O documento descreve como mulheres produzem ovos de Páscoa artesanalmente em Porto Alegre para gerar renda. Ângela Silva e Zenaira Caudro oferecem bombons e ovos de chocolate caseiros de porta em porta, faturando até R$100 e 500kg respectivamente na Páscoa. A produção artesanal representa 17% do chocolate consumido na data, mas não ameaça os grandes fabricantes.
1. | 24 | ZERO HORA > DOMINGO | 9 | ABRIL | 2006
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Por qual razão a Varig
enfrenta sua pior crise
Páginas 26 a 28
Gerdau surfa na
onda de aquisições
Página 30
Editora executiva: Maria Isabel Hammes > 3218-4701. Editora: Christianne Schmitt > 3218-4702 . Coordenador de produção: Pedro Dias Lopes > 3218-4707
FOTOS JÚLIO CORDEIRO
A ex-empregada doméstica Ângela hoje dedica-se à elaboração de ovos, que oferece de porta em porta a moradores de bairros pobres de Porto Alegre
Páscoa Divulgada em cursos, produção de chocolate artesanal se fortalece como alternativa de renda.
Apenas para data festiva, são fabricadas 3,5 mil toneladas de barras da matéria-prima usada por doceiras
Por uma vida mais doce
SEBASTIÃO RIBEIRO
A fabricação de chocolate caseiro barraco quarto-e-sala, paredes de ci-
tem um mercado particular. Segun- mento não-rebocado, cortinas que
As desalinhadas letras na pla- do a Associação Brasileira da Indús- fazem as vezes de porta, mas tudo
ca de compensado, pregada à tria do Chocolate (Abicab), para a impecavelmente limpo “para dar boa
também desalinhada cerca de Páscoa são produzidas 3,5 mil tone- impressão aos clientes”. Touca higiê-
madeira, anunciam a venda de ladas de barras para derreter artesa- nica na cabeça, avental amarelo já
bombons e trufas. nalmente – 17% do total de ovos desbotado no corpo, rádio sintoniza-
Dentro da casa, Ângela Silva, previsto para o período, ou 20,4 mil do na emissora Farroupilha, e a ex-
45 anos, passa manhãs e tardes toneladas. Embora o produto caseiro empregada doméstica passa manhãs
dando novas formas ao choco- tenha preço inferior ao do industrial, e tardes com um olho nas netas. Para
late que negocia no fim de se- os grandes fabricantes não temem a esquentar a água que derrete o cho-
mana em andanças na vizi- concorrência informal. colate em banho-maria e economizar
nhança do Jardim Leopoldina, – Nosso interesse é vender choco- gás, usa um rabo-quente elétrico.
onde mora, ou em Vila Nazaré, late. Seja em forma de ovos ou de – Não quero ficar rica. Mas que
Vila Brasília e Sarandi – bairros barras. A produção artesanal é pe- minhas netas peçam um iogurte,
pobres de Porto Alegre. É a pri- quena se comparada com o mercado uma bolacha e eu possa dar – diz.
meira Páscoa dela no ofício. total – afirma Getúlio Netto, presi- Na Capital, há pelo menos três lo-
dente da Abicab. Zenaira deixou de lado a arquitetura e hoje vende até 500 quilos na Páscoa jas especializadas na produção arte-
sanal de chocolate. Entrar nelas é
E m frente à casa de Zenaira Cau-
duro, 45 anos, não é preciso
anúncio para atrair clientes. Eles já
Ângela aprendeu a fazer chocolate
em cursos. Há um mês e meio, pediu
R$ 140 emprestados e comprou a Zenaira trabalhou como arquiteta Isso foi até o Plano Collor. Depois,
acessar um mundo feito de grandes
barras do produto, plásticos molda-
são muitos – amigos, amigos de matéria-prima para iniciar o negó- por quatro anos, após se formar, em nunca mais foi assim – diz Zenaira. dos com toda a sorte de figuras
amigos, empresas que organizam cio. Hoje, fatura R$ 100 por semana 1985. Deixou a atividade e se tornou A jornada de Zenaira começa às (moeda, golfinho, estrela, Hello Kit-
festas – e aparecem o ano todo, mas vendendo bombons. Para esta Pás- doceira. Criou três filhos – Eduardo 5h45min. Ela acorda, “dá café para ty, coração e até coelha grávida...),
principalmente nesta época. Basta li- coa, tem encomendas de 20 ovos de (14), Bruna (11) e Luíza (13) – ne- as crianças”, e se entoca em uma pe- papéis e fitas coloridas para fazer
gar para contatos pinçados da surra- 400 gramas e 20 cestas cheias de coe- gociando seus “chocolates dos deu- ça nos fundos de sua casa, onde es- embalagens. Na Casa do Chocolate,
da agenda e repetir os mesmos lem- lhinhos doces, conta: ses”, como diz o cartão de visitas. tão a derretedeira, os refrigeradores 60% das vendas do ano ocorrem
bretes (“o coelhinho tá aí, não vai – É fácil vender. Eu bato na porta Hoje, vende uma média de 60 quilos e as mesas amplas para lidar com o nos três meses antes da Páscoa. Pa-
comprar ovo no supermercado, das casas e ofereço um bombom. Di- por mês, chegando a 500 quilos na chocolate. Às 7h, TV ligada no pro- ra renovar a clientela o ano inteiro,
hein!”), para que comecem a bater a go: “a senhora compra só um e, se Páscoa. grama Bom Dia Brasil, começa a são promovidos cursos gratuitos, fi-
sua porta, no IAPI, um bairro de não gostar, vai gastar só R$ 0,30”. – No começo, dava muito dinhei- produção. Se preciso, atravessa ma- nanciados pelos fabricantes.
classe média da Capital. É a 24ª Pás- Vou embora e elas vêm atrás gritan- ro. Terminava uma Páscoa, e a gente drugadas para atender um cliente.
coa de Zenaira no ramo. do: “ô tia do chocolate, quero mais”. conseguia comprar um carro novo. A fábrica de Ângela é o seu próprio ± sebastião.ribeiro@zerohora.com.br
2. Data Publicação : 09/04/2006
Editoria : Economia
Ilustração : Foto
Assunto :
Páscoa (cartola), Venda, Comércio, Produção, Ovo de Páscoa, Chocolate