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CURRENT ISSUES
Abril 2003 volume 3 número 1
Fundamentos Teóricos de Metas de Inflação
Luiz Nelson Porto Araujo
O Brasil, como outros países – desenvolvidos e em desenvolvimento – adota um regime monetário
baseado na definição, ex-ante, de uma trajetória para a taxa de inflação. A operacionalização
deste regime tem as seguintes características: (i) anúncio da meta, (ii) escolha entre o nível de
preços ou a taxa de inflação, (iii) horizonte da meta, (iv) nível da meta, (v) largura da banda da
meta, (vi) precisão da taxa de inflação, (vii) modelo econométrico utilizado para as projeções e
(viii) transparência e accountability da autoridade monetária.
Introdução
Dentro das recentes modificações da política
econômica no Brasil, o Banco Central do
Brasil (BACEN) anunciou, em 1999, a sua
disposição em adotar uma política monetária
baseada na definição ex-ante de uma traje-
tória para a taxa de inflação. Esta trajetória
irá condicionar os instrumentos de política
monetária a serem utilizados pelo BACEN.1
A decisão que fundamentou essa disposição
decorre diretamente da percepção das auto-
ridades econômicas de que uma baixa e es-
tável taxa inflacionária deve ser buscada
como condição sine qua non para a reto-
1. A literatura sobre este tema é bastante extensa.
Para maiores detalhes ver, por exemplo, Debelle
mada do processo de desenvolvimento sus-
tentado do país. Neste sentido, ela reafirma
a proposição de que a complicada experiên-
cia de transição do regime do padrão-ouro
para a administração discricionária de papel-
moeda não conversível levou à crença, quase
geral, de que a estabilidade dos preços é o
mais importante objetivo da política monetá-
ria. A adoção de metas de inflação (inflation
targeting) é uma indicação explícita desta
crença.
Em teoria, uma meta de inflação pode ser
definida sem maiores dificuldades. O Banco
(1997), Fischer (1993), McCallum (1998), Rudebusch
et al. (1998) e Svensson (1998).
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DELTA ECONOMICS & FINANCE 2
Central faz previsões sobre a trajetória da in-
flação; essas previsões são comparadas com
a meta; a diferença entre a previsão e a meta
define os ajustes necessários nos instrumen-
tos de política monetária. Na prática, essas
metas foram inicialmente introduzidas como
âncora para a política monetária da Nova Ze-
lândia, em março de 1990, e do Canadá, em
fevereiro de 1991. No entanto, foi apenas
nos últimos cinco anos que inúmeros outros
países basearam as suas respectivas políti-
cas monetárias em metas inflacionárias.
Desde então, o estudo e a avaliação destas
políticas cresceram exponencialmente, ao
ponto do FMI estar recomendando a sua
adoção.
Fundamentos Teóricos
Trade-Off entre Inflação e Desemprego:
A Curva de Phillips
Em geral, a análise de políticas monetárias
baseadas em metas de inflação resgata dis-
cussões anteriores sobre o trade-off entre in-
flação e desemprego (ou produção). Na ver-
dade, pode-se mesmo dizer que a existência
de um trade-off de curto prazo entre estas
variáveis é fundamental nas decisões dos
formuladores da política monetária.
A discussão econômica sobre a existência de
um trade-off entre inflação e desemprego
pode ser analisada ao longo de três períodos
consecutivos. O primeiro iniciou-se com o ar-
tigo de Phillips (1958) sobre o comporta-
mento das taxas de desemprego e os salá-
rios nominais na Inglaterra. O segundo perí-
odo teve como marco fundamental a formu-
2. Phillips encontrou diversos loops entre estas va-
riáveis e não uma relação linear estável.
3. Ou, então, assumiram expectativas estáticas.
lação da hipótese da taxa natural de desem-
prego por Friedman (1968) e Phelps (1967).
O último período está associado com a intro-
dução da hipótese de expectativas racionais
e a aceitação, quase generalizada, de que
não existe um trade-off que possa ser explo-
rado pela autoridade econômica.
Apesar da investigação inicial de Fischer
(1926) da relação negativa entre inflação e
desemprego, foi somente após a publicação
do estudo de Phillips (1958) que ela ganhou
relevância nos círculos acadêmicos e políti-
cos. A principal observação de Phillips foi a
existência de uma correlação inversa signifi-
cativa entre as taxas de desemprego e de va-
riação do salário nominal na Inglaterra. O pe-
ríodo analisado por Phillips compreendeu
quase um século e, portanto, não deveria
causar surpresa o fato de que os resultados
aparentemente indicavam um trade-off, no
qual os benefícios de uma menor inflação se-
riam contrapostos em termos de uma maior
taxa de variação do salário nominal, que po-
deria ser explorado pelo governo.2
O segundo período inicia-se com a formula-
ção da hipótese da taxa natural de desem-
prego por Friedman (1968) e Phelps (1967)
e com os primeiros estudos sobre os funda-
mentos microeconômicos da macroecono-
mia. Ao contrário de Phillips (e, posterior-
mente, Lipsey (1960)), que não levaram em
consideração o papel das expectativas dos
agentes e encontraram uma relação aparen-
temente estável,3
Friedman e Phelps questi-
onaram exatamente esta suposta estabili-
dade sob condições de mudanças nas ex-
pectativas.4
4. Em termos mais gerais, a crítica destes autores
chamou atenção para o processo de formação das ex-
pectativas, que seria ainda mais relevante nas análises
de Lucas e Sargent sobre a curva de Phillips.
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DELTA ECONOMICS & FINANCE 3
A discussão dos loops encontrados por Phil-
lips sugere que o trade-off de curto prazo di-
fere daquele de longo prazo. A distinção en-
tre ambos forma a base da Natural Rate
Hypothesis (NRH) de Friedman (1968) e
Phelps (1971): apesar de existir um trade-off
no curto prazo, existe também uma taxa na-
tural de desemprego no longo prazo, taxa
essa independente da taxa de inflação no es-
tado estacionário. A implicação da NRH é
que a curva de Phillips no longo prazo é ver-
tical, ou seja, o trade-off é nulo; este
trade-off só existe no curto prazo.
A proposição fundamental é que o trade-off
de curto prazo resulta de erros de expectativa
por parte dos agentes econômicos, ou seja,
são esses erros que permitem à taxa de de-
semprego diferir da taxa natural. Friedman e
Phelps argumentam contra a suposição de
que é possível enganar todos os trabalhado-
res e firmas o tempo todo. Tanto os trabalha-
dores quanto as firmas barganham por salá-
rios reais e, dessa forma, a taxa natural de
desemprego é independente da taxa de in-
flação antecipada.
A existência de um trade-off de curto prazo
decorrente de erros de expectativa não im-
pede, por si só, qualquer efeito da política
monetária sobre o produto, desde que as au-
toridades monetárias sejam capazes de gerar
uma taxa de inflação que não seja anteci-
pada. Na verdade, o uso de expectativas
adaptadas sugere que uma aceleração da
taxa de inflação seria capaz de manter a taxa
de desemprego abaixo da taxa natural. Este
corolário da NRH, conhecido como a versão
aceleracionista da curva de Phillips, foi suge-
rido por Friedman, mas foi Phelps quem o
demonstrou rigorosamente: se um aumento
da taxa de inflação somente reduz a taxa de
5. Ou seja, as expectativas inflacionárias são ajus-
tadas de acordo com o hiato entre a inflação observada
e a esperada.
desemprego de forma temporária, então, a
única forma de se manter essa taxa perma-
nentemente abaixo da taxa natural é por
meio de um aumento contínuo, a taxas cres-
centes, da inflação, ou seja, acelerando-se a
taxa de inflação.
O terceiro período de análise da curva de
Phillips iniciou-se a partir da percepção de
que, na formulação de Friedman-Phelps, a
diferença entre a curva de curto prazo e a de
longo prazo é uma consequência lógica da
suposição de que as expectativas são forma-
das de acordo com esquemas adaptativos.5
O problema é que a hipótese de expectativas
adaptadas implica, primeiro, que os agentes
cometem erros sistemáticos de previsão (as
expectativas são viesadas) e, segundo, que
o conjunto de informação utilizado pelos
agentes é incompleto, na medida em que só
compreende valores passados dos preços;
em outras palavras, novas informações são
desperdiçadas. Neste período, foi introduzida
a hipótese de expectativas racionais, que
destruiu até mesmo o trade-off da curva de
Phillips de curto prazo.
Na formulação de Robert Lucas, e outros,
uma política monetária previsível não tem
qualquer efeito sobre o nível do produto, na
medida em que o setor privado leva em con-
sideração esta política e ajusta as suas ex-
pectativas de acordo, e, portanto, não existe
a possibilidade de um hiato sistemático entre
a taxa de inflação observada e a esperada. É
importante ressaltar que um modelo com ex-
pectativas racionais também explicita uma
curva de Phillips. No entanto, há uma dife-
rença fundamental deste caso em relação à
formulação de Friedman-Phelps: desvios sis-
temáticos entre a taxa de inflação observada
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DELTA ECONOMICS & FINANCE 4
e a esperada não podem derivar de mudan-
ças na oferta de moeda destinadas a alterar
a taxa de desemprego. Se a taxa de cresci-
mento da oferta de moeda aumenta, e os
agentes sabem disto, então eles irão rever
suas expectativas de inflação. Em conse-
quência, a curva de Phillips desloca-se. As-
sim que o trade-off é explorado por qualquer
política econômica sistemática ele desapa-
rece, ou seja, no caso das expectativas se-
rem racionais até mesmo a curva de curto
prazo é instável.
Custo da Estabilização
Uma das questões mais controversas na lite-
ratura econômica teórica e empírica refere-
se ao custo de bem-estar da estabilização.6
Suponha que em um certo instante o go-
verno tenha por objetivo reduzir a variabili-
dade de um conjunto de variáveis macroeco-
nômicas.7
A pergunta, aparentemente sim-
ples, que se coloca é a seguinte: qual o custo
de se adotar uma política de estabilização?
A simplicidade da pergunta esconde a volu-
mosa controvérsia sobre eventuais respos-
tas, controvérsia esta decorrente, em grande
parte, da inexistência de modelos comu-
mente aceitos que, em última instância, per-
mitam a quantificação destes custos.
Hall (1982) editou os resultados do Projeto
sobre Inflação do National Bureau of Econo-
mic Research. A preocupação fundamental
era diagnosticar as causas da inflação e des-
crever os seus efeitos.8
Os estudos de Gor-
don (1982) e Sargent (1982), então relata-
dos, apresentam um forte contraste. Apesar
6. Em geral, este custo é medido em termos dos
níveis de produção e de emprego.
