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FUNDAÇÃO GETULIO VARGAS
Programa FGV Management
MBA em Gestão de Sustentabilidade
SUSTENTABILIDADE NA FORMAÇÃO DO ADMINISTRADOR DE
EMPRESAS: ILUSÃO OU REALIDADE?
Cristine Zanarotti Prestes Rosa
São Paulo, 08 de março de 2013.
2
FUNDAÇÃO GETULIO VARGAS
Programa FGV Management
MBA em Gestão de Sustentabilidade
SUSTENTABILIDADE NA FORMAÇÃO DO ADMINISTRADOR DE
EMPRESAS: ILUSÃO OU REALIDADE?
Trabalho de Conclusão de Curso
apresentado ao MBA em Gestão de
Sustentabilidade, Pós-graduação lato sensu,
Nível de Especialização Programa FGV
Management.
Cristine Zanarotti Prestes Rosa
Professor Orientador: Jacques Demajorovic
São Paulo, 08 de março de 2013.
3
FUNDAÇÃO GETULIO VARGAS
Programa FGV Management
MBA em Gestão de Sustentabilidade
O Trabalho de Conclusão de Curso:
Sustentabilidade na formação do administrador de empresas: ilusão ou realidade?
Elaborado por: Cristine Zanarotti Prestes Rosa
e aprovado pela Coordenação Acadêmica do MBA em Gestão de Sustentabilidade, foi
aceito como requisito parcial para a obtenção do certificado de conclusão do curso de pós-
graduação, nível de especialização, do Programa FGV Management.
Data: 08 de março de 2013.
__________________________________
Prof. Dr. Mario Monzoni
4
Termo de Compromisso
A aluna Cristine Zanarotti Prestes Rosa, abaixo-assinada, do
MBA em Gestão de Sustentabilidade, do Programa FGV Management, realizado nas
dependências da instituição conveniada
Av. Paulista, 548, no período de abril de 2009 a julho de 2010, declara que o conteúdo do
trabalho de conclusão de curso
intitulado: Sustentabilidade na formação do administrador de empresas: ilusão ou realidade?
é autêntico, original, e de sua autoria exclusiva.
São Paulo, 08 de março de 2013.
(Assinaturas)
5
RESUMO
Os desafios e oportunidades que se apresentam à vida, ao bem-estar da sociedade e ao sucesso
dos negócios são de natureza global. Suas causas não se restringem a fatores isolados,
biológicos ou técnicos; revelam dimensões institucionais, sociais, culturais, ambientais,
políticas e econômicas, interdependentes.
O paradigma econômico está em xeque e é inegável o papel que as empresas representam hoje
nesse modelo. A educação é colocada como um meio para evoluir a consciência, o
conhecimento e oferecer novos caminhos.
Em um contexto em que a educação e as empresas são identificadas como chave para a
mudança, surge a pergunta: os administradores de empresa estão sendo preparados para lidar
com os complexos desafios da nossa era, de forma transformadora e propositiva? São
capacitados para criar valor sustentável? Os cursos de administração formam os futuros
profissionais para a sustentabilidade?
A educação para o desenvolvimento sustentável se mostra como uma proposta para repensar o
estilo de vida e de se fazer negócios. Questiona os modelos que marcaram a sociedade
moderna.
Mostra-se necessária uma mudança no relacionamento entre os seres humanos, demais seres
vivos, empresas e o meio ambiente. É preciso desenvolver conhecimentos, habilidades,
perspectivas e valores. As escolas de administração são chamadas a assumir um papel de
liderança e rever suas abordagens, seu currículo e suas práticas, tendo a sustentabilidade como
um valor transversal, independente da posição ou especialidade que o administrador irá
assumir.
Esse trabalho aborda o significado da educação para sustentabilidade no contexto da formação
do administrador de empresas, considerando que o conceito de desenvolvimento sustentável
ainda está em construção. Contempla forças externas às instituições de ensino superior que
incentivam e apoiam o movimento. Busca-se coletar e refletir sobre o que especialistas
colocam como características e requisitos da educação para o desenvolvimento sustentável e
como as escolas de administração têm inserido o tema no currículo. Não há receita, mas há
caminhos apontados por autores como facilitadores da sustentabilidade no ensino superior.
Palavras-chave: sustentabilidade, ensino superior, administrador, educação para
sustentabilidade.
6
AGRADECIMENTOS
À Caroline Zanarotti Prestes Rosa, Heloise Zanarotti, Luiz Edmundo Prestes Rosa e Rodrigo
Pascual Roncero pela dedicação, paciência e contribuições.
Aos autores estudados e todas as pessoas motivadas em fazer desse um mundo melhor para
todos.
A equipe de Desenvolvimento Sustentável do Santander e todos os parceiros envolvidos, que
com que paixão tem aberto espaço e se empenhado em contribuir para o avanço do tema.
7
SUMÁRIO
INTRODUÇÃO..........................................................................................................................8
CAPÍTULO 1 - EDUCAÇÃO PARA SUSTENTABILIDADE..............................................13
1.1. A sustentabilidade........................................................................................................13
1.2. A educação para sustentabilidade no contexto da formação do administrador de
empresas.......................................................................................................................15
CAPÍTULO 2 - FOMENTO À EDUCAÇÃO PARA SUSTENTABILIDADE NO ENSINO
DE ADMINISTRAÇÃO...........................................................................................................19
2.1 Principles for Responsible Management Education (PRME) ....................................20
2.2 Incentivo do mercado...................................................................................................23
CAPÍTULO 3: O NOVO PARADIGMA.................................................................................26
3.1 Abordagens que a educação para sustentabilidade propõe ..........................................28
3.2 Interdisciplinaridade......................................................................................................32
CAPÍTULO 4: COMO A SUSTENTABILIDADE É ABORDADA NO ENSINO DE
ADMINISTRAÇÃO.................................................................................................................35
CAPÍTULO 5: CAMINHOS PARA FACILITAR A INSERÇÃO..........................................44
5.1 Formação e valorização dos docentes...........................................................................45
5.2 Pesquisa.........................................................................................................................46
5.3 Engajamento e participação dos públicos de interesse.................................................48
CONCLUSÃO..........................................................................................................................51
BIBLIOGRAFIA......................................................................................................................56
8
INTRODUÇÃO
Sustentabilidade é um compromisso com valores e uma visão pragmática da condição da vida.
Esse ideário é construído à medida que se reconhece que premissas que nortearam a
organização da sociedade e a economia estavam equivocadas.
Uma delas é a concepção de que o meio ambiente é infinito ou substituível por tecnologia. A
tecnologia pode melhorar a eficácia do uso de recursos naturais, mas não eliminá-lo. Observe
o exemplo da tendência à virtualização, que ainda requer materiais e recursos minerais para
laptops, I-Pads, celulares, servidores e torres de transmissão.
Somos natureza. Nossa existência está atrelada a uma série de trocas com o meio ambiente:
respiração, alimentação, água. Serviços ambientais menos evidentes, como regulação do
clima e formação dos solos, são vitais para qualidade de vida e, em algumas situações, para
sobrevivência.
O sistema da vida é complexo e não linear. Uma teia delicada de inter-relações autorreguladas
em um sistema fechado: as trocas de matéria ocorrem sem que haja desperdícios ou entradas e
saídas relevantes da biosfera. Fazemos parte de um planeta único e finito, do qual
dependemos totalmente (CECHIN; VEIGA, 2010).
A economia, por outro lado, é um sistema aberto: depende de troca de matéria e energia com
o seu meio para girar. Porém, ensina-se o contrário, que a economia é o grande sistema e o
meio ambiente é sua parte, à disposição. É natural que as teorias econômicas não consigam
prever a destruição dos sistemas naturais como se observa hoje.
Evidências de que a economia está em conflito com a natureza são claras. Nos noticiários, o
colapso da pesca, a diminuição das florestas, a erosão do solo, as secas e enchentes, a
diminuição de água potável. O motivo? Foi criado um modelo econômico em conflito com o
sistema que o suporta e do qual depende (BROWN, 2009; CECHIN; VEIGA, 2010).
O modelo de crescimento e produção linear, baseado em processos de extração, produção,
consumo e descarte, não considera o funcionamento dos ecossistemas. Na natureza os
9
processos são cíclicos, não há lixo (IBGC, 2007). Um modelo linear não se sustenta no longo
prazo quando está submetido a uma lógica cíclica (BROWN, 2009).
A ciência aponta que, quando um subsistema funciona contra as regras do sistema a qual
pertence, faz com que ambos sofram, com o risco de colapso. É como uma doença no
organismo.
São muitos os avanços alcançados desde a revolução industrial, seja no campo da ciência,
medicina, tecnologia, produção e agricultura. No entanto, não é toda a humanidade que
desfruta de bem-estar. Parte da população observou progressos, enquantos muitos se
encontram presos em um sistema reprodutor de pobreza e desigualdade social, sem acesso a
educação e saúde de qualidade, em alguns casos até de direitos humanos (BANERJEE 2003;
STEIN, 2010).
A proposta não é negar ou desvalorizar o que foi conquistado, porém há de se admitir que o
paradigma hegemônico da produção econômica vive hoje uma profunda crise e que o modelo
empregado até aqui não oferece mais as respostas que precisamos (SEM, 1999 apud
CARREIRA, 2012). A humanindade chegou em um ponto de evolução que lhe permite
perceber que não estamos sendo capazes de intervir, corretamente, para resolver a gama de
problemas econômicos, sociais e ambientais que enfrentamos (STEIN, 2010) e tampouco
desenvolver senso de oportunidade frente a essa nova consciência que passa a emergir.
É inegável o papel que as empresas representam hoje nesse modelo. Para Hart (2006), à
medida que adentramos o novo século, as empresas se destacam como as instituições mais
poderosas do planeta. A realidade atual desafia as corporações a repensar a própria lógica
corporativa de se fazer negócios, não se baseando mais na busca exclusiva e exaustiva pelo
lucro, mas tentando compreender seu verdadeiro papel.
Sustentabilidade não é a negação do lucro e do valor econômico. A dimensão econômica é um
pilar fundamental, que jamais deve ser desconsiderado. O desenvolvimento sustentável
propõe que o econômico pode e deve ser equilibrado com valores sociais e ambientais. O
valor econômico-financeiro é um meio que visa e viabiliza a continuidade de bens e serviços
importantes, o bem-estar individual e social e que deve estar em equilíbrio com a natureza.
Não é um fim em si próprio.
10
Gadotti (2009) aponta a educação como meio para superarmos a crise civilizatória. Ele coloca
a educação para o desenvolvimento sustentável voltada para repensar o estilo de vida. É
necessária uma mudança na educação para compreendermos e mudarmos o relacionamento
entre os seres humanos, demais seres vivos e o planeta. É preciso desenvolver conhecimentos,
habilidades, perspectivas e valores que inspirem a percepção de que cada um de nós tem o
poder e a responsabilidade de introduzir mudanças positivas em escala global (UNESCO,
2005).
Sustentabilidade foi colocada como uma questão de valores porque instiga o questionamento
de pressupostos e modelos que marcaram a sociedade moderna até hoje, provocando um novo
balanceamento de princípios. É um compromisso com valores porque sugere um processo de
aprendizagem de como tomar decisões que consideram todas as formas de vida e o futuro a
longo prazo. Dá espaço para um novo sentido e propósito para indivíduos e sociedade.
É também uma visão pragmática porque demanda lidar com a realidade a partir do
entendimento de “regras inevitáveis” que estamos submentidos: às condições da vida na
Terra. Sugere um processo de aprendizagem que auxilie as pessoas a entenderem melhor o
mundo em que vivem, compreendendo a complexidade e interconexão das questões que
enfrentamos, para, a partir desse aprendizado, construir propostas para a sociedade e
economia. É um desafio porque incita que algumas soluções utilizadas até hoje, não estão em
consonância com essa nova visão. Por outro lado, provoca uma nova perspectiva muito
inspiradora e o aprendizado contínuo na busca por soluções1
aos problemas que temos.
Reconhecendo a importância da educação para a sustentabilidade, a Cúpula Mundial sobre o
Desenvolvimento Sustentável, que ocorreu em Johannesburgo em 2002, recomendou à
Assembléia Geral das Nações Unidas o estabelecimento da Década da Educação para o
Desenvolvimento Sustentável, definida entre os anos de 2005 e 2014.
Nesse contexto, em que as educação e as empresas tornam-se elementos chave para a
mudança, surge a pergunta: os administradores estão sendo preparados para lidar com os
complexos desafios da nossa era de forma transformadora e propositiva? Os cursos de
1
Por exemplo, saiba mais da biomimética. Referência: http://biomimicry.net/ (em inglês)
11
administração estão formando os futuros profissionais para a sustentabilidade? Em que
profundidade?
Para tentar responder as perguntas acima, buscou-se reunir diferentes pontos de vista de
pesquisadores, estudiosos, autores e instituições que têm se dedicado a essa temática.
Por exemplo, Sandra Lays Gathás Carvalho (2001), que conduziu uma pesquisa com 17
instituições de ensino superior brasileiras de renome, entrevistando 20 pessoas (15
coordenadores de curso, 2 diretores de curso, 1 vice-diretor e 2 professores). Seu objetivo era
discutir os significados de educação para sustentabilidade nas instituições de ensino superior e
sua implicação na formação de novos administradores. Ela também conduziu uma extensa
pesquisa de referencial teórico analisando as tendências mundiais no tema.
Duas publicações foram muito utilizadas. Elas são baseadas em estudos com universidades
signatárias do PRME (Principles for Responsible Management Education), iniciativa que será
explicada ao longo do trabalho. Uma delas é o Integrating Sustainability into Business
Schools – Analysis of 100 UN PRME Sharing Information on Progress (SIP) reports2
, de
Godemann et al (2011). Esse estudo dedicou-se a entender como a sustentabilidade está sendo
integrada em cem escolas internacionais de negócio que declaram seu compromisso com o
desenvolvimento do trabalho.
A outra publicação é The Inspirational Guide for the Implementation of PRME3
(PRME,
2012), lançada no 3º Fórum Global para a Educação em Gestão Responsável, na Conferência
das Nações Unidas em Desenvolvimento Sustentável (Rio+20) e no Fórum Rio+20 do Pacto
Global. O livro analisa os avanços do tema em instituições signatárias da iniciativa.
Além disso, também se buscou informações na UNESCO (2005) e estudiosos do tema como
Jacobi, Raufflet e Arruda (2011), Demajorovic e Silva (2012), que têm estudado e publicado
sobre a temática por muito tempo.
2 Integrando a Sustentabilidade nas Escolas de Negócio – Análise de 100 relatórios de compartilhamento de
progresso (SIP) do PRME da ONU (tradução nossa).
3 Guia motivacional para a implementação do PRME (tradução nossa).
12
No capítulo 01, educação para sustentabilidade, será abordada a discussão do conceito de
sustentabilidade e a importância de que os administradores sejam formados para esse
propósito.
No capítulo 02, serão apresentadas forças externas às instituições de ensino superior, que
fomentam e apoiam que os princípios do desenvolvimento sustentável sejam inseridos na
educação. Esse incentivo é relevante para a aceleração do movimento e reconhecimento de
sua importância.
Em seguida, no capítulo 03, será tratado o que representa o novo paradigma da educação para
sustentabilidade e o que requer em termos de abordagem de ensino.
No capítulo 04, será tratado como a sustentabilidade é abordada no ensino superior,
analisando as estratégias para inserção de sustentabilidade no currículo.
Para finalizar, no capítulo 05, abordaremos alguns caminhos apontados por autores como
facilitadores da sustentabilidade no ensino superior. Iremos refletir sobre o papel dos
docentes, da pesquisa e da participação dos públicos de relacionamento.
Sustentabilidade no ensino superior é um tema amplo. Como o foco é a formação do
administrador, a ênfase é no ensino. Trata-se de um estudo teórico-conceitual, sem pretensão
de abarcar o tema em sua totalidade. O objetivo do estudo é reunir diferentes pontos de vista a
respeito da temática, contribuir para reflexão e sobre possíveis caminhos.
13
CAPÍTULO 1 - EDUCAÇÃO PARA SUSTENTABILIDADE
Esse capítulo dedica-se a discussão do conceito de sustentabilidade e o que ele representa para
as empresas. Em seguida será abordada a importância da educação para a sustentabilidade na
formação do administrador de empresas.
1.1 A sustentabilidade
Sustentabilidade é um termo que abarca diversas definições, existe uma variedade de
expressões associadas ao tema (CARVALHO, 2011). De acordo com Holmberg e Sandbrook
(1992 apud BANERJEE, 2003), há mais de cem definições sobre desenvolvimento
sustentável.
O Relatório Brundtland, conhecido como “Nosso Futuro Comum”, fruto do encontro do
World Comission on Environment and Development4
, em 1987, é referência para a
conceituação do termo, embora provoque muita discussão e desacordo: desenvolvimento
sustentável é “aquele que atende às necessidades do presente sem comprometer a capacidade
das futuras gerações atenderem suas próprias necessidades” (WCED, 1987, p. 14, tradução
nossa).
Em 1994, John Elkington (2000) propôs o conhecido conceito do Triple Bottom Line. Bottom
line5
é um termo em inglês que se refere ao lucro, fazendo alusão à última linha dos
demonstrativos financeiros. O autor do famoso tripé da sustentabilidade sugere que as
empresas, além de se preocuparem com o desempenho financeiro, devem obter resultados
ambientais e sociais positivos, por isso Triple6
Bottom Line ou “3Ps”, como se tornou
conhecido (people, planet, profit7
). Nessa linha, as empresas devem buscar de forma
equilibrada a prosperidade econômica, a qualidade ambiental e a justiça social. Essa proposta
difundiu-se nas organizações porque tornou o conceito mais palpável ao ambiente dos
negócios.
4 Em português: Comissão Mundial sobre o Meio Ambiente e Desenvolvimento
5 “Linha de baixo” (tradução nossa)
6 Em português: triplo
7 Em português: pessoas, planeta e lucro
14
O debate e críticas sobre o conceito de sustentabilidade estão longe de terminar. Independente
das propostas de estudiosos e militantes de diversos campos, sustentabilidade ainda é um
conceito em construção. Porém, há um crescente consenso entre os estudiosos quanto suas
dimensões e sobre a “insustentabilidade da sociedade” atual (CARVALHO, 2011).
Existem pesquisadores e teóricos, que aprofundam e, por vezes, expandem8
a proposta de
Elkington. No entanto, convergem ao reconhecer que as dimensões ambientais, sociais e
econômicas são interdependentes e fundamentais no ideário de sustentabilidade, tendo a ética
e a responsabilidade como pano de fundo.
O desafio de equilibrar as dimensões sociais e ambientais, na busca pelo lucro, trouxe às
organizações um contexto mais diversificado do que antes, quando o foco era apenas o
resultado financeiro. O que já representa uma ruptura fundamental com o sistema capitalista,
que sempre considerou o crescimento econômico como o único objetivo de um
empreendimento (CARREIRA, 2010).
Pesquisadores, praticantes e especialistas concordam em que a sustentabilidade está ligada a
uma mudança de valores, que desde a Revolução Industrial. O paradigma econômico e a
cultura individualista da sociedade capitalista estão em xeque diante dos limites do planeta, o
que impõe a necessidade de desenhar um novo modelo de desenvolvimento. Por isso,
independente da definição utilizada, a proposta da sustentabilidade representa uma mudança
complexa na qual as empresas tem o papel protagonista, por estarem no centro do sistema
capitalista e ditarem regras de mercado, produção e consumo (CARREIRA, 2010).
Estamos diante de uma mudança cultural profunda que nos leva a rever a relação não só da
empresa, mas também dos indivíduos, com a sociedade e com o planeta. Novos valores
definem nova relação, a geração presente torna-se responsável por garantir condições de bem-
estar ambiental, social e econômico para futuras gerações. Isso implica em fazer com que as
pessoas que trabalham nas empresas percebam esses novos valores e os incorporem, de modo
a traduzi-los em processos, práticas e comportamentos éticos (CARREIRA, 2010).
8
Sachs (2008) e outros propõem outras dimensões, como a cultural, política, territorial, individual, etc.
15
Dessa forma, as escolas de negócio apresentam um papel fundamental na formação de líderes
que tenham a ousadia de mudar as empresas. É necessário que os estudantes sejam expostos a
reflexões éticas e sobre responsabilidades como cidadãos e profissionais. Formados para
serem conscientes do impacto de decisões, capazes de considerar dimensões sociais,
econômicas e ambientais de forma integrada. Hábeis para transformarem os desafios da
sociedade contemporânea em valor para negócios e para a sociedade, trabalhando por uma
economia global inclusiva e sustentável.
Antes de avançar para o próximo item, não se pode deixar de mencionar que também há uma
grande discussão sobre as diferenças entre sustentabilidade e desenvolvimento sustentável.
Sendo a primeira entendida por muitos como o “estado da arte” a ser alcançado e o segundo
como a “trilha” para chegar lá. Essa visão é suportada por Sterling (2001 apud CARVALHO,
2011), mas como não poderia deixar de ser, também gera polêmica. Nesse trabalho
sustentabilidade e desenvolvimento sustentável serão utilizados como sinônimos. Escolas de
negócio e faculdades de administração também serão consideradas equivalentes para se referir
ao ensino de administração e gestão no ensino superior.
No próximo item abordaremos a importância da educação para sustentabilidade para a
formação do administrador.
1.2 A educação para sustentabilidade no contexto da formação do administrador de
empresas
Segundo Stein (2010, p. 23), a educação para o desenvolvimento sustentável já era
reconhecida como condição necessária para a sobrevivência humana há mais de três décadas.
Ele cita que desde a Conferência das Nações Unidas, em junho de 1972, em Estocolmo, na
Suécia, o tema é colocado como relevante para a vida humana. Desde então, ocorreram
diversos eventos mundiais em que a Organização das Nações Unidas tratou a temática. Essa
ocorrência regular reforça que há uma evolução na consciência global da importância da
educação para atingir melhores condições de vida e sobrevivência.
Para Carvalho (2011), o atual cenário de insustentabilidade tem levado indivíduos,
pesquisadores, educadores, governos e organizações a crer que a educação para a
16
sustentabilidade deve ocupar um lugar central na vida econômica e social das nações. Ela cita
que na visão de diversos autores, como Huclke (1996), Sterling (2001), Orr (2004) e
McNamara (2010), a educação para sustentabilidade é propulsora de mudanças para o futuro
ambiental, social e econômico do planeta.
Um reconhecimento claro à importância da temática foi o estabelecimento da Década da
Educação para o Desenvolvimento Sustentável (de 2005 a 2014) pela Assembléia Geral das
Nações Unidas, em resposta à recomendação da Cúpula Mundial sobre o Desenvolvimento
Sustentável, em Johannesburgo, em 2002.
Para Jacobi, Raufflet e Arruda (2011), desde os anos 1990 há iniciativas internacionais e
nacionais para promover a sustentabilidade nas instituições de ensino superior. Mas, quando
tratamos do ensino de administração e das escolas negócio, o fenômeno é recente
(GODEMANN et al., 2011).
