Tratamento de resíduos de óleo isolante em empresa de energia
1. ASPECTOS SOBRE RESPONSABILIDADE AMBIENTAL E
TRATAMENTO DE RESÍDUOS DE ÓLEO ISOLANTE MINERAL
EM UMA EMPRESA DE ENERGIA ELÉTRICA DO SUL DO
BRASIL: um estudo de caso
Marcos Surian Thomaz (UTFPR) Especializando em Engenharia da Produção -
marcos_surian@ig.com.br
Isaura Alberton de Lima (UTFPR) Professora Orientadora - alberton@cefetpr.br
Cezar Augusto Romano (UTFPR) Professor Orientador - caromano@cefetpr.br
Ivanir Luiz de Oliveira (UTFPR) Professor Titular - ivanir@pg.cefetpr.br
Carlos Cezar Stadler (UTFPR) Professor Titular - cstadler@pg.cefetpr.br
Daniel Gueiber (COPEL) - gueiber@copel.com
Resumo
A sociedade, nas últimas décadas, têm mudado sua maneira de perceber o papel das empresas.
De um enfoque puramente econômico, as organizações passaram a ser cobradas pela sua
postura social e de responsabilidade ambiental. Este artigo aborda a solução adotada em uma
empresa de energia elétrica do sul do Brasil para tratar o problema do descarte do óleo isolante
mineral, presente nos equipamentos elétricos de potência. Com este objetivo, foi construída uma
máquina que filtra e regenera o óleo envelhecido, promovendo economia na compra de óleo
novo, e evitando que haja uma contaminação do meio ambiente com um produto altamente
poluidor.
Palavras-chave: Gestão ambiental, Ecologia, Óleo mineral, Resíduos, Regeneração, Filtragem.
1. Introdução
O ambiente dos negócios a nível mundial tem apresentado mudanças ao longo das
últimas décadas. Inicialmente, nos anos 60, as empresas eram vistas somente como
instituições econômicas, preocupadas com problemas econômicos fundamentais (o que
produzir, como produzir e para quem produzir). Recentemente, elas têm sido vistas como
instituições sócio-políticas, preocupadas com outros aspectos, tais como proteção ao
consumidor, controle da poluição, segurança e qualidade dos produtos, assistência médica
e social, defesa de grupos minoritários, entre outros (DONAIRE, 1999).
Ainda segundo Donaire (1999), esta visão é resultado de uma mudança de
enfoque que está acontecendo no pensamento da sociedade, mudando sua ênfase do
econômico para o social. A sociedade têm se preocupado com o comportamento ético das
empresas, o que tem resultado em uma nova legislação (leis e regulamentos) que tenta
melhorar o padrão ético das corporações.
2. A Questão Ambiental
Um dos aspectos desta nova visão voltada para o social é a preocupação
2. ecológica. O conceito de desenvolvimento sustentável como sendo o atendimento das
necessidades do presente sem o comprometimento da capacidade das gerações futuras
atenderem às suas tornou-se primordial, e é amplamente considerado pela sociedade. Uma
empresa que não apresenta preocupação com os aspectos ambientais pode ter como
resposta um aumento dos custos, diminuição dos lucros, perda de posição no mercado e,
até mesmo, privação da liberdade ou cessação de atividades (DONAIRE, 1999).
Segundo Galdino et al. (2002), as empresas implantam sistemas de proteção
ambiental tanto por imposição do mercado, como por iniciativa própria visando retorno
financeiro no futuro. Em ambas as situações, a antecipação das questões ambientais é uma
estratégia comum e visa prevenir as fiscalizações dos órgãos ambientais.
Considerando a implantação de sistemas de gestão ambiental (SGA) em empresas,
existem normas técnicas criadas para prover as organizações de elementos para implantar
um SGA eficaz, para especificar requisitos para que este sistema capacite a empresa a
desenvolver e implementar política e objetivos que considerem os principais aspectos
ambientais significativos. Uma destas normas é a ABNT NBR ISO 14001:2004, publicada
pela Associação Brasileira de Normas Técnicas (ABNT) baseada na norma ISO
14001:2004, publicada pela International Organization for Standardization (ISO).
