Apresentação de artigo no SBgames 2013: "Este artigo pretende tornar clara a premissa de que os videogames podem ser vistos como sistemas complexos dos quais é possível observar a emergência de padrões comportamentais imprevistos quando da elaboração das regras e respectiva programação, sejam estes padrões o resultado de uma resposta à ação do jogador ou da interação social proporcionada pelos jogos coletivos. Parte da definição de complexidade segundo o pensamento de Edgar Morin, contrabalançado pela explicação de John Conway sobre sistemas complexos, passa à definição de emergência segundo a visão científica de Thomas Kuhn, para finalmente tratar dos videogames como possíveis sistemas emergentes. Ainda, oferece uma explicação sobre o uso da metodologia iterativa na criação de videogames enquanto sistemas complexos, com um modelo de prototipagem e avaliação cíclico que privilegia o refinamento e a eficácia do produto final."
O uso da metodologia iterativa na criação de videogames como sistemas emergentes
1. O USO DA METODOLOGIA ITERATIVA NA
CRIAÇÃO DE VIDEOGAMES COMO SISTEMAS
EMERGENTES
Julia Stateri
Doutoranda pelo Instituto de Artes da UNICAMP
Coordenadora do Curso de Pós-Graduação em Gestão da Comunicação
em Mídias Digitais do Senac – Campinas
2013
2. INTRODUÇÃO: FUNDAMENTAÇÃO E TERMINOLOGIA
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•
•
•
Metodologia Iterativa – utilizada no
desenvolvimento de softwares –
incluindo videogames.
Videogames – como jogos eletrônicos
independentemente de sua
plataforma.
Complexidade – segundo Edgar
Morin, em contraponto com John
Conway (que trata especificamente
dos videogames).
Emergência – segundo Thomas Kuhn
– lógica do raciocínio científico, ao
que voltamos à Conway.
Iteratividade – descrição prática de
Richard Rouse.
•
E. Morin. “Da necessidade de um
pensamento complexo,” in ara navegar
no s culo – ecnologias do magin rio e i
ercultura. Porto Alegre: Sulina, 2003.
•
J. Conway. “Games as Emergent
Systems,” in E. Zimmerman, K. Salen
(Org.). Rules of Play: Game Design
Fundamentals. Massachusetts: The MIT
Press, 2004, pp. 152-157.
•
T. Kuhn. A estrutura das revoluções
científicas. São Paulo: Perspectiva,
2006.
•
R. Rouse. Game Design: Theory &
Practice. Massachusetts: Worldware
Publishing, 2005, pp. 284.
3. COMPLEXIDADE
•
Edgar Morin – crítica que se aplica ao sistema educacional: disciplinas do
conhecimento apresentadas isoladamente, sem correlação.
Informação
Transmitida
•
Decorada pelo
Educando
Avaliação
Para compreender o espírito humano, por exemplo, por que não estudar a psicologia
aliada à fisiologia do cérebro?
4. COMPLEXIDADE
•
Mas então, o que é a complexidade?
•
Jeremy Campbell em Grammatical
Man explica que um sistema complexo
é formado de muitas partes, mas nem
sempre um sistema como muitas
partes é complexo.
•
Ainda, um sistema complexo não é
aquele em que muitas partes se
relacionam entre sim, mas sim aquele
no qual esta relação resulta na
execução de coisas que não seriam
possíveis sem esta relação.
5. COMPLEXIDADE
•
Para John Conway o mais simples dos
jogos pode ser um sistema complexo,
pois partindo de um sistema de regras
os jogadores utilizarão seu repertório
ao interpretar e jogar. Como o
comportamento dos jogadores é
imprevisível, logo o comportamento
emergente do jogo também o será.
•
Porém, alguns jogos são tão restritivos
que não oferecem o grau de
complexidade necessário para que
exista a jogada significativa.
6. COMPLEXIDADE
•
Para Christopher Langton é possível
definir os sistemas como:
•
Fixo – TV Desligada, pixel ausente
de luz.
•
Periódico – Oscilação entre
padrões pré-determinados: branco
e preto em constante alternância.
•
Caótico – Estado randômico,
imprevisível. TV com estática.
•
Complexo - São mais complicados
e surpreendentes do que um
sistema periódico, mas não tão
imprevisíveis e dinâmicos quanto os
sistemas caóticos.
7. COMPLEXIDADE
•
O jogo, enquanto sistema, só entra em funcionamento com a participação do jogador.
Não há complexidade sem que haja a jogada significativa e sem esta, não existe a
emergência de um comportamento inesperado.
• A jogada significativa – diz respeito às ações do jogador e à resposta oferecida pelo
sistema.
• Complexidade – diz respeito à relação entre as partes do próprio sistema e ao que o
sistema oferece em decorrência desta.
8. COMPLEXIDADE
Age of Empires Online – pode vir sob a forma de estratégias ou
dinâmicas de jogo.
Ragnarok Online – pode vir das relações sociais envolvidas.
Poker Online – ou mesmo das implicações psicológicas em
se apostar dinheiro real.
9. EMERGÊNCIA
•
A partir da adição de elementos que respeitem a importância das jogadas realizadas
pelos jogadores, a relação entre as ações tomadas e o retorno oferecido pelo sistema
começam a trazer padrões de comportamento imprevisíveis: como o jogador irá se
relacionar socialmente através da dinâmica proposta pelo jogo? Em que momento o
jogador se arriscará a apostar seus pontos ganhos dentro do próprio jogo?
•
Estes padrões de comportamento imprevistos e a maneira como são surgidos é o que
pode-se chamar de emergência.