O tema ganhou destaque quando as empresas passaram a ser consideradas relevantes nas
diversas crises sociais, ambientais e financeiras dos últimos anos e acadêmicos e executivos
começaram a apontar a sustentabilidade como imperativa para a sobrevivência dos negócios e
da sociedade. Os escândalos financeiros expuseram o ensino da administração a críticas sob
diversos aspectos, como ser desvinculado da prática e treinar em uma perspectiva econômica,
às custas de abordagens mais integradas (GHOSHAL, 2005; MINTZBERG, 2004 apud
JACOBI; RAUFFLET; ARRUDA, 2011).
Reconheceu-se ser crucial que as escolas de administração assegurassem de forma proativa
que seus formandos fossem educados dentro dos parâmetros da ética e desafiados a integrar a
sustentabilidade em suas decisões (GODEMANN et al., 2011). Sendo necessário formar
administradores conscientes, que busquem decisões embasadas em variáveis econômicas,
sociais e ambientais, de forma equilibrada e comprometida com a construção de uma
sociedade mais sustentável (TELLES, 2011).
Diversos estudiosos corroboram esse entendimento. Para Carvalho (2011), percebe-se um
interesse crescente pela educação para sustentabilidade nas escolas de administração. Dentre
os motivos, está justamente o papel central na formação de uma nova geração de profissionais
capazes de pensar e agir por princípios que vão muito além das preocupações econômicas.
17
Stein (2010) defende que alinhar os cursos de administração de empresas às exigências de um
modelo de desenvolvimento sustentável tem potencial significativo para melhorar as
condições de sobrevivência no planeta. O ensino de administração visa a formação de
profissionais preparados para administrar organizações que têm impacto relevante no modelo
de desenvolvimento que adotamos.
Para Telles (2011), tendo em vista a problemática gerada pelas empresas, é urgente que seja
inserida na formação dos administradores a temática da sustentabilidade para que novas
gerações de líderes sejam desenvolvidas e empresas sejam conduzidas por gestores mais
conscientes.
Carvallho (2011) cita que segundo uma imensidade de autores, como Calder e Clugston
(2003), McNamara (2010), Rusinko e Sama (2010), Sheriberg (2002) e Sterling (2001), as
instituições de ensino superior são chamadas a tomar um papel de liderança e a servirem de
modelo na adoção e na instituição de práticas sustentáveis. As instituições de ensino superior
não devem apenas educar as futuras gerações para serem tomadores de decisão; têm papel
importante na trajetória para um futuro global mais sustentável (JACOBI; RAUFFLET;
ARRUDA, 2011).
Anacleto, Boszczowski e Fernandes (2009 apud CARVALHO, 2011) propõem que ainda que
a educação para a sustentabilidade perpasse por todos os graus de ensino. É na educação
superior que se observa uma grande expectativa quanto ao papel de inovar o sistema
educacional vigente, de modo a atrelar a formação acadêmica aos princípios do
desenvolvimento sustentável.
Surgem uma série de movimentos, pactos, iniciativas e incentivos para que as escolas de
administração e gestão se adaptem ou até mesmo se reinventem para atender as complexas
demandas da sociedade.
Antes de avançar para o próximo capítulo, é preciso marcar a distinção entre o que
chamaremos de educação de sustentabilidade e educação para sustentabilidade, o foco deste
trabalho. As duas são importantes e têm seu momento e seu papel. Entende-se educação de
sustentabilidade como educação sobre o tema da sustentabilidade, aquela para informar e
18
ensinar sobre o desenvolvimento sustentável e seus conteúdos relacionados. Uma educação
básica de sustentabilidade é premissa para a educação para sustentabilidade.
Esse trabalho está dedicado a tratar da educação dos futuros gestores para a sustentabilidade.
A educação para sustentabilidade busca criar as condições para que os alunos sejam capazes
de promover o desenvolvimento sustentável no desempenho de sua profissão, independente
de querer se tornar em um profissional da área de sustentabilidade. Trata-se da necessidade de
qualificar os alunos para um posicionamento crítico ante a crise socioambiental, da
transformação de hábitos e práticas sociais e da formação de uma cidadania em seu
significado mais abrangente (JACOBI; RAUFFLET; ARRUDA, 2011). A educação para
sustentabilidade não significa apenas entender os princípios básicos de sustentabilidade, mas
ser capaz refletir sobre eles e de incorporá-los no dia a dia.
A premissa que norteia o paradigma proposto é o diálogo de saberes que permita formar um
pensamento crítico, criativo e sintonizado com a necessidade de respostas para o futuro, capaz
de analisar as complexas relações entre os processos naturais e sociais e de atuar no ambiente
em uma perspectiva global, respeitando as diversidades socioculturais (JACOBI, 2005).
No próximo capítulo iremos abordar os diferentes incentivos e pressões que as instituições de
ensino superior têm recebido para educar para a sustentabilidade.
19
CAPÍTULO 2: FOMENTO À EDUCAÇÃO PARA SUSTENTABILIDADE NO
ENSINO DE ADMINISTRAÇÃO
Como visto no capítulo anterior, é necessário que os futuros administradores não sejam
apenas educados sobre sustentabilidade (princípios e temas); mas também para a
sustentabilidade, para que suas futuras decisões de negócios sejam propulsoras das inovações
necessárias para o desenvolvimento sustentável.
Nesse contexto, surgem iniciativas importantes para fomentar a sustentabilidade no ensino
superior. Elas vêm de todos os lados: iniciativa pública, de organizações não governamentais
(CARVALHO, 2011), inclusive das próprias instituições de ensino e do setor privado.
Para Jacobi, Raufflet e Arruda (2011), a adoção de novas teorias nos cursos de administração
surge na maioria das vezes de fora, de uma necessidade prática ou de uma demanda das
empresas.
Diversas organizações intergovernamentais e não governamentais começaram a promover o
debate e a divulgar declarações com o intuito de comprometer indivíduos, governos e
instituições. Cada vez mais faculdades passaram a aderir e ser signatárias de declarações de
compromisso com a sustentabilidade (CARVALHO, 2011). Wright (2004 apud CARVALHO
2011) afirma que mais de mil presidentes e vice-chanceleres de universidades já assinaram
algum tipo de declaração, como Halifax, Swansea, Copernicus Charter, Tailloires, Kyoto,
Lünerburg.
Entre as iniciativas, destacam-se os Principles for Responsible Management Education
(PRME) no campo de administração de empresas (JACOBI; RAUFFLET; ARRUDA, 2011),
que será abordado no próximo item.
Como mencionado anteriormente, o próprio mercado também é uma influência relevante, por
isso, em seguida ao PRME, também observaremos como as empresas são propulsoras desse
movimento.
A análise dessas forças se torna relevante porque a pressão para inserção de sustentabilidade
no ensino superior tem se mostrado ocorrer especialmente de “fora para dentro”. E quando de
20
“dentro para fora”, de iniciativas individuais de docentes pouco articuladas com o todo
institucional (JACOBI; RAUFFLET; ARRUDA, 2011). O estímulo externo estimula que o
tema ganhe relevância na instituição, sendo inserido de forma articulada e sistêmica, fruto de
um processo reflexivo.
2.1 Principles for Responsible Management Education (PRME)
Os Princípios para Educação Empresarial Responsável ou Princípios para Educação em
Gestão Responsável (PRME - Principles for Responsible Management Education), como
usualmente são traduzidos, foram lançados como uma reação à série de desafios que as
faculdades de administração enfrentam hoje e para auxiliá-las com as demandas da sociedade
por uma economia responsável. É uma iniciativa do Pacto Global da Organização das Nações
Unidas com a missão de defender e inspirar a educação para a gestão responsável, a pesquisa
e a liderança de ideias inovadoras (PRME, 2012, tradução nossa).
São seis princípios inspirados nos dez princípios do Pacto Global das Nações Unidas e
procuram estabelecer um processo de melhoria contínua entre as instituições de ensino de
administração para desenvolver uma nova geração de líderes de negócios, capazes de gerir as
complexas provocações impostas às empresas pela sociedade contemporânea.
Contando com as mais avançadas e consolidadas escolas de negócio e instituições do ensino
superior de todo o mundo, desde que foi lançado, o PRME cresceu e inclui mais de 400
signatários, que se comprometem com avanços estabelecidos pelos princípios (PRME, 2012).
Conforme declarado no site da iniciativa, a responsabilidade corporativa e a sustentabilidade
entraram no meio acadêmico, mas não foram inseridas no “mainstream9
” da educação. É
preciso estimular o olhar por novos horizontes e paradigmas.
Os princípios, portanto, são um chamado global para escolas de negócio de todo o mundo,
gradualmente, adaptarem seus currículos, pesquisa, aulas, metodologias e estratégias
9
Mainstream é um termo em inglês que pode ser entendido como um pensamento ou crença corrente da maioria
da população.
21
institucionais aos temas da responsabilidade social corporativa e sustentabilidade. São um
guia para qualquer instituição que queira incorporar sustentabilidade de forma sistêmica
(PRME, 2008, tradução nossa):
Princípio 1. Propósito: Nós vamos desenvolver as capacidades dos estudantes para serem
futuros geradores de valor sustentável para negócios e sociedade no geral e para trabalharem a
favor de uma economia global sustentável e inclusiva.
Princípio 2. Valores: Nós vamos incorporar nas nossas atividades acadêmicas e currículos os
valores da responsabilidade social global conforme apresentados em iniciativas
internacionais, como o Pacto Global da Organização das Nações Unidas.
Princípio 3. Método: Nós vamos criar moldes, materiais, processos e ambientes educacionais
que possibilitem experiências eficazes de aprendizado para liderança responsável.
Princípio 4. Pesquisa: Nós vamos nos engajar em pesquisas conceituais e empíricas que
melhorem nossa compreensão sobre o papel, a dinâmica e o impacto de empresas na criação
de valores de sustentabilidade social, ambiental e econômica.
Princípio 5. Parceria: Nós vamos interagir com administradores de empresas para ampliar
nosso conhecimento sobre desafios em cumprir responsabilidades sociais e ambientais e
explorar maneiras eficazes de enfrentá-los.
Princípio 6. Diálogo: Nós facilitaremos e apoiaremos diálogo e debate entre educadores,
empresas, governo, consumidores, mídia, organizações da sociedade civil e outros grupos
interessados e investidores (stakeholders) sobre questões críticas relacionadas à
responsabilidade e sustentabilidade social global.
Ao final da declaração dos princípios há um destaque, que Godemann et al. (2011) intitulam
de sétimo princípio: “nós entendemos que nossas próprias práticas organizacionais devem
servir de exemplo dos valores e atitudes que nós transmitimos aos nossos estudantes” (PRME,
2008, p.7, tradução nossa). A afirmação expressa a necessidade das práticas organizacionais
das universidades serem coerentes com o compromisso com a sustentabilidade. Os autores
22
afirmam que tem se tornado comum que as escolas de negócio reportem informações sobre a
integração da sustentabilidade em suas operações.
Para ganhar o status de signatária, as instituições de ensino se comprometem com avanços
direcionados pelos princípios, que por serem abrangentes carecem que as escolas encontrem
seus próprios caminhos para inseri-los em sua realidade.
A iniciativa do PRME, enquanto organização, oferece grupos de trabalho, estudos e
publicações, além de encontros para aprofundar a discussão e gerar compartilhamento de
experiências, como por exemplo, nos chamados Sharing Information on Progress (SIP)
reports10
. Como o nome diz, por meio desses relatórios, os signatários reportam seus esforços
e conquistas em relação aos princípios (PRME, 2012). Faremos referência a esse documento
como SIP ou relatório SIP ao longo desse trabalho.
O SIP tem dois objetivos: apoiar o compartilhamento de experiências e boas práticas entre os
signatários e interessados no tema e fornecer uma prestação de contas regular a todas as partes
interessadas. O relatório deve ser enviado a cada dois anos e é prerrogativa para ser
considerado signatário. As instituições são encorajadas a enviar anualmente e caso não
enviem no prazo de vinte e quatro meses, perdem o status de signatária.
Não exclusivamente, mas de forma complementar, ao longo desse estudo, analisaremos os
esforços das faculdades de administração em inserir sustentabilidade com base em dois
estudos que têm as escolas signatárias do PRME como base.
Um deles é o Integrating Sustainability into Business Schools – Analysis of 100 UN PRME
Sharing Information on Progress (SIP) reports11
, de Godemann et al (2011). Esse estudo
analisa criticamente o conteúdo dos cem primeiros relatórios SIP submetidos ao site do
PRME. Busca melhorar o entendimento de como a sustentabilidade está sendo integrada nas
escolas internacionais de negócio signatárias do PRME.
10 Podemos traduzir como Relatórios de Compartilhamento de Informações sobre o Progresso (tradução nossa)
11 Integrando a Sustentabilidade nas Escolas de Negócio – Análise de 100 relatórios de compartilhamento de
progresso (SIP) do PRME da ONU (tradução nossa).
23
O projeto faz parte do Leading Sustainable Development in Higher Education, uma iniciativa
da HEFCE – Higher Education Funding Council England, sendo resultado da colaboração do
International Centre for Corporate Social Responsibility, Nottingham University Business
School e do Centre for Business, Organisations and Society, University of Bath School of
Management. Seu objetivo é prover orientação para que as escolas de negócio comuniquem e
integrem sustentabilidade nos programas de educação, pesquisa, práticas e processos
organizacionais.
O segundo é de iniciativa do próprio PRME que lançou The Inspirational Guide for the
Implementation of PRME12
, em junho de 2012 no 3º Fórum Global para a Educação em
Gestão Responsável, na Conferência das Nações Unidas em Desenvolvimento Sustentável
(Rio+20) e no Fórum Rio+20 do Pacto Global (PRME, 2012). O livro analisa os avanços do
tema em instituições signatárias e busca uma implementação mais completa do PRME,
apontando exemplos vivos da aplicação dos Princípios nas escolas e universidades parceiras.
2.2 Incentivo do mercado
Como citado, não são apenas as organizações intergovernamentais e não governamentais que
incentivam a inserção de sustentabilidade no ensino superior. As empresas têm um papel
relevante.
O setor privado, ao ser cobrado pela sociedade para introduzir a sustentabilidade na forma de
fazer negócios, passou a demandar da Academia a formação de profissionais que lhes
auxiliem nesse processo. Essa é uma pressão muito importante porque as escolas de
administração estão atentas em atender às exigências do mercado.
Shriberg (2002, apud CARVALHO 2011) aponta que um dos fatores para que as faculdades
se tornem mais sustentáveis é aumentar as chances de seus estudantes conseguirem emprego,
uma vez que o interesse pela sustentabilidade tem aumentado cada vez mais no campo
empresarial.
12 Guia motivacional para a implementação do PRME (tradução nossa).
24
Carvalho (2011), que conduziu um estudo com coordenadores de curso de administração e
diretores de 17 instituições de ensino superior brasileiras de renome, constatou que há
preocupação entre eles de que o egresso seja preparado para enfrentar um mercado de
trabalho que já exige uma formação mais completa, multidimensional, que entende a
sustentabilidade como uma vantagem competitiva. Seu estudo leva a crer que quanto maior a
proximidade da instituição de ensino do mercado, maior a pressão para introduzir a
sustentabilidade no currículo.
Percebe-se, portanto, uma preocupação mercadológica por parte das instituições de ensino,
que demonstram interesse em inserir sustentabilidade para não perder competitividade
acadêmica.
Também se destacam iniciativas do setor empresarial que buscam incentivar e apoiar as
universidades, desenvolvendo iniciativas exclusivas para esse fim. As iniciativas do Banco
Santander Brasil são emblemáticas.
O Banco apresenta uma série de projetos de estímulo à sustentabilidade no ensino superior,
como os Prêmios Santander Universidades têm a sustentabilidade como requisito transversal
nos editais dos diferentes prêmios. O Desafio Santander de Sustentabilidade, em 2010, propôs
que os estudantes elaborassem projetos de inserção de sustentabilidade em suas universidades;
o objetivo era estimulá-los para o tema, desenvolver competências pessoais e profissionais e
propiciar uma oportunidade de vivenciarem a sustentabilidade na prática de forma
propositiva, entendendo que esse é um tema que fará parte de qualquer profissão que
assumam nos dias de hoje. Como os estudantes são uma importante força de promoção do
tema dentro de suas instituições, essa forma de estímulo se mostra positiva para influenciar as
instituições de ensino quanto ao tema.
Já o Santander Práticas de Educação para Sustentabilidade é um prêmio, que tem como
objetivo estimular a inserção de sustentabilidade de forma transversal no currículo obrigatório
dos cursos de graduação de economia e administração. A iniciativa incentivou, disseminou e
premiou casos práticos (experiências realizadas) de professores que inseriram sustentabilidade
no currículo obrigatório desses cursos.
25
Alinhado ao escopo desse estudo, a iniciativa privilegiou incentivar a educação para
sustentabilidade e não de sustentabilidade. O interessante da proposta é que não poderiam se
inscrever disciplinas eletivas e disciplinas cujo plano de ensino fosse focado em
sustentabilidade ou em temas como responsabilidade corporativa. A premissa é de que
sustentabilidade não pode ser uma disciplina isolada ou optativa; para promover uma
mudança de patamar quanto à consciência dos estudantes e torná-los líderes de negócios
sustentáveis, a temática precisa permear todas as disciplinas do currículo universitário.
O Banco declara a necessidade da formação de líderes de negócio com visão sistêmica e
capazes de promover um mercado mais próspero, inovador, justo e ambientalmente
equilibrado; apoiando e reconhecendo o papel estratégico das instituições de ensino superior.
No próximo capítulo discutiremos o novo paradigma que a educação para a sustentabilidade
representa.
26
CAPÍTULO 3 – O NOVO PARADIGMA
O novo paradigma provoca questionamentos: quais os pressupostos das teorias que
seguimos? Quais premissas sustentam nossa visão de mundo e a economia? Está correto
privilegiar o resultado para um pequeno grupo no curto prazo em detrimento de um resultado
negativo para todos no longo prazo? É ético gerar lucro para alguns às custas da
socialização de custos para todos? O crescimento econômico, de fato, gera desenvolvimento?
Quais são os critérios considerados no cálculo desse crescimento? Como os modelos
produtivos poderiam se estruturar para garantir que a natureza continue provendo recursos e
serviços tão importantes para a sociedade? Todos encontram no sistema atual a mesma
oportunidade de se desenvolverem e atenderem suas necessidades? É possível um negócio ou
sociedade triunfar por muito tempo em um ambiente que vai mal? Como nos sentimos em
conviver com a violência? Que espaços estamos criando para a diversidade e o
desenvolvimento das pessoas? Quais são as consequências de minhas ações ao seguir os
preceitos estabelecidos? Será que porque hoje são aceitos, são éticos? São alinhados com
meus valores? Eles promovem ou prejudicam a continuidade e qualidade da vida? Qual
nosso projeto de sociedade? E se criássemos negócios que contribuam para a sociedade em
sintonia com a natureza?Como eles seriam?
Além disso, se hoje se reconhece que os sistemas ecológicos, sociais e econômicos são
complexos e interdependentes, que conhecimentos e competências os profissionais precisam
desenvolver? A que tipo de experiências, reflexões, métodos e espaços precisam estar
expostos para desenvolvê-las? Que dilemas e oportunidades enfrentarão?
Esses são alguns questionamentos que o novo paradigma da sustentabilidade apresenta. Para
transformar a educação em ferramenta efetiva para a sustentabilidade é necessário fazer novas
perguntas, questionar os modelos mentais vigentes e confrontar como a educação pensa a
própria educação. Nota-se, como consenso entre os autores estudados, que o foco no
pensamento econômico tem prevalecido no currículo dos cursos de administração. Para que
outra concepção de educação, pautada pelo paradigma da sustentabilidade, possa se
estabelecer no âmbito global, é indispensável o questionamento e a mudança de valores e
crenças até então considerados paradigma dominante (TELLES, 2011; JACOBI;
RAUFFLET; ARRUDA, 2011).
27
A educação para sustentabilidade requer o desenvolvimento de novas competências, sendo
necessária uma mudança não apenas daquilo que se aprende, mas também no contexto e
forma como se aprende (JACOBI; RAUFFLET; ARRUDA, 2011).
Para Sterling (1996 apud CARVALHO, 2011), apenas com a mudança no paradigma da
educação será possível responder aos desafios atuais. A educação se torna parte do problema
quando, ao invés de ser um agente de mudança, encoraja o individualismo, estilos de vida e
padrões de consumo insustentáveis, de forma direta e sem questionamento. Se o paradigma
atual de crescimento econômico não for questionado, a educação estará se direcionando a
“insustentabilidade” (STEIN, 2010), mesmo que insira conteúdos do tema no currículo ou em
algumas práticas organizacionais.
A formação dos administradores tornou-se essencialmente técnica e fragmentada. Os
administradores são formados para enxergar os fenômenos organizacionais como eventos
independentes, incapazes de perceber a dinâmica sistêmica de funcionamento da sociedade
(LOPES, 2002 apud DEMAJOROVIC; SILVA, 2012, p 46), o que prejudica uma atuação
consciente e eficaz.
O novo paradigma exige compromissos mais profundos das escolas de administração. Torna-
se preciso reavaliar o objetivo da educação, demandando um reexame de seus fundamentos e
práticas (JACOBI; RAUFFLET; ARRUDA, 2011).
Para ser coerente com o novo propósito, os autores estudados concordam que uma
universidade deve integrar a sustentabilidade em todas suas dimensões e atividades, do
conteúdo das aulas, à forma de ensinar e à gestão das operações, como o currículo, pedagogia,
pesquisa, extensão, estrutura, gestão do campus, operações e práticas organizacionais, além
dos relacionamentos. Dialogar e se aproximar dos diversos públicos de interesse, realizar
parceiras com outros setores da sociedade, oferecer oportunidades para o envolvimento e
desenvolvimento dos estudantes, docentes, corpo administrativo e comunidade do entorno são
fundamentais.
Trata-se de uma mudança sistêmica, que requer uma transformação profunda e duradoura nas
políticas e práticas educacionais. Todas as dimensões se afetam mutuamente (CARVALHO,
2011).
28
Neste trabalho analisaremos o novo paradigma com foco na formação do administrador, no
ensino. Demais dimensões que não são foco, não serão aprofundadas; porém serão
mencionadas, já que quando a sustentabilidade é adotada como um princípio central, acaba
desencadeando mudanças em todos os níveis da instituição. A inserção desses valores, de
forma consistente e compreensível, no core da educação da administração resulta num
processo dinâmico de transformação. Significa uma mudança inter-relacionada de diferentes
frentes, já que a mudança em um aspecto leva à mudança em outro (PRME, 2012).
Escolheu-se o foco no ensino porque se entende que proporcionar oportunidades de
aprendizagem no currículo das instituições de ensino superior é de extrema relevância para
promover essas mudanças. Nota-se que, enquanto cresce o consenso de que os programas
educacionais precisam mudar para preparar os estudantes para o que encontrarão como
profissionais, a integração da sustentabilidade nas propostas pedagógicas ainda se mostra um
enorme desafio (ATWATER et al., 2008 apud GODEMANN et al. 2011; SPRINGETT,
2005). O currículo é cerne da questão do processo de inserção de sustentabilidade no ensino
superior e é onde predominam incertezas (JACOBI; RAUFFLET; ARRUDA, 201;
GODEMANN et al., 2011).