A norma ABNT NBR ISO 14001:2004 também considera esta nova preocupação
com o atingimento e demostração de um desempenho ambiental correto por parte das
organizações, por meio do controle dos impactos das suas atividades, produtos e serviços
sobre o meio ambiente, coerente com sua política e seus objetivos ambientais.
Ainda segundo Galdino et al. (2002), as empresas exploradoras de petróleo são
altamente influenciadas pela questão ambiental por se tratar de um ramo industrial com
alto potencial de poluição e contaminação.
As empresas do setor elétrico também estão na mesma situação que as de petróleo
devido à presença de óleo isolante mineral dentro dos equipamentos existentes no sistema
elétrico de potência.
3. Óleo Isolante Mineral
O óleo isolante mineral é um hidrocarboneto, obtido do refino do petróleo a uma
fração de 300 °C a 400 °C, composto por cadeias com 19 a 23 átomos de carbono, podendo
ser predominantemente naftênico (estrutura em anéis), ou do tipo “A”, ou parafínico
(estrutura linear), ou do tipo “B”. Este óleo é utilizado como isolante elétrico e
refrigerante térmico (troca de calor por convecção) dentro de equipamentos elétricos de
potência. Os transformadores existentes nas redes elétricas aéreas de todo o Brasil, bem
como outros equipamentos existentes dentro das subestações de energia, utilizam este tipo
de substância. Calcula-se que 95 % dos equipamentos presentes na planta das empresas
distribuidoras de energia elétrica no Brasil utilizam óleo isolante mineral.
O óleo isolante mineral, após um período de uso dentro dos equipamentos, sofre
um processo de envelhecimento. O contato com a umidade, oxigênio e o cobre dos
enrolamentos internos dos equipamentos, além da presença de calor causam a oxidação do
óleo. Esta reação química origina hidroperóxidos e peróxidos que se depositam no fundo
dos tanques e, por sua vez, dão origem a outros produtos, tais como álcoois, aldeídos,
3. cetonas, ésteres, ácidos, sabões metálicos e água. Todos estes contaminantes precipitam-se
em forma de sedimento, o que deteriora a capacidade de troca de calor e de isolante
elétrico do óleo e diminui a vida útil do equipamento.
O óleo contaminado deve ser totalmente substituído por óleo novo após um certo
período de envelhecimento. Esta medida é adotada visando prolongar a vida útil e também
evitar acidentes com descarga elétrica nas partes internas do equipamento. O descarte deste
óleo tornou-se um problema de difícil solução, similar ao ocorrido com o descarte de óleo
lubrificante automotivo, pois ele é altamente poluente e pode degradar o meio ambiente
com muita intensidade. Para se ter a exata noção desta poluição, um litro de óleo isolante
mineral pode contaminar um milhão de litros de água.
4. Estudo de Caso sobre uma Máquina Regeneradora de Óleo Isolante Mineral
O caso estudado baseia-se em uma empresa distribuidora de energia elétrica do
sul do Brasil.
Não existe ainda um sistema de gestão ambiental (SGA) implantado na
organização porque, como coloca Galdino et al. (2002), não houve uma imposição do
mercado para que isto acontecesse.
Apesar de não haver um SGA implantado, conforme também cita Galdino et al.
(2002), a empresa procurou agir proativamente, procurando antecipar as questões
ambientais e prevenir irregularidades em fiscalizações futuras, atuando no problema
existente com o descarte do óleo isolante mineral.
Considerando ainda a preocupação com o controle dos impactos das suas
atividades, produtos e serviços sobre o meio ambiente, como consta no texto da norma
ABNT NBR ISO 14001:2004, a empresa começou a procurar soluções para que o óleo
mineral isolante contaminado não poluísse o meio ambiente.
Foi desenvolvida uma máquina que filtra e regenera o óleo isolante mineral. Desta
forma, procura-se evitar que o óleo mineral seja descartado no meio ambiente. Sua vida
útil aumenta consideravelmente e o impacto ambiental é minimizado. Este trabalho foi
realizado pela área de Engenharia da empresa, e, posteriormente, disponibilizado para uso
a todas às áreas de Operação do Sistema Elétrico das vários regionais.
