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“Faz sentido economizar na energia e investir em saúde”.
A frase é do engenheiro Roberto Lamberts, Presidente da
Antac – Associação Nacional de Tecnologia do Ambiente
Construído, e toca em um assunto fundamental para os
hospitais: eficiência energética.
Para ele, que também é professor da Universidade Federal
de Santa Catarina, é normal países em desenvolvimento
aumentarem o consumo, mas medidas de controle são
indispensáveis para o futuro.“O planeta não tem energia
suficiente para o ritmo atual do crescimento econômico”,
disse no IV Congresso Brasileiro para o Desenvolvimento
do Edifício Hospitalar, realizado em agosto, em
Florianópolis/SC.
Um dos grandes vilões dos gastos com energia é o
conjunto de técnicas utilizadas para gerenciar este recurso,
segundo o engenheiro clínico Lúcio Flávio Brito.“Acontece
quando o sistema joga contra ele mesmo, como uma
doença autoimune. Ele não reconhece a si, nem aos outros,
e termina por causar dano a si próprio”, explica.
Em termos técnicos, é possível dizer que esse vilão é o
sistema de refrigeração. Como o Brasil é um país quente,
precisa deste recurso, que a cada dia está mais acessível.
Contudo, a aplicação ainda é inadequada e pouco
profissional, considera Brito.
Como o ar condicionado emprega muitos motores
(carga indutiva), pode afetar a forma como o hospital
utiliza a energia e gerar multas. Sem falar na atitude
das pessoas: o mais comum é conversarem com a porta
INFRAESTRUTURA
Como usar a energia
de forma eficiente e
sustentável?
O planeta não tem energia suficiente
para o ritmo atual do desenvolvimento
econômico, por isso é preciso pensar de
forma sustentável e considerar diversas
mudanças na rotina dos hospitais,
gerando não só benefícios para o meio
ambiente, mas também para o bolso.
Por Carol Gonçalves
Imagem de abertura.
Detalhes em vermelho
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entreaberta, quando deveria estar fechada.“Em países
frios, como Canadá, Estados Unidos, França e Inglaterra,
o rigor é muito alto no uso desses equipamentos. Veja
as portas duplas nas entradas dos estabelecimentos,
demonstrando uma maturidade maior que a nossa em
relação ao assunto”, conta.
Outro grupo de vilões são as cargas resistivas, como as
criadas por autoclaves, caldeiras elétricas, equipamentos
elétricos do Serviço de Nutrição e Dietética até
lâmpadas incandescentes (tecnologia em completo
desuso), entre outras.
“É comum encontrarmos hospitais pagando multas
significativas há anos sem entender por quê. E quando
descobrem, não sabem o que fazer. Falta conhecimento,
vocabulário técnico e administrativo para falar com a
concessionária de igual para igual”, considera.
Como economizar
Primeiramente, é preciso saber o que está sendo
comprado e cobrado. Para Brito, é fundamental mudar
a cultura. “A fatura chega, alguém carimba e envia para
aquele que efetua o pagamento. É tudo automático,
não há trabalho ‘pensante’. Esta é a primeira correção.
Como há opções de contratação de energia elétrica,
é necessário conhecer o que foi acordado e ajudar a
equipe do setor financeiro com estratégias de redução
a partir daí.”
O engenheiro clínico chama atenção para a “tarifa de
ultrapassagem”, multa aplicada quando se excede o
valor combinado. Funciona dessa forma: o hospital
contrata uma certa quantidade de energia elétrica,
mas quando a demanda cresce, é preciso solicitar
mais à concessionária. Como essa variação impacta
na produção de energia, foi estipulada uma multa,
chamada de tarifa de ultrapassagem, que pretende
impedir que o consumidor imponha ao fornecedor
uma demanda muita elevada e sem planejamento.
Antes era possível ultrapassar 10% sobre o contratado,
mas hoje, bastam 5%. A multa é três vezes o valor
contratado aplicado ao excedente. Caso isso não seja
observado, o hospital pode acabar pagando o dobro
pela energia que utiliza, sendo que bastaria fazer uma
adequação contratual. A tabela a seguir explica com
números.
