partir! — reclamou ela em tom furioso. Matt se sentou ao lado de Ed e fechou a porta com um estrondo, encarando-a e estreitando o olhar. — Pensei que estivéssemos partindo por causa de sua enxaqueca, querida — falou ele, concluindo em tom gélido. Sua paciência se esgotara. Estava tomado pela sensação de desejo frustrado. Lançando um olhar para Leslie, pensou a respeito de quanto ela era boa em manipular os outros. Quase o dominara por completo, despertando seu desejo. Era provável que estivesse rindo por dentro, divertindo-se em silêncio à sua custa. Bem, iria certificar-se de fazê-la pagar por isso. Carolyn, ao vê-lo olhar daquela maneira para Leslie, soltou um gemido de desgosto e se virou para a janela, olhando de maneira vazia para fora. Para surpresa de Ed, o motorista o deixou em casa primeiro. Quando tentou argumentar, Matt se mostrou irredutível. Carolyn foi a próxima. Acompanhando-a até a porta da casa, virou-se e foi até o carro antes do beijo de boa-noite. Ela fechou a porta da casa com tanta força ao entrar que o ruído ecoou até mesmo dentro da limusine, que estava com os vidros fechados. Leslie mordeu o lábio inferior ao vê-lo acomodar-se à sua frente no interior do carro. Sob a iluminação suave do veículo de luxo, era possível ver a expressão de desejo ardente naqueles olhos negros. — Esse não é o caminho para meu apartamento. — Não, não é — respondeu ele, soando perigoso. Pouco depois, a limusine parou à porta da fazenda dele. Depois de ajudá-la a sair, trocou algumas palavras com o motorista, que partiu em seguida, antes de voltar a erguê-la nos braços. — Sr. Caldwell… — começou Leslie. — Matt — corrigiu ele, carregando-a rumo à entrada da casa. — Quero ir para casa. — E irá. Eventualmente. — Mas você mandou o motorista partir — falou ela, ao ser colocada momentaneamente no chão, enquanto ele pegava a chave e destrancava a porta da frente. — Tenho seis carros. Levarei você embora quando for a hora certa. — Estou muito cansada. — Então sei qual é o lugar ideal para você — respondeu Matt depois de voltar a fechar a porta atrás de si, erguendo-a nos braços e a levando por um longo corredor. Segundos depois, Leslie se viu no meio de uma cama enorme, sobre um cobertor macio, enquanto aquelas mãos fortes a despiam da echarpe que a aquecia. A peça foi arremessada sobre uma cadeira,junto com a gravata e o paletó dele. Desabotoando a camisa, Matt se acomodou ao lado dela na cama, movendo-se em seguida de modo a ficar praticamente sobre o corpo dela. Aquela posição trouxe à tona lembranças terríveis, fazendo-a ficar tensa e pálida. Ele ignorou aquela reação, olhando-a da cabeça aos pés e se demorando em cada curva, até fixar sua atenção no contorno de seus seios. Uma daquelas mãos fortes deslizou sobre o tecido fino do vestido, traçando o contorno de um mamilo enrijecido. O toque surpreendeu Leslie, que não o achou repulsivo como imaginara. Um leve tremor percorreu-lhe o corpo. Seu olhar, com um misto de medo e curiosidade, encontrou o dele. — Você se incomoda? — indagou ele, com um leve tom de insolência, enquanto abaixava uma das alças do vestido dela para expor-lhe um seio.