7. A razão e a determinação endógena do instante
de tal decisão são irrelevantes para os fins da discus-
são a seguir, apesar de fundamentais na adoção prá-
tica de políticas de estabilização.
8 O Projeto não teve como foco a recomendação
de políticas específicas para o término da inflação.
de ambos terem analisado episódios históri-
cos sobre o término da inflação chegaram a
conclusões dramaticamente distintas à per-
gunta: o que aconteceria com a produção e
o emprego se a inflação fosse eliminada?
Gordon (1982) analisou 14 episódios (Ale-
manha, Brasil, Estados Unidos, França, Is-
rael, Itália, Japão e Suíça), sendo seis ape-
nas nos Estados Unidos, e concluiu que o
término da inflação pode impactar negativa-
mente a produção e o emprego. No entanto,
os seus resultados não são unânimes, ou
seja, nem sempre o término da inflação tem
efeitos adversos sobre o emprego.9
Sua aná-
lise concentrou-se na velocidade e extensão
da resposta da taxa de inflação a mudanças
temporárias e permanentes na taxa de cres-
cimento do produto nominal.
Sargent (1982) estudou o final de quatro hi-
perinflações (Alemanha, Áustria, Hungria e
Polônia) no período entre as duas Grandes
Guerras e concluiu que a passagem de um
período de instabilidade para um de estabili-
dade foi imediata, e que os custos da esta-
bilização em termos de emprego foram insig-
nificantes. Ele mostrou que reformas fiscais
do tipo once-and-for-all foram fundamentais
para o controle da inflação em cada dos qua-
tro episódios. A evidência coletada por ele
sugere que as características comuns de
cada um dos países foram: (i) a natureza do
regime fiscal durante cada uma das hiperin-
flações. Cada um dos países apresentou dé-
ficits públicos persistentes e gigantescos; (ii)
a natureza das medidas fiscais e monetárias,
9. Gordon relatou que o término da inflação nos Es-
tados Unidos após a Primeira Grande Guerra foi acom-
panhado de uma recessão bastante suave. A Alema-
nha também teve sucesso com políticas de combate à
inflação ao longo dos anos 70. Também a França e a
Itália, em meados dos anos 60, e o Japão, ao final dos
anos 70, conseguiram controlar a inflação sem uma
recessão profunda.
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DELTA ECONOMICS & FINANCE 5
compreensivas e drásticas, que foram adota-
das para terminar as hiperinflações; (iii) a
imediação com a qual o nível de preços e a
taxa de câmbio foram estabilizados e (iv) o
rápido crescimento da base monetária nos
meses e anos que sucederam ao término da
inflação.
Recentemente, Lucas (1987) sugeriu um
modelo teórico que, apesar de simples,
busca responder à pergunta central. A partir
de dados para a economia Americana, no
período pós Segunda Guerra Mundial, ele es-
tima os parâmetros do modelo e, então, in-
daga quanto um agente representativo esta-
ria disposto a pagar em termos do seu nível
de consumo, em cada período, para obter:
(i) um aumento na taxa de crescimento do
consumo e (ii) uma redução na variabilidade
do componente cíclico em relação à tendên-
cia. Apesar da primeira indagação envolver
valores substanciais, no caso da segunda
eles são inesperadamente pequenos. A con-
clusão de Lucas é que o ganho de bem-estar
derivado de uma redução da variabilidade do
consumo agregado através de políticas de
estabilização é, provavelmente, insignifi-
cante. Em outras palavras, no período anali-
sado o ciclo econômico não é importante do
ponto de vista do bem-estar social.10
Regras para a Política Monetária
Em geral, aceita-se que regras de política
monetária convencionais baseadas em me-
tas intermediárias, como o crescimento da
moeda ou do crédito, fundamentam-se na
premissa de que as relações que ajustam es-
sas variáveis aos indicadores relevantes do
setor não-financeiro, como renda e preços,
são robustas. Quando os mercados financei-
ros se alteram e perturbam essas relações,
as regras baseadas em metas intermediárias
10. Mais ainda, os benefícios marginais de se desen-
volver tal teoria são potencialmente insignificantes.
não são mais capazes de fornecer um refe-
rencial útil para a condução da política mo-
netária. Nestas circunstâncias, o banco cen-
tral pode, ao invés, se valer de variáveis
como a moeda e o crédito como variáveis-
informação. Isso irá exigir, inevitavelmente,
julgamentos caso-a-caso. Quanto maior for o
impacto das alterações nos mercados finan-
ceiros, maior será a necessidade de o banco
central valer-se de outras informações, ex-
tensamente, no sentido de tirar proveito de
fontes múltiplas e diversas de informações
ao invés de uma única variável, e intensa-
mente, no sentido de permitir menos tempo
entre as decisões de política.
Instituições e Política Monetária
Romer e Romer (1997) demonstraram que
as deficiências da política monetária derivam
não apenas de inconsistência dinâmica,
mas, mais importante, de uma compreensão
imperfeita da economia e dos efeitos da po-
lítica. Utilizando-se de episódios históricos e
recentes para os Estados Unidos e outros pa-
íses, eles demonstram que o conhecimento
parcial dos economistas, formuladores de
política, líderes políticos e dos eleitores têm
sido uma fonte importante de deficiências da
política monetária. Estes autores analisam
quais as instituições da política monetária
poderiam tratar os problemas da inconsis-
tência dinâmica do conhecimento limitado e
sugerem que um conjunto de instituições
que poderia realizar este feito é um banco
central significativamente independente com
discrição sobre os objetivos e a conduta da
política, combinado com uma estrutura em
dois níveis onde os líderes eleitos indicaram
um conselho de trustees para o banco cen-
tral o qual, por sua vez, escolhem os formu-
ladores da política. Finalmente, Romer e Ro-
mer também discutem reformas e propostas
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DELTA ECONOMICS & FINANCE 6
de reformas da política monetária e das ins-
tituições em países industrializados.
Coordenação das Políticas Monetária e
Fiscal
A coordenação de políticas é um dos temas
mais analisados na moderna teoria econô-
mica.11
Considerando que o sistema econô-
mico é dinâmico e complexo, sendo influen-
ciado por inúmeros fatores sob constante al-
teração – o que o torno instável – a coorde-
nação de políticas é uma necessidade.
No entanto, o uso específico dos instrumen-
tos de políticas públicas, sejam setoriais ou
regulatória, dado que são operados por dife-
rentes autoridades – muitas vezes com obje-
tivos, recursos e pontos fracos e fortes dis-
tintos – é um imperativo.
Uma das maneiras de se obter esta coorde-
nação é através da troca de informações en-
tre os formuladores destas políticas, com
foco nas estratégias, efeitos e medidas dos
instrumentos disponíveis em cada um dos
casos. Na literatura, o problema de coorde-
nação mais estudado é aquele que envolve
as políticas monetária e fiscal.
Banco Central
Os primeiros bancos centrais foram instituí-
dos com o propósito de financiar o governo e
contribuir para o desenvolvimento do sistema
financeiro. Ao longo do século XIX eles pas-
saram a ter como atribuição primária prote-
ger a estabilidade do sistema financeiro e o
valor externo da moeda. Ao longo das déca-
das de 30 e 40, no período inicial da revolu-
ção keynesiana, as atribuições conferidas
aos bancos centrais, geralmente, incluíam a
estabilidade monetária e a promoção do
11. Para maiores detalhes ver, por exemplo, Laurens
e La Piedra (1998) e Dixit e Lambertini (2003).
pleno emprego. A partir de meados dos anos
60, com o fortalecimento das pressões infla-
cionárias que acabaram por destruir o sis-
tema de Bretton Woods, o foco da política
monetária foi redefinido como a manutenção
do valor doméstico da moeda. Atualmente,
os bancos centrais exercem inúmeras atri-
buições, dentre elas:
 a administração da oferta de moeda e
de crédito e determinação das taxas de
juros, através do controle da base mo-
netária; o controle, exclusivo ou compar-
tilhado, da taxa de câmbio e das reser-
vas internacionais;
 o depósito das reservas compulsórias e
voluntárias dos bancos comerciais;
 a responsabilidade pela promoção da
estabilidade do sistema financeiro, atra-
vés da supervisão do sistema, da sua
atuação como emprestador de última
instância e, em alguns casos, da gestão
do seguro depósito;
 a atuação como banco do tesouro e, em
alguns casos, a administração total ou
parcial da dívida pública.
De todas essas, a administração da oferta de
moeda e de crédito - a política monetária - é
fundamental, ao conferir ao banco central
um poder enorme, particularmente nas situ-
ações em que a independência do banco é
tal que ele também fixa as taxas de juros.
Na prática, a experiência internacional mos-
tra uma grande disparidade na fixação dos
objetivos do Banco Central. Na Alemanha,
por exemplo, o Bundesbank deve conduzir a
política monetária com o objetivo de preser-
var a moeda. Além disso, ele também deve
apoiar a política econômica do governo fede-
ral, mas apenas na medida em que seja con-
sistente com o seu objetivo primordial de
preservar a moeda. Na França, a lei confere
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DELTA ECONOMICS & FINANCE 7
ao Banque de France a tarefa de assegurar
a estabilidade dos preços, no contexto da po-
lítica econômica do governo. Esse mandato
é similar àquele do Bundesbank, exceto a
provisão de que o mandato para a estabili-
dade dos preços sobrepõe a obrigação de
apoiar a política econômica do governo.
Por sua vez, na Inglaterra, o Bank of England
Act de 1946 não estabeleceu nenhum obje-
tivo específico. No caso da Nova Zelândia, o
Reserve Bank of New Zeland Act de 1989
determinou que "the primary function of the
Bank is to formulate and implement mone-
tary policy directed to the economic objective
of achieving and maintaining stability in the
general level of prices."
Nos Estados Unidos, o Federal Reserve deve
"maintain long-run growth of the monetary
and credit aggregates commensurate with
the economy's long run potential to increase
production, so as to promote effectively the
goals of maximum employment, stable
prices, and moderate long-term interest
rates".12
Por último, vale a pena ressaltar que
no âmbito da EMU foi definido The European
System of Central Banks (ESCB), formado
pelo European Central Bank e os bancos
centrais dos países membros da EMU. O Ar-
ticle 105(1) do Tratado de Maastricht es-
tabeleceu que "the primary objective of the
ESCB shall be to maintain price stability.
Without prejudice to the objective of price
stability, the ESCB shall support the general
economic policies in the Community with a
view to contributing to the achievement of
the objectives of the Community [...]".