A máquina consiste em filtrar e regenerar o óleo isolante que tenha uma certa
parcela de contaminação deixando o equipamento elétrico totalmente energizado e
funcionando, ou seja, além das questões ambientais também são observados requisitos
técnicos e de continuidade no fornecimento de energia. Devido ao custo da máquina e ao
fato de que ela fica instalada ao ar livre, sem proteção contra vandalismos, esta solução
está sendo adotada em transformadores de maior potência (tipicamente 7 MVA), com
maior volume de óleo (cerca de 3000 litros). Como citado anteriormente, os custos de
manutenção e operação destes equipamentos são minimizados, já que o não atendimento
dos consumidores devido ao equipamento ficar fora de operação implica no não
faturamento da energia e em multas emitidas pela Agência Nacional de Energia Elétrica
(Aneel), órgão regulador do setor elétrico no Brasil.
Para a realização do processo, a máquina capta o óleo na válvula inferior do
tanque do equipamento energizado, utilizando uma bomba com motor elétrico, faz ele
4. circular por três filtros em seqüência, e o devolve na válvula superior do tanque do
equipamento. Como o óleo dentro do equipamento circula por convecção e os detritos
estão concentrados no fundo dos tanques, a máquina é instalada em paralelo com o circuito
de fluxo de óleo e devolve óleo livre de impurezas. Por esta razão o equipamento não
precisa ser desenergizado para que o óleo seja filtrado.
Os filtros utilizados são de três tipos: filtro percolador de terra “Fuller”, filtro
particulado e filtro desidratador.
O filtro percolador é composto pelo elemento denominado terra “Fuller”. A
percolação consiste em atrair eletricamente as partículas sólidas que contaminam o óleo,
que são compostos por moléculas polares (possuem dois pólos elétricos: positivo e
negativo), que ficam depositadas na terra “Fuller”.
A terra “Fuller” é composta por quase 70 % de sílica (SiO2), entre 10 a 15 % de
alumínio (Al2O3), entre 10 e 13 % de magnésio (MgO), entre 2 e 4 % de ferro (Fe2O3),
entre 4 e 7 % de cálcio (CaO) e outras substâncias em menor quantidade. Se trata de uma
argila expandida que possui esta característica de atrair eletricamente as moléculas polares.
A quantidade padrão deste elemento no filtro percolador é de 30 g por litro de óleo que
será filtrado (90 kg para um transformador de 3000 litros de óleo).
O filtro particulado têm a função de reter as partículas da própria terra “Fuller”
que ficam presentes no óleo após ele passar pelo filtro percolador. Junto deste filtro é
colocado um medidor de pressão que serve para controlar a pressão do sistema como um
todo. Caso o valor ultrapasse a marca de 0,5 kgf, isto indica que os elementos filtrantes
internos do filtro particulado estão saturados e devem ser trocados.
O filtro desidratador serve para retirar a umidade existente no óleo isolante. Ele é
composto por filtros absorventes de água. Para se detectar se estes filtros estão saturados, é
recomendável medir a concentração de água no óleo na entrada e na saída do filtro. O valor
típico de concentração de água para óleo não contaminado é de 15 ppm (partes por
milhão). Este é o valor máximo para a saída do filtro desidratador. Se a saída apresentar
uma concentração próxima do valor obtido na entrada, então os elementos absorventes
devem ser substituídos.
Após passar pelos três filtros, o óleo regenerado é reconduzido ao tanque do
equipamento energizado pela válvula superior. Existe ainda um medidor de vazão na saída
do último filtro. A vazão padrão para o funcionamento da máquina é de 100 litros por hora.
A operação típica de regeneração e filtragem do óleo de um transformador de
potência de 7 MVA (tensões de operação de 34,5 kV e 13,8 kV) prevê 30 dias de
funcionamento da máquina. Como o transformador contém 3000 litros de óleo, tem-se que
todo o óleo do equipamento passará pela máquina em 30 horas. Portanto, todo o óleo do
transformador passará 24 vezes pela máquina.