  • 22. Ela mal podia acreditar no que estava acontecendo. Os homens lhe causavam repulsa. A idéia de qualquer tipo de intimidade a enojava. Mas Matt estava olhando seu seio nu e aquilo não estava lhe inspirando sequer o mínimo impulso de resistir. O contato daqueles dedos másculos contra seu corpo intocado estava lhe causando tanto prazer que era como se estivesse sonhando e observando algo irreal. Ele sorriu com uma leve expressão travessa ao ver o semblante dela. — Nunca fez isso antes? — Não. Embora a resposta dela soasse até mesmo sincera, Matt descartou tal possibilidade de imediato. Leslie estava calma e submissa demais para alguém inexperiente. A sobrancelha dele se arqueou, demonstrando curiosidade. — Vinte e três anos e ainda é virgem? “Como ele podia saber disso?”, pensou ela, constrangida. — Ora… sim. Tecnicamente, era verdade. Emocionalmente, não. A despeito do que fora feito contra ela, o estupro não chegara a ser concluído, pois sua mãe chegara em casa segundos antes de a violência se completar. Matt estava concentrado em tocar-lhe o corpo. O indicador dele contornava-lhe o mamilo excitado enquanto aqueles olhos negros a observavam arquear-se para reclamar seu toque a cada afastamento momentâneo de sua mão. — Está gostando? Leslie o encarou com intensidade. — Sim. Era como se estivesse surpresa por gostar das carícias que recebia. Sem hesitar, ele a ergueu um pouco e abaixou a outra alça do vestido, deixando-a nua da cintura para cima. Jamais vira seios perfeitos como os de Leslie. Aquela pele alva e macia parecia um convite a seu toque. Nenhuma mulher jamais o excitara tanto, nem de maneira tão intensa. Mesmo sabendo que deveria estar lutando para se livrar dele, para sair dali, Leslie não sentia vontade de fazê-lo. Por quê? Qual o motivo de o toque dele não deixá-la apavorada? Quando sentiu os lábios dele junto a seu seio, enrijeceu e arqueou o corpo de imediato. Matt levantou a cabeça no mesmo instante e a encarou, concluindo que aquilo não era uma tentativa de esquivar-se dele. A expressão dela era uma mistura de surpresa, prazer e curiosidade. — Outra primeira vez? O tom dele foi um pouco arrogante, assim como seu sorriso frio e calculado, mas a mente dela estava em um turbilhão emocional acelerado demais para aqueles detalhes serem registrados. Leslie apenas engoliu em seco, balançando a cabeça afirmativamente. Seu corpo, como se estivesse ignorando sua mente, movia-se da maneira sensual sobre a cama. Jamais imaginara que pudesse deixar-se acariciar daquela forma. Quando os lábios dele voltaram a tocar-lhe o. seio, sugando o mamilo rosado, foi impossível conter um gemido alto de prazer. Ao ouvir aquele som, Matt sentiu-se tomado por uma onda de excitação. Suas carícias ficaram mais intensas do que planejara. Estava quase perdendo o controle quando se lembrou de que não deveria se deixar fazer de tolo, mesmo que a desejasse mais do que jamais desejara alguém antes. Levantando a cabeça, observou-a atentamente. Estava claro que poderia tê-la naquele mesmo instante. Ela parecia sequiosa por recebê-lo, mas com certeza haveria um preço por isso. Ao ver o olhar de expectativa e curiosidade dela, sentiu vontade de rir. Era óbvio que Leslie já o considerava como um “peixe fisgado”. Mas toda aquela aquiescência fora um erro de cálculo grosseiro da parte dela. Fora a repulsa inicial que o fizera sentir-se atraído. Sentando-se de maneira abrupta, levantou-a consigo e voltou a colocar o vestido dela no lugar, levantando as alças. Ainda em choque por toda aquela experiência, ela o fitava em silêncio. Observou-o levantar-se da cama e abotoar a camisa, pegando então o paletó e o vestindo. Parando ao pé da cama, olhou-a com ar especulativo e então sorriu. Mas não era um sorriso agradável. — Você não é nada má — murmurou Matt, com sarcasmo. — Mas esse ato da virgem fascinada me tira o prazer. Gosto de experiência. Leslie piscou os olhos repetidamente, tentando voltar a pensar com clareza. —O quê? — Deduzo que seus outros amantes gostaram desse olhar assustado de “Oh, é minha primeira vez”, não é?
