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Transcriçãode RTP Ensina – Amor de Perdição (p. 190)Duração:
12:46 minutos
(Narrador) Aos 35 anos Camilo Castelo Branco vive o maior dilema da sua vida.
Perseguido pela justiça, hesita entre fugir e entregar-se à prisão. O seu amor proibido com
Ana Plácido já pôs a mulher que ama atrás das grades e Camilo sabe que é o próximo. É
já conhecido como escritor e está em risco de ser enviado para o exílio. Com medo, tenta
escapar à justiça. Esconde-se em casas de amigos, de terra em terra, adiando o inevitável.
Quando desiste de fugir e se entrega, abre caminho para a grande mudança da sua vida.
O ano que passa na cadeia da Relação é decisivo. Como se fosse uma questão de vida ou
morte, Camilo Castelo Branco escreve sem parar. Em 15 dias termina aquele que será o
seu livro mais célebre. O Amor de Perdição chega ao público em 1862 e torna-se um
tremendo êxito. Os leitores choram as desventuras do amor puro que se confronta com a
tragédia. Vivem como seus os amores trágicos de Simão, Teresa e Mariana.
(Voz de Camilo Castelo Branco) “Amou, perdeu-se e morreu amando.” É a
história! História assim poderá ouvi-la a olhos enxutos, a mulher, a criatura mais bem
formada das branduras da piedade a que por vezes traz consigo do céu um reflexo da
divina misericórdia? Essa, a minha leitora, a carinhosa amiga de todos os infelizes, não
choraria se lhe dissessem que o pobre moço perdera a honra, reabilitação, pátria,
liberdade, irmãs, mãe, vida, tudo, por amor da primeira mulher que o despertou do seu
dormir de inocentes desejos?
(Narrador) Alguém poderia dizer: não há coincidências, e não há de facto. Camilo
Castelo Branco está preso na cadeia da Relação do Porto por causa de um amor
impossível. Para passar o tempo escreve um romance genial sobre o amor trágico que
leva o seu protagonista à cadeia da Relação, no Porto.
(Isabel Rocheta – Prof. Universitária FL/UL) De alguma maneira, quando Camilo
escolheu o subtítulo de Amor de Perdição, Memórias de uma Família, está a estabelecer
uma identificação. Quando abrimos a novela, na introdução, encontramos logo a figura
de Simão através de um registo das cadeias da Relação do Porto, em que Simão aparece
com a indicação da sua filiação.
(Annabela Rita – Prof. Universitária FL/UL) Nós verificamos que ele, sujeito,
narrador, que se assume como autor que escreve aquele texto, e que escreve nas
circunstâncias em que um seu antepassado também, circunstâncias semelhantes às que
um seu antepassado viveu, e que se encontra no mesmo lugar, portanto é essa
coincidência, essa duplicidade que adensa a tragédia, coincidência que ele vai explorar, é
exatamente essa coincidência que justifica que ele escreva. Ele encontra o registo da
prisão de Simão Botelho, seu tio, tio-avô. O que importa é que é com base numa alegada
coincidência de situações que ele vai contar a história de Simão Botelho. E essa história
é coincidente com a sua. Portanto, ao denunciar a situação enfim…da perseguição e da
injustiça, e ao reivindicar o direito ao amor e à paixão e à concretização disso, ele está a
defender-se a si próprio.
(Francisco Moita-Flores – Escritor) Porque ele confessa-se. Aquela narrativa é
uma autoconfissão. E é uma autoconfissão de desespero. E qualquer homem, ou qualquer
mulher, sente nesse desespero do amor, nesse desespero do desejo, nesse desespero do ter
e não ter, do sonhar que tem, mas não vai ter, da impossibilidade, na possibilidade de
tocar e não tocar.
(Narrador) Em 1849, num baile de carnaval, Camilo Castelo Branco conhece o
amor de uma vida. Ana Plácido, inocente de 17 anos, solteira ainda. Camilo apaixona-se
nesse momento, mas de pouco vale. Um ano depois, Ana Plácido casa com Manuel
Pinheiro Alves, emigrante que fizera fortuna no Brasil. Camilo vai para Lisboa
determinado a fazer-se escritor, mas os planos não correm como previsto. Volta ao Porto,
muda de vida, ingressa num seminário. A vocação religiosa também falha. Fica no Porto
e regressa à escrita. Vai publicando furiosamente. Torna-se conhecido a partir de 1856
com a edição de Onde está a felicidade? obra elogiada por muitos, entre eles Alexandre
Herculano.
(Aníbal Pinto de Castro – Diretor Casa de Camilo) No Onde está a felicidade?
Camilo captou alguns dos ingredientes mais importantes na sociedade portuguesa do
século XIX, e particularmente a importância do dinheiro como motor da sociedade. No
que estará também alguma presença do endinheiramento introduzido na província
portuguesa pelos brasileiros de torna-viagem. Ele, a partir daí, capta certos movimentos
que depois se vão prolongar por toda a obra, mas que dão a Onde está a felicidade? esse
papel de iniciador e de uma nova orientação na ficção romanesca.
(Voz de Camilo Castelo Branco) Sou o homem mais feliz do mundo…
(Narrador) Com a fama veio finalmente a concretização da paixão. Em 1858, a
relação de Camilo e Ana Plácido é comentada da Foz até à Campanhã e torna-se no
escândalo preferido das boas famílias.
(Atores)
— Isso é mesmo verdade?
— Verdade?
— Sim, essa história da Ana Plácido e do Camilo.
— Eu acho que sim, eu acho que ela saiu de casa abandonando o marido.
— Ai…
(sonhos…)
(Narrador) Ana abandona a casa do marido e vai viver com Camilo. Para escapar
à pressão social, Camilo, Ana e o filho, mudam-se para Lisboa.
(Atores)
— Essa mulher manchou a sua honra. É altura de lutar e não se deixar vencer.
(Narrador) Pinheiro Alves tenta negociar o fim da relação, disposto a receber a
sua mulher de volta a casa mas não tem sucesso. A paixão é forte e falam mais alto que
os laços do matrimónio.
(Atores)
— Meu Deus, não sei, mas eu já não sei esperar.
(Narrador) Em dezembro de 1859, o marido enganado leva o caso à justiça. Ana
Plácido é acusada de crime de adultério e Camilo de copular com mulher casada. Ana é
presa em junho e Camilo, depois de uma breve fuga, entrega-se a 1 de outubro. É uma
novela seguida com avidez pelo povo.
(Mário Cláudio – Escritor) Toda a gente conhecia o que tinha acontecido com os
amores difíceis do Camilo com a Ana Plácido. A cidade do Porto, que nessa altura era
um meio literário muito forte, muito importante, acompanhou isso com muita curiosidade,
com muito interesse, e às vezes de uma forma um pouco doentia até, e portanto isso
também teria contribuído para o sucesso do romance.
(António Trabulo – Escritor) Mas no fim de contas Camilo tinha uma coisa
extraordinária: antes de haver publicitários, ele era já um publicitário extraordinário. Ele
estava na cadeia por causa de um amor infeliz. O que é que fez a promoção do Amor de
Perdição? Foi o amor infeliz, foi o facto de ele e Ana Plácido estarem na cadeia naquele
momento. Camilo nisso tinha um sentido de oportunidade notável.
(José Manuel Oliveira – Bibliotecário e Museólogo casa de Camilo) Criou-se em
torno do julgamento de Camilo Castelo Branco e de Ana Plácido, uma espécie de fações
(não é?), umas que eram a favor de Camilo, outras que eram a favor de Pinheiro Alves.
A verdade é que mesmo nos jornais e mesmo em termos públicos, Pinheiro Alves
encarregou-se de fazer alguma publicitação do escândalo desta relação. A verdade é que
Camilo Castelo Branco acabou por conseguir dar volta a isto tudo. E o escrever o Amor
de Perdição não é tão inocente assim. Independentemente do aspeto literário da obra, eu
creio que provavelmente também há aqui um fator muito forte de tentar convencer os 12
jurados de que ele se perdera por amor. E a melhor forma de convencer os 12 jurados era
convencer as 12 mulheres dos 12 jurados e ele conseguiria isso através de uma obra como
foi o Amor de Perdição.
(Voz de Camilo Castelo Branco) Escrevi o romance em quinze dias, os mais
atormentados de minha vida, tão horrorizados tenho deles memória, que nunca mais
abrirei o Amor de Perdição. Nem passarei a lima sobre os defeitos em edições futuras.
(Narrador) Era ainda no prefácio da 2.ª edição que Camilo prometia não mais
voltar à sua obra-prima. Mas ainda o reviu três vezes, tantas quantas as edições que viu
na praça.
(Isabel Rocheta – Prof. Universitária FL/UL) Em 1861, Camilo está realmente a
entrar no auge da maturidade, e Amor de Perdição foi, desde o momento da sua
publicação, uma obra reconhecida como uma grande novela. Penso que na construção das
personagens, na verosimilhança que de facto Camilo conseguiu, num realismo que não é
de escola, mas que surge nas falas, na mímica, na apresentação das personagens, está
possivelmente uma das chaves do êxito desta obra. O desenlace é extremamente
conseguido… É de facto uma obra-prima camiliana.