A partir do início dos anos 70, com o colapso
do Sistema de Bretton Woods, a condução
12. Este é o objetivo da política monetária definida
no Humphrey-Hawkings Act de 1978.
da política monetária foi alterada em diver-
sos países desenvolvidos e emergentes. Essa
alteração contemplou, em particular, os ar-
ranjos institucionais desta política, com a de-
legação de maior independência aos bancos
centrais. O objetivo foi a proteção da autori-
dade monetária de interferências na escolha
dos instrumentos de política monetária e na
busca da estabilidade dos preços. Uma
maior independência da autoridade monetá-
ria significa que ela não precisa comprome-
ter o objetivo de estabilidade dos preços a
favor de outros objetivos conflitantes de curto
prazo, como o equilíbrio do balanço de paga-
mentos e das contas públicas.
Meta de Inflação como um Arcabouço
para a Política Monetária
Dentre os diversos motivos encontrados na
literatura econômica para a adoção de metas
de inflação, dois são particularmente rele-
vantes: i) uma nova ênfase na estabilidade
dos preços como o objetivo fundamental da
política monetária; e ii) proposições teóricas
que argumentam que um comprometimento
crível a um objetivo de inflação - por exem-
plo, uma meta - pode eliminar o potencial
viés inflacionário da política monetária.
O objetivo fundamental da política monetária
em um regime de meta inflacionária é o cum-
primento da meta fixada. Neste sentido,
qualquer outro objetivo só pode ser procu-
rado se não for inconsistente com a meta.
Os principais casos usualmente discutidos
na literatura envolvem: i) meta e taxa de
câmbio; ii) meta e pleno emprego e iii) meta
e estabilidade financeira.
Um regime de meta inflacionária não é con-
sistente com um regime de câmbio fixo.13
13. Na verdade, muitos países que adotaram um re-
gime de metas inflacionárias o fizeram para substituir
um regime de câmbio fixo.
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DELTA ECONOMICS & FINANCE 8
Dado que a política monetária é endógena
sob um regime de câmbio fixo, geralmente
não é possível fixar como meta (no médio
prazo) uma taxa de inflação, ao contrário do
caso de um país onde a moeda local é atre-
lada à uma outra. Da mesma maneira, um
objetivo de pleno emprego não é, em geral,
inconsistente com uma meta de inflação. O
problema, neste caso, é que a assunção da
existência de um trade-off entre inflação e
emprego pode induzir a autoridade monetá-
ria a incluir na sua função objetivo o nível de
produção (ou de emprego) e, em consequên-
cia, influir na política monetária ótima. O
mesmo acontece com um regime de meta
inflacionária e um objetivo de estabilidade fi-
nanceira (geralmente buscado por bancos
centrais): não são necessariamente incom-
patíveis, apesar de um sistema bancário frá-
gil poder comprometer a grau de flexibilidade
da taxa de juros.
Por último, é importante também ressaltar a
interação entre os objetivos das políticas mo-
netária e fiscal em um regime de meta infla-
cionária. Operacionalmente, a política mone-
tária deve levar em consideração o efeito da
política fiscal sobre a previsão para a infla-
ção. Por outro lado, a política fiscal também
deve, em geral, dar apoio à meta de inflação.
Um estoque excessivo da dívida pública pode
gerar expectativas de inflações futuras que,
por sua vez, por tornar mais difícil ao banco
14. Aparentemente isto ocorreu nos estágios iniciais
do regime de metas no Canadá e na Nova Zelândia.
Em ambos os casos, o novo regime foi introduzido
quando o estoque da dívida pública era bastante alto
(mais de 60% e de 50%, ao final dos anos 80, respec-
tivamente). O endividamento existente pode ter au-
mentado o custo do processo desinflacionário em am-
bos os casos, ao minar a credibilidade do esforço de-
sinflacionário, resultando em apertos monetários.
15. O arcabouço atualmente vigente na Nova Zelân-
dia enfatiza a distinção entre independência de objeti-
vos e de instrumentos. Neste país, o Reserve Bank of
New Zeland Act, aprovado em 1989, estabeleceu que
um Policy Target Agreement deve ser pactuado entre o
central o cumprimento da meta no curto
prazo. Por sua vez, uma taxa de juros mais
elevada também pode aumentar o serviço da
dívida pública, aumentando o estoque já
existente, resultando em um círculo vicioso
de maior taxa de juros e maior dívida.14
Operacionalização de um Regime
de Metas de Inflação
Anúncio da Meta
A indicação da autoridade responsável pela
meta inflacionária está correlacionada com a
independência do banco central. Esta inde-
pendência não precisa estar relacionada
com a liberdade para a escolha de seus pró-
prios objetivos. Na verdade, argumenta-se
mesmo que pode ser mais apropriado para o
banco central ser dependente, no que diz
respeito aos objetivos (no sentido de que es-
tes são definidos no seu estatuto ou pelo go-
verno), mas ser independente no tocante à
escolha dos instrumentos, ou seja, não ter
restrições na operacionalização da política
monetária necessária para se atingir os obje-
tivos.15
O divulgador da meta varia entre os países.
Em alguns casos (Austrália, Finlândia e Sué-
cia), a meta foi primeiramente divulgada pelo
Governador do Bank e o ministro da Fazenda. Este
acordo define a implementação na prática do objetivo
primário do Bank, qual seja, a estabilidade dos preços.
O conteúdo do acordo é negociado entre o governo e
o Bank e é assinado ao início do mandato de cada Go-
vernador do Bank e permanece em vigor durante o
mandato (de cinco anos); o cumprimento da meta in-
flacionária é o mais importante critério de performance
do contrato de emprego do Governador. O acordo pode
ser anulado para períodos de seis meses, mas a anu-
lação deve ser tornar pública. Esta estrutura é seme-
lhante ao incentive-compatible contracts referidos na
literatura sobre a independência do Banco Central.
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DELTA ECONOMICS & FINANCE 9
banco central, sem qualquer apoio explícito
pelo governo. Em outros (Canadá e Nova Ze-
lândia), a meta resultou de acordos conjun-
tos entre o ministro da Fazenda e o Governa-
dor do banco central. Nos casos onde a meta
foi originalmente anunciada pelo banco cen-
tral, na maioria dos casos ela foi subsequen-
temente apoiada pelo governo.16
Uma meta de inflação não é explicitada em
nenhum dos estatutos dos principais bancos
centrais do mundo. Ao contrário, os bancos
centrais que adotam metas justificam-na
como uma interpretação operacional do ob-
jetivo último a ser buscado, qual seja, a es-
tabilidade da moeda. Dado o trade-off de
curto prazo corporificado na Curva de Phillips
de curto prazo, aqueles bancos centrais cu-
jos objetivos incluem o pleno emprego e pe-
quena inflação podem ser vistos como arbi-
trando em favor de um ou outro objetivo.
Neste sentido, como observado por Debelle
(1997) "[...] central banks have stressed that
there is no long run trade-off between output
and inflation and that the best way that the
central bank can assist the achievement of
higher growth in the long run is to maintain a
low inflation rate".
Nível de Preços ou Taxa de Inflação
Uma discussão fundamental em um regime
de metas de inflação refere-se à escolha en-
tre uma meta para o nível de preços ou uma
para a taxa de inflação. Os argumentos teó-
ricos a favor do primeiro são os mais aceitos,
o que levou à adoção, na prática deste tipo
de meta. O problema seguinte que se coloca
refere-se à escolha do índice de preços utili-
zado para a fixação da meta.17
16. Na Austrália, um comunicado conjunto foi feito
em 1996 pelo novo Governador do Banco Central e
pelo Tesouro, formalmente apoiando o arcabouço de
metas inflacionárias. O governo anterior havia apoiado
o arcabouço em inúmeras outras oportunidades.
Em geral, a prática tem sido especificar a
meta em termos do IPC, ou alguma variante,
ao invés do deflator implícito do PIB, apesar
desse último ser muito mais amplo, por dois
motivos básicos. Primeiro, o IPC é o índice
mais conhecido do público em geral e, se-
gundo, por estar disponível tempestivamente
e não estar sujeito a revisões.
Diversos países usam uma medida da infla-
ção subjacente (underlying) baseada no IPC,
ao invés daquele publicado, ou headline IPC.
O motivo de se utilizar uma taxa de inflação
subjacente é excluir da taxa de inflação de-
terminantes não-monetários. Na prática, a
mensuração da inflação subjacente (core)
exclui os efeitos de primeira ordem de cho-
ques específicos (e que são, portanto, aco-
modados pela política monetária), mas não
os efeitos de segunda ordem desses cho-
ques sobre preços e salários (e que são re-
vertidos por um aperto da política monetá-
ria).
Em muitos países a principal diferença entre
o IPC e a inflação subjacente é que esta úl-
tima exclui o pagamento de juros hipotecá-
rios. O motivo é que se o banco central res-
ponde a um aumento acima da metade da
taxa de inflação esperada elevando as taxas
de juros de curto prazo, a inflação medida
pelo IPC irá aumentar ainda mais com o au-
mento das taxas hipotecárias. O componente
do IPC afetado pela variação no custo das
hipotecas pode ser facilmente identificado,
além do que a taxa expurgada deste custo é
frequentemente publicada pelas agências
responsáveis pela apuração da inflação. Em
outros países, incluindo os Estados Unidos,
17. Sabe-se que esta escolha reflete as metodolo-
gias alternativas para se mensurar o Índice de Preço
ao Consumidor (IPC) entre os países e a sensibilidade
relativa do IPC a choques de oferta.
C U R R E N T I S S U E S
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DELTA ECONOMICS & FINANCE 10
este problema é evitado tratando-se os juros
no IPC de maneira diferente.
A adoção de metas de inflação pelos bancos
centrais torna ainda mais importante a esti-
mativa acurada e confiável de variações em
índices agregados de preços. Essa estimativa
é bastante difícil, na medida em que a esti-
mativa do IPC apresenta ruídos transitórios e
viés. O primeiro faz com que mudanças de
curto prazo na inflação reflitam inadequada-
mente movimentos de longo prazo, enquanto
que o viés faz com que a inflação média de
longo prazo seja muito elevada.
Horizonte da Meta
A experiência internacional sugere que o ho-
rizonte da meta de inflação depende, parci-
almente, da taxa de inflação no momento da
adoção da meta. Nos países onde a taxa ini-
cial diferia daquela estabelecida na meta, o
período de implementação foi de aproxima-
damente dois anos, dados os hiatos dos efei-
tos da política monetária sobre a inflação.
Naqueles países onde a inflação já era baixa,
as metas foram adotadas imediatamente e
por prazo indefinido. O horizonte da meta
também reflete a capacidade da política mo-
netária compensar desvios de choques de
curto prazo.
