1. UNIVERSIDADE FEDERAL DO
MARANHÃO
CENTRO DE CIÊNCIAS HUMANAS
PROGRAMA DE PÓS GRADUAÇÃO EM
LETRAS – Mestrado Acadêmico
Disciplina: Introdução ao estudo da
linguagem e do discurso
Docentes: profª draª Maria da Graça
Santos Faria e profª draª Marize Aranha
Dupla: Marcelo Andrade e Letícia Maciel
O DISCURSO EM FOUCAULT
2. CONTEXTO HISTÓRICO
Segundo Wilson (2013), as discussões teóricas
na linguística giram em torno de dois pontos
fundamentais, dos quais derivam as escolas
linguísticas:
A concepção de língua e de linguagem;
A perspectiva que o pesquisador adota em
relação ao seu objeto de estudo.
A autora acrescenta que dependendo do modo
em como os estudiosos concebem a língua, surge
um método equivalente e adequado para explicar
o seu funcionamento, sua organização, sua
estrutura e as possíveis relações com outros
elementos internos e externos ao sistema
linguístico. (WILSON, 2013, p. 87).
3. É impossível falar em linguística e não considerar
as grandes contribuições de Ferdinand de Saussure.
Dessa maneira, a partir do século XX, depois da
publicação do CLG, podemos inferir que as
pesquisas na área da linguística se dividem em dois
grandes polos:
O polo formalista: prestigia a forma linguística,
ou seja, concebe a língua como sistema e
estrutura. Aqui a língua é entendida como um
objeto autônomo, independente das intenções de
uso e da situação comunicativa. Dentre as
dicotomias propostas por Saussure, neste polo,
temos a proposta do suíço de langue/parole.
4. • A langue era pensada como um sistema linguístico de
base social que é utilizada como meio de
comunicação pelos membros de uma determinada
comunidade, ou seja, é um fenômeno coletivo,
partilhada e produzida socialmente (MARTELOTTA,
2013, p. 53). Todavia, a língua é vista como algo
exterior ao indivíduo, sendo interiorizada
coercivamente pela influência do social.
• Já a parole, descartada durante muito tempo dos
estudos em linguística, se refere ao uso individual do
sistema. Assim, Saussure observou que os falantes,
ao se comunicarem, não adaptam apenas as
restrições presentes no sistema de sua língua de
acordo com os diferentes contextos, bem como às
suas preferencias pessoais, impossibilitando, assim,
um ‘estudo fechado’ desse fenômeno.
5. O polo funcionalista: vai em direção ao
paradigma funcional, no qual a língua é tomada
sob uma perspectiva sociointeracionista e
funcional. Assim, essa ‘nova’ proposta, surgida
na segunda metade do século XX, busca
observar as condições de uso da língua em
situações reais de comunicação. É neste
momento em que se põem em evidência a
competência comunicativa ou pragmática da
língua, considerando agora as relações entre
forma e função, entre fatores gramaticais e
sociais. É dentro deste paradigma que Wilson
(2013) acredita que estão inseridas algumas
escolas da linguística, tais como: a
sociolinguística, a sociolinguística
interacional, o funcionalismo, a linguística
sociocognitiva, a análise do discurso, a
pragmática, entre outras. (WILSON, 2013, p. 87).
6. Segundo Brandão (2012), a AD de base
francesa surge a partir de 1960, pois se filiava:
A uma certa tradição intelectual europeia
acostumada a unir reflexão sobre o texto e
sobre a história. Nos anos 1960, sob a égide
do estruturalismo, a conjuntura intelectual
francesa propiciou, em torno de uma reflexão
sobre a “escritura”, uma articulação entre a
linguística, o marxismo e a psicanálise. A AD
nasceu tendo como base a
interdisciplinaridade, pois ela era preocupação
não só de linguistas como historiadores e de
alguns psicólogos. (BRANDÃO, 2012, p. 16).