(Ana Maria Magalhães – Escritora) O Amor de Perdição é uma obra magnífica,
mas é também uma obra de emoções muito, muito fortes, e portanto mesmo pessoas que
não tinham grande preparação ou instrução para poder apreciar a qualidade literária do
texto, aderiam apaixonadamente àquelas personagens, àquele enredo, liam na esperança
de que as coisas se resolvessem, que afinal o desfecho não fosse tão trágico; o ritmo da
história, o desenho das personagens tão nítido, aqueles que Camilo construiu para que
nós os amassemos e aqueles que construiu para que os odiássemos.
(Narrador) O livro conta-nos os amores trágicos de Simão Botelho e Teresa
Albuquerque. Filhos de famílias inimigas, preferem morrer a desistir do amor que os une.
Representam a liberdade de amar contra as exigências sociais. A narrativa de Camilo é
visual, popular e comovente.
(João Bigotte Chorão – Ensaísta) Eu julgo que é de facto a nossa versão de Romeu
e Julieta. Aliás Camilo conhecia bem Shakespeare e tinha até na sua biblioteca livros do
Shakespeare. Portanto é de facto um rapaz e uma rapariga que se amam, e o amor deles é
contrariado de uma maneira violenta pelas famílias. Camilo conseguiu, ao contrário do
que acontece noutros livros seus em que ele se derrama em considerações exteriores à
narrativa, ali ele não perde o fio à meada.
(Narrador) Simão, o grande herói é um jovem turbulento que o grande amor
transforma.
(Voz de Camilo Castelo Branco) Os quinze anos de Simão têm a aparência de
vinte. É forte de compleição. Belo homem, com as feições de sua mãe e a corpulência
dela, mas de todo avesso em génio.
(Narrador) Teresa é uma jovem fidalga de província que desafia o poder paterno
e, por amor, recusa um casamento de conveniência com o seu primo Baltasar Coutinho.
(Voz de Camilo Castelo Branco) Amava Simão uma sua vizinha, menina de
quinze anos, rica herdeira, regularmente bonita e bem-nascida. Da janela do seu quarto é
que ele a vira pela primeira vez para amá-la sempre. Não ficara ela incólume da ferida
que fizera no coração do vizinho. Amou-o, também, e com mais seriedade que é usual
nos seus anos.
(Narrador) Há ainda Mariana, a jovem do povo que se apaixonará por Simão ao
ponto de escolher morrer. Essa figura que tudo faz pelo amado acentua a grandeza da
tragédia.
(Atores)
— Os sentimentos do coração só os posso agradecer com amizade.
— E eu já lhe pedi mais alguma coisa, Sr. Simão?
(Voz de Camilo Castelo Branco) O ferrador tinha uma filha, moça de 24 anos,
formas bonitas, rosto belo e triste. Notou Simão os reparos em que ela se demorava a
contemplá-lo, e perguntou-lhe a causa daquele olhar melancólico com que ela o fitava.
Mariana corou, abriu um sorriso triste, e respondeu: — Não sei o que me adivinha o
coração a respeito de vossa senhoria. Alguma desgraça está para lhe suceder.
(Eunice Cabral – Prof. Universitária UÉvora) A figura de Mariana é
absolutamente espantosa. Não direi que seja uma mulher anjo, mas é a mulher abnegada,
a mulher pura, a mulher que pratica um amor incondicional, muito à maneira romântica,
que aparece, eu não direi em conflito, porque não há conflito, como sabemos (não é?),
mas aparece em contraste com a Teresa; que suicida-se no final, porque tem de
acompanhar Simão.
(Mário Cláudio – Escritor) A Teresa é pintada como é pintada a heroína da época,
é uma figura virginal, distante, uma tímida, uma abúlica (não é?), que assiste mais aos
acontecimentos do que participa neles. Mariana não, é uma mulher de armas, intervém na
ação e intervém de uma forma decisiva. O próprio suicídio da Mariana é uma afirmação
de vontade, claramente uma afirmação de vontade. Está muito mais próxima da figura
das heroínas clássicas, por exemplo, do que está a Teresa, que se deixa morrer de uma
forma um pouco desistente.
(Narrador) Tudo acontece num crescendo dramático que anuncia a tragédia.
Teresa está presa num convento e Simão tenta libertá-la. Na confusão mata Baltasar
Coutinho, que disputava sem sucesso o coração de Teresa.
(Atores)
— Sou eu.
— Vossa senhoria.
— Venha, que eu deixo-o fugir.
— Eu não fujo. Estou preso. Aqui tem.
(Annabela Rita – Prof. Universitária FL/UL) Essa adesão à figura de Simão e à
figura dos amorosos é necessariamente uma clivagem e uma demarcação relativamente
aos outros. E aí a toda a sociedade que de alguma forma se constituiu como obstáculo
desse amor. E essa sociedade é a sociedade constituída pelos homens feitos feras, portanto
a comoção do leitor relativamente a uns é acompanhada necessariamente do ódio, e é
mesmo a expressão utilizada no texto camiliano, pelo ódio por esses homens feitos feras
que perseguiram e impediram a concretização desse amor.
(António Trabulo – Escritor) Depois, também é um cheirinho a transgressão. O
Amor de Perdição é uma obra antiética. No fim de contas o João da Cruz é um assassino,
o Simão é um assassino. São pessoas para quem um indivíduo vale muito mais que a
sociedade, vão atrás dos seus amores, das suas paixões, e o resto não tem muita
importância. E depois as pessoas gostam de transgressão, gostam de cheirinho a pecado.
(Narrador) Depois do crime, Simão Botelho é preso. Mariana será a sua fiel
companhia. Teresa, a amada, continua no convento.
(Ana Maria Magalhães – Escritora) Temos que pensar que na maior parte dos
casos as pessoas não iam para freiras por vocação. Era porque os pais, por exemplo, não
tinham dote para tantas filhas e metiam umas quantas no convento, havia mães que
prometiam, se esta menina vingar, não morrer vai para o convento. Havia imensa gente
que estava ali obrigada e realmente na maior parte dos conventos haveria de tudo, mesmo
pouca vergonha e coscuvilhice e tudo o resto também havia. Havia amantes, havia freiras
que tinham filhos, e etc., e o Camilo sabia isso muito bem e retrata, porque ele tem muita
graça.
(Voz Camilo Castelo Branco) Se Simão estava no leito doente ou prostrado,
Mariana, que tivera alguns princípios de escrita, sentava-se à banca e escrevia cem vezes
o nome de Simão, que muitas vezes as lágrimas deliam. E isto assim durante sete meses
sem nunca o ouvir nem proferir a palavra amor. E isto assim depois de vigílias noturnas,
ora em preces, ora em trabalho, ora no caminho de sua casa onde ia visitar o pai a desoras.
(Narrador) Simão é condenado ao exílio na Índia. Embarca, mas ao saber da morte
de Teresa, decide também por fim à vida. A Mariana só restará uma decisão.
(Voz de Camilo Castelo Branco)
– Se eu morrer, que tenciona fazer, Mariana?
– Morrerei, senhor Simão.
– Morrerá?!... Tanta gente desgraçada que eu fiz.
(Ana Maria Magalhães – Escritora) Mariana é uma intrusa de alguma forma, que
ela é a força dela, é porque é a desgraça completa. Quer dizer, a Teresa sofre, mas sabe
que Simão sofre por ela, enquanto que a Mariana não. Ela sofre por alguém que não a
quer, que a olha com amizade e não há nada mais duro do que uma pessoa estar
apaixonada por outra que lhe oferece a sua amizade. A pessoa quase prefere o ódio, então
prefiro que me odeies, não te quero ver mais. Agora, eu apaixonadíssima por alguém que
me oferece amizade, isso é um balde de água gélida.
(Annabela Rita – Prof. Universitária FL/UL) De facto esse trio amoroso resolve-
se através da morte. Aquilo que não seria aceitável em vida, de acordo com os códigos
éticos e morais e sociais da altura, torna-se de alguma forma espiritualizado e aceite na
vida para além da morte.
(Francisco Moita-Flores – Escritor) Porque ele tinha esta perceção, do que as
pessoas eram, do que as pessoas sentiam e isso transformou-o de facto no escritor do
povo. Ele é um dos poetas e dos escritores do povo. Exatamente por essa perceção dos
nossos sentimentos, das nossas preocupações, das nossas canseiras, daquilo que são as
nossas expectativas face ao futuro, daquilo que são as relações amorosas, porque ele foi
um namoradeiro grande.
(João Bigotte Chorão – Ensaísta) Eu suponho que a experiência do caso foi muito
rica do ponto de vista literário para Camilo. Aliás o Camilo dizia: “Eu não tenho
imaginação, tenho memória”. E o elemento autobiográfico é efetivamente fundamental
na obra de Camilo. E não se pode entender o Camilo, sem conhecer a vida de Camilo,
que é uma vida também dramática e romanesca. Porque o Camilo teve também uma vida
romanesca, cheia de amores, de duelos, de conflitos, de guerrilhas, literárias e não só, não
é verdade?
(Mário Cláudio – Escritor) O Camilo vivia em estado de irritabilidade permanente
com ele próprio, e com os outros, de impaciência com os outros. E viveu também uma
dinâmica muito curiosa que acontece em muitos autores, de vítima-carrasco. Se por um
lado castigava as pessoas que ele julgava que não obedeciam àquilo que ele entendia que
devia ser, e por outro lado arvorava-se em vítima dessas mesmas pessoas. Essa dinâmica
está permanente na sua personalidade e também na sua obra. Portanto, as polémicas são
um resultado ainda disso. Ele insulta, às vezes de uma forma tenebrosa, recorrendo a um
sentido de humor absolutamente corrosivo, medonho, também para depois se apresentar
como vítima. Ele não tem controlo sobre esse processo. Está continuamente a queixar-se
e a verberar.
