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APRESENTAÇÃO


        O cinema, como importante veículo de comunicação, tem grande papel de ferramenta
formadora de opinião na sociedade. Grandes obras do cinema possuem ideologias e até
mesmo, mensagens subliminares, que tem como principal função, a emissão de ideias que a
sociedade-de acordo com a ideia do realizador- deveriam ser incorporadas ou ao menos vistas
pela sociedade.
     Laranja Mecânica de Stanley Kubrick, e Metropolis de Fritz Lang, são filmes
conhecidos por seus conteúdos altamente políticos- ideológicos que mudaram a maneira de
fazer cinema. Ignorados pela grande audiência em sua época, e adulados pela crítica e pela
elite, esses filmes traziam claramente a divisão social e a punição sofrida pelos radicais.
Notoriamente um grito de socorro - ou uma simples propaganda do programa de governo da
maior parte da sociedade-, tais filmes até hoje tem seu valor reconhecido como obras
cinematográficas de valor e de qualidade e claro de inspiração para filmes da atualidade.
     No cinema nacional, desde suas origens, diversas linguagens foram utilizadas. Desde
filmes com forte contexto político, ideológico e até mesmo, filmes com uma linguagem quase
abstrata, muito tem se visto nas produções nacionais. Talvez, nada de uma grandeza tão
abrangente como no filme de Kubrick, mas com certeza, de muita relevância para a formação
de opiniões e ideias do público brasileiro. Público esse que muitas vezes, sofre com imagens
de uma realidade de seu país que é vista nas telas de cinema de forma crítica e ácida, que por
vezes é tão rasa e mal discutida em outros meios de comunicação.
     Dentre tantas fases da sétima arte nacional, uma das que mais chama a atenção, e que
foi (e para muitos ainda é) uma das fases mais polêmicas de produção cinematográfica, foi à
era da pornochanchada. Tais filmes não eram nada mais do que uma mistura do estilo
“chanchada”, que fazia comédias populares, com o estilo pornô (especialmente o italiano) que
contavam geralmente com elenco desconhecido e roteiros fracos.
     A falta de profundidade e excesso de linguagem sexual dessa fase do cinema nacional,
fez com que ela fosse jogada no limbo do esquecimento, e até mesmo que fosse considerada
uma vergonha para o cinema e para a cultura do país. Por anos, filmes que lotaram salas de
cinema e eram o sinônimo de boas bilheterias ficaram totalmente esquecidos, e nem mesmo
foram recuperados para a posteridade. Muitos filmes anteriores a essa era, tem melhor
conservação do que essas obras da década de 1970, devido à reputação de tais filmes que na

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maioria das vezes leva-nos, em uma análise mais curta a uma sensação de imoralidade e
desrespeito aos bons costumes, amplamente vistos em filmes nacionalistas.
      Ainda que a pornochanchada seja vista com maus olhos por uma grande parte da
população brasileira, o fato é que muito pode ser analisado observando os quase 20 anos em
que esses filmes fizeram parte da realidade nacional.

      .

      SOBRE A RELEVÂNCIA DESTE TRABALHO


      Esta pesquisa tem como principal objetivo, mostrar a pornochanchada como um
movimento do cinema brasileiro, além daquilo que é percebido pelo grande público, ou seja,
pretende-se mostrar essas obras como uma fonte de informações e ideologias importantes e
inerentes á época em que a pornochanchada teve seu auge.
      Muito além de fazer uma breve análise de filmes, a pesquisa pretende mostrar fatos
importantes relacionados a mudanças ocorridas na linguagem e até mesmo na produção de
filmes que para muitos, são vistos como uma fase linear, ou seja, sem grandes mudanças e
ocorrências, mas que apesar disso apresenta fatos importantes para a compreensão da época
em que está inserida.
      Com uma parte considerável do trabalho voltado à análise de dois diferentes filmes do
gênero pornochanchada, sendo uma da década de 1970 e outra da década seguinte, pretende-
se mostrar a evolução da linguagem de filmes puramente humorísticos para filmes com um
contexto mais maduro e informativo, ainda que tais informações estejam no filme de maneira
implícita.
      O cinema como obra artístico-cultural, tem um poder incontestável na cultura humana
desde seu surgimento. No Brasil, a história não é diferente. Assim como o Cinema de
Retomada em sua fase atual move milhões de espectadores para os cinemas e quebra recordes
de público com filmes pensados na família brasileira e na atual necessidade de
posicionamento econômico e cultural no qual o Brasil se encontra, não podemos nos esquecer
de que há pelo menos três décadas atrás, o cinema nacional também vivia um momento
significativo para sua existência quando lotava salas com pessoas que procuravam se
identificar com personagens de forte apelo popular, e histórias tão simples como suas vidas.
      Quando o primeiro filme em que corpos começaram a ser desnudados sem a censura
perseguindo seus difusores e seguidores, um novo gênero nascia e lotava salas de cinema por
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todo o país. “A Viúva Virgem”, filme de 1972 e para muitos a primeira produção do gênero,
inaugurava uma fusão de erotismo e comédia com cenas consideradas ousadas para a época,
mas que passaram facilmente pela censura.
      Porém, a pornochanchada não se limita a década de 1970, e se estende para a década
seguinte, e muitas mudanças podem ser notadas na linguagem utilizada, e aí que a
importância desse trabalho se destaca: encontrar e destacar tais mudanças e suas
consequências dentro desse tipo de produção.



      HIPÓTESES


      Tendo em vista a grande quantidade de produções cinematográficas do estilo
pornochanchada no período da década de 1970, até meados da década de 1980, deve-se
analisar atentamente a frouxidão da censura, e a facilidade absorção desse tipo de material
pela sociedade, bem como a mudança na postura desse tipo de produção, que passou de uma
produção com viés cômico a um produto repleto de sexo explícito. Juntamente com o sexo
explícito, vieram temas mais sérios como a prostituição, o homossexualismo, o estupro e até
mesmo o liberalismo de ideias até então, ignoradas por esse tipo de obras que davam mais
atenção ao humor pastelão. Para alguns o fim na produção dessas obras ocorrido somente por
conta do desinteresse do público. Porém o governo que fora na década de 1970 tão
condescendentes com a produção cinematográfica, mudava suas regras dificultando e quase
anulando a produção de filmes no país, fazendo com que muitas produções mudassem seus
focos.
      Se filmes com certo teor político causavam o estranhamento para os órgãos
censuradores, é no mínimo curioso como filmes com alto teor de cenas sexuais e de contra
ideais cristãos amplamente divulgados pela igreja católica, fossem aceitos com tanta
facilidade.
      Ainda que filmes tenham sofrido alguns cortes, como foi o caso de “O Princípio do
Desejo”, de 1979, que teve algumas cenas excluídas, a grande maioria das obras foram
exibidas de forma integral nos cinemas.
      Isso leva-nos a crer que havia um interesse por parte do governo, que filmes sem
conteúdo relevante fossem levados às telas de cinema, já que filmes nacionais deveriam
ocupar pelo menos uma exibição mensal em salas do país, e a época era de revolução e de
revoltas populares.
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Pensando no fato de que apenas filmes que não saíam de um padrão pré-determinado de
linguagem, eram liberados e apoiados pelo governo, e de que as pornochanchadas eram filmes
independentes e com uma linguagem mais liberal, podemos ter a ideia de que por não serem
filmes financiados pela EMBRAFILME, são os que deveriam ser ainda mais visados pelo
governo. Mas de certa forma, notamos que há sim uma frouxidão pela censura, já que filmes
que continham alusões ao comportamento da perversão, poderiam ser uma possível ameaça.
      Quando a censura se afrouxa ainda mais e cenas mais explícitas são liberadas, os filmes
passam a surgir com uma linguagem mais política, e curiosamente, tais filmes pararam de ser
produzidos, graças à decadência dos estúdios. Seria essa decadência uma mudança de ideia
por parte de censura, que passava a ver uma possível ameaça nos filmes que outrora eram
apenas diversão com informação irrelevante e sem conteúdo que pudesse gerar uma possível
reflexão em seu público?
      Deve-se salientar também, que a pornochanchada, para os especialistas durou apenas até
1982, já que o estilo presente com caráter de comédia havia sido trocado por falas políticas e
cenas explicitas que mostravam um amadurecimento e ao mesmo tempo uma vulgarização do
estilo que fizera tanto sucesso no passado.


     METODOLOGIA


      Para a realização dessa pesquisa, a análise de dois filmes do gênero em questão se fez
necessária, sendo uma do início da década de 1970, e outra da década de 1980. Também para
se apoiar histórica e temporalmente, o uso de artigos científicos, textos de sites especializados
em cinema e documentos que pudessem ser levados em conta para a realização dessa pesquisa
foram utilizados, e devidamente referenciados nas páginas onde se encontram as citações
contidas em tais veículos/documentos.
      Em seguida uma análise comparativa entre as duas obras escolhidas foi realizada, para
que o confronto entre as duas diferentes épocas enquanto produtoras de um mesmo gênero
pudessem ser percebidas.




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1. A PORNOCHANCHADA

      Num cenário onde a EMBRAFILME começava a financiar produções cinematográficas
no país com um programa de coprodução, podemos notar o aparecimento de um fenômeno
cinematográfico que com certeza faz as décadas de 1970 e parte da de 1980, uma das mais
rentáveis do cinema nacional, sendo que na de 70, o Brasil viria se tronar o maior produtor de
filmes da América Latina. Esse fenômeno atende pelo nome de pornochanchada, e contava
com roteiros fracos e uma ideia relativamente ousada para a época em que surgia: a mistura
de humor pastelão com cenas de insinuação sexual, com uma nudez ainda moderada em seu
início.


                             Se o cinema nacional já não era bem visto pelos olhos dos próprios
                       brasileiros que reclamavam da péssima qualidade das obras produzidas no país, a
                       pornochanchadas com certeza foi um agravante para essa visão, tendo em vista uma
                       pesquisa realizada em 1978 pela própria EMBRAFILME, época em que o gênero
                       estava em seu auge. . “Essa repulsa pelo cinema nacional, é explicitada por uma
                       pesquisa de mercado encomendada pela própria EMBRAFILME no ano de 1978,
                       realizada em diversos extratos sociais e idades” (SOUZA, 2006 P.11).


          Ainda assim, é indiscutível que a produção pornochanchada foi favorecida por um
programa em que a EMBRAFILME, fazia às vezes de coprodutora com os estúdios fazendo
com que a difusão desse gênero fosse grande em too o território nacional, mesmo que essas
não fossem financiadas diretamente com o dinheiro dessa empresa. Um financiamento na área
da cultura de um órgão tão grande como a EMBRAFILME, só podia valorizar e chamar cada
vez mais a atenção para as produções nacionais.




                       Em 1973, a EMBRAFILME inicia seu programa mais conhecido, o de coprodução.
                       Esse foi o principal programa desse órgão, e o maior responsável pela produção
                       fílmica brasileira nas décadas de 70 e 80. Entre os anos de 1973 e 1981, a
                       EMBRAFILME coproduziu 131 longas-metragens, tornando o Brasil o maior
                       produtor Cinematográfico latino-americano nesse período. (SOUZA, 2006, P.
                       10)


      A composição dos filmes da pornochanchada, que somam mais de seiscentos em sua
totalidade¹, não possui seu aspecto repulsivo à toa. Seu local de produção remetia totalmente

                                                                                                     5
ao universo em que os roteiros mergulhavam especialmente os mais recentes, que tinham um
caráter mais urbanizado e fugiam do humor inocente proposto no início das produções.
Famoso por abrigar estúdios como Paramount, Fox entre outros nos anos 30 e 40, o bairro da
Luz em São Paulo contou com um lugar especial que com o passar dos anos viu suas
produções decaírem de qualidade tanto no roteiro quanto no financiamento de suas obras.
Nascia então, “A Boca do Lixo”, chamado assim pelo ar de “resto” daquilo que já havia sido
lugar de glamour e dinheiro e que hoje é conhecido como reduto de venda de produtos eletro
eletrônico.
      Apesar de ocupar um espaço um tanto quanto esquecido na cultura nacional, a
pornochanchada, não deve ser subjugada e tampouco subestimada devido ao seu conteúdo
questionável para muitos. Tamanhas são as contribuições possíveis de análise que essas
proporcionam para um estudo da época em que esta inserida.




      1.1 A PORNOCHANCHADA NA DÉCADA DE 1970


      Iniciada -para alguns- com a produção do filme “A Viúva Virgem” em 1972, com uma
história que colocava o cômico e o insinuante juntos, numa produção em que o roteiro já não
era o forte da produção, o filme é um dos maiores sucessos do gênero, que em sua exibição
contou com grande público, cerca de 2.635.962 pagaram para ver a fita.
      Espelho de uma época onde o movimento hippie que influenciou o mundo todo e
almejavam por liberdade, os filmes produzidos nessa época mostram com um ar de
libertinagem os desejos de uma sociedade em se desnudar daquilo que até então era proibido.
Ainda é muito interessante observar que em uma época em que a censura era tão forte, tais
obras tão ousadas tenham sido autorizadas.

                                    A ideia de vícios e virtudes, ideologia cristã-paulina difundida pela
                                    igreja católicae coadunada a necessidade de ser produtivo,
                                    estimuladapelo ideário governamental, demonstra outra faceta dessa
                                    realidade . (NETO, 2007 P.2)




      Deixemos a censura pata outro capítulo e reflitamos que a partir do curioso contexto
citado, diversos filmes foram produzidos seguindo a linha que fizera tanto sucesso nas salas
de cinema do país, seguindo a ideia do Cinema Marginal, advindo da década de 1960,
                                                                                                       6
AHISTÒRIA DO CINEMA e fazendo a mistura de dois gêneros que, ainda eu distintos,
prometiam uma boa combinação. A mistura tão incomum era da comédia (lembrado então
como chanchada, outro gênero famoso do cinema nacional que ia pelo caminho cômico) e do
erotismo, que se tornava famoso graças à pornografia italiana que chegava a todo mundo e era
então a maior produtora do gênero segundo a Wikipedia.
      No início da década de 70 até o ano de 1982 a linha seguida foi sempre a mesma.
Roteiros fracos, misturados com cenas de corpos parcialmente nus especialmente de mulheres
(onde seios eram geralmente mostrados), onde uma insinuação em forma de atuação sexual
era feita.
      Muitos atores veteranos da TV brasileira começaram a sua carreira, ou reforçaram a já
existente, com filmes de pornochanchada. Nomes como Vera Fischer, Sônia Braga, Nuno
Leal Maia, Antônio Fagundes entre outros foram nomes que passaram pelo gênero sem
causarem estragos a carreira graças ao apelo menor ao sexo em seus filmes.

                       Dentre as obras produzidas nessa década, estão filmes que até hoje possuem um
                       grande reconhecimento por parte do público e até mesmo da crítica especializada, e
                       que assim como já dito possuem atores conhecidos até a presente data como Vera
                       Fischer e Nuno Leal Maia, como é o caso de filmes como “O Bem Dotado- O
                       Homem de Itu”, “A Super-Fêmea” e também o filme “Mulher Objeto”, que
                       conseguiu um total de 2.031.520 espectadores e seu período de exibição, sendo esse
                       último um pouco menos cômico que os demais. (CARLOS Cinema BLOGSPOT) .