Situação 1 Situação 2
Valor do kW R$ 29,14
Valor contratado (kW) 100 200
Consumo até 200 kW (R$)
11.364,60
(com multa)
5.828,00
(contratado)
Diferença: R$ 5.536,60
O Hospital Albert Einstein, de São Paulo/SP, é um
exemplo de ação com resultados. Através de um
projeto de eficiência energética, descobriu que era
preciso melhorar a qualidade da energia, eficiência
do ar condicionado e migrar o ambiente de geração
do hospital. “Investimos na redução de energia reativa
e ajustamos nossa contratação de demanda, pois
gastávamos mais do que o contratado. A economia foi
de 7,5% ao ano, com retorno rápido”, disse o Gerente
de Sistema Elétrico da instituição, Coroacy dos Santos
Junior, na 15ª edição do Energy Summit, realizado em
novembro, em São Paulo.
Outra ação do hospital envolveu o ar condicionado.
Com a instalação de schilers e sistema de automação,
com novos motores e inversores de alto rendimento, o
consumo caiu em torno de 57%.“Hoje ele representa
26% do uso total de energia, e pretendemos reduzir
ainda mais. A mudança para o modelo de aquisição
para Ambiente de Contratação Livre, em 2013, também
contribuiu para que a economia no final do ano fosse de
23%. Até julho de 2014, já reduzimos cerca de 20% se
compararmos com o que seria gasto no modelo cativo”,
acrescentou o gerente. A Unidade de Alphaville do
hospital, inaugurada em 2012, foi toda projetada em LED.
A redução varia entre 45% e 60% por área de utilização, e
a iniciativa está sendo replicada.
Para o engenheiro clínico Brito, buscar novas tecnologias
também é importante para economizar, como o uso de
energia solar.“Há regiões muito favoráveis a este recurso,
que está cada vez mais disponível”, considera. Trocar
equipamentos também é outra estratégia.
Ele ressalta que, em época de crise em São Paulo pela
falta de água, é difícil se lembrar de também economizar
energia, que é predominantemente hídrica.“Não seria
oportuno trabalhar nas duas pontas? Economize água e
não se esqueça de apagar as luzes!”
Adotando práticas de redução do consumo, o hospital
pode economizar muito, mas é preciso envolver as pessoas.
“Há um tipo de contrato cujo valor da energia é diferente
em determinados horários. Quando o hospital opta
por isso, tem que mudar o modo como usa o recurso e
comunicar os colaboradores. É comum a administração, em
conjunto com a área de engenharia, adotar a tarifa sazonal
mas não informar o usuário, que acaba trabalhando com
a mesma rotina no horário em que a energia é mais cara”,
lembra Brito.
Sustentabilidade
Quanto maior a eficiência energética, maior é a evidência
de que se está trilhando um caminho em direção à
sustentabilidade. Elas são diretamente proporcionais. Em
climatização, é utilizada uma grandeza denominada TR
(tonelada refrigeração), que é igual a 12.000 BTU/h. BTU
é a capacidade de produzir frio ou calor; BTU/hora é a
velocidade com que produzimos esta energia ou trabalho.
Há equipamentos que gastam 2 KW para produzirem 1 TR,
outros, 1,2 kW, ou seja, é preciso ter ciência dessas relações
e utilizá-las da melhor forma.
“Os gestores hospitalares devem conhecer mais sobre
as ações concretas ou objetivas frente aos dois temas:
sustentabilidade e eficiência. Ainda há muito que
caminhar. Mas estamos indo, embora uns estejam mais à
frente do que outros”, expõe.
Autossuficiência
Brito acredita que ser autossuficiente em energia
elétrica é para quem sabe fazer. É o mesmo caso da
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produção do oxigênio intra-hospitalar: o hospital
deve avaliar os riscos. Energia elétrica também salva
vidas, tanto no diagnóstico quanto na terapia ou na
assistência, e não deixa de ser uma tecnologia em saúde.
“No entanto, parar de comprar para produzir significa
se responsabilizar totalmente pelo resultado. Conheci
países onde a energia elétrica é produzida por geradores
de forma muito efetiva. Como engenheiro, é um desafio,
mas perfeitamente possível”, revela.
Segundo o profissional, o número de geradores instalados
pelos hospitais nos últimos 15 anos é enorme e, em grande
parte, superdimensionado. Essas instituições poderiam,
inclusive, fornecer parte de sua capacidade produtiva para
a rede, em sua opinião.
