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UNIVERSIDADE DO ESTADO DA BAHIA
      JULIANA COSTA OLIVEIRA




A COMUNICAÇÃO COMUNITÁRIA NO
      TERRITÓRIO DO SISAL




           Conceição do Coité
                 2010
1



           JULIANA COSTA OLIVEIRA




A COMUNICAÇÃO COMUNITÁRIA NO TERRITÓRIO
               DO SISAL




                         Trabalho de conclusão apresentado ao curso de
                         Comunicação Social – Habilitação em
                         Radialismo, da Universidade do Estado da
                         Bahia, como requisito parcial de obtenção do
                         grau de bacharel em Comunicação, sob a
                         orientação da Profª Esp. Vilbégina Monteiro
                         dos Santos.




                Conceição do Coité
                      2010
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               JULIANA COSTA OLIVEIRA




A COMUNICAÇÃO COMUNITÁRIA NO TERRITÓRIO
                         DO SISAL




                                Trabalho de conclusão apresentado ao curso de
                                Comunicação Social – Habilitação em
                                Radialismo, da Universidade do Estado da
                                Bahia, sob orientação da Profª Esp. Vilbégina
                                Monteiro dos Santos.




       Data: _________________________________________________
       Resultado: _____________________________________________


       BANCA EXAMINADORA
       Profª. (orientadora) _______________________________________
       Assinatura: _____________________________________________


       Profª. __________________________________________________
       Assinatura: _____________________________________________


       Prof. ___________________________________________________
       Assinatura: _________________________________________
3




Dedico este trabalho aos meus avós paternos Almir
Oliveira e Dulcelina Lopes (ambos, in memoriam)
pelo exemplo de vida, dedicação e perseverança no
sertão. À minha família, em especial a minha mãe,
Elisabete Costa, pelo carinho, pelas preces, pelo apoio
incondicional que ao longo dessa jornada foram
imprescindíveis.
4



                               AGRADECIMENTOS




                        À Deus, por ter me concedido essa benção;
         À toda minha família pelo amor , compreensão e generosidade de sempre;
 Aos meus pais, Ernandes e Elisabete, que sempre estiveram ao meu lado me apoiando e me
                      incentivando em todas as etapas da minha vida;
Ao meu irmão, Diego Costa, pelo companheirismo, amizade e pela presença constante, sendo
                          fundamental na realização desse sonho;
À Edisvânio Nascimento, e a todos os Comunicadores Comunitários e Entidades do Território
              do Sisal, pela ajuda e atenção nos momentos em que os recorri;
    Aos meus professores, em especial, à professora Vilbégina Monteiro dos Santos, pela
                                dedicação ao orientar-me;
          Aos meus colegas que sempre me auxiliaram ao longo dessa caminhada;
 À todos aqueles que de alguma forma colaboraram durante o processo de realização desse
                           trabalho, meu MUITO OBRIGADA!
5




“Quanto mais livre a informação circula, mais
forte fica uma sociedade”.


             Barack Obama (Presidente dos EUA).
6



                                         RESUMO




Localizado no semi-árido do nordeste da Bahia, o Território do Sisal caracteriza-se pelo seu
clima seco, pela economia baseada no cultivo do agave e também por ser uma região
desfavorecida no que diz respeito a aspectos políticos, sociais, econômicos e ambientais.
Entretanto, essa região vem se destacando pela forte atuação do terceiro setor. A alteração no
processo comunicativo com o fenômeno das rádios comunitárias e a criação de entidades de
comunicação, fez com que os atores sociais instituíssem a comunicação como fundamental
para a mobilização social. O objetivo do estudo é compreender este processo dando destaque
ao Plano de Desenvolvimento Territorial, buscando identificar os avanços, desafios e
perspectivas da comunicação na viabilização do desenvolvimento local. Como estratégias
metodológicas foram utilizadas o levantamento de dados qualitativos, o que possibilitou
estabelecer um debate teórico sobre a Comunicação Comunitária e Desenvolvimento Local,
assim como, realizar um apanhado histórico da Comunicação Comunitária na região. O uso da
pesquisa de campo e das entrevistas semi-estruturas e em profundidade foram essenciais para
detectar os entraves da Comunicação Comunitária no Território do Sisal. Diante da análise,
propõe-se a necessidade de rever o conceito de participação.



PALAVRAS-CHAVE: Comunicação, Mobilização Social e Desenvolvimento Local.
7



                                        ABSTRACT



Located in the semi-arid northeast of Bahia, the Territory of Sisal is characterized by its dry
climate, the economy based on the cultivation of agave and also for being a disadvantaged
area with regard to political, social, economic and environmental. However, this region has
been increasing by the strong performance of the third sector. The change in the
communication process with the phenomenon of community radio and the establishment of
independent media, meant that social actors institute communication as essential for social
mobilization. The study is to understand this process by highlighting the Territorial
Development Plan, aimed at identifying the progress, challenges and perspectives of
communication in facilitating the development site. As methodological strategies were used to
raise data quality, which allowed the establishment of a theoretical debate on the
Communication Community and Local Development, as well as perform a historical
overview of Communication in the region. The use of field research and semi-structure and
depth are essential to detect obstacles of Communication in the Territory of Sisal. Before the
analysis, it is proposed the need to revise the concept of participation.




KEYWORDS: Communication, Social Mobilization and Local Development.
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                                       SUMÁRIO



Introdução                                                                   09


1 - Comunicação Comunitária e Desenvolvimento Local:                         13
Um debate possível?


1.1- O cenário da comunicação no Brasil.                                     14
1.2- Comunicação Comunitária, mais que uma alternativa.                      17
1.3 - Uma nova proposta de desenvolvimento.                                  19
1.4 - A relação entre Comunicação Comunitária e desenvolvimento local.       23


2 – Sisal, um Território de Possibilidades.                                  26

2.1 – “Por um Sertão justo”:
A causa das organizações que compõem o Território do Sisal.                  35

2.2 - A Comunicação Comunitária no Território do Sisal.                      41


3 - Comunicação Comunitária e Desenvolvimento Local:                         47
Uma prioridade ou uma resistência?


3.1 – Pensando a comunicação estrategicamente.                               48
3.2 – Comunicação Comunitária no Território do Sisal:
Papel de mobilização ou mobilização só no papel? Avaliação dos resultados.   52


Considerações Finais                                                         58


Referências                                                                  63


Anexos                                                                       67
9



                                      INTRODUÇÃO


       Quando criança, nas visitas a fazenda do meu avô paterno, localizada no Município de

Retirolândia, a caminho, eu sempre costumava observar o ruído dos motores de sisal nas

redondezas. No imenso silêncio das pastagens, aquele som denunciava que ali por perto havia

trabalhadores desfibrando as folhas do sisal. Anos mais tarde, já na adolescência, pude

entender melhor a história da Região em que passava a conviver. A proximidade com o lugar,

com as pessoas, me fez compreender que o barulho do motor do sisal representava muito mais

para aquela gente.

       Além de ser uma importante ferramenta que facilita a extração da fibra do sisal,

principal fonte de renda da região; a chegada das primeiras máquinas, em meados da década

de 40, sinalizou o início do processo de modernização na Região Sisaleira (CODES, 2008). O

trabalho no motor, como é popularmente conhecido, baseia-se na exploração da mão-de-obra,

em péssimas condições de trabalho, assim como também oferece riscos de saúde e mutilações.

Entretanto, essa lida foi e ainda permanece sendo o sustento de inúmeras famílias.

       Durante décadas, os ruídos dos motores de sisal foram os únicos sons ouvidos pela

população marcada pela subserviência e clientelismo. Numa terra castigada pela seca, onde a

pobreza, o analfabetismo, a migração e o trabalho infantil configuram os agravantes sociais; a

organização da sociedade civil passa a ser uma valiosa arma na luta por melhores condições

de vida.

       A criação dos Sindicatos de Trabalhadores Rurais (STRs) configurou um passo

imprescindível para que os agricultores passassem a se mobilizar para lutar por seus

interesses, no entanto, a cultura de dominação disseminada pelos meios de comunicação,

concentrados em sua maioria nas mãos de poucas famílias ligadas a grupos políticos, se

estabelecia como o maior entrave para a viabilização da participação e conscientização dos

cidadãos.
10



       As transformações na realidade social da Região Sisaleira começam a acontecer com o

surgimento dos movimentos sociais, os quais encontraram destaque através das Rádios

Comunitárias implementadas no final da década de 90. Essas rádios constituíram papel

fundamental no processo de mobilização, uma vez que o som que informa, educa e denuncia

passava a ressoar entre o ronco dos motores de sisal, aproximando as comunidades e alterando

o cenário comunicacional da Região.

       A forte atuação dos movimentos sociais pode ser verificada pela inserção do Codes

Sisal (Conselho Regional de Desenvolvimento Rural Sustentável da Região Sisaleira do

Estado da Bahia), instituição responsável por promover ações de sensibilização, mobilização e

planejamento do desenvolvimento do Território. Nessa perspectiva, a comunicação aparece

como eixo prioritário do PTDRS (Plano Territorial de Desenvolvimento Rural Sustentável da

Região Sisaleira), sendo eleita como fator estratégico do desenvolvimento local.

       Esta monografia tem como objetivo analisar a Comunicação Comunitária no Território

do Sisal, implementada pelo Plano de Comunicação do CODES Sisal. Tal abordagem busca

compreender como é articulada a relação: Comunicação e Desenvolvimento Local no

Território Sisaleiro.

       Desenvolver a pesquisa sobre a Comunicação Comunitária no Território do Sisal é de

grande relevância, pois são poucos os estudos desse foco na região, embora seja um fenômeno

evidente. Além disso, a minha própria ligação com o tema, enquanto aluna do curso de

Comunicação Social, fruto da forte mobilização dos movimentos sociais, me levou a

prosseguir a investigação. Trata-se, porém, de um retorno à comunidade, sendo que, a

abordagem pode ser uma contribuição a mais, que venha a favorecer a formação de políticas

públicas de comunicação para o Território.

       Portanto, fez-se necessário analisar e dialogar com essas comunidades, com esses

atores que se organizaram e buscaram representatividade ao lado dos movimentos sociais, das
11



rádios comunitárias, e oportunidades de capacitação e qualificação com a criação de projetos

para melhorar a forma de se comunicar com o intuito de transformar a realidade social e o

olhar que a mídia faz desse lugar. Dessa forma é pertinente averiguar se os conceitos de

Comunicação Comunitária estão sendo trabalhados, avaliando as ações de interação entre

cidadão e a comunicação.

       No 1º capítulo a proposta foi trazer um debate teórico buscando responder os

questionamentos a respeito da relação entre Comunicação Comunitária e Desenvolvimento

Local. Partindo pelo contexto histórico da comunicação no Brasil, desde o surgimento dos

primeiros meios de comunicação de massa no país, perpassando a formação dos grandes

conglomerados de mídia no Governo Vargas, pelas censuras e opressões marcadas no período

da ditadura militar, até chegar à constituição da organização da sociedade civil e a

necessidade de apropriação de uma comunicação voltada para os interesses da comunidade.

Logo em seguida, é apresentado o conceito de Comunicação Comunitária, sendo traçada a

relação com o Desenvolvimento Local, baseada na noção de participação, e então é trazida a

proposta de desenvolvimento.

       Inteirados das noções de comunicação e desenvolvimento, prosseguimos para o 2º

capítulo onde é apresentado um apanhado histórico da Comunicação Comunitária no

Território do Sisal. A princípio são pontuados os aspectos econômicos, políticos, sociais,

culturais, comunicacionais e ambientais da Região, assim como, o seu fortalecimento através

da organização popular, sendo relatado especialmente sobre as principais entidades que

compõem o Território e a importância dessas para o desenvolvimento sustentável. Depois é

abordada especificamente a Comunicação Comunitária no Território, ressaltando as rádios

comunitárias, a criação das entidades de comunicação e a inclusão do Eixo de Comunicação

no PTDRS elaborado pelo Codes Sisal.
12



       Com intuito de identificar as melhorias alcançadas e as possíveis deficiências no

desenvolvimento do Território através das práticas comunicativas, foram analisadas no 3º

capítulo as ações e projetos desenvolvidos pelo Codes Sisal, tomando por base o Eixo de

Comunicação do Plano Territorial de Desenvolvimento Rural Sustentável da Região Sisaleira.

Correlacionando-o aos conhecimentos de Relações Públicas, foi possível detectar as

estratégias de comunicação para a mobilização social. A análise de outros documentos como a

Carta Coité, o Relatório do MOC (Movimento de Organização Comunitária): Como está a

Comunicação nas Organizações?, as pautas de reunião do Grupo de Trabalho de

Comunicação, assim como, as entrevistas realizadas, foram essenciais para         avaliar os

avanços, desafios e perspectivas da comunicação comunitária no Território do Sisal.

       Contudo, esse trabalho não significa um ponto final no processo de investigação sobre

a comunicação da Região, mas sim de uma proposta de continuidade, de incentivo aos atores

sociais para que reavaliem os conceitos, as ações, a participação dos outros setores na busca

da implementação da Comunicação Comunitária em prol do Desenvolvimento Local. Uma

vez que, os ruídos dos motores de sisal que antes eram os únicos sons ouvidos perante o

imenso silêncio que predominava naquela gente, agora dão lugar aos ruídos da transformação.

Boa leitura!
13



1 - Comunicação Comunitária e Desenvolvimento Local: Um debate possível?


       Nos dias de hoje, devido aos efeitos da globalização, a comunicação passou a ser mais

utilizada para fins mercadológicos, perdendo aos poucos o seu caráter de integração para a

cidadania. É inevitável o controle que os meios de comunicação exercem sobre a sociedade,

enquanto poderosos formadores de opinião. Cada vez mais, alienam os indivíduos, ditam

modas, exacerbam o consumismo, manipulam resultados, influenciam na cultura, na política,

na economia, na educação e em outros campos, ou seja, detêm o controle das massas. É

grande o fluxo de informação no mundo, no entanto, o poder midiático se restringe à

pequenos grupos.

       No Brasil, a centralidade da comunicação nas mãos de poucas famílias revela as

interfaces do contexto histórico político e social de um país em desenvolvimento. Numa

nação democrática em que a maioria dos veículos de massa são propriedades privadas, a

liberdade de expressão, a pluralidade e a democratização da comunicação, não são realidades.

       É entendendo a comunicação como decisiva no processo de formação da sociedade,

que atualmente vem sendo muito discutida entre os estudiosos de diversas áreas a relação

entre comunicação e desenvolvimento. O questionamento mais preponderante é como a

comunicação pode ser trabalhada de forma a viabilizar o desenvolvimento. Para pensar nessa

lógica é preciso antes saber quais as dimensões desses termos devem ser apropriadas.

        Neste capítulo, os conceitos de comunicação e desenvolvimento serão enfatizados na

perspectiva de melhorar as condições sociais de vida das pessoas através de suas relações

comunitárias. Logo, a concepção de comunicação a ser tratada é voltada para uma dinâmica

dialógica, participativa, mobilizadora, capaz de atender as demandas da comunidade, uma vez

que esta será articulada, de modo, estratégico em prol do desenvolvimento local. Sendo assim,

primeiro será abordado o panorama da comunicação no âmbito nacional e em seguida serão
14



apresentados os conceitos de Comunicação Comunitária e Desenvolvimento Local e a relação

proposta.



1.1-    O cenário da comunicação no Brasil.


        Historicamente, o cenário da comunicação no Brasil é marcado por repressões,

censuras e oligarquias; desde o período colonial, perpassando por vários governos e

perdurando até os dias atuais. Por se tratar de uma República democrática, onde está

assegurado na constituição federal de 1988, artigo 5, “a inviolabilidade do direito à vida, à

liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade”, garantindo no parágrafo IX - “é livre a

expressão da atividade intelectual, artística, científica e de comunicação, independentemente

de censura ou licença”; e no artigo 220, “que a manifestação do pensamento, a criação, a

expressão e a informação, sob qualquer forma, processo ou veículo não sofrerão qualquer

restrição”, constando no inciso 2º, que “é vedada toda e qualquer censura de natureza política,

ideológica e artística”. Entretanto, a realidade é totalmente contraditória à legislação,

principalmente quando o Estado abre concessões públicas de veículos de comunicação para

representantes políticos, religiosos, empresários, entre outros, em troca de favores, confluindo

assim, para a formação de um sistema autoritário onde o poder da informação está

concentrado nas mãos de poucas famílias, constituindo assim, o monopólio da comunicação

brasileira.

        O surgimento da Rádio Sociedade do Rio de Janeiro, idealizada por Roquette Pinto e

Henrique Morize em 1923, em plena efervescência política, é o marco inicial para a

configuração do sistema comunicacional excludente que temos hoje. Isso porque, o rádio no

Brasil nasce privado na forma de rádio-clubes com teor erudito, tendo como público a elite

intelectual e social da época, uma vez que o Governo não havia se interessado em criar um

sistema estatal. Ao ganhar proporções com o aumento de adeptos na década de 30, ele atrai a
15



atenção do poder público, logo, o então chefe do governo provisório, Getúlio Vargas, assina o

estatuto da radiodifusão em 1931, definindo sua finalidade educativa, assim como, decreta a

permissão de veiculação de propaganda, o que torna o veículo ainda mais popular passando a

atingir outras classes.


                          A Revolução de 30 estabeleceu também o caráter da radiodifusão como de interesse
                          público, e, portanto, sujeitou tanto o rádio quanto a televisão a serem tratados como
                          serviços públicos, protegidos e regulados pelo Estado. Coerentemente com este
                          caráter, os revolucionários de 30 atribuíram à radiodifusão finalidades educacionais.
                          Eles falharam, contudo, na conceituação dessas finalidades e na fixação do modo
                          como deveriam ser alcançadas e avaliadas. Repetindo a falha, todos os governos que
                          se sucederam, desde então, jamais definiram substantivamente aquelas finalidades.
                          O resultado é que a qualificação legal da radiodifusão como um serviço de interesse
                          público e com finalidades educacionais tornou-se meramente retórica, sem
                          consequências objetivas em torno de implementação. Na prática, o modo comercial
                          de exploração da radiodifusão tem sido esmagadoramente predominante e o número
                          e qualidade de programas de entretenimento têm superado de longe aqueles com
                          caracteristicas educacionais.(JAMBEIRO, 2004, p.183-184)


       Segundo Calabre (2003, p.2), “a capacidade de falar” para diversas pessoas e para

muitas localidades simultaneamente tornava o veículo um aliado estratégico na questão da

formação de uma unidade cultural”. Contudo, os ideólogos do Estado Novo visando o

fortalecimento do Estado e do nacionalismo, usam não só o rádio, mas, todos os veículos

como os jornais, revistas, entre outros, para disseminar os ideais de integração e paternalismo

ao mesmo tempo em que legitimavam a figura de Vargas.

       A expansão das atividades econômicas no final da metade dos anos 30 impulsionou o

crescimento da publicidade nos meios de comunicação de massa. O desenvolvimento da

radiodifusão fez com que os empresários disputassem concessões, muitos dos quais já

detinham o poder de outras mídias. Neste ritmo, em 1938 surge o primeiro conglomerado

brasileiro de veículos de comunicação de massa, criado pelo jornalista Assis Chateaubriand.

A ele pertenciam cinco emissoras de rádio, doze jornais diários e uma revista; 20 anos mais

tarde, ele já tinha 36 rádios, 34 jornais, 18 emissoras de televisão e várias revistas
16



(JAMBEIRO, 2004) Desde então, o processo de concessão e fiscalização é controlado pelo

Governo Federal.

       Somente em 1962 foi aprovada a legislação que regulamenta a radiodifusão. Fase em

que o novo modelo de desenvolvimento econômico proposto na ditadura militar, baseado em

repressões políticas, só teve êxito devido ao controle dos meios de comunicação através da

censura e também pela afinidade do empresário Roberto Marinho com o regime. A instalação

da TV Globo em 1965, surge dos interesses políticos e com o investimento recebido do grupo

estrangeiro Time-Life, o que não era permitido pela lei, mas, logo se transforma no maior

império da comunicação no país. O peso que a Rede Globo exerce na sociedade brasileira,

principalmente no quadro político, é até hoje uma realidade.