Rever o currículo, elaborando propostas pedagógicas dinâmicas que atendam aos novos
desafios no campo da gestão e da sustentabilidade não é um processo simples. Requer que as
instituições invistam na formação de funcionários e incluam novas ferramentas de ensino e
aprendizagem, revisem conteúdos e cursos, desenvolvam novos cursos em um processo que
incorpore os princípios da sustentabilidade na instituição como um todo (TILBURY, 2004;
CORCORAN; WALS, 2004 apud JACOBI; RAUFFLET; ARRUDA, 2011).
3.1 Abordagens que a educação para sustentabilidade propõe
Como já mencionado, a formação para sustentabilidade não requer apenas novos
conhecimentos. Solicita o exame de valores, novas formas de pensar, articular saberes e
habilidades; por isso novas formas de aprender. Além do desenvolvimento de competências
técnicas e analíticas, demanda o entendimento das variáveis e da dinâmica social e ambiental.
O administrador que se vislumbra é um profissional do diálogo, que integra diferentes
29
contextos organizacionais e diferentes campos da atuação profissional (DEMAJOROVIC;
SILVA, 2012, p 49) para solução de problemas e tomada de decisão.
Há um aumento do uso de novos ambientes e métodos de aprendizagem que são mais
apropriados para o ensino de temas complexos, não somente na sala de aula, mas também em
experiências externas e diretas (PRME, 2012). Os autores estudados apontam nessa direção; a
nova proposta de ensino e aprendizagem pressupõe o uso de estratégias e práticas
diferenciadas, ocorre em situações vivenciais e têm o aprendiz como centro (CARVALHO,
2011).
Longe de explorar o tema em sua totalidade, iremos abordar propostas que permitam perceber
noções gerais do que esse novo paradigma propõe. O intuito é oferecer insumos para que o
leitor reflita e avalie criticamente as estratégias das escolas em educar para sustentabilidade e
rever o currículo.
Hoje os estudantes são estimulados a tomar decisões para um pequeno grupo, priorizando a
maximização de lucro no curto prazo (JACOBI; RAUFFLET; ARRUDA, 2011). Essa
abordagem se contrapõe à visão educacional que caracteriza o desenvolvimento sustentável.
As escolas de administração passam a ser provocadas a transformar a dinâmica de
aprendizagem organizacional para que seja mais abrangente, crítica, participativa,
transformativa e inclusiva.
As práticas educativas sustentáveis apontam para propostas pedagógicas centradas na
criticidade dos sujeitos, com vistas à mudança de comportamento e atitude, à organização
social e participação coletiva. O novo paradigma implica nova percepção e valores,
pensamento complexo aberto às indeterminações, à diversidade, à possibilidade de construir e
reconstruir, em um processo contínuo de novas leituras e interpretações (JACOBI, 2005).
É necessário haver diálogo de conhecimentos que formem um pensamento reflexível, criativo
e sintonizado com a necessidade de propor respostas para o futuro, capaz de analisar as
complexas relações entre os processos naturais e sociais e de atuar no ambiente em uma
perspectiva global, respeitando as diversidades socioculturais (JACOBI, 2005).
30
A UNESCO corrobora essa visão. Declara que a educação para o desenvolvimento
sustentável é um processo de aprendizagem de como tomar decisões que consideram o futuro
a longo prazo; auxilia as pessoas de todas as idades a entenderem melhor o mundo em que
vivem, compreendendo a complexidade e interconexão dos problemas (UNESCO, 2003 apud
CARVALHO, 2011).
Para criar compreensão entre os diferentes temas relacionados à sustentabilidade de forma
interconectada com a realidade, é preciso utilizar e promover uma abordagem holística e
interdisciplinar. Desenvolver conhecimentos, habilidades, perspectivas e valores que inspirem
a percepção de que cada um de nós tem o poder e a responsabilidade de introduzir mudanças
positivas em escala global (UNESCO, 2005).
A educação deve propiciar o entendimento das múltiplas repercussões de ações e
comportamentos, fortalecendo a capacidade de reflexão orientada para o futuro. Tornar os
indivíduos aptos a compreender a si e a comunidade, buscando entender o próximo e os
vínculos que os unem ao entorno natural e social (UNESCO, 2005).
Resumindo, para a UNESCO (2005) a educação para o desenvolvimento sustentável reflete a
preocupação por uma educação de alta qualidade e apresenta as seguintes características:
 Ser interdisciplinar e holística: ensinar desenvolvimento sustentável de forma
integrada em todo o currículo, não como disciplina à parte;
 Visar aquisição de valores: ensinar a compartilhar valores e princípios
fundamentados no desenvolvimento sustentável. Imprescindível que as normas
assumidas – os valores e princípios – sejam explicitadas e possam ser analisadas,
debatidas, testadas e aplicadas;
 Desenvolver o pensamento crítico e a capacidade de encontrar solução para os
problemas: ensinar a ter confiança ante os dilemas e desafios;
 Recorrer à multiplicidade de métodos: ensinar a usar a palavra, a arte, debate,
experiência e diversas pedagogias. É preciso ultrapassar a ideia do ensino como
transmissão de conhecimento, enfocando que professores e alunos trabalhem juntos;
 Estimular o processo participativo de tomada de decisão: fazer que os alunos
participem das decisões sobre como irão aprender;
31
 Ser aplicável: integrar as experiências de aprendizagem na vida pessoal e
profissional cotidiana;
 Ser localmente relevante: abordar tanto os problemas locais quanto os globais,
usando a linguagem que os alunos usam. É preciso ter em conta que valores,
diversidade, conhecimento, linguagens e visão de mundo são associados à cultura e
influenciam fortemente o modo de abordar os distintos aspectos da educação.
Demais autores detalham, nomeiam e categorizam as características propostas pela UNESCO
de forma complementar. Tilbury e Wortman (2004 apud JACOBI; RAUFFLET; ARRUDA,
2011) mencionam também a necessidade de desenvolver a competência de “perspectivas de
futuro” (ser capaz de imaginar um mundo melhor, com a premissa de que, se sabemos aonde
queremos chegar, seremos mais capazes de trabalhar para chegarmos lá). Para o “pensamento
crítico e reflexão”, ressaltam a importância de aprender a questionar os sistemas de crenças e
reconhecer as hipóteses subjacentes ao conhecimento, perspectivas e opiniões. Citam a
necessidade de desenvolver o “pensamento sistêmico” para reconhecer as complexidades, ao
procurar por ligações e sinergias, tentando encontrar soluções. Também apontam que é
necessário desenvolver a competência de “construir parcerias”, promover o diálogo, a
negociação e aprender a trabalhar em equipe. Por fim, destacam que para que haja real
“participação nas tomadas de decisão” é necessário que as pessoas empoderem-se.
Sterling (1996 apud CARVALHO 2011), entre outras características que estão alinhadas às
que já foram mencionadas até aqui, enfatiza também a necessidade da educação ser
“contextual” (sintonizada e comprometida em tratar as crises da modernidade, baseada no
contexto social, econômico, ambiental e geográfico) e que deve ser “inovadora e
construtiva” (inspirada no pensamento pós-moderno de conhecimentos, ciências, ética,
política, economia, design e psicologia) e “intencionada” com o propósito explícito de
promover a mudança.
Pesquisadores, em essência, apontam para as mesmas características e necessidades. Sendo
fundamental entender o educando como protagonista, com suas experiências, histórico,
questionamentos e dilemas e considerando-o em todas as dimensões humanas e sociais, como
as emocionais, culturais, familiares, profissionais, cidadãs. Para Carvalho (2011) educar não é
apenas formar super profissionais, a instituição de ensino deve zelar pelo desenvolvimento
pessoal dos aprendizes. O período do curso superior é fundamental para consolidar os valores
32
e compromissos humanos e sociais, valores da cidadania, da busca por um mundo mais justo,
humano e sustentável.
A educação para o desenvolvimento sustentável requer a reorientação das abordagens
educacionais: revisar os objetivos e conteúdos dos currículos, pedagogia, as metodologias de
aprendizagem e avaliação para fomentar as competências necessárias. Junto com habilidades
relacionadas ao pensamento crítico e criativo, mostra-se necessário desenvolver a
comunicação oral e escrita, colaboração e cooperação, gestão de conflitos, tomada de
decisões, soluções de problemas e planejamento, uso apropriado das tecnologias de
informação e comunicação e a cidadania prática (UNESCO, 2005).
Apesar do fato de muitas escolas de negócio explorarem metodologias de ensino
diferenciadas, com vivências práticas, estas ainda demandam muitos recursos e parcerias, e
por isso, continuam em sua infância (PRME, 2012).
Como a sustentabilidade está buscando espaço num cenário governado por paradigmas
cartesianos e tradicionais, os dilemas e contradições se instalam (TELLES, 2011). A
interdisciplinaridade se apresenta como um dos caminhos para superar contradições.
3.2 Interdisciplinaridade
As pesquisas e experiências interdisciplinares ainda são recentes e incipientes (JACOBI;
RAUFFLET; ARRUDA, 2011), mas estão ganhando evidência. Reconhece-se cada vez mais
que os modelos educacionais fragmentados dificultam o aprendizado de temas amplos
(TELLES, 2011).
A base disciplinar é um desafio. Para Jacobi, Raufflet e Arruda (2011), a divisão de
conhecimento se transforma em obstáculo, quando poderia contribuir para a integração da
sustentabilidade no currículo. Para Amboni et al. (2010 apud DEMAJOROVIC; SILVA,
2012), professores precisam ir além de suas disciplinas e levar o indivíduo a aprender a
aprender. Isso se manifesta pela capacidade de refletir, analisar e tomar consciência do que
sabe e não se sabe, dispor-se a mudar os próprios conceitos, buscar novas informações,
substituir velhas verdades por teorias transitórias, adquirir novos conhecimentos. É necessário
33
propor problemas que levem os próprios alunos a buscar uma solução. Esses problemas não
podem ser resolvidos com a contribuição individual das disciplinas, sem interação de saberes.
Para Demajorovic e Silva (2012), com base em estudo de diversos pesquisadores do tema, o
problema dos projetos pedagógicos tradicionais não está exatamente na estrutura disciplinar; e
sim na falta de articulação entre as disciplinas, no distanciamento dos ensinamentos da
realidade dos alunos e porque não impulsionam e orientam as capacidades cognitivas,
inquisitivas e criativas do aluno.
Fazenda (2009 apud DEMAJOROVIC; SILVA, 2012) afirma que a interdisciplinaridade não
é a eliminação da contribuição de cada disciplina. Ela se constitui em uma atitude, com o
objetivo de impedir que uma determinada ciência tenha supremacia sobre outras igualmente
importantes.
A construção de um espaço de saber interdisciplinar possibilita o diálogo entre a problemática
socioambiental e as ferramentas de gestão (DEMAJOROVIC; SILVA, 2012), por isso é
imperativo em função das mudanças sociais vivenciadas pela sociedade. Disciplinas que
trabalham isoladamente não podem dar respostas adequadas às problemáticas complexas da
atualidade (FAZENDA, 2009 apud DEMAJOROVIC; SILVA, 2012).
Essa também é a visão da UNESCO (2005), que defende que a ênfase na interdisciplinaridade
deve-se à constatação de que os problemas que afetam e mantêm a vida no planeta são de
natureza global e que suas causas não podem restringir-se apenas aos fatores estritamente
biológicos, pois revelam dimensões políticas, econômicas, institucionais, sociais e culturais.
Posto que os problemas transcendem as diferentes disciplinas, tanto o aprofundamento
disciplinar quanto a ampliação do conhecimento entre as disciplinas são fundamentais.
Porém esse é um tema de difícil implementação. Não é suficiente reunir diferentes disciplinas,
são necessárias trocas sistemáticas e o confronto de saberes disciplinares, o que só se
concretizará com uma ação orgânica das diversas disciplinas, superando a visão
multidisciplinar (UNESCO, 2005).
As escolas de administração devem buscar caminhos para inserir as questões de
sustentabilidade de forma que suas discussões façam parte do desenvolvimento da própria
34
ciência de administração; e não um movimento à parte, gerando conflito com suas diversas
áreas. O conhecimento gerado em finanças deve ser coerente com o que se aprende em outras
áreas e também com as questões postas pelos desafios da sustentabilidade (JACOBI;
RAUFFLET; ARRUDA, 2011). Porém, o que se observa na prática das escolas de
administração é justamente o contrário. A sustentabilidade acaba sendo inserida de forma
pontual e sem articulação com o todo, resultando em incoerências e contradições com as
demais áreas ensinadas.
No próximo capítulo analisaremos como as instituições estão reagindo às demandas e
influências externas, abordadas no capítulo 2, e como estão encarando o novo paradigma
discutido neste capítulo.
35
CAPÍTULO 4 – COMO A EDUCAÇÃO PARA SUSTENTABILIDADE É ABORDADA
NO ENSINO DE ADMINISTRAÇÃO
De primeira vista, a boa notícia é que se observa um significativo aumento de instituições de
ensino superior motivadas para formar estudantes com conhecimento e habilidades
necessários para colocar a sustentabilidade no centro de suas futuras atividades de gestão.
Durante a última década, multiplicaram-se módulos, cursos e programas (JACOBI;
RAUFFLET; ARRUDA, 2011).
Diversas experiências estão sendo conduzidas em gestão universitária, extensão, pesquisa,
ensino, participação dos alunos, capacitação de docentes e declarações de sustentabilidade na
visão e missão das instituições de ensino (CARVALHO, 2011).
Esse capítulo é dedicado a analisar criticamente como as faculdades de administração estão
inserindo a sustentabilidade no currículo, foco desse estudo, conforme explicitado
anteriormente.
As pesquisas que têm as instituições signatárias do PRME como base são otimistas e
declaram que muitas escolas de negócio já estão “walking the talk”13
(PRME, 2012). Porém
essa visão não é unânime.
Com base em leituras de autores, como Springett (2005), Calder e Clugston (2003), Elliot et
al. (2004), Springett e Kearins (2001) e estudos empíricos conduzidos por ela, Carvalho
(2011) traz que há uma dicotomia entre o que se prega e o que se pratica. Ela defende que
apesar de ser politicamente desejada e de haver demonstrações de preocupação com a
sustentabilidade, poucas são as universidades que já a incorporaram em seu processo do dia a
dia, como políticas e práticas, sendo que a maior parte recorre para estratégias mais simples.
Em sua maioria, incorporam uma disciplina isolada de sustentabilidade no currículo, como
veremos a seguir.
É fato que já existe progresso em inserção de sustentabilidade no ensino superior, em
diferentes formatos, formas e profundidades (PRME, 2012). Godemann et al. (2011), após
13
Termo em inglês que significa ser coerente com o discurso.
36
analisar experiências de pelo menos cem instituições signatárias do PRME, afirmam que não
há receita de bolo. A promoção da sustentabilidade nas instituições oferece muitos caminhos e
não há consenso como operacionalizá-la (CARVALHO, 2011).
De acordo com o PRME (2012), consenso foi alcançado pelas instituições globais de que a
sustentabilidade deve ser incorporada ao currículo. Porém, justamente, a questão relevante
não é mais o porquê a educação deve mudar e sim o como. E nessa área a transformação está
apenas começando.
Com base na leitura de diversos pesquisadores e estudiosos, percebe-se as seguintes
estratégias de inserção no currículo. Após apresentadas, discutiremos sobre elas, como um
todo, tendo em vista a visão de diferentes pesquisadores e estudos:
a) Inclusão de uma disciplina no currículo
Trata-se da inclusão de uma disciplina no currículo, seja de sustentabilidade ou conteúdos
relacionados, como responsabilidade social empresarial. Em alguns casos, inclui-se mais de
uma disciplina sobre o tema, sendo mais comum a incorporação de disciplinas eletivas ou
complementares, fora do currículo obrigatório. Caracteriza-se pela inserção pontual, isolada,
sem revisão do todo; as disciplinas tradicionais não sofrem alteração. Essa tem sido a prática
mais comum e é o que aqui chamamos de educação sobre sustentabilidade.
Essa estratégia não tem encontrado muitas resistências nas instituições de ensino superior,
conforme relatado por diversos estudos.
Iniciar a discussão sobre a temática da sustentabilidade em formato de disciplina com
conteúdo próprio, separado das demais disciplinas tende a ser uma estratégia de fácil
aplicação e que muitas vezes está associada ao fato do docente estar realizando pesquisa e se
interessar pelo tema (CARVALHO, 2011). Jacobi, Raufflet e Arruda (2011) verificam o
mesmo cenário, de que o crescimento da sustentabilidade em disciplinas ocorre na maior parte
das vezes de iniciativas individuais de docentes, mas pouco articuladas com o todo
institucional.
37
b) Inserção de tópicos ao longo do currículo
Trata-se da inclusão de conteúdos nas diferentes disciplinas ao longo de todo o currículo. O
PRME (2012) aponta que a introdução gradual de temas relacionados à sustentabilidade e
utilização de estudos de caso em disciplinas existentes é uma abordagem muito recorrida.
Nesse cenário verifica-se a predominância da inserção de conteúdos, ao invés de uma revisão
dos objetivos, valores, modelos mentais e metodologias. Práticas interdisciplinares e
vivenciais são incipientes e restritas a trabalhos específicos.
Para Stein (2010), mudanças através da simples inclusão de tópicos e conceitos relacionados à
sustentabilidade em currículos são um início interessante, mas somente adaptativas e seu
impacto será mínimo caso a linha principal do curso se mantenha inalterada. Transformações
efetivas ocorrem somente com mudança no sistema de ensino e nos educadores.
c) Criação de um novo curso ou programa dedicado ao tema ou com linha de formação
específica
Trata-se da criação de um novo curso ou programa voltado para o tema da sustentabilidade. É
mais comum encontrar essa modalidade nos cursos de pós-graduação por obterem maior
flexibilidade. Um exemplo seria a criação de um curso sobre gestão de sustentabilidade nas
empresas.
Verifica-se também a criação de cursos de administração com ênfase ou linha de formação
específica em gestão ambiental ou sustentabilidade. Demajorovic e Silva (2012) conduziram
um estudo junto a egressos de um curso dessa natureza e que apresentava a
interdisciplinaridade como premissa. Os resultados indicam que os alunos reconheceram as
práticas interdisciplinares empregadas e sua contribuição para o desenvolvimento de
competências profissionais significativas. Porém, manifestaram sentir falta de
aprofundamento em conceitos tradicionais de administração.
38
d) Inserção transversal no currículo
Esse é escopo de análise desse trabalho. A autora entende que essa é a estratégia para a efetiva
educação para sustentabilidade na formação do administrador. Isso não invalida ou desmerece
as demais estratégias. Defende-se, no entanto, que as os itens A (inclusão de uma disciplina
no currículo) e C (criação de um novo curso ou programa dedicado ao tema), guardadas as
devidas proporções, referem-se à educação sobre sustentabilidade, por se tratar do objetivo
explícito da disciplina, curso ou programa. Ressalva seja feita aos casos com “ênfase” ou
“linha específica” em sustentabilidade. Acredita-se que em casos bem sucedidos, de fato,
ocorra a educação para sustentabilidade. Esse tipo de formação tem muito valor, porém, o
escopo desse trabalho buscou analisar a inserção transversal na formação do administrador
comum, não aquela que ocorre por meio da criação de um curso especial ou programa
paralelo. No item B (inserção de tópicos ao longo do currículo), a educação para
sustentabilidade não se mostra ocorrer de forma holística e na profundidade necessária,
embora já represente um avanço.
Pode-se exemplificar a diferença entre os itens B e D, imaginando uma disciplina de
marketing e produção. No caso da estratégia B, poderá ser abordado nas aulas de marketing
questões como marketing verde, o greenwashing14
ou a responsabilidade da propaganda junto
ao público infantil. Em produção provavelmente se discutirá sobre ecoeficiência e o descarte
correto de resíduos e efluentes. Em marketing, em circunstâncias mais avançadas, poderá ser
trazido para dentro de sala de aula, estudos de casos ou trabalhos práticos interessantes, que
façam os alunos refletir sobre temas relacionados ao marketing e à sustentabilidade,
considerando também o conhecimento de outras disciplinas, como conceitos de produção.
Provavelmente partirá de uma iniciativa individual de um professor que vislumbrou essa
oportunidade e que instigará seus alunos sobre a importância de se considerar os materiais
utilizados nas peças de comunicação, buscando valorizar boas práticas, como o uso de tinta
ecológica, técnicas para evitar o desperdício, respeito aos fornecedores, etc.
No caso do D, todos os exemplos tratados acima podem ser realidade, mas os alunos seriam
provocados também a conteúdos e reflexões mais profundos e inter-relacionados. Como
14
Pode-se traduzir como “lavagem verde” (tradução nossa), termo utilizado quando sugere-se tentativa de
enganar o consumidor sobre as propriedades ou características ecológicas de um produto ou organização.
39
discutir a questão da transparência e o papel do marketing de forma mais crítica. Os alunos
seriam instigados a questionar sobre sua responsabilidade como cidadãos e futuros
administradores, seus valores individuais na criação de necessidades e valores nas pessoas e
na sociedade, a existência de certos produtos, considerando o projeto de uma sociedade
sustentável. A concepção de produtos e serviços em consonância com os princípios da
natureza seria tratada nas duas matérias de forma complementar. Em produção, também
seriam abordados conteúdos como a análise de ciclo de vida dos produtos, novos arranjos
produtivos e o biomimetismo. O contexto do curso seria diferente. As reflexões e conteúdos
sob a ótica da sustentabilidade não estariam desalinhados ou em conflito ao ensinado em
outras disciplinas como, economia e finanças. A inter-relação das diversas áreas de
conhecimento seria uma realidade. A questão da geração de externalidades e a internalização
desse custo nas empresas e no preço seria um tema comum de todas as áreas. Já se haveria
questionado sobre a premissa da maximização ao acionista e do crescimento econômico,
como o maior objetivo a ser atingido e o que isso representa para marketing e da produção. Os
alunos seriam levados a identificar e refletir sobre as premissas que sustentam as áreas de
conhecimento e alternativas, tendo os princípios e valores da sustentabilidade como pano de
fundo e objetivo. Atenção especial seria dada às vivências, metodologias, trabalhos,
competências a serem desenvolvidas e formas alternativas de medir o aprendizado dos alunos.
As características e metodologias descritas no capítulo 3 seriam uma realidade de todo o
currículo.
Os dois exemplos são superficiais e não são categóricos, ou seja, não quer dizer que os
cenários B e D irão se comportar exatamente dessa forma, com as divisões, circunstâncias e
conteúdos apontados. Servem apenas para tentar ilustrar a diferença entre os cenários.
Em suma, no cenário B, pode haver, em maior ou menor grau, a inclusão de tópicos referentes
à sustentabilidade nas disciplinas, porém a linha principal do curso se mantém a mesma. Os
conteúdos de sustentabilidade e as áreas de conhecimento podem ser inter-relacionados
pontualmente, mas não no todo e de forma verdadeiramente interdisciplinar. Verifica-se a
predominância da inserção de conteúdos, ao invés de inovação nas abordagens de ensino. É
comum haver conflito entre metodologias, conteúdos e valores entre as diferentes disciplinas,
o que pode confundir os alunos. A inovação normalmente fica restrita a abordagens técnicas
de produtos e de gestão, como se fosse sinônimo de tecnologia.