“Como as estruturas de engenharia no organograma dos
hospitais praticamente não existem, porque são tratadas
apenas como manutenção, acho pouco provável não
ocorrerem problemas frequentes com este tipo de ideia.
Não é somente a questão tecnológica que impacta, mas
também o modelo de contrato que terá que ser feito pela
concessionária”, considera.
Não existe uma norma que obrigue os hospitais a usarem
geradores, mas áreas como centro cirúrgico e UTI não
podem ficar sem esses equipamentos. Por exemplo, o foco
cirúrgico requer no-break, pois o tempo de transferência
de energia da concessionária para fonte alternativa tem
que ser muito rápido. O gerador, somente, não consegue
atender neste tempo.
Muitos os utilizam, inclusive com redundância,
movimentando bastante o mercado, que precisa de
pessoas capacitadas, tanto na gestão de motores de
combustão interna, que usam diesel, quanto em geradores.
Além disso, devem ter conhecimento em comandos
elétricos, pois quase não há mais equipamentos sem um
computador“inside”.
Recentemente, Brito fez a tradução do Índice de
Segurança Hospitalar Frente a Desastres, da OPAS/OMS,
criado para avaliar o quão preparado está um hospital
para enfrentar essas situações. Trata-se de um trabalho
aplicado no mundo inteiro que analisa a situação
geográfica onde a instituição está inserida, a estrutura
da edificação, as instalações que dão apoio à operação
e a sua capacidade de se manter funcional. “O manual
orienta que para ser considerado seguro sob o ponto
de vista da capacidade em manter seu fornecimento
de energia elétrica, um hospital deve dispor de
combustível para ao menos 36 horas. Nossas leis falam
de 24 horas no mínimo. Estamos fora do ponto de vista
legal e vamos ter que corrigir isso”, acrescenta.
Como escolher
A Cummins Power Generation é uma das empresas que
oferecem soluções em geradores e sistemas capazes de
suprir as necessidades energéticas de qualquer tipo de
hospital. Segundo Leonardy Giordany, Gerente Técnico
Comercial da Distribuidora Cummins Diesel do Nordeste
(DCDN), o grupo gerador não é um produto de prateleira,
ou seja, antes de escolher um determinado modelo
é importante a visita técnica para levantamento de
informações como carga, tipo de aplicação, entre outros
itens que ajudarão a ter um diagnóstico das necessidades
do cliente. No caso de geradores a gás, por exemplo,
pode ser feito um estudo para cogeração de energia para
minimizar o consumo com ar condicionado, água quente
ou gelada.
“O valor do investimento depende do projeto e das
necessidades. O cliente poderá optar por adquirir um
grupo gerador apenas para emergência, e garantir
que o hospital funcione normalmente numa falha da
concessionária. O retorno financeiro é imediato, e o
É comum hospitais pagarem multas
significativas sem saber por quê. Falta
conhecimento, vocabulário técnico
e administrativo para falar com a
concessionária de igual para igual
“
“
Lúcio Flávio Brito, engenheiro clínico
Grupo Gerador da Cummins no
Hospital da Mulher, de Fortaleza/CE
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valor, imensurável, pois se trata de manter vidas. Outro
tipo de contrato é para reduzir o custo da energia
no horário de ponta, neste caso, a média de retorno
do investimento é entre dois e três anos”, explica o
profissional.
Com relação às quedas de energia, Giordany
aponta que elas podem estar associadas à falha no
fornecimento da concessionária local, à sobrecarga
em equipamentos usados inadequadamente e até
mesmo à falta de manutenção da parte elétrica do
empreendimento. Ele também alerta para a crise
por conta dos baixos níveis dos reservatórios das
hidroelétricas, inclusive para a grande possibilidade de
apagões e até racionamento em 2015.
“Consideramos de extrema importância a prévia avaliação
de falhas e a monitorização dos equipamentos à distância.
Desta forma, implantamos em nossos equipamentos um
sistema de telemetria para acompanhamento remoto
com informações em tempo real, permitindo antecipar as
informações e ter agilidade na identificação e solução de
problemas técnicos”, ressalta.