       Desde o fim da ditadura militar a sociedade civil vem galgando espaço de participação

nos debates em torno de políticas públicas. São as camadas populares que se viram excluídas

e começam a se organizar e se fortalecer através dos movimentos sociais em prol de melhores

condições de vida. Nas últimas décadas, as ações desses movimentos e organizações

populares tiveram significativo crescimento nos diversos setores, sendo fundamentais para a

conscientização e mobilização da população na luta pelos seus direitos e na promoção do

desenvolvimento social, cultural e econômico das comunidades.




                       Os movimentos sociais são, hoje em dia, um dos principais responsáveis por captar
                       os problemas sociais que ressoam nas esferas privadas e transformá-los em questões
                       de interesse geral na esfera pública política. Além disso, têm o papel de ampliar o
                       próprio espectro do político, ao incorporar novos temas na agenda política. Uma
                       sociedade civil forte cria grupos e pressiona em direção a determinadas opções
                       políticas; uma sociedade civil fraca, por outro lado, será normalmente dominada
                       pelas esferas do Estado ou do mercado. (RAMOS E SANTOS,2007,p.134).



       Nessa perspectiva, os movimentos sociais são importantes no processo de

democratização, já que estes agem como canais de representatividade da sociedade civil,

como os sindicatos e partidos políticos. Conforme Peruzzo (2007), essas organizações
17



descobriram a necessidade de apropriação pública de técnicas (de produção jornalística,

radiofônica, estratégias de relacionamento público etc.) e de tecnologias de comunicação

(instrumentos para transmissão e recepção de conteúdos etc.) para poderem se fortalecer e

realizar os objetivos propostos. Assim sendo, num primeiro momento descobriram a

utilização da comunicação desde as formas grupais e individuais até os meios tecnológicos

como uma necessidade, ou seja, como canais importantes para comunicarem-se entre si e com

seus públicos, sejam eles os usuários reais ou potenciais dos serviços oferecidos, a imprensa,

órgãos públicos, aliados e o conjunto da sociedade.

       Deste modo, diante da concentração dos canais de comunicação que decretam

restrições a democratização, a Comunicação Comunitária surge como meio alternativo para

atender aos interesses e necessidades coletivos. Trata-se de uma comunicação que tem o

propósito de viabilizar a todos o direito de comunicar-se. Caracteriza-se como um espaço

plural e acessível, onde a comunidade tem o poder de informar, reivindicar e denunciar,

exercendo assim o papel de cidadão. Nesta proporção, é fundamental refletir sobre tais

princípios.



1.2- Comunicação Comunitária, mais que uma alternativa.



       Em seus estudos sobre a comunicação comunitária no Brasil, Peruzzo (2007) chama

atenção para a noção de comunidade, uma vez que esta não basta a um meio de comunicação

ser local, falar das coisas do lugar e gozar de aceitação pública para configurar-se como

comunitário. Ela define comunicação comunitária como sendo aquela que é produzida no

âmbito das comunidades e fundamentada nas noções de comunidade, participação ativa,

horizontal e democrática dos cidadãos. Logo, para compreender o real significado do termo é

necessário ater-se para tais conceitos.
18



         Para Sayonara Leal (2007), a comunidade existe na medida em que há o

reconhecimento mútuo de princípios morais, normativos, valores culturais, traços sociais

comuns entre os membros que a compõe. O território geográfico, o pertencimento étnico, a

identidade pelo gosto estético, podem ser modos de agregar indivíduos numa formação social.

A definição proposta por Souza (2000) vem atribuir que a susbstância de comunidade não está

no aspecto físico, mas no conjunto de relações e inter-relações, de poderes e contrapoderes

que se estruturam, tomando como referência a infra-estrutura física e social da área, que por

sua vez, tem suas determinações nas estruturas fundamentais da sociedade.

         A comunidade é, portanto, uma forma particular de expressão da própria sociedade.

Sendo assim, Peruzzo (2003) cita a valorização do local na sociedade contemporânea, mesmo

no auge de globalização e em tempos de comunicações de longas distâncias, as pessoas se

interessam pelo o que está próximo, pelo que atinge diretamente suas vidas e demonstram

valorizar as coisas da comunidade, e querem saber dos acontecimentos que ocorrem ao seu

redor.

         Peruzzo (2004) aponta a participação como uma das dimensões essenciais desse

sistema, a qual se concretiza numa comunicação feita dentro dos movimentos e organizações

e que reflete na existência de outra comunicação, tendo seus conteúdos vindos das bases

excluídas da sociedade e destinadas a essas mesmas bases. Neste sentido, as pessoas podem

atuar como sujeitos ativos, como protagonistas do processo.

         Nesse mesmo viés a pesquisadora faz um contraponto quando relata que a questão da

participação direta não significa que todos tenham que tomar parte de tudo durante todo o

tempo, pois, conforme experiências históricas, a representatividade, se aplicada de forma

democrática, também condiz como modo de participação. Neste panorama, evidencia-se a

importância da representação coletiva proporcionada pelas entidades, quando estas operam

como porta-vozes legítimos dos coletivos organizados da sociedade civil onde estão inseridas.
19



Conforme Xavier (2002, p.22), as representações coletivas dariam sustentação a uma moral

específica, “necessária ao corpo social”, materializando-a, objetivando-a e naturalizando-a,

desempenhando, assim, o papel de amainar ou até mesmo eliminar a contradição entre o

individual e o coletivo, mantendo a ordem e o equilíbrio social.


                       Independente das formas com que pode revestir, a participação significa fazer parte,
                       tomar parte, ser parte de um ato ou processo, de uma atividade pública, de ações
                       coletivas. A referência à parte implica pensar o todo, a sociedade, o Estado, a
                       relação entre as partes entre si e das partes com o todo. Esse todo não é homogêneo;
                       as partes têm interesses, aspirações, valores e recursos de poder diferenciados.
                       Diante disto coloca-se o problema de como atingir interesses gerais, numa sociedade
                       dominada pelo particularismo e fragmentação. (TEIXEIRA, 1997, p.179)



       Souza (2000) ainda traz a abordagem de participação como conteúdo básico na esfera

do desenvolvimento das comunidades, sendo necessário considerar a sua diversidade de

significações, pois esta pode até levar o povo à ilusão que está participando quando, de fato,

está cada vez mais submisso.

       Contudo, diante do agravante histórico de uma sociedade não participativa, as

múltiplas formas de participação, enquanto possibilidades de acesso são fundamentais

mecanismos para um aprofundamento da democracia, desde que a sociedade se sinta incluída

no processo. Logo, engajar-se frente aos interesses comuns é considerada uma prática de

cidadania que remete ao objetivo do desenvolvimento local. Diante disso, é relevante saber

como essas dimensões se contemplam no contexto histórico brasileiro.



1.3 - A relação entre Comunicação Comunitária e Desenvolvimento Local.



       Perante a análise de vários estudiosos, verifica-se que o conceito de desenvolvimento

local está basicamente associado à noção de participação, dessa forma, a comunicação surge

como peça importante na articulação e viabilização de ações cooperativas, de modo, a

estimular participação ativa dos cidadãos no debate em torno de políticas públicas. Em suas
20



pesquisas, Melo (1998) menciona que a ação do homem para enfrentar a natureza,

transformando-a e adaptando-a às suas necessidades de sobrevivência e de bem-estar, está

atrelada a inovações comunicacionais e informacionais. Portanto, para alcançar mudanças

sociais é necessário repensar as estruturas de comunicação inseridas nas comunidades.


                       Reside aí a contribuição fundamental dos sistemas de comunicação, veiculando
                       informações e difundindo modos de agir, pensar e sentir que predisponham os
                       cidadãos a adotarem comportamentos sintonizados com as estratégias do
                       desenvolvimento. Trata-se de uma função educativa, qual seja a de mobilizar
                       recursos humanos motivados a adquirirem novas habilidades sociais e técnicas,
                       superando o fatalismo político, o imediatismo econômico e os preconceitos
                       culturais. (MELO, 1998, p.296).




       É justamente nesse viés educativo que a comunicação na pedagogia de Paulo Freire é

pensada, com o objetivo de buscar o diálogo e proporcionar aos homens o desenvolvimento

de uma compreensão crítica. Ele descreve a situação dos problemas de incomunicação da

sociedade brasileira, como decorrentes do aspecto histórico-político e de ordem sócio-

econômica, apontando dentre eles, o “mutismo”, próprio das sociedades com inexperiência

democrática, em que a comunicação constitui-se acrítica, num clima antidiálogo, em que

configura-se a “cultura do silêncio”, refletido como fenômeno comum aos povos colonizados,

sendo estes, alguém que não tem voz própria, que fala pela fala do opressor; ocasionando a

não-comunicação.

       Outro problema levantado é o da educação bancária, em que a educação se funde em

repassar conhecimentos. Freire relaciona sua pedagogia como uma “Pedagogia do Oprimido”,

inserida na luta do homem pela sua humanização. Melo (1998, p. 281) vem ressaltar que o

educador refere-se à Pedagogia da Comunicação como uma pedagogia libertadora, aberta,

intensa e em permanente reelaboração. O autor faz menção ao conceito de comunicação

(diálogo), apontado por Paulo Freire (1978, p. 90-91): “Não é no silêncio que os homens se

fazem, mas na palavra, no trabalho, na ação-reflexão. Mas, se dizer a palavra, que é trabalho,
21



que é práxis, é transformar o mundo, dizer a palavra não é privilégio de alguns homens, mas

direito de todos os homens”. Tomando como base a Pedagogia Freiriana, Melo vem destacar a

função dos meios de comunicação na perspectiva do desenvolvimento social:


                       A contribuição que os meios de comunicação de massa podem oferecer para
                       intensificar o processo de desenvolvimento das sociedades que permanecem em
                       patamares econômicos atrasados, possuindo padrões tecnológicos e culturais
                       tradicionais, é justamente o de criar expectativas na população, produzindo atitudes
                       detonadoras da busca das informações e da manifestação de opiniões, que instauram
                       um “clima para o desenvolvimento”. (MELO, 1998, p.294).



       Partindo dessa proposta é que a Comunicação Comunitária evolui. Como cita Peruzzo

(2003), ela surge e se desenvolve articulada aos movimentos sociais como um meio popular,

participativo, alternativo e dialógico. No Brasil, a comunicação comunitária ganha força na

década de 1980 mediante as pequenas ações dos movimentos populares no período da

ditadura militar, exatamente, quando a sociedade protestava por justiça social. Ainda nos anos

de 1990 essa comunicação se institui pelo caráter reivindicatório, já nos últimos anos ela

passa a tratar mais propriamente de temas locais, o que ocasiona o fenômeno das rádios

comunitárias, que surgem como mecanismos eficientes de enfrentamento da realidade.

       Peruzzo (1998) destaca que foi no ano de 1995 que o Brasil descobriu o formato das

rádios comunitárias, no formato de rádios livres, comumente chamadas de piratas por não

terem autorização do Governo. Leal (2007) vem definir a radiodifusão comunitária no Brasil

como um sistema complementar às emissoras comerciais e ao sistema oficial estatal, tendo

como objetivos a preservação de valores culturais e sociais, a divulgação, de forma

independente, de informações sobre fatos políticos, sociais e econômicos relevantes e,

sobretudo, a disseminação de informações locais e regionais de interesse de uma coletividade.

       De acordo com a autora, as rádios comunitárias são consideradas tentativas de

constituição de espaços autônomos de difusão da palavra de pessoas anônimas desatreladas

das estruturas políticas hegemônicas. Elas são reconhecidas como meios de contra-poder, de
22



expressão democrática, de pertencimento local, capazes de instaurar uma prática

comunicativa alternativa e participativa. No entanto, é necessário compreender a finalidade

dos meios comunitários, já que devido ao amplo movimento de expansão destes, nos dias de

hoje, vem ocorrendo um desvirtuamento de seus princípios.


                        Enfim, a comunicação comunitária é aquela que faz sentido dentro de realidades
                        específicas e porque é produto de cada uma dessas realidades. Ela surge das
                        necessidades locais e serve aos interesses da “comunidade”, embora seja normal
                        existir uma grande gama de distorções, como, por exemplo, a existência de meios de
                        comunicação que se dizem comunitários, mas que de fato servem a outros interesses
                        políticos eleitorais, religiosos, financeiros e personalísticos. Tais desvios podem
                        prejudicar a noção de comunitário diante das pessoas de uma localidade. É a
                        configuração de cada realidade específica que serve de parâmetro para a
                        compreensão do significado comunitário de cada experiência de comunicação local.
                        (PERUZZO, 2003, p.249).



       Entende-se que os meios comunitários são formas de descentralização do poder de

comunicação no país, o que revela uma re-significação de um povo culturalmente desprovido

do exercício de participação, que passa a interagir com esses mecanismos e assim se

reapropriar do uso da fala. Nesse contexto, Peruzzo (2003) avalia esse processo comunicativo

como propiciador da cidadania, o que consiste na participação ativa da população local, a

sustentabilidade, o respeito de gênero e etnia e melhorias de vida da população envolvida, o

que implica em um desenvolvimento social com igualdade. Conforme afirma a autora,

“nessas condições o desenvolvimento não é apenas uma questão econômica ou de aumento de

renda, mas um desenvolvimento integral e sustentado em condições que permitam ser

duradouro e igualitário”. (p. 253).

       Perruzo (2003) ressalta que no Brasil a participação nos meios de comunicação tem

aumentado a partir de 1990, não somente através da mídia comunitária, mas também a grande

mídia passa a oferecer espaço à população, ou seja, os conteúdos dos grandes veículos passam

a ter uma maior abertura para o regional / local. Estas mudanças resultam da demanda pela

participação social proporcionada pelos meios de comunicação locais na luta pela
23



democratização da comunicação, embora não representem ruptura na estrutura da grande

mídia. Assim, Souza (2000) contribui ao afirmar que o desenvolvimento de comunidade é

hoje um dos instrumentos principais de participação e desenvolvimento das condições de

cidadania da população, reconhecidos como recursos básicos ao desenvolvimento global.

       Peruzzo (2003) conclui que apesar da Comunicação Comunitária se revelar com uma

realização coletiva que gera conteúdos voltados para o desenvolvimento comunitário local,

seu desempenho sofre distorções e contradições dentro dela mesma no que se refere a sua

importância, a sua dimensão na viabilização do desenvolvimento sustentável. No entanto,

Melo (1998) defende a idéia de que para que a comunicação venha a contribuir no processo

de desenvolvimento sócio-econômico, é preciso antes conhecer mais profundamente as

potências comunicacionais disponíveis na região e as implicações que envolvem os campos

da economia, da política e da cultural, para assim melhor exercer seu papel decisivo no

progresso local e global. Sendo assim, torna-se fundamental atentar-se para a noção de

desenvolvimento em questão.



1.4 - Uma nova proposta de desenvolvimento.



       Para entender a dimensão do termo desenvolvimento local é preciso compreender o

significado de desenvolvimento, uma vez que este esteve por muito tempo associado somente

ao processo de crescimento econômico proposto pela industrialização. Contudo, falar de

desenvolvimento implica em alterações nos diversos segmentos da sociedade. Petitinga

(2008) vem dizer que além do fator econômico, existe também a melhoria da qualidade de

vida das pessoas e a conservação do meio ambiente como aspectos fundamentais para esta

concepção. Para ela, o desenvolvimento deve ser visto levando-se em conta os aspectos

locais, que têm significado em um território específico. O global passa a ter sua importância
24



associada ao local e vice e versa, já que um está em constante mudança por conta das

interferências do outro.

       Da mesma forma, Muls (2008) afirma que outras formas de coordenação das relações

sociais e das atividades produtivas têm emergido como promotoras do desenvolvimento local.

A mobilização dos atores locais, a formação de redes entre organismos e instituições locais e

uma maior cooperação entre empresas situadas em um mesmo território, são instrumentos que

têm possibilitado aos territórios novas formas de inserção produtiva e uma atenuação das

desigualdades sociais. Lemos (2005) vem considerar que a noção de território não deve ser

apenas entendida pelos seus aspectos físicos e jurídicos, ou seja, para delimitar as fronteiras

de um território é preciso levar em consideração as circunstâncias sociais, simbólicas,

culturais e subjetivas.

       Ao considerar o desenvolvimento como fruto das interações sociais, a participação

constitui-se como elemento básico do desenvolvimento local. Conforme Souza (2000, p.83)

“o desenvolvimento social do homem requer participação nas definições e decisões da vida

social. É neste sentido que o resgate deste processo precisa ser trabalhado”. Segundo a autora,

o desenvolvimento de comunidade é um sistema pedagógico de ação junto às comunidades,

sendo assim, diante das dificuldades na participação, ela traz uma reflexão sobre a

conscientização como um processo contínuo e dinâmico. Como diz Paulo Freire (1980, p. 26),

“na aproximação espontânea que o homem faz do mundo, a posição normal, fundamental, não

é a posição crítica, mas a posição ingênua. A conscientização implica que ultrapassemos a

esfera espontânea de apreensão da realidade para chegarmos a uma esfera crítica”. Por sua

vez, Lima (2007) enfatiza a participação como uma das necessidades fundamentais do ser

humano e também para o desenvolvimento local. Sua essência encontra-se na tomada de

consciência, na formação de um senso crítico, de uma sensibilidade e uma identidade

comunitária.
25



       Outro aspecto importante na representação do desenvolvimento local como aponta

Souza (2000), é que este permeia a condição de cooperação social, sendo esta realizada por

segmentos da população que têm interesses em comum, dadas às mesmas condições materiais

da existência humana e social. É através da organização da comunidade que as práticas de

cooperação são executadas, ocasionando a formação de sindicatos, partidos, associação de

moradores, organizações comunitárias entre outros.

       Conclui-se que a comunicação comunitária é capaz de atender as expectativas de

desenvolvimento local e vice e versa, sendo que estes comungam dos mesmos princípios, o

que torna a relação possível. Contudo, para melhor compreender as interfaces entre a

comunicação comunitária e o desenvolvimento local vale verificar como acontece na prática.

Nos capítulos seguintes serão mostrados como se dá essa experiência e os resultados obtidos

do projeto de comunicação comunitária no Território do Sisal.
26



2 – Sisal, um Território de Possibilidades.


        É com o objetivo de promover o desenvolvimento local sustentável que a

Comunicação Comunitária ganha força no Território do Sisal. Localizada no semi-árido

brasileiro, mas propriamente no Nordeste da Bahia, a Região Sisaleira é considerada uma das

áreas com os piores índices de desenvolvimento social e econômico do país. Sua abrangência

é de uma área de 21.256,50 Km² sendo composto por 20 municípios: Araci, Barrocas,

Biritinga, Candeal, Cansanção, Conceição do Coité, Ichu, Itiúba, Lamarão, Monte Santo,

Nordestina, Queimadas, Quinjingue, Retirolândia, Santa Luz, Serrinha, São Domingos,

Teofilândia, Tucano e Valente. A população estimada é de cerca de 552.713 habitantes, dos

quais 348.222 (63%) ocupam a área rural (segundo o censo demográfico de 2007).




Figura 1 – Mapa do Território do Sisal.
Fonte: http://sit.mda.gov.br
27



          A região caracteriza-se pelo clima seco, com longos períodos de estiagem e vegetação

de caatinga, compondo a demarcação do polígono das secas feita pelo governo federal em

1936 (CODES, 2008). As limitações ambientais, assim como, as de caráter cultural, social,

política e econômica têm desafiado a plena capacidade que o sertanejo possui de sobreviver.

A exploração de pedras, o cultivo do sisal, a pecuária e a agricultura são ali as bases de

sustentação econômica mais expressiva para os trabalhadores rurais.