40
O cenário D se caracteriza pela revisão total do currículo sob a ótica da formação para a
sustentabilidade. Revisa objetivos, valores, metodologias, conteúdos e a inter-relação de todas
as disciplinas, tendo em vista o administrador que se deseja formar; capaz de impulsionar a
sustentabilidade. A inovação é encarada como um processo contínuo pela busca da melhor
forma de fazer as coisas, seja por meio de uma nova prática, comportamento, tecnologia ou
uma mudança de qualquer ordem que permita a uma organização questionar e romper com a
lógica atual. Para ser sustentável é preciso inovar, o que implica em aprender com o ambiente
– que está em constante transformação (CARREIRA, 2010).
Por isso, algumas barreiras de inserir a temática de forma transversal no currículo são claras,
ausência de pessoal especializado, falta de definições e conceitos comuns, estruturas rígidas e
resistência à mudança. Docentes e corpo administrativo precisam aprender ao mesmo tempo
em que ensinam e testam, avaliam e criam novas práticas. É necessário que a instituição se
engaje como um todo, dê espaço para o aprendizado contínuo e conjunto e aprenda lidar com
as incertezas, um desafio para a Academia. Não existem fórmulas prontas ou um caminho
claro a seguir. São poucos os exemplos de boas práticas, mas que felizmente estão
crescenndo.
Sem necessariamente terem o mesmo entendimento do seu significado, na percepção dos
coordenadores de curso e diretores entrevistados por Carvalho (2011), a transversalidade é a
melhor forma de inserção. Porém a realidade, não sinaliza uma mudança nessa ordem. Não se
observou no seu estudo uma formação para sustentabilidade e sim sobre sustentabilidade.
A experiência internacional também revela um enfoque fragmentado em iniciativas de
adicionar conteúdo a uma parte específica do currículo. Poucas escolas tentam inserir
sustentabilidade de forma transversal e a maioria tem conseguido apenas pequenos avanços
incrementais (CARVALHO, 2011; GODEMANN et al., 2011; JACOBI; RAUFFLET;
ARRUDA, 2011).
Um elemento importante a se destacar é a ambiguidade da definição de sustentabilidade no
currículo. A compreensão e a interpretação do termo “sustentabilidade” e a ideia de
“aprendizagem para a sustentabilidade” variam muito dentro do ensino superior e
predominam as incertezas de como fazer essa integração (JACOBI; RAUFFLET; ARRUDA,
2011; GODEMANN et al., 2011).
41
Stein (2010) apresenta que o paradigma educacional proposto é baseado na distinção entre
mudanças e aprendizados de primeira, segunda e terceira ordem. As de primeira ordem são
alterações adaptativas que não examinam, questionam e/ou mudam os valores básicos. Nas de
segunda ordem, observa-se um aprendizado reflexivo e crítico, quando as premissas e valores
que influenciam o aprendizado de primeira ordem são questionados. As situações de
aprendizado de terceira ordem ocorrem quando estamos aptos a ver os acontecimentos de
maneira criativa, com um entendimento aprofundado e vislumbrando maneiras alternativas de
ação. Trata-se de um nível transformador. A crise atual que vivemos demanda uma ruptura
que somente será possível com aprendizados de segunda e terceira ordem.
A UNESCO (2005) valida a visão de que a mudança curricular é necessária em todos os
programas de estudo, e não apenas para aqueles com foco em sustentabilidade, sendo que o
tema deve integrar todo o currículo. Para a instituição, a educação para o desenvolvimento
sustentável não deve ser vista como “uma disciplina a mais” a ser adicionada a um currículo
sobrecarregado, mas como um planejamento global “de toda a escola”, em que o
desenvolvimento sustentável é visto como um contexto para alcançar os objetivos da
educação e não uma prioridade em competição com as demais disciplinas.
Quando educadores tentam preencher essa lacuna com conteúdos alternativos e práticas
interdisciplinares, tem pouco sucesso. Eles enfrentaram forte resistência a essa inovação, uma
vez que os cursos são concebidos de forma a valorizar os critérios de negócios, cujo
pensamento dominante entende a incorporação da dimensão socioambiental como uma
ameaça à competitividade das empresas (DEMAJOROVIC; SILVA, 2012)
Permanecer no mainstream é a tendência entre coordenadores e diretores de curso de
administração nas escolas estudadas por Carvalho (2011). Springett e Kearins (2005 apud
CARVALHO, 2011) sugerem que tomar posicionamentos críticos, romper com a lógica
racionalista-capitalista parece ser uma atitude arriscada e evitada pelos profissionais de
ensino.
Os cursos de administração privilegiam a melhor combinação de recursos para obter maior
produtividade e lucratividade. Nos anos recentes, tais cursos incluíram novas disciplinas,
como responsabilidade social, ética nos negócios e gestão de recursos naturais. No entanto,
longe de promover uma efetiva educação para a sustentabilidade, tais iniciativas mascaram o
42
fato de que os objetivos originais dos cursos de administração continuam preservados, o que
leva a continuidade do paradigma social dominante (DEMAJOROVIC; SILVA, 2012).
O foco atual está no treinamento de futuros administradores para que possam trabalhar em
direção a um aumento da eficiência e da geração de inovações incrementais. O modelo
mecaniscista/ teconológico predomina entre os coordenadores de curso. Muito pouco tem sido
feito para instigar estudantes a repensar e a desafiar o sistema mais amplo de produção, em
seu contexto socioambiental. Sustentabilidade nas escolas de administração considera
marginalmente o fato de vivermos em um planeta com recursos finitos (CARVALHO, 2011;
JACOBI; RAUFFLET; ARRUDA, 2011).
Quando indagados sobre a importância da sustentabilidade para a adminsitração, as respostas
dos coordenadores de curso e diretores levam a crer que, embora o tema seja importante,
ainda não é visto como fundamental ou central na formação do administrador. A
sustentabilidade está sendo tratada no lugar comum, como produto de demanda de mercado e
como vantagem competitiva, por causa da demanda profissional (CARVALHO, 2011).
Para Huckle (1996) e Orr (1992 apud CARVALHO, 2011) as universidades têm se voltado
para as forças de mercado e se sujeitado a ideologias do mesmo. Eles enxergam as instituições
de ensino preparando indivíduos para economias em expansão e que se espelham na
competição do mercado, muito mais do que nos valores e princípios educacionais.
Carvalho (2011) afirma que também há visões mais engajadas politicamente. Mesmo essas
ainda estão distantes de uma reflexão sobre o sentindo e o lugar das escolas de administração
numa sociedade que pretende ser sustentável.
A missão de alcançar uma mudança substancial no conteúdo das disciplinas tradicionais,
como estratégia, contabilidade, finanças, marketing, recursos humanos, logística, está ainda
nos primeiro passos (PRME, 2012), o que prejudica o entendimento de educação para
sustentabilidade.
Por isso, para Ghoshal (2005 apud JACOBI; RAUFFLET; ARRUDA, 2011), a inclusão de
um módulo ou de um curso sobre desenvolvimento sustentável em um programa dominado
43
por um paradigma econômico pode ser considerado imediatista e provavelmente fracassará
em direcionar mudanças profundas.
Nessa perspectiva, argumenta-se que os cursos de administração não antecipam as mudanças
na sociedade. Em vez de se colocarem na vanguarda da disseminação do conceito de
sustentabilidade, acompanham, de forma reativa, a reformulação do discurso empresarial
(DEMAJOROVIC; SILVA, 2012).
44
CAPÍTULO 5: CAMINHOS PARA FACILITAR A INSERÇÃO
Sem pretensão de esgotar o debate, este capítulo dedica-se a pontuar três aspectos que foram
marcados pelos diferentes autores como chave para facilitar capilarização da sustentabilidade
no ensino superior. Eles são: a importância de capacitar e valorizar os docentes; o papel da
pesquisa em atribuir relevância ao tema na Academia e facilitar sua incorporação no ensino; e
o engajamento dos diferentes públicos de interesse, com destaque à liderança, como
fundamentais para garantir uma mudança profunda e duradoura.
Esses tópicos foram reforçados sistematicamente pelos diversos autores. Como para Carvalho
(2011), por exemplo, que destacou a pesquisa e formação de professores como essenciais para
o desenvolvimento de uma abordagem transversal de sustentabilidade no currículo. Jacobi,
Raufflet e Arruda (2011) apontaram que para garantir uma mudança efetiva, é preciso
envolver toda a instituição nas mudanças em andamento. O desafio é ampliar as visões de
colaboração e incluir a participação de toda a gama de stakeholders15
com compromissos de
longo prazo.
É importante ressaltar que também existem outros caminhos para garantir que a
sustentabilidade se insira nas instituições de ensino superior. A extensão e gestão da
universidade, incluindo práticas organizacionais, campus e operações, embora não destacados
em um item, são essenciais para garantir a coerência da instituição com o desenvolvimento
sustentável. Como abordado, a mudança para sustentabilidade é sistêmica e envolve todas as
dimensões das instituições de ensino superior. O chamado para integrá-la no coração da
escola impacta na cultura e comportamento, por meio de vários projetos de transformação
extracurricular (PRME, 2012). As universidades devem funcionar com lugares de pesquisa e
aprendizagem para o desenvolvimento sustentável e como iniciadores de atividades nas suas
comunidades (UNESCO, 2005).
Os projetos de extensão são excelentes para integrar o ensino e a pesquisa, proporcionando
aos alunos um rico aprendizado e a possibilidade de aplicar conhecimentos na prática de uma
15
Públicos de relacionamento - que impactam/influenciam e são impactados/ influenciados, no contexto desse
trabalho, pela instituição de ensino superior.
45
forma interdisciplinar. É também uma maneira da universidade cumprir sua função social e
contribuir para a comunidade.
No campo da gestão universitária, trata-se de tornar o próprio ambiente universitário
pedagógico, um exemplo. Discutir a gestão universitária sustentável, envolvendo os aluno e
outros stakeholders, significa observar impactos ambientais, sociais e econômicos envolvidos
nas decisões e práticas da gestão da universidade, oferecendo a oportunidade para aprender a
pensar e produzir respostas a uma gestão responsável (CARVALHO, 2011).
A UNESCO (2005) enfatiza que a educação superior deve assumir uma função de liderança,
colocando em prática aquilo que é ensinado por professores. Universidades não são apenas
lugares para se aprender sobre desenvolvimento sustentável, mas lugares onde se pode
ativamente implementar boas práticas, como economia de energia, reciclagem, uso produtivo
do terreno das escolas, uso de materiais e recursos naturais. As compras, investimentos e
serviços da universidade precisam ser sustentáveis e integrados ao ensino e à aprendizagem.
Todos os alunos do curso superior devem entender a importância da diversidade e da inclusão
e devem ser capazes de identificar valores, hipóteses e sistemas éticos.
5.1 Formação e valorização dos docentes
Os educadores são os grandes iniciadores da temática nas instituições de ensino superior. Se
hoje há alguma transversalidade ou tendência à interdisciplinaridade, ela foi construída
informalmente, pelo conjunto de professores que discutem o tema (CARVALHO, 2011).
Quando falamos de ensino, os educadores são protagonistas, estão no contato direto com os
alunos. Seu papel é essencial para impulsionar as transformações de uma educação que
assume um compromisso com a formação de valores de sustentabilidade, numa perspectiva
coletiva (UNESCO, 2005). São decisivos na inserção da temática no currículo e por isso
precisam de apoio e investimento para agregar ferramentas de ensino e aprendizagem.
Embora grande parte das iniciativas de inserção de sustentabilidade nos currículos surja da
iniciativa individual dos docentes, também é deles que vêm resistências, como de se engajar
46
com a interdisciplinaridade e com abordagens metodológicas mais práticas (JACOBI;
RAUFFLET; ARRUDA, 2011).
O desafio é que os professores estão frequentemente sobrecarregados pelas mudanças e
ampliação dos currículos. Para aumentar a aceitação do corpo docente, uma estratégia que
vem dando certo é associar os temas de sustentabilidade a conceitos e tendências que são já
aceitos no ensino da administração, como inovação e empreendedorismo social (PRME,
2012).
Diversos autores afirmam que a operacionalização da educação para o desenvolvimento
sustentável só é viável à medida que se repense o papel dos educadores e docentes como
agentes da mudança. Nota-se, porém, um despreparo dos professores em relação a
conhecimentos, habilidades e atitudes para incorporar os princípios de sustentabilidade em
seus cursos; e talvez até por isso, muitos evitem tomar posicionamentos críticos e romper com
a lógica atual. Infelizmente, a questão não se resume a falta de docentes que conheçam o tema
ou trabalhem com sustentabilidade. Esta dificuldade se soma a falta de professores doutores,
pesquisadores ou com trabalhos publicados na área de gestão (CARVALHO, 2011).
O desenvolvimento sustentável é um conceito dinâmico que reconhece que a sociedade
humana está em constante transformação e que não existem respostas ou fórmulas prontas.
Isso requer que os docentes estejam constantemente se atualizando e revendo seus modelos,
conteúdos e métodos de ensino. Por isso, além de um compromisso e um engajamento
individual, é fundamental o apoio da universidade.
Para implementar a educação para sustentabilidade, os instrutores precisam romper com a
visão fundamentada no conhecimento sobre sustentabilidade e ir além de incluir conteúdos
específicos em seus cursos. Porém, a inserção de novos métodos, como a promoção da
interdisciplinaridade, tem encontrado muita resistência nas instituições, tanto por razões
administrativas, como pela relutância dos docentes, formados em uma visão disciplinar
(JACOBI; RAUFFLET; ARRUDA, 2011).
A Declaração de Talloires, iniciativa precursora ao PRME, reconhece a importância de que a
universidade crie programas para desenvolver a capacidade do corpo docente de ensinar os
princípios da natureza para todos os alunos. Destaca esse ponto como um dos dez pontos de
47
plano de ação recomendados às instituições de ensino superior (ASSOCIATION OF
UNIVERSITY LEADER FOR A SUSTAINABLE FUTURE, 1990).
Uma organização só muda quando as pessoas que trabalham nela não se sentem ameaçadas
pela mudança, entendem-na, percebem sua necessidade e benefícios (CARREIRA, 2010).
Para que a transformação ocorra, além de se convencer de sua necessidade, os docentes
devem dispor de conhecimento e métodos para integrar os princípios do desenvolvimento
sustentável nas suas práticas.
Iniciativas externas que venham estimular a motivação dos professores e valorizá-los, se
mostram como uma boa porta de entrada para o tema na instituição; os docentes podem ser
gatilhos para a mudança dentro da universidade. No entanto, para a mudança ser sistêmica e
duradoura, é essencial investir na capacitação e garantir que as práticas individuais
influenciem as institucionais. É recomendado pela UNESCO (2005) que os ministérios da
educação incluam o desenvolvimento sustentável como tema transversal nas instituições de
capacitação de professores.
Os professores são atores fundamentais para a evolução da educação para a sustentabilidade.
Contudo, apenas uma parte. Em muitas instituições, não têm poderes para mudar conteúdos
de suas disciplinas e de promover a interdisciplinaridade. Acima deles estão coordenadores,
diretores, direção geral, às vezes, acionistas e conselheiros. Uma verdadeira transformação
requer mudar o modelo mental de toda a cadeia de liderança, para que a sustentabilidade seja
incorporada como valor, atitude e comportamentos por todos os responsáveis por decidir os
rumos da educação, como será abordado mais a seguir.
5.2 Pesquisa
Teorias educacionais e práticas inovadoras emergem de programas de pesquisa e de
investigação acadêmica (UNESCO, 2005). Apesar de importantes progressos feitos pelas
escolas de negócio, o campo da pesquisa irá continuar dependente da motivação individual do
pesquisador até que as revistas acadêmicas e periódicos de prestígio ofereçam reconhecimento
aos assuntos relacionados à sustentabilidade, como tema primeira categoria de pesquisa.
48
Isso porque as publicações científicas consideradas A e B são cruciais tanto para as
instituições de ensino e seus rankings, quanto para as perspectivas de carreira de corpo
docente. Assegurar publicação de pesquisa de qualidade é a base para persuadir as disciplinas
de administração tradicionais a adaptarem seu conteúdo para um novo paradigma (PRME,
2012).
Novas teorias de gestão baseadas nos parâmetros de sustentabilidade precisam de espaço para
emergir e ganhar legitimidade acadêmica. Nada disso será possível sem uma mudança na
importância dada para esse tipo de pesquisa (PRME, 2012).
Dessa forma é fundamental que as próprias instituições incentivem a pesquisa de
sustentabilidade, se comprometam com o tema e expandam seu papel como poderosos
defensores do tema, inclusive junto aos periódicos (PRME, 2012). Incentivos externos para
estimular a pesquisa de sustentabilidade e educação para sustentabilidade são muito bem-
vindos e favoráveis.
5.3 Engajamento e participação dos públicos de interesse
O engajamento e participação dos stakeholders da universidade como condição para inserção
de sustentabilidade, na profundidade necessária, é consenso entre os pesquisadores.
Para Stein (2010), a institucionalização de uma educação para o desenvolvimento sustentável
exige não somente uma revisão de propósitos, atitudes e processos, mas também uma
interação diferenciada entre gestores, professores e estudantes. Carvalho (2011) vai ao
encontro quando aponta que ser sustentável requer uma mudança de atitude e comportamento
de todos os indivíduos dentro das instituições de ensino superior, incluindo educadores,
estudantes e corpo administrativo. Demajorovic e Silva (2012) reforçam a importância do
diálogo e a necessidade do envolvimento de todos os públicos. Afirmam ser necessário
reconhecer as limitações contidas em apenas um ponto de vista e ressaltam a riqueza da
possibilidade de uma pessoa refletir sobre si própria através do olhar de outro.
Huckle e Sterling (1996 apud JACOBI; RAUFFLET; ARRUDA, 2011) propõem que criar
abordagens inclusivas, envolvendo funcionários administrativos e professores é relevante para
49
desenvolver um suporte para a mudança. As experiências mostram que planos de gestão
ambiental e de sustentabilidade do campus são mais bem-sucedidos quando são
fundamentados no envolvimento ativo da maior parte da comunidade, pois a participação em
atividades pode ser educativa e criar comprometimentos mais profundos (CALVO;
BENAYAS; GUTIERREZ, 2002 apud JACOBI; RAUFFLET; ARRUDA, 2011).
Os estudos do PRME trazem que os estudantes são uma importante parte da equação. Tendo
em vista que o progresso rumo ao desenvolvimento sustentável é sistêmico, desencadear o
potencial dos estudantes é essencial. Existem exemplos surpreendentes em que os estudantes
são os principais iniciadores dos processos de transformações (PRME, 2012).
Infelizmente apenas algumas escolas de administração aparentam perceber o espectro de
oportunidades que surgem da participação, de aprenderem uns com os outros, discutir e
refletir sobre diferentes perspectivas (GODEMANN et al, 2011).
Carreira (2010) defende que um dos principais valores trazidos pela sustentabilidade é a
responsabilidade, por isso todos devem ser parte do processo e se sentirem responsáveis por
fazer a mudança acontecer.
Iniciativas reforçam a necessidade de a universidade atuar além dos seus muros e inclusive
além da comunidade do seu entorno. O PRME pontua isso nos princípios 5 (parceria) e 6
(diálogo). A Declaração de Talloires (ASSOCIATION OF UNIVERSITY LEADER FOR A
SUSTAINABLE FUTURE, 1990) propõe que a universidade deve usar toda a oportunidade
que tiver para aumentar a consciência pública da necessidade do desenvolvimento sustentável.
Para isso, os líderes devem iniciar e apoiar a mobilização de recursos internos e externos.
Vale a pena destacar, parceria com organizações nacionais e internacionais, o
compartilhamento de informações e a cooperação inter-universitária e a possibilidade de
influencia política, incluindo do arcabouço legal.
Os estudos do PRME enfatizam o papel da liderança. Defendem que pouco progresso é
alcançado sem uma sua verdadeira convicção. Para que a mudança ocorra, é prerrogativa que
a alta liderança coloque a temática como prioridade.
50
Como apontam os estudiosos de Gestão da Mudança, definir uma visão de futuro e
compartilhá-la com todos é essencial para que a mudança ocorra, pois deixa claro aonde se
quer chegar, diminuindo as resistências geradas pelas incertezas do futuro; os líderes têm esse
papel (CARREIRA, 2010).
Ser signatário de uma inciativa, como do PRME, tem um pouco dessa função, pois a
faculdade declara publicamente seu compromisso com a sustentabilidade. Porém, uma
importante lição é que não é suficiente incluir os princípios ou outras aspirações na missão e
visão da escola. Pode ser uma vantagem inicial, mas há um longo caminho entre o
reconhecimento “teórico” e a implementação dos princípios de forma consistente em todos os
níveis. Um dos principais desafios está em como evoluir os valores de forma que eles se
tornem direcionadores gerais das atividades. Ter uma equipe de liderança habilidosa e
apoiadora, uma estratégia “top-down”, é fator crítico para o sucesso (CARVALHO, 2011;
PRME, 2012). A adaptação da escola de negócio para colocar a sustentabilidade no core do
ensino, requer novas estruturas, incentivos e financiamentos, que não podem ser viabilizados
sem decisão da liderança.
A promoção de uma nova cultura requer que seus líderes e gestores ajam explicitamente
conforme os valores estabelecidos. As pessoas devem perceber que a maneira como “as coisas
são feitas” mudou e agora é regida por novos valores, normas e práticas. Os líderes também
precisam apoiar as pessoas e as equipes nesse momento de transição, fazendo-as notar a
necessidade da mudança e incorporar gradativamente em suas práticas a nova cultura
organizacional. A mudança só é alcançada quando os envolvidos passam a apresentar valores
alinhados com a sustentabilidade, como o cuidado com o meio ambiente e as pessoas, e
acreditam que formas de pensar e agir, inconsistentes com esses valores, não são mais
apropriadas (CARREIRA, 2010).
51
CONCLUSÃO
O desafio de equilibrar os aspectos sociais e ambientais na gestão das empresas trouxe um
contexto mais amplo do que antes, quando o resultado financeiro era o principal objetivo. Isso
representa mudança de valores e quebra de paradigmas que caracterizaram a era pós-
industrial. Essa mudança cultural profunda induz a revisão da relação da empresa com a
sociedade e o meio ambiente e implica que os profissionais percebam e incorporem novos
valores no dia a dia, como em metas, processos, atividades e comportamentos.
As escolas de negócio são fundamentais na formação de líderes que tenham a ousadia e a
competência de mudar as empresas. Os estudantes precisam ser expostos a reflexões éticas e
sobre responsabilidades como cidadãos e profissionais. Formados para serem conscientes do
impacto de decisões, capazes de considerar a complexidade, as dimensões sociais,
econômicas e ambientais de forma integrada; hábeis para transformarem os desafios da
sociedade contemporânea em valor para negócios e para a sociedade, trabalhando por uma
economia global inclusiva e sustentável.