  • 23. Outros amantes. Teria ele adivinhado algo sobre seu passado? Seu medo se refletiu em sua expressão. Matt percebeu. Estava quase lamentando por se tratar de uma farsa. Estava cansado de ser perseguido por mulheres falsas e oportunistas o tempo todo. Todas o consideravam uma grande presa, por ser solteiro, rico e por ter boa aparência e a fama de ser um hábil amante. Até então, sempre deixara claro que jamais iria se casar, o que nunca fora uni problema. Uma jóia cara, um presente sofisticado ou uma viagem e tudo estava arranjado. Estava exausto daquele jogo. Naquele momento, sentia-se mais decepcionado do que nunca. Leslie viu a expressão de desgosto dele e desejou que se abrisse um buraco no chão por onde pudesse desaparecer. O olhar frio dele a fez sentir-se como se fosse uma vadia, como o médico, a mídia e sua mãe fizeram. Ele não saberia explicar o motivo, mas ao ver o olhar de Leslie naquele momento, uma onda de culpa se apoderou de seu coração, fazendo-o sentir um aperto no peito. Antes que fizesse alguma tolice, virou-se para o outro lado, pegou a echarpe e a bolsa e as jogou no colo dela. — Vamos. Vou levá-la para casa. Leslie não olhou para ele enquanto o seguiu rumo à entrada, O corredor era bem mais longo do que lhe parecera antes e, ao chegar à porta, sua perna já estava latejando. A dança já a havia machucado bastante, mas o tranco que recebera quando ele a forçara a andar depressa no salão pareceu haver deslocado algo. Mas ela cerrou os dentes, pressionou os lábios e tentou não demonstrar o que sentia. Na garagem, Matt escolheu o Mercedes prateado e eles partiram rumo a Jacobsville. Olhando pela janela, Leslie sentiu-se uma idiota pela maneira como agira. Devia ter dado a impressão de ser a mulher mais fácil do mundo. Só não conseguia entender o motivo que o levara a não tirar vantagem da situação. Quanta ironia. Depois de anos evitando os homens, descobrir-se capaz de sentir um desejo tão intenso justamente por alguém que não a queria era perturbador. Ele percebeu a tensão na linguagem corporal dela. Era óbvio que estava frustrada por seu plano sórdido de seduzi-lo haver falhado. — E isso que Ed ganha quando a leva para casa? — indagou Matt, em um tom indiferente. Leslie cravou as unhas no couro da bolsa. Com muito esforço, manteve-se calada. Não pretendia valorizar aquele comentário maldoso com uma resposta. — Não fique tão abalada — prosseguiu ele. — É que já sou experiente demais para cair nesses truques. Mas há outros fazendeiros solteiros perto de Jacobsville. Cy Park, por exemplo, é um homem nervoso e irritadiço como ninguém, mas é viúvo e muito solitário. Oh, mas, pensando melhor, acho que já houve tragédia o bastante na vida dele. Eu não iria querer vê-la piorar isso ainda mais. Ela estava tão chocada e magoada que não conseguia falar. Por que tudo em sua vida tinha que terminar mal? Parecia um eterno pesadelo. Para completar, sua perna doía muito mais do que o normal, forçando-a a se ajeitar no assento em busca de uma posição mais confortável. Mas não adiantou. — Como foi que esse osso ficou assim? — questionou Matt, com naturalidade. — Você não sabe? — perguntou ela, soltando uma risada que parecia uma mistura de sarcasmo e mágoa. Se ele sabia mesmo da história, como tudo indicava, aquele era mesmo um jogo de crueldade. — Como eu poderia saber? — falou ele, olhando-a de lado e fazendo uma careta. Leslie franziu o cenho. Talvez Matt não soubesse de nada e estivesse apenas cavando informações. Engolindo em seco, manteve-se quieta e segurou a bolsa com força. Estacionando o Mercedes em frente à casa de Leslie sem desligar o motor, Matt se virou para encará-la e repetiu: — Como eu poderia saber? — Ora, você acha que sabe tudo a meu respeito. Os olhos dele se estreitaram de maneira perigosa. — Há muitas maneiras pelas quais um osso pode ser fraturado. Uma delas é pelo impacto de uma bala. Sem conseguir respirar, Leslie ficou imóvel, encarando-o de maneira deliberada. — O que sabe a respeito de balas? — indagou ela. — Fui convocado durante a operação Desert Storm e servi em uma unidade de Infantaria. Aprendi um bocado sobre armas e balas, e sobre como ficam ossos baleados. O que me conduz à pergunta óbvia: quem atirou em você? — Eu não disse que fui baleada.