(Narrador) A história de vida de Camilo Castelo Branco também tem tragédia,
amor e drama. Tudo servido em doses exageradas. Os seus livros não são filhos do acaso.
É fácil explicar a personalidade conflituosa, a instabilidade de espírito, a inadaptação aos
locais, através da infância e juventude que viveu.
(António Trabulo – Escritor) Camilo ficou sem mãe cedo, sem pai cedo; aos 10
anos já não tinha nem pai nem mãe. Era pobre. Não tinha juízo. Nem dinheiro, nem nada.
E construiu-se. E fez-se um grande romancista, mas fez-se à sua própria custa, e com
muita dor e muito sacrifício.
(Narrador) Camilo Castelo Branco nasce em Lisboa, no Bairro Alto, a 16 de março
de 1825. É registado como filho de pais incógnitos. Quando tinha dois anos, morre a mãe,
Jacinta Rosa. O seu pai, Manuel Joaquim Botelho, regista Camilo como seu filho
ilegítimo, sem nunca legalizar o nome materno. E morre tem Camilo 10 anos. Despachado
para os familiares de Vila Real, fica a conhecer a história de seu tio Simão Botelho, o
homem que ficará no centro de Amor de Perdição. Por não se entender com a família,
muda para casa do padre António José de Azevedo, em Vilarinho da Samardã.
(Voz de Camilo Castelo Branco) Nesta Samardã passei eu os descuidos e as
alegrias da infância na companhia da minha irmã, que ali casou, e daquele padre António
de Azevedo, alma de Deus, missionário fervoroso que me podia ensinar tanto latim, tanta
virtude, e só me ensinou princípios de cantochão, os quais me serviram de muito para as
acertadas apreciações que eu fiz depois das prima-donas.
(Narrador) O norte de Portugal torna-se o seu território natural. É aí que cresce,
que começa a escrever, aprende a amar e a enjeitar responsabilidades.
(José Manuel Oliveira – Bibliotecário e Museólogo casa de Camilo) Camilo não
dizia bem de nenhuma terra. Portanto, essa relação com os espaços… A única terra de
que ele disse bem foi Vilarinho da Samardã, “onde passei os mais felizes anos da minha
mocidade”. Mas ele diz mal de todas as terras à exceção desta, de Vilarinho da Samardã.
Camilo…se nós imaginarmos, independentemente das viagens das suas personagens, o
triângulo camiliano tem apenas três vértices, por onde ele se movimentou. Se pensarmos
que um é Lisboa, outro Lamego e outro Vigo. Ele praticamente não saiu deste triângulo.
Mas de Lisboa onde nasceu e onde voltou muitas vezes por causa dos editores, e não só,
porque ia a Lisboa, esteve internado em Lisboa, ia aos médicos em Lisboa. Vila Real,
onde viveu com a tia Rita Emília, dos 10 aos 12 anos; em Vilarinho da Samardã onde
viveu com a irmã e o cunhado, que era médico. Em Ribeira de Pena onde casou pela
primeira vez e cuja mulher e filha abandonou bem cedo. O caso do Porto, que é na maior
parte das opiniões, a grande cidade de Camilo Castelo Branco.
(Narrador) Aos 16 anos casa com Joaquina Pereira, uma paixão apressada pela
juventude. Ao fim de 2 anos já fez nascer a primeira filha, e já abandonou a família,
instalando-se no Porto. A boémia fala mais alto que os estudos de liceu e da faculdade de
medicina. Em Vila Real, conhece Patrícia Emília de Barros, sua prima e decide fugir com
ela. Colabora com revistas e jornais, publica peças de teatro e poemas. A sua primeira
mulher e a filha morrem, e em 1848 nasce a segunda filha fruto da relação com a prima.
Aos 23 anos abandona a nova família em Vila Real e volta a instalar-se no Porto como
jornalista.
(Aníbal Pinto de Castro – Diretor Casa de Camilo) Levou uma vida um pouco
boémia, por cafés, o Águia d’Ouro, por exemplo, e por conseguinte tinha um conjunto de
amizades nas quais se movia, e que naturalmente se aplicavam em boa parte à conquista,
logo nessa altura. A mundividência amorosa de Camilo é uma série de contradições, de
quebras, mudanças, que a tornam em si um romance. Mesmo depois da sua ligação com
Ana Plácido, e que deu lugar àquela retenção na cadeia da Relação do Porto, digamos por
solidariedade com ele porque ela estava indiciada num processo de adultério, mas ele era
tido e havido por um homem tão instável, que quando foi o julgamento, o advogado dele
que era o Dr. Marcelino de Matos, pediu ao juiz para fazer o julgamento à porta fechada,
para poder explanar ali uma série de características do próprio Camilo que não convinha
trazer a público.
(José Manuel Oliveira – Bibliotecário e Museólogo casa de Camilo) Há
pormenores curiosos em relação ao processo – na altura da audiência houve uma enorme
trovoada e uma das testemunhas fugiu da sala assustada com o trovão – e há até uma
história que se conta acerca do advogado Marcelino de Matos que quando está a fazer a
defesa final dos réus, há um grande trovão que assusta toda a sala, e reposta a normalidade
ele vira-se para os jurados e diz: “Senhores jurados, é o céu a manifestar a sua cólera
contra a acusação que pesa sobre os arguidos.”
(Narrador) Escreve furiosamente tal como vive. Priva com intelectuais, integra as
tertúlias dos cafés. Vai aos teatros, aos serões da elite burguesa. Escreve peças de teatro,
novelas, polémicas, poemas, artigos de jornal e romances. É um homem público.
Alimenta ódios e amores. Acumula paixões, chegando a desviar uma freira do seu voto.
E arranja polémicas, sendo espancado em público mais do que uma vez.
(Mário Cláudio – Escritor) Camilo não teria sido genial se tivesse tido uma
existência pacata de bom burguês de pantufas, não é? A circunstância de ter vivido como
viveu, é inseparável da obra que ele escreveu. Ele rompeu com muita coisa, socialmente,
até do ponto de vista ético, do ponto de vista dos valores, infringiu muitos quadros
valorativos, e isso dá uma certa dimensão e uma certa espessura, uma vez mais, à obra
que escreveu. Não é possível escrever na quietude dos sentimentos, no ram ram dos
sentimentos.
(Narrador) Camilo escreve muito. Torna-se conhecido a pulso, e será o primeiro
português a viver profissionalmente das letras. A sua escrita é o pão que alimenta a família
e por isso não se faz rogado. Publica de tudo para agradar ao gosto popular.
(Mário Cláudio – Escritor) Ele é o primeiro grande escritor profissional das nossas letras,
não é um mero diletante da escrita – antes dele estaríamos um pouco habituados a isso. A
escrita era de certa forma instrumental de outras atividades ou de outros objetivos do
escritor, e o Camilo faz isso, faz da escrita a sua maneira de ser, a sua forma de estar no
mundo, a sua única via de comunicação com os outros.
(António Trabulo – Escritor) Certamente que a pressão de escrever às vezes mais
do que um livro ao mesmo tempo, para vender, limitou um bocadinho o resultado final
da escrita. Mas eu penso que também aquilo era parte do feitio do homem. Um homem
impaciente, escrevia e está escrito e pronto!
(Francisco Moita-Flores – Escritor) Ele é de facto um grande homem a escrever.
Depois porque ele é o grande mestre das paixões. Ninguém como Camilo conseguiu
mexer nas paixões, e gerir as paixões como ele geriu. E isso como sabe, aliás, hoje quando
as televisões todas elas potenciam o jogo das emoções e das paixões por causa das
audiências, melhor se percebe a literatura, sobretudo a literatura mais de cordel do próprio
Camilo, das revistas onde escreveu, para nos colocar rendidos perante este grande mestre
na gestão das nossa emoções. Ele hoje se vivesse, se fosse hoje vivo, estas novelas rascas
a que nós hoje aí assistimos, que se fundam também muito nessa narrativa, se ele fosse
hoje vivo era seguramente o maior novelista português. Já o é, era ao nível da telenovela,
porque ele escreve com essa preocupação, a preocupação de ganhar dinheiro, de poder
comer, de poder viver. E portanto ele tem de produzir depressa, e produzir depressa neste
quadro onde a dramaticidade está sempre muito presente e que fascina e que faz com que
os editores queiram, porque as coisas dele vendiam. E vendiam muito. Ainda hoje vendem
muito. E é de facto um livro de todas as gerações.
(Narrador) O ano que passou atrás das grades marca a grande mudança na vida de
Camilo Castelo Branco. O sucesso é finalmente atingido com Amor de Perdição, a sua
obra maior, a que o consagra como nome grande da literatura. Mas é também o fim da
boémia e dos amores inconstantes. Camilo tem uma família para sustentar e uma mulher
para amar.
