2. Já não sei em que data estamos.
Nesta casa não há folhinhas e, em
minha memória tudo está revolto.
As coisas antigas foram
desaparecendo, e eu também fui
apagando sem que ninguém se
desse conta.
3. Quando a família cresceu, me
trocaram de quarto. Depois me
passaram a outro menor ,ainda
acompanhada de minhas netas.
Agora ocupo a edícula, no quintal
de trás.
Prometeram-me trocar o vidro
quebrado da janela, mas se
esqueceram. E nas noites, por ali
sopra um ventinho gelado que
aumenta minhas dores reumáticas.
4. Um dia a tarde, me dei conta que
minha voz desapareceu. Quando
falo, meus filhos e meus netos não
me respondem.
Conversam sem olhar para
Às vezes, digo algo, acreditando que com
mim, como se eu não estivesse
eles.
apreciarão meus conselhos. Mas não
olham, não me respondem.
Então, me retiro para o meu canto antes de
terminar a caneca de café.
5. O faço para que compreendam que
estou enojada, para que venham
procurar-me e me peçam perdão...
Mas dia seguinte lhes disse:
No ninguém vem.
-_Quando eu morrer, então
sim vão sentir minha falta.
E meu neto perguntou:
_Estás viva, vovó? (rindo-se)
6. Estive três dias chorando em meu
quarto, até que numa certa
manhã, um dos meninos entrou a
jogar umas rodas velhas...
Nem o bom dia me deu.
Foi então quando me convenci de
que sou invisível.
7. Uma vez, os meninos vieram
dizer-me que no dia seguinte
iríamos todos ao campo.
Fiquei muito feliz. Fazia tempo
que não saía! Fui a primeira a se
levantar.
8. Quis arrumar as coisas com
calma. Nós, os velhos tardamos
muito, assim me ajeitei a tempo
para não atrasá-los.
Em pouco tempo, todos entravam
e saíam da casa
correndo, jogando bolsas e
brinquedos no carro.
9. Eu já estava pronta e muito
alegre. Parei na porta e fiquei
esperando. Quando se
foram, compreendi que eu não
estava convidada. Talvez porque
Senti como meu coração se encolhia, o
não cabia no carro.
queixo me tremia como alguém que tinha
vontade de chorar.
Eu os entendo. São jovens.
Riem, sonham, se abraçam, se beijam.
10. E eu... Antes beijava os
meninos, me agradava tê-los nos
braços, como se fossem meus. E
até cantava canções de berço que
havia esquecido.
Mas um dia...minha neta acabava
de ter um bebê. Me disse que não
era bom que os velhos beijassem
aos meninos por questões de
saúde.
11. Desde então, não me aproximei mais
deles. Tenho tanto medo de
contagiá-los! Eu os bendigo a todos
e os perdôo, porque...
Que culpa eles têm, de
que eu tenha me
tornado invisível?
12. Formatação: Verarduin
Texto: Silvia
Castillejon
Imagens: Internet
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