As instituições de ensino superior são chamadas a assumir um papel de liderança e a servirem
de modelo na instituição de práticas sustentáveis, devendo inovar o sistema educacional
vigente.
Esse trabalho procurou analisar se a formação do administrador para a sustentabilidade é uma
realidade ou uma ilusão.
Vale diferenciar mais uma vez a educação de sustentabilidade (educação sobre os princípios,
temas e conceitos) e a educação para sustentabilidade. Essa última, escopo desse estudo, é a
que busca criar condições para que os alunos sejam capazes de promover o desenvolvimento
sustentável no desempenho de sua profissão, independente de almejarem se tornar um
profissional da área. A sustentabilidade é entendida como uma necessidade e premissa de
qualquer posição ou especialidade do administrador.
Constata-se que os desafios que afetam a vida na Terra, o bem-estar da sociedade e o sucesso
dos negócios são de natureza global. Suas causas não se restringem a fatores biológicos ou
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  • 1. FUNDAÇÃO GETULIO VARGAS Programa FGV Management MBA em Gestão de Sustentabilidade SUSTENTABILIDADE NA FORMAÇÃO DO ADMINISTRADOR DE EMPRESAS: ILUSÃO OU REALIDADE? Cristine Zanarotti Prestes Rosa São Paulo, 08 de março de 2013.
  • 2. 2 FUNDAÇÃO GETULIO VARGAS Programa FGV Management MBA em Gestão de Sustentabilidade SUSTENTABILIDADE NA FORMAÇÃO DO ADMINISTRADOR DE EMPRESAS: ILUSÃO OU REALIDADE? Trabalho de Conclusão de Curso apresentado ao MBA em Gestão de Sustentabilidade, Pós-graduação lato sensu, Nível de Especialização Programa FGV Management. Cristine Zanarotti Prestes Rosa Professor Orientador: Jacques Demajorovic São Paulo, 08 de março de 2013.
  • 3. 3 FUNDAÇÃO GETULIO VARGAS Programa FGV Management MBA em Gestão de Sustentabilidade O Trabalho de Conclusão de Curso: Sustentabilidade na formação do administrador de empresas: ilusão ou realidade? Elaborado por: Cristine Zanarotti Prestes Rosa e aprovado pela Coordenação Acadêmica do MBA em Gestão de Sustentabilidade, foi aceito como requisito parcial para a obtenção do certificado de conclusão do curso de pós- graduação, nível de especialização, do Programa FGV Management. Data: 08 de março de 2013. __________________________________ Prof. Dr. Mario Monzoni
  • 4. 4 Termo de Compromisso A aluna Cristine Zanarotti Prestes Rosa, abaixo-assinada, do MBA em Gestão de Sustentabilidade, do Programa FGV Management, realizado nas dependências da instituição conveniada Av. Paulista, 548, no período de abril de 2009 a julho de 2010, declara que o conteúdo do trabalho de conclusão de curso intitulado: Sustentabilidade na formação do administrador de empresas: ilusão ou realidade? é autêntico, original, e de sua autoria exclusiva. São Paulo, 08 de março de 2013. (Assinaturas)
  • 5. 5 RESUMO Os desafios e oportunidades que se apresentam à vida, ao bem-estar da sociedade e ao sucesso dos negócios são de natureza global. Suas causas não se restringem a fatores isolados, biológicos ou técnicos; revelam dimensões institucionais, sociais, culturais, ambientais, políticas e econômicas, interdependentes. O paradigma econômico está em xeque e é inegável o papel que as empresas representam hoje nesse modelo. A educação é colocada como um meio para evoluir a consciência, o conhecimento e oferecer novos caminhos. Em um contexto em que a educação e as empresas são identificadas como chave para a mudança, surge a pergunta: os administradores de empresa estão sendo preparados para lidar com os complexos desafios da nossa era, de forma transformadora e propositiva? São capacitados para criar valor sustentável? Os cursos de administração formam os futuros profissionais para a sustentabilidade? A educação para o desenvolvimento sustentável se mostra como uma proposta para repensar o estilo de vida e de se fazer negócios. Questiona os modelos que marcaram a sociedade moderna. Mostra-se necessária uma mudança no relacionamento entre os seres humanos, demais seres vivos, empresas e o meio ambiente. É preciso desenvolver conhecimentos, habilidades, perspectivas e valores. As escolas de administração são chamadas a assumir um papel de liderança e rever suas abordagens, seu currículo e suas práticas, tendo a sustentabilidade como um valor transversal, independente da posição ou especialidade que o administrador irá assumir. Esse trabalho aborda o significado da educação para sustentabilidade no contexto da formação do administrador de empresas, considerando que o conceito de desenvolvimento sustentável ainda está em construção. Contempla forças externas às instituições de ensino superior que incentivam e apoiam o movimento. Busca-se coletar e refletir sobre o que especialistas colocam como características e requisitos da educação para o desenvolvimento sustentável e como as escolas de administração têm inserido o tema no currículo. Não há receita, mas há caminhos apontados por autores como facilitadores da sustentabilidade no ensino superior. Palavras-chave: sustentabilidade, ensino superior, administrador, educação para sustentabilidade.
  • 6. 6 AGRADECIMENTOS À Caroline Zanarotti Prestes Rosa, Heloise Zanarotti, Luiz Edmundo Prestes Rosa e Rodrigo Pascual Roncero pela dedicação, paciência e contribuições. Aos autores estudados e todas as pessoas motivadas em fazer desse um mundo melhor para todos. A equipe de Desenvolvimento Sustentável do Santander e todos os parceiros envolvidos, que com que paixão tem aberto espaço e se empenhado em contribuir para o avanço do tema.
  • 7. 7 SUMÁRIO INTRODUÇÃO..........................................................................................................................8 CAPÍTULO 1 - EDUCAÇÃO PARA SUSTENTABILIDADE..............................................13 1.1. A sustentabilidade........................................................................................................13 1.2. A educação para sustentabilidade no contexto da formação do administrador de empresas.......................................................................................................................15 CAPÍTULO 2 - FOMENTO À EDUCAÇÃO PARA SUSTENTABILIDADE NO ENSINO DE ADMINISTRAÇÃO...........................................................................................................19 2.1 Principles for Responsible Management Education (PRME) ....................................20 2.2 Incentivo do mercado...................................................................................................23 CAPÍTULO 3: O NOVO PARADIGMA.................................................................................26 3.1 Abordagens que a educação para sustentabilidade propõe ..........................................28 3.2 Interdisciplinaridade......................................................................................................32 CAPÍTULO 4: COMO A SUSTENTABILIDADE É ABORDADA NO ENSINO DE ADMINISTRAÇÃO.................................................................................................................35 CAPÍTULO 5: CAMINHOS PARA FACILITAR A INSERÇÃO..........................................44 5.1 Formação e valorização dos docentes...........................................................................45 5.2 Pesquisa.........................................................................................................................46 5.3 Engajamento e participação dos públicos de interesse.................................................48 CONCLUSÃO..........................................................................................................................51 BIBLIOGRAFIA......................................................................................................................56
  • 8. 8 INTRODUÇÃO Sustentabilidade é um compromisso com valores e uma visão pragmática da condição da vida. Esse ideário é construído à medida que se reconhece que premissas que nortearam a organização da sociedade e a economia estavam equivocadas. Uma delas é a concepção de que o meio ambiente é infinito ou substituível por tecnologia. A tecnologia pode melhorar a eficácia do uso de recursos naturais, mas não eliminá-lo. Observe o exemplo da tendência à virtualização, que ainda requer materiais e recursos minerais para laptops, I-Pads, celulares, servidores e torres de transmissão. Somos natureza. Nossa existência está atrelada a uma série de trocas com o meio ambiente: respiração, alimentação, água. Serviços ambientais menos evidentes, como regulação do clima e formação dos solos, são vitais para qualidade de vida e, em algumas situações, para sobrevivência. O sistema da vida é complexo e não linear. Uma teia delicada de inter-relações autorreguladas em um sistema fechado: as trocas de matéria ocorrem sem que haja desperdícios ou entradas e saídas relevantes da biosfera. Fazemos parte de um planeta único e finito, do qual dependemos totalmente (CECHIN; VEIGA, 2010). A economia, por outro lado, é um sistema aberto: depende de troca de matéria e energia com o seu meio para girar. Porém, ensina-se o contrário, que a economia é o grande sistema e o meio ambiente é sua parte, à disposição. É natural que as teorias econômicas não consigam prever a destruição dos sistemas naturais como se observa hoje. Evidências de que a economia está em conflito com a natureza são claras. Nos noticiários, o colapso da pesca, a diminuição das florestas, a erosão do solo, as secas e enchentes, a diminuição de água potável. O motivo? Foi criado um modelo econômico em conflito com o sistema que o suporta e do qual depende (BROWN, 2009; CECHIN; VEIGA, 2010). O modelo de crescimento e produção linear, baseado em processos de extração, produção, consumo e descarte, não considera o funcionamento dos ecossistemas. Na natureza os
  • 9. 9 processos são cíclicos, não há lixo (IBGC, 2007). Um modelo linear não se sustenta no longo prazo quando está submetido a uma lógica cíclica (BROWN, 2009). A ciência aponta que, quando um subsistema funciona contra as regras do sistema a qual pertence, faz com que ambos sofram, com o risco de colapso. É como uma doença no organismo. São muitos os avanços alcançados desde a revolução industrial, seja no campo da ciência, medicina, tecnologia, produção e agricultura. No entanto, não é toda a humanidade que desfruta de bem-estar. Parte da população observou progressos, enquantos muitos se encontram presos em um sistema reprodutor de pobreza e desigualdade social, sem acesso a educação e saúde de qualidade, em alguns casos até de direitos humanos (BANERJEE 2003; STEIN, 2010). A proposta não é negar ou desvalorizar o que foi conquistado, porém há de se admitir que o paradigma hegemônico da produção econômica vive hoje uma profunda crise e que o modelo empregado até aqui não oferece mais as respostas que precisamos (SEM, 1999 apud CARREIRA, 2012). A humanindade chegou em um ponto de evolução que lhe permite perceber que não estamos sendo capazes de intervir, corretamente, para resolver a gama de problemas econômicos, sociais e ambientais que enfrentamos (STEIN, 2010) e tampouco desenvolver senso de oportunidade frente a essa nova consciência que passa a emergir. É inegável o papel que as empresas representam hoje nesse modelo. Para Hart (2006), à medida que adentramos o novo século, as empresas se destacam como as instituições mais poderosas do planeta. A realidade atual desafia as corporações a repensar a própria lógica corporativa de se fazer negócios, não se baseando mais na busca exclusiva e exaustiva pelo lucro, mas tentando compreender seu verdadeiro papel. Sustentabilidade não é a negação do lucro e do valor econômico. A dimensão econômica é um pilar fundamental, que jamais deve ser desconsiderado. O desenvolvimento sustentável propõe que o econômico pode e deve ser equilibrado com valores sociais e ambientais. O valor econômico-financeiro é um meio que visa e viabiliza a continuidade de bens e serviços importantes, o bem-estar individual e social e que deve estar em equilíbrio com a natureza. Não é um fim em si próprio.
  • 10. 10 Gadotti (2009) aponta a educação como meio para superarmos a crise civilizatória. Ele coloca a educação para o desenvolvimento sustentável voltada para repensar o estilo de vida. É necessária uma mudança na educação para compreendermos e mudarmos o relacionamento entre os seres humanos, demais seres vivos e o planeta. É preciso desenvolver conhecimentos, habilidades, perspectivas e valores que inspirem a percepção de que cada um de nós tem o poder e a responsabilidade de introduzir mudanças positivas em escala global (UNESCO, 2005). Sustentabilidade foi colocada como uma questão de valores porque instiga o questionamento de pressupostos e modelos que marcaram a sociedade moderna até hoje, provocando um novo balanceamento de princípios. É um compromisso com valores porque sugere um processo de aprendizagem de como tomar decisões que consideram todas as formas de vida e o futuro a longo prazo. Dá espaço para um novo sentido e propósito para indivíduos e sociedade. É também uma visão pragmática porque demanda lidar com a realidade a partir do entendimento de “regras inevitáveis” que estamos submentidos: às condições da vida na Terra. Sugere um processo de aprendizagem que auxilie as pessoas a entenderem melhor o mundo em que vivem, compreendendo a complexidade e interconexão das questões que enfrentamos, para, a partir desse aprendizado, construir propostas para a sociedade e economia. É um desafio porque incita que algumas soluções utilizadas até hoje, não estão em consonância com essa nova visão. Por outro lado, provoca uma nova perspectiva muito inspiradora e o aprendizado contínuo na busca por soluções1 aos problemas que temos. Reconhecendo a importância da educação para a sustentabilidade, a Cúpula Mundial sobre o Desenvolvimento Sustentável, que ocorreu em Johannesburgo em 2002, recomendou à Assembléia Geral das Nações Unidas o estabelecimento da Década da Educação para o Desenvolvimento Sustentável, definida entre os anos de 2005 e 2014. Nesse contexto, em que as educação e as empresas tornam-se elementos chave para a mudança, surge a pergunta: os administradores estão sendo preparados para lidar com os complexos desafios da nossa era de forma transformadora e propositiva? Os cursos de 1 Por exemplo, saiba mais da biomimética. Referência: http://biomimicry.net/ (em inglês)
  • 11. 11 administração estão formando os futuros profissionais para a sustentabilidade? Em que profundidade? Para tentar responder as perguntas acima, buscou-se reunir diferentes pontos de vista de pesquisadores, estudiosos, autores e instituições que têm se dedicado a essa temática. Por exemplo, Sandra Lays Gathás Carvalho (2001), que conduziu uma pesquisa com 17 instituições de ensino superior brasileiras de renome, entrevistando 20 pessoas (15 coordenadores de curso, 2 diretores de curso, 1 vice-diretor e 2 professores). Seu objetivo era discutir os significados de educação para sustentabilidade nas instituições de ensino superior e sua implicação na formação de novos administradores. Ela também conduziu uma extensa pesquisa de referencial teórico analisando as tendências mundiais no tema. Duas publicações foram muito utilizadas. Elas são baseadas em estudos com universidades signatárias do PRME (Principles for Responsible Management Education), iniciativa que será explicada ao longo do trabalho. Uma delas é o Integrating Sustainability into Business Schools – Analysis of 100 UN PRME Sharing Information on Progress (SIP) reports2 , de Godemann et al (2011). Esse estudo dedicou-se a entender como a sustentabilidade está sendo integrada em cem escolas internacionais de negócio que declaram seu compromisso com o desenvolvimento do trabalho. A outra publicação é The Inspirational Guide for the Implementation of PRME3 (PRME, 2012), lançada no 3º Fórum Global para a Educação em Gestão Responsável, na Conferência das Nações Unidas em Desenvolvimento Sustentável (Rio+20) e no Fórum Rio+20 do Pacto Global. O livro analisa os avanços do tema em instituições signatárias da iniciativa. Além disso, também se buscou informações na UNESCO (2005) e estudiosos do tema como Jacobi, Raufflet e Arruda (2011), Demajorovic e Silva (2012), que têm estudado e publicado sobre a temática por muito tempo. 2 Integrando a Sustentabilidade nas Escolas de Negócio – Análise de 100 relatórios de compartilhamento de progresso (SIP) do PRME da ONU (tradução nossa). 3 Guia motivacional para a implementação do PRME (tradução nossa).
  • 12. 12 No capítulo 01, educação para sustentabilidade, será abordada a discussão do conceito de sustentabilidade e a importância de que os administradores sejam formados para esse propósito. No capítulo 02, serão apresentadas forças externas às instituições de ensino superior, que fomentam e apoiam que os princípios do desenvolvimento sustentável sejam inseridos na educação. Esse incentivo é relevante para a aceleração do movimento e reconhecimento de sua importância. Em seguida, no capítulo 03, será tratado o que representa o novo paradigma da educação para sustentabilidade e o que requer em termos de abordagem de ensino. No capítulo 04, será tratado como a sustentabilidade é abordada no ensino superior, analisando as estratégias para inserção de sustentabilidade no currículo. Para finalizar, no capítulo 05, abordaremos alguns caminhos apontados por autores como facilitadores da sustentabilidade no ensino superior. Iremos refletir sobre o papel dos docentes, da pesquisa e da participação dos públicos de relacionamento. Sustentabilidade no ensino superior é um tema amplo. Como o foco é a formação do administrador, a ênfase é no ensino. Trata-se de um estudo teórico-conceitual, sem pretensão de abarcar o tema em sua totalidade. O objetivo do estudo é reunir diferentes pontos de vista a respeito da temática, contribuir para reflexão e sobre possíveis caminhos.
  • 13. 13 CAPÍTULO 1 - EDUCAÇÃO PARA SUSTENTABILIDADE Esse capítulo dedica-se a discussão do conceito de sustentabilidade e o que ele representa para as empresas. Em seguida será abordada a importância da educação para a sustentabilidade na formação do administrador de empresas. 1.1 A sustentabilidade Sustentabilidade é um termo que abarca diversas definições, existe uma variedade de expressões associadas ao tema (CARVALHO, 2011). De acordo com Holmberg e Sandbrook (1992 apud BANERJEE, 2003), há mais de cem definições sobre desenvolvimento sustentável. O Relatório Brundtland, conhecido como “Nosso Futuro Comum”, fruto do encontro do World Comission on Environment and Development4 , em 1987, é referência para a conceituação do termo, embora provoque muita discussão e desacordo: desenvolvimento sustentável é “aquele que atende às necessidades do presente sem comprometer a capacidade das futuras gerações atenderem suas próprias necessidades” (WCED, 1987, p. 14, tradução nossa). Em 1994, John Elkington (2000) propôs o conhecido conceito do Triple Bottom Line. Bottom line5 é um termo em inglês que se refere ao lucro, fazendo alusão à última linha dos demonstrativos financeiros. O autor do famoso tripé da sustentabilidade sugere que as empresas, além de se preocuparem com o desempenho financeiro, devem obter resultados ambientais e sociais positivos, por isso Triple6 Bottom Line ou “3Ps”, como se tornou conhecido (people, planet, profit7 ). Nessa linha, as empresas devem buscar de forma equilibrada a prosperidade econômica, a qualidade ambiental e a justiça social. Essa proposta difundiu-se nas organizações porque tornou o conceito mais palpável ao ambiente dos negócios. 4 Em português: Comissão Mundial sobre o Meio Ambiente e Desenvolvimento 5 “Linha de baixo” (tradução nossa) 6 Em português: triplo 7 Em português: pessoas, planeta e lucro
  • 14. 14 O debate e críticas sobre o conceito de sustentabilidade estão longe de terminar. Independente das propostas de estudiosos e militantes de diversos campos, sustentabilidade ainda é um conceito em construção. Porém, há um crescente consenso entre os estudiosos quanto suas dimensões e sobre a “insustentabilidade da sociedade” atual (CARVALHO, 2011). Existem pesquisadores e teóricos, que aprofundam e, por vezes, expandem8 a proposta de Elkington. No entanto, convergem ao reconhecer que as dimensões ambientais, sociais e econômicas são interdependentes e fundamentais no ideário de sustentabilidade, tendo a ética e a responsabilidade como pano de fundo. O desafio de equilibrar as dimensões sociais e ambientais, na busca pelo lucro, trouxe às organizações um contexto mais diversificado do que antes, quando o foco era apenas o resultado financeiro. O que já representa uma ruptura fundamental com o sistema capitalista, que sempre considerou o crescimento econômico como o único objetivo de um empreendimento (CARREIRA, 2010). Pesquisadores, praticantes e especialistas concordam em que a sustentabilidade está ligada a uma mudança de valores, que desde a Revolução Industrial. O paradigma econômico e a cultura individualista da sociedade capitalista estão em xeque diante dos limites do planeta, o que impõe a necessidade de desenhar um novo modelo de desenvolvimento. Por isso, independente da definição utilizada, a proposta da sustentabilidade representa uma mudança complexa na qual as empresas tem o papel protagonista, por estarem no centro do sistema capitalista e ditarem regras de mercado, produção e consumo (CARREIRA, 2010). Estamos diante de uma mudança cultural profunda que nos leva a rever a relação não só da empresa, mas também dos indivíduos, com a sociedade e com o planeta. Novos valores definem nova relação, a geração presente torna-se responsável por garantir condições de bem- estar ambiental, social e econômico para futuras gerações. Isso implica em fazer com que as pessoas que trabalham nas empresas percebam esses novos valores e os incorporem, de modo a traduzi-los em processos, práticas e comportamentos éticos (CARREIRA, 2010). 8 Sachs (2008) e outros propõem outras dimensões, como a cultural, política, territorial, individual, etc.
  • 15. 15 Dessa forma, as escolas de negócio apresentam um papel fundamental na formação de líderes que tenham a ousadia de mudar as empresas. É necessário que os estudantes sejam expostos a reflexões éticas e sobre responsabilidades como cidadãos e profissionais. Formados para serem conscientes do impacto de decisões, capazes de considerar dimensões sociais, econômicas e ambientais de forma integrada. Hábeis para transformarem os desafios da sociedade contemporânea em valor para negócios e para a sociedade, trabalhando por uma economia global inclusiva e sustentável. Antes de avançar para o próximo item, não se pode deixar de mencionar que também há uma grande discussão sobre as diferenças entre sustentabilidade e desenvolvimento sustentável. Sendo a primeira entendida por muitos como o “estado da arte” a ser alcançado e o segundo como a “trilha” para chegar lá. Essa visão é suportada por Sterling (2001 apud CARVALHO, 2011), mas como não poderia deixar de ser, também gera polêmica. Nesse trabalho sustentabilidade e desenvolvimento sustentável serão utilizados como sinônimos. Escolas de negócio e faculdades de administração também serão consideradas equivalentes para se referir ao ensino de administração e gestão no ensino superior. No próximo item abordaremos a importância da educação para sustentabilidade para a formação do administrador. 1.2 A educação para sustentabilidade no contexto da formação do administrador de empresas Segundo Stein (2010, p. 23), a educação para o desenvolvimento sustentável já era reconhecida como condição necessária para a sobrevivência humana há mais de três décadas. Ele cita que desde a Conferência das Nações Unidas, em junho de 1972, em Estocolmo, na Suécia, o tema é colocado como relevante para a vida humana. Desde então, ocorreram diversos eventos mundiais em que a Organização das Nações Unidas tratou a temática. Essa ocorrência regular reforça que há uma evolução na consciência global da importância da educação para atingir melhores condições de vida e sobrevivência. Para Carvalho (2011), o atual cenário de insustentabilidade tem levado indivíduos, pesquisadores, educadores, governos e organizações a crer que a educação para a
  • 16. 16 sustentabilidade deve ocupar um lugar central na vida econômica e social das nações. Ela cita que na visão de diversos autores, como Huclke (1996), Sterling (2001), Orr (2004) e McNamara (2010), a educação para sustentabilidade é propulsora de mudanças para o futuro ambiental, social e econômico do planeta. Um reconhecimento claro à importância da temática foi o estabelecimento da Década da Educação para o Desenvolvimento Sustentável (de 2005 a 2014) pela Assembléia Geral das Nações Unidas, em resposta à recomendação da Cúpula Mundial sobre o Desenvolvimento Sustentável, em Johannesburgo, em 2002. Para Jacobi, Raufflet e Arruda (2011), desde os anos 1990 há iniciativas internacionais e nacionais para promover a sustentabilidade nas instituições de ensino superior. Mas, quando tratamos do ensino de administração e das escolas negócio, o fenômeno é recente (GODEMANN et al., 2011). O tema ganhou destaque quando as empresas passaram a ser consideradas relevantes nas diversas crises sociais, ambientais e financeiras dos últimos anos e acadêmicos e executivos começaram a apontar a sustentabilidade como imperativa para a sobrevivência dos negócios e da sociedade. Os escândalos financeiros expuseram o ensino da administração a críticas sob diversos aspectos, como ser desvinculado da prática e treinar em uma perspectiva econômica, às custas de abordagens mais integradas (GHOSHAL, 2005; MINTZBERG, 2004 apud JACOBI; RAUFFLET; ARRUDA, 2011). Reconheceu-se ser crucial que as escolas de administração assegurassem de forma proativa que seus formandos fossem educados dentro dos parâmetros da ética e desafiados a integrar a sustentabilidade em suas decisões (GODEMANN et al., 2011). Sendo necessário formar administradores conscientes, que busquem decisões embasadas em variáveis econômicas, sociais e ambientais, de forma equilibrada e comprometida com a construção de uma sociedade mais sustentável (TELLES, 2011). Diversos estudiosos corroboram esse entendimento. Para Carvalho (2011), percebe-se um interesse crescente pela educação para sustentabilidade nas escolas de administração. Dentre os motivos, está justamente o papel central na formação de uma nova geração de profissionais capazes de pensar e agir por princípios que vão muito além das preocupações econômicas.
