1. Entrevista KARIN FELLER
“Todos gostam de moda”
DÉBORAH ARANHOS
A estilista brasileira com origem israelense diz que não há um indivíduo que não goste do
assunto e afirma que ninguém se veste de qualquer jeito, nem o mais desleixado
F ormada desde 2008, Karin Feller
sempre gostou de moda. Sua pri-
meira oportunidade de alavancar a
sua carreira foi no mesmo ano na Ponto
Zero, um concurso para novos profissio-
nais. Aos 28 anos, Karin mantém a sua
própria marca na cidade de São Paulo
e diz que não tem planos de morar em
outro Estado ou País, pelo menos por
enquanto devido à importância de estar
na “sede da moda” como ela mesmo
define a cidade. Para ela, o Brasil está
crescendo cada vez mais no ramo e
indica que o mercado está aquecido e
necessitando de novos profissionais.
Karin explicou que um estilista não
trabalha sozinho: “são muitas pessoas
que estão envolvidas e isso tem uma
magnitude muito grande”. Confira a
entrevista cedida pela estilista em seu
escritório em São Paulo.
A Casa de Criadores é um dos
“Uma marca tem
eventos mais importantes da indús-
tria da moda principalmente no
Brasil e na América Latina e que a
cada ano está crescendo mais. Para
você, profissional do ramo, como é vários departamentos
estar na Casa de Criadores? O que
o evento trouxe pra você de bom? E e várias pessoas
como surgiu a oportunidade de criar
uma coleção para o evento? Estar na envolvidas e eu
casa de criadores é muito gratificante,
pois é um evento que traz bastante visi- represento a marca
bilidade e estrutura para toda marca que
é pequena e está crescendo. Estando lá
dentro, você tem essa estrutura para ter
Karin Feller ”
uma marca, fazer com que ela cresça
cada vez mais, ter uma visibilidade
dentro da mídia e um espaço para você
fazer os desfiles. No meu caso, eu entrei
na casa de criadores através do Projeto
DÉBORAH ARANHOS
Ponto Zero, que é feito pela Casa de
Criadores, ABIT e Mercado Mundo
Mix. Eu fui vencedora da primeira
edição e consequentemente entrei para
Casa de Criadores e fiquei.
veja/universidade cruzeiro do sul I 03 DE JUNHO, 2011 I 17

2. Entrevista KARIN FELLER
A moda é passageira, e estilistas pelo
“Eu preciso trabalhar cimento rápido e a gente espera que continue
mundo todo lançam novos estilos, em São Paulo, outras sendo assim, continue crescendo bastante.
cores e temas. Você como estilista,
sempre lança novas tendências ou você
sempre segue o mesmo padrão? Toda
pessoas de outros Aqui nesse escritório, funcionam quan-
tas empresas?Aqui é um escritório que tem
marca tem um estilo que faz com que ela seja
reconhecida, por que é muito efêmera, está
ramos, inclusive três empresas.
muito lá no fundo. Você consegue reconhecer
aquela linha de criação, mas dentro de cada
da moda podem Por ser uma estilista, você se preocupa
um pouco mais com o visual ou você
coleção tem uma história nova, é uma linha
de criação nova que preza pela linha de estilo
trabalhar em outros veste o que bem entender? É engraçado,
não é? Por sermos estilistas, parece que a gente
da marca, que lança novas tendências, cores e
temas. lugares, mas eu tem uma liberdade para se vestir como quer, e
é mais ou menos assim que funciona. Eu não
Toda personalidade de qualquer ramo, preciso ficar na sede costumo pensar muito, apesar de que a gente
fala: ai, essa roupa não está muito pensada mas
seja eles, fotografia, moda, cinema e no fundo ela está, para ficar com cara de não
música, tem uma história de como tudo da moda, pensada, mas ela é. Eu tenho um estilo que é
começou até os dias atuais. Como tudo meu, que é uma coisa bem casual e eu me visto
começou na sua carreira e quais são os que no Brasil é de acordo com o meu humor no dia, com o que
principais trabalhos que você já fez? Eu
estava me formando em 2008, quando surgiu
a oportunidade de fazer o concurso da Ponto
aqui ” vai acontecer e com a ocasião.