•
No capítulo A Anomalia e a Emergência das Descobertas Científicas, do livro
A Estrutura das Revoluções Científicas de Thomas Kuhn, é possível se encontrar a
compreensão do conceito de emergência a partir da maneira como novas teorias
científicas surgem, pela modificação de paradigmas estabelecidos por teorias anteriores.
10. EMERGÊNCIA
•
Entretanto, no caso dos jogos, os paradigmas
dos quais a experiência do jogo emerge são
as próprias regras.
•
Ainda que tenhamos um jogo com a
complexidade de um MMORPG, por exemplo,
existe uma quantidade limitada de regras
dentro das quais o jogador tem liberdade para
tomar ações imprevistas.
•
O jogador deste gênero de videogame poderá
explorar o mundo que se desvela a ele
através da profundidade narrativa proposta
pelo cenário ou poderá procurar monstros
contra os quais se digladiar para subir de nível
e adquirir itens. Poderá ainda, relacionar-se
amigavelmente com outros jogadores,
formando um grupo de exploradores que se
auxilia mutuamente ou fazer muitos inimigos,
posicionando-se como um antagonista.
World of Warcraft – inúmeros comportamentos podem emergir das
regras propostas.
11. A CRIAÇÃO DE UM SISTEMA EMERGENTE
•
Quando um videogame é projetado para ser um verdadeiro sistema emergente o
jogador sentira sua vontade respeitada pelas jogadas significativas às quais terá
acesso e, portanto, passará a se engajar com o conteúdo proposto.
•
Desenvolver um jogo que mantenha o interesse do jogador e permita contextualizações
criativas é tarefa árdua que exige o uso de uma metodologia efetiva. Aqui propomos a
utilização da Metodologia Iterativa, simples e precisa, que compreende um processo
circular em três estágios:
• Design
• Protótipo
• Avaliação
12. A CRIAÇÃO DE UM SISTEMA EMERGENTE
Projeto
Na fase inicial do
projeto,
especialmente em
se tratando de
mecânicas
originais, é difícil
prever todos os
problemas. Devese evitar o excesso
de detalhes e banir
a inflexibilidade.
Equipe e
Ferramentas
Deve-se evitar o
uso de ferramentas
recém-lançadas ou
desconhecidas
pela equipe de
desenvolvimento.
Adquirir domínio
sobre novas
tecnologias
consome um
tempo precioso.
Publisher
Caso esteja
trabalhando sob a
supervisão de uma
publisher, deve-se
redobrar a cautela
com relação ao
excesso de
detalhes da
documentação.
Tudo o que for
acordado por
escrito será
cobrado. Isso inclui
os prazos de
entrega que se
estabelecerão.
Estabelecimento
de Etapas
Com isto em
mente, não se
deve elaborar nada
além do que for
estritamente
necessário para a
etapa vigente do
desenvolvimento
do projeto, pois,
completas as
metas de cada
etapa, serão
realizadas as
respectivas
avaliações e testes
antes que seja
possível prosseguir
à etapa seguinte.
14. ALGUMAS SUGESTÕES PRÁTICAS
•
Já durante a elaboração da mecânica, devem ser realizadas algumas perguntas: Estes
componentes se complementam como objetos capazes de realizar ações
combinadas? Eles são passíveis de sofrer alterações contextuais? Das ações
realizadas podem emergir padrões comportamentais? Algum destes padrões pode
ser danoso para a estabilidade do jogo?
•
Se a mecânica ainda não foi testada, não há porque trabalhar nos gráficos finais. Se a
equipe houver devotado muito tempo à elaboração de recursos sobre fundamentos
falhos, há risco de se encontrar dificuldade em abrir mão do que não está
funcionando.
•
Com todos os elementos da mecânica funcionando e testados (inclusive do que diz
respeito ao fator de diversão), é o momento para se criar uma fase completa e ter um
olhar crítico sobre ela. Recomenda-se a construção de uma fase do meio do projeto,
pois a primeira fase (cronologicamente) deve transmitir ao jogador o corpo e a totalidade
do jogo. A fase final também deve estimular o jogador a continuar acompanhando o
trabalho da desenvolvedora ou a aguardar por novos títulos do mesmo jogo.
15. ALGUMAS SUGESTÕES PRÁTICAS
•
Depois do desenvolvimento da fase completa, é importante realizar testes com diversos
tipos de jogadores diferentes. Podem ser detectados problemas que não surgiram
durante os testes de mecânica, como é o caso do balanceamento. Isso é comum
quando os próprios programadores realizam os testes dos jogos que desenvolvem.
•
Deve-se manter a simplicidade. É muito mais fácil adicionar dificuldade a uma
mecânica, do que torná-la mais simples depois de estruturada.
16. CONCLUSÃO
•
Sistemas Emergentes são Sistemas Complexos dos quais emergem comportamentos
inesperados, graças às relações estabelecidas entre os componentes propostos.
Podemos identificar em alguns jogos de videogame exemplos de sistemas emergentes.
•
Nos jogos, as regras são como paradigmas que, uma vez constituídos, não podem ser
contestados, para o pleno funcionamento do sistema. Porém, um jogo é mais do que a
soma de suas regras. Assim o game designer deve propor ações para jogadas
significativas. Através da interpretação e articulação destas jogadas, emergirão
comportamentos imprevistos.
•
Criar um videogame que corresponda a um sistema emergente é um trabalho que deve
ser realizado da maneira mais estratégica possível, evitando esforços braçais para
corrigir falhas que deveriam ser identificadas no início do projeto, ou o descarte de
trabalhos elaborados de modo meramente intuitivo. Para tal, a cíclica metodologia
iterativa mostra-se bastante adequada, oferecendo uma abordagem que parte da
simplicidade para a complexidade, gerando-a através das combinações e
contextualizações de seus elementos.