Nível da Meta
Para muitos países o ponto médio da meta
de inflação reflete, em geral, a respectiva de-
finição operacional de estabilidade dos pre-
ços. Do ponto de vista teórico, uma inflação
pode ser vista como equivalente à estabili-
dade dos preços, mas, na prática, o conceito
de estabilidade é impactado por questões
como medição e rigidezes nominais.
O viés no cálculo do índice de preços ao con-
sumidor implica que, na prática, a estabili-
dade dos preços, muito provavelmente, es-
tará associada à uma inflação positiva no IPC
do que à uma inflação zero. Esse viés resulta
da introdução de novos bens, viés de substi-
tuição, viés de qualidade e aqueles causados
por ajustes pelos consumidores devido a mu-
danças em preços relativos entre as redefini-
ções periódicas na cesta básica de consumo.
Esses problemas são endêmicos ao cálculo
de índices de preços e, geralmente, não po-
dem ser remediados pela agência responsá-
vel pelo cálculo.
Outros argumentos também foram propostos
para justificar uma meta de inflação maior do
que zero. Primeiro, a possibilidade de rigidez
para baixo nos preços e salários implica em
que uma inflação positiva baixa permite o
ajuste necessário dos preços relativos. Se-
gundo, na medida em que o limite inferior
das taxas nominais de juros é zero, uma
meta de inflação de zero implica em que a
possibilidade de taxas de juros reais negati-
vas é eliminada (o que pode ser necessário
para estimular a recuperação econômica em
uma recessão). Ambos argumentos podem
ter sido motivados pela elevada inflação dos
anos 70 e 80.
Em geral, as metas de inflação estão centra-
das ao redor de uma taxa de 2% ao ano. A
este nível, exista esparsa evidência empírica
de que os benefícios de se buscar uma meta
ainda mais baixa sejam significativos, mas os
custos podem ser relevantes. O benefício
mais importante parece derivar da redução
da incerteza e de uma taxa de inflação mais
estável, independentemente do nível, desde
que seja suficientemente baixo.
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DELTA ECONOMICS & FINANCE 11
Largura da Banda da Meta
Uma diferença importante entre as defini-
ções de metas inflacionárias nos países é a
largura da banda em torno da central target,
ou mesmo se a banda é especificada. Na de-
terminação dessa banda é importante levar
em consideração o fato de que uma banda
estreita pode induzir instabilidade no instru-
mento da política monetária. Para se alcan-
çar um dado movimento na taxa da inflação,
quanto menor o período de tempo, maior a
variação no instrumento da política monetá-
ria.
Se a banda é muito estreita, um aumento na
taxa de juros para coibir o aumento da infla-
ção acima da banda em um trimestre pode
ser maior do que o necessário para prevenir
a queda da inflação abaixo da banda no pró-
ximo trimestre. Esses movimentos nas taxas
de juros podem desestabilizar os mercados
financeiros, mesmo que a meta de inflação
continue a ser atendida. Além disso, as osci-
lações necessárias nas taxas de juros para
manter a inflação dentro da banda podem
ser explosivas ao invés de amortecidas ao
longo do tempo.
Alternativamente, a variação necessária na
taxa de inflação pode ser induzida por mu-
danças na taxa de câmbio. Isso pode permitir
que a meta de inflação seja alcançada mais
facilmente no curto prazo, dependendo da
velocidade do passthrough da taxa de câm-
bio. No entanto, um apoio sistemático na
taxa de câmbio pode causar conflitos em se
alcançar a meta de inflação no curto e médio
prazo. A variação nas taxas de juros neces-
sárias para induzir o movimento apropriado
na taxa de câmbio no curto prazo, pode cau-
sar um movimento não desejado na de-
manda doméstica e na inflação no médio
prazo. Um problema adicional é que pode
existir um impacto distributivo não desejado
nos setores de bens comerciáveis e não-co-
merciáveis caso muito confiança seja colo-
cada na taxa de câmbio, especialmente se a
fonte de inflação está no setor de bens não-
comerciáveis. A valorização da taxa de câm-
bio, mesmo reduzindo a taxa de inflação dos
bens importados irá reduzir a competitivi-
dade das exportações e do setor substituto
das importações.
Previsão da Taxa de Inflação
Segundo Debelle (1997) existem diversos
critérios que justificam uma previsão de in-
flação como o fundamento de um arcabouço
de meta inflacionária. Um arcabouço para
previsão satisfatório deve existir. É preciso
que se tenha dados históricos suficientes
para se estimar relações confiáveis. Além
disso, essas relações devem ser suficiente-
mente estáveis no novo regime. Pode ser di-
fícil para o banco central acordar sobre o mo-
delo com base no qual as previsões serão
feitas. O princípio fundamental é que as de-
cisões de política monetária devem basear-
se em uma projeção para a trajetória futura
da inflação apesar dessa expectativa não
precisar estar baseada em um modelo em
particular. Ao contrário, ela pode resumir in-
formações de fontes distintas.
No entanto, Debelle (1997) observou que,
na prática, a previsão de inflação de um de-
terminado modelo pode ser apenas um input
na decisão da política monetária. Outras in-
formações também devem ser utilizadas
mesmo se não puderem ser diretamente in-
corporadas no modelo de previsão da infla-
ção. O apoio em previsões de inflação le-
vanta o problema de erros de previsão, que
também são relevantes na especificação da
banda da meta.
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DELTA ECONOMICS & FINANCE 12
Modelo Econométrico
Uma das principais dificuldades na operacio-
nalização de um regime de metas de inflação
diz respeito à formulação e, posteriormente,
calibração do modelo econométrico para a
economia. O pressuposto é que o banco cen-
tral tenha um modelo para a projeção da tra-
jetória das principais variáveis macroeconô-
micas e que o utilize na estimativa os impac-
tos decorrentes da adoção de determinado
instrumento de política monetária.
Transparência e Accountability
Uma outra questão fundamental associada à
adoção de um regime de metas de inflação
é a transparência e accountability.18
O mo-
tivo é que a atribuição de uma meta de infla-
ção ao banco central define um benchmark
claro e facilmente mensurável que serve para
se avaliar a performance do banco. Qualquer
violação da banda da meta ou desvio signifi-
cante do nível desejado devem requerer uma
explicação detalhada pelo banco central. No
passado, os objetivos do banco central eram
relativamente gerais, implicando em dificul-
dades para se avaliar a sua performance. Os
bancos não podiam ser responsáveis pela
busca de inúmeros, e potencialmente confli-
tantes, objetivos.
Na medida em que exista um hiato relevante
entre os instrumentos de política monetária
e o objetivo final para a inflação, pode ser
difícil determinar se uma violação da meta foi
causada por erros de política ou devido a
choques fora do controle do banco central.
Um outro problema em usar metas de infla-
ção como medida para a accountability de-
corre dos longos e variáveis hiatos da política
monetária. Os efeitos de qualquer política
18. Accountability entendida aqui como o dever ou
responsabilidade de prestar contas.
não podem ser avaliados em um prazo infe-
rior a um ano, ou talvez mais. Uma maneira
de se contornar esse problema é usar a pre-
visão de inflação como uma medida.
Em geral, os bancos centrais que adotam
metas de inflação são diretamente accoun-
table ao governo. Testemunhos frequentes
ao Parlamento (ou Congresso) e a publica-
ção de relatórios anuais têm sido os princi-
pais mecanismos utilizados por eles para as-
segurar a transparência das metas e a sua
accountability.
Referências
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Practice, IMF Working Paper n° 35,
March.
Dixit, Avinash K. e Luisa Lambertini (2003):
Interactions of Commitment and Discre-
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tary Policy, American Economic Review,
vol 58, n° 1, March, pg 1-17.
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flation May Be Costly: Evidence from
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E. Hall (ed.), Inflation: Causes and Effects,
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Press.
C U R R E N T I S S U E S
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DELTA ECONOMICS & FINANCE 13
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Mishkin, Frederic S. e Adam S. Posen
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NBER Working Paper n° 5579, February.
Phillips, A. W. (1958): The Relation between
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(eds.) Reducing Inflation: Motivation and
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Rudebusch, Gleen D. e Lars E. O. Svensson
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Big Inflations, em Robert E. Hall (ed.) In-
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nois: University of Chicago Press.
Svensson, Lars E. O. (1998): Inflation Tar-
geting as a Monetary Policy Rule, NBER
Working Paper n° 6790, November.
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Luiz Nelson Porto Araujo, economista, é sócio-diretor da Delta Economics & Finance. Foi Professor do
Departamento de Planejamento e Análise Econômica da EAESP-FGV e da FCECA da Universidade Macken-
zie.
As opiniões expressas nesse estudo são de responsabilidade exclusiva do(s) autor(es) e não expressam,
necessariamente, a opinião da Delta Economics & Finance.
Sobre a Delta
Fundada em 2000, a Delta é uma empresa brasileira de consultoria econômica e financeira. Nossa missão
é oferecer soluções de qualidade aos nossos clientes mediante um compromisso com ética, inovação,
trabalho em equipe, alianças estratégicas e capacidade analítica.
Disponibilizamos sofisticadas soluções em Desenvolvimento Local & Logística, Estratégia & Operações, Fi-
nanças Corporativas e Regulação Econômica. O diferencial destas soluções está na utilização de modernos
métodos analíticos.
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automotivo, bancário, construção, energético, imobiliário, óleo e gás, petroquímico, transportes e saúde.
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CI - 2003 - fundamentos teóricos de metas de inflação

  • 1. CURRENT ISSUES Abril 2003 volume 3 número 1 Fundamentos Teóricos de Metas de Inflação Luiz Nelson Porto Araujo O Brasil, como outros países – desenvolvidos e em desenvolvimento – adota um regime monetário baseado na definição, ex-ante, de uma trajetória para a taxa de inflação. A operacionalização deste regime tem as seguintes características: (i) anúncio da meta, (ii) escolha entre o nível de preços ou a taxa de inflação, (iii) horizonte da meta, (iv) nível da meta, (v) largura da banda da meta, (vi) precisão da taxa de inflação, (vii) modelo econométrico utilizado para as projeções e (viii) transparência e accountability da autoridade monetária. Introdução Dentro das recentes modificações da política econômica no Brasil, o Banco Central do Brasil (BACEN) anunciou, em 1999, a sua disposição em adotar uma política monetária baseada na definição ex-ante de uma traje- tória para a taxa de inflação. Esta trajetória irá condicionar os instrumentos de política monetária a serem utilizados pelo BACEN.1 A decisão que fundamentou essa disposição decorre diretamente da percepção das auto- ridades econômicas de que uma baixa e es- tável taxa inflacionária deve ser buscada como condição sine qua non para a reto- 1. A literatura sobre este tema é bastante extensa. Para maiores detalhes ver, por exemplo, Debelle mada do processo de desenvolvimento sus- tentado do país. Neste sentido, ela reafirma a proposição de que a complicada experiên- cia de transição do regime do padrão-ouro para a administração discricionária de papel- moeda não conversível levou à crença, quase geral, de que a estabilidade dos preços é o mais importante objetivo da política monetá- ria. A adoção de metas de inflação (inflation targeting) é uma indicação explícita desta crença. Em teoria, uma meta de inflação pode ser definida sem maiores dificuldades. O Banco (1997), Fischer (1993), McCallum (1998), Rudebusch et al. (1998) e Svensson (1998).