      Filmes com roteiros criados a partir de histórias do famoso escritor e cronista Nelson
Rodrigues também ficaram marcados nessa época, e por vezes fugiam da estética puramente
cômica e tinham um viés mais sério, em especial títulos como “Os Sete Gatinhos”, “A Dama
do Lotação” e “Toda Nudez Será Castigada” que tinham um humor mais ácido e crítico.
      Até o final da década de 70, muitos foram os títulos que ganharam as telas, e muitas
foram as polêmicas enfrentadas pelos produtores, atores e diretores do gênero. Um dos casos
mais famosos, que até hoje gera controvérsias devido ao contexto em que aconteceu, é o caso
do filme “Amor, Estranho Amor” de 1979 de Walter Hugo Khouri. Em seu lançamento, o
filme tinha em seu cartaz os protagonistas Tarcísio Meira e Vera Fischer. Anos depois após
sua atriz coadjuvante ganhar os holofotes do mundo do entretenimento infantil sob o nome de
Xuxa, sua imagem e nome foram anexados na capa original que passou a ser vendida
ilegalmente em todo o país. Mas o problema maior que Xuxa enfrentava era sua credibilidade
como apresentadora infantil, já que na película ela era vista em cenas de sexo com um garoto
de apenas 12 anos. Assim como aconteceu com o filme de Khouri, as polêmicas e qualidade

                                                                                                       7
das obras começariam a decair no final da década de 70, e teriam seu fim na metade da década
seguinte.



     1.2.       A PORNOCHANCHADA NA DÉCADA DE 1980


       Se na década de 1970, as produções foram favorecidas com a coprodução da
EMBRAFILME, nos anos de 1980 a situação mudaria um pouco. Com uma gestão e
burocracia confusa que não sabia se deviam apoiar os filmes com maior rendimento de
bilheteria, ou então, os filmes tidos como mais densos culturalmente, a organização passou a
ter sérios problemas, por volta de 1981 quando o passou-se a cobrar altos impostos de filmes
estrangeiros e também graças à própria distribuidora também criada para fugir das
distribuidoras internacionais. Com esse movimento, perdeu muito investimento de estúdios
americanos, e muito dinheiro deixou de entrar no país.

                       A paralisia da EMBRAFILME seguramente foi uma das responsáveis para a Crise
                       do cinema nacional da década de 80. Soma-se à má qualidade dos filmes, em
                       comparação à produção norte-americana (nesse caso o critério de qualidade é
                       técnico), com a altíssima inflação e uma rede televisiva cada vez maior, trazendo
                       entretenimento gratuito para a população. O ato de ir ao cinema se tornou um luxo
                       para o brasileiro” (SOUZA, 2011 P.11)


     Com a crise no cinema, e a chegada de filmes e aparelhos reprodutores de VHS, o
mercado então se viu num beco sem saída. A saída mais viável para atrair público para as
salas de cinema era fazer filmes mais apelativos e que pudessem ser alvo de interesse dos
espectadores.
     A nudez não era um experimento novo e exclusivo da pornochanchada. Em 1962, “Os
Cafajestes” fez um grande público após ser censurado e, meses depois, liberado para a
audiência. No filme, que possuía a emblemática cena de Norma Bengell no primeiro nu
frontal do cinema moderno brasileiro, uma preciosa lição fora aprendida.

                       Essa trama apresentou a atriz Norma Bengell no primeiro nu frontal do cinema
                       brasileiro moderno. Por essa cena foi censurado e considerado pornográfico, porém
                       quando volta as “telonas” torna-se recorde de bilheteria e por trabalhar um tema de
                       preferência do grupo cinema novista, que era a burguesia decadente e depravada, é
                       eleito como filme-símbolo do movimento... Inicialmente pornográfico para depois
                       tornar-se bandeira cinema novista e recorde de público, recorde esse, nitidamente
                       alcançado pelo uso do erotismo que com abordagem inédita causava frisson e muita
                       curiosidade. (NETO, 2007 P.5)




                                                                                                        8
Se certamente a nudez nos filmes até então chamava muito mais atenção do que as
incursões no humor, já havia uma saída para que a pornochanchada não ficasse esquecida, ou
que se findasse: a produção de filmes com sexo explícito. E assim foi feito o primeiro filme
de sexo explícito (mas ainda com toques de humor) no Brasil, intitulado “Coisas Eróticas” no
longínquo ano de 1981. Dirigido por Rafaelle Rossi e Laente Callichio, o filme causou frisson
na sua estreia e conta com três historietas. Figura até hoje, na lista de um dos mais assistidos
filme nacionais de todos os tempos, figurando em um 13º lugar na lista, feito raro já que se
analisarmos a lista dos cinquenta maiores êxitos do cinema nacional não veremos nada do
gênero que se compare ao sucesso atingido pela obra.




                P                                                                              Data de       Espect
                              Título              Diretor                Rodutor
    os.                                                                                     estreia       adores
                                                   José                                       outubro/       11.081
                1         Tropa de Elite 2                            Zazen Produções
                                              Padilha                                       2010          .199[5]
                         Dona Flor e Seus         Bruno                                        novembr       10.735
                2                                                       L.C.Barreto
                        Dois Maridos          Barreto                                       o/1976        .524[5]
                                                Neville de                                    abril/19       6.509.
                        A Dama do Lotação                              Regina Filmes
3                                             Almeida                                        78            134
                                                  Daniel                                      janeiro/2      6.137.
                4       Se Eu Fosse Você 2                          Total Entertainment
                                               Filho                                         009           039
                          O Trapalhão nas                                                     agosto/1       5.786.
                5                               J.B. Tanko           J.B.Tanko Filmes
                    Minas do Rei Salomão                                                     977           226
                          Lúcio Flávio, o        Hector                                        novembr       5.401.
                6                                                        HB Filmes
                    Passageiro da Agonia     Babenco                                        o/1977         325
                            2 Filhos de            Breno                                      agosto/2       5.319.
                7                                                   Conspiração Filmes
                         Francisco            Silveira                                       005           677
                          Os Saltimbancos                                                      dezembr       5.218.
                8                               J. B. Tanko          J.B.Tanko Filmes
                         Trapalhões                                                         o/1981         478
                        Os Trapalhões na          Adriano         Renato Aragão Produções      dezembr       5.089.
                9
                    Guerra dos Planetas        Stuart                Artísticas             o/1978         970
                1        Os Trapalhões na                                                      dezembr       5.043.
                                                J. B. Tanko          J.B.Tanko Filmes
        0               Serra Pelada                                                        o/1982         350
                1          O Cinderelo            Adriano         Renato Aragão Produções     junho/19       5.028.
        1                Trapalhão             Stuart                  Artísticas            79            893
                                                         Com mais de 4 milhões
            P                                                                                  Data de       Espect
                               Título               Diretor               Produtor
os.                                                                                         estréia       adores
            1            O Casamento dos             José               Renato Aragão          dezembr       4.779.
    2                    Trapalhões           Alvarenga Jr.       Produções Artísticas      o/1988         027
                                                    Raffaele
            1                                                             Empresa              julho/19      4.729.
                           Coisas Eróticas       Rossi e
    3                                                            Cinematográfica Rossi        82           484
                                             Laente Calicchio
            1                                       Hector                                     abril/20      4.693.
                             Carandiru                                    HB Filmes
    4                                           Babenco                                       03           853
            1             Os Vagabundos               J. B.           J.B.Tanko Filmes        junho/19       4.631.

                                                                                                                 9
5               Trapalhões                   Tanko                                           82           914
      1       O Trapalhão no Planalto             J. B.                                        dezembr       4.565.
                                                                    J.B.Tanko Filmes
 6              dos Macacos                   Tanko                                         o/1976         267
      1          Simbad, o Marujo                 J. B.                                        junho/19      4.406.
                                                                    J.B.Tanko Filmes
 7               Trapalhão                    Tanko                                           76           200
      1                                           Adriano             Renato Aragão           janeiro/1      4.240.
               O Rei e os Trapalhões
 8                                             Stuart           Produções Artísticas         980           757
      1        Os Três Mosqueteiros               Adriano             Renato Aragão            junho/19      4.221.
 9              Trapalhões                     Stuart           Produções Artísticas          80           062
      2         O Incrível Monstro                Adriano             Renato Aragão           janeiro/1      4.212.
 0              Trapalhão                      Stuart           Produções Artísticas         981           244
      2                                          Tizuka                                        junho/19      4.178.
                   Lua de Cristal                                      Dreamvision
 1                                           Yamazaki                                         90           165
      2                                          Wagner                                        setembr       4.060.
                     Nosso Lar                                       Cinética Filmes
 2                                           de Assis                                       o/2010         304
      2        A Princesa Xuxa e os               José              Renato Aragão              junho/19      4.018.
 3              Trapalhões                 Alvarenga Jr.      Produções Artísticas            89           764
                                                    2Com mais de 3 milhões
      P                                                                                        Data de       Espect
                   Título                       Diretor                   Produtor
os.                                                                                         estréia       adores
      2         O Cangaceiro                                            Renato Aragão          junho/19      3.831.
                                              Daniel Filho
 4            Trapalhão                                           Produções Artísticas        83           443
      2                                                                                       janeiro/2      3.644.
              Se Eu Fosse Você                Daniel Filho            Total Entertainment
 5                                                                                           006           956
      2       Os Trapalhões e o                                         Renato Aragão          junho/19      3.616.
                                             Carlos Manga
 6          Rei do Futebol                                        Produções Artísticas        86           696
      2                                                                                        dezembr       3.547.
              De Pernas pro Ar              Roberto Santucci          Downtown Filmes
 7                                                                                          o/2010         138
      2           O Jeca                          Pio                                          fevereir      3.468.
                                                                         PAM Filmes
 8           Macumbeiro                Zamuner e Mazzaropi                                  o/1975         728
      2                                                                                        abril/19      3.457.
                 Eu Te Amo                   Arnaldo Jabor               Flávia Filmes
 9                                                                                            81           154
      3        Jeca Contra o                      Pio                                          fevereir      3.428.
                                                                         PAM Filmes
 0             Capeta                  Zamuner e Mazzaropi                                  o/1976         860
      3                                                                                        abril/20      3.413.
                Chico Xavier                  Daniel Filho             Lereby Produções
 1                                                                                            10           300
      3        O Trapalhão na                                                                  junho/19      3.375.
                                               J. B. Tanko             J.B.Tanko Filmes
 2         Ilha do Tesouro                                                                    75           090
      3                                                                                       agosto/2       3.307.
               Cidade de Deus              Fernando Meirelles             O2 Filmes
 3                                                                                           002           746
      3          Jecão, um                        Pio                                          junho/19      3.306.
                                                                         PAM Filmes
 4        Fofoqueiro no Céu            Zamuner e Mazzaropi                                    77           926
      3       Os Trapalhões na                                          Renato Aragão          dezembr       3.200.
                                            Flávio Migliaccio
 5        Terra dos Monstros                                      Produções Artísticas      o/1989         000
                                                                                               setembr       3.183.
                Xica da Silva                Carlos Diegues              Terra Filmes
36                                                                                          o/1976         582
      3          Lisbela e o                                                                  agosto/2       3.169.
                                              Guel Arraes             Natasha Enterprises
 7           Prisioneiro                                                                     003           860
      3         O Menino da                 Jeremias Moreira               Topázio            março/1        3.131.
 8             Porteira                       Filho                 Cinematográfica          977           878
      3                                                                                        novembr       3.082.
              Aluga-se Moças                Deni Cavalcanti             Madial Filmes
 9                                                                                          o/1981         925

                                                                                                                 10
4        Cazuza – O Tempo             Sandra                                            junho/20      3.082.
                                                                       Lereby Produções
 0              Não Para        Werneck e Walter Carvalho                                    04           522
      4                                                                  Nexus Cinema e      agosto/2       3.076.
                      Olga                 Jayme Monjardim
 1                                                                        Video             004           297
                                                       Com mais de 2 milhões
      P                                                                                       Data de       Espect
                     Título                  Diretor                      Produtor
os.                                                                                        Estréia       adores
      4          Robin Hood, o                                                                julho/19      2.978.
                                           J. B. Tanko                J.B.Tanko Filmes
 3        Trapalhão da Floresta                                                              74           767
      4                                                              Missão Impossível        outubro/      2.977.
                  Os Normais            José Alvarenga Jr.
 4                                                            Cinco Produções Artísticas    2003          641
      4                                   José Alvarenga                                      julho/20      2.974.
                  Cilada.com                                            Case Filmes
 5                                         Júnior                                            11           697
      4        Independência ou                                                               setembr       2.924.
                                         Carlos Coimbra                   Cinedistri
 6               Morte                                                                     o/1972         494
      4           O Jeca e Seu                 Pio                                           abril/197      2.872.
                                                                        PAM Filmes
 7             Filho Preto        Zamuner e Berilo Faccio                                    8            881
      4           Super Xuxa            Ana Penido e David                                                  2.816.
                                                                        Dreamvision            1988
 8         Contra Baixo Astral         Sonnenschein                                                       000
                                                                         Produções
      4        Roberto Carlos a                                                               dezembr       2.785.
                                          Roberto Farias       Cinematográficas Roberto
 9          300 km por Hora                                                                o/1971         922
                                                                       Farias
      5         Um Caipira em                 Pio                       PAM Filmes           janeiro/1      2.720.
 0             Bariloche           Zamuner e Mazzaropi                                      973           345




          Até mesmo José Mojica Marins, conhecido pela maioria como Zé do Caixão,
personagem emblemático da cultura brasileira, fez sua participação no mercado da
pornochanchada com duas sequências de nome forte: na primeira “24 horas de Sexo
Alucinante”, havia a proposta de uma orgia ininterrupta durante todo esse tempo. Em seguida,
lançou “48 horas de sexo alucinante”, onde apesar do nome, tratava-se apenas de um
reaproveitamento de cenas do anterior, com um tempo ainda menor de duração.
          Ainda que tenha feito grande sucesso nas bilheterias nacionais em sua estreia com um
público acumulado em 4.729.484 WIKIPEDIA, não demorou muito pra que a nova direção
que tomava pornochanchada começasse a falhar. Com histórias cada vez mais ousadas que
partiam para uma estética bizarra e cada vez mais questionável quanto ao ponto de vista
artístico, cada vez mais a orçamento dos filmes eram menores, e já não havia nomes famosos
da televisão nas produções. Ainda assim, grandes nomes da era da pornochanchada foram
forjados nessa época em que o sexo explícito era o foco. Nomes como David Cardoso, Carlo
Mossy e Sady Baby que produziam e participavam de seu filme como personagens são
conhecidos até hoje. Já atores menores e figuras sempre vistas nas produções acabaram
caindo no esquecimento.
                                                                                                               11
1.3.    A PORNOCHANCHADA E A DITADURA


     É no mínimo questionável que em um país onde a censura foi tão forte e presente nas
décadas de 70 e 80, produções como as pornochanchadas tenham passado livremente sem
questionamentos e cortes severos.