7. A AD passa então a ser definida como um estudo linguístico das
condições de produção de um enunciado, apoiando-se em conceitos e
métodos da linguística. Porém, se por um lado a AD se distingue das
outras ciências humanas com as quais mantem um diálogo, por outro, ela
não dará conta, por si só, de marcar sua especificidade no interior dos estudos
da linguagem, pois corre o risco de permanecer numa linguística imanente,
sendo necessário considerar dimensões como: a) observação das condições
de produção de um discurso; b) quais embates históricos e sociais se
cristalizam no discurso; c) o espaço próprio que cada discurso configura
para si no interior de um interdiscurso (BRANDÃO, 2012, p. 17).
Fernandes (2008) explica que o discurso implica uma exterioridade à
língua, que deve ser apreendido no social, cuja compreensão coloca em
evidência aspectos ideológicos e históricos próprios à existência dos
discursos nos diferentes contextos sociais (FERNANDES, 2008, p.8).
Todavia, para que esse discurso se materialize, necessitam-se mais do que
elementos linguísticos e extralinguísticos, faz-se necessária a presença de um
sujeito discursivo. Este, por sua vez, está inserido em uma dada conjuntura
social, detentor de um lugar social, histórico e ideologicamente marcado; ele
caracteriza-se não por ser um sujeito homogêneo, mas pela sua
heterogeneidade, constituído por um conjunto de diferentes vozes.
8. A AD possui um objeto de estudo específico – o discurso – o qual
necessita de sujeitos históricos e sociais para funcionar e tem como foco de
análise a noção de sentidos ou de efeitos de sentidos. Para Fernandes
(2008), os efeitos de sentidos encontrados em enunciados discursivos
traduzem a carga ideológica dos sujeitos em interlocução, ou seja, no
discurso, além das posições sociais e ideológicas dos sujeitos
discursivos teremos os efeitos de sentidos que esses sujeitos podem
manifestar durante a materialização de seus enunciados. Os sentidos, nas
palavras do autor, “não são o significado da palavra, apenas, são produzidos
em decorrência da ideologia dos sujeitos em questão, da forma como
compreendem a realidade política e social na qual estão inseridos”
(FERNANDES, 2008, p.14).
É salutar lembrar que os discursos não são fixos, que estão em
constante movimento e transformação, uma vez que acompanham as
transformações sociais e políticas de uma determinada sociedade ou cultura.
Dessa forma, para entender um determinado enunciado, Fernandes (2008)
acredita que:
É preciso sair do especificamente linguístico, dirigir-se a outros espaços,
para procurar descobrir, descortinar, o que está entre a língua e a fala, fora
delas, ou seja, para compreender de que se constitui essa exterioridade a que
se denomina discurso, objeto a ser focalizado para análise. (FERNANDES,
2008, p.17).
9. O DISCURSO EM FOUCAULT
Segundo Gregolin (2016), o discurso,
para Foucault, é um lugar de luta, de
embate entre poderes e saberes, em que
o filósofo analisa a produção de
verdades histórico-sociais como frutos
da batalha para constituição das
subjetividades. (GREGOLIN, 2016, p.
3213).
11. Para a autora, podemos ‘dividir’ a obra de
Foucault em três momentos:
a) Em um primeiro momento, denominado como
arqueologia do saber, Foucault pesquisou alguns
modos de investigação científica que produzem,
como efeito, a objetivação do sujeito. Sua atenção
voltou-se para a história da loucura, da medicina
e de campos do saber que trataram dos temas
da vida, da linguagem e do trabalho (História da
Loucura na Idade Clássica; O Nascimento da
Clínica; As Palavras e as Coisas). Trata-se, nesse
momento, de investigar os saberes que estão na
base da cultura ocidental, de empreender o
método arqueológico para escavar o solo social
e revolver a história desses saberes (FOUCAULT,
1986);
12. b) Em um segundo momento, tendo como limiar o estudo
sobre A ordem do discurso (1971), Foucault empreende a
análise das articulações entre os saberes e os poderes no
interior de uma genealogia do poder. Ele estuda, a partir de
então, práticas discursivas desenvolvidas em dispositivos
de saber e de poder que objetivam os sujeitos por meio da
classificação, da segregação e da separação (o sistema
prisional, o sistema jurídico etc.); deriva dessas análises a
concepção de que nossa sociedade se organiza em uma
microfísica do poder (FOUCAULT, 1979a);
c) Enfim, em um terceiro momento, ele investigou a
subjetivação a partir de técnicas de si, da
governamentalidade, isto é, do governo de si e dos outros,
orientando suas pesquisas na direção da sexualidade, da
constituição histórica de uma genealogia da ética (História da
Sexualidade, em três volumes). (GREGOLIN, 2016, p. 3213 e
3214).
