Este documento discute a ética apresentada no Livro de Jó à luz do contexto do absurdo e da graça divina. O autor argumenta que apenas Deus compreende como o mal pode realizar o bem e que os seres humanos não devem tentar explicar os caminhos de Deus, mas sim discernir seus próprios pensamentos. O livro de Jó ensina que devemos buscar a Deus e o bem, em vez de tentar entender os planos divinos.
2. A ÉTICA DO CONTEXTO DO ABSURDO
O livro de Jó é o livro da fé e da ética vividos no contexto do absolutamente absurdo.
No livro O Enigma da Graça trato, entre outras coisas, desse problema.
Aqui fica um resumo que espero abra o apetite dos leitores para a leitura do livro que
escrevi, mas, sobretudo, aguce o desejo do leitor de ler na Bíblia o Livro de Jó.
A questão ética sobre o bem e o mal apresentada no Livro de Jó nos remete, como
ilustração, à observação de Juizes 14: 4, 19. Ali, bem como em tudo o mais que vem
na seqüência dos fatos narrados naquele texto — que eram, claramente, estratégias
de Deus para criar inimizade entre Sansão e os filisteus a fim de destruí-los—, abrese também a questão de se e quando os fins justificam os meios.
Ora, no texto de Juizes, os “meios” usados por Deus, todavia, não agradavam
às percepções imediatas dos pais e contemporâneos de Sansão. Entretanto,
estranhamente, isto “vinha da parte do Senhor”. E chamar isto de “vontade
permissiva” de Deus não passa de um ardil semântico e uma tentativa de “explicar” o
inescrutável, como se fosse uma “negociação divina” com “outras forças”, incluindo o
Diabo e o livre arbítrio humano.
Ora, essa tentativa de “salvar Deus” pela via de uma “vontade permissiva” não passa
de um mero vício filosófico de natureza escolástico-reducionista, própria também aos
amigos de Jó.
Sim! Não passa de mais uma tentativa de trazer Deus para os grilhões de nossas
ignorâncias!
Deus é o único que sabe o quê, num mundo caído, pode ser um “mal” que realiza um
“bem”, ao mesmo tempo em que sabe quais são os “bens” que realizam o “mal”.
Somente Deus não precisa de uma ética filosófica para o que faz!
Afinal, Ele só faz o Bem, mesmo que a nossa percepção filosófica imediata seja a de
que há um “mal” em curso!
Provavelmente, na eternidade, descubramos que nossos maiores males e dores
tenham sido nossas maiores e melhores bênçãos na Terra!
E quando se crê nesse Amor que à tudo criou, perde-se o medo, pois, a Graça cobre
o ser!
E o ser coberto pela Graça não se sente nu porque não está mais nu!
Entre os mortais, poucos seres chegaram aonde Jó chegou em sua alma e seu santo
3. atrevimento na presença de Deus.
Entretanto, no Livro de Jó — como de resto em toda a Bíblia — aprendemos que
Deus põe o homem tendo que discernir a própria perversidade de seu caminho e a
iniqüidade de seus próprios pensamentos, antes de ter que se pré-ocupar com os
“caminhos de Deus”, pois, esses, são previamente indisponíveis aos sentidos e às
percepções.
E este é o engano: fica-se querendo saber qual é o “caminho de Deus”—que de
acordo com Isaías é indisponível aos sentidos humanos—e não se busca discernir o
próprio existir humano na Terra, que é fruto, para o mal, de “pensamentos iníquos”, e
“caminhos perversos”.
Assim, a recomendação é para que se enxergue a si mesmo, e para que se tente
discernir nossas próprias construções de valores e pensamentos, que são os
produtores do nosso modo de caminhar—que pode ser bom ou mal.
O homem se manifesta na Terra como o produto de seus próprios pensamentos,
sejam eles justos ou iníquos! E isto nada tem a ver com o que ele “recebe” na vida,
mas com o modo como ele “responde” ao que “recebe”, incluindo todo “bem” e todo
“mal”.
Com relação aos “caminhos de Deus”, o que o próprio Deus diz é muito mais simples,
ou seja:
“Buscai-me e vivei!” E mais: “Buscai o bem e não o ma!”
E isto não vem de uma Lista ou de um Código fixo. O resultado que o genuíno
encontro com Deus promove é amor àquilo que realiza o bem em nós e no próximo!
Portanto, o que se pede a Deus é “vê se há em mim algum caminho mal e guia-me
pelo caminho eterno”.
E isto é obra de Deus no coração que o busca e que se abre para deixar seus
próprios pensamentos quando percebe que sua construção é iníqua; ou seja, quando
não é justa e, por essa razão, promove a perversidade.
Outro nome para essa dinâmica interior é arrependimento, que é mudança de mente,
de estrutura de pensamento e de proceder em relação a Deus, a si mesmo e ao
próximo!
E a estrada que nos leva à esse “entendimento”—como diz Isaías—pode até mesmo
ser um “caminho no mar e uma vereda nas águas tempestuosas”; ou “um caminho
no deserto”—e que, ao final, abre “rios no ermo”. Portanto, nos deixando “soltos” na
nossa presunção de saber qual é o “caminho de Deus” à priori, forçando-nos, assim,
a caminhar em fé, a fim de que—quem sabe—possamos um dia discernir as veredas
de Deus à posteriori!
O que passar disso, é problema dos amigos de Jó. Jó, todavia, nada mais tem a ver
4. com isto!
E o que você me diz?
É possível uma outra leitura do drama de Jó?
Caio
Copacabana
2002
Ps: Aproveite e baixe o livro " O Enigma da Graça " aqui no site . Faça isto e leia.
É pedra preciosa para a construção de sua alma. É o fundamento da disposição de
servir a Deus por Nada; ou seja: apesar do Absurdo.