          A denominação desse território se deve à tradicional cultura da fibra de sisal, extraído

da folha do agave, planta rústica originária do México, que consegue se desenvolver em

regiões áridas. As primeiras mudas de sisal chegaram em 1910, vindas da Paraíba para o

município de Santa Luz. Com boa adaptação ao solo, a planta logo passou a ser cultivada por

toda a região, tendo maior produção as cidades de Santa Luz, São Domingos, Valente e

Conceição do Coité (MOC, 2005). Sua fibra tem vasta utilização no mercado nacional e

internacional, sendo empregada nas indústrias de cordas, papel, confecção, tapetes, entre

outros.

          Nessa região, o vestuário, a música, a culinária, o artesanato em couro e a arte popular

em geral, estão marcados pela influência do vaqueiro, expressão de força e resistência, que se

espalhou pelo país, ampliando o mercado para produtos e serviços que caracterizam a cultura

do nordestino. Antigas tradições ainda tentam resistir à modernização, como o Reisado, o Boi

roubado, os Festejos religiosos e a Literatura de cordel, que ainda possuem fiéis adeptos.

Porém, as festas de largo, assim como os diversos gêneros musicais, entre outros resultados

da modernização, estabelecem o atual contexto de identidade cultural.

          Um dos primeiro efeitos da modernização ocorria na segunda metade da década de 40

com os primeiros motores de sisal, os quais pertenciam à “gente rica”, fazendeiros e

comerciantes. Com a “chegada” à região da legislação trabalhista, os proprietários de motores

transferiram tal responsabilidade para os agricultores familiares ou para os próprios
28



trabalhadores, criando-se uma situação inusitada: o dono do motor era, em muitos casos, um

trabalhador, mas tinha os seus pares como empregados diante da lei. Tal modificação no

desfibramento do sisal, que antes feito de forma artesanal, mas, logo depois com a máquina,

acabou acarretando uma série de acidentes de trabalho; em sua maioria resultava em

mutilações dos trabalhadores (CODES, 2008).




Figura 2 – Trabalhadores desfibrando o Sisal.
Fonte: http://www.redetec.org.br


        Um agravante desse lugar são os indicadores de pobreza e de desigualdade. Em média,

mais da metade da população está abaixo da linha de pobreza. Os problemas mais recorrentes

são: altos números de analfabetismo e trabalho infantil, concentração da propriedade rural,

clientelismo político, inexistência de políticas públicas e falta de investimentos para os

produtores rurais. Deve-se levar em consideração que na região onde o setor agropecuário tem

importante papel na formação do PIB, a terra passa a ter papel de destaque na formulação de

políticas para incrementar a economia.

        No contexto da globalização e da privatização, o estado brasileiro quase abdicou

completamente de ter uma política de desenvolvimento regional, deixando a economia mais

livre para ajustar-se de acordo com as forças de mercado, no caso, inteiramente desfavoráveis

ao homem e à economia do semi-árido. O mesmo pode ser dito quanto aos serviços que, de

modo geral, decorrem da elevação da renda e da diversificação dos padrões de consumo. Em
29



razão do baixo nível de renda e dos baixos índices de desenvolvimento humano, a migração é

a grande saída, caminho que vem sendo trilhado não apenas pela população profissionalmente

qualificada, mas também por aqueles isentos de profissionalização em busca da obtenção por

melhores condições de vida. É o que revelam as letras das canções interpretadas por Luiz

Gonzaga:


                                              Sem chuva na terra
                                              Descamba Janeiro,
                                               Depois fevereiro
                                               E o mesmo verão
                                             Meu Deus, meu Deus
                                              Entonce o nortista
                                               Pensando consigo
                                              Diz: "isso é castigo
                                             não chove mais não"
                                                  Ai, ai, ai, ai
                                                       (...)
                                                Agora pensando
                                              Ele segue outra tria
                                              Chamando a famia
                                                Começa a dizer
                                             Meu Deus, meu Deus
                                             Eu vendo meu burro
                                             Meu jegue e o cavalo
                                            Nóis vamo a São Paulo
                                                Viver ou morrer
                                                  Ai, ai, ai, ai
                                            Nóis vamo a São Paulo
                                              Que a coisa tá feia
                                                Por terras alheia
                                               Nós vamos vagar
                                             Meu Deus, meu Deus
                                              Se o nosso destino
                                            Não for tão mesquinho
                                            Ai pro mesmo cantinho
                                              Nós torna a voltar1



          As músicas do Rei do Baião traduzem um traço da identidade do sertanejo, um povo

que é “forçado” a deixar sua terra pelas adversidades e que ao saber de notícias de chuva, logo

voltam confiantes. Um povo religioso que atribui a Deus as dificuldades de sobrevivência,

entendendo as desigualdades sociais como um “castigo de Deus”.




1
    A Triste Partida, toada, 1964, Patativa do Assaré, RCA Victor. Disponível em: www.luizluagonzaga.mus.br
30



           Carente de investimentos por parte do Estado, a população sertaneja é alvo de políticos

que se utilizam das mazelas sociais para promoverem seus discursos e reforçar a política da

seca, ao invés de solucioná-las. O cenário político é marcado pelo coronelismo2, na maioria

dos municípios já se tornou comum apenas uma família estar no poder por várias décadas,

configurando uma cultura de dominação. Enraizadas historicamente no Nordeste e

evidentemente no semi-árido baiano, as práticas de compra de votos e a relação de troca de

favores entre políticos resistem até os dias atuais, o que torna ainda mais emergente a

conscientização da população.

           É na perspectiva de mudança da realidade social que a população rural e urbana passa

a se organizar através de ações de mobilização impulsionadas pela Igreja Católica através das

Comunidades Eclesiais de Base, sindicatos de trabalhadores rurais, movimentos sociais,

entidades locais e organizações não governamentais e públicas.


                              A história social da região registra que esses movimentos nasceram do
                              enfrentamento dos setores populares com as situações de opressões às quais sempre
                              estiveram submetidos. Dentre as experiências de organização popular aí vivenciadas,
                              podem ser lembradas a organização das comunidades de pequenos agricultores, as
                              lutas pela criação dos armazéns populares, contra o clientelismo nas frentes de
                              trabalho durante os períodos de seca, dos mutilados do sisal pela previdência social e
                              pela segurança no trabalho, a luta pela erradicação do trabalho infantil e a luta pela
                              terra, entre outras. (NASCIMENTO, 2005, p.18)



           Espremidos em propriedades de um ou dois hectares ou sem terra nenhuma, os nativos

da Região Sisaleira tem dificuldades de garantir o sustento de suas famílias. A quantidade de

terra por eles possuída é na maioria das vezes insuficiente para a sobrevivência no semi-árido,

não havendo perspectiva sustentável para as famílias da zona rural. A assessoria dos órgãos

cooperativos é entendida como ferramenta utilizada para proporcionar à comunidade uma

percepção das possibilidades de investimento na realização de trabalhos locais visando obter

uma vida digna no campo.


2
    Sistema de poder político autoritário e hegemônico que estruturou-se na República Velha.
31



      Espelhando-se na filosofia libertadora implementada pela Igreja Católica, surge o

Movimento de Organização Comunitária (MOC) em 1967, com o objetivo de incentivar a

transformação da realidade social. Os primeiros sinais da atuação da sociedade se tornam

mais visíveis com a organização de agricultores, diretamente ligados à cadeia econômica do

território. A mobilização pelo fim dos impostos na comercialização de seus produtos no fim

da década de 70, acarretou a criação da APAEB – Associação de Agricultores do Estado da

Bahia, entidade regional que atua na organização da comercialização, assistência técnica e

crédito. A criação da APAEB foi decisiva para consolidar o movimento de organização dos

trabalhadores rurais, iniciado na época com o apoio da Pastoral Rural pertencente à Igreja

Católica. No ano de 1993, a APAEB é municipalizada, e os agricultores de cada município

que se encarregavam de dar andamento ao projeto.

     Na década de 80, alguns municípios passaram a compor movimentos sindicais buscando

sustentação por meio das APAEB’s, enquanto em outros foram conquistados Pólos Sindicais

Regionais. A FATRES - Fundação de Apoio aos Trabalhadores Rurais da Região do Sisal,

surge com grande significado nesse período, e posteriormente vão surgindo as cooperativas de

créditos na viabilização da agricultura familiar, que ao passar dos anos se espalha pelos

municípios.

       Ao longo do processo de conscientização da população houve muitos desafios, uma

vez que os sertanejos já estavam marcados pela submissão. Contudo, a força e a esperança

desse povo foram imprescindíveis para lutar por melhores condições de vida. Nos anos 80, a

luta dos mutilados do sisal suscitada pelos STR’s (Sindicatos de Trabalhadores Rurais) com o

apoio da OIT (Organização Internacional do Trabalho) e do UNICEF (Fundo das Nações

Unidas para a infância) teve grande repercussão, o que garantiu ao trabalhador a conquista do

direito ao amparo previdenciário, além de reforçar a idéia dos movimentos populares na

reivindicação das várias demandas.
32



        Uma das primeiras mudanças significativas se deu com a implantação do PETI –

Programa de Erradicação do Trabalho Infantil, assistido pelo Governo Federal através do

Ministério de Desenvolvimento Social e Combate à Fome3. Com o propósito de combater a

exploração da mão-de-obra infantil, o programa prevê o serviço socioeducativo para crianças

e adolescentes de baixa renda, dando-os incentivo para que estes se afastem do trabalho

precoce e possam ter um futuro melhor.

       Embora a organização popular já tivesse surtido efeitos, o povo ainda carregava em si

o medo e a subserviência, embutidos pelo discurso autoritário das oligarquias dominantes que

se disseminou através dos meios de comunicação como o jornal, o rádio e a televisão. O

veículo de maior aceitação na região é o rádio, que além do seu baixo custo e longo alcance,

contempla a população semi-analfabeta, podendo então atingir as classes subalternas. Na

maioria dos municípios as concessões destes veículos públicos pertencem aos mesmos grupos

políticos, que os utiliza para a manipulação das massas e abuso de poder, de modo a formar

receptores passivos, legitimando a “cultura do silêncio”. Embora tenham ocorrido mudanças

tecnológicas ao longo dos anos, os resultados dessas práticas comunicacionais hegemônicas

persistem até hoje, o que pode-se nomear de “coronelismo eletrônico”.4

       Contudo, um dos maiores problemas que a sociedade civil enfrenta até os dias atuais é

a idéia de colocar o povo a protagonizar suas reivindicações, ou seja, poder re-significar o

simbolismo que instaurou-se por anos e anos. Conforme Nascimento (2005), diante do estado

de necessidade em relação à comunicação nas garantias constitucionais à liberdade de

expressão, foram surgindo em meados dos anos 90 as rádios comunitárias. Foi visando

promover o diálogo, a aproximação com as comunidades rurais, o debate sobre políticas



3
 http://www.mds.gov.br
4
  SANTOS, Suzy; CAPPARELLI, Sérgio. Coronelismo, radiodifusão e voto: a nova face de um velho conceito
In: BRITTOS, Valério Cruz; BOLAÑO, César Ricardo Siqueira (Org.). Rede Globo: 40 anos de poder e
hegemonia. 1 ed. São Paulo: Paulus, 2005, v.1, p. 77101.
33



públicas e o incentivo a participação, que esse meio alternativo foi sendo implantado em

vários municípios.

       É dentro dessa perspectiva de sensibilização e planejamento de ações voltadas para

auxiliar o desenvolvimento sustentável do Território do Sisal que surge em dezembro de 2002

o CODES Sisal (Conselho Regional de Desenvolvimento Rural Sustentável da Região

Sisaleira do Estado da Bahia). Em 2003, a entidade concebe o PTDRS (Plano Territorial de

Desenvolvimento Rural Sustentável da Região Sisaleira) que fora elaborado por

representantes dos diversos setores da sociedade civil, o qual prevê a articulação das entidades

como exercício contínuo na viabilização das propostas dos eixos prioritário, que são:

agricultura familiar, infra-estrutura, comunicação, educação, saúde, cultura e meio ambiente.

       Conforme cita Moreira (2006), o apoio do Governo Federal através do MDA

(Ministério do Desenvolvimento Agrário) e da SDT (Secretaria de Desenvolvimento

Territorial), o CODES Sisal passou a coordenar a aplicação dos recursos do PRONAF

(Programa Nacional de Agricultura Familiar), no que se refere às políticas de infra-estrutura.

       Somente em 2004, a espacialidade Território do Sisal passa a ser reconhecido

oficialmente no mapa da Bahia. A divisão dos territórios é um acontecimento recente, fruto da

Política Territorial criada no primeiro mandato do Governo Lula, o Território da Cidadania é

uma estratégia de desenvolvimento regional sustentável e garantia de direitos sociais voltados

às regiões do país que mais precisam, com objetivo de levar o desenvolvimento econômico e

universalizar os programas básicos de cidadania. Trabalha com base na integração das ações

do Governo Federal e dos governos estaduais e municipais, em um plano desenvolvido em

cada território, com a participação da sociedade. Em cada território, um Conselho Territorial

composto pelas três esferas governamentais e pela sociedade determinará um plano de

desenvolvimento e uma agenda pactuada de ações. (MDA, 2008). No caso do Território do

Sisal, o CODES Sisal é quem coordena estas ações.
34



       Para subdividir os territórios foram definidos conjuntos de municípios unidos pelas

mesmas características econômicas e ambientais que tivessem identidade e coesão social,

cultural e geográfica. Maiores que o município e menores que o estado, os territórios

conseguem demonstrar, de uma forma mais nítida, a realidade dos grupos sociais, das

atividades econômicas e das instituições de cada localidade, o que facilita o planejamento de

ações governamentais para o desenvolvimento dessas regiões. (MDA, 2008). Contudo, o traço

que maior se sobressai para a definição do Território Sisaleiro consiste na reapropriação de

um povo de fibra que busca meios para sair da condição de excluídos e se tornarem

protagonistas das ações.


                       A construção do desenho cartográfico do Sisal na Bahia demonstra que as limitações
                       regionais são mais políticas que definições geográficas estáticas. Reflete o processo
                       de disputas entre variados atores internos e externos a este território, não entendido
                       como mera questão geográfica ou divisão militar, mas como discurso construído,
                       produto de uma rede de relações entre agentes que se reproduzem e agem com
                       dimensões espaciais diferentes. A divisão cartográfica desse mapa se redesenhou
                       segundo as acomodações de interesse de seu novo ator político e agente
                       comunicativo, que baseado em suas lutas e reivindicações buscou a reconstrução da
                       experiência do que é e do que pode vir a ser o território do sisal. [...] Sentir-se parte
                       do Território do Sisal se enuncia muito mais amplo que um espaço físico localizado
                       no semi-árido nordeste baiano, geograficamente contínuo e definido pela dimensão
                       de seus 20 municípios. Ele apresenta características multidimensionais, tais como o
                       ambiente, a economia, a sociedade, a cultura, a política e as instituições, e uma
                       população, com grupos sociais relativamente distintos, que se relacionam interna e
                       externamente por meio de processos específicos, onde se pode distinguir um ou mais
                       elementos que indicam identidade e coesão social, cultural e territorial. Entretanto,
                       no seu processo de constituição e regulamentação político-cartográfica, prevaleceu a
                       dimensão identitária de resistência dos grupos contra-hegemônicos, ante um longo e
                       complexo processo de disputas. (MOREIRA, 2006, p.124-125)




       Os movimentos sociais têm se revelado com grande influência na região no sentido de

buscar reverter o quadro de exclusão e dominação política. As instituições com maior atuação

na região são as associações, sindicatos, cooperativas, ONG’s e órgãos governamentais. O

constante trabalho implementado por essas entidades proporciona o surgimento de uma

grande parcela de pequenos agricultores, motivados pela perspectiva de tornar produtivo seu

habitat através da participação e vigência cooperativa, reconhecendo o trabalho associativo
35



como alternativa de sustentabilidade, contribuição favorável à prevalência em suas

localidades de origem, tornando desnecessária a recorrência à emigração.

          O fortalecimento da região através da organização e mobilização da sociedade civil

tem o apoio de entidades que vêm buscando incentivar os membros das comunidades a

exercer o papel de cidadãos conscientes, através de seus direitos e deveres. Logo, apresentar

os princípios de cada uma dessas organizações que compõe o cenário de luta do Território do

Sisal é de grande relevância.



2.1 – “Por um Sertão justo” 5: A causa das organizações que compõem o Território do

Sisal.



          Atualmente, o Território Sisaleiro é considerado famoso pela atuação do terceiro setor.

Na maioria dos seus municípios, a luta por políticas públicas e por justiça social nos diversos

setores da sociedade tem ganhado expressividade. Sendo assim, faz-se necessário conhecer a

contribuição das entidades de maior destaque nessa empreitada.

          A FATRES é uma organização da sociedade civil, sem fins econômicos, de natureza

beneficente, considerada de utilidade pública municipal e estadual. Desde sua fundação em

1996, direcionou sua atuação aos trabalhadores rurais, tendo como foco estratégico de ação

para o alcance de seus objetivos institucionais estratégicos, os dirigentes e lideranças sindicais

rurais, no sentido de fortalecer diretamente as organizações sindicais (STRs), de mobilizá-las

e articulá-las para fazerem frente às questões sociais relacionadas à realidade rural da região.


                           A Fundação tem priorizado conteúdos formativos como políticas públicas para
                           fortalecimento da agricultura familiar, cooperativismo e associativismo, formação
                           sindical, formação de conselheiros, etc, enquanto forma estratégica de organização
                           dos produtores para acesso ao crédito e ao mercado, planejamento estratégico e
                           gestão institucional, alternativas de Assessoria Técnica Social, Cultural e Ambiental
                           e captação, armazenamento e gestão de recursos hídricos, adequadas e viáveis à


5
    Slogan do MOC – Movimento de Organização Comunitária.
36


                        convivência no e com o semi-árido, bem como o incentivo a experiência geradoras
                        de trabalho e renda. (CODES, 2008, p. 66)



       Neste cenário, temos também a APAEB Valente. A instituição foi fundada em 1980

diante das reivindicações dos produtores rurais e da iniciativa do MOC. Desde então, o

objetivo da APAEB é melhorar a qualidade de vida das famílias de agricultores com trabalhos

voltados a garantir o sustento econômico, a inclusão social, visando o desenvolvimento

ecologicamente sustentável, a promoção social e a defesa dos direitos dos trabalhadores.

Dentre suas áreas de competência estão: a produção agrícola, a gestão econômica, a

capacitação de pessoas, a industrialização de produtos agrícolas, a influência no processo de

formulação de políticas públicas e a realização de pesquisas e estudos.

       A associação recebe o apoio financeiro de vários parceiros a nível nacional e

internacional, o que lhe permite gerir projetos que ajudem a população a conviver com a seca.

É conceituada na região por gerar renda através dos empregos diretos e indiretos com suas

ações. São cursos profissionalizantes por meio da Escola Família Agrícola, linha de crédito

para o pequeno produtor através do SICOOB COOPERE, Cooperativa de Crédito do Semi-

árido da Bahia, assim como, lazer aos seus associados com o clube social, incentivo aos

produtores com a implantação das batedeiras comunitárias e aos artesãos com a fábrica de

tapetes de sisal, entre outras atividades. Além disso, a instituição ainda dispõe de três veículos

de comunicação que servem para aproximá-la à população e seus associados, são eles: a TV

Valente, a Rádio Comunitária Valente FM e o Jornal A Folha do Sisal. A APAEB também

conta com o espaço Casa da Cultura que promove a valorização da cultura popular regional.

Logo, com a organização da sociedade, as limitações do lugar se tornam um aspecto favorável

para repensar a participação e a cidadania, como fica claro no slogan da associação em que

diz: “O Sertão tem tudo que se precisa, se faltar a gente inventa”.
37



       Uma outra instituição que desempenha um trabalho eficaz na região é o MOC,

entidade filantrópica que desde sua criação dirige sua atuação com e para as populações

menos favorecidas, discriminadas, suscitando e fortalecendo organizações comunitárias rurais

e urbanas, que tivessem a missão de promover o desenvolvimento local e territorial

sustentável.