Entre os clientes da Cummins está o Hospital da
Mulher, de Fortaleza/CE, capaz de funcionar por
cerca de oito horas, em casos de falta de luz. O
empreendimento conta com três grupos geradores
de 450 kVA, com sistema moderno de transferência
de carga fechada STR, que fornece 1,35 MVA de
energia. Referência para o programa Rede Cegonha, a
instituição dispõe de 184 leitos, incluindo dez de UTI
neonatal, 16 de UTI neonatal de médio risco e dez de
UTI adulto. Uma semana após a inauguração, Fortaleza
sofreu um apagão que durou aproximadamente três
horas. Na ocasião, o Hospital da Mulher continuou
operando normalmente graças aos geradores de
emergência que foram acionados automaticamente
poucos segundos após a queda de luz.
Também são clientes da empresa os hospitais Albert
Einstein, Vivalle, Santa Paula e Santa Rita de Cássia, todos
em São Paulo, além do Badim, no Rio de Janeiro.
Outra companhia que atua no segmento é o Grupo
Sotreq, com capital 100% nacional. Marcelo Tadeu
de Souza, Gerente de Aplicações Especiais da
Unidade de Energia, cita entre as vantagens de um
hospital em se tornar autossuficiente em energia
elétrica a independência do sistema, a qualidade da
energia e, sobretudo, o aumento da disponibilidade
e da confiabilidade no fornecimento do recurso,
proporcionando maior segurança às atividades.
Segundo ele, ao adotar a solução, a instituição deve ter
os mesmos cuidados com os quais trata seus pacientes.
“É imprescindível efetuar um diagnóstico adequado
das necessidades, do ponto de vista de infraestrutura
elétrica e tecnológica, fazendo uma análise criteriosa dos
sistemas agregados, a fim de se desenvolver um projeto
com concepção específica à estratégia de implantação
– e também de expansão – dos hospitais ou complexos
hospitalares”, conta, acrescentando que o investimento
é diretamente proporcional à complexidade técnica
requerida. O retorno financeiro depende da filosofia
operacional a ser adotada, mas, basicamente, é de três a
cinco anos.
“Além disso, é indispensável a idealização do melhor
modelo para operação e manutenção dos grupos
geradores, do ponto de vista preditivo, preventivo
e corretivo, assim como da melhor forma de
atendimento nas emergências”, declara Souza. Para
evitar os problemas da queda de energia, ele considera
importante implementar sistemas contingentes/
redundantes (autossuficiência, emergência e/ou
cogeração).
O segmento de Aplicações Especiais da Unidade de
Energia da Sotreq atende os principais hospitais de
São Paulo, como Albert Einstein, Sírio Libanês, Oswaldo
Cruz, São Camilo, HC e 9 de Julho. Normalmente, as
soluções técnicas adotadas envolvem a instalação de
sistemas de autossuficiência energética, com usinas
de geração em M.T. – Média Tensão e/ou sistemas de
emergência em B.T. – Baixa Tensão.
A linha de no-breaks ConceptionTrifásicos Multiativos
CM Comandos, da Beta Eletronic, permite até seis
unidades em paralelismo redundante e utiliza a
sofisticada tecnologia DSP – Processamento Digital de
Sinais. Disponíveis de 5 a 120 kVAs, contam com sistemas
online, senoidais e que operam em dupla conversão.
São autônomos e possuem sistema de bypass estático,
permitindo a parada para manutenção sem que seja
necessário desligar a carga e paralisar a rede.
www.betaeletronic.com.br l (11) 5545-4544
PARA REDUZIR OS CUSTOS
• Atualizar ou substituir sistemas e equipamentos
obsoletos (retrofit);
• Utilizar no-breaks;
• Desligar os aparelhos quando não estiverem em
uso, o que pode ser feito manualmente ou com a
ajuda de recursos tecnológicos;
• Acompanhar frequentemente as métricas de
eficiência energética;
• Apagar as luzes ao deixar o ambiente ou instalar
sensores de presença;
• Usar grupos geradores nos horários de ponta (entre
17h e 20h, dependendo da região), o que contribui
para uma economia de até 20% na conta de luz;
• Consultar empresas de projeto, engenharia e
consultoria especializadas no setor hospitalar e
que trabalhem com abordagem participativa/
construtiva ao lado dos usuários finais e
operadores hospitalares.
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