  • 2. C U R R E N T I S S U E S __________________________________________________________________________________ DELTA ECONOMICS & FINANCE 2 Central faz previsões sobre a trajetória da in- flação; essas previsões são comparadas com a meta; a diferença entre a previsão e a meta define os ajustes necessários nos instrumen- tos de política monetária. Na prática, essas metas foram inicialmente introduzidas como âncora para a política monetária da Nova Ze- lândia, em março de 1990, e do Canadá, em fevereiro de 1991. No entanto, foi apenas nos últimos cinco anos que inúmeros outros países basearam as suas respectivas políti- cas monetárias em metas inflacionárias. Desde então, o estudo e a avaliação destas políticas cresceram exponencialmente, ao ponto do FMI estar recomendando a sua adoção. Fundamentos Teóricos Trade-Off entre Inflação e Desemprego: A Curva de Phillips Em geral, a análise de políticas monetárias baseadas em metas de inflação resgata dis- cussões anteriores sobre o trade-off entre in- flação e desemprego (ou produção). Na ver- dade, pode-se mesmo dizer que a existência de um trade-off de curto prazo entre estas variáveis é fundamental nas decisões dos formuladores da política monetária. A discussão econômica sobre a existência de um trade-off entre inflação e desemprego pode ser analisada ao longo de três períodos consecutivos. O primeiro iniciou-se com o ar- tigo de Phillips (1958) sobre o comporta- mento das taxas de desemprego e os salá- rios nominais na Inglaterra. O segundo perí- odo teve como marco fundamental a formu- 2. Phillips encontrou diversos loops entre estas va- riáveis e não uma relação linear estável. 3. Ou, então, assumiram expectativas estáticas. lação da hipótese da taxa natural de desem- prego por Friedman (1968) e Phelps (1967). O último período está associado com a intro- dução da hipótese de expectativas racionais e a aceitação, quase generalizada, de que não existe um trade-off que possa ser explo- rado pela autoridade econômica. Apesar da investigação inicial de Fischer (1926) da relação negativa entre inflação e desemprego, foi somente após a publicação do estudo de Phillips (1958) que ela ganhou relevância nos círculos acadêmicos e políti- cos. A principal observação de Phillips foi a existência de uma correlação inversa signifi- cativa entre as taxas de desemprego e de va- riação do salário nominal na Inglaterra. O pe- ríodo analisado por Phillips compreendeu quase um século e, portanto, não deveria causar surpresa o fato de que os resultados aparentemente indicavam um trade-off, no qual os benefícios de uma menor inflação se- riam contrapostos em termos de uma maior taxa de variação do salário nominal, que po- deria ser explorado pelo governo.2 O segundo período inicia-se com a formula- ção da hipótese da taxa natural de desem- prego por Friedman (1968) e Phelps (1967) e com os primeiros estudos sobre os funda- mentos microeconômicos da macroecono- mia. Ao contrário de Phillips (e, posterior- mente, Lipsey (1960)), que não levaram em consideração o papel das expectativas dos agentes e encontraram uma relação aparen- temente estável,3 Friedman e Phelps questi- onaram exatamente esta suposta estabili- dade sob condições de mudanças nas ex- pectativas.4 4. Em termos mais gerais, a crítica destes autores chamou atenção para o processo de formação das ex- pectativas, que seria ainda mais relevante nas análises de Lucas e Sargent sobre a curva de Phillips.
  • 3. C U R R E N T I S S U E S __________________________________________________________________________________ DELTA ECONOMICS & FINANCE 3 A discussão dos loops encontrados por Phil- lips sugere que o trade-off de curto prazo di- fere daquele de longo prazo. A distinção en- tre ambos forma a base da Natural Rate Hypothesis (NRH) de Friedman (1968) e Phelps (1971): apesar de existir um trade-off no curto prazo, existe também uma taxa na- tural de desemprego no longo prazo, taxa essa independente da taxa de inflação no es- tado estacionário. A implicação da NRH é que a curva de Phillips no longo prazo é ver- tical, ou seja, o trade-off é nulo; este trade-off só existe no curto prazo. A proposição fundamental é que o trade-off de curto prazo resulta de erros de expectativa por parte dos agentes econômicos, ou seja, são esses erros que permitem à taxa de de- semprego diferir da taxa natural. Friedman e Phelps argumentam contra a suposição de que é possível enganar todos os trabalhado- res e firmas o tempo todo. Tanto os trabalha- dores quanto as firmas barganham por salá- rios reais e, dessa forma, a taxa natural de desemprego é independente da taxa de in- flação antecipada. A existência de um trade-off de curto prazo decorrente de erros de expectativa não im- pede, por si só, qualquer efeito da política monetária sobre o produto, desde que as au- toridades monetárias sejam capazes de gerar uma taxa de inflação que não seja anteci- pada. Na verdade, o uso de expectativas adaptadas sugere que uma aceleração da taxa de inflação seria capaz de manter a taxa de desemprego abaixo da taxa natural. Este corolário da NRH, conhecido como a versão aceleracionista da curva de Phillips, foi suge- rido por Friedman, mas foi Phelps quem o demonstrou rigorosamente: se um aumento da taxa de inflação somente reduz a taxa de 5. Ou seja, as expectativas inflacionárias são ajus- tadas de acordo com o hiato entre a inflação observada e a esperada. desemprego de forma temporária, então, a única forma de se manter essa taxa perma- nentemente abaixo da taxa natural é por meio de um aumento contínuo, a taxas cres- centes, da inflação, ou seja, acelerando-se a taxa de inflação. O terceiro período de análise da curva de Phillips iniciou-se a partir da percepção de que, na formulação de Friedman-Phelps, a diferença entre a curva de curto prazo e a de longo prazo é uma consequência lógica da suposição de que as expectativas são forma- das de acordo com esquemas adaptativos.5 O problema é que a hipótese de expectativas adaptadas implica, primeiro, que os agentes cometem erros sistemáticos de previsão (as expectativas são viesadas) e, segundo, que o conjunto de informação utilizado pelos agentes é incompleto, na medida em que só compreende valores passados dos preços; em outras palavras, novas informações são desperdiçadas. Neste período, foi introduzida a hipótese de expectativas racionais, que destruiu até mesmo o trade-off da curva de Phillips de curto prazo. Na formulação de Robert Lucas, e outros, uma política monetária previsível não tem qualquer efeito sobre o nível do produto, na medida em que o setor privado leva em con- sideração esta política e ajusta as suas ex- pectativas de acordo, e, portanto, não existe a possibilidade de um hiato sistemático entre a taxa de inflação observada e a esperada. É importante ressaltar que um modelo com ex- pectativas racionais também explicita uma curva de Phillips. No entanto, há uma dife- rença fundamental deste caso em relação à formulação de Friedman-Phelps: desvios sis- temáticos entre a taxa de inflação observada
  • 4. C U R R E N T I S S U E S __________________________________________________________________________________ DELTA ECONOMICS & FINANCE 4 e a esperada não podem derivar de mudan- ças na oferta de moeda destinadas a alterar a taxa de desemprego. Se a taxa de cresci- mento da oferta de moeda aumenta, e os agentes sabem disto, então eles irão rever suas expectativas de inflação. Em conse- quência, a curva de Phillips desloca-se. As- sim que o trade-off é explorado por qualquer política econômica sistemática ele desapa- rece, ou seja, no caso das expectativas se- rem racionais até mesmo a curva de curto prazo é instável. Custo da Estabilização Uma das questões mais controversas na lite- ratura econômica teórica e empírica refere- se ao custo de bem-estar da estabilização.6 Suponha que em um certo instante o go- verno tenha por objetivo reduzir a variabili- dade de um conjunto de variáveis macroeco- nômicas.7 A pergunta, aparentemente sim- ples, que se coloca é a seguinte: qual o custo de se adotar uma política de estabilização? A simplicidade da pergunta esconde a volu- mosa controvérsia sobre eventuais respos- tas, controvérsia esta decorrente, em grande parte, da inexistência de modelos comu- mente aceitos que, em última instância, per- mitam a quantificação destes custos. Hall (1982) editou os resultados do Projeto sobre Inflação do National Bureau of Econo- mic Research. A preocupação fundamental era diagnosticar as causas da inflação e des- crever os seus efeitos.8 Os estudos de Gor- don (1982) e Sargent (1982), então relata- dos, apresentam um forte contraste. Apesar 6. Em geral, este custo é medido em termos dos níveis de produção e de emprego. 7. A razão e a determinação endógena do instante de tal decisão são irrelevantes para os fins da discus- são a seguir, apesar de fundamentais na adoção prá- tica de políticas de estabilização. 8 O Projeto não teve como foco a recomendação de políticas específicas para o término da inflação. de ambos terem analisado episódios históri- cos sobre o término da inflação chegaram a conclusões dramaticamente distintas à per- gunta: o que aconteceria com a produção e o emprego se a inflação fosse eliminada? Gordon (1982) analisou 14 episódios (Ale- manha, Brasil, Estados Unidos, França, Is- rael, Itália, Japão e Suíça), sendo seis ape- nas nos Estados Unidos, e concluiu que o término da inflação pode impactar negativa- mente a produção e o emprego. No entanto, os seus resultados não são unânimes, ou seja, nem sempre o término da inflação tem efeitos adversos sobre o emprego.9 Sua aná- lise concentrou-se na velocidade e extensão da resposta da taxa de inflação a mudanças temporárias e permanentes na taxa de cres- cimento do produto nominal. Sargent (1982) estudou o final de quatro hi- perinflações (Alemanha, Áustria, Hungria e Polônia) no período entre as duas Grandes Guerras e concluiu que a passagem de um período de instabilidade para um de estabili- dade foi imediata, e que os custos da esta- bilização em termos de emprego foram insig- nificantes. Ele mostrou que reformas fiscais do tipo once-and-for-all foram fundamentais para o controle da inflação em cada dos qua- tro episódios. A evidência coletada por ele sugere que as características comuns de cada um dos países foram: (i) a natureza do regime fiscal durante cada uma das hiperin- flações. Cada um dos países apresentou dé- ficits públicos persistentes e gigantescos; (ii) a natureza das medidas fiscais e monetárias, 9. Gordon relatou que o término da inflação nos Es- tados Unidos após a Primeira Grande Guerra foi acom- panhado de uma recessão bastante suave. A Alema- nha também teve sucesso com políticas de combate à inflação ao longo dos anos 70. Também a França e a Itália, em meados dos anos 60, e o Japão, ao final dos anos 70, conseguiram controlar a inflação sem uma recessão profunda.