       Sediada em Feira de Santana, a instituição desenvolve seus trabalhos em alguns

municípios da Bahia, inclusive na Região Sisaleira, mas sua metodologia de apoio à

mobilização da sociedade civil na luta pelo exercício dos seus direitos se estende até mesmo

para outros estados, como Sergipe. O MOC tem como parceiros: o Governo Federal, Regional

e Municipal; a United Nations Children's Fund – UNICEF –; Every Child (Inglaterra);

Cordaid (Holanda); Cooperativas de Crédito (Sistema de Crédito Cooperativo – SICOOBs – e

Associação das Cooperativas de Apoio à Economia Familiar – ASCOOB); Associação dos

Pequenos Agricultores – APAEBs –; Universidade Estadual de Feira de Santana – UEFS –;

Secretaria do Trabalho e Ação Social – SETRAS; etc. Seus principais projetos se baseiam em

cinco programas, são eles:


                       1)Programa de Fortalecimento da Agricultura Familiar no Semi-árido (viabilizar a
                       agricultura familiar através de busca de crédito para produção; preparação para a
                       convivência com a seca; formação cidadã para interferência em políticas públicas; e
                       assistência técnica) – possui três sub-programas: Agroindústria e Comercialização,
                       Assistência Técnica e Capacitação, Recursos Hídricos e Crédito –; 2) Programa de
                       Gênero (implementar vivência de eqüidade de gênero na escola, na construção de
                       políticas públicas e na agricultura familiar; e assessorar o Movimento de Mulheres
                       Trabalhadoras Rurais para o seu fortalecimento na intervenção em políticas
                       públicas); 3) Programa de Educação Rural – que tem como sub-programas a
                       Formação de Monitores da Jornada Ampliada (Programa de Erradicação do
                       Trabalho Infantil – PETI), a Formação de Professores Rurais (CAT – Conhecer,
                       Analisar e Transformar), e o Baú de Leitura –; 4) Programa de Políticas Públicas
                       (formação de representantes das organizações e dos movimentos sociais para
                       fiscalizar e propor políticas públicas; fortalecimento da sociedade civil no meio
                       político; monitoramento e colaboração em programas públicos; e formação de
                       conselheiros da sociedade civil, para diagnosticar as necessidades políticas na área
                       de atuação dos conselhos) – divide-se em três sub-programas: Conselhos Municipais
                       de Gestão, Defesa dos Direitos da Criança e Adolescente (PETI) e Organização e
                       Fortalecimento da Sociedade Civil –; e 5) Programa de Comunicação – qualificar as
                       ações desenvolvidas nas áreas de assessoria e articulação das rádios comunitárias;
                       favorecer uma comunicação interna; criação e atualização de produtos institucionais
                       (ex: o site); e coordenar o jornal Gira Mundo em parceria com o projeto especial do
                       MOC, chamado Comunicação Juvenil. (PORTINHO, 2004, p.2-3)
38




       A organização aposta em uma educação inovadora, baseada nos princípios de Paulo

Freire, para gerar oportunidades na construção de conhecimentos e assim motivar a população

desfavorecida a buscar meios de organização. Em face da realidade regional e com esses

princípios de transformação, o público prioritário do MOC compreende trabalhadores rurais,

empreendedores familiares, professores rurais, movimento de mulheres, organizações

populares, crianças, adolescentes, jovens, comunicadores sociais e órgãos partidários de

gestão. “O MOC vem tentando dar sua contribuição ao processo de construção e

desenvolvimento sustentável da região sisaleira, sem perder de vista a noção holística,

considerando, inclusive, o local e o global como parte de um processo”. (RODRIGUEZ,

2005, p.216).

       Os Sindicato de Trabalhadores Rurais que prestam um fundamental apoio na luta por

melhores condições de vida do homem e da mulher do campo e têm sido de fundamental

importância para as conquistas no Território do Sisal. Espalhados pelos municípios, eles são

articulados em prol da defesa dos direitos trabalhistas, no combate ao trabalho infantil e

escravo, da Previdência Rural, da Educação e Saúde para o campo, da Reforma Agrária e do

Fortalecimento da Agricultura familiar. Segundo o PTDRS do CODES (2006) os STR’s têm

como objetivo maior a representação dos Trabalhadores Rurais. Tem como público pequenos

agricultores e agricultores familiares, meeiros, posseiros, arrendatários, comodatários.

       A região ainda conta com os serviços da ASCOOB, Associação das Cooperativas de

Crédito da Agricultura Familiar, criada oficialmente em 1999 por cinco Cooperativas de

Crédito Rural com atuação nas micro-regiões semi-árida e litorânea da Bahia, tendo como

missão: fortalecer a economia familiar solidária, através do cooperativismo de crédito,

fomentando os processos de desenvolvimento local integrado, sustentável e solidário do

estado da Bahia. Atualmente, conta com 10 cooperativas filiadas com pontos de atendimento

em 34 municípios do estado, abrangendo oito territórios e uma base de mais de 41.000
39



cooperados. Dispõe de parcerias com os Bancos do Brasil e do Nordeste e atua a nível

nacional juntamente com a ANCOSOL (Associação do Cooperativismo de Economia

Familiar e Solidária), e a UNICAFES (União Nacional de Cooperativas da Agricultura

Familiar e Economia Solidária). A filiada de maior destaque na região semi-árida da Bahia é a

Cooperativa Valentense de Crédito Rural - SICOOB COPERE, que foi criada em 1993.

       A cooperativa surgiu da iniciativa da APAEB Valente que tinha um programa

chamado de “Poupança- APAEB”. Tratava-se de um fundo rotativo feito pelos seus

associados, que logo passou a realizar pequenos financiamentos e mais tarde começou a

disponibilizar capital de giro para a própria indústria de beneficiamento de sisal mantida pela

associação. Com a proporção do crescimento de empréstimos e número de associados se deu

início a SICOOB COPERE. Um dos grandes diferenciais é que a finalidade maior da

cooperativa não é o lucro e sim o desenvolvimento regional.

       Já a ARCO SERTÃO, Agência Regional de Comercialização do Sertão da Bahia é

uma associação formada por 30 empreendimentos econômicos solidários dos Territórios

Bacia do Jacuípe, Sisal e Portal do Sertão, que visa a inserção dos produtos das associações e

cooperativas de agricultores familiares no mercado. Uma das principais metas é a qualidade

social e ambiental, além do retorno econômico e o fortalecimento de suas organizações. A

organização promove a intercooperação dos empreendimentos filiados. Desta forma, ela

busca a inclusão social e econômica dos empreendimentos através da formação política dos

trabalhadores rurais, visando comercializar os produtos da Agricultura Familiar e Economia

Solidária.

       Os empreendimentos filiados a ARCO Sertão estão distribuídos por 13 municípios

localizados no semi-árido baiano. Em total, são beneficiadas mais de 2.500 agricultores

familiares, que através da ARCO tem acesso ampliado ao mercado, gerando renda e cidadania

na região. Seus parceiros são: FETRAF (Federação dos Trabalhadores na Agricultura
40



Familiar), SEAGRI (Secretaria Estadual de Agricultura, Irrigação e Reforma Agrária),

UNICAFES (União das Cooperativas da Agricultura Familiar e Economia Solidária), MDA

(Ministério do Desenvolvimento Agrário) / SAF (Secretaria da Agricultura Familiar), PNUD

Brasil - Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento.

        Uma outra organização forte é o MMTR, Movimento de Mulheres Trabalhadoras

Rurais, que surgiu na Região Sisaleira em 1984 com estratégias de construção, mobilização e

defesa dos direitos civis, políticos, sociais e econômicos das mulheres. Em 2006, foi criado o

conselho fiscal do movimento com o objetivo de promover a discussão em torno da

representação política das mulheres rurais e desenvolver ações de qualificação profissional de

mulheres do campo para a geração de oportunidade de trabalho e renda. Atualmente, o

MMTR está presente em sete municípios da Região Sisaleira da Bahia, desenvolvendo ações

que atendem a 150 mulheres diretamente. Com a organização do grupo, elas conseguiram

conquistar importantes espaços de discussão na região, como o Conselho Regional de

Desenvolvimento Sustentável da Região Sisaleira do Estado da Bahia (MOC, 2006).

        O Território ainda dispõe do apoio do CODES Sisal. Idealizado em 2002, o conselho

foi criado com o intuito de aproximar o poder público da comunidade. Formado pela

sociedade civil juntamente com representantes governamentais e também de várias entidades

que estão inseridas no território, o CODES visa atender as demandas dos diversos setores da

região criando mecanismos que possibilitem implementar uma política de desenvolvimento

para o território.


                       O CODES é uma resposta social, tanto quanto à capacidade das entidades locais se
                       organizarem, quanto de tornar suas práticas de desenvolvimento social intrínsecas ao
                       poder público, através da discussão e aprovação de políticas públicas multi-setoriais
                       e únicas para o território, a fim de aumentar o impacto social e a eficácia dos
                       recursos alocados na criação e consecução destas políticas. (NATALÍCIO E
                       MENDES, 2007, p.8).




        Pensando nas prioridades da região, foi elaborado em 2003 o PTDRS que tem como
41



missão: Contribuir para o desenvolvimento integral, participativo e ecologicamente sustentável

do Território Sisal, priorizando o fortalecimento da cidadania, a erradicação da exclusão social

e a melhoria da qualidade de vida, através da articulação dos sujeitos e das políticas públicas,

apoiando e incentivando ações e projetos referenciais.

        Nesse contexto, a importante atuação das entidades que compõem o Território foi

imprescindível na construção do Plano, assim como, frente a tantas outras lutas a caminho do

desenvolvimento. O trabalho realizado por essas organizações gera a participação coletiva, a

sustentabilidade, a conscientização e, sobretudo, o capital social6.

        Um outro elemento importante na construção de uma sociedade mais forte e atuante é o

trabalho através da comunicação. Diante da história de dominação político-cultural apoiada

durante séculos na região, emergem os mecanismos de Comunicação Comunitária como

possibilidade de rompimento com as práticas discursivas que impõe o “silêncio” e a

hegemonia de opiniões, como é feito comumente na mídia comercial. O Território do Sisal

caracteriza-se pela expressividade das rádios comunitárias enquanto meio de difusoras dos

ideais de desenvolvimento local. Sendo assim, é necessário compreender de que forma a

comunicação vem contribuindo para sanar as dificuldades existentes nesse lugar.




2.2 - A comunicação comunitária no Território do Sisal.



                            As rádios comunitárias foram os primeiros mecanismos de utilização das novas
                            tecnologias na elaboração de contra-discursos. Elas traduzem a fragmentação da
                            comunicação na experiência dos movimentos e a apropriação destes dos novos
                            cenários comunicativos como estratégia das lutas simbólicas locais. (FERREIRA E
                            MOREIRA, 2005, p.6).




6
  Para Putnam (In: Moura e Barros, 2008), o capital social é uma característica de organizações sociais, como as
redes, as normas e a confiança, que facilitam a ação e a cooperação com vistas a um benefício mútuo.
42



       O surgimento das Rádios Comunitárias na região aconteceu mediante a falta de

veículos comprometidos com as demandas sociais das localidades. Na sua maioria, os donos

dos meios de comunicação são políticos ou pertencem à mesma família, o que acarreta na

concentração do poder da informação nas mãos de poucos, contribuindo assim, para uma

sociedade cada vez mais alienada e passiva. De acordo com Nascimento (2005), as rádios

comunitárias inseridas no Território do Sisal são frutos da necessidade dos movimentos sociais

locais em se comunicarem com suas bases sociais. Nessa perspectiva, Cogo (1998, p.55)

citando Santoro, aponta:



                       O uso do rádio articulado [...] inserido e legitimado em movimentos e lutas
                       populares que lhe dêem razão de existir, presta-se maravilhosamente a um novo uso
                       voltado à promoção do ser humano, fundamentado no diálogo, em sua participação e
                       libertação.



       Com o incentivo da Igreja Católica, STR’s, Apaebs, MOC, entre outras entidades a

nível nacional e internacional; as rádios comunitárias vão alcançando expressividade em

meados do final dos anos 90 e início de 2000, configurando um fenômeno na região. Além de

levar informações principalmente às comunidades da zona rural, que têm o rádio como único

meio de se manterem conectadas aos acontecimentos, as rádios têm desempenhado um papel

social fundamental para o fortalecimento da sociedade, enfatizando em seus discursos, debates

a respeito da cultura, educação, meio ambiente, saúde, políticas públicas e entre outras

questões.

       Contudo, é pelo caráter democrático que as rádios comunitárias criam impacto, ou seja,

por reconhecerem a população enquanto interlocutores legítimos. Peruzzo (2007) vai dizer que

a democracia no poder de comunicar é condição para ampliação da cidadania. Portanto, a

participação popular nas experiências de comunicação comunitária representam um avanço

significativo na democracia comunicacional.
43




                       Pensada em sua dimensão política, apesar dos conflitos e contradições inerentes ao
                       próprio movimento, ela torna-se elemento central de um modelo comunicativo
                       baseado na participação a partir da construção cotidiana da realidade. Tendo forte
                       inspiração em Paulo Freire, boa parte dessas iniciativas inspirara-se em sua teoria da
                       comunicação dialógica e libertadora. (FERREIRA E MOREIRA, 2005, P.6).



       No relatório sobre as rádios comunitárias da Região Sisaleira coordenado no ano de

2005 pelo pesquisador Antonio Dias do Nascimento, as radcom’s da região se destacam pelo

espaço plural, de reivindicações, informação, valorização da cultura local; onde priorizam em

sua programação jornalística os acontecimentos locais, na programação musical a inserção

dos artistas da terra, além do serviço de utilidade pública. Entretanto, as dificuldades para

manter esses meios são grandes, devido a fatores como escassez de recursos financeiros e

humanos, processo de legalização e a repressão por parte da Anatel (Agência Nacional de

Telecomunicações) e Polícia Federal. Porém, ao longo dos anos vão surgindo alternativas

para amenizar os problemas encontrados. No que diz respeito à arrecadação de verbas, as

saídas são os patrocínios, apoio cultural e ajuda da comunidade e das associações. Já as

perseguições dos órgãos federais, acontecem na maioria das vezes por causa de denúncias

feitas ou pelos donos de rádios comerciais, por representantes do poder público municipal ou

por outros setores que são criticados ou denunciados pelas rádios, que por não serem

outorgadas terminam tendo seus equipamentos apreendidos, o que causa indignação a

população.

       Nesse sentido, surge em 2004 a ABRAÇO SISAL (Associação Brasileira de Rádios

Comunitárias) voltada a representar e defender legalmente as rádios. Consolidada como a

primeira entidade de comunicação do Território, ela têm como objetivo central contribuir para

a democratização da comunicação local. Atualmente a ABRAÇO SISAL conta com 17 rádios

comunitárias filiadas, as quais prestam um trabalho de acompanhamento, apóiam as emissoras

com capacitações técnicas e de conteúdo, além de orientá-las quanto a informações sobre o
44



desenvolvimento do Território.

       Uma outra deficiência que já vem sendo solucionada é a falta de profissionais

capacitados. Apesar de grande parte dessas rádios serem formadas por voluntários, a

qualificação desse pessoal vem sendo articulada pelo programa de comunicação do MOC

criado em 2002 com o apoio do UNICEF e da ONG CIPÓ (Comunicação Interativa), o qual

presta suporte e assessoria na construção de uma política cultural comunicativa para o

Território. O Projeto de Comunicação Juvenil desenvolvido pelo MOC juntamente com o

Instituto Credicard, objetivou-se na mobilização de jovens e entidades sociais em torno de

questões como juventude, democracia e participação. O projeto baseia-se no processo de

formação e qualificação de jovens em técnicas de rádio e jornalismo. Um dos resultados desse

trabalho foi criação em 2005 da Agência Mandacaru de Comunicação e Cultura (AMAC), que

desde então presta serviços de divulgação, cobertura de eventos, produz jornais, boletins

impressos, folders, fotos, campanhas, vinhetas e programas radiofônicos, além de prestar

assessoria de comunicação aos movimentos locais.

       Boa parte das rádios intituladas como comunitárias espalhadas no Território, atuam de

acordo com os conceitos de comunitário. A exemplo disso, temos a Rádio Comunitária Santa

Luz FM e a Valente FM, que após muitos anos buscando a legalização, finalmente

conseguiram a outorga. Essas conquistas ajudam a sociedade civil organizada e as entidades

da região a reafirmar que as rádios comunitárias, enquanto meios democráticos, de cunho

educativo, facilitadores do exercício da cidadania, são instrumentos eficazes na luta contra a

exclusão social, mas também, passam a ver esses veículos como poderosos mecanismos em

prol do desenvolvimento das comunidades.


                       Considerando serem as rádios comunitárias instrumentos importantes para a
                       promoção do desenvolvimento sustentável local, considera-se ser importante
                       aprofundar os mecanismos de envolvimento das comunidades na promoção,
                       implementação e consolidação desses meios enquanto instrumentos de resgate e
                       valorização dos saberes tradicionais; de ampliação das vozes das populações locais;
45


                       de afirmação da cidadania e justiça social; de democratização dos processos de
                       desenvolvimento social, econômico e cultural; bem como da necessidade de
                       potencializar a participação comunitária no planejamento e gestão de programas que
                       visam tornar as rádios comunitárias “sustentáveis” ou até mesmo “auto-
                       sustentáveis”. Isto significa que todo o programa de desenvolvimento local deve ter
                       em conta a ação comunicativa veiculada pela rádio comunitária, comunicação no
                       sentido educativo, mobilizando as populações serviços voluntários e cooperativos
                       em prol da sustentabilidade da própria rádio. (JANE, 2004, p. 184)



       Neste sentido, as rádios comunitárias são agentes fundamentais para a mobilização dos

movimentos sociais junto às comunidades, sendo assim, peças chave para integração.

Todavia, esse meio alternativo precisa também garantir formas auto-sustentáveis e não

somente ser pensados enquanto facilitador do processo. A comunicação comunitária deve ser

trabalhada num programa de desenvolvimento local, de modo, que ela também se desenvolva,

se fortaleça, para assim atingir seus idéias de cidadania. É com esse objetivo que as rádios

comunitárias vêm lutando na Região.

       O povo que antes era marcado por uma cultura de dominação, silêncio e submissão,

agora se vê frente aos debates da construção de políticas de desenvolvimento territorial, com

intuito de alcançar uma cultura de participação. Então, a sociedade civil através do CODES

busca legitimar seu discurso e define o conceito de desenvolvimento mais pautado nas ações

sociais. Logo, as discussões por um modelo comunicacional alternativo para o Território

fazem com que se defina em meio a seminários e oficinas envolvendo diversos atores da

sociedade, a constituição do Eixo de Comunicação no PTDRS, dentre as demais prioridades.

Essa inserção sinaliza a necessidade de pensar a comunicação de forma estratégica para o

desenvolvimento do Território do Sisal.

       Para melhor tratar, debater e elaborar as estratégias do eixo de comunicação foi

formado o Grupo Temático de Comunicação (GT-Com), sendo esse, composto por

representantes das rádios comunitárias (ABRAÇO Sisal), da Agência Mandacaru de

Comunicação e Cultura, das entidades como o MOC, Sindicato de Trabalhadores Rurais,
46



Apaeb Valente, e da Universidade do Estado da Bahia (UNEB – Campus XIV). De acordo

com Peruzzo (2007, P.14), “a formação de conselhos e/ou comitês locais de comunicação, são

maneiras de avançar na utilização das tecnologias de comunicação para colocá-las a serviço

do desenvolvimento comunitário e da cidadania”.

       Os embates em torno do quadro comunicacional da região serão tratados no capítulo

seguinte, onde veremos como estão sendo concebidas as ações e projetos previstos no Plano

Territorial do CODES Sisal. Serão analisados os resultados das ações, assim como os desafios

e perspectivas encontrados pelo GT de Comunicação.
47



3 - Comunicação Comunitária e Desenvolvimento Local: uma prioridade ou uma

resistência?