                       Para os críticos da época, os filmes eram grosseiros, vulgares e apelativos, fruto de
                       um momento de forte repressão do poder à produção cultural e de controle da
                       informação. No afã de desviar a atenção da opinião pública para o cinema, tornando-
                       a menos crítica ao regime, o governo permite o oferecimento de filmes de comédia e
                       cenas picantes. Portanto, para estes intelectuais, a inteligência do Estado trabalhava
                       de maneira sagaz a catarse pública através do riso e do erotismo, enquanto
                       desenvolvia manobras esdrúxulas no comando do país. Numa leitura política,
                       censura e pornochanchada são vistas como irmãs gêmeas de comportamentos
                       opostos, que vem a surgir nos primeiros meses de 1969 (nenhuma intenção
                       cabalística nesse número), tendo vida intensa no período em que cortes e
                       cerceamentos criavam as condições excelentes para a aceitação de produtos mal-
                       acabados e grosseiros. (NETO, 2007. P. 5 e 6)


     Em filmes da década de 1970, não é raro encontrarmos desconexões nos roteiros,
geralmente rasos e carentes de informações relevantes. Em alguns filmes são notórias os
posicionamentos mais ideológicos, como é o caso de “Toda Nudez Será Castigada”, porém o
êxito de filmes desse calão é infinitamente menor, sendo visível a falta de figuração desses
títulos na lista dos mais assistidos do cinema nacional. Já na década de 1980, os filmes que
perderam um pouco seu viés humorístico ganharam um foco um pouco mais sério e autoral,
tendo como exemplo, o filme de Tony Vieira “Banho de língua” do ano de 1985, que conta
com cenas de sexo explícito, mas também ostra personagens mais tangíveis e situações mais
realistas e dignas de discussão, como por exemplo, a temática do estupro, do machismo e do
feminismo.
     Merecendo um ponto de destaque, destaca-se a presença de cenas de homossexualismo
(já que o feminino já acontecia na década passada) masculinos sempre constantes nos filmes a
partir do início da década de 80. Filmes como “Emoções Sexuais de um Jegue” de 1986, “O
Analista de Taras Deliciosas” de 1984, “Um Pistoleiro Chamado Papaco” (Também
conhecido como “Um Amor de Pistoleiro” de 1987 contém em sua composição pelo menos
uma cena onde homens participam de cenas de sexo, mostrando um desprendimento maior
quanto ao sexo, e claro visando alcançar um publico maior, já que o mercado de home vídeo

                                                                                                          12
ainda era escasso no Brasil. Até mesmo filmes de grandes atores como David Cardoso, como
por exemplo, “Corpo Devasso” de 1980 e “Gisele” com Carlo Mossy também de 1980
continham cenas feitas pelos próprios atores que ostentavam a imagem de galãs.




      1.4.   O FIM DA PORNOCHAHCHADA BO BRASIL


      Se a decadência dos filmes se dava cada dia mais graças à falta de qualidade do
material, a situação iria se tornar ainda pior quando produtores menores passariam a utilizar-
se de nomes de filmes conhecidos em suas capas, mas na verdade tratava-se de material, ainda
que parecesse impossível inferior aos oferecidos pelos grandes produtores. Por volta de 1989,
os últimos filmes do gênero foram produzidos e por um tempo foram totalmente esquecidos,
até que em 1991, Carlo Mossy galã, produtor e diretor voltaram com o filme “O Fotógrafo e
as Modelos”, assinando a direção como Gisele, a personagem central de um de seus filmes da
década anterior, mas era inegável que a era das pornochanchadas havia acabado de vez.


      2.0. UMA ANÁLISE SOBRE A PORNOCHANCHADA


      Como já dito antes, a pornochanchada que ocupou duas décadas em sua duração não
possui apenas uma faceta. Se em sua primeira década as obras eram voltadas para uma
comédia com insinuação sexual moderada, na década de 1980 o sexo explícito tomou conta
das produções.
      Para pontuar essas diferenças a análise de dois filmes faz-se necessária, sendo um da
década de 1970 e outro da de 1980. Para a década de 70, será feita a análise do filme “A
Super-Fêmea” de 1973.
      Já para a década de 1980, o filme “Banho de Língua” do ano de 1985 dirigido por Tony
Vieira será o foco da análise.




      2.1. BANHO DE LÍNGUA: MAIS ACIDEZ DO QUE HUMOR


                                                                                           13
FICHA TÉCNICA ORIGINAL DO FILME




     SINOPSE



      1985 - Banho de língua
     Filme pornográfico com sexo explícito dos anos 80. Garota do interior vai buscar
trabalho em São Paulo e, depois de ser violentada por um playboy, se torna garota de
programa.



                                                                                   14
Produzido pelo então famoso e polêmico produtor, diretor e ator de filmes do estilo
pornochanchadas Tony Vieira (pseudônimo de Maury de Queiroz) no ano de 1985, o filme
assim como a grande maioria dos filmes do gênero não conta com um roteiro consistente. No
entanto, isso não foi obstáculo para que o filme caísse no gosto do público fã do gênero, que
consagrou o filme como uma das maiores produções desse segmento, embora ele não figure
nas listas dos filmes nacionais com mais de um milhão de espectadores.
     Na verdade para críticos e fãs do movimento cinematográfico da pornochanchada, o
filme já se trata apenas de um filme tenso que lembra os filmes engraçados da década passada
apenas por conta da presença de cenas de sexo explícito. Se até o final da década de 1970 os
filmes giravam em torno de um apelo popular visando o humor, os anos de 1980 vieram em
busca de certo amadurecimento para as obras -ao menos do ponto autoral- e também de um
empobrecimento, já que as fitas já não eram mais patrocinadas pela.
     Embora o filme não siga a linha comédia, há cenas de sexo na trama que possuem um
teor cômico e por certas vezes provocador, já que foge da linha convencional de filmes de
sexo apresentados na mesma época. Na trama, três garotas desempregadas se encontram por
acaso, logo após uma delas ter sido abusada sexualmente por um falso contratante, e a partir
dessa premissa, ou seja, da dificuldade de ajustamento à cidade grande e a dificuldade
financeira, decidem dar um jeito na dificuldade que enfrentam         tornando-se garotas de
programa. O tema da prostituição foi tratado pelo diretor em um filme anterior á Banho de
Língua, intitulado “Meninas de Programa”, sendo esse o primeiro filme hardcore , ou seja,
que continha cenas de sexo explícito, do diretor.
     Ainda que inicialmente a trama sugira uma ideia inicial de vingança da personagem
principal pelos malfeitores que a violentam no início do filme, ao final há um plot twist, ou
seja, uma reviravolta, que tira a intenção inicial e mostra o sexo como ação “salvadora” e
talvez até solucionadora dos problemas da personagem, mostrando um lado mais pervertido
do filme que sugere que a personagem tenha gostado do estupro sofrido no início da história.
     Se por um lado o grande foco do filme são as cenas de sexo, algo incomum em um
mundo machista nessa obra é percebido: a liberação feminina de seus desejos. Se em obras
similares as mulheres são meros objetos receptivos para os homens, em “Banho de Língua”
testemunhamos mulheres fortes e decididas a utilizarem seu corpo para o trabalho, e também
para satisfazerem seus desejos mais íntimos, como se pode notar nas cenas com conteúdo
lésbico, que não fazem parte do trabalho como garotas de programa envolvendo as
personagens centrais.

                                                                                           15
A linguagem do filme envolve palavrões e como a grande maioria das produções há
uma falta de sincronia entre a fala e os movimentos labiais dos atores, que por muitas vezes
são dublados por artistas diferentes.
      Quanto às imagens e cenas, há muitas no mínimo chocantes para a audiência altamente
moralista, como por exemplo, cenas onde objetos são inseridos em cenas de sexo bizarras,
como por exemplo, uma cena onde uma mulher fuma utilizando sua vagina por volta dos ***
de filme, e também onde um espanador é introduzido no ânus de um homem em uma cena de
orgia. As cenas não causam estranhamento apenas na época, mas ainda hoje impactam aos
espectadores, que consideram tais cenas uma das mais fortes desse tipo de cinema.
Considerado por adoradores da pornochanchada como uma das “pratas” de sua época, o filme
não foge a regra quando o assunto é escatologia.




      2.2. ANÁLISE DAS CATEGORIAS


      Tema: O filme mostra o cotidiano de três garotas que após uma série de desilusões com
a vida na cidade na grande, decidem tornarem-se garotas de programa. Dessa premissa, várias
temáticas ligadas ao sexo surgem na vida das garotas.
      Personagens: Os personagens podem ser divididos em três diferentes níveis. Os
protagonistas, que são as três garotas que se tornam garotas de programas e os antagonistas
que se dividem em duas diferentes participações no filme. Uma delas são os vilões do filme,
que são homens ricos que se utilizam da esperteza para abusarem de mulheres indefesas. Os
outros são os clientes atendidos pelas meninas, que são homens e mulheres de diferentes
idades. Algo interessante a ser observado quanto aos personagens, é o contraponto entre a
ingenuidade da pessoa vinda das cidades do interior vivida pela personagem central Rose, e a
falta de escrúpulos do homem da capital.
      Cenografia: O filme se passa na grande São Paulo dos anos de 1980, em locações
variadas, como casas, apartamentos e também algumas cenas em locais abertos como ruas e
praças. A cenografia é pobre e com cenários feios, o que de certa forma, mostra a qualidade
de vida que os personagens possuíam no contexto da história.
      Diálogos: Os diálogos do filme, bem como seu roteiro, não são o forte da obra que
conta com frases por muitas vezes desconexas e prejudicadas graças a um tipo de

                                                                                         16
acontecimento comum no cinema nacional da época: a dublagem para a melhora do som
original, que trouxe um ar ainda mais amador para algumas cenas da obra que não contava
com um grande orçamento.
     Roteiro: Conta a história da jovem Rose, que vinda de uma cidade pequena de Minas
Gerais tem problemas para se estabelecer na grande São Paulo. Quando se vê sem saída, já
que vai foi despejada de seu apartamento, a jovem começa a procurar uma oportunidade de
melhora na sua vida. Quando pensa ter encontrado a oportunidade que salvará sua vida, Rose
é enganada pelo homem que lhe oferecia uma oportunidade de emprego que na verdade
pretendia ter relações sexuais com a moça. Desiludida com o mundo, Rose encontra mais
duas mulheres em uma situação parecida, que dizem já ter resolvido seus problemas, pois
resolveram se prostituir. Rose ainda crente nos valores do mundo vai à procura mais uma vez
de emprego, e dessa vez cai nas garras de homens inescrupulosos que a dopam e forçam a
relação sexual com a moça. Após tal situação, Rose desiste de seus bons costumes e se junta
às duas amigas na prostituição. Porém, Rose tem um plano: pretende encontrar-se com a
gangue do homem que lhe estuprou para conseguir a vingança que tanto almeja. Mas até que
seu desejo se concretize, muitas serão as aventuras/desventuras sexuais que Rose terá que
enfrentar como prostituta, atendendo os mais diversos tipos de clientes e suas fantasias.
Embora no final da película rose encontre seus desafetos, uma reviravolta acontece no roteiro:
ela permite que os vilões a capturem e mais uma vez consumem o ato do estupro, mas dessa
vez com um diferencial, mostrando uma face da personagem que até então vinha sendo
desenhada de acordo com o desenvolvimento da trama. Ela permite que os homens a
estuprem, mostrando que na verdade tratava-se de um desejo secreto da personagem ter o
contato com aquele tipo de relação forçada. O filme termina com a relação consumada e mais
nenhuma palavra.
     Trilha Sonora: O filme conta com algumas músicas feitas para a trilha incidental do
filme, ou seja, composições instrumentais originais para a obra. Mas assim como a maioria
das obras do gênero, conta com canções populares nacionais e internacionais da época.




     2.3. CONCLUSÕES SOBRE O FILME


                                                                                           17
O filme mostra com uma linguagem que mistura a veia cômica de diálogos com termos
pouco usuais em uma conversa formal, com termos que podem causar estranhamento em
algumas pessoas, mas está longe da forte veia cômica que consagrou o gênero na década
anterior, mas voltada para um humor mais popular. O forte do filme está mesmo nas cenas de
sexo explícito e na direção competente de Tony Vieira que fez um histórico notável na
indústria cinematográfica brasileira dirigindo filmes policiais e de ação na década de 1970.
Ainda que seja uma obra cheia de defeitos característicos das obras de baixo orçamento da
década de 1980 com uma edição ruim e com trilhas sonoras desconexas com a história, o
filme tem uma competência maior do que os comparados a ele.
     Contando a história da inocente Rose, vieira nos remete a um mundo de paralelos,
aonde a bondade daqueles que vem das pequenas cidades são abalados pela malícia e
inescrupulosidade de quem já vive na cidade grande há muito tempo. É notável a mudança de
comportamento e como as atitudes dos personagens que cercam Rose afetam sua decisão
final, e moldam seu comportamento. De moça doce e inocente do interior, Rose se transforma
em mais uma mulher comum dos grandes centros.
     Se analisado mais a fundo, o filme pode nos mostrar também, especialmente em sua
cena final, traços de um feminismo não característico desse tipo de obra que trata a mulher
como objeto de desejo. Quando a personagem Rose decide deixar que o estupro feito pelos
mesmos dois homens que no início do filme abusaram sexualmente da personagem seja
consumado sem maiores problemas e proclama a frase “Era bem isso que eu estava
esperando, era bem isso que eu queria”, não vemos apenas uma personagem que mudou de
ideia quanto aos seus planos de vingança; vemos uma mulher que teve coragem de expressar
seus desejos verbalmente, e coloca-los em prática. Se na década da de 70 víamos filmes
inspirados pelo movimento hippie que influenciava a liberdade sexual e de expressão, ainda
podíamos enxergar traços de um machismo colocando as personagens femininas em posição
desconfortável de meros objetos de desejo. No filme de Vieira, podemos ver mulheres
decididas que para terem seu sustento garantido, buscam na prostituição um meio para
sobreviverem, e de acordo com a obra, de se divertirem.
     O reflexo de o filme ter um viés tão sério e mais politizado de que seus concorrentes da
década anterior a de sua realização, e até mesmo aos de sua geração, pode estar no fato do
descontentamento de Vieira com os rumos que a cultura vinha tomando no país, lembrando
que nessa época os problemas com a EMBRAFILME já haviam começado, e sua



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desesperança talvez fosse refletida na vida sem perspectiva de personagens tão frios como ele
próprio frente ao descaso com a cultura do cinema que ele mesmo tanto ajudara a construir.
      Os filmes da década de 1980, ao contrário de “Banho de Língua”, não possuíam roteiro
consistente, e por vezes, assim como o precursor da inserção do sexo explícito nas tramas,
coisas     Eróticas”,                                                   nem           mesmo
continham                                                               conclusões de suas
tramas                                                                  desenvolvidas
durante a trama,                                                        caso   da    segunda
história mostrada                                                       dentro de um ciclo
de três pequenos                                                        episódios   inseridos
no filme. Por isso                                                      ainda que aquém das
expectativas       de                                                   obras de qualidade
que      talvez     o                                                   público     esperasse
para assistir      no                                                   cinema, “Banho de
Língua”       merece                                                    destaque por trazer
temas, que além                                                         do sexo, fazem sua
trama interessante                                                      e até mesmo mais
passível           de                                                   classificação de obra
que vai além do                                                         erotismo.
      Livre        de                                                   mensagens políticas
explicita,        mas                                                   cheios de alusões à
liberdade,                                                              mostradas       aqui
como o sexo por prazer e as escolhas do personagem, o filme merece destaque dentre a vasta
produção do gênero graças a sua qualidade superior.