14. A ARQUEOLOGIA DO SABER
I - INTRODUÇÃO
II - AS REGULARIDADES DISCURSIVAS
1. As Unidades do Discurso
2. As Formações Discursivas
3. A Formação dos Objetos
4. A Formação das Modalidades Enunciativas
5. A Formação dos Conceitos
6. A Formação das Estratégias
7. Observações e Consequências
III - O ENUNCIADO E O ARQUIVO
1. Definir o Enunciado
2. A Função Enunciativa
3. A Descrição dos Enunciados
4. Raridade, Exterioridade, Acúmulo
5. O A Priori Histórico e o Arquivo
15. INTRODUÇÃO
A proposta de Foucault na introdução da sua obra mais significativa para o seu
primeiro ‘momento’, acredita que exista:
Por trás da história desordenada dos governos, das guerras e da fome,
desenham-se histórias, quase imóveis ao olhar histórias com um suave
declive: história dos caminhos marítimos, história do trigo ou das minas de
ouro, história da seca e da irrigação, história da rotação das culturas,
história do equilíbrio obtido pela espécie humana entre a fome e a
proliferação. As velhas questões de análise tradicional (Que ligação
estabelecer entre acontecimentos díspares? Como estabelecer entre eles
uma sequência necessária? Que continuidade os atravessa ou que
significação de conjunto acabamos por formar? Pode-se definir uma
totalidade ou é preciso limitar-se a reconstituir encadeamentos?) são
substituídas, de agora em diante, por interrogações de outro tipo: Que
estratos é preciso isolar uns dos outros? Que tipos de séries instaurar? Que
critérios de periodização adotar para cada uma delas? Que sistema de
relações (hierarquia, dominância, escalonamento, determinação unívoca,
causalidade circular) pode ser descrito entre uma e outra? (FOUCAULT,
2008, p.6).
16. É a partir de tais questionamentos que o filósofo francês irá construindo a noção
de discurso ao longo de sua arqueologia do saber, lançando mão de algumas
noções já conhecidas por estudiosos do discurso como acontecimento, linearidade,
práticas discursivas, discurso, enunciado, sujeito, regularidade, dispersão e muitos
outros. Para ele,
(...) a história, em sua forma tradicional, se dispunha a “memorizar” os
monumentos do passado, transformá-los em documentos e fazer
falarem estes rastros que, por si mesmos, raramente são verbais, ou que
dizem em silêncio coisa diversa do que dizem; em nossos dias, a história
é o que transforma os documentos em monumentos e que desdobra,
onde se decifravam rastros deixados pelos homens, onde se tentava
reconhecer em profundidade o que tinham sido, uma massa de
elementos que devem ser isolados, agrupados, tornados pertinentes,
inter-relacionados, organizados em conjuntos. Havia um tempo era que
a arqueologia, como disciplina dos monumentos mudos, dos rastros
inertes, dos objetos sem contexto e das coisas deixadas pelo passado,
se voltava para a história e só tomava sentido pelo restabelecimento de
um discurso histórico; poderíamos dizer, jogando um pouco com as
palavras, que a história, em nossos dias, se volta para a arqueologia –
para a descrição intrínseca do monumento. (FOUCAULT, 2008, p.9).