(José Manuel Oliveira – Bibliotecário e Museólogo casa de Camilo) É sabido que
ele passava o tempo a ler e a escrever. Lia muito, escrevia muito, e começou logo a
traduzir a Arte de ser Feliz que é algo curioso, a Arte de ser Feliz, de Joseph Droz, e a
colaborar para vários jornais. Se os inimigos ou adversários pensavam que o
encarceramento de Camilo constituía um secar do seu espírito criador, enganaram-se. Ela
acaba por produzir obras importantes de toda a sua bibliografia, as Memórias do Cárcere,
grande parte de Doze Casamentos Felizes, e também aquela que é sem dúvida a sua obra-
prima, o Amor de Perdição. Ele vai ser visto na Foz, em banhos, vai ser visto com o seu
advogado Marcelino de Matos numa procissão da Lapa, vai ser visto muitas vezes a
passear no jardim da Cordoaria, que é um jardim contíguo à cadeia da Relação do Porto,
e o facto mais chocante é, para os então comerciantes do Porto, foi o facto de Camilo ser
visto a descer a rua de S. António, ou rua 31 de janeiro, e a subir a rua das carmelitas,
com as botinas, supostamente de Ana Plácido, enfiadas no dedo.
(Narrador) A morte de Pinheiro Alves dá a Ana Plácido uma herança valiosa que
inclui a casa de São Miguel de Seide. É para lá que Camilo se muda com a família para
escrever e educar os filhos, Jorge e Nuno. O primeiro, louco, o segundo, jogador e
mulherengo. E o escritor continua a gostar de boas farsas e de melhores tragédias. A vida
do escritor continua a acompanhar a obra, ambas refletem a ruralidade nortenha e as
tramas romanescas da época. Mas, terão sido felizes os dias de Camilo na casa de Seide?
Ter-se-á habituado o escritor à rotina, ao isolamento rural?
(Aníbal Pinto de Castro – Diretor Casa de Camilo) Naturalmente que escrevia,
escrevia porque ele tinha uma família a sustentar e ganhava na escrita o sustento dessa
família, porque entretanto nasceram mais dois filhos. Lia, lia imenso, anotava os livros.
Nós temos aqui livros ainda com anotações quase sempre a lápis, porque ele lia na cama.
Por outro lado as relações dele com AP eram umas relações curiosas, de ódio-amor. Ele
foi sempre um apaixonado da mulher, mas ao mesmo tempo uma pessoa que ela tinha
uma certa dificuldade em aturar no dia a dia aqui de Seide. E portanto, ele entre a escrita,
a leitura e as saídas, preenchia razoavelmente o tempo sem com isto dizer que ele não
tivesse momentos de tédio, momentos de aborrecimento aqui.
(Narrador) A idade não faz bem a Camilo. As preocupações financeiras aumentam
e a saúde sofre. Mas o pior é a evolução da literatura que insiste em arrumar os escritores
consagrados na prateleira empoeirada do romantismo.
(Annabela Rita – Prof. Universitária FL/UL) Ele dá-nos um Portugal de uma certa
época, dá-nos um Portugal de um certo espaço. E desse ponto de vista talvez se explique
porque é que ele não é tão traduzido como outros autores que vieram depois e que de
alguma forma têm uma dimensão mais…, não direi universal, mas que são entendidos
como mais universais, mais aceitáveis.
(António Trabulo – Escritor) Camilo no fim de contas retrata um mundo antes de
Fontes Pereira de Melo, não havia quase comboios, quer dizer…começaram nesse tempo.
Não havia comboios, não havia telefone, não havia quase eletricidade em sítio nenhum
— é um mundo que passou.
(Narrador) O Realismo passa a ser dominante, e Camilo sente-se ultrapassado pela
nova tendência intelectual. Eça de Queirós e Ramalho Ortigão editam As Farpas e
ocupam o espaço público dos intelectuais. A seguir, Eça lança O Crime do Padre Amaro
e em 1878 O Primo Basílio. Camilo tenta sobreviver pela escrita. No isolamento da sua
casa, aventura-se na nova literatura. Escreve Eusébio Macário e mais tarde A Corja. Em
plena luta entre românticos e realistas, Camilo faz o prefácio da 5.ª edição de Amor de
Perdição. E escreve:
(Voz de Camilo Castelo Branco) “O Amor de Perdição visto à luz elétrica do
criticismo moderno é um romance romântico, declamatório com bastantes aleijões líricos
e umas ideias celeradas que chegam a tocar no desaforo do sentimentalismo. (…) Se, por
virtude da metempsicose, eu reaparecer na sociedade do século XX, talvez me regozije
de ver outra vez as lágrimas em moda nos braços da retórica, e esta 5.ª edição do Amor
de Perdição quase esgotada.” S. Miguel de Seide, 8 de fevereiro de 1879.
(Eunice Cabral – Prof. Universitária UÉvora) Em 79, Camilo Castelo Branco
imagina, felizmente não aconteceu, que o Amor de Perdição está perdido para os leitores,
porque O Primo Basílio já tinha sido escrito, o Realismo-Naturalismo está em pleno,
enfim, como ele diz, os leitores já podem entrar nas alcovas, portanto é tudo a negação da
espiritualidade romântica tal como ele a concebeu. E ele está, não direi completamente
amargurado, porque ele é muito elegante, mas há ali uma amargura que se nota nesse
prefácio de 79, em que ele já está em S. Miguel de Seide (aliás enfim está ainda, apesar
de tudo, a alguns anos da morte dele). Mas ele tem este desabafo espantoso: Amor de
Perdição, nos anos sessenta, fez chorar. Mas agora, em 79, faz rir. É motivo de troça
porque exatamente é muito idealizado, é muito sentimental e já não está na moda.
(João Bigotte Chorão – Ensaísta) Quando se diz que o Camilo é um escritor
démodé, um escritor do passado e tal, que hoje o mundo já não é assim, mas o amor e o
ódio são eternos. E muitas vezes a gente lê nos jornais uma história de amores infelizes
que terminam às vezes por ciúmes, num homicídio ou num suicídio dos protagonistas, e
nós comentamos: isto parece uma história camiliana. É uma história camiliana, portanto
isso significa que Camilo é um autor atual.
(Narrador) Em 1882 lança o seu último grande livro, A Brasileira de Prazins. No
ano seguinte, é obrigado a vender parte da biblioteca. E quando um escritor vende os
livros com que alimentou a sua arte, é certo que algo de grave se passa. O diagnóstico
clínico acumula doenças várias, filhas da boémia e da falta de posses. Em 1885, consegue
finalmente o título que havia pedido há 15 anos. Torna-se visconde de Correia Botelho.
No ano a seguir publica o último romance e o filho Jorge é internado, dado como louco.
Ao seu lado continua Ana Plácido, a mulher de personalidade forte que o obrigara às
responsabilidades familiares. Ela ajuda-o a escrever. E trata-o quando se sente demasiado
fraco.
(Mário Cláudio – Escritor) Eu creio que Ana Plácido, se não tivesse havido a
vizinhança desse monstro sagrado que foi o Camilo Castelo Branco, poderia
perfeitamente ter levantado uma obra própria. E uma obra com bastante grandeza, com
pujança, e uma obra que certamente se teria imposto. Mas teve realmente digamos a
delicadeza, ou a modéstia ou o que quer que seja, isto também estava dentro dos costumes
da época, de se colocar um pouco à sombra do génio que com ela coabitava. Isso foi-lhe
fatal, não é? Foi-lhe fatal. Levou-a a subalternizar-se até um ponto que provavelmente
seria muito angustiante para ela, mas que também dá a dimensão da sua grandeza.
Naquele casal, o que estava presente, no fundo, era o culto da genialidade, um culto em
que de facto o ídolo era o Camilo e Ana Plácido seria a sacerdotisa.
(Narrador) Em 1888 casa finalmente com Ana Plácido. Ela tem 56 anos e Camilo
está a chegar aos 63. Mas a cegueira aumenta e já não consegue escrever. Vai aos médicos
do Porto, depois aos de Lisboa, em busca de uma cura. Volta desiludido para Seide com
a esperança a desaparecer. Em 1890, vive os dias do desespero e ouve muitos editores
recusarem o seu último livro. A custo, publica um conjunto de sonetos chamado Nas
Trevas, toque de finados literário do grande escritor.
(Voz de Camilo Castelo Branco) Sou o cadáver representante de um nome que
teve alguma reputação gloriosa neste país durante 40 anos de trabalho. Chamo-me Camilo
castelo Branco e estou cego.
(Narrador) O oftalmologista que o visita na sua casa em Seide no dia 1 de junho
de 1890, não lhe permite a esperança. A cegueira é irreversível. Sozinho na sala, Camilo
desiste da vida, encosta o cano do revólver ao lado direito da cabeça e dispara.
(António Trabulo – Escritor) Quem depende dos olhos, quem depende da escrita,
quem depende da leitura, para quem tudo o que de mais importante fez na vida, deixar de
ver, e não foi só o deixar de ver. A doença não tirou só a vista a Camilo. Também andava
com dificuldade. Era preciso levá-lo. Camilo teve um fim triste, uma vida doente e depois
cometeu o suicídio. Aliás, o suicídio era uma ideia romântica antiga em Camilo. Quer
dizer, provavelmente não teria nada a ver com realidade. O suicídio de Camilo é um
bocado de eutanásia, é abreviar um fim quando a vida já não tem qualidade nenhuma.
(Narrador) Tal como Mariana que em Amor de Perdição se atira ao mar ao
encontro de Simão, também camilo escolhe terminar os seus dias por não mais poder
exercer o amor pela escrita.
(Voz de Camilo Castelo Branco) E, antes que que o baque do cadáver se fizesse
ouvir na água, todos viram, e ninguém já pôde segurar Mariana, que se atirara ao mar.