Nos seus desfiles você também escolhe
Zero. Eu achei uma boa ideia então eu fiz o pro- a maquiagem, os penteados e os aces-
jeto, mandei, fui aprovada e concorri represen- pra fazê-la? Na coleção de Verão, eu estou sórios das modelos ou tem um departa-
tando a Faculdade que eu estava estudando. Eu dando uma continuidade que veio da coleção mento para isso? Nós sempre fazemos um
venci o concurso e foi a partir desde momento de Inverno. É o amadurecimento da marca com trabalho com o “stylist”, então a gente escolhe
que as portas se abriram para mim. Eu tive a inspirações em animais selvagens e pássaros em conjunto. O Stylist é uma pessoa que está de
chance de fazer um desfile em Portugal, tive a migratórios. fora, que tem um olhar especializado nisso para
oportunidade de vender as peças e aos poucos fazer uma imagem e é legal por que ela tem um
conhecer o mercado tanto nacional quanto in- Geralmente passarela é sinal de nova olhar que eu não tenho e como eu convivi com
ternacional. Dessa forma as coisas começaram moda a ser lançada. Como estilista, aquela coleção durante seis meses eu já não
a fluir naturalmente. como é lançar uma nova tendência, qual vejo algumas coisas ou vejo coisas que a pessoa
é o sentimento de saber que você criou que está de fora e que é introduzida na coleção
Por ser uma estilista conhecida como tudo aquilo e que os aplauso são todos nova vai ver de uma maneira diferente então, é
você lida com os seus fãs? É muito bom, para você? É muito legal. Como estilista é legal fazer esse trabalho junto do stylist. E os
eles são muito fofos. É muito gostoso, por que muito gostoso por que tem o reconhecimento, acessórios todos são da coleção, a marca faz
de repente você vê que não tinha muita noção mas eu não vejo muita essa história, como sapato, faz bolsa, semi-jóias. Então a gente vai
aonde o seu trabalho chega, depois vem uma estilista. Eu vejo como marca e como a frente compondo todos os “looks” um por um. E eles
pessoa que você não faz ideia, de um lugar que da direção criativa da marca. Por que o trabalho meio que se conversam, por que como os aces-
você nem sabia que podia estar alcançando e ali não é só meu, são muitas pessoas que estão sórios fazem parte da coleção e da marca eles
essa pessoa curtiu o seu trabalho e ela dá para envolvidas e isso tem uma magnitude muito vão ter o mesmo tema, o mesmo ar e estilo.
você um retorno que faz tudo valer a pena. Que grande, que envolve desde a pessoa que ajudou
é o retorno de admirar o que você batalhou você a escolher o tecido, a costureira que Qual a sua origem e porquê trabalhar
tanto para conseguir. fechou a peça até o trabalho de marketing e em São Paulo e não em outra cidade?
comercial. Então é um trabalho que eu estou re- Você tem vontade de mudar para outro
No que mais você se inspira para fazer presentando e este agradecimento é na verdade estado ou quem sabe, outro país? Eu
as suas coleções? Eu me inspiro muito em para um complexo de pessoas que estão dentro nasci em Israel e fiquei lá até os nove anos de
música, eu me inspiro muito na rua, eu me ins- da marca e isso é bom para gente. idade e depois eu cresci no Rio Grande do Sul
piro muito em coisas que estão acontecendo na e vim pra São Paulo quando eu já era adoles-
minha vida. Cada coleção começa com o tema Nós que estamos de fora pensamos cente. Eu me apaixonei pela cidade. São Paulo
que é só você. Isso por que a marca leva o
antes de eu pensar em escolhe-lo, ele meio que tem muitos problemas, claro, a qualidade de
surge pra mim. meu nome, é diferente a Karin Feller pessoa da vida aqui talvez não seja a mais incrível de
Karin Feller marca. É uma marca, tem departa- todas, mas você tem tudo. E depois que você
Você pode adiantar um pouco sobre a mentos, tem várias pessoas envolvidas. Ou seja, aprende a viver com a possibilidade de ter tudo
sua nova coleção de Verão que você eu estou ali representando a marca, e é bom por é muito difícil você voltar para uma vida mais
está criando e no que você se inspirou isso, que você vê que está tendo um reconhe- simples, isso é o que eu penso hoje, talvez um
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3. dia eu sinta falta de uma vida um pouco mais
“Todo mundo gosta acho que as pessoas sempre gostaram. Agora o
tranquila, mas no meu caso eu não tenho nem
muita escolha, eu preciso trabalhar em São Pau-
ou gostou de moda, mercado está aquecido mesmo, por que o Brasil
está começando a melhorar essa questão, então
lo. Outras pessoas de outros ramos, inclusive
da moda podem trabalhar em outros lugares e
ela é mais do que acaba que ele tem mais necessidade de pessoas
trabalhando.
devem, por que tem mercado no Brasil inteiro,
mas no meu caso, eu preciso ficar na sede da
você ir ao shopping Quais necessidades que um estilista
moda, que no Brasil é aqui.
e comprar uma roupa deve atender? Um estilista deve atender
muitas necessidades tanto a do público, que
Então se surgisse uma oportunidade de
trabalhar em outro país você não iria? cara, ela significa são as necessidades de novidades e conceitos,
quanto as necessidades comerciais, que são as
Mas que outra oportunidade seria essa? Por que
eu não iria trabalhar em outra marca, eu não ter um código para peças que vão vender e é aonde você faz o seu
negócio girar.
iria trabalhar em outra empresa, a não ser que a
minha empresa se expandisse e chegasse a esse passar a sua Isso é considerado um super desafio?
ponto, aí sim. Mas a partir daí eu prefiro pensar Sim, é um desafio. Você precisa criar peças
conforme as coisas vão acontecendo. Outros vestimenta e com ela novas, por que se você não criar novidade
países são sempre interessantes, se mudar é ninguém precisa de você lá, mas ao mesmo
muito interessante. A gente vai vendo conforme você passar uma tempo dentre essas novidades você tem que ter
as coisas vão acontecendo.