17. Dessa forma, Foucault oferece aos historiadores e arqueólogos da história do
saber na cultura ocidental um manual para se realizar uma pesquisa na área, como
podemos notar na II unidade: Regularidades Discursivas. Nessa seção,
comentaremos apenas as 4 primeiras noções, a saber:
A) As unidades do discurso: neste item, basicamente Foucault acredita que as
unidades do discurso sejam os enunciados. Aqui a unidade é entendida sob o
sentido de união, de liga, de algo que estabelece pontes. É neste item também que
Foucault inicia a elaboração de noções-chave como descontinuidade, ruptura,
limiar, série enunciativa, dentre outras que aparecerão no decorrer da obra. Para
o autor:
todo discurso manifesto repousaria secretamente sobre um já-dito; e
que este já-dito não seria simplesmente uma frase já pronunciada,
um texto já escrito, mas um “jamais-dito”, um discurso sem corpo,
uma voz tão silenciosa quanto um sopro, uma escrita que não é
senão o vazio de seu próprio rastro. Supõe-se, assim, que tudo que
o discurso formula já se encontra articulado nesse meio-silêncio que
lhe é prévio, que continua a correr obstinadamente sob ele, mas que
ele recobre e faz calar. O discurso manifesto não passaria, afinal de
contas, da presença repressiva do que ele diz; e esse não-dito seria
um vazio minando, do interior, tudo que se diz. (FOUCAULT, 2008,
p.22)
18. B) As formações discursivas: relacionado ao primeiro item, seria um elo
entre as unidades do discurso, orientadas pela dispersão. Assim:
No caso em que se puder descrever, entre um certo número de enunciados,
semelhante sistema de dispersão, e no caso em que entre os objetos, os
tipos de enunciação, os conceitos, as escolhas temáticas, se puder definir
uma regularidade (uma ordem, correlações, posições e funcionamentos,
transformações), diremos, por convenção, que se trata de uma formação
discursiva evitando, assim, palavras demasiado carregadas de condições e
consequências, inadequadas, aliás, para designar semelhante dispersão, tais
como “ciência”, ou “ideologia”, ou “teoria”, ou “domínio de objetividade”.
Chamaremos de regras deformação as condições a que estão submetidos os
elementos dessa repartição (objetos, modalidade de enunciação, conceitos,
escolhas temáticas).
As regras de formação são condições de existência (mas também de
coexistência, de manutenção, de modificação e de desaparecimento) em
uma dada repartição discursiva. (FOUCAULT, 2008, p.33)
C) A formação dos objetos: dando continuidade à formação discursiva, neste
item, Foucault nos apresenta algumas hipóteses (condições) para que um
objeto seja passível de estudo: i) superfícies de emergência (diferenças
individuais entre os objetos e essas superfícies variam de acordo com a cultura
e a sociedade, além do tempo); ii) instâncias de delimitação (são como
limites impostos ao discurso. Ex: a formação discursiva sobre o aborto –
discurso jurídico, o religioso, o feminista etc); iii) grades de especificação
(sistemas em que associamos, reagrupamos, classificamos e derivamos as
diferentes nuances de um objeto).
19. D) A formação das modalidades enunciativas: neste item,
Foucault observa o lugar de fala do sujeito que enuncia: quem fala?
Qual lugar de fala o sujeito ocupa? Que posições o sujeito
assume ao enunciar?
Por fim, na III unidade de sua obra – o enunciado e o arquivo –
percebemos alguns pontos de convergência entre o pensamento
foucaultiano e o bakhitiniano no que diz respeito ao enunciado.
A partir dessa unidade, a formação discursiva para Foucault é
sinônimo de articulação da grande superfície dos discursos e
compreende o enunciado como uma “descontinuidade liberta de
todas as formas em que aceitava-se como campo geral, ilimitado,
aparentemente sem forma, do discurso” (FOUCAULT, 2008, p. 66).
O filósofo retoma alguns pontos vistos na unidade II e acredita
que se o pensamento dele estiver correto, o discurso poderá ser
compreendido como um conjunto de enunciados inscritos numa
mesma formação discursiva.
20. A ORDEM DO DISCURSO
• A Ordem do Discurso corresponde à aula inaugural de
Foucault no Cóllege de France, em dezembro de 1970. A
obra é considerada a ligação entre as produções feitas no
anos 1960 – História da Loucura, As palavras e as coisas,
Arqueologia do Saber – e Vigiar e Punir, datada de 1968.
• Na obra, Foucault fala da relação de poder entre as práticas
discursivas e poderes que as permeiam. O autor considera
que o discurso exerce uma função de controle, limitação e
validação das regras de poder em diferentes períodos
históricos e grupos sociais.