  • 17. 17 Stein (2010) defende que alinhar os cursos de administração de empresas às exigências de um modelo de desenvolvimento sustentável tem potencial significativo para melhorar as condições de sobrevivência no planeta. O ensino de administração visa a formação de profissionais preparados para administrar organizações que têm impacto relevante no modelo de desenvolvimento que adotamos. Para Telles (2011), tendo em vista a problemática gerada pelas empresas, é urgente que seja inserida na formação dos administradores a temática da sustentabilidade para que novas gerações de líderes sejam desenvolvidas e empresas sejam conduzidas por gestores mais conscientes. Carvallho (2011) cita que segundo uma imensidade de autores, como Calder e Clugston (2003), McNamara (2010), Rusinko e Sama (2010), Sheriberg (2002) e Sterling (2001), as instituições de ensino superior são chamadas a tomar um papel de liderança e a servirem de modelo na adoção e na instituição de práticas sustentáveis. As instituições de ensino superior não devem apenas educar as futuras gerações para serem tomadores de decisão; têm papel importante na trajetória para um futuro global mais sustentável (JACOBI; RAUFFLET; ARRUDA, 2011). Anacleto, Boszczowski e Fernandes (2009 apud CARVALHO, 2011) propõem que ainda que a educação para a sustentabilidade perpasse por todos os graus de ensino. É na educação superior que se observa uma grande expectativa quanto ao papel de inovar o sistema educacional vigente, de modo a atrelar a formação acadêmica aos princípios do desenvolvimento sustentável. Surgem uma série de movimentos, pactos, iniciativas e incentivos para que as escolas de administração e gestão se adaptem ou até mesmo se reinventem para atender as complexas demandas da sociedade. Antes de avançar para o próximo capítulo, é preciso marcar a distinção entre o que chamaremos de educação de sustentabilidade e educação para sustentabilidade, o foco deste trabalho. As duas são importantes e têm seu momento e seu papel. Entende-se educação de sustentabilidade como educação sobre o tema da sustentabilidade, aquela para informar e
  • 18. 18 ensinar sobre o desenvolvimento sustentável e seus conteúdos relacionados. Uma educação básica de sustentabilidade é premissa para a educação para sustentabilidade. Esse trabalho está dedicado a tratar da educação dos futuros gestores para a sustentabilidade. A educação para sustentabilidade busca criar as condições para que os alunos sejam capazes de promover o desenvolvimento sustentável no desempenho de sua profissão, independente de querer se tornar em um profissional da área de sustentabilidade. Trata-se da necessidade de qualificar os alunos para um posicionamento crítico ante a crise socioambiental, da transformação de hábitos e práticas sociais e da formação de uma cidadania em seu significado mais abrangente (JACOBI; RAUFFLET; ARRUDA, 2011). A educação para sustentabilidade não significa apenas entender os princípios básicos de sustentabilidade, mas ser capaz refletir sobre eles e de incorporá-los no dia a dia. A premissa que norteia o paradigma proposto é o diálogo de saberes que permita formar um pensamento crítico, criativo e sintonizado com a necessidade de respostas para o futuro, capaz de analisar as complexas relações entre os processos naturais e sociais e de atuar no ambiente em uma perspectiva global, respeitando as diversidades socioculturais (JACOBI, 2005). No próximo capítulo iremos abordar os diferentes incentivos e pressões que as instituições de ensino superior têm recebido para educar para a sustentabilidade.
  • 19. 19 CAPÍTULO 2: FOMENTO À EDUCAÇÃO PARA SUSTENTABILIDADE NO ENSINO DE ADMINISTRAÇÃO Como visto no capítulo anterior, é necessário que os futuros administradores não sejam apenas educados sobre sustentabilidade (princípios e temas); mas também para a sustentabilidade, para que suas futuras decisões de negócios sejam propulsoras das inovações necessárias para o desenvolvimento sustentável. Nesse contexto, surgem iniciativas importantes para fomentar a sustentabilidade no ensino superior. Elas vêm de todos os lados: iniciativa pública, de organizações não governamentais (CARVALHO, 2011), inclusive das próprias instituições de ensino e do setor privado. Para Jacobi, Raufflet e Arruda (2011), a adoção de novas teorias nos cursos de administração surge na maioria das vezes de fora, de uma necessidade prática ou de uma demanda das empresas. Diversas organizações intergovernamentais e não governamentais começaram a promover o debate e a divulgar declarações com o intuito de comprometer indivíduos, governos e instituições. Cada vez mais faculdades passaram a aderir e ser signatárias de declarações de compromisso com a sustentabilidade (CARVALHO, 2011). Wright (2004 apud CARVALHO 2011) afirma que mais de mil presidentes e vice-chanceleres de universidades já assinaram algum tipo de declaração, como Halifax, Swansea, Copernicus Charter, Tailloires, Kyoto, Lünerburg. Entre as iniciativas, destacam-se os Principles for Responsible Management Education (PRME) no campo de administração de empresas (JACOBI; RAUFFLET; ARRUDA, 2011), que será abordado no próximo item. Como mencionado anteriormente, o próprio mercado também é uma influência relevante, por isso, em seguida ao PRME, também observaremos como as empresas são propulsoras desse movimento. A análise dessas forças se torna relevante porque a pressão para inserção de sustentabilidade no ensino superior tem se mostrado ocorrer especialmente de “fora para dentro”. E quando de
  • 20. 20 “dentro para fora”, de iniciativas individuais de docentes pouco articuladas com o todo institucional (JACOBI; RAUFFLET; ARRUDA, 2011). O estímulo externo estimula que o tema ganhe relevância na instituição, sendo inserido de forma articulada e sistêmica, fruto de um processo reflexivo. 2.1 Principles for Responsible Management Education (PRME) Os Princípios para Educação Empresarial Responsável ou Princípios para Educação em Gestão Responsável (PRME - Principles for Responsible Management Education), como usualmente são traduzidos, foram lançados como uma reação à série de desafios que as faculdades de administração enfrentam hoje e para auxiliá-las com as demandas da sociedade por uma economia responsável. É uma iniciativa do Pacto Global da Organização das Nações Unidas com a missão de defender e inspirar a educação para a gestão responsável, a pesquisa e a liderança de ideias inovadoras (PRME, 2012, tradução nossa). São seis princípios inspirados nos dez princípios do Pacto Global das Nações Unidas e procuram estabelecer um processo de melhoria contínua entre as instituições de ensino de administração para desenvolver uma nova geração de líderes de negócios, capazes de gerir as complexas provocações impostas às empresas pela sociedade contemporânea. Contando com as mais avançadas e consolidadas escolas de negócio e instituições do ensino superior de todo o mundo, desde que foi lançado, o PRME cresceu e inclui mais de 400 signatários, que se comprometem com avanços estabelecidos pelos princípios (PRME, 2012). Conforme declarado no site da iniciativa, a responsabilidade corporativa e a sustentabilidade entraram no meio acadêmico, mas não foram inseridas no “mainstream9 ” da educação. É preciso estimular o olhar por novos horizontes e paradigmas. Os princípios, portanto, são um chamado global para escolas de negócio de todo o mundo, gradualmente, adaptarem seus currículos, pesquisa, aulas, metodologias e estratégias 9 Mainstream é um termo em inglês que pode ser entendido como um pensamento ou crença corrente da maioria da população.
  • 21. 21 institucionais aos temas da responsabilidade social corporativa e sustentabilidade. São um guia para qualquer instituição que queira incorporar sustentabilidade de forma sistêmica (PRME, 2008, tradução nossa): Princípio 1. Propósito: Nós vamos desenvolver as capacidades dos estudantes para serem futuros geradores de valor sustentável para negócios e sociedade no geral e para trabalharem a favor de uma economia global sustentável e inclusiva. Princípio 2. Valores: Nós vamos incorporar nas nossas atividades acadêmicas e currículos os valores da responsabilidade social global conforme apresentados em iniciativas internacionais, como o Pacto Global da Organização das Nações Unidas. Princípio 3. Método: Nós vamos criar moldes, materiais, processos e ambientes educacionais que possibilitem experiências eficazes de aprendizado para liderança responsável. Princípio 4. Pesquisa: Nós vamos nos engajar em pesquisas conceituais e empíricas que melhorem nossa compreensão sobre o papel, a dinâmica e o impacto de empresas na criação de valores de sustentabilidade social, ambiental e econômica. Princípio 5. Parceria: Nós vamos interagir com administradores de empresas para ampliar nosso conhecimento sobre desafios em cumprir responsabilidades sociais e ambientais e explorar maneiras eficazes de enfrentá-los. Princípio 6. Diálogo: Nós facilitaremos e apoiaremos diálogo e debate entre educadores, empresas, governo, consumidores, mídia, organizações da sociedade civil e outros grupos interessados e investidores (stakeholders) sobre questões críticas relacionadas à responsabilidade e sustentabilidade social global. Ao final da declaração dos princípios há um destaque, que Godemann et al. (2011) intitulam de sétimo princípio: “nós entendemos que nossas próprias práticas organizacionais devem servir de exemplo dos valores e atitudes que nós transmitimos aos nossos estudantes” (PRME, 2008, p.7, tradução nossa). A afirmação expressa a necessidade das práticas organizacionais das universidades serem coerentes com o compromisso com a sustentabilidade. Os autores
  • 22. 22 afirmam que tem se tornado comum que as escolas de negócio reportem informações sobre a integração da sustentabilidade em suas operações. Para ganhar o status de signatária, as instituições de ensino se comprometem com avanços direcionados pelos princípios, que por serem abrangentes carecem que as escolas encontrem seus próprios caminhos para inseri-los em sua realidade. A iniciativa do PRME, enquanto organização, oferece grupos de trabalho, estudos e publicações, além de encontros para aprofundar a discussão e gerar compartilhamento de experiências, como por exemplo, nos chamados Sharing Information on Progress (SIP) reports10 . Como o nome diz, por meio desses relatórios, os signatários reportam seus esforços e conquistas em relação aos princípios (PRME, 2012). Faremos referência a esse documento como SIP ou relatório SIP ao longo desse trabalho. O SIP tem dois objetivos: apoiar o compartilhamento de experiências e boas práticas entre os signatários e interessados no tema e fornecer uma prestação de contas regular a todas as partes interessadas. O relatório deve ser enviado a cada dois anos e é prerrogativa para ser considerado signatário. As instituições são encorajadas a enviar anualmente e caso não enviem no prazo de vinte e quatro meses, perdem o status de signatária. Não exclusivamente, mas de forma complementar, ao longo desse estudo, analisaremos os esforços das faculdades de administração em inserir sustentabilidade com base em dois estudos que têm as escolas signatárias do PRME como base. Um deles é o Integrating Sustainability into Business Schools – Analysis of 100 UN PRME Sharing Information on Progress (SIP) reports11 , de Godemann et al (2011). Esse estudo analisa criticamente o conteúdo dos cem primeiros relatórios SIP submetidos ao site do PRME. Busca melhorar o entendimento de como a sustentabilidade está sendo integrada nas escolas internacionais de negócio signatárias do PRME. 10 Podemos traduzir como Relatórios de Compartilhamento de Informações sobre o Progresso (tradução nossa) 11 Integrando a Sustentabilidade nas Escolas de Negócio – Análise de 100 relatórios de compartilhamento de progresso (SIP) do PRME da ONU (tradução nossa).
  • 23. 23 O projeto faz parte do Leading Sustainable Development in Higher Education, uma iniciativa da HEFCE – Higher Education Funding Council England, sendo resultado da colaboração do International Centre for Corporate Social Responsibility, Nottingham University Business School e do Centre for Business, Organisations and Society, University of Bath School of Management. Seu objetivo é prover orientação para que as escolas de negócio comuniquem e integrem sustentabilidade nos programas de educação, pesquisa, práticas e processos organizacionais. O segundo é de iniciativa do próprio PRME que lançou The Inspirational Guide for the Implementation of PRME12 , em junho de 2012 no 3º Fórum Global para a Educação em Gestão Responsável, na Conferência das Nações Unidas em Desenvolvimento Sustentável (Rio+20) e no Fórum Rio+20 do Pacto Global (PRME, 2012). O livro analisa os avanços do tema em instituições signatárias e busca uma implementação mais completa do PRME, apontando exemplos vivos da aplicação dos Princípios nas escolas e universidades parceiras. 2.2 Incentivo do mercado Como citado, não são apenas as organizações intergovernamentais e não governamentais que incentivam a inserção de sustentabilidade no ensino superior. As empresas têm um papel relevante. O setor privado, ao ser cobrado pela sociedade para introduzir a sustentabilidade na forma de fazer negócios, passou a demandar da Academia a formação de profissionais que lhes auxiliem nesse processo. Essa é uma pressão muito importante porque as escolas de administração estão atentas em atender às exigências do mercado. Shriberg (2002, apud CARVALHO 2011) aponta que um dos fatores para que as faculdades se tornem mais sustentáveis é aumentar as chances de seus estudantes conseguirem emprego, uma vez que o interesse pela sustentabilidade tem aumentado cada vez mais no campo empresarial. 12 Guia motivacional para a implementação do PRME (tradução nossa).
  • 24. 24 Carvalho (2011), que conduziu um estudo com coordenadores de curso de administração e diretores de 17 instituições de ensino superior brasileiras de renome, constatou que há preocupação entre eles de que o egresso seja preparado para enfrentar um mercado de trabalho que já exige uma formação mais completa, multidimensional, que entende a sustentabilidade como uma vantagem competitiva. Seu estudo leva a crer que quanto maior a proximidade da instituição de ensino do mercado, maior a pressão para introduzir a sustentabilidade no currículo. Percebe-se, portanto, uma preocupação mercadológica por parte das instituições de ensino, que demonstram interesse em inserir sustentabilidade para não perder competitividade acadêmica. Também se destacam iniciativas do setor empresarial que buscam incentivar e apoiar as universidades, desenvolvendo iniciativas exclusivas para esse fim. As iniciativas do Banco Santander Brasil são emblemáticas. O Banco apresenta uma série de projetos de estímulo à sustentabilidade no ensino superior, como os Prêmios Santander Universidades têm a sustentabilidade como requisito transversal nos editais dos diferentes prêmios. O Desafio Santander de Sustentabilidade, em 2010, propôs que os estudantes elaborassem projetos de inserção de sustentabilidade em suas universidades; o objetivo era estimulá-los para o tema, desenvolver competências pessoais e profissionais e propiciar uma oportunidade de vivenciarem a sustentabilidade na prática de forma propositiva, entendendo que esse é um tema que fará parte de qualquer profissão que assumam nos dias de hoje. Como os estudantes são uma importante força de promoção do tema dentro de suas instituições, essa forma de estímulo se mostra positiva para influenciar as instituições de ensino quanto ao tema. Já o Santander Práticas de Educação para Sustentabilidade é um prêmio, que tem como objetivo estimular a inserção de sustentabilidade de forma transversal no currículo obrigatório dos cursos de graduação de economia e administração. A iniciativa incentivou, disseminou e premiou casos práticos (experiências realizadas) de professores que inseriram sustentabilidade no currículo obrigatório desses cursos.
  • 25. 25 Alinhado ao escopo desse estudo, a iniciativa privilegiou incentivar a educação para sustentabilidade e não de sustentabilidade. O interessante da proposta é que não poderiam se inscrever disciplinas eletivas e disciplinas cujo plano de ensino fosse focado em sustentabilidade ou em temas como responsabilidade corporativa. A premissa é de que sustentabilidade não pode ser uma disciplina isolada ou optativa; para promover uma mudança de patamar quanto à consciência dos estudantes e torná-los líderes de negócios sustentáveis, a temática precisa permear todas as disciplinas do currículo universitário. O Banco declara a necessidade da formação de líderes de negócio com visão sistêmica e capazes de promover um mercado mais próspero, inovador, justo e ambientalmente equilibrado; apoiando e reconhecendo o papel estratégico das instituições de ensino superior. No próximo capítulo discutiremos o novo paradigma que a educação para a sustentabilidade representa.
  • 26. 26 CAPÍTULO 3 – O NOVO PARADIGMA O novo paradigma provoca questionamentos: quais os pressupostos das teorias que seguimos? Quais premissas sustentam nossa visão de mundo e a economia? Está correto privilegiar o resultado para um pequeno grupo no curto prazo em detrimento de um resultado negativo para todos no longo prazo? É ético gerar lucro para alguns às custas da socialização de custos para todos? O crescimento econômico, de fato, gera desenvolvimento? Quais são os critérios considerados no cálculo desse crescimento? Como os modelos produtivos poderiam se estruturar para garantir que a natureza continue provendo recursos e serviços tão importantes para a sociedade? Todos encontram no sistema atual a mesma oportunidade de se desenvolverem e atenderem suas necessidades? É possível um negócio ou sociedade triunfar por muito tempo em um ambiente que vai mal? Como nos sentimos em conviver com a violência? Que espaços estamos criando para a diversidade e o desenvolvimento das pessoas? Quais são as consequências de minhas ações ao seguir os preceitos estabelecidos? Será que porque hoje são aceitos, são éticos? São alinhados com meus valores? Eles promovem ou prejudicam a continuidade e qualidade da vida? Qual nosso projeto de sociedade? E se criássemos negócios que contribuam para a sociedade em sintonia com a natureza?Como eles seriam? Além disso, se hoje se reconhece que os sistemas ecológicos, sociais e econômicos são complexos e interdependentes, que conhecimentos e competências os profissionais precisam desenvolver? A que tipo de experiências, reflexões, métodos e espaços precisam estar expostos para desenvolvê-las? Que dilemas e oportunidades enfrentarão? Esses são alguns questionamentos que o novo paradigma da sustentabilidade apresenta. Para transformar a educação em ferramenta efetiva para a sustentabilidade é necessário fazer novas perguntas, questionar os modelos mentais vigentes e confrontar como a educação pensa a própria educação. Nota-se, como consenso entre os autores estudados, que o foco no pensamento econômico tem prevalecido no currículo dos cursos de administração. Para que outra concepção de educação, pautada pelo paradigma da sustentabilidade, possa se estabelecer no âmbito global, é indispensável o questionamento e a mudança de valores e crenças até então considerados paradigma dominante (TELLES, 2011; JACOBI; RAUFFLET; ARRUDA, 2011).
  • 27. 27 A educação para sustentabilidade requer o desenvolvimento de novas competências, sendo necessária uma mudança não apenas daquilo que se aprende, mas também no contexto e forma como se aprende (JACOBI; RAUFFLET; ARRUDA, 2011). Para Sterling (1996 apud CARVALHO, 2011), apenas com a mudança no paradigma da educação será possível responder aos desafios atuais. A educação se torna parte do problema quando, ao invés de ser um agente de mudança, encoraja o individualismo, estilos de vida e padrões de consumo insustentáveis, de forma direta e sem questionamento. Se o paradigma atual de crescimento econômico não for questionado, a educação estará se direcionando a “insustentabilidade” (STEIN, 2010), mesmo que insira conteúdos do tema no currículo ou em algumas práticas organizacionais. A formação dos administradores tornou-se essencialmente técnica e fragmentada. Os administradores são formados para enxergar os fenômenos organizacionais como eventos independentes, incapazes de perceber a dinâmica sistêmica de funcionamento da sociedade (LOPES, 2002 apud DEMAJOROVIC; SILVA, 2012, p 46), o que prejudica uma atuação consciente e eficaz. O novo paradigma exige compromissos mais profundos das escolas de administração. Torna- se preciso reavaliar o objetivo da educação, demandando um reexame de seus fundamentos e práticas (JACOBI; RAUFFLET; ARRUDA, 2011). Para ser coerente com o novo propósito, os autores estudados concordam que uma universidade deve integrar a sustentabilidade em todas suas dimensões e atividades, do conteúdo das aulas, à forma de ensinar e à gestão das operações, como o currículo, pedagogia, pesquisa, extensão, estrutura, gestão do campus, operações e práticas organizacionais, além dos relacionamentos. Dialogar e se aproximar dos diversos públicos de interesse, realizar parceiras com outros setores da sociedade, oferecer oportunidades para o envolvimento e desenvolvimento dos estudantes, docentes, corpo administrativo e comunidade do entorno são fundamentais. Trata-se de uma mudança sistêmica, que requer uma transformação profunda e duradoura nas políticas e práticas educacionais. Todas as dimensões se afetam mutuamente (CARVALHO, 2011).