  • 24. — Mas foi, não é mesmo? — insistiu Matt, sorrindo com frieza. — Quanto ao autor do disparo, aposto que foi um de seus antigos amantes. Ele a pegou com outro ou ficou furioso por ser provocado até a beira da insanidade, apenas para receber uma recusa? Não que seu estilo seja recusar — disse e assumiu um ar de superioridade. — Não posso dizer que bancou a difícil esta noite. O ego de Legue caiu por terra. Estava sendo acusada das piores coisas possíveis. Suas lembranças antigas já eram horríveis, mas vê-lo acusá-la de ser algum tipo de ninfomaníaca era doloroso demais para suportar. Pela primeira vez na vida sentira um prazer físico íntimo e Matt a estava fazendo sentir-se como se ela fosse uma qualquer. Soltando o cinto de segurança, saiu do carro com tanta dignidade quanto possível. Sua perna jamais doera tanto. Tudo que queria era tomar um analgésico forte e se deitar. Matt desligou o motor e contornou o veículo, irritado pelo modo como ela insistia em andar sozinha mesmo mancando. — Eu a levarei até a porta… — Não! — disse ela em um tom baixo, evitando o toque dele e se sentindo envergonhada por tê- lo deixado fazer o que fez. Seus olhos se encheram de lágrimas de mágoa, frustração e ultraje. — Mais joguinhos? Ele não gostou nada de vê-la voltar a se esquivar de seu toque, depois do modo como se comportara em sua cama. — Eu não faço… joguinhos — bradou Leslie, sem conseguir conter o soluço que a interrompeu. — E você pode ir para o inferno! Fazendo uma careta ao ver a expressão dela, Matt mal ouviu suas palavras. Leslie estava tão pálida e tensa que dava a impressão de que algo muito sério a incomodava. Algo mais importante do que uma mera conquista frustrada. Enquanto a via virar-se e afastar-se, fazendo um esforço visível para mancar o mínimo possível, ele se viu tomado por emoções confusas, todas misturadas, de uma forma que jamais sentira antes. A lembrança do modo como ela lhe dissera “Você não sabe?” não lhe saía da cabeça. Sentando-se ao volante do Mercedes, ficou parado e com um olhar vazio durante um longo tempo antes de voltar a ligar o motor. Leslie Murry era um quebra-cabeça que ele pretendia solucionar, mesmo que isso lhe custasse uma fortuna em honorários de detetives particulares. CAPÍTULO 5 Leslie chorou durante tanto tempo que lhe pareceu haverem passado horas. As aspirinas não tiraram a dor que sentia na perna e não havia remédio conhecido pela humanidade para curar seu ego ferido. Matt a humilhara, fizera pouco de sua inocência e a colocara quase no mesmo patamar de uma prostituta. Ele agira como aquele médico da sala de emergência, anos antes, que a fizera sentir-se envergonhada de seu corpo. Ora, pensou consigo enquanto enxugava as lágrimas, jamais voltaria a cometer o erro de ceder a seus impulsos outra vez. E Matt Caldwell podia ir direto para o inferno com sua arrogância. O telefone tocou e Leslie hesitou, mas como poderia ser Ed, optou por atender. — Demos boas risadas de você — falou Carolyn, sem rodeios. — Imagino que irá pensar duas vezes antes de se jogar sobre ele outra vez! Matt disse que você foi tão fácil que o enojou… Trêmula por causa da humilhação, Leslie colocou o telefone no gancho com muita força, fazendo um estrondo. Então tirou o telefone da tomada. Pelo visto ele não se contentara em arrasá-la e ainda fora correndo contar para a namorada o que acabara de fazer. Aquilo era tudo de que precisava para sua noite se tornar completamente horrível. A dor e a humilhação mantiveram Leslie acordada até o raiar do dia, que foi quando conseguiu adormecer. Passou a hora do desjejum e então a da missa. Quando despertou, tomou consciência de que sentia uma dor tão forte quanto a da noite em que fora baleada. Ao se mover, fez uma careta de dor e soltou um incontrolável gemido de agonia. Quase não percebeu o som de alguém batendo à porta. — Entre — falou ela, com a voz embargada. Assim que a porta se abriu, Matt Caldwell surgiu pela passagem. Não havia se barbeado e estava com olheiras profundas. As palavras de Carolyn ecoaram na mente dela. Com um movimento instintivo, agarrou a primeira coisa que lhe veio à mão, uma garrafa de água mineral que estava na mesinha-de-cabeceira,