(…) Viram-na, um momento, esbracejar, não para resistir à morte, mas para abraçar-se
ao cadáver de Simão, que uma onda lhe atirou aos braços. O comandante olhou para o
sítio donde Mariana se atirara, e viu, enleado no cordame, o avental, e à flor da água, um
rolo de papéis, que os marujos recolheram na lancha. Era, como sabem, a correspondência
de Teresa e Simão.

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  • 1. Transcriçãode RTP Ensina – Amor de Perdição (p. 190)Duração: 12:46 minutos (Narrador) Aos 35 anos Camilo Castelo Branco vive o maior dilema da sua vida. Perseguido pela justiça, hesita entre fugir e entregar-se à prisão. O seu amor proibido com Ana Plácido já pôs a mulher que ama atrás das grades e Camilo sabe que é o próximo. É já conhecido como escritor e está em risco de ser enviado para o exílio. Com medo, tenta escapar à justiça. Esconde-se em casas de amigos, de terra em terra, adiando o inevitável. Quando desiste de fugir e se entrega, abre caminho para a grande mudança da sua vida. O ano que passa na cadeia da Relação é decisivo. Como se fosse uma questão de vida ou morte, Camilo Castelo Branco escreve sem parar. Em 15 dias termina aquele que será o seu livro mais célebre. O Amor de Perdição chega ao público em 1862 e torna-se um tremendo êxito. Os leitores choram as desventuras do amor puro que se confronta com a tragédia. Vivem como seus os amores trágicos de Simão, Teresa e Mariana. (Voz de Camilo Castelo Branco) “Amou, perdeu-se e morreu amando.” É a história! História assim poderá ouvi-la a olhos enxutos, a mulher, a criatura mais bem formada das branduras da piedade a que por vezes traz consigo do céu um reflexo da divina misericórdia? Essa, a minha leitora, a carinhosa amiga de todos os infelizes, não choraria se lhe dissessem que o pobre moço perdera a honra, reabilitação, pátria, liberdade, irmãs, mãe, vida, tudo, por amor da primeira mulher que o despertou do seu dormir de inocentes desejos? (Narrador) Alguém poderia dizer: não há coincidências, e não há de facto. Camilo Castelo Branco está preso na cadeia da Relação do Porto por causa de um amor impossível. Para passar o tempo escreve um romance genial sobre o amor trágico que leva o seu protagonista à cadeia da Relação, no Porto. (Isabel Rocheta – Prof. Universitária FL/UL) De alguma maneira, quando Camilo escolheu o subtítulo de Amor de Perdição, Memórias de uma Família, está a estabelecer uma identificação. Quando abrimos a novela, na introdução, encontramos logo a figura de Simão através de um registo das cadeias da Relação do Porto, em que Simão aparece com a indicação da sua filiação. (Annabela Rita – Prof. Universitária FL/UL) Nós verificamos que ele, sujeito, narrador, que se assume como autor que escreve aquele texto, e que escreve nas circunstâncias em que um seu antepassado também, circunstâncias semelhantes às que um seu antepassado viveu, e que se encontra no mesmo lugar, portanto é essa coincidência, essa duplicidade que adensa a tragédia, coincidência que ele vai explorar, é exatamente essa coincidência que justifica que ele escreva. Ele encontra o registo da prisão de Simão Botelho, seu tio, tio-avô. O que importa é que é com base numa alegada coincidência de situações que ele vai contar a história de Simão Botelho. E essa história é coincidente com a sua. Portanto, ao denunciar a situação enfim…da perseguição e da injustiça, e ao reivindicar o direito ao amor e à paixão e à concretização disso, ele está a defender-se a si próprio.
  • 2. (Francisco Moita-Flores – Escritor) Porque ele confessa-se. Aquela narrativa é uma autoconfissão. E é uma autoconfissão de desespero. E qualquer homem, ou qualquer mulher, sente nesse desespero do amor, nesse desespero do desejo, nesse desespero do ter e não ter, do sonhar que tem, mas não vai ter, da impossibilidade, na possibilidade de tocar e não tocar. (Narrador) Em 1849, num baile de carnaval, Camilo Castelo Branco conhece o amor de uma vida. Ana Plácido, inocente de 17 anos, solteira ainda. Camilo apaixona-se nesse momento, mas de pouco vale. Um ano depois, Ana Plácido casa com Manuel Pinheiro Alves, emigrante que fizera fortuna no Brasil. Camilo vai para Lisboa determinado a fazer-se escritor, mas os planos não correm como previsto. Volta ao Porto, muda de vida, ingressa num seminário. A vocação religiosa também falha. Fica no Porto e regressa à escrita. Vai publicando furiosamente. Torna-se conhecido a partir de 1856 com a edição de Onde está a felicidade? obra elogiada por muitos, entre eles Alexandre Herculano. (Aníbal Pinto de Castro – Diretor Casa de Camilo) No Onde está a felicidade? Camilo captou alguns dos ingredientes mais importantes na sociedade portuguesa do século XIX, e particularmente a importância do dinheiro como motor da sociedade. No que estará também alguma presença do endinheiramento introduzido na província portuguesa pelos brasileiros de torna-viagem. Ele, a partir daí, capta certos movimentos que depois se vão prolongar por toda a obra, mas que dão a Onde está a felicidade? esse papel de iniciador e de uma nova orientação na ficção romanesca. (Voz de Camilo Castelo Branco) Sou o homem mais feliz do mundo… (Narrador) Com a fama veio finalmente a concretização da paixão. Em 1858, a relação de Camilo e Ana Plácido é comentada da Foz até à Campanhã e torna-se no escândalo preferido das boas famílias. (Atores) — Isso é mesmo verdade? — Verdade? — Sim, essa história da Ana Plácido e do Camilo. — Eu acho que sim, eu acho que ela saiu de casa abandonando o marido. — Ai… (sonhos…) (Narrador) Ana abandona a casa do marido e vai viver com Camilo. Para escapar à pressão social, Camilo, Ana e o filho, mudam-se para Lisboa. (Atores) — Essa mulher manchou a sua honra. É altura de lutar e não se deixar vencer.
  • 3. (Narrador) Pinheiro Alves tenta negociar o fim da relação, disposto a receber a sua mulher de volta a casa mas não tem sucesso. A paixão é forte e falam mais alto que os laços do matrimónio. (Atores) — Meu Deus, não sei, mas eu já não sei esperar. (Narrador) Em dezembro de 1859, o marido enganado leva o caso à justiça. Ana Plácido é acusada de crime de adultério e Camilo de copular com mulher casada. Ana é presa em junho e Camilo, depois de uma breve fuga, entrega-se a 1 de outubro. É uma novela seguida com avidez pelo povo. (Mário Cláudio – Escritor) Toda a gente conhecia o que tinha acontecido com os amores difíceis do Camilo com a Ana Plácido. A cidade do Porto, que nessa altura era um meio literário muito forte, muito importante, acompanhou isso com muita curiosidade, com muito interesse, e às vezes de uma forma um pouco doentia até, e portanto isso também teria contribuído para o sucesso do romance. (António Trabulo – Escritor) Mas no fim de contas Camilo tinha uma coisa extraordinária: antes de haver publicitários, ele era já um publicitário extraordinário. Ele estava na cadeia por causa de um amor infeliz. O que é que fez a promoção do Amor de Perdição? Foi o amor infeliz, foi o facto de ele e Ana Plácido estarem na cadeia naquele momento. Camilo nisso tinha um sentido de oportunidade notável. (José Manuel Oliveira – Bibliotecário e Museólogo casa de Camilo) Criou-se em torno do julgamento de Camilo Castelo Branco e de Ana Plácido, uma espécie de fações (não é?), umas que eram a favor de Camilo, outras que eram a favor de Pinheiro Alves. A verdade é que mesmo nos jornais e mesmo em termos públicos, Pinheiro Alves encarregou-se de fazer alguma publicitação do escândalo desta relação. A verdade é que Camilo Castelo Branco acabou por conseguir dar volta a isto tudo. E o escrever o Amor de Perdição não é tão inocente assim. Independentemente do aspeto literário da obra, eu creio que provavelmente também há aqui um fator muito forte de tentar convencer os 12 jurados de que ele se perdera por amor. E a melhor forma de convencer os 12 jurados era convencer as 12 mulheres dos 12 jurados e ele conseguiria isso através de uma obra como foi o Amor de Perdição. (Voz de Camilo Castelo Branco) Escrevi o romance em quinze dias, os mais atormentados de minha vida, tão horrorizados tenho deles memória, que nunca mais abrirei o Amor de Perdição. Nem passarei a lima sobre os defeitos em edições futuras. (Narrador) Era ainda no prefácio da 2.ª edição que Camilo prometia não mais voltar à sua obra-prima. Mas ainda o reviu três vezes, tantas quantas as edições que viu na praça. (Isabel Rocheta – Prof. Universitária FL/UL) Em 1861, Camilo está realmente a entrar no auge da maturidade, e Amor de Perdição foi, desde o momento da sua