Suponho que em toda sociedade a produção do discurso
é ao mesmo tempo controlada, selecionada, organizada
e redistribuída por certo número de procedimentos que
tem por função conjurar seus poderes e perigos, dominar
seu acontecimento aleatório, esquivar sua pesada e
temível materialidade (FOUCAULT, 2012, p. 8-9).
21. • Para Foucault, um discurso pode ser considerado um
conjunto de signos interconectados com outros discursos ou
outras redes de discursos, em um sistema que tanto registra
quanto reproduz e estabelece os valores de determinada
sociedade, perpetuando-os.
• O discurso não é apenas uma sequência lógica de frases e
palavras que constroem um significado, mas constitui um
importante instrumento de organização funcional que
pretende estruturar determinado imaginário social.
22. • Para Foucault, tanto o discurso quanto as palavras são um
jogo. O autor questiona, então, os procedimentos discursivos
que reforçam e propagam o controle de tudo que é produzido
pelo discurso.
• Há um conjunto de mecanismos de exclusão externos ao
discurso, composto por interdição, separação e vontade da
verdade:
1. Interdição – mecanismo mais disseminado, referente ao tabu
do objeto, aquilo que não deve ser dito, ao ritual da
circunstância e ao direito privilegiado de quem fala. Há uma
clara relação entre discurso e poder.
2. Separação ou rejeição – Revela a separação do discurso
proferido pelo louco a partir da oposição razão x loucura.
3. Vontade de verdade – o discurso funciona como uma
ferramenta de separação entre o verdadeiro e o falso
(imposto pelas instituições que partem de critérios
alicerçados em contingências históricas).
23. • Em A Ordem do Discurso, Foucault destaca quatro
argumentos principais que se relacionam:
1. “No verdadeiro”- a verdade que é aceita em
determinado contexto social e que, por isso interessa a
algum grupo social específico. A verdade oficial, que
não fere os interesses do status quo e é validada por
diversas estratégias de difusão.
2. Não há simetria entre o que o discurso atesta
representar e os possíveis conceitos e objetos externos
que efetivamente possam existir, que têm
“possibilidade de verdade”. O discurso está dentro de
sequências de signos de variados discursos passando
a sensação de continuidade entre si, ou mesmo
evolução progressiva desses discursos.
24. 3. O discurso é o encadeamento entre significantes e
outros discursos externos. O discurso não direciona seu
foco no significado, mas no significante (no imaginário dos
receptores desse discurso). A reprodução desse e para
esse imaginário visa a consolidação e propagação de
determinada lei, regra, norma, valores, etc.
4. A estrutura social responsável pela manutenção desses
valores dispõe de rituais e estratégias específicas para
validação e disseminação dos discursos, o que o
transforma em expressão social e oficialmente aceita
(textos jurídicos, religiosos, literários, científicos).
25. Logofilia
• Tais referenciais se apoiam no que Foucault denomina
logofilia, sentimento que surge por meio da educação
familiar e social (escolas, por exemplo), onde é possível
encontrar mensagens permeadas de verdades. É
construído por meio dos discursos e leva a pensar de
modo maniqueísta – verdadeiro e falso.
• Da logofilia surge a logofobia, o receio/angústia
causados pelo não reconhecimento. É decorrente de
dúvida sobre a reprodução de um discurso próprio,
individualizado, validado, socialmente reconhecido e,
portanto, inserido “no verdadeiro”. Tais discursos
validam tanto a reprodução quanto a manutenção das
verdades oficiais.
26. Os conceitos de logofilia e logofobia dão base para
outras noções trabalhadas por Foucault, tais como:
1. Sujeito fundante – possibilidade de que o sujeito possa,
intuitivamente ou racionalmente fundar horizontes de
significação que a história não terá senão a tarefa de revelar.
É o lugar onde as proposições, as ciências e os conjuntos
dedutivos encontram seu fundamento.
2. Experiência originária – supõe uma espécie de
conhecimento do mundo originário que ocorre antes mesmo
de nossa aparição nesta vida. Uma vez que determinadas
“verdades” foram ditas anteriormente, é possível uma
captura desse pensamento passado de modo que o discurso
será simplesmente a representação legítima da experiência
e, por isso mesmo, uma verdade continuamente acessível.