  • 5. C U R R E N T I S S U E S __________________________________________________________________________________ DELTA ECONOMICS & FINANCE 5 compreensivas e drásticas, que foram adota- das para terminar as hiperinflações; (iii) a imediação com a qual o nível de preços e a taxa de câmbio foram estabilizados e (iv) o rápido crescimento da base monetária nos meses e anos que sucederam ao término da inflação. Recentemente, Lucas (1987) sugeriu um modelo teórico que, apesar de simples, busca responder à pergunta central. A partir de dados para a economia Americana, no período pós Segunda Guerra Mundial, ele es- tima os parâmetros do modelo e, então, in- daga quanto um agente representativo esta- ria disposto a pagar em termos do seu nível de consumo, em cada período, para obter: (i) um aumento na taxa de crescimento do consumo e (ii) uma redução na variabilidade do componente cíclico em relação à tendên- cia. Apesar da primeira indagação envolver valores substanciais, no caso da segunda eles são inesperadamente pequenos. A con- clusão de Lucas é que o ganho de bem-estar derivado de uma redução da variabilidade do consumo agregado através de políticas de estabilização é, provavelmente, insignifi- cante. Em outras palavras, no período anali- sado o ciclo econômico não é importante do ponto de vista do bem-estar social.10 Regras para a Política Monetária Em geral, aceita-se que regras de política monetária convencionais baseadas em me- tas intermediárias, como o crescimento da moeda ou do crédito, fundamentam-se na premissa de que as relações que ajustam es- sas variáveis aos indicadores relevantes do setor não-financeiro, como renda e preços, são robustas. Quando os mercados financei- ros se alteram e perturbam essas relações, as regras baseadas em metas intermediárias 10. Mais ainda, os benefícios marginais de se desen- volver tal teoria são potencialmente insignificantes. não são mais capazes de fornecer um refe- rencial útil para a condução da política mo- netária. Nestas circunstâncias, o banco cen- tral pode, ao invés, se valer de variáveis como a moeda e o crédito como variáveis- informação. Isso irá exigir, inevitavelmente, julgamentos caso-a-caso. Quanto maior for o impacto das alterações nos mercados finan- ceiros, maior será a necessidade de o banco central valer-se de outras informações, ex- tensamente, no sentido de tirar proveito de fontes múltiplas e diversas de informações ao invés de uma única variável, e intensa- mente, no sentido de permitir menos tempo entre as decisões de política. Instituições e Política Monetária Romer e Romer (1997) demonstraram que as deficiências da política monetária derivam não apenas de inconsistência dinâmica, mas, mais importante, de uma compreensão imperfeita da economia e dos efeitos da po- lítica. Utilizando-se de episódios históricos e recentes para os Estados Unidos e outros pa- íses, eles demonstram que o conhecimento parcial dos economistas, formuladores de política, líderes políticos e dos eleitores têm sido uma fonte importante de deficiências da política monetária. Estes autores analisam quais as instituições da política monetária poderiam tratar os problemas da inconsis- tência dinâmica do conhecimento limitado e sugerem que um conjunto de instituições que poderia realizar este feito é um banco central significativamente independente com discrição sobre os objetivos e a conduta da política, combinado com uma estrutura em dois níveis onde os líderes eleitos indicaram um conselho de trustees para o banco cen- tral o qual, por sua vez, escolhem os formu- ladores da política. Finalmente, Romer e Ro- mer também discutem reformas e propostas
  • 6. C U R R E N T I S S U E S __________________________________________________________________________________ DELTA ECONOMICS & FINANCE 6 de reformas da política monetária e das ins- tituições em países industrializados. Coordenação das Políticas Monetária e Fiscal A coordenação de políticas é um dos temas mais analisados na moderna teoria econô- mica.11 Considerando que o sistema econô- mico é dinâmico e complexo, sendo influen- ciado por inúmeros fatores sob constante al- teração – o que o torno instável – a coorde- nação de políticas é uma necessidade. No entanto, o uso específico dos instrumen- tos de políticas públicas, sejam setoriais ou regulatória, dado que são operados por dife- rentes autoridades – muitas vezes com obje- tivos, recursos e pontos fracos e fortes dis- tintos – é um imperativo. Uma das maneiras de se obter esta coorde- nação é através da troca de informações en- tre os formuladores destas políticas, com foco nas estratégias, efeitos e medidas dos instrumentos disponíveis em cada um dos casos. Na literatura, o problema de coorde- nação mais estudado é aquele que envolve as políticas monetária e fiscal. Banco Central Os primeiros bancos centrais foram instituí- dos com o propósito de financiar o governo e contribuir para o desenvolvimento do sistema financeiro. Ao longo do século XIX eles pas- saram a ter como atribuição primária prote- ger a estabilidade do sistema financeiro e o valor externo da moeda. Ao longo das déca- das de 30 e 40, no período inicial da revolu- ção keynesiana, as atribuições conferidas aos bancos centrais, geralmente, incluíam a estabilidade monetária e a promoção do 11. Para maiores detalhes ver, por exemplo, Laurens e La Piedra (1998) e Dixit e Lambertini (2003). pleno emprego. A partir de meados dos anos 60, com o fortalecimento das pressões infla- cionárias que acabaram por destruir o sis- tema de Bretton Woods, o foco da política monetária foi redefinido como a manutenção do valor doméstico da moeda. Atualmente, os bancos centrais exercem inúmeras atri- buições, dentre elas:  a administração da oferta de moeda e de crédito e determinação das taxas de juros, através do controle da base mo- netária; o controle, exclusivo ou compar- tilhado, da taxa de câmbio e das reser- vas internacionais;  o depósito das reservas compulsórias e voluntárias dos bancos comerciais;  a responsabilidade pela promoção da estabilidade do sistema financeiro, atra- vés da supervisão do sistema, da sua atuação como emprestador de última instância e, em alguns casos, da gestão do seguro depósito;  a atuação como banco do tesouro e, em alguns casos, a administração total ou parcial da dívida pública. De todas essas, a administração da oferta de moeda e de crédito - a política monetária - é fundamental, ao conferir ao banco central um poder enorme, particularmente nas situ- ações em que a independência do banco é tal que ele também fixa as taxas de juros. Na prática, a experiência internacional mos- tra uma grande disparidade na fixação dos objetivos do Banco Central. Na Alemanha, por exemplo, o Bundesbank deve conduzir a política monetária com o objetivo de preser- var a moeda. Além disso, ele também deve apoiar a política econômica do governo fede- ral, mas apenas na medida em que seja con- sistente com o seu objetivo primordial de preservar a moeda. Na França, a lei confere
  • 7. C U R R E N T I S S U E S __________________________________________________________________________________ DELTA ECONOMICS & FINANCE 7 ao Banque de France a tarefa de assegurar a estabilidade dos preços, no contexto da po- lítica econômica do governo. Esse mandato é similar àquele do Bundesbank, exceto a provisão de que o mandato para a estabili- dade dos preços sobrepõe a obrigação de apoiar a política econômica do governo. Por sua vez, na Inglaterra, o Bank of England Act de 1946 não estabeleceu nenhum obje- tivo específico. No caso da Nova Zelândia, o Reserve Bank of New Zeland Act de 1989 determinou que "the primary function of the Bank is to formulate and implement mone- tary policy directed to the economic objective of achieving and maintaining stability in the general level of prices." Nos Estados Unidos, o Federal Reserve deve "maintain long-run growth of the monetary and credit aggregates commensurate with the economy's long run potential to increase production, so as to promote effectively the goals of maximum employment, stable prices, and moderate long-term interest rates".12 Por último, vale a pena ressaltar que no âmbito da EMU foi definido The European System of Central Banks (ESCB), formado pelo European Central Bank e os bancos centrais dos países membros da EMU. O Ar- ticle 105(1) do Tratado de Maastricht es- tabeleceu que "the primary objective of the ESCB shall be to maintain price stability. Without prejudice to the objective of price stability, the ESCB shall support the general economic policies in the Community with a view to contributing to the achievement of the objectives of the Community [...]". A partir do início dos anos 70, com o colapso do Sistema de Bretton Woods, a condução 12. Este é o objetivo da política monetária definida no Humphrey-Hawkings Act de 1978. da política monetária foi alterada em diver- sos países desenvolvidos e emergentes. Essa alteração contemplou, em particular, os ar- ranjos institucionais desta política, com a de- legação de maior independência aos bancos centrais. O objetivo foi a proteção da autori- dade monetária de interferências na escolha dos instrumentos de política monetária e na busca da estabilidade dos preços. Uma maior independência da autoridade monetá- ria significa que ela não precisa comprome- ter o objetivo de estabilidade dos preços a favor de outros objetivos conflitantes de curto prazo, como o equilíbrio do balanço de paga- mentos e das contas públicas. Meta de Inflação como um Arcabouço para a Política Monetária Dentre os diversos motivos encontrados na literatura econômica para a adoção de metas de inflação, dois são particularmente rele- vantes: i) uma nova ênfase na estabilidade dos preços como o objetivo fundamental da política monetária; e ii) proposições teóricas que argumentam que um comprometimento crível a um objetivo de inflação - por exem- plo, uma meta - pode eliminar o potencial viés inflacionário da política monetária. O objetivo fundamental da política monetária em um regime de meta inflacionária é o cum- primento da meta fixada. Neste sentido, qualquer outro objetivo só pode ser procu- rado se não for inconsistente com a meta. Os principais casos usualmente discutidos na literatura envolvem: i) meta e taxa de câmbio; ii) meta e pleno emprego e iii) meta e estabilidade financeira. Um regime de meta inflacionária não é con- sistente com um regime de câmbio fixo.13 13. Na verdade, muitos países que adotaram um re- gime de metas inflacionárias o fizeram para substituir um regime de câmbio fixo.