  • 4. publicação, uma obra reconhecida como uma grande novela. Penso que na construção das personagens, na verosimilhança que de facto Camilo conseguiu, num realismo que não é de escola, mas que surge nas falas, na mímica, na apresentação das personagens, está possivelmente uma das chaves do êxito desta obra. O desenlace é extremamente conseguido… É de facto uma obra-prima camiliana. (Ana Maria Magalhães – Escritora) O Amor de Perdição é uma obra magnífica, mas é também uma obra de emoções muito, muito fortes, e portanto mesmo pessoas que não tinham grande preparação ou instrução para poder apreciar a qualidade literária do texto, aderiam apaixonadamente àquelas personagens, àquele enredo, liam na esperança de que as coisas se resolvessem, que afinal o desfecho não fosse tão trágico; o ritmo da história, o desenho das personagens tão nítido, aqueles que Camilo construiu para que nós os amassemos e aqueles que construiu para que os odiássemos. (Narrador) O livro conta-nos os amores trágicos de Simão Botelho e Teresa Albuquerque. Filhos de famílias inimigas, preferem morrer a desistir do amor que os une. Representam a liberdade de amar contra as exigências sociais. A narrativa de Camilo é visual, popular e comovente. (João Bigotte Chorão – Ensaísta) Eu julgo que é de facto a nossa versão de Romeu e Julieta. Aliás Camilo conhecia bem Shakespeare e tinha até na sua biblioteca livros do Shakespeare. Portanto é de facto um rapaz e uma rapariga que se amam, e o amor deles é contrariado de uma maneira violenta pelas famílias. Camilo conseguiu, ao contrário do que acontece noutros livros seus em que ele se derrama em considerações exteriores à narrativa, ali ele não perde o fio à meada. (Narrador) Simão, o grande herói é um jovem turbulento que o grande amor transforma. (Voz de Camilo Castelo Branco) Os quinze anos de Simão têm a aparência de vinte. É forte de compleição. Belo homem, com as feições de sua mãe e a corpulência dela, mas de todo avesso em génio. (Narrador) Teresa é uma jovem fidalga de província que desafia o poder paterno e, por amor, recusa um casamento de conveniência com o seu primo Baltasar Coutinho. (Voz de Camilo Castelo Branco) Amava Simão uma sua vizinha, menina de quinze anos, rica herdeira, regularmente bonita e bem-nascida. Da janela do seu quarto é que ele a vira pela primeira vez para amá-la sempre. Não ficara ela incólume da ferida que fizera no coração do vizinho. Amou-o, também, e com mais seriedade que é usual nos seus anos. (Narrador) Há ainda Mariana, a jovem do povo que se apaixonará por Simão ao ponto de escolher morrer. Essa figura que tudo faz pelo amado acentua a grandeza da tragédia. (Atores)
  • 5. — Os sentimentos do coração só os posso agradecer com amizade. — E eu já lhe pedi mais alguma coisa, Sr. Simão? (Voz de Camilo Castelo Branco) O ferrador tinha uma filha, moça de 24 anos, formas bonitas, rosto belo e triste. Notou Simão os reparos em que ela se demorava a contemplá-lo, e perguntou-lhe a causa daquele olhar melancólico com que ela o fitava. Mariana corou, abriu um sorriso triste, e respondeu: — Não sei o que me adivinha o coração a respeito de vossa senhoria. Alguma desgraça está para lhe suceder. (Eunice Cabral – Prof. Universitária UÉvora) A figura de Mariana é absolutamente espantosa. Não direi que seja uma mulher anjo, mas é a mulher abnegada, a mulher pura, a mulher que pratica um amor incondicional, muito à maneira romântica, que aparece, eu não direi em conflito, porque não há conflito, como sabemos (não é?), mas aparece em contraste com a Teresa; que suicida-se no final, porque tem de acompanhar Simão. (Mário Cláudio – Escritor) A Teresa é pintada como é pintada a heroína da época, é uma figura virginal, distante, uma tímida, uma abúlica (não é?), que assiste mais aos acontecimentos do que participa neles. Mariana não, é uma mulher de armas, intervém na ação e intervém de uma forma decisiva. O próprio suicídio da Mariana é uma afirmação de vontade, claramente uma afirmação de vontade. Está muito mais próxima da figura das heroínas clássicas, por exemplo, do que está a Teresa, que se deixa morrer de uma forma um pouco desistente. (Narrador) Tudo acontece num crescendo dramático que anuncia a tragédia. Teresa está presa num convento e Simão tenta libertá-la. Na confusão mata Baltasar Coutinho, que disputava sem sucesso o coração de Teresa. (Atores) — Sou eu. — Vossa senhoria. — Venha, que eu deixo-o fugir. — Eu não fujo. Estou preso. Aqui tem. (Annabela Rita – Prof. Universitária FL/UL) Essa adesão à figura de Simão e à figura dos amorosos é necessariamente uma clivagem e uma demarcação relativamente aos outros. E aí a toda a sociedade que de alguma forma se constituiu como obstáculo desse amor. E essa sociedade é a sociedade constituída pelos homens feitos feras, portanto a comoção do leitor relativamente a uns é acompanhada necessariamente do ódio, e é mesmo a expressão utilizada no texto camiliano, pelo ódio por esses homens feitos feras que perseguiram e impediram a concretização desse amor. (António Trabulo – Escritor) Depois, também é um cheirinho a transgressão. O Amor de Perdição é uma obra antiética. No fim de contas o João da Cruz é um assassino,
  • 6. o Simão é um assassino. São pessoas para quem um indivíduo vale muito mais que a sociedade, vão atrás dos seus amores, das suas paixões, e o resto não tem muita importância. E depois as pessoas gostam de transgressão, gostam de cheirinho a pecado. (Narrador) Depois do crime, Simão Botelho é preso. Mariana será a sua fiel companhia. Teresa, a amada, continua no convento. (Ana Maria Magalhães – Escritora) Temos que pensar que na maior parte dos casos as pessoas não iam para freiras por vocação. Era porque os pais, por exemplo, não tinham dote para tantas filhas e metiam umas quantas no convento, havia mães que prometiam, se esta menina vingar, não morrer vai para o convento. Havia imensa gente que estava ali obrigada e realmente na maior parte dos conventos haveria de tudo, mesmo pouca vergonha e coscuvilhice e tudo o resto também havia. Havia amantes, havia freiras que tinham filhos, e etc., e o Camilo sabia isso muito bem e retrata, porque ele tem muita graça. (Voz Camilo Castelo Branco) Se Simão estava no leito doente ou prostrado, Mariana, que tivera alguns princípios de escrita, sentava-se à banca e escrevia cem vezes o nome de Simão, que muitas vezes as lágrimas deliam. E isto assim durante sete meses sem nunca o ouvir nem proferir a palavra amor. E isto assim depois de vigílias noturnas, ora em preces, ora em trabalho, ora no caminho de sua casa onde ia visitar o pai a desoras. (Narrador) Simão é condenado ao exílio na Índia. Embarca, mas ao saber da morte de Teresa, decide também por fim à vida. A Mariana só restará uma decisão. (Voz de Camilo Castelo Branco) – Se eu morrer, que tenciona fazer, Mariana? – Morrerei, senhor Simão. – Morrerá?!... Tanta gente desgraçada que eu fiz. (Ana Maria Magalhães – Escritora) Mariana é uma intrusa de alguma forma, que ela é a força dela, é porque é a desgraça completa. Quer dizer, a Teresa sofre, mas sabe que Simão sofre por ela, enquanto que a Mariana não. Ela sofre por alguém que não a quer, que a olha com amizade e não há nada mais duro do que uma pessoa estar apaixonada por outra que lhe oferece a sua amizade. A pessoa quase prefere o ódio, então prefiro que me odeies, não te quero ver mais. Agora, eu apaixonadíssima por alguém que me oferece amizade, isso é um balde de água gélida. (Annabela Rita – Prof. Universitária FL/UL) De facto esse trio amoroso resolve- se através da morte. Aquilo que não seria aceitável em vida, de acordo com os códigos éticos e morais e sociais da altura, torna-se de alguma forma espiritualizado e aceite na vida para além da morte.