A figura 1 ilustra o esquemático da máquina regeneradora de óleo isolante,
mostrando o fluxo do óleo desde o tanque do transformador, através da bomba e dos três
filtros descritos anteriormente, e voltando ao tanque. Existe a possibilidade de realizar a
passagem do óleo somente pelos filtros particulado e desidratador, fechando-se o registro
ilustrado com o número 3, mas esta operação é menos comum.
A figura 2 mostra um transformador de potência 7 MVA, instalado dentro de uma
subestação, sendo submetido à regeneração do óleo isolante mineral através da máquina
5. descrita. Este transformador continua energizado e em operação.
FIGURA 1 –ESQUEMA DA MÁQUINA REGENERADORA DE ÓLEO ISOLANTE MINERAL
FIGURA 2 – TRANSFORMADOR EM OPERAÇÃO SENDO SUBMETIDO À REGENERAÇÃO DO
ÓLEO ISOLANTE
A figura 3 revela a máquina com a bomba com motor elétrico, o filtro particulado,
6. o filtro desidratador e os medidores de vazão e de pressão. Já a figura 4 mostra a fotografia
do filtro percolador, que consiste do recipiente com capacidade para 160 kg de terra
“Fuller”.
FIGURA 3 – PARTE DA MÁQUINA REGENERADORA DE ÓLEO ISOLANTE
FIGURA 4 – RECIPIENTE DE TERRA “FULLER”
7. 5. Resultados Práticos
Em oito anos de utilização destas máquinas dentro da companhia, já foram
regenerados cerca de 3,3 milhões de litros de óleo isolante mineral. A economia, em
termos financeiros, foi de R$ 4 milhões, que seriam gastos na compra de óleo novo. Além
disto, o processo de regeneração apresentado possui licença do IAP (Instituto Ambiental
do Paraná) para ser utilizado dentro de subestações de energia elétrica energizadas.
Uma outra preocupação decorrente do processo é o descarte da terra “Fuller”
saturada de resíduos de óleo contaminado. Ela própria é submetida a várias sessões de
reciclagem até a saturação máxima. Como se trata de argila, está em estudo sua utilização
na construção civil como parte da mistura para fazer concreto.
6. Conclusões
Pode-se notar que a empresa, mesmo sem ter implantado um sistema de gestão
ambiental (SGA), e tãopouco obter certificação em alguma norma ambiental (nos moldes
da ABNT NBR ISO 14001:2004), por não haver obrigatoriedade destes procedimentos,
apresenta uma grande preocupação nesta área, condizendo com a mudança de enfoque no
pensamento da sociedade, mudando a ênfase do econômico para o social e o ambiental.
Esta preocupação se reflete no processo de regeneração de óleo isolante mineral,
utilizando máquina regeneradora desenvolvida dentro da própria empresa, conforme
descrito neste artigo, e também no descarte dos resíduos deste processo, como a terra
“Fuller”, que será utilizada como matéria-prima da construção civil.
ASPECTS ABOUT ENVIROMENTAL RESPONSABILITY AND ISOLATING
MINERAL OIL TREATMENT IN A POWER COMPANY IN SOUTH BRAZIL: case
study
Abstract
Society, in the last decades, has changed its way to see enterprises main role. From a pure
economic focus, the organizations passed to be seen by its social position and its enviromental
responsability. This article tells us about the solution adopted in a power company in South Brazil
to deal with the problem of isolating mineral oil rejection, existent inside the electrical power
equipaments. For this porpouse, a machine that filters and regenerates aged oil was built,
promoting economy avoiding purchasing new oil, and avoiding contamination of enviroment by a
high poluter product.
Key Words: Enviromental management, Ecology, Mineral oil, Residues, Regeneration, Filtration.
Referências bibliográficas
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Edição. São Paulo.
GALDINO, C.A.B.; SANTOS, E.M. DOS; PINHEIRO, J.I.; MARQUES JR., S. & RAMOS, R.E.B. (2002) –
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COPEL DISTRIBUIÇÃO (2003) – Tratamento de óleo isolante em transformador energizado. Apostila de
Curso.