       Os debates em torno da necessidade de se repensar a comunicação do Território do

Sisal começam a ser pleiteados a partir do momento em que as rádios comunitárias passam a

se organizar, o que envolve o surgimento da ABRAÇO Sisal, assim como, a atuação dos

jovens comunicadores através de iniciativas como a criação da Agência Mandacaru de

Comunicação e Cultura. Outro aspecto essencial foi a formação do Programa de Comunicação

do MOC, que contribuiu significativamente para um maior engajamento desse atores que

passaram a lutar por condições que viabilizassem o fortalecimento da comunicação. Com o

apoio do CODES SISAL e de outros setores da sociedade, foi implantado o curso de

Comunicação Social com habilitação em Rádio e TV no campus da UNEB (Universidade do

Estado da Bahia) em Conceição do Coité. Além dessa, uma outra conquista importante foi a

inserção do item comunicação ao plano de desenvolvimento do CODES, o que caracteriza um

diferencial do Território.

       Constituindo-se como um dos eixos prioritários no Plano Territorial de

Desenvolvimento Rural Sustentável com edições de 2006 a 2008 (em anexo), a comunicação

aparece, dentre os outros eixos, como programação elementar na promoção do

desenvolvimento local. Sendo assim, serão avaliadas as concepções, objetivos e ações

elaboradas para este eixo, uma vez que a comunicação estratégica foi concebida

especialmente pelo MOC, apropriado dos conhecimentos de Relações Públicas.

        O intuito do capítulo é identificar a importância do eixo enquanto potencializador da

ação coletiva da própria organização popular, e por fim pontuar os resultados das ações do

plano, bem como, trazer as reflexões sobre a realidade da comunicação comunitária no

Território. Portanto, foram analisados os seguintes documentos: PTDRS, o Relatório do MOC
A comunicação comunitária no território do sisal
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A comunicação comunitária no território do sisal