  • 28. 28 Neste trabalho analisaremos o novo paradigma com foco na formação do administrador, no ensino. Demais dimensões que não são foco, não serão aprofundadas; porém serão mencionadas, já que quando a sustentabilidade é adotada como um princípio central, acaba desencadeando mudanças em todos os níveis da instituição. A inserção desses valores, de forma consistente e compreensível, no core da educação da administração resulta num processo dinâmico de transformação. Significa uma mudança inter-relacionada de diferentes frentes, já que a mudança em um aspecto leva à mudança em outro (PRME, 2012). Escolheu-se o foco no ensino porque se entende que proporcionar oportunidades de aprendizagem no currículo das instituições de ensino superior é de extrema relevância para promover essas mudanças. Nota-se que, enquanto cresce o consenso de que os programas educacionais precisam mudar para preparar os estudantes para o que encontrarão como profissionais, a integração da sustentabilidade nas propostas pedagógicas ainda se mostra um enorme desafio (ATWATER et al., 2008 apud GODEMANN et al. 2011; SPRINGETT, 2005). O currículo é cerne da questão do processo de inserção de sustentabilidade no ensino superior e é onde predominam incertezas (JACOBI; RAUFFLET; ARRUDA, 201; GODEMANN et al., 2011). Rever o currículo, elaborando propostas pedagógicas dinâmicas que atendam aos novos desafios no campo da gestão e da sustentabilidade não é um processo simples. Requer que as instituições invistam na formação de funcionários e incluam novas ferramentas de ensino e aprendizagem, revisem conteúdos e cursos, desenvolvam novos cursos em um processo que incorpore os princípios da sustentabilidade na instituição como um todo (TILBURY, 2004; CORCORAN; WALS, 2004 apud JACOBI; RAUFFLET; ARRUDA, 2011). 3.1 Abordagens que a educação para sustentabilidade propõe Como já mencionado, a formação para sustentabilidade não requer apenas novos conhecimentos. Solicita o exame de valores, novas formas de pensar, articular saberes e habilidades; por isso novas formas de aprender. Além do desenvolvimento de competências técnicas e analíticas, demanda o entendimento das variáveis e da dinâmica social e ambiental. O administrador que se vislumbra é um profissional do diálogo, que integra diferentes
  • 29. 29 contextos organizacionais e diferentes campos da atuação profissional (DEMAJOROVIC; SILVA, 2012, p 49) para solução de problemas e tomada de decisão. Há um aumento do uso de novos ambientes e métodos de aprendizagem que são mais apropriados para o ensino de temas complexos, não somente na sala de aula, mas também em experiências externas e diretas (PRME, 2012). Os autores estudados apontam nessa direção; a nova proposta de ensino e aprendizagem pressupõe o uso de estratégias e práticas diferenciadas, ocorre em situações vivenciais e têm o aprendiz como centro (CARVALHO, 2011). Longe de explorar o tema em sua totalidade, iremos abordar propostas que permitam perceber noções gerais do que esse novo paradigma propõe. O intuito é oferecer insumos para que o leitor reflita e avalie criticamente as estratégias das escolas em educar para sustentabilidade e rever o currículo. Hoje os estudantes são estimulados a tomar decisões para um pequeno grupo, priorizando a maximização de lucro no curto prazo (JACOBI; RAUFFLET; ARRUDA, 2011). Essa abordagem se contrapõe à visão educacional que caracteriza o desenvolvimento sustentável. As escolas de administração passam a ser provocadas a transformar a dinâmica de aprendizagem organizacional para que seja mais abrangente, crítica, participativa, transformativa e inclusiva. As práticas educativas sustentáveis apontam para propostas pedagógicas centradas na criticidade dos sujeitos, com vistas à mudança de comportamento e atitude, à organização social e participação coletiva. O novo paradigma implica nova percepção e valores, pensamento complexo aberto às indeterminações, à diversidade, à possibilidade de construir e reconstruir, em um processo contínuo de novas leituras e interpretações (JACOBI, 2005). É necessário haver diálogo de conhecimentos que formem um pensamento reflexível, criativo e sintonizado com a necessidade de propor respostas para o futuro, capaz de analisar as complexas relações entre os processos naturais e sociais e de atuar no ambiente em uma perspectiva global, respeitando as diversidades socioculturais (JACOBI, 2005).
  • 30. 30 A UNESCO corrobora essa visão. Declara que a educação para o desenvolvimento sustentável é um processo de aprendizagem de como tomar decisões que consideram o futuro a longo prazo; auxilia as pessoas de todas as idades a entenderem melhor o mundo em que vivem, compreendendo a complexidade e interconexão dos problemas (UNESCO, 2003 apud CARVALHO, 2011). Para criar compreensão entre os diferentes temas relacionados à sustentabilidade de forma interconectada com a realidade, é preciso utilizar e promover uma abordagem holística e interdisciplinar. Desenvolver conhecimentos, habilidades, perspectivas e valores que inspirem a percepção de que cada um de nós tem o poder e a responsabilidade de introduzir mudanças positivas em escala global (UNESCO, 2005). A educação deve propiciar o entendimento das múltiplas repercussões de ações e comportamentos, fortalecendo a capacidade de reflexão orientada para o futuro. Tornar os indivíduos aptos a compreender a si e a comunidade, buscando entender o próximo e os vínculos que os unem ao entorno natural e social (UNESCO, 2005). Resumindo, para a UNESCO (2005) a educação para o desenvolvimento sustentável reflete a preocupação por uma educação de alta qualidade e apresenta as seguintes características:  Ser interdisciplinar e holística: ensinar desenvolvimento sustentável de forma integrada em todo o currículo, não como disciplina à parte;  Visar aquisição de valores: ensinar a compartilhar valores e princípios fundamentados no desenvolvimento sustentável. Imprescindível que as normas assumidas – os valores e princípios – sejam explicitadas e possam ser analisadas, debatidas, testadas e aplicadas;  Desenvolver o pensamento crítico e a capacidade de encontrar solução para os problemas: ensinar a ter confiança ante os dilemas e desafios;  Recorrer à multiplicidade de métodos: ensinar a usar a palavra, a arte, debate, experiência e diversas pedagogias. É preciso ultrapassar a ideia do ensino como transmissão de conhecimento, enfocando que professores e alunos trabalhem juntos;  Estimular o processo participativo de tomada de decisão: fazer que os alunos participem das decisões sobre como irão aprender;
  • 31. 31  Ser aplicável: integrar as experiências de aprendizagem na vida pessoal e profissional cotidiana;  Ser localmente relevante: abordar tanto os problemas locais quanto os globais, usando a linguagem que os alunos usam. É preciso ter em conta que valores, diversidade, conhecimento, linguagens e visão de mundo são associados à cultura e influenciam fortemente o modo de abordar os distintos aspectos da educação. Demais autores detalham, nomeiam e categorizam as características propostas pela UNESCO de forma complementar. Tilbury e Wortman (2004 apud JACOBI; RAUFFLET; ARRUDA, 2011) mencionam também a necessidade de desenvolver a competência de “perspectivas de futuro” (ser capaz de imaginar um mundo melhor, com a premissa de que, se sabemos aonde queremos chegar, seremos mais capazes de trabalhar para chegarmos lá). Para o “pensamento crítico e reflexão”, ressaltam a importância de aprender a questionar os sistemas de crenças e reconhecer as hipóteses subjacentes ao conhecimento, perspectivas e opiniões. Citam a necessidade de desenvolver o “pensamento sistêmico” para reconhecer as complexidades, ao procurar por ligações e sinergias, tentando encontrar soluções. Também apontam que é necessário desenvolver a competência de “construir parcerias”, promover o diálogo, a negociação e aprender a trabalhar em equipe. Por fim, destacam que para que haja real “participação nas tomadas de decisão” é necessário que as pessoas empoderem-se. Sterling (1996 apud CARVALHO 2011), entre outras características que estão alinhadas às que já foram mencionadas até aqui, enfatiza também a necessidade da educação ser “contextual” (sintonizada e comprometida em tratar as crises da modernidade, baseada no contexto social, econômico, ambiental e geográfico) e que deve ser “inovadora e construtiva” (inspirada no pensamento pós-moderno de conhecimentos, ciências, ética, política, economia, design e psicologia) e “intencionada” com o propósito explícito de promover a mudança. Pesquisadores, em essência, apontam para as mesmas características e necessidades. Sendo fundamental entender o educando como protagonista, com suas experiências, histórico, questionamentos e dilemas e considerando-o em todas as dimensões humanas e sociais, como as emocionais, culturais, familiares, profissionais, cidadãs. Para Carvalho (2011) educar não é apenas formar super profissionais, a instituição de ensino deve zelar pelo desenvolvimento pessoal dos aprendizes. O período do curso superior é fundamental para consolidar os valores
  • 32. 32 e compromissos humanos e sociais, valores da cidadania, da busca por um mundo mais justo, humano e sustentável. A educação para o desenvolvimento sustentável requer a reorientação das abordagens educacionais: revisar os objetivos e conteúdos dos currículos, pedagogia, as metodologias de aprendizagem e avaliação para fomentar as competências necessárias. Junto com habilidades relacionadas ao pensamento crítico e criativo, mostra-se necessário desenvolver a comunicação oral e escrita, colaboração e cooperação, gestão de conflitos, tomada de decisões, soluções de problemas e planejamento, uso apropriado das tecnologias de informação e comunicação e a cidadania prática (UNESCO, 2005). Apesar do fato de muitas escolas de negócio explorarem metodologias de ensino diferenciadas, com vivências práticas, estas ainda demandam muitos recursos e parcerias, e por isso, continuam em sua infância (PRME, 2012). Como a sustentabilidade está buscando espaço num cenário governado por paradigmas cartesianos e tradicionais, os dilemas e contradições se instalam (TELLES, 2011). A interdisciplinaridade se apresenta como um dos caminhos para superar contradições. 3.2 Interdisciplinaridade As pesquisas e experiências interdisciplinares ainda são recentes e incipientes (JACOBI; RAUFFLET; ARRUDA, 2011), mas estão ganhando evidência. Reconhece-se cada vez mais que os modelos educacionais fragmentados dificultam o aprendizado de temas amplos (TELLES, 2011). A base disciplinar é um desafio. Para Jacobi, Raufflet e Arruda (2011), a divisão de conhecimento se transforma em obstáculo, quando poderia contribuir para a integração da sustentabilidade no currículo. Para Amboni et al. (2010 apud DEMAJOROVIC; SILVA, 2012), professores precisam ir além de suas disciplinas e levar o indivíduo a aprender a aprender. Isso se manifesta pela capacidade de refletir, analisar e tomar consciência do que sabe e não se sabe, dispor-se a mudar os próprios conceitos, buscar novas informações, substituir velhas verdades por teorias transitórias, adquirir novos conhecimentos. É necessário
  • 33. 33 propor problemas que levem os próprios alunos a buscar uma solução. Esses problemas não podem ser resolvidos com a contribuição individual das disciplinas, sem interação de saberes. Para Demajorovic e Silva (2012), com base em estudo de diversos pesquisadores do tema, o problema dos projetos pedagógicos tradicionais não está exatamente na estrutura disciplinar; e sim na falta de articulação entre as disciplinas, no distanciamento dos ensinamentos da realidade dos alunos e porque não impulsionam e orientam as capacidades cognitivas, inquisitivas e criativas do aluno. Fazenda (2009 apud DEMAJOROVIC; SILVA, 2012) afirma que a interdisciplinaridade não é a eliminação da contribuição de cada disciplina. Ela se constitui em uma atitude, com o objetivo de impedir que uma determinada ciência tenha supremacia sobre outras igualmente importantes. A construção de um espaço de saber interdisciplinar possibilita o diálogo entre a problemática socioambiental e as ferramentas de gestão (DEMAJOROVIC; SILVA, 2012), por isso é imperativo em função das mudanças sociais vivenciadas pela sociedade. Disciplinas que trabalham isoladamente não podem dar respostas adequadas às problemáticas complexas da atualidade (FAZENDA, 2009 apud DEMAJOROVIC; SILVA, 2012). Essa também é a visão da UNESCO (2005), que defende que a ênfase na interdisciplinaridade deve-se à constatação de que os problemas que afetam e mantêm a vida no planeta são de natureza global e que suas causas não podem restringir-se apenas aos fatores estritamente biológicos, pois revelam dimensões políticas, econômicas, institucionais, sociais e culturais. Posto que os problemas transcendem as diferentes disciplinas, tanto o aprofundamento disciplinar quanto a ampliação do conhecimento entre as disciplinas são fundamentais. Porém esse é um tema de difícil implementação. Não é suficiente reunir diferentes disciplinas, são necessárias trocas sistemáticas e o confronto de saberes disciplinares, o que só se concretizará com uma ação orgânica das diversas disciplinas, superando a visão multidisciplinar (UNESCO, 2005). As escolas de administração devem buscar caminhos para inserir as questões de sustentabilidade de forma que suas discussões façam parte do desenvolvimento da própria
  • 34. 34 ciência de administração; e não um movimento à parte, gerando conflito com suas diversas áreas. O conhecimento gerado em finanças deve ser coerente com o que se aprende em outras áreas e também com as questões postas pelos desafios da sustentabilidade (JACOBI; RAUFFLET; ARRUDA, 2011). Porém, o que se observa na prática das escolas de administração é justamente o contrário. A sustentabilidade acaba sendo inserida de forma pontual e sem articulação com o todo, resultando em incoerências e contradições com as demais áreas ensinadas. No próximo capítulo analisaremos como as instituições estão reagindo às demandas e influências externas, abordadas no capítulo 2, e como estão encarando o novo paradigma discutido neste capítulo.
  • 35. 35 CAPÍTULO 4 – COMO A EDUCAÇÃO PARA SUSTENTABILIDADE É ABORDADA NO ENSINO DE ADMINISTRAÇÃO De primeira vista, a boa notícia é que se observa um significativo aumento de instituições de ensino superior motivadas para formar estudantes com conhecimento e habilidades necessários para colocar a sustentabilidade no centro de suas futuras atividades de gestão. Durante a última década, multiplicaram-se módulos, cursos e programas (JACOBI; RAUFFLET; ARRUDA, 2011). Diversas experiências estão sendo conduzidas em gestão universitária, extensão, pesquisa, ensino, participação dos alunos, capacitação de docentes e declarações de sustentabilidade na visão e missão das instituições de ensino (CARVALHO, 2011). Esse capítulo é dedicado a analisar criticamente como as faculdades de administração estão inserindo a sustentabilidade no currículo, foco desse estudo, conforme explicitado anteriormente. As pesquisas que têm as instituições signatárias do PRME como base são otimistas e declaram que muitas escolas de negócio já estão “walking the talk”13 (PRME, 2012). Porém essa visão não é unânime. Com base em leituras de autores, como Springett (2005), Calder e Clugston (2003), Elliot et al. (2004), Springett e Kearins (2001) e estudos empíricos conduzidos por ela, Carvalho (2011) traz que há uma dicotomia entre o que se prega e o que se pratica. Ela defende que apesar de ser politicamente desejada e de haver demonstrações de preocupação com a sustentabilidade, poucas são as universidades que já a incorporaram em seu processo do dia a dia, como políticas e práticas, sendo que a maior parte recorre para estratégias mais simples. Em sua maioria, incorporam uma disciplina isolada de sustentabilidade no currículo, como veremos a seguir. É fato que já existe progresso em inserção de sustentabilidade no ensino superior, em diferentes formatos, formas e profundidades (PRME, 2012). Godemann et al. (2011), após 13 Termo em inglês que significa ser coerente com o discurso.
  • 36. 36 analisar experiências de pelo menos cem instituições signatárias do PRME, afirmam que não há receita de bolo. A promoção da sustentabilidade nas instituições oferece muitos caminhos e não há consenso como operacionalizá-la (CARVALHO, 2011). De acordo com o PRME (2012), consenso foi alcançado pelas instituições globais de que a sustentabilidade deve ser incorporada ao currículo. Porém, justamente, a questão relevante não é mais o porquê a educação deve mudar e sim o como. E nessa área a transformação está apenas começando. Com base na leitura de diversos pesquisadores e estudiosos, percebe-se as seguintes estratégias de inserção no currículo. Após apresentadas, discutiremos sobre elas, como um todo, tendo em vista a visão de diferentes pesquisadores e estudos: a) Inclusão de uma disciplina no currículo Trata-se da inclusão de uma disciplina no currículo, seja de sustentabilidade ou conteúdos relacionados, como responsabilidade social empresarial. Em alguns casos, inclui-se mais de uma disciplina sobre o tema, sendo mais comum a incorporação de disciplinas eletivas ou complementares, fora do currículo obrigatório. Caracteriza-se pela inserção pontual, isolada, sem revisão do todo; as disciplinas tradicionais não sofrem alteração. Essa tem sido a prática mais comum e é o que aqui chamamos de educação sobre sustentabilidade. Essa estratégia não tem encontrado muitas resistências nas instituições de ensino superior, conforme relatado por diversos estudos. Iniciar a discussão sobre a temática da sustentabilidade em formato de disciplina com conteúdo próprio, separado das demais disciplinas tende a ser uma estratégia de fácil aplicação e que muitas vezes está associada ao fato do docente estar realizando pesquisa e se interessar pelo tema (CARVALHO, 2011). Jacobi, Raufflet e Arruda (2011) verificam o mesmo cenário, de que o crescimento da sustentabilidade em disciplinas ocorre na maior parte das vezes de iniciativas individuais de docentes, mas pouco articuladas com o todo institucional.
  • 37. 37 b) Inserção de tópicos ao longo do currículo Trata-se da inclusão de conteúdos nas diferentes disciplinas ao longo de todo o currículo. O PRME (2012) aponta que a introdução gradual de temas relacionados à sustentabilidade e utilização de estudos de caso em disciplinas existentes é uma abordagem muito recorrida. Nesse cenário verifica-se a predominância da inserção de conteúdos, ao invés de uma revisão dos objetivos, valores, modelos mentais e metodologias. Práticas interdisciplinares e vivenciais são incipientes e restritas a trabalhos específicos. Para Stein (2010), mudanças através da simples inclusão de tópicos e conceitos relacionados à sustentabilidade em currículos são um início interessante, mas somente adaptativas e seu impacto será mínimo caso a linha principal do curso se mantenha inalterada. Transformações efetivas ocorrem somente com mudança no sistema de ensino e nos educadores. c) Criação de um novo curso ou programa dedicado ao tema ou com linha de formação específica Trata-se da criação de um novo curso ou programa voltado para o tema da sustentabilidade. É mais comum encontrar essa modalidade nos cursos de pós-graduação por obterem maior flexibilidade. Um exemplo seria a criação de um curso sobre gestão de sustentabilidade nas empresas. Verifica-se também a criação de cursos de administração com ênfase ou linha de formação específica em gestão ambiental ou sustentabilidade. Demajorovic e Silva (2012) conduziram um estudo junto a egressos de um curso dessa natureza e que apresentava a interdisciplinaridade como premissa. Os resultados indicam que os alunos reconheceram as práticas interdisciplinares empregadas e sua contribuição para o desenvolvimento de competências profissionais significativas. Porém, manifestaram sentir falta de aprofundamento em conceitos tradicionais de administração.
  • 38. 38 d) Inserção transversal no currículo Esse é escopo de análise desse trabalho. A autora entende que essa é a estratégia para a efetiva educação para sustentabilidade na formação do administrador. Isso não invalida ou desmerece as demais estratégias. Defende-se, no entanto, que as os itens A (inclusão de uma disciplina no currículo) e C (criação de um novo curso ou programa dedicado ao tema), guardadas as devidas proporções, referem-se à educação sobre sustentabilidade, por se tratar do objetivo explícito da disciplina, curso ou programa. Ressalva seja feita aos casos com “ênfase” ou “linha específica” em sustentabilidade. Acredita-se que em casos bem sucedidos, de fato, ocorra a educação para sustentabilidade. Esse tipo de formação tem muito valor, porém, o escopo desse trabalho buscou analisar a inserção transversal na formação do administrador comum, não aquela que ocorre por meio da criação de um curso especial ou programa paralelo. No item B (inserção de tópicos ao longo do currículo), a educação para sustentabilidade não se mostra ocorrer de forma holística e na profundidade necessária, embora já represente um avanço. Pode-se exemplificar a diferença entre os itens B e D, imaginando uma disciplina de marketing e produção. No caso da estratégia B, poderá ser abordado nas aulas de marketing questões como marketing verde, o greenwashing14 ou a responsabilidade da propaganda junto ao público infantil. Em produção provavelmente se discutirá sobre ecoeficiência e o descarte correto de resíduos e efluentes. Em marketing, em circunstâncias mais avançadas, poderá ser trazido para dentro de sala de aula, estudos de casos ou trabalhos práticos interessantes, que façam os alunos refletir sobre temas relacionados ao marketing e à sustentabilidade, considerando também o conhecimento de outras disciplinas, como conceitos de produção. Provavelmente partirá de uma iniciativa individual de um professor que vislumbrou essa oportunidade e que instigará seus alunos sobre a importância de se considerar os materiais utilizados nas peças de comunicação, buscando valorizar boas práticas, como o uso de tinta ecológica, técnicas para evitar o desperdício, respeito aos fornecedores, etc. No caso do D, todos os exemplos tratados acima podem ser realidade, mas os alunos seriam provocados também a conteúdos e reflexões mais profundos e inter-relacionados. Como 14 Pode-se traduzir como “lavagem verde” (tradução nossa), termo utilizado quando sugere-se tentativa de enganar o consumidor sobre as propriedades ou características ecológicas de um produto ou organização.
  • 39. 39 discutir a questão da transparência e o papel do marketing de forma mais crítica. Os alunos seriam instigados a questionar sobre sua responsabilidade como cidadãos e futuros administradores, seus valores individuais na criação de necessidades e valores nas pessoas e na sociedade, a existência de certos produtos, considerando o projeto de uma sociedade sustentável. A concepção de produtos e serviços em consonância com os princípios da natureza seria tratada nas duas matérias de forma complementar. Em produção, também seriam abordados conteúdos como a análise de ciclo de vida dos produtos, novos arranjos produtivos e o biomimetismo. O contexto do curso seria diferente. As reflexões e conteúdos sob a ótica da sustentabilidade não estariam desalinhados ou em conflito ao ensinado em outras disciplinas como, economia e finanças. A inter-relação das diversas áreas de conhecimento seria uma realidade. A questão da geração de externalidades e a internalização desse custo nas empresas e no preço seria um tema comum de todas as áreas. Já se haveria questionado sobre a premissa da maximização ao acionista e do crescimento econômico, como o maior objetivo a ser atingido e o que isso representa para marketing e da produção. Os alunos seriam levados a identificar e refletir sobre as premissas que sustentam as áreas de conhecimento e alternativas, tendo os princípios e valores da sustentabilidade como pano de fundo e objetivo. Atenção especial seria dada às vivências, metodologias, trabalhos, competências a serem desenvolvidas e formas alternativas de medir o aprendizado dos alunos. As características e metodologias descritas no capítulo 3 seriam uma realidade de todo o currículo. Os dois exemplos são superficiais e não são categóricos, ou seja, não quer dizer que os cenários B e D irão se comportar exatamente dessa forma, com as divisões, circunstâncias e conteúdos apontados. Servem apenas para tentar ilustrar a diferença entre os cenários. Em suma, no cenário B, pode haver, em maior ou menor grau, a inclusão de tópicos referentes à sustentabilidade nas disciplinas, porém a linha principal do curso se mantém a mesma. Os conteúdos de sustentabilidade e as áreas de conhecimento podem ser inter-relacionados pontualmente, mas não no todo e de forma verdadeiramente interdisciplinar. Verifica-se a predominância da inserção de conteúdos, ao invés de inovação nas abordagens de ensino. É comum haver conflito entre metodologias, conteúdos e valores entre as diferentes disciplinas, o que pode confundir os alunos. A inovação normalmente fica restrita a abordagens técnicas de produtos e de gestão, como se fosse sinônimo de tecnologia.
