Nota Técnica do Dieese sobre o substitutivo da reforma da previdência
O princípio previdenciário do direito à transição
1. O PRINCÍPIO PREVIDENCIÁRIO DO DIREITO À TRANSIÇÃO
COMENTÁRIO: Este breve texto é um extrato do meu futuro livro,
centrado na abordagem ao princípio do direito à transição na seara
jurídica da previdência social. A existência desse princípio foi levantada
em 2007, em meu Novo Direito Previdenciário Brasileiro, cuja terceira
edição também já está a caminho. Boa leitura!
As mudanças constitucionais relativas aos critérios para garantia de benefícios,
obedecendo aos padrões usuais de nosso direito, passam a vigorar a partir da publicação
da emenda constitucional que lhes deu causa, encontrando indivíduos que já haviam
cumprido os requisitos para se aposentar (Súmula n.° 359, do Supremo Tribunal Federal
— STF). Isto aconteceu com as emendas n° 20/98 (tanto em relação ao RGPS quanto em
relação ao RPPS) e n.° 41/03 (no tocante ao RPPS). Em todas elas, naturalmente,
enquanto os que já haviam cumprido os requisitos tiveram o reconhecimento ao direito
adquirido, os que ingressaram no mercado, após a mudança, submeteram-se aos novos
critérios.
Interessante, contudo, atentar para o caso dos que já estavam em atividade, mas
não cumpriram os requisitos necessários à aposentação. Em todas as emendas
constitucionais mencionadas, o Poder Constituinte Derivado teve a prudência de
estabelecer regras especiais (de transição) para aquelas pessoas que estavam nessa
situação.
A EC n° 20/1998 estabeleceu critérios mais rigorosos (principalmente a idade
mínima de 60 anos) para a aposentação dos servidores que ingressaram no serviço
público após a publicação da mencionada Emenda. Para aqueles que já estava no serviço
público, mas não haviam cumprido os requisitos necessários à aposentadoria, contudo,
criou um tempo de serviço adicional (que se tornou conhecido como pedágio) e uma
idade mínima inferior à idade mínima dos novos servidores. A EC n° 41/2003, que
retirou o direito à integralidade e à paridade dos novos servidores efetivos, estabeleceu
regras de transição para os que ingressaram antes do seu advento e não adquiriram direito
a benefícios (Capítulo 9).
Destarte, podemos identificar que existe no sistema jurídico-constitucional
previdenciário, mesmo que de maneira implícita, o princípio do direito a regra de
transição, certamente inspirado no princípio da segurança jurídica e da isonomia.
2. Podemos perceber nesse princípio a disposição de que, sempre que for inscrita uma
norma jurídica mais rigorosa em relação aos requisitos para aposentação, aqueles que
estão em atividade e não tenham adquirido o direito ao benefício, terão direito a urna
regra de transição, com rigor intermediário entre os novos e os antigos requisitos.
Os fundamentos desse princípio podem ser identificados nos seguintes elementos:
Como as mudanças previdenciárias partem do pressuposto do aumento da
expectativa de vida, a pessoa que ingressa após as mudanças tem, em tese,
uma expectativa de vida maior do que os que já estão no mercado de
trabalho;
Seria injusto que pessoas que estavam sob a mesma regra previdenciária
para aposentação que aqueles que conquistaram o direito adquirido,
fossem segregadas para modelos mais rigorosos tendo como parâmetro a
data de publicação de uma emenda, visto que essas pessoas trabalharam
parte de suas vidas profissionais em momentos semelhantes, com as
mesmas contribuições;
Seria igualmente injusta a situação em que um trabalhador ou servidor
labora, durantes anos, sob uma expectativa de direito que pode vir a ser
sucessivamente protelado, criando um cenário de incerteza quanto ao
direito à aposentadoria;
A crise dos regimes previdenciários deve-se, em sua maioria, por fatores
de má-gestão desses regimes, motivo pelo qual o peso das crises não deve
ser suportado pesadamente pelos contribuintes;
Por fim, o fato de que a regra de transição não deixa de implicar um ônus,
o que já significa uma "transação institucional" entre o Poder Público e o
trabalhador, em que cada um suporta um ônus para o equilíbrio das
finanças públicas.
Por fim, há que se analisar os exemplos claros em que o princípio do direito à
transição foi respeitado:
EC nº 20/1998, art. 8º;
EC nº 41/2003, art. 6º;
EC nº 47/2005, art. 3º.
3. Em conclusão, é plausível a existência do princípio, mesmo que implícito, do
direito a transição. Tendo em vista e equidade, a isonomia e as peculiaridades do direito
previdenciário, o segurado que, não tendo direito adquirido, mantém vínculo com um
regime de previdência social quando da publicação de emenda constitucional
reformadora, deve ter direito a uma regra transitória que estabeleça requisitos
intermediários (e justos) entre aqueles que já cumpriram os requisitos para aposentar-se
e aqueles que iniciam vinculo após a data da publicação.
O princípio do direito à transição pressupõe, portanto, que, havendo uma
mudança normativa que produza normas previdenciários com requisitos mais rigorosos,
quem está no mercado possui direito a uma regra transitória, não necessariamente tão
benéfica quanto a anterior, mas, jamais tão rigorosa quanto a nova.
A inobservância do princípio do direito à transição é motivadora de
inconstitucionalidade por omissão.
Estrutura do Livro
1 – O Direito Previdenciário e os Princípios Protetivos da Previdência Social;
2 – Os Impactos da Emenda Constitucional nº 20/1998 sobre o Direito Previdenciário
Brasileiro;
Onde serão analisados os impactos do princípio do equilíbrio atuarial em face
aos fundamentos jurídicos de direito tributário e previdenciário;
Onde serão analisados os impactos da padronização do RGPS e RPPS.
3 – O Princípio da Isonomia
4 – O Princípio da Segurança Jurídica
5 – As Regras Previdenciárias, a Isonomia e a Segurança Jurídica
6 – O Princípio do Direito à Transição: Fundamentos Jurídicos
7 – O Princípio do Direito à Transição e as Reformas Previdenciárias
8 – Problemas Práticos.
Recife, 29 de junho de 2016.