  • 25. e a arremessou contra a cabeça dele. Errou por pouco, quase acertando Ed, que vinha logo atrás e se desviou no último instante. — Não, obrigado, não quero água — falou Ed, tomando a dianteira e sinalizando para o primo parar à porta. O rosto pálido de Leslie era a pura expressão da dor, mas o olhar que dirigia a Matt parecia quase capaz de fazê-lo queimar onde estava. — Ei — falou Ed, tentando chamar a atenção dela —, telefonei a manhã toda, mas você não atendia. — Ele viu o plugue fora da tomada. — Oh, agora sei por quê. Como está a dor? Estava difícil até para Leslie respirar. — Forte. O que era uma palavra fraca demais para definir o que sentia. — Venha — prosseguiu Ed, em tom decidido. — Vamos levá-la para o pronto-socorro. Matt, poderia chamar Lou Coltrain e pedir para ela nos encontrar lá? Otimo. Agora, Leslie, deixe-me ajudá-la a colocar esse robe. A dor era tanta que ela não disse nada. Apenas saiu da cama, ciente da surpresa que seria para Matt vê-la com um pijama de flanela que a cobria do pescoço aos tornozelos. Com a criatividade fértil e malévola dele, deveria tê-la imaginado nua sob o cobertor. Mas, exceto pelo que dissera à médica ao telefone celular, não emitira mais nenhum som. Ficou apenas imóvel, à porta, observando Ed ajudá-la. Pelo menos até que Leslie tentou se levantar e não se sustentou. Ed a pegou e a ergueu nos braços, interrompendo o movimento instintivo que Matt fez na direção dela. — Posso carregá-la — garantiu Ed. — Vamos indo. — O cartão do convênio… — murmurou ela — .na minha bolsa. — Deixe essa preocupação para depois — falou Matt, tenso, abrindo a porta do Mercedes para Ed acomodá-la. Quando o carro entrou em movimento, Leslie se recostou no assento e fechou os olhos, quase não suportando a dor. — Ela não deveria ter sido forçada a dançar — murmurou Matt, em tom desgostoso. — Depois eu ainda a forcei a andar depressa e a parar de repente. A culpa é minha. Ed não respondeu. Apenas olhou com ar preocupado para Leslie, acomodada no banco de trás, rogando para que a pequena exibição da noite anterior não tivesse causado nenhum dano permanente adicional à perna dela. Lou Coltrain estava esperando no pronto-socorro quando Ed entrou no recinto com Leslie nos braços. A médica indicou o caminho até uma das salas, fechando a porta assim que Matt entrou. Depois de examinar a perna com cuidado, aplicou uma injeção para aliviar a dor e a levou para a sala de raios X. Ed a acompanhou, mas o telefone celular de Matt tocou e ele ficou para trás, atendendo uma chamada internacional. Ao ver a expressão de alívio de Leslie por estarem sozinhos enquanto a médica se afastou um instante para falar com o técnico de radiografias, Ed falou: — Calma. Ninguém vai lhe fazer mal. Nem meu primo, nem a doutora. — Eu odeio seu primo. Ele riu de tudo — murmurou Leslie, voltando a chorar. — Ela disse que ambos riram de mim e que ele ficou enojado. — Ela? — Carolyn. Oh, eu o odeio! Outra onda de choro a calou. Lou voltou e acariciou-lhe a cabeça, como se estivesse atendendo uma criança. — Você terá de esperar lá fora, Ed. Vou acompanhar a seção de radiografias pessoalmente e depois farei mais alguns testes. — Tudo bem, doutora. Estarei lá na frente. Ao sair, foi ao encontro de Matt, que estava na sala de espera, com uma expressão atormentada no rosto. — Leslie disse que Carolyn telefonou para ela ontem à noite — começou Ed. — Acho era por isso que o telefone estava desligado. Como é? — Leslie falou que Carolyn telefonou dizendo que vocês dois estavam rindo dela. Mas não me disse a respeito de quê. Matt fez uma expressão severa e colocou as mãos nos bolsos, abaixando o olhar. — Maldição.