  • 1. UNIVERSIDADE DO ESTADO DA BAHIA JULIANA COSTA OLIVEIRA A COMUNICAÇÃO COMUNITÁRIA NO TERRITÓRIO DO SISAL Conceição do Coité 2010
  • 2. 1 JULIANA COSTA OLIVEIRA A COMUNICAÇÃO COMUNITÁRIA NO TERRITÓRIO DO SISAL Trabalho de conclusão apresentado ao curso de Comunicação Social – Habilitação em Radialismo, da Universidade do Estado da Bahia, como requisito parcial de obtenção do grau de bacharel em Comunicação, sob a orientação da Profª Esp. Vilbégina Monteiro dos Santos. Conceição do Coité 2010
  • 3. 2 JULIANA COSTA OLIVEIRA A COMUNICAÇÃO COMUNITÁRIA NO TERRITÓRIO DO SISAL Trabalho de conclusão apresentado ao curso de Comunicação Social – Habilitação em Radialismo, da Universidade do Estado da Bahia, sob orientação da Profª Esp. Vilbégina Monteiro dos Santos. Data: _________________________________________________ Resultado: _____________________________________________ BANCA EXAMINADORA Profª. (orientadora) _______________________________________ Assinatura: _____________________________________________ Profª. __________________________________________________ Assinatura: _____________________________________________ Prof. ___________________________________________________ Assinatura: _________________________________________
  • 4. 3 Dedico este trabalho aos meus avós paternos Almir Oliveira e Dulcelina Lopes (ambos, in memoriam) pelo exemplo de vida, dedicação e perseverança no sertão. À minha família, em especial a minha mãe, Elisabete Costa, pelo carinho, pelas preces, pelo apoio incondicional que ao longo dessa jornada foram imprescindíveis.
  • 5. 4 AGRADECIMENTOS À Deus, por ter me concedido essa benção; À toda minha família pelo amor , compreensão e generosidade de sempre; Aos meus pais, Ernandes e Elisabete, que sempre estiveram ao meu lado me apoiando e me incentivando em todas as etapas da minha vida; Ao meu irmão, Diego Costa, pelo companheirismo, amizade e pela presença constante, sendo fundamental na realização desse sonho; À Edisvânio Nascimento, e a todos os Comunicadores Comunitários e Entidades do Território do Sisal, pela ajuda e atenção nos momentos em que os recorri; Aos meus professores, em especial, à professora Vilbégina Monteiro dos Santos, pela dedicação ao orientar-me; Aos meus colegas que sempre me auxiliaram ao longo dessa caminhada; À todos aqueles que de alguma forma colaboraram durante o processo de realização desse trabalho, meu MUITO OBRIGADA!
  • 6. 5 “Quanto mais livre a informação circula, mais forte fica uma sociedade”. Barack Obama (Presidente dos EUA).
  • 7. 6 RESUMO Localizado no semi-árido do nordeste da Bahia, o Território do Sisal caracteriza-se pelo seu clima seco, pela economia baseada no cultivo do agave e também por ser uma região desfavorecida no que diz respeito a aspectos políticos, sociais, econômicos e ambientais. Entretanto, essa região vem se destacando pela forte atuação do terceiro setor. A alteração no processo comunicativo com o fenômeno das rádios comunitárias e a criação de entidades de comunicação, fez com que os atores sociais instituíssem a comunicação como fundamental para a mobilização social. O objetivo do estudo é compreender este processo dando destaque ao Plano de Desenvolvimento Territorial, buscando identificar os avanços, desafios e perspectivas da comunicação na viabilização do desenvolvimento local. Como estratégias metodológicas foram utilizadas o levantamento de dados qualitativos, o que possibilitou estabelecer um debate teórico sobre a Comunicação Comunitária e Desenvolvimento Local, assim como, realizar um apanhado histórico da Comunicação Comunitária na região. O uso da pesquisa de campo e das entrevistas semi-estruturas e em profundidade foram essenciais para detectar os entraves da Comunicação Comunitária no Território do Sisal. Diante da análise, propõe-se a necessidade de rever o conceito de participação. PALAVRAS-CHAVE: Comunicação, Mobilização Social e Desenvolvimento Local.
  • 8. 7 ABSTRACT Located in the semi-arid northeast of Bahia, the Territory of Sisal is characterized by its dry climate, the economy based on the cultivation of agave and also for being a disadvantaged area with regard to political, social, economic and environmental. However, this region has been increasing by the strong performance of the third sector. The change in the communication process with the phenomenon of community radio and the establishment of independent media, meant that social actors institute communication as essential for social mobilization. The study is to understand this process by highlighting the Territorial Development Plan, aimed at identifying the progress, challenges and perspectives of communication in facilitating the development site. As methodological strategies were used to raise data quality, which allowed the establishment of a theoretical debate on the Communication Community and Local Development, as well as perform a historical overview of Communication in the region. The use of field research and semi-structure and depth are essential to detect obstacles of Communication in the Territory of Sisal. Before the analysis, it is proposed the need to revise the concept of participation. KEYWORDS: Communication, Social Mobilization and Local Development.
  • 9. 8 SUMÁRIO Introdução 09 1 - Comunicação Comunitária e Desenvolvimento Local: 13 Um debate possível? 1.1- O cenário da comunicação no Brasil. 14 1.2- Comunicação Comunitária, mais que uma alternativa. 17 1.3 - Uma nova proposta de desenvolvimento. 19 1.4 - A relação entre Comunicação Comunitária e desenvolvimento local. 23 2 – Sisal, um Território de Possibilidades. 26 2.1 – “Por um Sertão justo”: A causa das organizações que compõem o Território do Sisal. 35 2.2 - A Comunicação Comunitária no Território do Sisal. 41 3 - Comunicação Comunitária e Desenvolvimento Local: 47 Uma prioridade ou uma resistência? 3.1 – Pensando a comunicação estrategicamente. 48 3.2 – Comunicação Comunitária no Território do Sisal: Papel de mobilização ou mobilização só no papel? Avaliação dos resultados. 52 Considerações Finais 58 Referências 63 Anexos 67
  • 10. 9 INTRODUÇÃO Quando criança, nas visitas a fazenda do meu avô paterno, localizada no Município de Retirolândia, a caminho, eu sempre costumava observar o ruído dos motores de sisal nas redondezas. No imenso silêncio das pastagens, aquele som denunciava que ali por perto havia trabalhadores desfibrando as folhas do sisal. Anos mais tarde, já na adolescência, pude entender melhor a história da Região em que passava a conviver. A proximidade com o lugar, com as pessoas, me fez compreender que o barulho do motor do sisal representava muito mais para aquela gente. Além de ser uma importante ferramenta que facilita a extração da fibra do sisal, principal fonte de renda da região; a chegada das primeiras máquinas, em meados da década de 40, sinalizou o início do processo de modernização na Região Sisaleira (CODES, 2008). O trabalho no motor, como é popularmente conhecido, baseia-se na exploração da mão-de-obra, em péssimas condições de trabalho, assim como também oferece riscos de saúde e mutilações. Entretanto, essa lida foi e ainda permanece sendo o sustento de inúmeras famílias. Durante décadas, os ruídos dos motores de sisal foram os únicos sons ouvidos pela população marcada pela subserviência e clientelismo. Numa terra castigada pela seca, onde a pobreza, o analfabetismo, a migração e o trabalho infantil configuram os agravantes sociais; a organização da sociedade civil passa a ser uma valiosa arma na luta por melhores condições de vida. A criação dos Sindicatos de Trabalhadores Rurais (STRs) configurou um passo imprescindível para que os agricultores passassem a se mobilizar para lutar por seus interesses, no entanto, a cultura de dominação disseminada pelos meios de comunicação, concentrados em sua maioria nas mãos de poucas famílias ligadas a grupos políticos, se estabelecia como o maior entrave para a viabilização da participação e conscientização dos cidadãos.
  • 11. 10 As transformações na realidade social da Região Sisaleira começam a acontecer com o surgimento dos movimentos sociais, os quais encontraram destaque através das Rádios Comunitárias implementadas no final da década de 90. Essas rádios constituíram papel fundamental no processo de mobilização, uma vez que o som que informa, educa e denuncia passava a ressoar entre o ronco dos motores de sisal, aproximando as comunidades e alterando o cenário comunicacional da Região. A forte atuação dos movimentos sociais pode ser verificada pela inserção do Codes Sisal (Conselho Regional de Desenvolvimento Rural Sustentável da Região Sisaleira do Estado da Bahia), instituição responsável por promover ações de sensibilização, mobilização e planejamento do desenvolvimento do Território. Nessa perspectiva, a comunicação aparece como eixo prioritário do PTDRS (Plano Territorial de Desenvolvimento Rural Sustentável da Região Sisaleira), sendo eleita como fator estratégico do desenvolvimento local. Esta monografia tem como objetivo analisar a Comunicação Comunitária no Território do Sisal, implementada pelo Plano de Comunicação do CODES Sisal. Tal abordagem busca compreender como é articulada a relação: Comunicação e Desenvolvimento Local no Território Sisaleiro. Desenvolver a pesquisa sobre a Comunicação Comunitária no Território do Sisal é de grande relevância, pois são poucos os estudos desse foco na região, embora seja um fenômeno evidente. Além disso, a minha própria ligação com o tema, enquanto aluna do curso de Comunicação Social, fruto da forte mobilização dos movimentos sociais, me levou a prosseguir a investigação. Trata-se, porém, de um retorno à comunidade, sendo que, a abordagem pode ser uma contribuição a mais, que venha a favorecer a formação de políticas públicas de comunicação para o Território. Portanto, fez-se necessário analisar e dialogar com essas comunidades, com esses atores que se organizaram e buscaram representatividade ao lado dos movimentos sociais, das
  • 12. 11 rádios comunitárias, e oportunidades de capacitação e qualificação com a criação de projetos para melhorar a forma de se comunicar com o intuito de transformar a realidade social e o olhar que a mídia faz desse lugar. Dessa forma é pertinente averiguar se os conceitos de Comunicação Comunitária estão sendo trabalhados, avaliando as ações de interação entre cidadão e a comunicação. No 1º capítulo a proposta foi trazer um debate teórico buscando responder os questionamentos a respeito da relação entre Comunicação Comunitária e Desenvolvimento Local. Partindo pelo contexto histórico da comunicação no Brasil, desde o surgimento dos primeiros meios de comunicação de massa no país, perpassando a formação dos grandes conglomerados de mídia no Governo Vargas, pelas censuras e opressões marcadas no período da ditadura militar, até chegar à constituição da organização da sociedade civil e a necessidade de apropriação de uma comunicação voltada para os interesses da comunidade. Logo em seguida, é apresentado o conceito de Comunicação Comunitária, sendo traçada a relação com o Desenvolvimento Local, baseada na noção de participação, e então é trazida a proposta de desenvolvimento. Inteirados das noções de comunicação e desenvolvimento, prosseguimos para o 2º capítulo onde é apresentado um apanhado histórico da Comunicação Comunitária no Território do Sisal. A princípio são pontuados os aspectos econômicos, políticos, sociais, culturais, comunicacionais e ambientais da Região, assim como, o seu fortalecimento através da organização popular, sendo relatado especialmente sobre as principais entidades que compõem o Território e a importância dessas para o desenvolvimento sustentável. Depois é abordada especificamente a Comunicação Comunitária no Território, ressaltando as rádios comunitárias, a criação das entidades de comunicação e a inclusão do Eixo de Comunicação no PTDRS elaborado pelo Codes Sisal.
  • 13. 12 Com intuito de identificar as melhorias alcançadas e as possíveis deficiências no desenvolvimento do Território através das práticas comunicativas, foram analisadas no 3º capítulo as ações e projetos desenvolvidos pelo Codes Sisal, tomando por base o Eixo de Comunicação do Plano Territorial de Desenvolvimento Rural Sustentável da Região Sisaleira. Correlacionando-o aos conhecimentos de Relações Públicas, foi possível detectar as estratégias de comunicação para a mobilização social. A análise de outros documentos como a Carta Coité, o Relatório do MOC (Movimento de Organização Comunitária): Como está a Comunicação nas Organizações?, as pautas de reunião do Grupo de Trabalho de Comunicação, assim como, as entrevistas realizadas, foram essenciais para avaliar os avanços, desafios e perspectivas da comunicação comunitária no Território do Sisal. Contudo, esse trabalho não significa um ponto final no processo de investigação sobre a comunicação da Região, mas sim de uma proposta de continuidade, de incentivo aos atores sociais para que reavaliem os conceitos, as ações, a participação dos outros setores na busca da implementação da Comunicação Comunitária em prol do Desenvolvimento Local. Uma vez que, os ruídos dos motores de sisal que antes eram os únicos sons ouvidos perante o imenso silêncio que predominava naquela gente, agora dão lugar aos ruídos da transformação. Boa leitura!
  • 14. 13 1 - Comunicação Comunitária e Desenvolvimento Local: Um debate possível? Nos dias de hoje, devido aos efeitos da globalização, a comunicação passou a ser mais utilizada para fins mercadológicos, perdendo aos poucos o seu caráter de integração para a cidadania. É inevitável o controle que os meios de comunicação exercem sobre a sociedade, enquanto poderosos formadores de opinião. Cada vez mais, alienam os indivíduos, ditam modas, exacerbam o consumismo, manipulam resultados, influenciam na cultura, na política, na economia, na educação e em outros campos, ou seja, detêm o controle das massas. É grande o fluxo de informação no mundo, no entanto, o poder midiático se restringe à pequenos grupos. No Brasil, a centralidade da comunicação nas mãos de poucas famílias revela as interfaces do contexto histórico político e social de um país em desenvolvimento. Numa nação democrática em que a maioria dos veículos de massa são propriedades privadas, a liberdade de expressão, a pluralidade e a democratização da comunicação, não são realidades. É entendendo a comunicação como decisiva no processo de formação da sociedade, que atualmente vem sendo muito discutida entre os estudiosos de diversas áreas a relação entre comunicação e desenvolvimento. O questionamento mais preponderante é como a comunicação pode ser trabalhada de forma a viabilizar o desenvolvimento. Para pensar nessa lógica é preciso antes saber quais as dimensões desses termos devem ser apropriadas. Neste capítulo, os conceitos de comunicação e desenvolvimento serão enfatizados na perspectiva de melhorar as condições sociais de vida das pessoas através de suas relações comunitárias. Logo, a concepção de comunicação a ser tratada é voltada para uma dinâmica dialógica, participativa, mobilizadora, capaz de atender as demandas da comunidade, uma vez que esta será articulada, de modo, estratégico em prol do desenvolvimento local. Sendo assim, primeiro será abordado o panorama da comunicação no âmbito nacional e em seguida serão
  • 15. 14 apresentados os conceitos de Comunicação Comunitária e Desenvolvimento Local e a relação proposta. 1.1- O cenário da comunicação no Brasil. Historicamente, o cenário da comunicação no Brasil é marcado por repressões, censuras e oligarquias; desde o período colonial, perpassando por vários governos e perdurando até os dias atuais. Por se tratar de uma República democrática, onde está assegurado na constituição federal de 1988, artigo 5, “a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade”, garantindo no parágrafo IX - “é livre a expressão da atividade intelectual, artística, científica e de comunicação, independentemente de censura ou licença”; e no artigo 220, “que a manifestação do pensamento, a criação, a expressão e a informação, sob qualquer forma, processo ou veículo não sofrerão qualquer restrição”, constando no inciso 2º, que “é vedada toda e qualquer censura de natureza política, ideológica e artística”. Entretanto, a realidade é totalmente contraditória à legislação, principalmente quando o Estado abre concessões públicas de veículos de comunicação para representantes políticos, religiosos, empresários, entre outros, em troca de favores, confluindo assim, para a formação de um sistema autoritário onde o poder da informação está concentrado nas mãos de poucas famílias, constituindo assim, o monopólio da comunicação brasileira. O surgimento da Rádio Sociedade do Rio de Janeiro, idealizada por Roquette Pinto e Henrique Morize em 1923, em plena efervescência política, é o marco inicial para a configuração do sistema comunicacional excludente que temos hoje. Isso porque, o rádio no Brasil nasce privado na forma de rádio-clubes com teor erudito, tendo como público a elite intelectual e social da época, uma vez que o Governo não havia se interessado em criar um sistema estatal. Ao ganhar proporções com o aumento de adeptos na década de 30, ele atrai a
  • 16. 15 atenção do poder público, logo, o então chefe do governo provisório, Getúlio Vargas, assina o estatuto da radiodifusão em 1931, definindo sua finalidade educativa, assim como, decreta a permissão de veiculação de propaganda, o que torna o veículo ainda mais popular passando a atingir outras classes. A Revolução de 30 estabeleceu também o caráter da radiodifusão como de interesse público, e, portanto, sujeitou tanto o rádio quanto a televisão a serem tratados como serviços públicos, protegidos e regulados pelo Estado. Coerentemente com este caráter, os revolucionários de 30 atribuíram à radiodifusão finalidades educacionais. Eles falharam, contudo, na conceituação dessas finalidades e na fixação do modo como deveriam ser alcançadas e avaliadas. Repetindo a falha, todos os governos que se sucederam, desde então, jamais definiram substantivamente aquelas finalidades. O resultado é que a qualificação legal da radiodifusão como um serviço de interesse público e com finalidades educacionais tornou-se meramente retórica, sem consequências objetivas em torno de implementação. Na prática, o modo comercial de exploração da radiodifusão tem sido esmagadoramente predominante e o número e qualidade de programas de entretenimento têm superado de longe aqueles com caracteristicas educacionais.(JAMBEIRO, 2004, p.183-184) Segundo Calabre (2003, p.2), “a capacidade de falar” para diversas pessoas e para muitas localidades simultaneamente tornava o veículo um aliado estratégico na questão da formação de uma unidade cultural”. Contudo, os ideólogos do Estado Novo visando o fortalecimento do Estado e do nacionalismo, usam não só o rádio, mas, todos os veículos como os jornais, revistas, entre outros, para disseminar os ideais de integração e paternalismo ao mesmo tempo em que legitimavam a figura de Vargas. A expansão das atividades econômicas no final da metade dos anos 30 impulsionou o crescimento da publicidade nos meios de comunicação de massa. O desenvolvimento da radiodifusão fez com que os empresários disputassem concessões, muitos dos quais já detinham o poder de outras mídias. Neste ritmo, em 1938 surge o primeiro conglomerado brasileiro de veículos de comunicação de massa, criado pelo jornalista Assis Chateaubriand. A ele pertenciam cinco emissoras de rádio, doze jornais diários e uma revista; 20 anos mais tarde, ele já tinha 36 rádios, 34 jornais, 18 emissoras de televisão e várias revistas
  • 17. 16 (JAMBEIRO, 2004) Desde então, o processo de concessão e fiscalização é controlado pelo Governo Federal. Somente em 1962 foi aprovada a legislação que regulamenta a radiodifusão. Fase em que o novo modelo de desenvolvimento econômico proposto na ditadura militar, baseado em repressões políticas, só teve êxito devido ao controle dos meios de comunicação através da censura e também pela afinidade do empresário Roberto Marinho com o regime. A instalação da TV Globo em 1965, surge dos interesses políticos e com o investimento recebido do grupo estrangeiro Time-Life, o que não era permitido pela lei, mas, logo se transforma no maior império da comunicação no país. O peso que a Rede Globo exerce na sociedade brasileira, principalmente no quadro político, é até hoje uma realidade. Desde o fim da ditadura militar a sociedade civil vem galgando espaço de participação nos debates em torno de políticas públicas. São as camadas populares que se viram excluídas e começam a se organizar e se fortalecer através dos movimentos sociais em prol de melhores condições de vida. Nas últimas décadas, as ações desses movimentos e organizações populares tiveram significativo crescimento nos diversos setores, sendo fundamentais para a conscientização e mobilização da população na luta pelos seus direitos e na promoção do desenvolvimento social, cultural e econômico das comunidades. Os movimentos sociais são, hoje em dia, um dos principais responsáveis por captar os problemas sociais que ressoam nas esferas privadas e transformá-los em questões de interesse geral na esfera pública política. Além disso, têm o papel de ampliar o próprio espectro do político, ao incorporar novos temas na agenda política. Uma sociedade civil forte cria grupos e pressiona em direção a determinadas opções políticas; uma sociedade civil fraca, por outro lado, será normalmente dominada pelas esferas do Estado ou do mercado. (RAMOS E SANTOS,2007,p.134). Nessa perspectiva, os movimentos sociais são importantes no processo de democratização, já que estes agem como canais de representatividade da sociedade civil, como os sindicatos e partidos políticos. Conforme Peruzzo (2007), essas organizações
  • 18. 17 descobriram a necessidade de apropriação pública de técnicas (de produção jornalística, radiofônica, estratégias de relacionamento público etc.) e de tecnologias de comunicação (instrumentos para transmissão e recepção de conteúdos etc.) para poderem se fortalecer e realizar os objetivos propostos. Assim sendo, num primeiro momento descobriram a utilização da comunicação desde as formas grupais e individuais até os meios tecnológicos como uma necessidade, ou seja, como canais importantes para comunicarem-se entre si e com seus públicos, sejam eles os usuários reais ou potenciais dos serviços oferecidos, a imprensa, órgãos públicos, aliados e o conjunto da sociedade. Deste modo, diante da concentração dos canais de comunicação que decretam restrições a democratização, a Comunicação Comunitária surge como meio alternativo para atender aos interesses e necessidades coletivos. Trata-se de uma comunicação que tem o propósito de viabilizar a todos o direito de comunicar-se. Caracteriza-se como um espaço plural e acessível, onde a comunidade tem o poder de informar, reivindicar e denunciar, exercendo assim o papel de cidadão. Nesta proporção, é fundamental refletir sobre tais princípios. 1.2- Comunicação Comunitária, mais que uma alternativa. Em seus estudos sobre a comunicação comunitária no Brasil, Peruzzo (2007) chama atenção para a noção de comunidade, uma vez que esta não basta a um meio de comunicação ser local, falar das coisas do lugar e gozar de aceitação pública para configurar-se como comunitário. Ela define comunicação comunitária como sendo aquela que é produzida no âmbito das comunidades e fundamentada nas noções de comunidade, participação ativa, horizontal e democrática dos cidadãos. Logo, para compreender o real significado do termo é necessário ater-se para tais conceitos.
  • 19. 18 Para Sayonara Leal (2007), a comunidade existe na medida em que há o reconhecimento mútuo de princípios morais, normativos, valores culturais, traços sociais comuns entre os membros que a compõe. O território geográfico, o pertencimento étnico, a identidade pelo gosto estético, podem ser modos de agregar indivíduos numa formação social. A definição proposta por Souza (2000) vem atribuir que a susbstância de comunidade não está no aspecto físico, mas no conjunto de relações e inter-relações, de poderes e contrapoderes que se estruturam, tomando como referência a infra-estrutura física e social da área, que por sua vez, tem suas determinações nas estruturas fundamentais da sociedade. A comunidade é, portanto, uma forma particular de expressão da própria sociedade. Sendo assim, Peruzzo (2003) cita a valorização do local na sociedade contemporânea, mesmo no auge de globalização e em tempos de comunicações de longas distâncias, as pessoas se interessam pelo o que está próximo, pelo que atinge diretamente suas vidas e demonstram valorizar as coisas da comunidade, e querem saber dos acontecimentos que ocorrem ao seu redor. Peruzzo (2004) aponta a participação como uma das dimensões essenciais desse sistema, a qual se concretiza numa comunicação feita dentro dos movimentos e organizações e que reflete na existência de outra comunicação, tendo seus conteúdos vindos das bases excluídas da sociedade e destinadas a essas mesmas bases. Neste sentido, as pessoas podem atuar como sujeitos ativos, como protagonistas do processo. Nesse mesmo viés a pesquisadora faz um contraponto quando relata que a questão da participação direta não significa que todos tenham que tomar parte de tudo durante todo o tempo, pois, conforme experiências históricas, a representatividade, se aplicada de forma democrática, também condiz como modo de participação. Neste panorama, evidencia-se a importância da representação coletiva proporcionada pelas entidades, quando estas operam como porta-vozes legítimos dos coletivos organizados da sociedade civil onde estão inseridas.
  • 20. 19 Conforme Xavier (2002, p.22), as representações coletivas dariam sustentação a uma moral específica, “necessária ao corpo social”, materializando-a, objetivando-a e naturalizando-a, desempenhando, assim, o papel de amainar ou até mesmo eliminar a contradição entre o individual e o coletivo, mantendo a ordem e o equilíbrio social. Independente das formas com que pode revestir, a participação significa fazer parte, tomar parte, ser parte de um ato ou processo, de uma atividade pública, de ações coletivas. A referência à parte implica pensar o todo, a sociedade, o Estado, a relação entre as partes entre si e das partes com o todo. Esse todo não é homogêneo; as partes têm interesses, aspirações, valores e recursos de poder diferenciados. Diante disto coloca-se o problema de como atingir interesses gerais, numa sociedade dominada pelo particularismo e fragmentação. (TEIXEIRA, 1997, p.179) Souza (2000) ainda traz a abordagem de participação como conteúdo básico na esfera do desenvolvimento das comunidades, sendo necessário considerar a sua diversidade de significações, pois esta pode até levar o povo à ilusão que está participando quando, de fato, está cada vez mais submisso. Contudo, diante do agravante histórico de uma sociedade não participativa, as múltiplas formas de participação, enquanto possibilidades de acesso são fundamentais mecanismos para um aprofundamento da democracia, desde que a sociedade se sinta incluída no processo. Logo, engajar-se frente aos interesses comuns é considerada uma prática de cidadania que remete ao objetivo do desenvolvimento local. Diante disso, é relevante saber como essas dimensões se contemplam no contexto histórico brasileiro. 1.3 - A relação entre Comunicação Comunitária e Desenvolvimento Local. Perante a análise de vários estudiosos, verifica-se que o conceito de desenvolvimento local está basicamente associado à noção de participação, dessa forma, a comunicação surge como peça importante na articulação e viabilização de ações cooperativas, de modo, a estimular participação ativa dos cidadãos no debate em torno de políticas públicas. Em suas