  • 7. (Francisco Moita-Flores – Escritor) Porque ele tinha esta perceção, do que as pessoas eram, do que as pessoas sentiam e isso transformou-o de facto no escritor do povo. Ele é um dos poetas e dos escritores do povo. Exatamente por essa perceção dos nossos sentimentos, das nossas preocupações, das nossas canseiras, daquilo que são as nossas expectativas face ao futuro, daquilo que são as relações amorosas, porque ele foi um namoradeiro grande. (João Bigotte Chorão – Ensaísta) Eu suponho que a experiência do caso foi muito rica do ponto de vista literário para Camilo. Aliás o Camilo dizia: “Eu não tenho imaginação, tenho memória”. E o elemento autobiográfico é efetivamente fundamental na obra de Camilo. E não se pode entender o Camilo, sem conhecer a vida de Camilo, que é uma vida também dramática e romanesca. Porque o Camilo teve também uma vida romanesca, cheia de amores, de duelos, de conflitos, de guerrilhas, literárias e não só, não é verdade? (Mário Cláudio – Escritor) O Camilo vivia em estado de irritabilidade permanente com ele próprio, e com os outros, de impaciência com os outros. E viveu também uma dinâmica muito curiosa que acontece em muitos autores, de vítima-carrasco. Se por um lado castigava as pessoas que ele julgava que não obedeciam àquilo que ele entendia que devia ser, e por outro lado arvorava-se em vítima dessas mesmas pessoas. Essa dinâmica está permanente na sua personalidade e também na sua obra. Portanto, as polémicas são um resultado ainda disso. Ele insulta, às vezes de uma forma tenebrosa, recorrendo a um sentido de humor absolutamente corrosivo, medonho, também para depois se apresentar como vítima. Ele não tem controlo sobre esse processo. Está continuamente a queixar-se e a verberar. (Narrador) A história de vida de Camilo Castelo Branco também tem tragédia, amor e drama. Tudo servido em doses exageradas. Os seus livros não são filhos do acaso. É fácil explicar a personalidade conflituosa, a instabilidade de espírito, a inadaptação aos locais, através da infância e juventude que viveu. (António Trabulo – Escritor) Camilo ficou sem mãe cedo, sem pai cedo; aos 10 anos já não tinha nem pai nem mãe. Era pobre. Não tinha juízo. Nem dinheiro, nem nada. E construiu-se. E fez-se um grande romancista, mas fez-se à sua própria custa, e com muita dor e muito sacrifício. (Narrador) Camilo Castelo Branco nasce em Lisboa, no Bairro Alto, a 16 de março de 1825. É registado como filho de pais incógnitos. Quando tinha dois anos, morre a mãe, Jacinta Rosa. O seu pai, Manuel Joaquim Botelho, regista Camilo como seu filho ilegítimo, sem nunca legalizar o nome materno. E morre tem Camilo 10 anos. Despachado para os familiares de Vila Real, fica a conhecer a história de seu tio Simão Botelho, o homem que ficará no centro de Amor de Perdição. Por não se entender com a família, muda para casa do padre António José de Azevedo, em Vilarinho da Samardã. (Voz de Camilo Castelo Branco) Nesta Samardã passei eu os descuidos e as alegrias da infância na companhia da minha irmã, que ali casou, e daquele padre António
  • 8. de Azevedo, alma de Deus, missionário fervoroso que me podia ensinar tanto latim, tanta virtude, e só me ensinou princípios de cantochão, os quais me serviram de muito para as acertadas apreciações que eu fiz depois das prima-donas. (Narrador) O norte de Portugal torna-se o seu território natural. É aí que cresce, que começa a escrever, aprende a amar e a enjeitar responsabilidades. (José Manuel Oliveira – Bibliotecário e Museólogo casa de Camilo) Camilo não dizia bem de nenhuma terra. Portanto, essa relação com os espaços… A única terra de que ele disse bem foi Vilarinho da Samardã, “onde passei os mais felizes anos da minha mocidade”. Mas ele diz mal de todas as terras à exceção desta, de Vilarinho da Samardã. Camilo…se nós imaginarmos, independentemente das viagens das suas personagens, o triângulo camiliano tem apenas três vértices, por onde ele se movimentou. Se pensarmos que um é Lisboa, outro Lamego e outro Vigo. Ele praticamente não saiu deste triângulo. Mas de Lisboa onde nasceu e onde voltou muitas vezes por causa dos editores, e não só, porque ia a Lisboa, esteve internado em Lisboa, ia aos médicos em Lisboa. Vila Real, onde viveu com a tia Rita Emília, dos 10 aos 12 anos; em Vilarinho da Samardã onde viveu com a irmã e o cunhado, que era médico. Em Ribeira de Pena onde casou pela primeira vez e cuja mulher e filha abandonou bem cedo. O caso do Porto, que é na maior parte das opiniões, a grande cidade de Camilo Castelo Branco. (Narrador) Aos 16 anos casa com Joaquina Pereira, uma paixão apressada pela juventude. Ao fim de 2 anos já fez nascer a primeira filha, e já abandonou a família, instalando-se no Porto. A boémia fala mais alto que os estudos de liceu e da faculdade de medicina. Em Vila Real, conhece Patrícia Emília de Barros, sua prima e decide fugir com ela. Colabora com revistas e jornais, publica peças de teatro e poemas. A sua primeira mulher e a filha morrem, e em 1848 nasce a segunda filha fruto da relação com a prima. Aos 23 anos abandona a nova família em Vila Real e volta a instalar-se no Porto como jornalista. (Aníbal Pinto de Castro – Diretor Casa de Camilo) Levou uma vida um pouco boémia, por cafés, o Águia d’Ouro, por exemplo, e por conseguinte tinha um conjunto de amizades nas quais se movia, e que naturalmente se aplicavam em boa parte à conquista, logo nessa altura. A mundividência amorosa de Camilo é uma série de contradições, de quebras, mudanças, que a tornam em si um romance. Mesmo depois da sua ligação com Ana Plácido, e que deu lugar àquela retenção na cadeia da Relação do Porto, digamos por solidariedade com ele porque ela estava indiciada num processo de adultério, mas ele era tido e havido por um homem tão instável, que quando foi o julgamento, o advogado dele que era o Dr. Marcelino de Matos, pediu ao juiz para fazer o julgamento à porta fechada, para poder explanar ali uma série de características do próprio Camilo que não convinha trazer a público. (José Manuel Oliveira – Bibliotecário e Museólogo casa de Camilo) Há pormenores curiosos em relação ao processo – na altura da audiência houve uma enorme trovoada e uma das testemunhas fugiu da sala assustada com o trovão – e há até uma história que se conta acerca do advogado Marcelino de Matos que quando está a fazer a
  • 9. defesa final dos réus, há um grande trovão que assusta toda a sala, e reposta a normalidade ele vira-se para os jurados e diz: “Senhores jurados, é o céu a manifestar a sua cólera contra a acusação que pesa sobre os arguidos.” (Narrador) Escreve furiosamente tal como vive. Priva com intelectuais, integra as tertúlias dos cafés. Vai aos teatros, aos serões da elite burguesa. Escreve peças de teatro, novelas, polémicas, poemas, artigos de jornal e romances. É um homem público. Alimenta ódios e amores. Acumula paixões, chegando a desviar uma freira do seu voto. E arranja polémicas, sendo espancado em público mais do que uma vez. (Mário Cláudio – Escritor) Camilo não teria sido genial se tivesse tido uma existência pacata de bom burguês de pantufas, não é? A circunstância de ter vivido como viveu, é inseparável da obra que ele escreveu. Ele rompeu com muita coisa, socialmente, até do ponto de vista ético, do ponto de vista dos valores, infringiu muitos quadros valorativos, e isso dá uma certa dimensão e uma certa espessura, uma vez mais, à obra que escreveu. Não é possível escrever na quietude dos sentimentos, no ram ram dos sentimentos. (Narrador) Camilo escreve muito. Torna-se conhecido a pulso, e será o primeiro português a viver profissionalmente das letras. A sua escrita é o pão que alimenta a família e por isso não se faz rogado. Publica de tudo para agradar ao gosto popular. (Mário Cláudio – Escritor) Ele é o primeiro grande escritor profissional das nossas letras, não é um mero diletante da escrita – antes dele estaríamos um pouco habituados a isso. A escrita era de certa forma instrumental de outras atividades ou de outros objetivos do escritor, e o Camilo faz isso, faz da escrita a sua maneira de ser, a sua forma de estar no mundo, a sua única via de comunicação com os outros. (António Trabulo – Escritor) Certamente que a pressão de escrever às vezes mais do que um livro ao mesmo tempo, para vender, limitou um bocadinho o resultado final da escrita. Mas eu penso que também aquilo era parte do feitio do homem. Um homem impaciente, escrevia e está escrito e pronto! (Francisco Moita-Flores – Escritor) Ele é de facto um grande homem a escrever. Depois porque ele é o grande mestre das paixões. Ninguém como Camilo conseguiu mexer nas paixões, e gerir as paixões como ele geriu. E isso como sabe, aliás, hoje quando as televisões todas elas potenciam o jogo das emoções e das paixões por causa das audiências, melhor se percebe a literatura, sobretudo a literatura mais de cordel do próprio Camilo, das revistas onde escreveu, para nos colocar rendidos perante este grande mestre na gestão das nossa emoções. Ele hoje se vivesse, se fosse hoje vivo, estas novelas rascas a que nós hoje aí assistimos, que se fundam também muito nessa narrativa, se ele fosse hoje vivo era seguramente o maior novelista português. Já o é, era ao nível da telenovela, porque ele escreve com essa preocupação, a preocupação de ganhar dinheiro, de poder comer, de poder viver. E portanto ele tem de produzir depressa, e produzir depressa neste quadro onde a dramaticidade está sempre muito presente e que fascina e que faz com que
  • 10. os editores queiram, porque as coisas dele vendiam. E vendiam muito. Ainda hoje vendem muito. E é de facto um livro de todas as gerações. (Narrador) O ano que passou atrás das grades marca a grande mudança na vida de Camilo Castelo Branco. O sucesso é finalmente atingido com Amor de Perdição, a sua obra maior, a que o consagra como nome grande da literatura. Mas é também o fim da boémia e dos amores inconstantes. Camilo tem uma família para sustentar e uma mulher para amar. (José Manuel Oliveira – Bibliotecário e Museólogo casa de Camilo) É sabido que ele passava o tempo a ler e a escrever. Lia muito, escrevia muito, e começou logo a traduzir a Arte de ser Feliz que é algo curioso, a Arte de ser Feliz, de Joseph Droz, e a colaborar para vários jornais. Se os inimigos ou adversários pensavam que o encarceramento de Camilo constituía um secar do seu espírito criador, enganaram-se. Ela acaba por produzir obras importantes de toda a sua bibliografia, as Memórias do Cárcere, grande parte de Doze Casamentos Felizes, e também aquela que é sem dúvida a sua obra- prima, o Amor de Perdição. Ele vai ser visto na Foz, em banhos, vai ser visto com o seu advogado Marcelino de Matos numa procissão da Lapa, vai ser visto muitas vezes a passear no jardim da Cordoaria, que é um jardim contíguo à cadeia da Relação do Porto, e o facto mais chocante é, para os então comerciantes do Porto, foi o facto de Camilo ser visto a descer a rua de S. António, ou rua 31 de janeiro, e a subir a rua das carmelitas, com as botinas, supostamente de Ana Plácido, enfiadas no dedo. (Narrador) A morte de Pinheiro Alves dá a Ana Plácido uma herança valiosa que inclui a casa de São Miguel de Seide. É para lá que Camilo se muda com a família para escrever e educar os filhos, Jorge e Nuno. O primeiro, louco, o segundo, jogador e mulherengo. E o escritor continua a gostar de boas farsas e de melhores tragédias. A vida do escritor continua a acompanhar a obra, ambas refletem a ruralidade nortenha e as tramas romanescas da época. Mas, terão sido felizes os dias de Camilo na casa de Seide? Ter-se-á habituado o escritor à rotina, ao isolamento rural? (Aníbal Pinto de Castro – Diretor Casa de Camilo) Naturalmente que escrevia, escrevia porque ele tinha uma família a sustentar e ganhava na escrita o sustento dessa família, porque entretanto nasceram mais dois filhos. Lia, lia imenso, anotava os livros. Nós temos aqui livros ainda com anotações quase sempre a lápis, porque ele lia na cama. Por outro lado as relações dele com AP eram umas relações curiosas, de ódio-amor. Ele foi sempre um apaixonado da mulher, mas ao mesmo tempo uma pessoa que ela tinha uma certa dificuldade em aturar no dia a dia aqui de Seide. E portanto, ele entre a escrita, a leitura e as saídas, preenchia razoavelmente o tempo sem com isto dizer que ele não tivesse momentos de tédio, momentos de aborrecimento aqui. (Narrador) A idade não faz bem a Camilo. As preocupações financeiras aumentam e a saúde sofre. Mas o pior é a evolução da literatura que insiste em arrumar os escritores consagrados na prateleira empoeirada do romantismo.