    2.4. A SUPER FÊMEA: O PODER DA MULHER COMO OBJETO
DE DESEJO




                                                                                             19
FICHA TÉCNICA

      Título original: A Superfêmea
      Gênero: Comédia
      Elenco: Vera Fischer, Perry Sales, Walter Stuart, Geórgia Gomide, John Herbert,
Adoniran Barbosa, Líbero Rípoli, Sérgio Hingst, Renato Restier, Sílvio de Abreu,
Roberto Bolant, Elza Aguiar, Ivete Bonfá, José Júlio Spiewak, Lyba Frydman, Décio
Piccinini entre outros.
      Duração: 100min.
      Lançamento (Brasil): 1973
      Distribuição: Cinedistri
      Direção: Anibal Massaini Neto
      Argumento: Anibal Massaini Neto, Lauro César Muniz, Adriano Stuart e
Alexandre Pires
      História: Lauro César Muniz
      Roteiro: Anibal Massaini Neto e Adriano Stuart
      Adaptação: José Peres e Antônio C. Martins
      Produção: Osvaldo Massaini e Anibal Massaini Neto
      Gerente de produção: Miron R. Cunha
      Assistente de produção: Antônio Santana
      Co-produção: Cinedistri
      Música: Mário Edson
      Som: Victor Raposeiro
      Fotografia: Osvaldo Oliveira e Antônio Meliande
      Assistente de Fotografia: Jurandir Pizzo
      Câmera: Rubens Eleutério
      Fotografia de Cena: José Amaral e Wilson Marques
      Figurinos: Vila Romana
      Montagem: Lúcio Braun
      Assistente de Montagem: Fernando Braun
      Eletricista: Antônio Souza
      Maquinista: Wilson S. Louzada
      Maquiagem: Flávio Torres
      Contra-regra: Nilson Oliveira
      Continuidade: Maria Isabel Amaral
      Coreografia: Clarice Abujamra



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SINOPSE

      Um laboratório farmacêutico resolve lançar no Brasil a pílula anticoncepcional para
homens. Para a publicidade de lançamento, revela-se, ao se realizar uma pesquisa de campo,
que a maior parte dos homens temem tomar a pílula, com receio de que possa diminuir sua
virilidade, mesmo sabendo de seu poder ao realizarem testes em cobaias animais. Por meio de
uma agência de propaganda e de seu super cérebro, descobrem a solução: o publico alvo, ou
seja, o homem brasileiro, apóia-se em três mitos fundamentais: a mulher, o jogo e o café. E é
a partir desses estimulantes que a campanha publicitária cria a figura da Super-Fêmea, a
mulher perfeita, levando a publicidade do produto às alturas.


      Produzido no longínquo a no de 1973, o filme A Super-Fêmea (grafado dessa maneira,
pois foi feito antes da correção ortográfica) é um típico filme da década de 1970 que mescla
incursões humorísticas e cenas de sexo moderadas, que na maioria das vezes se limitam a
insinuação sexual. Como estrela, temos a ex-miss Brasil Vera Fischer, fazendo um dos seus
primeiros papéis de destaque na dramaturgia nacional. O filme assim como a maioria, conta
com um roteiro fraco e confuso, tendo cortes abruptos entre uma cena e outra, e uma trilha
sonora nada original, que s utiliza até mesmo de trechos da trilha original de “O Poderoso
Chefão”, lançado alguns anos antes. Diferentemente dos filmes da década seguinte, o foco
desse tipo de filme, era puramente o humor, sem compromisso algum com a realidade.
      O filme, até hoje um dos mais famosos e lembrados do gênero (embora não tenha sido
sucesso de bilheteria), contém cenas que parecem ter sido tiradas de um filme do
expressionismo alemão, graças as suas cenas com personagens um tanto quanto robóticos, e
falas complexas. Porém a comparação termina nesse ponto, já que as cenas do filme parecem,
por muitas vezes, nem mesmo seguir uma cronologia ou uma lógica de roteiro.
      Estrela de grandes produções do gênero pornochanchada, Vera Fischer brilhou na
produção dando vida a uma modelo que tinha como missão a difícil tarefa de fazer com que
uma pílula anticoncepcional masculina fosse aprovada pelo público alvo. Usando de sua
imagem de sexy simbol, a atriz atiça os homens e faz com que seu produto seja facilmente
aceito pela população masculina, e ao final ainda consegue comprovar que o produto aumenta
a fertilidade masculina.


      2.5. ANÁLISE DAS CATEGORIAS

                                                                                          21
Tema: O filme passa por dois momentos distintos. Em um início que é praticamente
esquecido durante o restante do filme, mulheres reivindicam seus “direitos”, cobrando que os
homens agora sofram as dores e os desconfortos de um parto e coisas do tipo. Em uma
reunião fechada, que logo parte para as ruas, temos então a cena de uma repórter que
entrevista homens sobre a possibilidade da existência da pílula contraceptiva masculina. A
partir daí, o tema do filme que inicialmente –especialmente pelo nome- parecia uma trama
feminista, rata dos caprichos de uma sociedade masculina altamente machista dos anos 70
preocupada com sua virilidade e potência sexual. O corpo de Vera é altamente exposto
durante o filme, que tem na protagonista a redenção de todos os seus problemas, que ao final
parecia ser uma tentativa do governo de aumento da natalidade no país, já que a personagem
central da à luz a cem bebês ao final da película.
      Personagens: Os personagens centrais são vera Fischer e Perry Salles, que vivem Eva e
Onan respectivamente. Criatura e criador que tentam fazer com que a imagem do
contraceptivo masculino seja livre de manchas. Num romance previsível que termina com o
nascimento de cem bebês por parte do casal, sai de uma premissa interessante, mas não leva a
lugar algum.
      Cenografia: O filme se passa numa grande cidade, mas existem cenas em diversos
locais como em uma floresta (onde há um treino de arco e flecha), e grande parte das cenas se
passam dentro laboratório da empresa responsável pelas pílulas.
      Diálogos: Os diálogos são falas comuns e não contem palavras de baixo calão como na
maioria das produções do gênero. Possuem um alto teor de características que remetem ao
machismo, e a mulher objeto, que é o assunto central do filme.
      Roteiro: A história contada de filme é a de Eva, uma mulher utilizada por uma empresa
farmacêutica que pretende colocar no mercado a pílula contraceptiva masculina. A mulher,
escolhida por ser a mais bela e desejável encontrada pela equipe de marketing da empresa,
tem como função fazer com que os homens percam o medo dos efeitos colaterais do
medicamento. Enquanto tentam provar a eficácia do medicamento, ambos se envolvem em
um relacionamento amoroso que só decola no final do filme.
      Trilha sonora: A trilha sonora é uma das maiores pérolas contidas no filme que conta
com composições feitas para a trilha sonora do filme o “Poderoso Chefão” de 1972 dirigido
por Francis Ford Copolla, nas cenas em que o chefe dos laboratórios aparece. O restante são
composições de músicas de mpb e samba que fazem parte como trilha incidental.



                                                                                          22
2.6. CONCLUSÕES SOBRE O FILME


      O filme segue a linha sugerida pelo gênero surgido na década de 1970. Mostra cenas de
comédia com um misto de cenas onde a insinuação sexual e o ato sexual moderado está
combinado. Não diferente também, grande parte das falas sofrem de uma falta de sincronia
labial e por vezes são dubladas por atores diferentes das vozes originais, o que deixa o filme
com um ar ainda mais trás.
      O roteiro é uma incógnita. Se no início parece uma manifestação pelos direitos das
mulheres, nas quase duas horas seguintes tem-se apenas um discurso machista de homens que
se enxergam preocupados cm sua virilidade e potencia sexual. A própria imagem de Vera
Fischer que inicialmente parece ser usada positivamente, logo toma a posição de mulher
objeto, não distante daquilo que já fora e seriam usadas tantas outras vezes dentro do gênero.
      A falta de lógica na narrativa também chama a atenção. Cenas mal editadas dão um ar
de descontinuidade às cenas, embora também haja belas tomadas feitas durante a produção, a
grande maioria explorando a beleza da protagonista, bem como cenas que beiram o bizarro e
o mau gosto.
      O sexo presente de forma natural, porém não explícita na trama, também marca essa
primeira fase da pornochanchada onde o corpo feminino era o foco da atenção, porém sem
nudez frontal total. Ainda assim, o filme já remete ao que tudo se tornaria logo mais em
alguns anos, mostrando que a moral e a luxúria estavam separadas apenas por uma tênue linha
que seria quebrada com produções mais ousadas na década seguinte.
      O filme diferente da maioria, porém tem uma produção um pouco mais cara e
elaborada, e claramente apoiada pela Rede Globo, já que ainda no início do filme é feita a
alusão de uma pesquisa feita para um programa da emissora. Ao fim, o parto dos cem bebês, a
mesma repórter do início, é a responsável pela cobertura do grande “acontecimento”.
      Ao contrário de “Banho de Língua”, a proposta de ‘A Super. Fêmea” é confusa. Uma
mistura de feminismo, machismo e a exaltação da natalidade e da quantidade de vezes que a
repórter diz ao final que todos deveriam ter filhos não deixa claras suas intenções.




      3. ANÁLISE COMPARATIVA DOS FILMES


                                                                                             23
Quando se tem em mãos o material de uma mesma era e gênero do cinema, pode-se ter
a ideia de uma linearidade entre os materiais, ainda que esses sejam de diferentes décadas.
Pois entre “A Super Fêmea” e “Banho de Língua”, separados por 12 anos de diferença, a
decadência de um estilo fica clara, bem como a mudança na linguagem e na intenção do uso
da ferramenta.
     Se na primeira década de existência o humor pastelão era o carro chefe ao lado de uma
sensualidade moderada é totalmente perceptível o aumento do uso do sexo, nesse caso o
explícito para chamar a atenção de um público que cada vez mais se distanciava das
produções nacionais e do cinema.
     Ainda que a decadência seja vista por muitos como a incursão do sexo explícito nas
tramas, também é claro um amadurecimento na discussão de temas polêmicos, considerados
tabu para a sociedade. Se até então o homem viril e a mulher objeto eram o único viés
explorado pelas obras, podemos ver uma grande diferença ao assistir o filma da década de 80,
pois percebemos personagens femininas não apenas vistas como objetos, mas como donas de
sues destinos e de não apenas objetos de manipulação do desejo masculino. à figura da mulher
independente que diferente de uma superfêmea, não cede aos desejos dos homens apenas por
uma maleabilidade natural da mulher, mas sim por desejo próprio.
     Enquanto assistimos a odisseia de uma mulher que pretende fazer com que os homens
do país se convençam dos benefícios de um medicamento utilizando o poder de sua
sensualidade, logo notamos que a história não gira em torno do poder da mulher, mas sim da
figura feminina como objeto de puro de desejo. Ao final, a mensagem fica ainda mais confusa
e o feminismo some de vez: Eva personagem de Vera tem cem filhos em um só parto, e é
vangloriada pela multidão e pela imprensa por tal feito, que considera que superfêmea, é
aquela que pode suportar tal acontecimento. Ou seja, o filme começa falando em liberação
feminina, mas em seguida, coloca a mulher em lugar de costume: como dona de casa.
     Embora as imagens sejam bem feitas, e algumas cenas bem bonitas, o filme peca pela
falta de estrutura mais bem elaborada de roteiro.
     Quanto a “Banho de Língua”, temos o inverso. Uma história de liberação pode ser vista
na tela, com personagens que desafiam as regras de uma sociedade ainda presa a moralismos,
falando sobre homossexualismo, bissexualidade e prostituição, mas o exagero e a escatologia
tomam conta do filme que fazem com que assim como o que ocorre com o filme de 1973,
fique a sensação incômoda de que algo está além do que devia. Se em 1973 o humor pastelão
e a incoerência fizeram com que a obra ficasse aquém de suas expectativas, o exagero e o

                                                                                         24
foco voltado em grande parte simplesmente para o sexo fez com que a obra fosse diminuída,
embora uma mensagem fosse presente em maior escala e com maior força dentro do contexto,
ou seja, a de liberação –especialmente a sexual- de desejos reprimidos.
      É impossível não levar em conta a habilidade e a técnica de Tony Vieira quanto à
direção de banho de Língua. Seus filmes, na maioria policial na década de 1970, sempre
dirigida com maestria e sucessos de público, foram base para a direção de seu filme mais
denso e explícito, e ao contrário da maioria dos filmes do estilo que na década de 1980
seguiam apenas para o sexo gratuito Vieira acrescentou uma história, diga-se de passagem,
com um final fortíssimo para seu filme. Contudo, como o filme era vendido com um filme de
sexo explícito, provavelmente essa intenção, essa mensagem passou despercebida.
      Em suma, embora muito mais explicite e agressivo do que os filmes do gênero na
década de 1970, Banho de Língua consegue passar uma mensagem muito mais mobilizadora
do que os filmes “leves” da década anterior que se utilizavam da nudez e de piadas para
chamar a atenção, mas raras vezes tocava em assuntos polêmicos e com certeza de pouco
interesse social passível de discussão.


      4. CONSIDERAÇÕES FINAIS


      Com todos os aspectos negativos que o cinema passou na década de 1980 aliados com a
falta de qualidade e o exagero das produções feitas nessa época, a pornochanchada chegou ao
seu fim, mas não sem antes colocar em algumas de suas produções um ar mais ácido e crítico,
fato, porém que foi ignorado pela grande população que procurava filmes de sexo explícito
apenas.
      Não propositalmente, tudo isso se emendou ao final desse tipo de produção, que caía no
desgosto do grande público e que também tinha que luta contra a grande produção
internacional de filmes do gênero pornográfico, que eram o grande desejo da época.
      Ainda que haja a coincidência de que tais filmes começassem a ser extintos quando uma
linguagem mais crítica passou a ser utilizada, em nada a censura interviu para que isso
acontecesse, sendo o descrédito e a autodesvalorização do próprio gênero que o fez cair no
limbo do esquecimento, com roteiros cada vez mais fracos –embora houvesse obras de
qualidade, ainda que muito poucas- e filmes de qualidade cada vez mais precária. A
pornochanchada, quando bem intencionada, pode sim ser considerada uma obra eu faz com
que seu espectador reflita quanto ao seu contexto, e seu fim, inclusive sua frouxidão quanto à

                                                                                           25
censura, pode ser muito mais relacionada ao seu caráter alienador enquanto obra de humor
popular, do que quanto a filmes de sexo explícito que apesar de conter mensagens muito mais
fortes do que seus antecessores, fascinavam muito mais pelos corpos desnudos do que por
suas intenções filosóficas.