  • 26. Ambos ficaram em silêncio. — Não magoe Leslie — disse Ed, depois da longa pausa, em tom baixo mas muito intenso. — A vida dela não foi nada fácil. Trate de não piorar as coisas, pois ela não tem mais nenhum lugar para onde ir. Matt encarou o primo, não gostando da ameaça implícita em seu tom de voz, nem do fato de Ed saber muito mais a respeito dela do que ele próprio. Seriam amantes? Ex-amantes, talvez? — Sua amiga é cheia de segredos — respondeu ele. — E foi baleada. Quem atirou? Ed arqueou ambas sobrancelhas de maneira tão surpresa e com tamanho ar de inocência que conseguiu enganar Matt. — Quem lhe disse uma coisa dessas? — Ora… ninguém. Apenas concluí isso. Além do mais, de que outra forma aquele osso poderia ter sido tão seriamente fraturado? — Por um atropelamento, uma queda violenta, um acidente de carro… — Sim, claro. Não sei por que cismei com essa história de tiro. De qualquer maneira, foi a dança de ontem que a fez piorar. Não percebi a fragilidade dela. Leslie não falou a respeito da gravidade do problema. — Ela sempre foi assim — respondeu Ed. — Como foi que a conheceu? — Estudamos juntos na faculdade e saímos algumas vezes. Leslie confia em mim. — Mas é bom que você não confie muito nela. E misteriosa demais. Creio que esteja escondendo algo de nós, talvez algo muito grave. Ed não ousou reagir como desejava. Apenas pressionou os lábios por um instante e então sorriu. — Ela jamais magoou uma pessoa sequer em toda sua vida. E, ãntes que faça mau juízo dela, é melhor saber que ela tem uma verdadeira espécie de fobia em relação aos homens. Matt riu com ironia. — Ora, essa é muito boa. Você deveria tê-la visto ontem à noite, quando estávamos sozinhos. Ed estreitou o olhar. — O que está querendo dizer com isso? — Estou dizendo que ela é fácil. — Seu idiota — murmurou Ed, cerrando os punhos. — Fácil. Meu Deus! — exclamou antes de se afastar e sumir de vista, furioso. Matt ficou confuso pelo comportamento anormal do primo. Talvez ele estivesse com ckime. O telefone celular tocou, distraindo-o. — Pensei que viesse cavalgar comigo esta tarde — falou Carolyn ao telefone, em tom animado. — Onde você está? — No hospital. O que disse a Leslie na noite passada? — Como assim? — Quando telefonou para ela. — Bem, eu queria saber se a perna dela estava melhor. Aquela dança pareceu haver causado muita dor à coitadinha. — O que mais? — exigiu ele, em tom severo. Carolyn riu com sarcasmo. — Oh, entendo. Estou sendo acusada de alguma indelicadeza, não é? Francamente, Matt, pensei que você fosse capaz de ver através da falsa fragilidade dela. O que ela disse que eu falei? Soltando um suspiro, Matt deu de ombros. — Esqueça. Eu devo ter entendido mal. -— Com certeza — garantiu ela, com firmeza. — Eu não telefonaria para alguém que estivesse sofrendo dores atrozes para atormentá-la ainda mais. Pensei que me conhecesse melhor. — E conheço. Conhecia-a mesmo muito bem. Ao que tudo indicava, a srta. Murry estava inventando calúnias sobre Carolyn. Mas por quê? Por vingança? Para fazê-lo virar-se contra seu primo? — E quanto à nossa cavalgada? Aliás, o que você está fazendo no hospital? — Estou com Ed, visitando uma pessoa que ele estima muito. Bem, quanto à cavalgada, é melhor deixarmos para o próximo fim de semana. Eu telefono. Matt desligou. Estava irritado e queria que Leslie Murry saísse de sua empresa e de sua vida. Ela era sinônimo de problemas. Guardando o telefone celular no bolso, soltou um suspiro exasperado e voltou a se sentar na sala de espera, para esperar por Ed e Leslie.