  • 11. (Annabela Rita – Prof. Universitária FL/UL) Ele dá-nos um Portugal de uma certa época, dá-nos um Portugal de um certo espaço. E desse ponto de vista talvez se explique porque é que ele não é tão traduzido como outros autores que vieram depois e que de alguma forma têm uma dimensão mais…, não direi universal, mas que são entendidos como mais universais, mais aceitáveis. (António Trabulo – Escritor) Camilo no fim de contas retrata um mundo antes de Fontes Pereira de Melo, não havia quase comboios, quer dizer…começaram nesse tempo. Não havia comboios, não havia telefone, não havia quase eletricidade em sítio nenhum — é um mundo que passou. (Narrador) O Realismo passa a ser dominante, e Camilo sente-se ultrapassado pela nova tendência intelectual. Eça de Queirós e Ramalho Ortigão editam As Farpas e ocupam o espaço público dos intelectuais. A seguir, Eça lança O Crime do Padre Amaro e em 1878 O Primo Basílio. Camilo tenta sobreviver pela escrita. No isolamento da sua casa, aventura-se na nova literatura. Escreve Eusébio Macário e mais tarde A Corja. Em plena luta entre românticos e realistas, Camilo faz o prefácio da 5.ª edição de Amor de Perdição. E escreve: (Voz de Camilo Castelo Branco) “O Amor de Perdição visto à luz elétrica do criticismo moderno é um romance romântico, declamatório com bastantes aleijões líricos e umas ideias celeradas que chegam a tocar no desaforo do sentimentalismo. (…) Se, por virtude da metempsicose, eu reaparecer na sociedade do século XX, talvez me regozije de ver outra vez as lágrimas em moda nos braços da retórica, e esta 5.ª edição do Amor de Perdição quase esgotada.” S. Miguel de Seide, 8 de fevereiro de 1879. (Eunice Cabral – Prof. Universitária UÉvora) Em 79, Camilo Castelo Branco imagina, felizmente não aconteceu, que o Amor de Perdição está perdido para os leitores, porque O Primo Basílio já tinha sido escrito, o Realismo-Naturalismo está em pleno, enfim, como ele diz, os leitores já podem entrar nas alcovas, portanto é tudo a negação da espiritualidade romântica tal como ele a concebeu. E ele está, não direi completamente amargurado, porque ele é muito elegante, mas há ali uma amargura que se nota nesse prefácio de 79, em que ele já está em S. Miguel de Seide (aliás enfim está ainda, apesar de tudo, a alguns anos da morte dele). Mas ele tem este desabafo espantoso: Amor de Perdição, nos anos sessenta, fez chorar. Mas agora, em 79, faz rir. É motivo de troça porque exatamente é muito idealizado, é muito sentimental e já não está na moda. (João Bigotte Chorão – Ensaísta) Quando se diz que o Camilo é um escritor démodé, um escritor do passado e tal, que hoje o mundo já não é assim, mas o amor e o ódio são eternos. E muitas vezes a gente lê nos jornais uma história de amores infelizes que terminam às vezes por ciúmes, num homicídio ou num suicídio dos protagonistas, e nós comentamos: isto parece uma história camiliana. É uma história camiliana, portanto isso significa que Camilo é um autor atual. (Narrador) Em 1882 lança o seu último grande livro, A Brasileira de Prazins. No ano seguinte, é obrigado a vender parte da biblioteca. E quando um escritor vende os
  • 12. livros com que alimentou a sua arte, é certo que algo de grave se passa. O diagnóstico clínico acumula doenças várias, filhas da boémia e da falta de posses. Em 1885, consegue finalmente o título que havia pedido há 15 anos. Torna-se visconde de Correia Botelho. No ano a seguir publica o último romance e o filho Jorge é internado, dado como louco. Ao seu lado continua Ana Plácido, a mulher de personalidade forte que o obrigara às responsabilidades familiares. Ela ajuda-o a escrever. E trata-o quando se sente demasiado fraco. (Mário Cláudio – Escritor) Eu creio que Ana Plácido, se não tivesse havido a vizinhança desse monstro sagrado que foi o Camilo Castelo Branco, poderia perfeitamente ter levantado uma obra própria. E uma obra com bastante grandeza, com pujança, e uma obra que certamente se teria imposto. Mas teve realmente digamos a delicadeza, ou a modéstia ou o que quer que seja, isto também estava dentro dos costumes da época, de se colocar um pouco à sombra do génio que com ela coabitava. Isso foi-lhe fatal, não é? Foi-lhe fatal. Levou-a a subalternizar-se até um ponto que provavelmente seria muito angustiante para ela, mas que também dá a dimensão da sua grandeza. Naquele casal, o que estava presente, no fundo, era o culto da genialidade, um culto em que de facto o ídolo era o Camilo e Ana Plácido seria a sacerdotisa. (Narrador) Em 1888 casa finalmente com Ana Plácido. Ela tem 56 anos e Camilo está a chegar aos 63. Mas a cegueira aumenta e já não consegue escrever. Vai aos médicos do Porto, depois aos de Lisboa, em busca de uma cura. Volta desiludido para Seide com a esperança a desaparecer. Em 1890, vive os dias do desespero e ouve muitos editores recusarem o seu último livro. A custo, publica um conjunto de sonetos chamado Nas Trevas, toque de finados literário do grande escritor. (Voz de Camilo Castelo Branco) Sou o cadáver representante de um nome que teve alguma reputação gloriosa neste país durante 40 anos de trabalho. Chamo-me Camilo castelo Branco e estou cego. (Narrador) O oftalmologista que o visita na sua casa em Seide no dia 1 de junho de 1890, não lhe permite a esperança. A cegueira é irreversível. Sozinho na sala, Camilo desiste da vida, encosta o cano do revólver ao lado direito da cabeça e dispara. (António Trabulo – Escritor) Quem depende dos olhos, quem depende da escrita, quem depende da leitura, para quem tudo o que de mais importante fez na vida, deixar de ver, e não foi só o deixar de ver. A doença não tirou só a vista a Camilo. Também andava com dificuldade. Era preciso levá-lo. Camilo teve um fim triste, uma vida doente e depois cometeu o suicídio. Aliás, o suicídio era uma ideia romântica antiga em Camilo. Quer dizer, provavelmente não teria nada a ver com realidade. O suicídio de Camilo é um bocado de eutanásia, é abreviar um fim quando a vida já não tem qualidade nenhuma. (Narrador) Tal como Mariana que em Amor de Perdição se atira ao mar ao encontro de Simão, também camilo escolhe terminar os seus dias por não mais poder exercer o amor pela escrita.
  • 13. (Voz de Camilo Castelo Branco) E, antes que que o baque do cadáver se fizesse ouvir na água, todos viram, e ninguém já pôde segurar Mariana, que se atirara ao mar. (…) Viram-na, um momento, esbracejar, não para resistir à morte, mas para abraçar-se ao cadáver de Simão, que uma onda lhe atirou aos braços. O comandante olhou para o sítio donde Mariana se atirara, e viu, enleado no cordame, o avental, e à flor da água, um rolo de papéis, que os marujos recolheram na lancha. Era, como sabem, a correspondência de Teresa e Simão.