  • 8. C U R R E N T I S S U E S __________________________________________________________________________________ DELTA ECONOMICS & FINANCE 8 Dado que a política monetária é endógena sob um regime de câmbio fixo, geralmente não é possível fixar como meta (no médio prazo) uma taxa de inflação, ao contrário do caso de um país onde a moeda local é atre- lada à uma outra. Da mesma maneira, um objetivo de pleno emprego não é, em geral, inconsistente com uma meta de inflação. O problema, neste caso, é que a assunção da existência de um trade-off entre inflação e emprego pode induzir a autoridade monetá- ria a incluir na sua função objetivo o nível de produção (ou de emprego) e, em consequên- cia, influir na política monetária ótima. O mesmo acontece com um regime de meta inflacionária e um objetivo de estabilidade fi- nanceira (geralmente buscado por bancos centrais): não são necessariamente incom- patíveis, apesar de um sistema bancário frá- gil poder comprometer a grau de flexibilidade da taxa de juros. Por último, é importante também ressaltar a interação entre os objetivos das políticas mo- netária e fiscal em um regime de meta infla- cionária. Operacionalmente, a política mone- tária deve levar em consideração o efeito da política fiscal sobre a previsão para a infla- ção. Por outro lado, a política fiscal também deve, em geral, dar apoio à meta de inflação. Um estoque excessivo da dívida pública pode gerar expectativas de inflações futuras que, por sua vez, por tornar mais difícil ao banco 14. Aparentemente isto ocorreu nos estágios iniciais do regime de metas no Canadá e na Nova Zelândia. Em ambos os casos, o novo regime foi introduzido quando o estoque da dívida pública era bastante alto (mais de 60% e de 50%, ao final dos anos 80, respec- tivamente). O endividamento existente pode ter au- mentado o custo do processo desinflacionário em am- bos os casos, ao minar a credibilidade do esforço de- sinflacionário, resultando em apertos monetários. 15. O arcabouço atualmente vigente na Nova Zelân- dia enfatiza a distinção entre independência de objeti- vos e de instrumentos. Neste país, o Reserve Bank of New Zeland Act, aprovado em 1989, estabeleceu que um Policy Target Agreement deve ser pactuado entre o central o cumprimento da meta no curto prazo. Por sua vez, uma taxa de juros mais elevada também pode aumentar o serviço da dívida pública, aumentando o estoque já existente, resultando em um círculo vicioso de maior taxa de juros e maior dívida.14 Operacionalização de um Regime de Metas de Inflação Anúncio da Meta A indicação da autoridade responsável pela meta inflacionária está correlacionada com a independência do banco central. Esta inde- pendência não precisa estar relacionada com a liberdade para a escolha de seus pró- prios objetivos. Na verdade, argumenta-se mesmo que pode ser mais apropriado para o banco central ser dependente, no que diz respeito aos objetivos (no sentido de que es- tes são definidos no seu estatuto ou pelo go- verno), mas ser independente no tocante à escolha dos instrumentos, ou seja, não ter restrições na operacionalização da política monetária necessária para se atingir os obje- tivos.15 O divulgador da meta varia entre os países. Em alguns casos (Austrália, Finlândia e Sué- cia), a meta foi primeiramente divulgada pelo Governador do Bank e o ministro da Fazenda. Este acordo define a implementação na prática do objetivo primário do Bank, qual seja, a estabilidade dos preços. O conteúdo do acordo é negociado entre o governo e o Bank e é assinado ao início do mandato de cada Go- vernador do Bank e permanece em vigor durante o mandato (de cinco anos); o cumprimento da meta in- flacionária é o mais importante critério de performance do contrato de emprego do Governador. O acordo pode ser anulado para períodos de seis meses, mas a anu- lação deve ser tornar pública. Esta estrutura é seme- lhante ao incentive-compatible contracts referidos na literatura sobre a independência do Banco Central.
  • 9. C U R R E N T I S S U E S __________________________________________________________________________________ DELTA ECONOMICS & FINANCE 9 banco central, sem qualquer apoio explícito pelo governo. Em outros (Canadá e Nova Ze- lândia), a meta resultou de acordos conjun- tos entre o ministro da Fazenda e o Governa- dor do banco central. Nos casos onde a meta foi originalmente anunciada pelo banco cen- tral, na maioria dos casos ela foi subsequen- temente apoiada pelo governo.16 Uma meta de inflação não é explicitada em nenhum dos estatutos dos principais bancos centrais do mundo. Ao contrário, os bancos centrais que adotam metas justificam-na como uma interpretação operacional do ob- jetivo último a ser buscado, qual seja, a es- tabilidade da moeda. Dado o trade-off de curto prazo corporificado na Curva de Phillips de curto prazo, aqueles bancos centrais cu- jos objetivos incluem o pleno emprego e pe- quena inflação podem ser vistos como arbi- trando em favor de um ou outro objetivo. Neste sentido, como observado por Debelle (1997) "[...] central banks have stressed that there is no long run trade-off between output and inflation and that the best way that the central bank can assist the achievement of higher growth in the long run is to maintain a low inflation rate". Nível de Preços ou Taxa de Inflação Uma discussão fundamental em um regime de metas de inflação refere-se à escolha en- tre uma meta para o nível de preços ou uma para a taxa de inflação. Os argumentos teó- ricos a favor do primeiro são os mais aceitos, o que levou à adoção, na prática deste tipo de meta. O problema seguinte que se coloca refere-se à escolha do índice de preços utili- zado para a fixação da meta.17 16. Na Austrália, um comunicado conjunto foi feito em 1996 pelo novo Governador do Banco Central e pelo Tesouro, formalmente apoiando o arcabouço de metas inflacionárias. O governo anterior havia apoiado o arcabouço em inúmeras outras oportunidades. Em geral, a prática tem sido especificar a meta em termos do IPC, ou alguma variante, ao invés do deflator implícito do PIB, apesar desse último ser muito mais amplo, por dois motivos básicos. Primeiro, o IPC é o índice mais conhecido do público em geral e, se- gundo, por estar disponível tempestivamente e não estar sujeito a revisões. Diversos países usam uma medida da infla- ção subjacente (underlying) baseada no IPC, ao invés daquele publicado, ou headline IPC. O motivo de se utilizar uma taxa de inflação subjacente é excluir da taxa de inflação de- terminantes não-monetários. Na prática, a mensuração da inflação subjacente (core) exclui os efeitos de primeira ordem de cho- ques específicos (e que são, portanto, aco- modados pela política monetária), mas não os efeitos de segunda ordem desses cho- ques sobre preços e salários (e que são re- vertidos por um aperto da política monetá- ria). Em muitos países a principal diferença entre o IPC e a inflação subjacente é que esta úl- tima exclui o pagamento de juros hipotecá- rios. O motivo é que se o banco central res- ponde a um aumento acima da metade da taxa de inflação esperada elevando as taxas de juros de curto prazo, a inflação medida pelo IPC irá aumentar ainda mais com o au- mento das taxas hipotecárias. O componente do IPC afetado pela variação no custo das hipotecas pode ser facilmente identificado, além do que a taxa expurgada deste custo é frequentemente publicada pelas agências responsáveis pela apuração da inflação. Em outros países, incluindo os Estados Unidos, 17. Sabe-se que esta escolha reflete as metodolo- gias alternativas para se mensurar o Índice de Preço ao Consumidor (IPC) entre os países e a sensibilidade relativa do IPC a choques de oferta.
  • 10. C U R R E N T I S S U E S __________________________________________________________________________________ DELTA ECONOMICS & FINANCE 10 este problema é evitado tratando-se os juros no IPC de maneira diferente. A adoção de metas de inflação pelos bancos centrais torna ainda mais importante a esti- mativa acurada e confiável de variações em índices agregados de preços. Essa estimativa é bastante difícil, na medida em que a esti- mativa do IPC apresenta ruídos transitórios e viés. O primeiro faz com que mudanças de curto prazo na inflação reflitam inadequada- mente movimentos de longo prazo, enquanto que o viés faz com que a inflação média de longo prazo seja muito elevada. Horizonte da Meta A experiência internacional sugere que o ho- rizonte da meta de inflação depende, parci- almente, da taxa de inflação no momento da adoção da meta. Nos países onde a taxa ini- cial diferia daquela estabelecida na meta, o período de implementação foi de aproxima- damente dois anos, dados os hiatos dos efei- tos da política monetária sobre a inflação. Naqueles países onde a inflação já era baixa, as metas foram adotadas imediatamente e por prazo indefinido. O horizonte da meta também reflete a capacidade da política mo- netária compensar desvios de choques de curto prazo. Nível da Meta Para muitos países o ponto médio da meta de inflação reflete, em geral, a respectiva de- finição operacional de estabilidade dos pre- ços. Do ponto de vista teórico, uma inflação pode ser vista como equivalente à estabili- dade dos preços, mas, na prática, o conceito de estabilidade é impactado por questões como medição e rigidezes nominais. O viés no cálculo do índice de preços ao con- sumidor implica que, na prática, a estabili- dade dos preços, muito provavelmente, es- tará associada à uma inflação positiva no IPC do que à uma inflação zero. Esse viés resulta da introdução de novos bens, viés de substi- tuição, viés de qualidade e aqueles causados por ajustes pelos consumidores devido a mu- danças em preços relativos entre as redefini- ções periódicas na cesta básica de consumo. Esses problemas são endêmicos ao cálculo de índices de preços e, geralmente, não po- dem ser remediados pela agência responsá- vel pelo cálculo. Outros argumentos também foram propostos para justificar uma meta de inflação maior do que zero. Primeiro, a possibilidade de rigidez para baixo nos preços e salários implica em que uma inflação positiva baixa permite o ajuste necessário dos preços relativos. Se- gundo, na medida em que o limite inferior das taxas nominais de juros é zero, uma meta de inflação de zero implica em que a possibilidade de taxas de juros reais negati- vas é eliminada (o que pode ser necessário para estimular a recuperação econômica em uma recessão). Ambos argumentos podem ter sido motivados pela elevada inflação dos anos 70 e 80. Em geral, as metas de inflação estão centra- das ao redor de uma taxa de 2% ao ano. A este nível, exista esparsa evidência empírica de que os benefícios de se buscar uma meta ainda mais baixa sejam significativos, mas os custos podem ser relevantes. O benefício mais importante parece derivar da redução da incerteza e de uma taxa de inflação mais estável, independentemente do nível, desde que seja suficientemente baixo.