  • 40. 40 O cenário D se caracteriza pela revisão total do currículo sob a ótica da formação para a sustentabilidade. Revisa objetivos, valores, metodologias, conteúdos e a inter-relação de todas as disciplinas, tendo em vista o administrador que se deseja formar; capaz de impulsionar a sustentabilidade. A inovação é encarada como um processo contínuo pela busca da melhor forma de fazer as coisas, seja por meio de uma nova prática, comportamento, tecnologia ou uma mudança de qualquer ordem que permita a uma organização questionar e romper com a lógica atual. Para ser sustentável é preciso inovar, o que implica em aprender com o ambiente – que está em constante transformação (CARREIRA, 2010). Por isso, algumas barreiras de inserir a temática de forma transversal no currículo são claras, ausência de pessoal especializado, falta de definições e conceitos comuns, estruturas rígidas e resistência à mudança. Docentes e corpo administrativo precisam aprender ao mesmo tempo em que ensinam e testam, avaliam e criam novas práticas. É necessário que a instituição se engaje como um todo, dê espaço para o aprendizado contínuo e conjunto e aprenda lidar com as incertezas, um desafio para a Academia. Não existem fórmulas prontas ou um caminho claro a seguir. São poucos os exemplos de boas práticas, mas que felizmente estão crescenndo. Sem necessariamente terem o mesmo entendimento do seu significado, na percepção dos coordenadores de curso e diretores entrevistados por Carvalho (2011), a transversalidade é a melhor forma de inserção. Porém a realidade, não sinaliza uma mudança nessa ordem. Não se observou no seu estudo uma formação para sustentabilidade e sim sobre sustentabilidade. A experiência internacional também revela um enfoque fragmentado em iniciativas de adicionar conteúdo a uma parte específica do currículo. Poucas escolas tentam inserir sustentabilidade de forma transversal e a maioria tem conseguido apenas pequenos avanços incrementais (CARVALHO, 2011; GODEMANN et al., 2011; JACOBI; RAUFFLET; ARRUDA, 2011). Um elemento importante a se destacar é a ambiguidade da definição de sustentabilidade no currículo. A compreensão e a interpretação do termo “sustentabilidade” e a ideia de “aprendizagem para a sustentabilidade” variam muito dentro do ensino superior e predominam as incertezas de como fazer essa integração (JACOBI; RAUFFLET; ARRUDA, 2011; GODEMANN et al., 2011).
  • 41. 41 Stein (2010) apresenta que o paradigma educacional proposto é baseado na distinção entre mudanças e aprendizados de primeira, segunda e terceira ordem. As de primeira ordem são alterações adaptativas que não examinam, questionam e/ou mudam os valores básicos. Nas de segunda ordem, observa-se um aprendizado reflexivo e crítico, quando as premissas e valores que influenciam o aprendizado de primeira ordem são questionados. As situações de aprendizado de terceira ordem ocorrem quando estamos aptos a ver os acontecimentos de maneira criativa, com um entendimento aprofundado e vislumbrando maneiras alternativas de ação. Trata-se de um nível transformador. A crise atual que vivemos demanda uma ruptura que somente será possível com aprendizados de segunda e terceira ordem. A UNESCO (2005) valida a visão de que a mudança curricular é necessária em todos os programas de estudo, e não apenas para aqueles com foco em sustentabilidade, sendo que o tema deve integrar todo o currículo. Para a instituição, a educação para o desenvolvimento sustentável não deve ser vista como “uma disciplina a mais” a ser adicionada a um currículo sobrecarregado, mas como um planejamento global “de toda a escola”, em que o desenvolvimento sustentável é visto como um contexto para alcançar os objetivos da educação e não uma prioridade em competição com as demais disciplinas. Quando educadores tentam preencher essa lacuna com conteúdos alternativos e práticas interdisciplinares, tem pouco sucesso. Eles enfrentaram forte resistência a essa inovação, uma vez que os cursos são concebidos de forma a valorizar os critérios de negócios, cujo pensamento dominante entende a incorporação da dimensão socioambiental como uma ameaça à competitividade das empresas (DEMAJOROVIC; SILVA, 2012) Permanecer no mainstream é a tendência entre coordenadores e diretores de curso de administração nas escolas estudadas por Carvalho (2011). Springett e Kearins (2005 apud CARVALHO, 2011) sugerem que tomar posicionamentos críticos, romper com a lógica racionalista-capitalista parece ser uma atitude arriscada e evitada pelos profissionais de ensino. Os cursos de administração privilegiam a melhor combinação de recursos para obter maior produtividade e lucratividade. Nos anos recentes, tais cursos incluíram novas disciplinas, como responsabilidade social, ética nos negócios e gestão de recursos naturais. No entanto, longe de promover uma efetiva educação para a sustentabilidade, tais iniciativas mascaram o
  • 42. 42 fato de que os objetivos originais dos cursos de administração continuam preservados, o que leva a continuidade do paradigma social dominante (DEMAJOROVIC; SILVA, 2012). O foco atual está no treinamento de futuros administradores para que possam trabalhar em direção a um aumento da eficiência e da geração de inovações incrementais. O modelo mecaniscista/ teconológico predomina entre os coordenadores de curso. Muito pouco tem sido feito para instigar estudantes a repensar e a desafiar o sistema mais amplo de produção, em seu contexto socioambiental. Sustentabilidade nas escolas de administração considera marginalmente o fato de vivermos em um planeta com recursos finitos (CARVALHO, 2011; JACOBI; RAUFFLET; ARRUDA, 2011). Quando indagados sobre a importância da sustentabilidade para a adminsitração, as respostas dos coordenadores de curso e diretores levam a crer que, embora o tema seja importante, ainda não é visto como fundamental ou central na formação do administrador. A sustentabilidade está sendo tratada no lugar comum, como produto de demanda de mercado e como vantagem competitiva, por causa da demanda profissional (CARVALHO, 2011). Para Huckle (1996) e Orr (1992 apud CARVALHO, 2011) as universidades têm se voltado para as forças de mercado e se sujeitado a ideologias do mesmo. Eles enxergam as instituições de ensino preparando indivíduos para economias em expansão e que se espelham na competição do mercado, muito mais do que nos valores e princípios educacionais. Carvalho (2011) afirma que também há visões mais engajadas politicamente. Mesmo essas ainda estão distantes de uma reflexão sobre o sentindo e o lugar das escolas de administração numa sociedade que pretende ser sustentável. A missão de alcançar uma mudança substancial no conteúdo das disciplinas tradicionais, como estratégia, contabilidade, finanças, marketing, recursos humanos, logística, está ainda nos primeiro passos (PRME, 2012), o que prejudica o entendimento de educação para sustentabilidade. Por isso, para Ghoshal (2005 apud JACOBI; RAUFFLET; ARRUDA, 2011), a inclusão de um módulo ou de um curso sobre desenvolvimento sustentável em um programa dominado
  • 43. 43 por um paradigma econômico pode ser considerado imediatista e provavelmente fracassará em direcionar mudanças profundas. Nessa perspectiva, argumenta-se que os cursos de administração não antecipam as mudanças na sociedade. Em vez de se colocarem na vanguarda da disseminação do conceito de sustentabilidade, acompanham, de forma reativa, a reformulação do discurso empresarial (DEMAJOROVIC; SILVA, 2012).
  • 44. 44 CAPÍTULO 5: CAMINHOS PARA FACILITAR A INSERÇÃO Sem pretensão de esgotar o debate, este capítulo dedica-se a pontuar três aspectos que foram marcados pelos diferentes autores como chave para facilitar capilarização da sustentabilidade no ensino superior. Eles são: a importância de capacitar e valorizar os docentes; o papel da pesquisa em atribuir relevância ao tema na Academia e facilitar sua incorporação no ensino; e o engajamento dos diferentes públicos de interesse, com destaque à liderança, como fundamentais para garantir uma mudança profunda e duradoura. Esses tópicos foram reforçados sistematicamente pelos diversos autores. Como para Carvalho (2011), por exemplo, que destacou a pesquisa e formação de professores como essenciais para o desenvolvimento de uma abordagem transversal de sustentabilidade no currículo. Jacobi, Raufflet e Arruda (2011) apontaram que para garantir uma mudança efetiva, é preciso envolver toda a instituição nas mudanças em andamento. O desafio é ampliar as visões de colaboração e incluir a participação de toda a gama de stakeholders15 com compromissos de longo prazo. É importante ressaltar que também existem outros caminhos para garantir que a sustentabilidade se insira nas instituições de ensino superior. A extensão e gestão da universidade, incluindo práticas organizacionais, campus e operações, embora não destacados em um item, são essenciais para garantir a coerência da instituição com o desenvolvimento sustentável. Como abordado, a mudança para sustentabilidade é sistêmica e envolve todas as dimensões das instituições de ensino superior. O chamado para integrá-la no coração da escola impacta na cultura e comportamento, por meio de vários projetos de transformação extracurricular (PRME, 2012). As universidades devem funcionar com lugares de pesquisa e aprendizagem para o desenvolvimento sustentável e como iniciadores de atividades nas suas comunidades (UNESCO, 2005). Os projetos de extensão são excelentes para integrar o ensino e a pesquisa, proporcionando aos alunos um rico aprendizado e a possibilidade de aplicar conhecimentos na prática de uma 15 Públicos de relacionamento - que impactam/influenciam e são impactados/ influenciados, no contexto desse trabalho, pela instituição de ensino superior.
  • 45. 45 forma interdisciplinar. É também uma maneira da universidade cumprir sua função social e contribuir para a comunidade. No campo da gestão universitária, trata-se de tornar o próprio ambiente universitário pedagógico, um exemplo. Discutir a gestão universitária sustentável, envolvendo os aluno e outros stakeholders, significa observar impactos ambientais, sociais e econômicos envolvidos nas decisões e práticas da gestão da universidade, oferecendo a oportunidade para aprender a pensar e produzir respostas a uma gestão responsável (CARVALHO, 2011). A UNESCO (2005) enfatiza que a educação superior deve assumir uma função de liderança, colocando em prática aquilo que é ensinado por professores. Universidades não são apenas lugares para se aprender sobre desenvolvimento sustentável, mas lugares onde se pode ativamente implementar boas práticas, como economia de energia, reciclagem, uso produtivo do terreno das escolas, uso de materiais e recursos naturais. As compras, investimentos e serviços da universidade precisam ser sustentáveis e integrados ao ensino e à aprendizagem. Todos os alunos do curso superior devem entender a importância da diversidade e da inclusão e devem ser capazes de identificar valores, hipóteses e sistemas éticos. 5.1 Formação e valorização dos docentes Os educadores são os grandes iniciadores da temática nas instituições de ensino superior. Se hoje há alguma transversalidade ou tendência à interdisciplinaridade, ela foi construída informalmente, pelo conjunto de professores que discutem o tema (CARVALHO, 2011). Quando falamos de ensino, os educadores são protagonistas, estão no contato direto com os alunos. Seu papel é essencial para impulsionar as transformações de uma educação que assume um compromisso com a formação de valores de sustentabilidade, numa perspectiva coletiva (UNESCO, 2005). São decisivos na inserção da temática no currículo e por isso precisam de apoio e investimento para agregar ferramentas de ensino e aprendizagem. Embora grande parte das iniciativas de inserção de sustentabilidade nos currículos surja da iniciativa individual dos docentes, também é deles que vêm resistências, como de se engajar
  • 46. 46 com a interdisciplinaridade e com abordagens metodológicas mais práticas (JACOBI; RAUFFLET; ARRUDA, 2011). O desafio é que os professores estão frequentemente sobrecarregados pelas mudanças e ampliação dos currículos. Para aumentar a aceitação do corpo docente, uma estratégia que vem dando certo é associar os temas de sustentabilidade a conceitos e tendências que são já aceitos no ensino da administração, como inovação e empreendedorismo social (PRME, 2012). Diversos autores afirmam que a operacionalização da educação para o desenvolvimento sustentável só é viável à medida que se repense o papel dos educadores e docentes como agentes da mudança. Nota-se, porém, um despreparo dos professores em relação a conhecimentos, habilidades e atitudes para incorporar os princípios de sustentabilidade em seus cursos; e talvez até por isso, muitos evitem tomar posicionamentos críticos e romper com a lógica atual. Infelizmente, a questão não se resume a falta de docentes que conheçam o tema ou trabalhem com sustentabilidade. Esta dificuldade se soma a falta de professores doutores, pesquisadores ou com trabalhos publicados na área de gestão (CARVALHO, 2011). O desenvolvimento sustentável é um conceito dinâmico que reconhece que a sociedade humana está em constante transformação e que não existem respostas ou fórmulas prontas. Isso requer que os docentes estejam constantemente se atualizando e revendo seus modelos, conteúdos e métodos de ensino. Por isso, além de um compromisso e um engajamento individual, é fundamental o apoio da universidade. Para implementar a educação para sustentabilidade, os instrutores precisam romper com a visão fundamentada no conhecimento sobre sustentabilidade e ir além de incluir conteúdos específicos em seus cursos. Porém, a inserção de novos métodos, como a promoção da interdisciplinaridade, tem encontrado muita resistência nas instituições, tanto por razões administrativas, como pela relutância dos docentes, formados em uma visão disciplinar (JACOBI; RAUFFLET; ARRUDA, 2011). A Declaração de Talloires, iniciativa precursora ao PRME, reconhece a importância de que a universidade crie programas para desenvolver a capacidade do corpo docente de ensinar os princípios da natureza para todos os alunos. Destaca esse ponto como um dos dez pontos de
  • 47. 47 plano de ação recomendados às instituições de ensino superior (ASSOCIATION OF UNIVERSITY LEADER FOR A SUSTAINABLE FUTURE, 1990). Uma organização só muda quando as pessoas que trabalham nela não se sentem ameaçadas pela mudança, entendem-na, percebem sua necessidade e benefícios (CARREIRA, 2010). Para que a transformação ocorra, além de se convencer de sua necessidade, os docentes devem dispor de conhecimento e métodos para integrar os princípios do desenvolvimento sustentável nas suas práticas. Iniciativas externas que venham estimular a motivação dos professores e valorizá-los, se mostram como uma boa porta de entrada para o tema na instituição; os docentes podem ser gatilhos para a mudança dentro da universidade. No entanto, para a mudança ser sistêmica e duradoura, é essencial investir na capacitação e garantir que as práticas individuais influenciem as institucionais. É recomendado pela UNESCO (2005) que os ministérios da educação incluam o desenvolvimento sustentável como tema transversal nas instituições de capacitação de professores. Os professores são atores fundamentais para a evolução da educação para a sustentabilidade. Contudo, apenas uma parte. Em muitas instituições, não têm poderes para mudar conteúdos de suas disciplinas e de promover a interdisciplinaridade. Acima deles estão coordenadores, diretores, direção geral, às vezes, acionistas e conselheiros. Uma verdadeira transformação requer mudar o modelo mental de toda a cadeia de liderança, para que a sustentabilidade seja incorporada como valor, atitude e comportamentos por todos os responsáveis por decidir os rumos da educação, como será abordado mais a seguir. 5.2 Pesquisa Teorias educacionais e práticas inovadoras emergem de programas de pesquisa e de investigação acadêmica (UNESCO, 2005). Apesar de importantes progressos feitos pelas escolas de negócio, o campo da pesquisa irá continuar dependente da motivação individual do pesquisador até que as revistas acadêmicas e periódicos de prestígio ofereçam reconhecimento aos assuntos relacionados à sustentabilidade, como tema primeira categoria de pesquisa.
  • 48. 48 Isso porque as publicações científicas consideradas A e B são cruciais tanto para as instituições de ensino e seus rankings, quanto para as perspectivas de carreira de corpo docente. Assegurar publicação de pesquisa de qualidade é a base para persuadir as disciplinas de administração tradicionais a adaptarem seu conteúdo para um novo paradigma (PRME, 2012). Novas teorias de gestão baseadas nos parâmetros de sustentabilidade precisam de espaço para emergir e ganhar legitimidade acadêmica. Nada disso será possível sem uma mudança na importância dada para esse tipo de pesquisa (PRME, 2012). Dessa forma é fundamental que as próprias instituições incentivem a pesquisa de sustentabilidade, se comprometam com o tema e expandam seu papel como poderosos defensores do tema, inclusive junto aos periódicos (PRME, 2012). Incentivos externos para estimular a pesquisa de sustentabilidade e educação para sustentabilidade são muito bem- vindos e favoráveis. 5.3 Engajamento e participação dos públicos de interesse O engajamento e participação dos stakeholders da universidade como condição para inserção de sustentabilidade, na profundidade necessária, é consenso entre os pesquisadores. Para Stein (2010), a institucionalização de uma educação para o desenvolvimento sustentável exige não somente uma revisão de propósitos, atitudes e processos, mas também uma interação diferenciada entre gestores, professores e estudantes. Carvalho (2011) vai ao encontro quando aponta que ser sustentável requer uma mudança de atitude e comportamento de todos os indivíduos dentro das instituições de ensino superior, incluindo educadores, estudantes e corpo administrativo. Demajorovic e Silva (2012) reforçam a importância do diálogo e a necessidade do envolvimento de todos os públicos. Afirmam ser necessário reconhecer as limitações contidas em apenas um ponto de vista e ressaltam a riqueza da possibilidade de uma pessoa refletir sobre si própria através do olhar de outro. Huckle e Sterling (1996 apud JACOBI; RAUFFLET; ARRUDA, 2011) propõem que criar abordagens inclusivas, envolvendo funcionários administrativos e professores é relevante para
  • 49. 49 desenvolver um suporte para a mudança. As experiências mostram que planos de gestão ambiental e de sustentabilidade do campus são mais bem-sucedidos quando são fundamentados no envolvimento ativo da maior parte da comunidade, pois a participação em atividades pode ser educativa e criar comprometimentos mais profundos (CALVO; BENAYAS; GUTIERREZ, 2002 apud JACOBI; RAUFFLET; ARRUDA, 2011). Os estudos do PRME trazem que os estudantes são uma importante parte da equação. Tendo em vista que o progresso rumo ao desenvolvimento sustentável é sistêmico, desencadear o potencial dos estudantes é essencial. Existem exemplos surpreendentes em que os estudantes são os principais iniciadores dos processos de transformações (PRME, 2012). Infelizmente apenas algumas escolas de administração aparentam perceber o espectro de oportunidades que surgem da participação, de aprenderem uns com os outros, discutir e refletir sobre diferentes perspectivas (GODEMANN et al, 2011). Carreira (2010) defende que um dos principais valores trazidos pela sustentabilidade é a responsabilidade, por isso todos devem ser parte do processo e se sentirem responsáveis por fazer a mudança acontecer. Iniciativas reforçam a necessidade de a universidade atuar além dos seus muros e inclusive além da comunidade do seu entorno. O PRME pontua isso nos princípios 5 (parceria) e 6 (diálogo). A Declaração de Talloires (ASSOCIATION OF UNIVERSITY LEADER FOR A SUSTAINABLE FUTURE, 1990) propõe que a universidade deve usar toda a oportunidade que tiver para aumentar a consciência pública da necessidade do desenvolvimento sustentável. Para isso, os líderes devem iniciar e apoiar a mobilização de recursos internos e externos. Vale a pena destacar, parceria com organizações nacionais e internacionais, o compartilhamento de informações e a cooperação inter-universitária e a possibilidade de influencia política, incluindo do arcabouço legal. Os estudos do PRME enfatizam o papel da liderança. Defendem que pouco progresso é alcançado sem uma sua verdadeira convicção. Para que a mudança ocorra, é prerrogativa que a alta liderança coloque a temática como prioridade.
  • 50. 50 Como apontam os estudiosos de Gestão da Mudança, definir uma visão de futuro e compartilhá-la com todos é essencial para que a mudança ocorra, pois deixa claro aonde se quer chegar, diminuindo as resistências geradas pelas incertezas do futuro; os líderes têm esse papel (CARREIRA, 2010). Ser signatário de uma inciativa, como do PRME, tem um pouco dessa função, pois a faculdade declara publicamente seu compromisso com a sustentabilidade. Porém, uma importante lição é que não é suficiente incluir os princípios ou outras aspirações na missão e visão da escola. Pode ser uma vantagem inicial, mas há um longo caminho entre o reconhecimento “teórico” e a implementação dos princípios de forma consistente em todos os níveis. Um dos principais desafios está em como evoluir os valores de forma que eles se tornem direcionadores gerais das atividades. Ter uma equipe de liderança habilidosa e apoiadora, uma estratégia “top-down”, é fator crítico para o sucesso (CARVALHO, 2011; PRME, 2012). A adaptação da escola de negócio para colocar a sustentabilidade no core do ensino, requer novas estruturas, incentivos e financiamentos, que não podem ser viabilizados sem decisão da liderança. A promoção de uma nova cultura requer que seus líderes e gestores ajam explicitamente conforme os valores estabelecidos. As pessoas devem perceber que a maneira como “as coisas são feitas” mudou e agora é regida por novos valores, normas e práticas. Os líderes também precisam apoiar as pessoas e as equipes nesse momento de transição, fazendo-as notar a necessidade da mudança e incorporar gradativamente em suas práticas a nova cultura organizacional. A mudança só é alcançada quando os envolvidos passam a apresentar valores alinhados com a sustentabilidade, como o cuidado com o meio ambiente e as pessoas, e acreditam que formas de pensar e agir, inconsistentes com esses valores, não são mais apropriadas (CARREIRA, 2010).
  • 51. 51 CONCLUSÃO O desafio de equilibrar os aspectos sociais e ambientais na gestão das empresas trouxe um contexto mais amplo do que antes, quando o resultado financeiro era o principal objetivo. Isso representa mudança de valores e quebra de paradigmas que caracterizaram a era pós- industrial. Essa mudança cultural profunda induz a revisão da relação da empresa com a sociedade e o meio ambiente e implica que os profissionais percebam e incorporem novos valores no dia a dia, como em metas, processos, atividades e comportamentos. As escolas de negócio são fundamentais na formação de líderes que tenham a ousadia e a competência de mudar as empresas. Os estudantes precisam ser expostos a reflexões éticas e sobre responsabilidades como cidadãos e profissionais. Formados para serem conscientes do impacto de decisões, capazes de considerar a complexidade, as dimensões sociais, econômicas e ambientais de forma integrada; hábeis para transformarem os desafios da sociedade contemporânea em valor para negócios e para a sociedade, trabalhando por uma economia global inclusiva e sustentável. As instituições de ensino superior são chamadas a assumir um papel de liderança e a servirem de modelo na instituição de práticas sustentáveis, devendo inovar o sistema educacional vigente. Esse trabalho procurou analisar se a formação do administrador para a sustentabilidade é uma realidade ou uma ilusão. Vale diferenciar mais uma vez a educação de sustentabilidade (educação sobre os princípios, temas e conceitos) e a educação para sustentabilidade. Essa última, escopo desse estudo, é a que busca criar condições para que os alunos sejam capazes de promover o desenvolvimento sustentável no desempenho de sua profissão, independente de almejarem se tornar um profissional da área. A sustentabilidade é entendida como uma necessidade e premissa de qualquer posição ou especialidade do administrador. Constata-se que os desafios que afetam a vida na Terra, o bem-estar da sociedade e o sucesso dos negócios são de natureza global. Suas causas não se restringem a fatores biológicos ou