REFERÊNCIAS


Artigos

PINTO, Leonor Souza. O Cinema Brasileiro face à censura imposta pelo regime militar
no Brasil – 1964/1988. Março 2006
NETO, Francisco de Oliveira : PORNOCHANCHADA E CENSURA: LEGÍTIMAS FILHAS
DA DITADURA. Outubro de 2007.
SOUZA, Rafael Machado Nobre. Fidel, “Purgas” e Pornochanchadas: um estudo
comparativo entre as políticas públicas cinematográficas do ICAIC e EMBRAFILME. 2011.
SIMIS, Anita. Cinema e Política Cultural Durante a Ditadura e a Democracia. 2006




Sites


A Boca do Lixo Ainda Respira. In < www.reporterbrasil.org.br > Acesso em: 2 de junho de 2011
In < www.bmpornochanchada.blogpot.com > Acesso pela primeira vez em: 24 de maio de 2011
In < www.unicamp.br > Acesso em 1º de junho de 2011 As pornochanchadas mais famosas In
<http://gilbertocarlos-cinema.blogspot.com> Acesso em 20 de outubro de 2011 A lista dos filmes
brasileiros com mais de 1 de milhão de espectadores, A pornochanchada no Brasil, David Cardoso e
Tony Vieira In < http://pt.wikipedia.org>


Filmes


BANHO DE LÍNGUA. 1985 Direção: Tony Vieira. Elenco: Aida Gimaraes, Camila Babi
74mim
A SUPER FÊMEA. 1973. Direção: Anibal Massaini Neto. Elenco: Vera Fischer, Perry Salles,
Adoniran Barbosa 103min


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Um Estudo sobre a Pornochanchada