Para seguir essa carreira de estilista
mensagem ” alguma coisa que cause desejo, por que se você
não vender, também não adianta. Pelo menos
no caso de uma marca que pretende entrar em
você fez a faculdade? Por que geral- um mercado de vendas, por que tem pessoas
mente as pessoas fazem apenas um necessariamente fui até o lugar. Já na coleção que conseguem fazer de outras maneiras e vão
curso profissionalizante. Eu fiz faculdade. passada eu fui mais aos lugares, eu passeei para o lado da arte, elas fazem apresentações
Eu me dediquei bastante, por que é um curso mais pelas cidades, eu tive mais necessidade conceituadas e vivem disso, mas a maioria
muito difícil e puxado e para mim, foi muito de ir, mas com o tempo acho que isso cres- delas, em algum momento, vai ter em algum
importante. Acho que cada caso é um caso, tem ce, conforme a marca cresce mais você quer “show room”, em algum atacado ou em algum
pessoas que nem fizeram faculdade de moda. conhecer novos lugares e novas referências varejo uma peça mais comercial que ela vai
Então, meio que como em todo ramo, claro que para buscar, então eu vou ter essa necessidade precisar conseguir difundir a marca dela, para
é possível você trabalhar, quando você já esta de viajar mais. as pessoas começarem a usar. Quer dizer, o
nele, mesmo sem ter feito um curso ou facul- objetivo é que as pessoas usem e transformem a
dade ou feito apenas o curso, mas acho que a O mundo da moda atualmente está história da moda gradativamente, desde sempre
faculdade é uma vantagem. crescendo, novos estilistas no merca- as coisas vão evoluindo e a gente está em uma
do, muitos desfiles e as pessoas estão fase de evoluir a nossa.
Fiquei sabendo de uma história que começando a gostar deste universo
uma estilista precisava ir para a cidade diferenciado. Você acha que as pes- Para entender melhor, assim que as
onde ela nasceu e viveu, por muitos soas estão começando a gostar deste peças saem do desfile, elas vão direto
anos, para criar as peças, ter as ideias e universo? A gente sempre gosta de moda, para as vendas? Não. No caso tem o “show
fazer seus desenhos. Tem alguma coisa mesmo quem fala que não, gosta de moda, por room”, onde você apresenta a sua coleção para
em que você se baseia ou algum lugar que ele faz questão de mostrar que não gosta de o atacado, que é o meu caso, e tudo que desfila,
específico para ter as suas ideias? moda então se veste de um jeito para demonstrar está disponível no atacado, mas muita coisa que
Cada coleção vai ter uma história, se o meu que aquilo não é importante para ele e aquela está no atacado não, necessariamente está na
tema fosse alguma coisa saudosista e tivesse vestimenta está passando um recado de que eu passarela.
essa coisa mais “vintage” (recuperação de esti- não gosto, mas você se importa com aquela
los) talvez eu precisasse viajar até outro lugar. Você venderia a sua coleção em outro
vestimenta, ninguém se veste de qualquer jeito.
Cada tema vai precisar de uma certa pesquisa e país? Não tem limite para isso. Todo mundo é
Até quem se veste de qualquer jeito, está fazendo
talvez essa pesquisa seja de campo mesmo, de questão de mostrar que é desleixado, está fazen-
bem vindo em todos os lugares, ao meu ver, eu
você estar fisicamente no lugar ou as vezes é do pouco caso. sei que não é bem assim, mas conforme você
um tema que já te cerca, então é bem relativo. expandir mais, é melhor para a marca. É bom
Para essa coleção, por exemplo, era uma coisa Todo mundo gosta de moda? Todo mundo para as pessoas, que tem a oportunidade de ter
que me cercava um pouco, então, eu não ne- gosta ou gostou de moda, ela é mais do que coisas de fora, é bom para o mercado que fica
cessariamente viajei, mas em outras coleções já você ir ao shopping e comprar uma roupa cara, bem mais aquecido e melhora a relação entre
passeei, viajei, pesquisei. Mas essa eu pesquisei ela significa um pouco mais. É como você as pessoas. A pessoa vem de fora para vender
de outras maneiras, essa foi através de livros, ter um código para passar a sua vestimenta e sua marca aqui e pode acontecer o inverso, de
em imagens, referências imagéticas. Eu não com ela você passar uma mensagem, então eu alguém daqui vender no exterior.
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