  • 21. 20 pesquisas, Melo (1998) menciona que a ação do homem para enfrentar a natureza, transformando-a e adaptando-a às suas necessidades de sobrevivência e de bem-estar, está atrelada a inovações comunicacionais e informacionais. Portanto, para alcançar mudanças sociais é necessário repensar as estruturas de comunicação inseridas nas comunidades. Reside aí a contribuição fundamental dos sistemas de comunicação, veiculando informações e difundindo modos de agir, pensar e sentir que predisponham os cidadãos a adotarem comportamentos sintonizados com as estratégias do desenvolvimento. Trata-se de uma função educativa, qual seja a de mobilizar recursos humanos motivados a adquirirem novas habilidades sociais e técnicas, superando o fatalismo político, o imediatismo econômico e os preconceitos culturais. (MELO, 1998, p.296). É justamente nesse viés educativo que a comunicação na pedagogia de Paulo Freire é pensada, com o objetivo de buscar o diálogo e proporcionar aos homens o desenvolvimento de uma compreensão crítica. Ele descreve a situação dos problemas de incomunicação da sociedade brasileira, como decorrentes do aspecto histórico-político e de ordem sócio- econômica, apontando dentre eles, o “mutismo”, próprio das sociedades com inexperiência democrática, em que a comunicação constitui-se acrítica, num clima antidiálogo, em que configura-se a “cultura do silêncio”, refletido como fenômeno comum aos povos colonizados, sendo estes, alguém que não tem voz própria, que fala pela fala do opressor; ocasionando a não-comunicação. Outro problema levantado é o da educação bancária, em que a educação se funde em repassar conhecimentos. Freire relaciona sua pedagogia como uma “Pedagogia do Oprimido”, inserida na luta do homem pela sua humanização. Melo (1998, p. 281) vem ressaltar que o educador refere-se à Pedagogia da Comunicação como uma pedagogia libertadora, aberta, intensa e em permanente reelaboração. O autor faz menção ao conceito de comunicação (diálogo), apontado por Paulo Freire (1978, p. 90-91): “Não é no silêncio que os homens se fazem, mas na palavra, no trabalho, na ação-reflexão. Mas, se dizer a palavra, que é trabalho,
  • 22. 21 que é práxis, é transformar o mundo, dizer a palavra não é privilégio de alguns homens, mas direito de todos os homens”. Tomando como base a Pedagogia Freiriana, Melo vem destacar a função dos meios de comunicação na perspectiva do desenvolvimento social: A contribuição que os meios de comunicação de massa podem oferecer para intensificar o processo de desenvolvimento das sociedades que permanecem em patamares econômicos atrasados, possuindo padrões tecnológicos e culturais tradicionais, é justamente o de criar expectativas na população, produzindo atitudes detonadoras da busca das informações e da manifestação de opiniões, que instauram um “clima para o desenvolvimento”. (MELO, 1998, p.294). Partindo dessa proposta é que a Comunicação Comunitária evolui. Como cita Peruzzo (2003), ela surge e se desenvolve articulada aos movimentos sociais como um meio popular, participativo, alternativo e dialógico. No Brasil, a comunicação comunitária ganha força na década de 1980 mediante as pequenas ações dos movimentos populares no período da ditadura militar, exatamente, quando a sociedade protestava por justiça social. Ainda nos anos de 1990 essa comunicação se institui pelo caráter reivindicatório, já nos últimos anos ela passa a tratar mais propriamente de temas locais, o que ocasiona o fenômeno das rádios comunitárias, que surgem como mecanismos eficientes de enfrentamento da realidade. Peruzzo (1998) destaca que foi no ano de 1995 que o Brasil descobriu o formato das rádios comunitárias, no formato de rádios livres, comumente chamadas de piratas por não terem autorização do Governo. Leal (2007) vem definir a radiodifusão comunitária no Brasil como um sistema complementar às emissoras comerciais e ao sistema oficial estatal, tendo como objetivos a preservação de valores culturais e sociais, a divulgação, de forma independente, de informações sobre fatos políticos, sociais e econômicos relevantes e, sobretudo, a disseminação de informações locais e regionais de interesse de uma coletividade. De acordo com a autora, as rádios comunitárias são consideradas tentativas de constituição de espaços autônomos de difusão da palavra de pessoas anônimas desatreladas das estruturas políticas hegemônicas. Elas são reconhecidas como meios de contra-poder, de
  • 23. 22 expressão democrática, de pertencimento local, capazes de instaurar uma prática comunicativa alternativa e participativa. No entanto, é necessário compreender a finalidade dos meios comunitários, já que devido ao amplo movimento de expansão destes, nos dias de hoje, vem ocorrendo um desvirtuamento de seus princípios. Enfim, a comunicação comunitária é aquela que faz sentido dentro de realidades específicas e porque é produto de cada uma dessas realidades. Ela surge das necessidades locais e serve aos interesses da “comunidade”, embora seja normal existir uma grande gama de distorções, como, por exemplo, a existência de meios de comunicação que se dizem comunitários, mas que de fato servem a outros interesses políticos eleitorais, religiosos, financeiros e personalísticos. Tais desvios podem prejudicar a noção de comunitário diante das pessoas de uma localidade. É a configuração de cada realidade específica que serve de parâmetro para a compreensão do significado comunitário de cada experiência de comunicação local. (PERUZZO, 2003, p.249). Entende-se que os meios comunitários são formas de descentralização do poder de comunicação no país, o que revela uma re-significação de um povo culturalmente desprovido do exercício de participação, que passa a interagir com esses mecanismos e assim se reapropriar do uso da fala. Nesse contexto, Peruzzo (2003) avalia esse processo comunicativo como propiciador da cidadania, o que consiste na participação ativa da população local, a sustentabilidade, o respeito de gênero e etnia e melhorias de vida da população envolvida, o que implica em um desenvolvimento social com igualdade. Conforme afirma a autora, “nessas condições o desenvolvimento não é apenas uma questão econômica ou de aumento de renda, mas um desenvolvimento integral e sustentado em condições que permitam ser duradouro e igualitário”. (p. 253). Perruzo (2003) ressalta que no Brasil a participação nos meios de comunicação tem aumentado a partir de 1990, não somente através da mídia comunitária, mas também a grande mídia passa a oferecer espaço à população, ou seja, os conteúdos dos grandes veículos passam a ter uma maior abertura para o regional / local. Estas mudanças resultam da demanda pela participação social proporcionada pelos meios de comunicação locais na luta pela
  • 24. 23 democratização da comunicação, embora não representem ruptura na estrutura da grande mídia. Assim, Souza (2000) contribui ao afirmar que o desenvolvimento de comunidade é hoje um dos instrumentos principais de participação e desenvolvimento das condições de cidadania da população, reconhecidos como recursos básicos ao desenvolvimento global. Peruzzo (2003) conclui que apesar da Comunicação Comunitária se revelar com uma realização coletiva que gera conteúdos voltados para o desenvolvimento comunitário local, seu desempenho sofre distorções e contradições dentro dela mesma no que se refere a sua importância, a sua dimensão na viabilização do desenvolvimento sustentável. No entanto, Melo (1998) defende a idéia de que para que a comunicação venha a contribuir no processo de desenvolvimento sócio-econômico, é preciso antes conhecer mais profundamente as potências comunicacionais disponíveis na região e as implicações que envolvem os campos da economia, da política e da cultural, para assim melhor exercer seu papel decisivo no progresso local e global. Sendo assim, torna-se fundamental atentar-se para a noção de desenvolvimento em questão. 1.4 - Uma nova proposta de desenvolvimento. Para entender a dimensão do termo desenvolvimento local é preciso compreender o significado de desenvolvimento, uma vez que este esteve por muito tempo associado somente ao processo de crescimento econômico proposto pela industrialização. Contudo, falar de desenvolvimento implica em alterações nos diversos segmentos da sociedade. Petitinga (2008) vem dizer que além do fator econômico, existe também a melhoria da qualidade de vida das pessoas e a conservação do meio ambiente como aspectos fundamentais para esta concepção. Para ela, o desenvolvimento deve ser visto levando-se em conta os aspectos locais, que têm significado em um território específico. O global passa a ter sua importância
  • 25. 24 associada ao local e vice e versa, já que um está em constante mudança por conta das interferências do outro. Da mesma forma, Muls (2008) afirma que outras formas de coordenação das relações sociais e das atividades produtivas têm emergido como promotoras do desenvolvimento local. A mobilização dos atores locais, a formação de redes entre organismos e instituições locais e uma maior cooperação entre empresas situadas em um mesmo território, são instrumentos que têm possibilitado aos territórios novas formas de inserção produtiva e uma atenuação das desigualdades sociais. Lemos (2005) vem considerar que a noção de território não deve ser apenas entendida pelos seus aspectos físicos e jurídicos, ou seja, para delimitar as fronteiras de um território é preciso levar em consideração as circunstâncias sociais, simbólicas, culturais e subjetivas. Ao considerar o desenvolvimento como fruto das interações sociais, a participação constitui-se como elemento básico do desenvolvimento local. Conforme Souza (2000, p.83) “o desenvolvimento social do homem requer participação nas definições e decisões da vida social. É neste sentido que o resgate deste processo precisa ser trabalhado”. Segundo a autora, o desenvolvimento de comunidade é um sistema pedagógico de ação junto às comunidades, sendo assim, diante das dificuldades na participação, ela traz uma reflexão sobre a conscientização como um processo contínuo e dinâmico. Como diz Paulo Freire (1980, p. 26), “na aproximação espontânea que o homem faz do mundo, a posição normal, fundamental, não é a posição crítica, mas a posição ingênua. A conscientização implica que ultrapassemos a esfera espontânea de apreensão da realidade para chegarmos a uma esfera crítica”. Por sua vez, Lima (2007) enfatiza a participação como uma das necessidades fundamentais do ser humano e também para o desenvolvimento local. Sua essência encontra-se na tomada de consciência, na formação de um senso crítico, de uma sensibilidade e uma identidade comunitária.
  • 26. 25 Outro aspecto importante na representação do desenvolvimento local como aponta Souza (2000), é que este permeia a condição de cooperação social, sendo esta realizada por segmentos da população que têm interesses em comum, dadas às mesmas condições materiais da existência humana e social. É através da organização da comunidade que as práticas de cooperação são executadas, ocasionando a formação de sindicatos, partidos, associação de moradores, organizações comunitárias entre outros. Conclui-se que a comunicação comunitária é capaz de atender as expectativas de desenvolvimento local e vice e versa, sendo que estes comungam dos mesmos princípios, o que torna a relação possível. Contudo, para melhor compreender as interfaces entre a comunicação comunitária e o desenvolvimento local vale verificar como acontece na prática. Nos capítulos seguintes serão mostrados como se dá essa experiência e os resultados obtidos do projeto de comunicação comunitária no Território do Sisal.
  • 27. 26 2 – Sisal, um Território de Possibilidades. É com o objetivo de promover o desenvolvimento local sustentável que a Comunicação Comunitária ganha força no Território do Sisal. Localizada no semi-árido brasileiro, mas propriamente no Nordeste da Bahia, a Região Sisaleira é considerada uma das áreas com os piores índices de desenvolvimento social e econômico do país. Sua abrangência é de uma área de 21.256,50 Km² sendo composto por 20 municípios: Araci, Barrocas, Biritinga, Candeal, Cansanção, Conceição do Coité, Ichu, Itiúba, Lamarão, Monte Santo, Nordestina, Queimadas, Quinjingue, Retirolândia, Santa Luz, Serrinha, São Domingos, Teofilândia, Tucano e Valente. A população estimada é de cerca de 552.713 habitantes, dos quais 348.222 (63%) ocupam a área rural (segundo o censo demográfico de 2007). Figura 1 – Mapa do Território do Sisal. Fonte: http://sit.mda.gov.br
  • 28. 27 A região caracteriza-se pelo clima seco, com longos períodos de estiagem e vegetação de caatinga, compondo a demarcação do polígono das secas feita pelo governo federal em 1936 (CODES, 2008). As limitações ambientais, assim como, as de caráter cultural, social, política e econômica têm desafiado a plena capacidade que o sertanejo possui de sobreviver. A exploração de pedras, o cultivo do sisal, a pecuária e a agricultura são ali as bases de sustentação econômica mais expressiva para os trabalhadores rurais. A denominação desse território se deve à tradicional cultura da fibra de sisal, extraído da folha do agave, planta rústica originária do México, que consegue se desenvolver em regiões áridas. As primeiras mudas de sisal chegaram em 1910, vindas da Paraíba para o município de Santa Luz. Com boa adaptação ao solo, a planta logo passou a ser cultivada por toda a região, tendo maior produção as cidades de Santa Luz, São Domingos, Valente e Conceição do Coité (MOC, 2005). Sua fibra tem vasta utilização no mercado nacional e internacional, sendo empregada nas indústrias de cordas, papel, confecção, tapetes, entre outros. Nessa região, o vestuário, a música, a culinária, o artesanato em couro e a arte popular em geral, estão marcados pela influência do vaqueiro, expressão de força e resistência, que se espalhou pelo país, ampliando o mercado para produtos e serviços que caracterizam a cultura do nordestino. Antigas tradições ainda tentam resistir à modernização, como o Reisado, o Boi roubado, os Festejos religiosos e a Literatura de cordel, que ainda possuem fiéis adeptos. Porém, as festas de largo, assim como os diversos gêneros musicais, entre outros resultados da modernização, estabelecem o atual contexto de identidade cultural. Um dos primeiro efeitos da modernização ocorria na segunda metade da década de 40 com os primeiros motores de sisal, os quais pertenciam à “gente rica”, fazendeiros e comerciantes. Com a “chegada” à região da legislação trabalhista, os proprietários de motores transferiram tal responsabilidade para os agricultores familiares ou para os próprios
  • 29. 28 trabalhadores, criando-se uma situação inusitada: o dono do motor era, em muitos casos, um trabalhador, mas tinha os seus pares como empregados diante da lei. Tal modificação no desfibramento do sisal, que antes feito de forma artesanal, mas, logo depois com a máquina, acabou acarretando uma série de acidentes de trabalho; em sua maioria resultava em mutilações dos trabalhadores (CODES, 2008). Figura 2 – Trabalhadores desfibrando o Sisal. Fonte: http://www.redetec.org.br Um agravante desse lugar são os indicadores de pobreza e de desigualdade. Em média, mais da metade da população está abaixo da linha de pobreza. Os problemas mais recorrentes são: altos números de analfabetismo e trabalho infantil, concentração da propriedade rural, clientelismo político, inexistência de políticas públicas e falta de investimentos para os produtores rurais. Deve-se levar em consideração que na região onde o setor agropecuário tem importante papel na formação do PIB, a terra passa a ter papel de destaque na formulação de políticas para incrementar a economia. No contexto da globalização e da privatização, o estado brasileiro quase abdicou completamente de ter uma política de desenvolvimento regional, deixando a economia mais livre para ajustar-se de acordo com as forças de mercado, no caso, inteiramente desfavoráveis ao homem e à economia do semi-árido. O mesmo pode ser dito quanto aos serviços que, de modo geral, decorrem da elevação da renda e da diversificação dos padrões de consumo. Em
  • 30. 29 razão do baixo nível de renda e dos baixos índices de desenvolvimento humano, a migração é a grande saída, caminho que vem sendo trilhado não apenas pela população profissionalmente qualificada, mas também por aqueles isentos de profissionalização em busca da obtenção por melhores condições de vida. É o que revelam as letras das canções interpretadas por Luiz Gonzaga: Sem chuva na terra Descamba Janeiro, Depois fevereiro E o mesmo verão Meu Deus, meu Deus Entonce o nortista Pensando consigo Diz: "isso é castigo não chove mais não" Ai, ai, ai, ai (...) Agora pensando Ele segue outra tria Chamando a famia Começa a dizer Meu Deus, meu Deus Eu vendo meu burro Meu jegue e o cavalo Nóis vamo a São Paulo Viver ou morrer Ai, ai, ai, ai Nóis vamo a São Paulo Que a coisa tá feia Por terras alheia Nós vamos vagar Meu Deus, meu Deus Se o nosso destino Não for tão mesquinho Ai pro mesmo cantinho Nós torna a voltar1 As músicas do Rei do Baião traduzem um traço da identidade do sertanejo, um povo que é “forçado” a deixar sua terra pelas adversidades e que ao saber de notícias de chuva, logo voltam confiantes. Um povo religioso que atribui a Deus as dificuldades de sobrevivência, entendendo as desigualdades sociais como um “castigo de Deus”. 1 A Triste Partida, toada, 1964, Patativa do Assaré, RCA Victor. Disponível em: www.luizluagonzaga.mus.br
  • 31. 30 Carente de investimentos por parte do Estado, a população sertaneja é alvo de políticos que se utilizam das mazelas sociais para promoverem seus discursos e reforçar a política da seca, ao invés de solucioná-las. O cenário político é marcado pelo coronelismo2, na maioria dos municípios já se tornou comum apenas uma família estar no poder por várias décadas, configurando uma cultura de dominação. Enraizadas historicamente no Nordeste e evidentemente no semi-árido baiano, as práticas de compra de votos e a relação de troca de favores entre políticos resistem até os dias atuais, o que torna ainda mais emergente a conscientização da população. É na perspectiva de mudança da realidade social que a população rural e urbana passa a se organizar através de ações de mobilização impulsionadas pela Igreja Católica através das Comunidades Eclesiais de Base, sindicatos de trabalhadores rurais, movimentos sociais, entidades locais e organizações não governamentais e públicas. A história social da região registra que esses movimentos nasceram do enfrentamento dos setores populares com as situações de opressões às quais sempre estiveram submetidos. Dentre as experiências de organização popular aí vivenciadas, podem ser lembradas a organização das comunidades de pequenos agricultores, as lutas pela criação dos armazéns populares, contra o clientelismo nas frentes de trabalho durante os períodos de seca, dos mutilados do sisal pela previdência social e pela segurança no trabalho, a luta pela erradicação do trabalho infantil e a luta pela terra, entre outras. (NASCIMENTO, 2005, p.18) Espremidos em propriedades de um ou dois hectares ou sem terra nenhuma, os nativos da Região Sisaleira tem dificuldades de garantir o sustento de suas famílias. A quantidade de terra por eles possuída é na maioria das vezes insuficiente para a sobrevivência no semi-árido, não havendo perspectiva sustentável para as famílias da zona rural. A assessoria dos órgãos cooperativos é entendida como ferramenta utilizada para proporcionar à comunidade uma percepção das possibilidades de investimento na realização de trabalhos locais visando obter uma vida digna no campo. 2 Sistema de poder político autoritário e hegemônico que estruturou-se na República Velha.
  • 32. 31 Espelhando-se na filosofia libertadora implementada pela Igreja Católica, surge o Movimento de Organização Comunitária (MOC) em 1967, com o objetivo de incentivar a transformação da realidade social. Os primeiros sinais da atuação da sociedade se tornam mais visíveis com a organização de agricultores, diretamente ligados à cadeia econômica do território. A mobilização pelo fim dos impostos na comercialização de seus produtos no fim da década de 70, acarretou a criação da APAEB – Associação de Agricultores do Estado da Bahia, entidade regional que atua na organização da comercialização, assistência técnica e crédito. A criação da APAEB foi decisiva para consolidar o movimento de organização dos trabalhadores rurais, iniciado na época com o apoio da Pastoral Rural pertencente à Igreja Católica. No ano de 1993, a APAEB é municipalizada, e os agricultores de cada município que se encarregavam de dar andamento ao projeto. Na década de 80, alguns municípios passaram a compor movimentos sindicais buscando sustentação por meio das APAEB’s, enquanto em outros foram conquistados Pólos Sindicais Regionais. A FATRES - Fundação de Apoio aos Trabalhadores Rurais da Região do Sisal, surge com grande significado nesse período, e posteriormente vão surgindo as cooperativas de créditos na viabilização da agricultura familiar, que ao passar dos anos se espalha pelos municípios. Ao longo do processo de conscientização da população houve muitos desafios, uma vez que os sertanejos já estavam marcados pela submissão. Contudo, a força e a esperança desse povo foram imprescindíveis para lutar por melhores condições de vida. Nos anos 80, a luta dos mutilados do sisal suscitada pelos STR’s (Sindicatos de Trabalhadores Rurais) com o apoio da OIT (Organização Internacional do Trabalho) e do UNICEF (Fundo das Nações Unidas para a infância) teve grande repercussão, o que garantiu ao trabalhador a conquista do direito ao amparo previdenciário, além de reforçar a idéia dos movimentos populares na reivindicação das várias demandas.
  • 33. 32 Uma das primeiras mudanças significativas se deu com a implantação do PETI – Programa de Erradicação do Trabalho Infantil, assistido pelo Governo Federal através do Ministério de Desenvolvimento Social e Combate à Fome3. Com o propósito de combater a exploração da mão-de-obra infantil, o programa prevê o serviço socioeducativo para crianças e adolescentes de baixa renda, dando-os incentivo para que estes se afastem do trabalho precoce e possam ter um futuro melhor. Embora a organização popular já tivesse surtido efeitos, o povo ainda carregava em si o medo e a subserviência, embutidos pelo discurso autoritário das oligarquias dominantes que se disseminou através dos meios de comunicação como o jornal, o rádio e a televisão. O veículo de maior aceitação na região é o rádio, que além do seu baixo custo e longo alcance, contempla a população semi-analfabeta, podendo então atingir as classes subalternas. Na maioria dos municípios as concessões destes veículos públicos pertencem aos mesmos grupos políticos, que os utiliza para a manipulação das massas e abuso de poder, de modo a formar receptores passivos, legitimando a “cultura do silêncio”. Embora tenham ocorrido mudanças tecnológicas ao longo dos anos, os resultados dessas práticas comunicacionais hegemônicas persistem até hoje, o que pode-se nomear de “coronelismo eletrônico”.4 Contudo, um dos maiores problemas que a sociedade civil enfrenta até os dias atuais é a idéia de colocar o povo a protagonizar suas reivindicações, ou seja, poder re-significar o simbolismo que instaurou-se por anos e anos. Conforme Nascimento (2005), diante do estado de necessidade em relação à comunicação nas garantias constitucionais à liberdade de expressão, foram surgindo em meados dos anos 90 as rádios comunitárias. Foi visando promover o diálogo, a aproximação com as comunidades rurais, o debate sobre políticas 3 http://www.mds.gov.br 4 SANTOS, Suzy; CAPPARELLI, Sérgio. Coronelismo, radiodifusão e voto: a nova face de um velho conceito In: BRITTOS, Valério Cruz; BOLAÑO, César Ricardo Siqueira (Org.). Rede Globo: 40 anos de poder e hegemonia. 1 ed. São Paulo: Paulus, 2005, v.1, p. 77101.
  • 34. 33 públicas e o incentivo a participação, que esse meio alternativo foi sendo implantado em vários municípios. É dentro dessa perspectiva de sensibilização e planejamento de ações voltadas para auxiliar o desenvolvimento sustentável do Território do Sisal que surge em dezembro de 2002 o CODES Sisal (Conselho Regional de Desenvolvimento Rural Sustentável da Região Sisaleira do Estado da Bahia). Em 2003, a entidade concebe o PTDRS (Plano Territorial de Desenvolvimento Rural Sustentável da Região Sisaleira) que fora elaborado por representantes dos diversos setores da sociedade civil, o qual prevê a articulação das entidades como exercício contínuo na viabilização das propostas dos eixos prioritário, que são: agricultura familiar, infra-estrutura, comunicação, educação, saúde, cultura e meio ambiente. Conforme cita Moreira (2006), o apoio do Governo Federal através do MDA (Ministério do Desenvolvimento Agrário) e da SDT (Secretaria de Desenvolvimento Territorial), o CODES Sisal passou a coordenar a aplicação dos recursos do PRONAF (Programa Nacional de Agricultura Familiar), no que se refere às políticas de infra-estrutura. Somente em 2004, a espacialidade Território do Sisal passa a ser reconhecido oficialmente no mapa da Bahia. A divisão dos territórios é um acontecimento recente, fruto da Política Territorial criada no primeiro mandato do Governo Lula, o Território da Cidadania é uma estratégia de desenvolvimento regional sustentável e garantia de direitos sociais voltados às regiões do país que mais precisam, com objetivo de levar o desenvolvimento econômico e universalizar os programas básicos de cidadania. Trabalha com base na integração das ações do Governo Federal e dos governos estaduais e municipais, em um plano desenvolvido em cada território, com a participação da sociedade. Em cada território, um Conselho Territorial composto pelas três esferas governamentais e pela sociedade determinará um plano de desenvolvimento e uma agenda pactuada de ações. (MDA, 2008). No caso do Território do Sisal, o CODES Sisal é quem coordena estas ações.
  • 35. 34 Para subdividir os territórios foram definidos conjuntos de municípios unidos pelas mesmas características econômicas e ambientais que tivessem identidade e coesão social, cultural e geográfica. Maiores que o município e menores que o estado, os territórios conseguem demonstrar, de uma forma mais nítida, a realidade dos grupos sociais, das atividades econômicas e das instituições de cada localidade, o que facilita o planejamento de ações governamentais para o desenvolvimento dessas regiões. (MDA, 2008). Contudo, o traço que maior se sobressai para a definição do Território Sisaleiro consiste na reapropriação de um povo de fibra que busca meios para sair da condição de excluídos e se tornarem protagonistas das ações. A construção do desenho cartográfico do Sisal na Bahia demonstra que as limitações regionais são mais políticas que definições geográficas estáticas. Reflete o processo de disputas entre variados atores internos e externos a este território, não entendido como mera questão geográfica ou divisão militar, mas como discurso construído, produto de uma rede de relações entre agentes que se reproduzem e agem com dimensões espaciais diferentes. A divisão cartográfica desse mapa se redesenhou segundo as acomodações de interesse de seu novo ator político e agente comunicativo, que baseado em suas lutas e reivindicações buscou a reconstrução da experiência do que é e do que pode vir a ser o território do sisal. [...] Sentir-se parte do Território do Sisal se enuncia muito mais amplo que um espaço físico localizado no semi-árido nordeste baiano, geograficamente contínuo e definido pela dimensão de seus 20 municípios. Ele apresenta características multidimensionais, tais como o ambiente, a economia, a sociedade, a cultura, a política e as instituições, e uma população, com grupos sociais relativamente distintos, que se relacionam interna e externamente por meio de processos específicos, onde se pode distinguir um ou mais elementos que indicam identidade e coesão social, cultural e territorial. Entretanto, no seu processo de constituição e regulamentação político-cartográfica, prevaleceu a dimensão identitária de resistência dos grupos contra-hegemônicos, ante um longo e complexo processo de disputas. (MOREIRA, 2006, p.124-125) Os movimentos sociais têm se revelado com grande influência na região no sentido de buscar reverter o quadro de exclusão e dominação política. As instituições com maior atuação na região são as associações, sindicatos, cooperativas, ONG’s e órgãos governamentais. O constante trabalho implementado por essas entidades proporciona o surgimento de uma grande parcela de pequenos agricultores, motivados pela perspectiva de tornar produtivo seu habitat através da participação e vigência cooperativa, reconhecendo o trabalho associativo