  • 1. APRESENTAÇÃO O cinema, como importante veículo de comunicação, tem grande papel de ferramenta formadora de opinião na sociedade. Grandes obras do cinema possuem ideologias e até mesmo, mensagens subliminares, que tem como principal função, a emissão de ideias que a sociedade-de acordo com a ideia do realizador- deveriam ser incorporadas ou ao menos vistas pela sociedade. Laranja Mecânica de Stanley Kubrick, e Metropolis de Fritz Lang, são filmes conhecidos por seus conteúdos altamente políticos- ideológicos que mudaram a maneira de fazer cinema. Ignorados pela grande audiência em sua época, e adulados pela crítica e pela elite, esses filmes traziam claramente a divisão social e a punição sofrida pelos radicais. Notoriamente um grito de socorro - ou uma simples propaganda do programa de governo da maior parte da sociedade-, tais filmes até hoje tem seu valor reconhecido como obras cinematográficas de valor e de qualidade e claro de inspiração para filmes da atualidade. No cinema nacional, desde suas origens, diversas linguagens foram utilizadas. Desde filmes com forte contexto político, ideológico e até mesmo, filmes com uma linguagem quase abstrata, muito tem se visto nas produções nacionais. Talvez, nada de uma grandeza tão abrangente como no filme de Kubrick, mas com certeza, de muita relevância para a formação de opiniões e ideias do público brasileiro. Público esse que muitas vezes, sofre com imagens de uma realidade de seu país que é vista nas telas de cinema de forma crítica e ácida, que por vezes é tão rasa e mal discutida em outros meios de comunicação. Dentre tantas fases da sétima arte nacional, uma das que mais chama a atenção, e que foi (e para muitos ainda é) uma das fases mais polêmicas de produção cinematográfica, foi à era da pornochanchada. Tais filmes não eram nada mais do que uma mistura do estilo “chanchada”, que fazia comédias populares, com o estilo pornô (especialmente o italiano) que contavam geralmente com elenco desconhecido e roteiros fracos. A falta de profundidade e excesso de linguagem sexual dessa fase do cinema nacional, fez com que ela fosse jogada no limbo do esquecimento, e até mesmo que fosse considerada uma vergonha para o cinema e para a cultura do país. Por anos, filmes que lotaram salas de cinema e eram o sinônimo de boas bilheterias ficaram totalmente esquecidos, e nem mesmo foram recuperados para a posteridade. Muitos filmes anteriores a essa era, tem melhor conservação do que essas obras da década de 1970, devido à reputação de tais filmes que na 1
  • 2. maioria das vezes leva-nos, em uma análise mais curta a uma sensação de imoralidade e desrespeito aos bons costumes, amplamente vistos em filmes nacionalistas. Ainda que a pornochanchada seja vista com maus olhos por uma grande parte da população brasileira, o fato é que muito pode ser analisado observando os quase 20 anos em que esses filmes fizeram parte da realidade nacional. . SOBRE A RELEVÂNCIA DESTE TRABALHO Esta pesquisa tem como principal objetivo, mostrar a pornochanchada como um movimento do cinema brasileiro, além daquilo que é percebido pelo grande público, ou seja, pretende-se mostrar essas obras como uma fonte de informações e ideologias importantes e inerentes á época em que a pornochanchada teve seu auge. Muito além de fazer uma breve análise de filmes, a pesquisa pretende mostrar fatos importantes relacionados a mudanças ocorridas na linguagem e até mesmo na produção de filmes que para muitos, são vistos como uma fase linear, ou seja, sem grandes mudanças e ocorrências, mas que apesar disso apresenta fatos importantes para a compreensão da época em que está inserida. Com uma parte considerável do trabalho voltado à análise de dois diferentes filmes do gênero pornochanchada, sendo uma da década de 1970 e outra da década seguinte, pretende- se mostrar a evolução da linguagem de filmes puramente humorísticos para filmes com um contexto mais maduro e informativo, ainda que tais informações estejam no filme de maneira implícita. O cinema como obra artístico-cultural, tem um poder incontestável na cultura humana desde seu surgimento. No Brasil, a história não é diferente. Assim como o Cinema de Retomada em sua fase atual move milhões de espectadores para os cinemas e quebra recordes de público com filmes pensados na família brasileira e na atual necessidade de posicionamento econômico e cultural no qual o Brasil se encontra, não podemos nos esquecer de que há pelo menos três décadas atrás, o cinema nacional também vivia um momento significativo para sua existência quando lotava salas com pessoas que procuravam se identificar com personagens de forte apelo popular, e histórias tão simples como suas vidas. Quando o primeiro filme em que corpos começaram a ser desnudados sem a censura perseguindo seus difusores e seguidores, um novo gênero nascia e lotava salas de cinema por 2
  • 3. todo o país. “A Viúva Virgem”, filme de 1972 e para muitos a primeira produção do gênero, inaugurava uma fusão de erotismo e comédia com cenas consideradas ousadas para a época, mas que passaram facilmente pela censura. Porém, a pornochanchada não se limita a década de 1970, e se estende para a década seguinte, e muitas mudanças podem ser notadas na linguagem utilizada, e aí que a importância desse trabalho se destaca: encontrar e destacar tais mudanças e suas consequências dentro desse tipo de produção. HIPÓTESES Tendo em vista a grande quantidade de produções cinematográficas do estilo pornochanchada no período da década de 1970, até meados da década de 1980, deve-se analisar atentamente a frouxidão da censura, e a facilidade absorção desse tipo de material pela sociedade, bem como a mudança na postura desse tipo de produção, que passou de uma produção com viés cômico a um produto repleto de sexo explícito. Juntamente com o sexo explícito, vieram temas mais sérios como a prostituição, o homossexualismo, o estupro e até mesmo o liberalismo de ideias até então, ignoradas por esse tipo de obras que davam mais atenção ao humor pastelão. Para alguns o fim na produção dessas obras ocorrido somente por conta do desinteresse do público. Porém o governo que fora na década de 1970 tão condescendentes com a produção cinematográfica, mudava suas regras dificultando e quase anulando a produção de filmes no país, fazendo com que muitas produções mudassem seus focos. Se filmes com certo teor político causavam o estranhamento para os órgãos censuradores, é no mínimo curioso como filmes com alto teor de cenas sexuais e de contra ideais cristãos amplamente divulgados pela igreja católica, fossem aceitos com tanta facilidade. Ainda que filmes tenham sofrido alguns cortes, como foi o caso de “O Princípio do Desejo”, de 1979, que teve algumas cenas excluídas, a grande maioria das obras foram exibidas de forma integral nos cinemas. Isso leva-nos a crer que havia um interesse por parte do governo, que filmes sem conteúdo relevante fossem levados às telas de cinema, já que filmes nacionais deveriam ocupar pelo menos uma exibição mensal em salas do país, e a época era de revolução e de revoltas populares. 3
  • 4. Pensando no fato de que apenas filmes que não saíam de um padrão pré-determinado de linguagem, eram liberados e apoiados pelo governo, e de que as pornochanchadas eram filmes independentes e com uma linguagem mais liberal, podemos ter a ideia de que por não serem filmes financiados pela EMBRAFILME, são os que deveriam ser ainda mais visados pelo governo. Mas de certa forma, notamos que há sim uma frouxidão pela censura, já que filmes que continham alusões ao comportamento da perversão, poderiam ser uma possível ameaça. Quando a censura se afrouxa ainda mais e cenas mais explícitas são liberadas, os filmes passam a surgir com uma linguagem mais política, e curiosamente, tais filmes pararam de ser produzidos, graças à decadência dos estúdios. Seria essa decadência uma mudança de ideia por parte de censura, que passava a ver uma possível ameaça nos filmes que outrora eram apenas diversão com informação irrelevante e sem conteúdo que pudesse gerar uma possível reflexão em seu público? Deve-se salientar também, que a pornochanchada, para os especialistas durou apenas até 1982, já que o estilo presente com caráter de comédia havia sido trocado por falas políticas e cenas explicitas que mostravam um amadurecimento e ao mesmo tempo uma vulgarização do estilo que fizera tanto sucesso no passado. METODOLOGIA Para a realização dessa pesquisa, a análise de dois filmes do gênero em questão se fez necessária, sendo uma do início da década de 1970, e outra da década de 1980. Também para se apoiar histórica e temporalmente, o uso de artigos científicos, textos de sites especializados em cinema e documentos que pudessem ser levados em conta para a realização dessa pesquisa foram utilizados, e devidamente referenciados nas páginas onde se encontram as citações contidas em tais veículos/documentos. Em seguida uma análise comparativa entre as duas obras escolhidas foi realizada, para que o confronto entre as duas diferentes épocas enquanto produtoras de um mesmo gênero pudessem ser percebidas. 4
  • 5. 1. A PORNOCHANCHADA Num cenário onde a EMBRAFILME começava a financiar produções cinematográficas no país com um programa de coprodução, podemos notar o aparecimento de um fenômeno cinematográfico que com certeza faz as décadas de 1970 e parte da de 1980, uma das mais rentáveis do cinema nacional, sendo que na de 70, o Brasil viria se tronar o maior produtor de filmes da América Latina. Esse fenômeno atende pelo nome de pornochanchada, e contava com roteiros fracos e uma ideia relativamente ousada para a época em que surgia: a mistura de humor pastelão com cenas de insinuação sexual, com uma nudez ainda moderada em seu início. Se o cinema nacional já não era bem visto pelos olhos dos próprios brasileiros que reclamavam da péssima qualidade das obras produzidas no país, a pornochanchadas com certeza foi um agravante para essa visão, tendo em vista uma pesquisa realizada em 1978 pela própria EMBRAFILME, época em que o gênero estava em seu auge. . “Essa repulsa pelo cinema nacional, é explicitada por uma pesquisa de mercado encomendada pela própria EMBRAFILME no ano de 1978, realizada em diversos extratos sociais e idades” (SOUZA, 2006 P.11). Ainda assim, é indiscutível que a produção pornochanchada foi favorecida por um programa em que a EMBRAFILME, fazia às vezes de coprodutora com os estúdios fazendo com que a difusão desse gênero fosse grande em too o território nacional, mesmo que essas não fossem financiadas diretamente com o dinheiro dessa empresa. Um financiamento na área da cultura de um órgão tão grande como a EMBRAFILME, só podia valorizar e chamar cada vez mais a atenção para as produções nacionais. Em 1973, a EMBRAFILME inicia seu programa mais conhecido, o de coprodução. Esse foi o principal programa desse órgão, e o maior responsável pela produção fílmica brasileira nas décadas de 70 e 80. Entre os anos de 1973 e 1981, a EMBRAFILME coproduziu 131 longas-metragens, tornando o Brasil o maior produtor Cinematográfico latino-americano nesse período. (SOUZA, 2006, P. 10) A composição dos filmes da pornochanchada, que somam mais de seiscentos em sua totalidade¹, não possui seu aspecto repulsivo à toa. Seu local de produção remetia totalmente 5
  • 6. ao universo em que os roteiros mergulhavam especialmente os mais recentes, que tinham um caráter mais urbanizado e fugiam do humor inocente proposto no início das produções. Famoso por abrigar estúdios como Paramount, Fox entre outros nos anos 30 e 40, o bairro da Luz em São Paulo contou com um lugar especial que com o passar dos anos viu suas produções decaírem de qualidade tanto no roteiro quanto no financiamento de suas obras. Nascia então, “A Boca do Lixo”, chamado assim pelo ar de “resto” daquilo que já havia sido lugar de glamour e dinheiro e que hoje é conhecido como reduto de venda de produtos eletro eletrônico. Apesar de ocupar um espaço um tanto quanto esquecido na cultura nacional, a pornochanchada, não deve ser subjugada e tampouco subestimada devido ao seu conteúdo questionável para muitos. Tamanhas são as contribuições possíveis de análise que essas proporcionam para um estudo da época em que esta inserida. 1.1 A PORNOCHANCHADA NA DÉCADA DE 1970 Iniciada -para alguns- com a produção do filme “A Viúva Virgem” em 1972, com uma história que colocava o cômico e o insinuante juntos, numa produção em que o roteiro já não era o forte da produção, o filme é um dos maiores sucessos do gênero, que em sua exibição contou com grande público, cerca de 2.635.962 pagaram para ver a fita. Espelho de uma época onde o movimento hippie que influenciou o mundo todo e almejavam por liberdade, os filmes produzidos nessa época mostram com um ar de libertinagem os desejos de uma sociedade em se desnudar daquilo que até então era proibido. Ainda é muito interessante observar que em uma época em que a censura era tão forte, tais obras tão ousadas tenham sido autorizadas. A ideia de vícios e virtudes, ideologia cristã-paulina difundida pela igreja católicae coadunada a necessidade de ser produtivo, estimuladapelo ideário governamental, demonstra outra faceta dessa realidade . (NETO, 2007 P.2) Deixemos a censura pata outro capítulo e reflitamos que a partir do curioso contexto citado, diversos filmes foram produzidos seguindo a linha que fizera tanto sucesso nas salas de cinema do país, seguindo a ideia do Cinema Marginal, advindo da década de 1960, 6
  • 7. AHISTÒRIA DO CINEMA e fazendo a mistura de dois gêneros que, ainda eu distintos, prometiam uma boa combinação. A mistura tão incomum era da comédia (lembrado então como chanchada, outro gênero famoso do cinema nacional que ia pelo caminho cômico) e do erotismo, que se tornava famoso graças à pornografia italiana que chegava a todo mundo e era então a maior produtora do gênero segundo a Wikipedia. No início da década de 70 até o ano de 1982 a linha seguida foi sempre a mesma. Roteiros fracos, misturados com cenas de corpos parcialmente nus especialmente de mulheres (onde seios eram geralmente mostrados), onde uma insinuação em forma de atuação sexual era feita. Muitos atores veteranos da TV brasileira começaram a sua carreira, ou reforçaram a já existente, com filmes de pornochanchada. Nomes como Vera Fischer, Sônia Braga, Nuno Leal Maia, Antônio Fagundes entre outros foram nomes que passaram pelo gênero sem causarem estragos a carreira graças ao apelo menor ao sexo em seus filmes. Dentre as obras produzidas nessa década, estão filmes que até hoje possuem um grande reconhecimento por parte do público e até mesmo da crítica especializada, e que assim como já dito possuem atores conhecidos até a presente data como Vera Fischer e Nuno Leal Maia, como é o caso de filmes como “O Bem Dotado- O Homem de Itu”, “A Super-Fêmea” e também o filme “Mulher Objeto”, que conseguiu um total de 2.031.520 espectadores e seu período de exibição, sendo esse último um pouco menos cômico que os demais. (CARLOS Cinema BLOGSPOT) . Filmes com roteiros criados a partir de histórias do famoso escritor e cronista Nelson Rodrigues também ficaram marcados nessa época, e por vezes fugiam da estética puramente cômica e tinham um viés mais sério, em especial títulos como “Os Sete Gatinhos”, “A Dama do Lotação” e “Toda Nudez Será Castigada” que tinham um humor mais ácido e crítico. Até o final da década de 70, muitos foram os títulos que ganharam as telas, e muitas foram as polêmicas enfrentadas pelos produtores, atores e diretores do gênero. Um dos casos mais famosos, que até hoje gera controvérsias devido ao contexto em que aconteceu, é o caso do filme “Amor, Estranho Amor” de 1979 de Walter Hugo Khouri. Em seu lançamento, o filme tinha em seu cartaz os protagonistas Tarcísio Meira e Vera Fischer. Anos depois após sua atriz coadjuvante ganhar os holofotes do mundo do entretenimento infantil sob o nome de Xuxa, sua imagem e nome foram anexados na capa original que passou a ser vendida ilegalmente em todo o país. Mas o problema maior que Xuxa enfrentava era sua credibilidade como apresentadora infantil, já que na película ela era vista em cenas de sexo com um garoto de apenas 12 anos. Assim como aconteceu com o filme de Khouri, as polêmicas e qualidade 7
  • 8. das obras começariam a decair no final da década de 70, e teriam seu fim na metade da década seguinte. 1.2. A PORNOCHANCHADA NA DÉCADA DE 1980 Se na década de 1970, as produções foram favorecidas com a coprodução da EMBRAFILME, nos anos de 1980 a situação mudaria um pouco. Com uma gestão e burocracia confusa que não sabia se deviam apoiar os filmes com maior rendimento de bilheteria, ou então, os filmes tidos como mais densos culturalmente, a organização passou a ter sérios problemas, por volta de 1981 quando o passou-se a cobrar altos impostos de filmes estrangeiros e também graças à própria distribuidora também criada para fugir das distribuidoras internacionais. Com esse movimento, perdeu muito investimento de estúdios americanos, e muito dinheiro deixou de entrar no país. A paralisia da EMBRAFILME seguramente foi uma das responsáveis para a Crise do cinema nacional da década de 80. Soma-se à má qualidade dos filmes, em comparação à produção norte-americana (nesse caso o critério de qualidade é técnico), com a altíssima inflação e uma rede televisiva cada vez maior, trazendo entretenimento gratuito para a população. O ato de ir ao cinema se tornou um luxo para o brasileiro” (SOUZA, 2011 P.11) Com a crise no cinema, e a chegada de filmes e aparelhos reprodutores de VHS, o mercado então se viu num beco sem saída. A saída mais viável para atrair público para as salas de cinema era fazer filmes mais apelativos e que pudessem ser alvo de interesse dos espectadores. A nudez não era um experimento novo e exclusivo da pornochanchada. Em 1962, “Os Cafajestes” fez um grande público após ser censurado e, meses depois, liberado para a audiência. No filme, que possuía a emblemática cena de Norma Bengell no primeiro nu frontal do cinema moderno brasileiro, uma preciosa lição fora aprendida. Essa trama apresentou a atriz Norma Bengell no primeiro nu frontal do cinema brasileiro moderno. Por essa cena foi censurado e considerado pornográfico, porém quando volta as “telonas” torna-se recorde de bilheteria e por trabalhar um tema de preferência do grupo cinema novista, que era a burguesia decadente e depravada, é eleito como filme-símbolo do movimento... Inicialmente pornográfico para depois tornar-se bandeira cinema novista e recorde de público, recorde esse, nitidamente alcançado pelo uso do erotismo que com abordagem inédita causava frisson e muita curiosidade. (NETO, 2007 P.5) 8