3. Mediação universal – leva à crença de uma racionalidade
constantemente disponível e que pode constituir uma
consciência imediatamente a partir das singularidades
supostamente universais.
27. Foucault organiza quatro princípios reguladores
fundamentais para a análise do discurso:
1. Acontecimento – o discurso de produz a partir de
acontecimentos aleatórios mesmo que inseridos em
determinado contexto.
2. Série – não há continuidade temporal e, portanto, não há
uma série que possibilite uma linha evolutiva questionável.
3. Regularidade – não nenhuma produção regular, mas
impermanente. Cada acontecimento pode ser entendido
como singular e original sem que o sujeito fundante seja seu
protagonista ou a continuidade de algum discurso anterior.
4. Condição de possibilidade – onde não há núcleos de
significados nos discursos. Há, pelo contrário, a
possibilidade de verdade na complexa rede de significantes.
28. • Foucault propõe dois caminhos para analisar o discurso:
o crítico e o genealógico. O primeiro traz o princípio da
inversão, as formas de exclusão e de limitação. O
segundo propõe entender como os discursos forma
formados a partir de práticas e sistemas de coerção,
analisando também as regras de produção e
perpetuação desses discursos e suas variações. Assim,
sugere quatro princípios como método para a análise do
discurso:
1. Inversão – Propõe o recorte estratégico em algum
trecho do texto para inverter o significado proposto;
trata-se de negá-lo e colocar em evidência seus
significantes: “É preciso reconhecer, ao contrário, o
jogo negativo de um recorte e de uma rarefação do
discurso” (FOUCAULT, 2012, p.49).
29. 2. Descontinuidade – submetido ao conhecimento genealógico
do discurso, é onde a leitura atenta dos discursos junto à
evidenciação da rarefação nos prova a não existência de um
contínuo de verdade evolutiva nos discursos : “Os discursos
devem ser tratados como práticas descontínuas, que se cruzam
por vezes, mas também se ignoram ou se excluem”
(FOUCAULT, 2012, p.50).
3. Especificidade – o discurso pronunciado por autores
validados não torna os significados propostos verdades
universais e absolutas.
4. Exterioridade – objetiva-se a fixação das fronteiras do
discurso, restringindo a busca de um núcleo de verdades
significativas. Busca-se também a compreensão da rede de
significantes – e não dos significados – estabelecida
exteriormente e sobreposta no discurso analisado.
30. REFERÊNCIAS
BRANDÃO, Helena Harhue Nagamine. Introdução à análise do discurso. 3ª ed. rev. –
Campinas, SP: Editora Unicamp, 2012.
FERNANDES, Cleudemar. Análise do Discurso: reflexões introdutórias. Goiânia: Trilhas
Urbanas: 2008.
Foucault e o Discurso. Disponível em: <https://www.youtube.com/watch?v=eBln7_RIy5U>.
Acesso em: 19 de outubro de 2018.
GREGOLIN, Maria do Rosário Valencise. Michel Foucault: uma análise de discursos que
remonta à história para retorizar a filosofia. In: III Seminário Internacional de Estudos Sobre
Discurso e Argumentação (III SEDiAr), 2016, Aracaju. Anais do III Seminário Internacional de
Estudos Sobre Discurso e Argumentação (III SEDiAr). Ilhéus - BA: Editora da Universidade
Estadual de Santa Cruz, 2016. v. 1. p. 3213-3223.
GREGOLIN, Maria do Rosário. Foucault e Pêcheux na construção da análise do discurso:
diálogos e duelos. São Carlos: Claraluz, 2004.
MARTELOTTA, Mário Eduardo. Conceitos de gramática. In MARTELOTTA, Mário Eduardo
(org.). Manual de linguística. 2 e.d., 2ª impressão – São Paulo: Contexto, 2013.
WILSON, Victoria. Motivações pragmáticas. . In MARTELOTTA, Mário Eduardo (org.).
Manual de linguística. 2 e.d., 2ª impressão – São Paulo: Contexto, 2013.