  • 36. 35 como alternativa de sustentabilidade, contribuição favorável à prevalência em suas localidades de origem, tornando desnecessária a recorrência à emigração. O fortalecimento da região através da organização e mobilização da sociedade civil tem o apoio de entidades que vêm buscando incentivar os membros das comunidades a exercer o papel de cidadãos conscientes, através de seus direitos e deveres. Logo, apresentar os princípios de cada uma dessas organizações que compõe o cenário de luta do Território do Sisal é de grande relevância. 2.1 – “Por um Sertão justo” 5: A causa das organizações que compõem o Território do Sisal. Atualmente, o Território Sisaleiro é considerado famoso pela atuação do terceiro setor. Na maioria dos seus municípios, a luta por políticas públicas e por justiça social nos diversos setores da sociedade tem ganhado expressividade. Sendo assim, faz-se necessário conhecer a contribuição das entidades de maior destaque nessa empreitada. A FATRES é uma organização da sociedade civil, sem fins econômicos, de natureza beneficente, considerada de utilidade pública municipal e estadual. Desde sua fundação em 1996, direcionou sua atuação aos trabalhadores rurais, tendo como foco estratégico de ação para o alcance de seus objetivos institucionais estratégicos, os dirigentes e lideranças sindicais rurais, no sentido de fortalecer diretamente as organizações sindicais (STRs), de mobilizá-las e articulá-las para fazerem frente às questões sociais relacionadas à realidade rural da região. A Fundação tem priorizado conteúdos formativos como políticas públicas para fortalecimento da agricultura familiar, cooperativismo e associativismo, formação sindical, formação de conselheiros, etc, enquanto forma estratégica de organização dos produtores para acesso ao crédito e ao mercado, planejamento estratégico e gestão institucional, alternativas de Assessoria Técnica Social, Cultural e Ambiental e captação, armazenamento e gestão de recursos hídricos, adequadas e viáveis à 5 Slogan do MOC – Movimento de Organização Comunitária.
  • 37. 36 convivência no e com o semi-árido, bem como o incentivo a experiência geradoras de trabalho e renda. (CODES, 2008, p. 66) Neste cenário, temos também a APAEB Valente. A instituição foi fundada em 1980 diante das reivindicações dos produtores rurais e da iniciativa do MOC. Desde então, o objetivo da APAEB é melhorar a qualidade de vida das famílias de agricultores com trabalhos voltados a garantir o sustento econômico, a inclusão social, visando o desenvolvimento ecologicamente sustentável, a promoção social e a defesa dos direitos dos trabalhadores. Dentre suas áreas de competência estão: a produção agrícola, a gestão econômica, a capacitação de pessoas, a industrialização de produtos agrícolas, a influência no processo de formulação de políticas públicas e a realização de pesquisas e estudos. A associação recebe o apoio financeiro de vários parceiros a nível nacional e internacional, o que lhe permite gerir projetos que ajudem a população a conviver com a seca. É conceituada na região por gerar renda através dos empregos diretos e indiretos com suas ações. São cursos profissionalizantes por meio da Escola Família Agrícola, linha de crédito para o pequeno produtor através do SICOOB COOPERE, Cooperativa de Crédito do Semi- árido da Bahia, assim como, lazer aos seus associados com o clube social, incentivo aos produtores com a implantação das batedeiras comunitárias e aos artesãos com a fábrica de tapetes de sisal, entre outras atividades. Além disso, a instituição ainda dispõe de três veículos de comunicação que servem para aproximá-la à população e seus associados, são eles: a TV Valente, a Rádio Comunitária Valente FM e o Jornal A Folha do Sisal. A APAEB também conta com o espaço Casa da Cultura que promove a valorização da cultura popular regional. Logo, com a organização da sociedade, as limitações do lugar se tornam um aspecto favorável para repensar a participação e a cidadania, como fica claro no slogan da associação em que diz: “O Sertão tem tudo que se precisa, se faltar a gente inventa”.
  • 38. 37 Uma outra instituição que desempenha um trabalho eficaz na região é o MOC, entidade filantrópica que desde sua criação dirige sua atuação com e para as populações menos favorecidas, discriminadas, suscitando e fortalecendo organizações comunitárias rurais e urbanas, que tivessem a missão de promover o desenvolvimento local e territorial sustentável. Sediada em Feira de Santana, a instituição desenvolve seus trabalhos em alguns municípios da Bahia, inclusive na Região Sisaleira, mas sua metodologia de apoio à mobilização da sociedade civil na luta pelo exercício dos seus direitos se estende até mesmo para outros estados, como Sergipe. O MOC tem como parceiros: o Governo Federal, Regional e Municipal; a United Nations Children's Fund – UNICEF –; Every Child (Inglaterra); Cordaid (Holanda); Cooperativas de Crédito (Sistema de Crédito Cooperativo – SICOOBs – e Associação das Cooperativas de Apoio à Economia Familiar – ASCOOB); Associação dos Pequenos Agricultores – APAEBs –; Universidade Estadual de Feira de Santana – UEFS –; Secretaria do Trabalho e Ação Social – SETRAS; etc. Seus principais projetos se baseiam em cinco programas, são eles: 1)Programa de Fortalecimento da Agricultura Familiar no Semi-árido (viabilizar a agricultura familiar através de busca de crédito para produção; preparação para a convivência com a seca; formação cidadã para interferência em políticas públicas; e assistência técnica) – possui três sub-programas: Agroindústria e Comercialização, Assistência Técnica e Capacitação, Recursos Hídricos e Crédito –; 2) Programa de Gênero (implementar vivência de eqüidade de gênero na escola, na construção de políticas públicas e na agricultura familiar; e assessorar o Movimento de Mulheres Trabalhadoras Rurais para o seu fortalecimento na intervenção em políticas públicas); 3) Programa de Educação Rural – que tem como sub-programas a Formação de Monitores da Jornada Ampliada (Programa de Erradicação do Trabalho Infantil – PETI), a Formação de Professores Rurais (CAT – Conhecer, Analisar e Transformar), e o Baú de Leitura –; 4) Programa de Políticas Públicas (formação de representantes das organizações e dos movimentos sociais para fiscalizar e propor políticas públicas; fortalecimento da sociedade civil no meio político; monitoramento e colaboração em programas públicos; e formação de conselheiros da sociedade civil, para diagnosticar as necessidades políticas na área de atuação dos conselhos) – divide-se em três sub-programas: Conselhos Municipais de Gestão, Defesa dos Direitos da Criança e Adolescente (PETI) e Organização e Fortalecimento da Sociedade Civil –; e 5) Programa de Comunicação – qualificar as ações desenvolvidas nas áreas de assessoria e articulação das rádios comunitárias; favorecer uma comunicação interna; criação e atualização de produtos institucionais (ex: o site); e coordenar o jornal Gira Mundo em parceria com o projeto especial do MOC, chamado Comunicação Juvenil. (PORTINHO, 2004, p.2-3)
  • 39. 38 A organização aposta em uma educação inovadora, baseada nos princípios de Paulo Freire, para gerar oportunidades na construção de conhecimentos e assim motivar a população desfavorecida a buscar meios de organização. Em face da realidade regional e com esses princípios de transformação, o público prioritário do MOC compreende trabalhadores rurais, empreendedores familiares, professores rurais, movimento de mulheres, organizações populares, crianças, adolescentes, jovens, comunicadores sociais e órgãos partidários de gestão. “O MOC vem tentando dar sua contribuição ao processo de construção e desenvolvimento sustentável da região sisaleira, sem perder de vista a noção holística, considerando, inclusive, o local e o global como parte de um processo”. (RODRIGUEZ, 2005, p.216). Os Sindicato de Trabalhadores Rurais que prestam um fundamental apoio na luta por melhores condições de vida do homem e da mulher do campo e têm sido de fundamental importância para as conquistas no Território do Sisal. Espalhados pelos municípios, eles são articulados em prol da defesa dos direitos trabalhistas, no combate ao trabalho infantil e escravo, da Previdência Rural, da Educação e Saúde para o campo, da Reforma Agrária e do Fortalecimento da Agricultura familiar. Segundo o PTDRS do CODES (2006) os STR’s têm como objetivo maior a representação dos Trabalhadores Rurais. Tem como público pequenos agricultores e agricultores familiares, meeiros, posseiros, arrendatários, comodatários. A região ainda conta com os serviços da ASCOOB, Associação das Cooperativas de Crédito da Agricultura Familiar, criada oficialmente em 1999 por cinco Cooperativas de Crédito Rural com atuação nas micro-regiões semi-árida e litorânea da Bahia, tendo como missão: fortalecer a economia familiar solidária, através do cooperativismo de crédito, fomentando os processos de desenvolvimento local integrado, sustentável e solidário do estado da Bahia. Atualmente, conta com 10 cooperativas filiadas com pontos de atendimento em 34 municípios do estado, abrangendo oito territórios e uma base de mais de 41.000
  • 40. 39 cooperados. Dispõe de parcerias com os Bancos do Brasil e do Nordeste e atua a nível nacional juntamente com a ANCOSOL (Associação do Cooperativismo de Economia Familiar e Solidária), e a UNICAFES (União Nacional de Cooperativas da Agricultura Familiar e Economia Solidária). A filiada de maior destaque na região semi-árida da Bahia é a Cooperativa Valentense de Crédito Rural - SICOOB COPERE, que foi criada em 1993. A cooperativa surgiu da iniciativa da APAEB Valente que tinha um programa chamado de “Poupança- APAEB”. Tratava-se de um fundo rotativo feito pelos seus associados, que logo passou a realizar pequenos financiamentos e mais tarde começou a disponibilizar capital de giro para a própria indústria de beneficiamento de sisal mantida pela associação. Com a proporção do crescimento de empréstimos e número de associados se deu início a SICOOB COPERE. Um dos grandes diferenciais é que a finalidade maior da cooperativa não é o lucro e sim o desenvolvimento regional. Já a ARCO SERTÃO, Agência Regional de Comercialização do Sertão da Bahia é uma associação formada por 30 empreendimentos econômicos solidários dos Territórios Bacia do Jacuípe, Sisal e Portal do Sertão, que visa a inserção dos produtos das associações e cooperativas de agricultores familiares no mercado. Uma das principais metas é a qualidade social e ambiental, além do retorno econômico e o fortalecimento de suas organizações. A organização promove a intercooperação dos empreendimentos filiados. Desta forma, ela busca a inclusão social e econômica dos empreendimentos através da formação política dos trabalhadores rurais, visando comercializar os produtos da Agricultura Familiar e Economia Solidária. Os empreendimentos filiados a ARCO Sertão estão distribuídos por 13 municípios localizados no semi-árido baiano. Em total, são beneficiadas mais de 2.500 agricultores familiares, que através da ARCO tem acesso ampliado ao mercado, gerando renda e cidadania na região. Seus parceiros são: FETRAF (Federação dos Trabalhadores na Agricultura
  • 41. 40 Familiar), SEAGRI (Secretaria Estadual de Agricultura, Irrigação e Reforma Agrária), UNICAFES (União das Cooperativas da Agricultura Familiar e Economia Solidária), MDA (Ministério do Desenvolvimento Agrário) / SAF (Secretaria da Agricultura Familiar), PNUD Brasil - Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento. Uma outra organização forte é o MMTR, Movimento de Mulheres Trabalhadoras Rurais, que surgiu na Região Sisaleira em 1984 com estratégias de construção, mobilização e defesa dos direitos civis, políticos, sociais e econômicos das mulheres. Em 2006, foi criado o conselho fiscal do movimento com o objetivo de promover a discussão em torno da representação política das mulheres rurais e desenvolver ações de qualificação profissional de mulheres do campo para a geração de oportunidade de trabalho e renda. Atualmente, o MMTR está presente em sete municípios da Região Sisaleira da Bahia, desenvolvendo ações que atendem a 150 mulheres diretamente. Com a organização do grupo, elas conseguiram conquistar importantes espaços de discussão na região, como o Conselho Regional de Desenvolvimento Sustentável da Região Sisaleira do Estado da Bahia (MOC, 2006). O Território ainda dispõe do apoio do CODES Sisal. Idealizado em 2002, o conselho foi criado com o intuito de aproximar o poder público da comunidade. Formado pela sociedade civil juntamente com representantes governamentais e também de várias entidades que estão inseridas no território, o CODES visa atender as demandas dos diversos setores da região criando mecanismos que possibilitem implementar uma política de desenvolvimento para o território. O CODES é uma resposta social, tanto quanto à capacidade das entidades locais se organizarem, quanto de tornar suas práticas de desenvolvimento social intrínsecas ao poder público, através da discussão e aprovação de políticas públicas multi-setoriais e únicas para o território, a fim de aumentar o impacto social e a eficácia dos recursos alocados na criação e consecução destas políticas. (NATALÍCIO E MENDES, 2007, p.8). Pensando nas prioridades da região, foi elaborado em 2003 o PTDRS que tem como
  • 42. 41 missão: Contribuir para o desenvolvimento integral, participativo e ecologicamente sustentável do Território Sisal, priorizando o fortalecimento da cidadania, a erradicação da exclusão social e a melhoria da qualidade de vida, através da articulação dos sujeitos e das políticas públicas, apoiando e incentivando ações e projetos referenciais. Nesse contexto, a importante atuação das entidades que compõem o Território foi imprescindível na construção do Plano, assim como, frente a tantas outras lutas a caminho do desenvolvimento. O trabalho realizado por essas organizações gera a participação coletiva, a sustentabilidade, a conscientização e, sobretudo, o capital social6. Um outro elemento importante na construção de uma sociedade mais forte e atuante é o trabalho através da comunicação. Diante da história de dominação político-cultural apoiada durante séculos na região, emergem os mecanismos de Comunicação Comunitária como possibilidade de rompimento com as práticas discursivas que impõe o “silêncio” e a hegemonia de opiniões, como é feito comumente na mídia comercial. O Território do Sisal caracteriza-se pela expressividade das rádios comunitárias enquanto meio de difusoras dos ideais de desenvolvimento local. Sendo assim, é necessário compreender de que forma a comunicação vem contribuindo para sanar as dificuldades existentes nesse lugar. 2.2 - A comunicação comunitária no Território do Sisal. As rádios comunitárias foram os primeiros mecanismos de utilização das novas tecnologias na elaboração de contra-discursos. Elas traduzem a fragmentação da comunicação na experiência dos movimentos e a apropriação destes dos novos cenários comunicativos como estratégia das lutas simbólicas locais. (FERREIRA E MOREIRA, 2005, p.6). 6 Para Putnam (In: Moura e Barros, 2008), o capital social é uma característica de organizações sociais, como as redes, as normas e a confiança, que facilitam a ação e a cooperação com vistas a um benefício mútuo.
  • 43. 42 O surgimento das Rádios Comunitárias na região aconteceu mediante a falta de veículos comprometidos com as demandas sociais das localidades. Na sua maioria, os donos dos meios de comunicação são políticos ou pertencem à mesma família, o que acarreta na concentração do poder da informação nas mãos de poucos, contribuindo assim, para uma sociedade cada vez mais alienada e passiva. De acordo com Nascimento (2005), as rádios comunitárias inseridas no Território do Sisal são frutos da necessidade dos movimentos sociais locais em se comunicarem com suas bases sociais. Nessa perspectiva, Cogo (1998, p.55) citando Santoro, aponta: O uso do rádio articulado [...] inserido e legitimado em movimentos e lutas populares que lhe dêem razão de existir, presta-se maravilhosamente a um novo uso voltado à promoção do ser humano, fundamentado no diálogo, em sua participação e libertação. Com o incentivo da Igreja Católica, STR’s, Apaebs, MOC, entre outras entidades a nível nacional e internacional; as rádios comunitárias vão alcançando expressividade em meados do final dos anos 90 e início de 2000, configurando um fenômeno na região. Além de levar informações principalmente às comunidades da zona rural, que têm o rádio como único meio de se manterem conectadas aos acontecimentos, as rádios têm desempenhado um papel social fundamental para o fortalecimento da sociedade, enfatizando em seus discursos, debates a respeito da cultura, educação, meio ambiente, saúde, políticas públicas e entre outras questões. Contudo, é pelo caráter democrático que as rádios comunitárias criam impacto, ou seja, por reconhecerem a população enquanto interlocutores legítimos. Peruzzo (2007) vai dizer que a democracia no poder de comunicar é condição para ampliação da cidadania. Portanto, a participação popular nas experiências de comunicação comunitária representam um avanço significativo na democracia comunicacional.
  • 44. 43 Pensada em sua dimensão política, apesar dos conflitos e contradições inerentes ao próprio movimento, ela torna-se elemento central de um modelo comunicativo baseado na participação a partir da construção cotidiana da realidade. Tendo forte inspiração em Paulo Freire, boa parte dessas iniciativas inspirara-se em sua teoria da comunicação dialógica e libertadora. (FERREIRA E MOREIRA, 2005, P.6). No relatório sobre as rádios comunitárias da Região Sisaleira coordenado no ano de 2005 pelo pesquisador Antonio Dias do Nascimento, as radcom’s da região se destacam pelo espaço plural, de reivindicações, informação, valorização da cultura local; onde priorizam em sua programação jornalística os acontecimentos locais, na programação musical a inserção dos artistas da terra, além do serviço de utilidade pública. Entretanto, as dificuldades para manter esses meios são grandes, devido a fatores como escassez de recursos financeiros e humanos, processo de legalização e a repressão por parte da Anatel (Agência Nacional de Telecomunicações) e Polícia Federal. Porém, ao longo dos anos vão surgindo alternativas para amenizar os problemas encontrados. No que diz respeito à arrecadação de verbas, as saídas são os patrocínios, apoio cultural e ajuda da comunidade e das associações. Já as perseguições dos órgãos federais, acontecem na maioria das vezes por causa de denúncias feitas ou pelos donos de rádios comerciais, por representantes do poder público municipal ou por outros setores que são criticados ou denunciados pelas rádios, que por não serem outorgadas terminam tendo seus equipamentos apreendidos, o que causa indignação a população. Nesse sentido, surge em 2004 a ABRAÇO SISAL (Associação Brasileira de Rádios Comunitárias) voltada a representar e defender legalmente as rádios. Consolidada como a primeira entidade de comunicação do Território, ela têm como objetivo central contribuir para a democratização da comunicação local. Atualmente a ABRAÇO SISAL conta com 17 rádios comunitárias filiadas, as quais prestam um trabalho de acompanhamento, apóiam as emissoras com capacitações técnicas e de conteúdo, além de orientá-las quanto a informações sobre o
  • 45. 44 desenvolvimento do Território. Uma outra deficiência que já vem sendo solucionada é a falta de profissionais capacitados. Apesar de grande parte dessas rádios serem formadas por voluntários, a qualificação desse pessoal vem sendo articulada pelo programa de comunicação do MOC criado em 2002 com o apoio do UNICEF e da ONG CIPÓ (Comunicação Interativa), o qual presta suporte e assessoria na construção de uma política cultural comunicativa para o Território. O Projeto de Comunicação Juvenil desenvolvido pelo MOC juntamente com o Instituto Credicard, objetivou-se na mobilização de jovens e entidades sociais em torno de questões como juventude, democracia e participação. O projeto baseia-se no processo de formação e qualificação de jovens em técnicas de rádio e jornalismo. Um dos resultados desse trabalho foi criação em 2005 da Agência Mandacaru de Comunicação e Cultura (AMAC), que desde então presta serviços de divulgação, cobertura de eventos, produz jornais, boletins impressos, folders, fotos, campanhas, vinhetas e programas radiofônicos, além de prestar assessoria de comunicação aos movimentos locais. Boa parte das rádios intituladas como comunitárias espalhadas no Território, atuam de acordo com os conceitos de comunitário. A exemplo disso, temos a Rádio Comunitária Santa Luz FM e a Valente FM, que após muitos anos buscando a legalização, finalmente conseguiram a outorga. Essas conquistas ajudam a sociedade civil organizada e as entidades da região a reafirmar que as rádios comunitárias, enquanto meios democráticos, de cunho educativo, facilitadores do exercício da cidadania, são instrumentos eficazes na luta contra a exclusão social, mas também, passam a ver esses veículos como poderosos mecanismos em prol do desenvolvimento das comunidades. Considerando serem as rádios comunitárias instrumentos importantes para a promoção do desenvolvimento sustentável local, considera-se ser importante aprofundar os mecanismos de envolvimento das comunidades na promoção, implementação e consolidação desses meios enquanto instrumentos de resgate e valorização dos saberes tradicionais; de ampliação das vozes das populações locais;
  • 46. 45 de afirmação da cidadania e justiça social; de democratização dos processos de desenvolvimento social, econômico e cultural; bem como da necessidade de potencializar a participação comunitária no planejamento e gestão de programas que visam tornar as rádios comunitárias “sustentáveis” ou até mesmo “auto- sustentáveis”. Isto significa que todo o programa de desenvolvimento local deve ter em conta a ação comunicativa veiculada pela rádio comunitária, comunicação no sentido educativo, mobilizando as populações serviços voluntários e cooperativos em prol da sustentabilidade da própria rádio. (JANE, 2004, p. 184) Neste sentido, as rádios comunitárias são agentes fundamentais para a mobilização dos movimentos sociais junto às comunidades, sendo assim, peças chave para integração. Todavia, esse meio alternativo precisa também garantir formas auto-sustentáveis e não somente ser pensados enquanto facilitador do processo. A comunicação comunitária deve ser trabalhada num programa de desenvolvimento local, de modo, que ela também se desenvolva, se fortaleça, para assim atingir seus idéias de cidadania. É com esse objetivo que as rádios comunitárias vêm lutando na Região. O povo que antes era marcado por uma cultura de dominação, silêncio e submissão, agora se vê frente aos debates da construção de políticas de desenvolvimento territorial, com intuito de alcançar uma cultura de participação. Então, a sociedade civil através do CODES busca legitimar seu discurso e define o conceito de desenvolvimento mais pautado nas ações sociais. Logo, as discussões por um modelo comunicacional alternativo para o Território fazem com que se defina em meio a seminários e oficinas envolvendo diversos atores da sociedade, a constituição do Eixo de Comunicação no PTDRS, dentre as demais prioridades. Essa inserção sinaliza a necessidade de pensar a comunicação de forma estratégica para o desenvolvimento do Território do Sisal. Para melhor tratar, debater e elaborar as estratégias do eixo de comunicação foi formado o Grupo Temático de Comunicação (GT-Com), sendo esse, composto por representantes das rádios comunitárias (ABRAÇO Sisal), da Agência Mandacaru de Comunicação e Cultura, das entidades como o MOC, Sindicato de Trabalhadores Rurais,
  • 47. 46 Apaeb Valente, e da Universidade do Estado da Bahia (UNEB – Campus XIV). De acordo com Peruzzo (2007, P.14), “a formação de conselhos e/ou comitês locais de comunicação, são maneiras de avançar na utilização das tecnologias de comunicação para colocá-las a serviço do desenvolvimento comunitário e da cidadania”. Os embates em torno do quadro comunicacional da região serão tratados no capítulo seguinte, onde veremos como estão sendo concebidas as ações e projetos previstos no Plano Territorial do CODES Sisal. Serão analisados os resultados das ações, assim como os desafios e perspectivas encontrados pelo GT de Comunicação.
  • 48. 47 3 - Comunicação Comunitária e Desenvolvimento Local: uma prioridade ou uma resistência? Os debates em torno da necessidade de se repensar a comunicação do Território do Sisal começam a ser pleiteados a partir do momento em que as rádios comunitárias passam a se organizar, o que envolve o surgimento da ABRAÇO Sisal, assim como, a atuação dos jovens comunicadores através de iniciativas como a criação da Agência Mandacaru de Comunicação e Cultura. Outro aspecto essencial foi a formação do Programa de Comunicação do MOC, que contribuiu significativamente para um maior engajamento desse atores que passaram a lutar por condições que viabilizassem o fortalecimento da comunicação. Com o apoio do CODES SISAL e de outros setores da sociedade, foi implantado o curso de Comunicação Social com habilitação em Rádio e TV no campus da UNEB (Universidade do Estado da Bahia) em Conceição do Coité. Além dessa, uma outra conquista importante foi a inserção do item comunicação ao plano de desenvolvimento do CODES, o que caracteriza um diferencial do Território. Constituindo-se como um dos eixos prioritários no Plano Territorial de Desenvolvimento Rural Sustentável com edições de 2006 a 2008 (em anexo), a comunicação aparece, dentre os outros eixos, como programação elementar na promoção do desenvolvimento local. Sendo assim, serão avaliadas as concepções, objetivos e ações elaboradas para este eixo, uma vez que a comunicação estratégica foi concebida especialmente pelo MOC, apropriado dos conhecimentos de Relações Públicas. O intuito do capítulo é identificar a importância do eixo enquanto potencializador da ação coletiva da própria organização popular, e por fim pontuar os resultados das ações do plano, bem como, trazer as reflexões sobre a realidade da comunicação comunitária no Território. Portanto, foram analisados os seguintes documentos: PTDRS, o Relatório do MOC