  • 9. Se certamente a nudez nos filmes até então chamava muito mais atenção do que as incursões no humor, já havia uma saída para que a pornochanchada não ficasse esquecida, ou que se findasse: a produção de filmes com sexo explícito. E assim foi feito o primeiro filme de sexo explícito (mas ainda com toques de humor) no Brasil, intitulado “Coisas Eróticas” no longínquo ano de 1981. Dirigido por Rafaelle Rossi e Laente Callichio, o filme causou frisson na sua estreia e conta com três historietas. Figura até hoje, na lista de um dos mais assistidos filme nacionais de todos os tempos, figurando em um 13º lugar na lista, feito raro já que se analisarmos a lista dos cinquenta maiores êxitos do cinema nacional não veremos nada do gênero que se compare ao sucesso atingido pela obra. P Data de Espect Título Diretor Rodutor os. estreia adores José outubro/ 11.081 1 Tropa de Elite 2 Zazen Produções Padilha 2010 .199[5] Dona Flor e Seus Bruno novembr 10.735 2 L.C.Barreto Dois Maridos Barreto o/1976 .524[5] Neville de abril/19 6.509. A Dama do Lotação Regina Filmes 3 Almeida 78 134 Daniel janeiro/2 6.137. 4 Se Eu Fosse Você 2 Total Entertainment Filho 009 039 O Trapalhão nas agosto/1 5.786. 5 J.B. Tanko J.B.Tanko Filmes Minas do Rei Salomão 977 226 Lúcio Flávio, o Hector novembr 5.401. 6 HB Filmes Passageiro da Agonia Babenco o/1977 325 2 Filhos de Breno agosto/2 5.319. 7 Conspiração Filmes Francisco Silveira 005 677 Os Saltimbancos dezembr 5.218. 8 J. B. Tanko J.B.Tanko Filmes Trapalhões o/1981 478 Os Trapalhões na Adriano Renato Aragão Produções dezembr 5.089. 9 Guerra dos Planetas Stuart Artísticas o/1978 970 1 Os Trapalhões na dezembr 5.043. J. B. Tanko J.B.Tanko Filmes 0 Serra Pelada o/1982 350 1 O Cinderelo Adriano Renato Aragão Produções junho/19 5.028. 1 Trapalhão Stuart Artísticas 79 893 Com mais de 4 milhões P Data de Espect Título Diretor Produtor os. estréia adores 1 O Casamento dos José Renato Aragão dezembr 4.779. 2 Trapalhões Alvarenga Jr. Produções Artísticas o/1988 027 Raffaele 1 Empresa julho/19 4.729. Coisas Eróticas Rossi e 3 Cinematográfica Rossi 82 484 Laente Calicchio 1 Hector abril/20 4.693. Carandiru HB Filmes 4 Babenco 03 853 1 Os Vagabundos J. B. J.B.Tanko Filmes junho/19 4.631. 9
  • 10. 5 Trapalhões Tanko 82 914 1 O Trapalhão no Planalto J. B. dezembr 4.565. J.B.Tanko Filmes 6 dos Macacos Tanko o/1976 267 1 Simbad, o Marujo J. B. junho/19 4.406. J.B.Tanko Filmes 7 Trapalhão Tanko 76 200 1 Adriano Renato Aragão janeiro/1 4.240. O Rei e os Trapalhões 8 Stuart Produções Artísticas 980 757 1 Os Três Mosqueteiros Adriano Renato Aragão junho/19 4.221. 9 Trapalhões Stuart Produções Artísticas 80 062 2 O Incrível Monstro Adriano Renato Aragão janeiro/1 4.212. 0 Trapalhão Stuart Produções Artísticas 981 244 2 Tizuka junho/19 4.178. Lua de Cristal Dreamvision 1 Yamazaki 90 165 2 Wagner setembr 4.060. Nosso Lar Cinética Filmes 2 de Assis o/2010 304 2 A Princesa Xuxa e os José Renato Aragão junho/19 4.018. 3 Trapalhões Alvarenga Jr. Produções Artísticas 89 764 2Com mais de 3 milhões P Data de Espect Título Diretor Produtor os. estréia adores 2 O Cangaceiro Renato Aragão junho/19 3.831. Daniel Filho 4 Trapalhão Produções Artísticas 83 443 2 janeiro/2 3.644. Se Eu Fosse Você Daniel Filho Total Entertainment 5 006 956 2 Os Trapalhões e o Renato Aragão junho/19 3.616. Carlos Manga 6 Rei do Futebol Produções Artísticas 86 696 2 dezembr 3.547. De Pernas pro Ar Roberto Santucci Downtown Filmes 7 o/2010 138 2 O Jeca Pio fevereir 3.468. PAM Filmes 8 Macumbeiro Zamuner e Mazzaropi o/1975 728 2 abril/19 3.457. Eu Te Amo Arnaldo Jabor Flávia Filmes 9 81 154 3 Jeca Contra o Pio fevereir 3.428. PAM Filmes 0 Capeta Zamuner e Mazzaropi o/1976 860 3 abril/20 3.413. Chico Xavier Daniel Filho Lereby Produções 1 10 300 3 O Trapalhão na junho/19 3.375. J. B. Tanko J.B.Tanko Filmes 2 Ilha do Tesouro 75 090 3 agosto/2 3.307. Cidade de Deus Fernando Meirelles O2 Filmes 3 002 746 3 Jecão, um Pio junho/19 3.306. PAM Filmes 4 Fofoqueiro no Céu Zamuner e Mazzaropi 77 926 3 Os Trapalhões na Renato Aragão dezembr 3.200. Flávio Migliaccio 5 Terra dos Monstros Produções Artísticas o/1989 000 setembr 3.183. Xica da Silva Carlos Diegues Terra Filmes 36 o/1976 582 3 Lisbela e o agosto/2 3.169. Guel Arraes Natasha Enterprises 7 Prisioneiro 003 860 3 O Menino da Jeremias Moreira Topázio março/1 3.131. 8 Porteira Filho Cinematográfica 977 878 3 novembr 3.082. Aluga-se Moças Deni Cavalcanti Madial Filmes 9 o/1981 925 10
  • 11. 4 Cazuza – O Tempo Sandra junho/20 3.082. Lereby Produções 0 Não Para Werneck e Walter Carvalho 04 522 4 Nexus Cinema e agosto/2 3.076. Olga Jayme Monjardim 1 Video 004 297 Com mais de 2 milhões P Data de Espect Título Diretor Produtor os. Estréia adores 4 Robin Hood, o julho/19 2.978. J. B. Tanko J.B.Tanko Filmes 3 Trapalhão da Floresta 74 767 4 Missão Impossível outubro/ 2.977. Os Normais José Alvarenga Jr. 4 Cinco Produções Artísticas 2003 641 4 José Alvarenga julho/20 2.974. Cilada.com Case Filmes 5 Júnior 11 697 4 Independência ou setembr 2.924. Carlos Coimbra Cinedistri 6 Morte o/1972 494 4 O Jeca e Seu Pio abril/197 2.872. PAM Filmes 7 Filho Preto Zamuner e Berilo Faccio 8 881 4 Super Xuxa Ana Penido e David 2.816. Dreamvision 1988 8 Contra Baixo Astral Sonnenschein 000 Produções 4 Roberto Carlos a dezembr 2.785. Roberto Farias Cinematográficas Roberto 9 300 km por Hora o/1971 922 Farias 5 Um Caipira em Pio PAM Filmes janeiro/1 2.720. 0 Bariloche Zamuner e Mazzaropi 973 345 Até mesmo José Mojica Marins, conhecido pela maioria como Zé do Caixão, personagem emblemático da cultura brasileira, fez sua participação no mercado da pornochanchada com duas sequências de nome forte: na primeira “24 horas de Sexo Alucinante”, havia a proposta de uma orgia ininterrupta durante todo esse tempo. Em seguida, lançou “48 horas de sexo alucinante”, onde apesar do nome, tratava-se apenas de um reaproveitamento de cenas do anterior, com um tempo ainda menor de duração. Ainda que tenha feito grande sucesso nas bilheterias nacionais em sua estreia com um público acumulado em 4.729.484 WIKIPEDIA, não demorou muito pra que a nova direção que tomava pornochanchada começasse a falhar. Com histórias cada vez mais ousadas que partiam para uma estética bizarra e cada vez mais questionável quanto ao ponto de vista artístico, cada vez mais a orçamento dos filmes eram menores, e já não havia nomes famosos da televisão nas produções. Ainda assim, grandes nomes da era da pornochanchada foram forjados nessa época em que o sexo explícito era o foco. Nomes como David Cardoso, Carlo Mossy e Sady Baby que produziam e participavam de seu filme como personagens são conhecidos até hoje. Já atores menores e figuras sempre vistas nas produções acabaram caindo no esquecimento. 11
  • 12. 1.3. A PORNOCHANCHADA E A DITADURA É no mínimo questionável que em um país onde a censura foi tão forte e presente nas décadas de 70 e 80, produções como as pornochanchadas tenham passado livremente sem questionamentos e cortes severos. Para os críticos da época, os filmes eram grosseiros, vulgares e apelativos, fruto de um momento de forte repressão do poder à produção cultural e de controle da informação. No afã de desviar a atenção da opinião pública para o cinema, tornando- a menos crítica ao regime, o governo permite o oferecimento de filmes de comédia e cenas picantes. Portanto, para estes intelectuais, a inteligência do Estado trabalhava de maneira sagaz a catarse pública através do riso e do erotismo, enquanto desenvolvia manobras esdrúxulas no comando do país. Numa leitura política, censura e pornochanchada são vistas como irmãs gêmeas de comportamentos opostos, que vem a surgir nos primeiros meses de 1969 (nenhuma intenção cabalística nesse número), tendo vida intensa no período em que cortes e cerceamentos criavam as condições excelentes para a aceitação de produtos mal- acabados e grosseiros. (NETO, 2007. P. 5 e 6) Em filmes da década de 1970, não é raro encontrarmos desconexões nos roteiros, geralmente rasos e carentes de informações relevantes. Em alguns filmes são notórias os posicionamentos mais ideológicos, como é o caso de “Toda Nudez Será Castigada”, porém o êxito de filmes desse calão é infinitamente menor, sendo visível a falta de figuração desses títulos na lista dos mais assistidos do cinema nacional. Já na década de 1980, os filmes que perderam um pouco seu viés humorístico ganharam um foco um pouco mais sério e autoral, tendo como exemplo, o filme de Tony Vieira “Banho de língua” do ano de 1985, que conta com cenas de sexo explícito, mas também ostra personagens mais tangíveis e situações mais realistas e dignas de discussão, como por exemplo, a temática do estupro, do machismo e do feminismo. Merecendo um ponto de destaque, destaca-se a presença de cenas de homossexualismo (já que o feminino já acontecia na década passada) masculinos sempre constantes nos filmes a partir do início da década de 80. Filmes como “Emoções Sexuais de um Jegue” de 1986, “O Analista de Taras Deliciosas” de 1984, “Um Pistoleiro Chamado Papaco” (Também conhecido como “Um Amor de Pistoleiro” de 1987 contém em sua composição pelo menos uma cena onde homens participam de cenas de sexo, mostrando um desprendimento maior quanto ao sexo, e claro visando alcançar um publico maior, já que o mercado de home vídeo 12
  • 13. ainda era escasso no Brasil. Até mesmo filmes de grandes atores como David Cardoso, como por exemplo, “Corpo Devasso” de 1980 e “Gisele” com Carlo Mossy também de 1980 continham cenas feitas pelos próprios atores que ostentavam a imagem de galãs. 1.4. O FIM DA PORNOCHAHCHADA BO BRASIL Se a decadência dos filmes se dava cada dia mais graças à falta de qualidade do material, a situação iria se tornar ainda pior quando produtores menores passariam a utilizar- se de nomes de filmes conhecidos em suas capas, mas na verdade tratava-se de material, ainda que parecesse impossível inferior aos oferecidos pelos grandes produtores. Por volta de 1989, os últimos filmes do gênero foram produzidos e por um tempo foram totalmente esquecidos, até que em 1991, Carlo Mossy galã, produtor e diretor voltaram com o filme “O Fotógrafo e as Modelos”, assinando a direção como Gisele, a personagem central de um de seus filmes da década anterior, mas era inegável que a era das pornochanchadas havia acabado de vez. 2.0. UMA ANÁLISE SOBRE A PORNOCHANCHADA Como já dito antes, a pornochanchada que ocupou duas décadas em sua duração não possui apenas uma faceta. Se em sua primeira década as obras eram voltadas para uma comédia com insinuação sexual moderada, na década de 1980 o sexo explícito tomou conta das produções. Para pontuar essas diferenças a análise de dois filmes faz-se necessária, sendo um da década de 1970 e outro da de 1980. Para a década de 70, será feita a análise do filme “A Super-Fêmea” de 1973. Já para a década de 1980, o filme “Banho de Língua” do ano de 1985 dirigido por Tony Vieira será o foco da análise. 2.1. BANHO DE LÍNGUA: MAIS ACIDEZ DO QUE HUMOR 13
  • 14. FICHA TÉCNICA ORIGINAL DO FILME SINOPSE 1985 - Banho de língua Filme pornográfico com sexo explícito dos anos 80. Garota do interior vai buscar trabalho em São Paulo e, depois de ser violentada por um playboy, se torna garota de programa. 14
  • 15. Produzido pelo então famoso e polêmico produtor, diretor e ator de filmes do estilo pornochanchadas Tony Vieira (pseudônimo de Maury de Queiroz) no ano de 1985, o filme assim como a grande maioria dos filmes do gênero não conta com um roteiro consistente. No entanto, isso não foi obstáculo para que o filme caísse no gosto do público fã do gênero, que consagrou o filme como uma das maiores produções desse segmento, embora ele não figure nas listas dos filmes nacionais com mais de um milhão de espectadores. Na verdade para críticos e fãs do movimento cinematográfico da pornochanchada, o filme já se trata apenas de um filme tenso que lembra os filmes engraçados da década passada apenas por conta da presença de cenas de sexo explícito. Se até o final da década de 1970 os filmes giravam em torno de um apelo popular visando o humor, os anos de 1980 vieram em busca de certo amadurecimento para as obras -ao menos do ponto autoral- e também de um empobrecimento, já que as fitas já não eram mais patrocinadas pela. Embora o filme não siga a linha comédia, há cenas de sexo na trama que possuem um teor cômico e por certas vezes provocador, já que foge da linha convencional de filmes de sexo apresentados na mesma época. Na trama, três garotas desempregadas se encontram por acaso, logo após uma delas ter sido abusada sexualmente por um falso contratante, e a partir dessa premissa, ou seja, da dificuldade de ajustamento à cidade grande e a dificuldade financeira, decidem dar um jeito na dificuldade que enfrentam tornando-se garotas de programa. O tema da prostituição foi tratado pelo diretor em um filme anterior á Banho de Língua, intitulado “Meninas de Programa”, sendo esse o primeiro filme hardcore , ou seja, que continha cenas de sexo explícito, do diretor. Ainda que inicialmente a trama sugira uma ideia inicial de vingança da personagem principal pelos malfeitores que a violentam no início do filme, ao final há um plot twist, ou seja, uma reviravolta, que tira a intenção inicial e mostra o sexo como ação “salvadora” e talvez até solucionadora dos problemas da personagem, mostrando um lado mais pervertido do filme que sugere que a personagem tenha gostado do estupro sofrido no início da história. Se por um lado o grande foco do filme são as cenas de sexo, algo incomum em um mundo machista nessa obra é percebido: a liberação feminina de seus desejos. Se em obras similares as mulheres são meros objetos receptivos para os homens, em “Banho de Língua” testemunhamos mulheres fortes e decididas a utilizarem seu corpo para o trabalho, e também para satisfazerem seus desejos mais íntimos, como se pode notar nas cenas com conteúdo lésbico, que não fazem parte do trabalho como garotas de programa envolvendo as personagens centrais. 15
  • 16. A linguagem do filme envolve palavrões e como a grande maioria das produções há uma falta de sincronia entre a fala e os movimentos labiais dos atores, que por muitas vezes são dublados por artistas diferentes. Quanto às imagens e cenas, há muitas no mínimo chocantes para a audiência altamente moralista, como por exemplo, cenas onde objetos são inseridos em cenas de sexo bizarras, como por exemplo, uma cena onde uma mulher fuma utilizando sua vagina por volta dos *** de filme, e também onde um espanador é introduzido no ânus de um homem em uma cena de orgia. As cenas não causam estranhamento apenas na época, mas ainda hoje impactam aos espectadores, que consideram tais cenas uma das mais fortes desse tipo de cinema. Considerado por adoradores da pornochanchada como uma das “pratas” de sua época, o filme não foge a regra quando o assunto é escatologia. 2.2. ANÁLISE DAS CATEGORIAS Tema: O filme mostra o cotidiano de três garotas que após uma série de desilusões com a vida na cidade na grande, decidem tornarem-se garotas de programa. Dessa premissa, várias temáticas ligadas ao sexo surgem na vida das garotas. Personagens: Os personagens podem ser divididos em três diferentes níveis. Os protagonistas, que são as três garotas que se tornam garotas de programas e os antagonistas que se dividem em duas diferentes participações no filme. Uma delas são os vilões do filme, que são homens ricos que se utilizam da esperteza para abusarem de mulheres indefesas. Os outros são os clientes atendidos pelas meninas, que são homens e mulheres de diferentes idades. Algo interessante a ser observado quanto aos personagens, é o contraponto entre a ingenuidade da pessoa vinda das cidades do interior vivida pela personagem central Rose, e a falta de escrúpulos do homem da capital. Cenografia: O filme se passa na grande São Paulo dos anos de 1980, em locações variadas, como casas, apartamentos e também algumas cenas em locais abertos como ruas e praças. A cenografia é pobre e com cenários feios, o que de certa forma, mostra a qualidade de vida que os personagens possuíam no contexto da história. Diálogos: Os diálogos do filme, bem como seu roteiro, não são o forte da obra que conta com frases por muitas vezes desconexas e prejudicadas graças a um tipo de 16
  • 17. acontecimento comum no cinema nacional da época: a dublagem para a melhora do som original, que trouxe um ar ainda mais amador para algumas cenas da obra que não contava com um grande orçamento. Roteiro: Conta a história da jovem Rose, que vinda de uma cidade pequena de Minas Gerais tem problemas para se estabelecer na grande São Paulo. Quando se vê sem saída, já que vai foi despejada de seu apartamento, a jovem começa a procurar uma oportunidade de melhora na sua vida. Quando pensa ter encontrado a oportunidade que salvará sua vida, Rose é enganada pelo homem que lhe oferecia uma oportunidade de emprego que na verdade pretendia ter relações sexuais com a moça. Desiludida com o mundo, Rose encontra mais duas mulheres em uma situação parecida, que dizem já ter resolvido seus problemas, pois resolveram se prostituir. Rose ainda crente nos valores do mundo vai à procura mais uma vez de emprego, e dessa vez cai nas garras de homens inescrupulosos que a dopam e forçam a relação sexual com a moça. Após tal situação, Rose desiste de seus bons costumes e se junta às duas amigas na prostituição. Porém, Rose tem um plano: pretende encontrar-se com a gangue do homem que lhe estuprou para conseguir a vingança que tanto almeja. Mas até que seu desejo se concretize, muitas serão as aventuras/desventuras sexuais que Rose terá que enfrentar como prostituta, atendendo os mais diversos tipos de clientes e suas fantasias. Embora no final da película rose encontre seus desafetos, uma reviravolta acontece no roteiro: ela permite que os vilões a capturem e mais uma vez consumem o ato do estupro, mas dessa vez com um diferencial, mostrando uma face da personagem que até então vinha sendo desenhada de acordo com o desenvolvimento da trama. Ela permite que os homens a estuprem, mostrando que na verdade tratava-se de um desejo secreto da personagem ter o contato com aquele tipo de relação forçada. O filme termina com a relação consumada e mais nenhuma palavra. Trilha Sonora: O filme conta com algumas músicas feitas para a trilha incidental do filme, ou seja, composições instrumentais originais para a obra. Mas assim como a maioria das obras do gênero, conta com canções populares nacionais e internacionais da época. 2.3. CONCLUSÕES SOBRE O FILME 17