  • 11. C U R R E N T I S S U E S __________________________________________________________________________________ DELTA ECONOMICS & FINANCE 11 Largura da Banda da Meta Uma diferença importante entre as defini- ções de metas inflacionárias nos países é a largura da banda em torno da central target, ou mesmo se a banda é especificada. Na de- terminação dessa banda é importante levar em consideração o fato de que uma banda estreita pode induzir instabilidade no instru- mento da política monetária. Para se alcan- çar um dado movimento na taxa da inflação, quanto menor o período de tempo, maior a variação no instrumento da política monetá- ria. Se a banda é muito estreita, um aumento na taxa de juros para coibir o aumento da infla- ção acima da banda em um trimestre pode ser maior do que o necessário para prevenir a queda da inflação abaixo da banda no pró- ximo trimestre. Esses movimentos nas taxas de juros podem desestabilizar os mercados financeiros, mesmo que a meta de inflação continue a ser atendida. Além disso, as osci- lações necessárias nas taxas de juros para manter a inflação dentro da banda podem ser explosivas ao invés de amortecidas ao longo do tempo. Alternativamente, a variação necessária na taxa de inflação pode ser induzida por mu- danças na taxa de câmbio. Isso pode permitir que a meta de inflação seja alcançada mais facilmente no curto prazo, dependendo da velocidade do passthrough da taxa de câm- bio. No entanto, um apoio sistemático na taxa de câmbio pode causar conflitos em se alcançar a meta de inflação no curto e médio prazo. A variação nas taxas de juros neces- sárias para induzir o movimento apropriado na taxa de câmbio no curto prazo, pode cau- sar um movimento não desejado na de- manda doméstica e na inflação no médio prazo. Um problema adicional é que pode existir um impacto distributivo não desejado nos setores de bens comerciáveis e não-co- merciáveis caso muito confiança seja colo- cada na taxa de câmbio, especialmente se a fonte de inflação está no setor de bens não- comerciáveis. A valorização da taxa de câm- bio, mesmo reduzindo a taxa de inflação dos bens importados irá reduzir a competitivi- dade das exportações e do setor substituto das importações. Previsão da Taxa de Inflação Segundo Debelle (1997) existem diversos critérios que justificam uma previsão de in- flação como o fundamento de um arcabouço de meta inflacionária. Um arcabouço para previsão satisfatório deve existir. É preciso que se tenha dados históricos suficientes para se estimar relações confiáveis. Além disso, essas relações devem ser suficiente- mente estáveis no novo regime. Pode ser di- fícil para o banco central acordar sobre o mo- delo com base no qual as previsões serão feitas. O princípio fundamental é que as de- cisões de política monetária devem basear- se em uma projeção para a trajetória futura da inflação apesar dessa expectativa não precisar estar baseada em um modelo em particular. Ao contrário, ela pode resumir in- formações de fontes distintas. No entanto, Debelle (1997) observou que, na prática, a previsão de inflação de um de- terminado modelo pode ser apenas um input na decisão da política monetária. Outras in- formações também devem ser utilizadas mesmo se não puderem ser diretamente in- corporadas no modelo de previsão da infla- ção. O apoio em previsões de inflação le- vanta o problema de erros de previsão, que também são relevantes na especificação da banda da meta.
  • 12. C U R R E N T I S S U E S __________________________________________________________________________________ DELTA ECONOMICS & FINANCE 12 Modelo Econométrico Uma das principais dificuldades na operacio- nalização de um regime de metas de inflação diz respeito à formulação e, posteriormente, calibração do modelo econométrico para a economia. O pressuposto é que o banco cen- tral tenha um modelo para a projeção da tra- jetória das principais variáveis macroeconô- micas e que o utilize na estimativa os impac- tos decorrentes da adoção de determinado instrumento de política monetária. Transparência e Accountability Uma outra questão fundamental associada à adoção de um regime de metas de inflação é a transparência e accountability.18 O mo- tivo é que a atribuição de uma meta de infla- ção ao banco central define um benchmark claro e facilmente mensurável que serve para se avaliar a performance do banco. Qualquer violação da banda da meta ou desvio signifi- cante do nível desejado devem requerer uma explicação detalhada pelo banco central. No passado, os objetivos do banco central eram relativamente gerais, implicando em dificul- dades para se avaliar a sua performance. Os bancos não podiam ser responsáveis pela busca de inúmeros, e potencialmente confli- tantes, objetivos. Na medida em que exista um hiato relevante entre os instrumentos de política monetária e o objetivo final para a inflação, pode ser difícil determinar se uma violação da meta foi causada por erros de política ou devido a choques fora do controle do banco central. Um outro problema em usar metas de infla- ção como medida para a accountability de- corre dos longos e variáveis hiatos da política monetária. Os efeitos de qualquer política 18. Accountability entendida aqui como o dever ou responsabilidade de prestar contas. não podem ser avaliados em um prazo infe- rior a um ano, ou talvez mais. Uma maneira de se contornar esse problema é usar a pre- visão de inflação como uma medida. Em geral, os bancos centrais que adotam metas de inflação são diretamente accoun- table ao governo. Testemunhos frequentes ao Parlamento (ou Congresso) e a publica- ção de relatórios anuais têm sido os princi- pais mecanismos utilizados por eles para as- segurar a transparência das metas e a sua accountability. Referências Debelle, Guy (1997): Inflation Targeting in Practice, IMF Working Paper n° 35, March. Dixit, Avinash K. e Luisa Lambertini (2003): Interactions of Commitment and Discre- tion in Monetary and Fiscal Policies, American Economic Review, vol 93, n° 5, pg 1522-1542. Fischer, Andreas (1993): Inflation Targeting: The New Zealand and Canadian Cases, Cato Journal, vol 13, n° 1, pg 1-27. Fischer, Irving (1926): A Statistical Relation between Unemployment and Price Changes, International Labor Review, vol 13, n° 6, June, 785-792. Friedman, Milton (1968): The Role of Mone- tary Policy, American Economic Review, vol 58, n° 1, March, pg 1-17. Gordon, Robert J. (1982): Why Stopping In- flation May Be Costly: Evidence from Fourteen Historical Episodes, em Robert E. Hall (ed.), Inflation: Causes and Effects, Chicago, Illinois: University of Chicago Press.
  • 13. C U R R E N T I S S U E S __________________________________________________________________________________ DELTA ECONOMICS & FINANCE 13 Hall, Robert E. (ed.) Inflation: Causes and Ef- fects, Chicago, Illinois: University of Chi- cago Press. Laurens, Bernard e Enrique G. de La Piedra (1998): Coordination of Monetary and Fiscal Policies, Working Paper n° 98-25, International Monetary Fund, March. Lucas, Robert E. Jr (1987): Models of Busi- ness Cycles, Oxford: Basil Blackwell. Mishkin, Frederic S. e Adam S. Posen (1998): Inflation Targeting: Lessons from Four Countries, NBER Working Paper n° 6126, February. McCallum, Bennett T. (1998): Inflation Tar- geting in Canada, New Zeland, Sweden, the United Kingdom, and in General, NBER Working Paper n° 5579, February. Phillips, A. W. (1958): The Relation between Unemployment and the Rate of Change of Money Wage Rates in the United King- dom, 1861-1957, Economica, vol 25, pg 283-294. Phelps, Edmund S. (1967): Phillips Curves, Expectations of Inflation and Optimal Un- employment over Time, Economica, vol 34, n° 135, August, pg 254-281. Phelps, Edmund S. et al. (eds.) (1971): Mi- croeconomic Foundations of Employment and Inflation Theory, London, UK: Macmil- lan. Romer, Christina D. e David H. Romer (1997): Institutions for Monetary Stability, em Christina D. Romer e David H. Romes (eds.) Reducing Inflation: Motivation and Strategy, Chicago, Illinois: University of Chicago Press. Rudebusch, Gleen D. e Lars E. O. Svensson (1998): Policy Rules for Inflation Target- ing, NBER Working Paper n° 6512, April. Sargent, Thomas J. (1982): The Ends of Four Big Inflations, em Robert E. Hall (ed.) In- flation: Causes and Effects, Chicago, Illi- nois: University of Chicago Press. Svensson, Lars E. O. (1998): Inflation Tar- geting as a Monetary Policy Rule, NBER Working Paper n° 6790, November.
  • 14. C U R R E N T I S S U E S __________________________________________________________________________________ DELTA ECONOMICS & FINANCE 14 Luiz Nelson Porto Araujo, economista, é sócio-diretor da Delta Economics & Finance. Foi Professor do Departamento de Planejamento e Análise Econômica da EAESP-FGV e da FCECA da Universidade Macken- zie. As opiniões expressas nesse estudo são de responsabilidade exclusiva do(s) autor(es) e não expressam, necessariamente, a opinião da Delta Economics & Finance. Sobre a Delta Fundada em 2000, a Delta é uma empresa brasileira de consultoria econômica e financeira. Nossa missão é oferecer soluções de qualidade aos nossos clientes mediante um compromisso com ética, inovação, trabalho em equipe, alianças estratégicas e capacidade analítica. Disponibilizamos sofisticadas soluções em Desenvolvimento Local & Logística, Estratégia & Operações, Fi- nanças Corporativas e Regulação Econômica. O diferencial destas soluções está na utilização de modernos métodos analíticos. Nossos profissionais possuem extensa experiência em vários setores de atividade econômica, dentre eles, automotivo, bancário, construção, energético, imobiliário, óleo e gás, petroquímico, transportes e saúde. Para maiores informações, visite nosso site: www.deltaef.com Disclaimer A Delta não realizou uma verificação independente das informações de fontes públicas (nacional e internacional) contidas nesses Documentos. A Delta e seus profissionais, direta ou indiretamente, não expressam nenhuma opinião, nem assumem qualquer responsabilidade pela veracidade, qualidade, suficiência, consistência ou completude de qualquer das informações e conclusões apresentadas em cada um dos Documentos, ou por qualquer omissão com relação a elas. As informações e conclusões de cada Documento refletem o julgamento do autor original quando da publicação, sem levar em conta a data em que o Usuário tomou conhecimento, e estão sujeitas a alteração sem aviso prévio. A Delta reserva-se o direito de modificar as informações e conclusões de cada Documento a qualquer momento sem aviso prévio, bem como de não as atualizar ou interrompê-las completamente. A Delta pode ter elaborado Documentos que consideram conceitos, hipóteses e métodos analíticos distintos e chegar a conclusões diferentes. Esses Documentos podem refletir diferentes conceitos, hipóteses e métodos analíticos dos profissionais que participaram da sua elaboração. Cada uma das conclusões não deve ser tomada como uma indicação, ou mesmo garantia, de conclusões futuras, e nenhuma representação ou garantia, expressa ou implícita, é dada em relação a conclusões futuras. Cada um desses Documentos é protegido por direitos autorais, sendo que copiar e/ou transmitir, no todo ou em parte, qualquer Documento sem autorização prévia e expressa da Delta implica em violação destes direitos. A Delta incentiva a divulgação do seu trabalho e, em geral, poderá conceder prontamente permissão para a cópia ou transmissão. © 2003 – all rights reserved Delta Economics & Finance