  • 18. O filme mostra com uma linguagem que mistura a veia cômica de diálogos com termos pouco usuais em uma conversa formal, com termos que podem causar estranhamento em algumas pessoas, mas está longe da forte veia cômica que consagrou o gênero na década anterior, mas voltada para um humor mais popular. O forte do filme está mesmo nas cenas de sexo explícito e na direção competente de Tony Vieira que fez um histórico notável na indústria cinematográfica brasileira dirigindo filmes policiais e de ação na década de 1970. Ainda que seja uma obra cheia de defeitos característicos das obras de baixo orçamento da década de 1980 com uma edição ruim e com trilhas sonoras desconexas com a história, o filme tem uma competência maior do que os comparados a ele. Contando a história da inocente Rose, vieira nos remete a um mundo de paralelos, aonde a bondade daqueles que vem das pequenas cidades são abalados pela malícia e inescrupulosidade de quem já vive na cidade grande há muito tempo. É notável a mudança de comportamento e como as atitudes dos personagens que cercam Rose afetam sua decisão final, e moldam seu comportamento. De moça doce e inocente do interior, Rose se transforma em mais uma mulher comum dos grandes centros. Se analisado mais a fundo, o filme pode nos mostrar também, especialmente em sua cena final, traços de um feminismo não característico desse tipo de obra que trata a mulher como objeto de desejo. Quando a personagem Rose decide deixar que o estupro feito pelos mesmos dois homens que no início do filme abusaram sexualmente da personagem seja consumado sem maiores problemas e proclama a frase “Era bem isso que eu estava esperando, era bem isso que eu queria”, não vemos apenas uma personagem que mudou de ideia quanto aos seus planos de vingança; vemos uma mulher que teve coragem de expressar seus desejos verbalmente, e coloca-los em prática. Se na década da de 70 víamos filmes inspirados pelo movimento hippie que influenciava a liberdade sexual e de expressão, ainda podíamos enxergar traços de um machismo colocando as personagens femininas em posição desconfortável de meros objetos de desejo. No filme de Vieira, podemos ver mulheres decididas que para terem seu sustento garantido, buscam na prostituição um meio para sobreviverem, e de acordo com a obra, de se divertirem. O reflexo de o filme ter um viés tão sério e mais politizado de que seus concorrentes da década anterior a de sua realização, e até mesmo aos de sua geração, pode estar no fato do descontentamento de Vieira com os rumos que a cultura vinha tomando no país, lembrando que nessa época os problemas com a EMBRAFILME já haviam começado, e sua 18
  • 19. desesperança talvez fosse refletida na vida sem perspectiva de personagens tão frios como ele próprio frente ao descaso com a cultura do cinema que ele mesmo tanto ajudara a construir. Os filmes da década de 1980, ao contrário de “Banho de Língua”, não possuíam roteiro consistente, e por vezes, assim como o precursor da inserção do sexo explícito nas tramas, coisas Eróticas”, nem mesmo continham conclusões de suas tramas desenvolvidas durante a trama, caso da segunda história mostrada dentro de um ciclo de três pequenos episódios inseridos no filme. Por isso ainda que aquém das expectativas de obras de qualidade que talvez o público esperasse para assistir no cinema, “Banho de Língua” merece destaque por trazer temas, que além do sexo, fazem sua trama interessante e até mesmo mais passível de classificação de obra que vai além do erotismo. Livre de mensagens políticas explicita, mas cheios de alusões à liberdade, mostradas aqui como o sexo por prazer e as escolhas do personagem, o filme merece destaque dentre a vasta produção do gênero graças a sua qualidade superior. 2.4. A SUPER FÊMEA: O PODER DA MULHER COMO OBJETO DE DESEJO 19
  • 20. FICHA TÉCNICA Título original: A Superfêmea Gênero: Comédia Elenco: Vera Fischer, Perry Sales, Walter Stuart, Geórgia Gomide, John Herbert, Adoniran Barbosa, Líbero Rípoli, Sérgio Hingst, Renato Restier, Sílvio de Abreu, Roberto Bolant, Elza Aguiar, Ivete Bonfá, José Júlio Spiewak, Lyba Frydman, Décio Piccinini entre outros. Duração: 100min. Lançamento (Brasil): 1973 Distribuição: Cinedistri Direção: Anibal Massaini Neto Argumento: Anibal Massaini Neto, Lauro César Muniz, Adriano Stuart e Alexandre Pires História: Lauro César Muniz Roteiro: Anibal Massaini Neto e Adriano Stuart Adaptação: José Peres e Antônio C. Martins Produção: Osvaldo Massaini e Anibal Massaini Neto Gerente de produção: Miron R. Cunha Assistente de produção: Antônio Santana Co-produção: Cinedistri Música: Mário Edson Som: Victor Raposeiro Fotografia: Osvaldo Oliveira e Antônio Meliande Assistente de Fotografia: Jurandir Pizzo Câmera: Rubens Eleutério Fotografia de Cena: José Amaral e Wilson Marques Figurinos: Vila Romana Montagem: Lúcio Braun Assistente de Montagem: Fernando Braun Eletricista: Antônio Souza Maquinista: Wilson S. Louzada Maquiagem: Flávio Torres Contra-regra: Nilson Oliveira Continuidade: Maria Isabel Amaral Coreografia: Clarice Abujamra 20
  • 21. SINOPSE Um laboratório farmacêutico resolve lançar no Brasil a pílula anticoncepcional para homens. Para a publicidade de lançamento, revela-se, ao se realizar uma pesquisa de campo, que a maior parte dos homens temem tomar a pílula, com receio de que possa diminuir sua virilidade, mesmo sabendo de seu poder ao realizarem testes em cobaias animais. Por meio de uma agência de propaganda e de seu super cérebro, descobrem a solução: o publico alvo, ou seja, o homem brasileiro, apóia-se em três mitos fundamentais: a mulher, o jogo e o café. E é a partir desses estimulantes que a campanha publicitária cria a figura da Super-Fêmea, a mulher perfeita, levando a publicidade do produto às alturas. Produzido no longínquo a no de 1973, o filme A Super-Fêmea (grafado dessa maneira, pois foi feito antes da correção ortográfica) é um típico filme da década de 1970 que mescla incursões humorísticas e cenas de sexo moderadas, que na maioria das vezes se limitam a insinuação sexual. Como estrela, temos a ex-miss Brasil Vera Fischer, fazendo um dos seus primeiros papéis de destaque na dramaturgia nacional. O filme assim como a maioria, conta com um roteiro fraco e confuso, tendo cortes abruptos entre uma cena e outra, e uma trilha sonora nada original, que s utiliza até mesmo de trechos da trilha original de “O Poderoso Chefão”, lançado alguns anos antes. Diferentemente dos filmes da década seguinte, o foco desse tipo de filme, era puramente o humor, sem compromisso algum com a realidade. O filme, até hoje um dos mais famosos e lembrados do gênero (embora não tenha sido sucesso de bilheteria), contém cenas que parecem ter sido tiradas de um filme do expressionismo alemão, graças as suas cenas com personagens um tanto quanto robóticos, e falas complexas. Porém a comparação termina nesse ponto, já que as cenas do filme parecem, por muitas vezes, nem mesmo seguir uma cronologia ou uma lógica de roteiro. Estrela de grandes produções do gênero pornochanchada, Vera Fischer brilhou na produção dando vida a uma modelo que tinha como missão a difícil tarefa de fazer com que uma pílula anticoncepcional masculina fosse aprovada pelo público alvo. Usando de sua imagem de sexy simbol, a atriz atiça os homens e faz com que seu produto seja facilmente aceito pela população masculina, e ao final ainda consegue comprovar que o produto aumenta a fertilidade masculina. 2.5. ANÁLISE DAS CATEGORIAS 21
  • 22. Tema: O filme passa por dois momentos distintos. Em um início que é praticamente esquecido durante o restante do filme, mulheres reivindicam seus “direitos”, cobrando que os homens agora sofram as dores e os desconfortos de um parto e coisas do tipo. Em uma reunião fechada, que logo parte para as ruas, temos então a cena de uma repórter que entrevista homens sobre a possibilidade da existência da pílula contraceptiva masculina. A partir daí, o tema do filme que inicialmente –especialmente pelo nome- parecia uma trama feminista, rata dos caprichos de uma sociedade masculina altamente machista dos anos 70 preocupada com sua virilidade e potência sexual. O corpo de Vera é altamente exposto durante o filme, que tem na protagonista a redenção de todos os seus problemas, que ao final parecia ser uma tentativa do governo de aumento da natalidade no país, já que a personagem central da à luz a cem bebês ao final da película. Personagens: Os personagens centrais são vera Fischer e Perry Salles, que vivem Eva e Onan respectivamente. Criatura e criador que tentam fazer com que a imagem do contraceptivo masculino seja livre de manchas. Num romance previsível que termina com o nascimento de cem bebês por parte do casal, sai de uma premissa interessante, mas não leva a lugar algum. Cenografia: O filme se passa numa grande cidade, mas existem cenas em diversos locais como em uma floresta (onde há um treino de arco e flecha), e grande parte das cenas se passam dentro laboratório da empresa responsável pelas pílulas. Diálogos: Os diálogos são falas comuns e não contem palavras de baixo calão como na maioria das produções do gênero. Possuem um alto teor de características que remetem ao machismo, e a mulher objeto, que é o assunto central do filme. Roteiro: A história contada de filme é a de Eva, uma mulher utilizada por uma empresa farmacêutica que pretende colocar no mercado a pílula contraceptiva masculina. A mulher, escolhida por ser a mais bela e desejável encontrada pela equipe de marketing da empresa, tem como função fazer com que os homens percam o medo dos efeitos colaterais do medicamento. Enquanto tentam provar a eficácia do medicamento, ambos se envolvem em um relacionamento amoroso que só decola no final do filme. Trilha sonora: A trilha sonora é uma das maiores pérolas contidas no filme que conta com composições feitas para a trilha sonora do filme o “Poderoso Chefão” de 1972 dirigido por Francis Ford Copolla, nas cenas em que o chefe dos laboratórios aparece. O restante são composições de músicas de mpb e samba que fazem parte como trilha incidental. 22
  • 23. 2.6. CONCLUSÕES SOBRE O FILME O filme segue a linha sugerida pelo gênero surgido na década de 1970. Mostra cenas de comédia com um misto de cenas onde a insinuação sexual e o ato sexual moderado está combinado. Não diferente também, grande parte das falas sofrem de uma falta de sincronia labial e por vezes são dubladas por atores diferentes das vozes originais, o que deixa o filme com um ar ainda mais trás. O roteiro é uma incógnita. Se no início parece uma manifestação pelos direitos das mulheres, nas quase duas horas seguintes tem-se apenas um discurso machista de homens que se enxergam preocupados cm sua virilidade e potencia sexual. A própria imagem de Vera Fischer que inicialmente parece ser usada positivamente, logo toma a posição de mulher objeto, não distante daquilo que já fora e seriam usadas tantas outras vezes dentro do gênero. A falta de lógica na narrativa também chama a atenção. Cenas mal editadas dão um ar de descontinuidade às cenas, embora também haja belas tomadas feitas durante a produção, a grande maioria explorando a beleza da protagonista, bem como cenas que beiram o bizarro e o mau gosto. O sexo presente de forma natural, porém não explícita na trama, também marca essa primeira fase da pornochanchada onde o corpo feminino era o foco da atenção, porém sem nudez frontal total. Ainda assim, o filme já remete ao que tudo se tornaria logo mais em alguns anos, mostrando que a moral e a luxúria estavam separadas apenas por uma tênue linha que seria quebrada com produções mais ousadas na década seguinte. O filme diferente da maioria, porém tem uma produção um pouco mais cara e elaborada, e claramente apoiada pela Rede Globo, já que ainda no início do filme é feita a alusão de uma pesquisa feita para um programa da emissora. Ao fim, o parto dos cem bebês, a mesma repórter do início, é a responsável pela cobertura do grande “acontecimento”. Ao contrário de “Banho de Língua”, a proposta de ‘A Super. Fêmea” é confusa. Uma mistura de feminismo, machismo e a exaltação da natalidade e da quantidade de vezes que a repórter diz ao final que todos deveriam ter filhos não deixa claras suas intenções. 3. ANÁLISE COMPARATIVA DOS FILMES 23
  • 24. Quando se tem em mãos o material de uma mesma era e gênero do cinema, pode-se ter a ideia de uma linearidade entre os materiais, ainda que esses sejam de diferentes décadas. Pois entre “A Super Fêmea” e “Banho de Língua”, separados por 12 anos de diferença, a decadência de um estilo fica clara, bem como a mudança na linguagem e na intenção do uso da ferramenta. Se na primeira década de existência o humor pastelão era o carro chefe ao lado de uma sensualidade moderada é totalmente perceptível o aumento do uso do sexo, nesse caso o explícito para chamar a atenção de um público que cada vez mais se distanciava das produções nacionais e do cinema. Ainda que a decadência seja vista por muitos como a incursão do sexo explícito nas tramas, também é claro um amadurecimento na discussão de temas polêmicos, considerados tabu para a sociedade. Se até então o homem viril e a mulher objeto eram o único viés explorado pelas obras, podemos ver uma grande diferença ao assistir o filma da década de 80, pois percebemos personagens femininas não apenas vistas como objetos, mas como donas de sues destinos e de não apenas objetos de manipulação do desejo masculino. à figura da mulher independente que diferente de uma superfêmea, não cede aos desejos dos homens apenas por uma maleabilidade natural da mulher, mas sim por desejo próprio. Enquanto assistimos a odisseia de uma mulher que pretende fazer com que os homens do país se convençam dos benefícios de um medicamento utilizando o poder de sua sensualidade, logo notamos que a história não gira em torno do poder da mulher, mas sim da figura feminina como objeto de puro de desejo. Ao final, a mensagem fica ainda mais confusa e o feminismo some de vez: Eva personagem de Vera tem cem filhos em um só parto, e é vangloriada pela multidão e pela imprensa por tal feito, que considera que superfêmea, é aquela que pode suportar tal acontecimento. Ou seja, o filme começa falando em liberação feminina, mas em seguida, coloca a mulher em lugar de costume: como dona de casa. Embora as imagens sejam bem feitas, e algumas cenas bem bonitas, o filme peca pela falta de estrutura mais bem elaborada de roteiro. Quanto a “Banho de Língua”, temos o inverso. Uma história de liberação pode ser vista na tela, com personagens que desafiam as regras de uma sociedade ainda presa a moralismos, falando sobre homossexualismo, bissexualidade e prostituição, mas o exagero e a escatologia tomam conta do filme que fazem com que assim como o que ocorre com o filme de 1973, fique a sensação incômoda de que algo está além do que devia. Se em 1973 o humor pastelão e a incoerência fizeram com que a obra ficasse aquém de suas expectativas, o exagero e o 24
  • 25. foco voltado em grande parte simplesmente para o sexo fez com que a obra fosse diminuída, embora uma mensagem fosse presente em maior escala e com maior força dentro do contexto, ou seja, a de liberação –especialmente a sexual- de desejos reprimidos. É impossível não levar em conta a habilidade e a técnica de Tony Vieira quanto à direção de banho de Língua. Seus filmes, na maioria policial na década de 1970, sempre dirigida com maestria e sucessos de público, foram base para a direção de seu filme mais denso e explícito, e ao contrário da maioria dos filmes do estilo que na década de 1980 seguiam apenas para o sexo gratuito Vieira acrescentou uma história, diga-se de passagem, com um final fortíssimo para seu filme. Contudo, como o filme era vendido com um filme de sexo explícito, provavelmente essa intenção, essa mensagem passou despercebida. Em suma, embora muito mais explicite e agressivo do que os filmes do gênero na década de 1970, Banho de Língua consegue passar uma mensagem muito mais mobilizadora do que os filmes “leves” da década anterior que se utilizavam da nudez e de piadas para chamar a atenção, mas raras vezes tocava em assuntos polêmicos e com certeza de pouco interesse social passível de discussão. 4. CONSIDERAÇÕES FINAIS Com todos os aspectos negativos que o cinema passou na década de 1980 aliados com a falta de qualidade e o exagero das produções feitas nessa época, a pornochanchada chegou ao seu fim, mas não sem antes colocar em algumas de suas produções um ar mais ácido e crítico, fato, porém que foi ignorado pela grande população que procurava filmes de sexo explícito apenas. Não propositalmente, tudo isso se emendou ao final desse tipo de produção, que caía no desgosto do grande público e que também tinha que luta contra a grande produção internacional de filmes do gênero pornográfico, que eram o grande desejo da época. Ainda que haja a coincidência de que tais filmes começassem a ser extintos quando uma linguagem mais crítica passou a ser utilizada, em nada a censura interviu para que isso acontecesse, sendo o descrédito e a autodesvalorização do próprio gênero que o fez cair no limbo do esquecimento, com roteiros cada vez mais fracos –embora houvesse obras de qualidade, ainda que muito poucas- e filmes de qualidade cada vez mais precária. A pornochanchada, quando bem intencionada, pode sim ser considerada uma obra eu faz com que seu espectador reflita quanto ao seu contexto, e seu fim, inclusive sua frouxidão quanto à 25
  • 26. censura, pode ser muito mais relacionada ao seu caráter alienador enquanto obra de humor popular, do que quanto a filmes de sexo explícito que apesar de conter mensagens muito mais fortes do que seus antecessores, fascinavam muito mais pelos corpos desnudos do que por suas intenções filosóficas. REFERÊNCIAS Artigos PINTO, Leonor Souza. O Cinema Brasileiro face à censura imposta pelo regime militar no Brasil – 1964/1988. Março 2006 NETO, Francisco de Oliveira : PORNOCHANCHADA E CENSURA: LEGÍTIMAS FILHAS DA DITADURA. Outubro de 2007. SOUZA, Rafael Machado Nobre. Fidel, “Purgas” e Pornochanchadas: um estudo comparativo entre as políticas públicas cinematográficas do ICAIC e EMBRAFILME. 2011. SIMIS, Anita. Cinema e Política Cultural Durante a Ditadura e a Democracia. 2006 Sites A Boca do Lixo Ainda Respira. In < www.reporterbrasil.org.br > Acesso em: 2 de junho de 2011 In < www.bmpornochanchada.blogpot.com > Acesso pela primeira vez em: 24 de maio de 2011 In < www.unicamp.br > Acesso em 1º de junho de 2011 As pornochanchadas mais famosas In <http://gilbertocarlos-cinema.blogspot.com> Acesso em 20 de outubro de 2011 A lista dos filmes brasileiros com mais de 1 de milhão de espectadores, A pornochanchada no Brasil, David Cardoso e Tony Vieira In < http://pt.wikipedia.org> Filmes BANHO DE LÍNGUA. 1985 Direção: Tony Vieira. Elenco: Aida Gimaraes, Camila Babi 74mim A SUPER FÊMEA. 1973. Direção: Anibal Massaini Neto. Elenco: Vera Fischer, Perry Salles, Adoniran Barbosa 103min 26
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