Entrevista AIMinho: Comunicação decisiva em tempos difíceis
1. Diário do Minho
TERÇA-FEIRA, 10 de abril de 2012 Entrevista www.diariodominho.pt 15
Entrevista Diário do Minho/Rádio FF a António Marques, presidente da AIMinho
Sem riqueza não há emprego
DR
A entrevista pode ser ou- AM O tecido empresarial não dade. Há duas ou três áreas
vida integralmente no site é todo igual. A nossa região é que passam com distinção: o
da Rádio FF, em www.fa- marcada pela indústria. O in- têxtil, embora haja algumas
cfil.braga.ucp.pt dustrial pensa, habitualmente, empresas em dificuldade; o
que o importante é produzir. calçado, que apanha margi-
Luís da Silva Pereira nalmente a nossa região; e a
Mas começou a perceber que,
Luísa Magalhães/FF
afinal, o importante não é só metalomecânica pura. Estão
produzir. Percebeu que tam- relativamente bem. Digo rela-
Luísa Magalhães (LM) – Dr. bém é importante vender, e tivamente porque podem al-
António Marques, é uma com lucro, não obstante as ten- guns empresários ouvir ou ler
honra tê-lo aos microfones dências em Portugal para con- o que estamos a dizer e dis-
do Periscópio da Rádio F.F. denar o que é lucro. O país só cordar. Sei que há dificulda-
Lançamos o desafio de con- será bom se tiver muito lucro, des, mas, neste enquadramen-
versar com os alunos da Fa- feito com ética, com trabalho, to, está a correr relativamen-
culdade de Filosofia, com os cumprindo as regras, ao con- te bem.
leitores do Diário do Minho trário de alguns fundamenta-
e, principalmente, com todo listas que ideologicamente de- LM Então em que área é que
o tecido social que está de- fendem o contrário. as coisas estão a correr
pendente da área empresa- mal?
rial que a AIMinho engloba. LM Não é possível defender AM O que está a correr pior é
A primeira pergunta é inevi- a falta de lucro… o setor da construção e obras
tável: como é ser o presiden- AM É claro, mas há muita gen- públicas.
António Marques, presidente da AIMinho
te da AIMinho? te que pensa que o país sai
António Marques (AM) – An- da situação em que está sem proximidades da empresa. Co- mundo onde não estamos em te, as empresas querem ven- LM E não virá a ultrapassar
tes de responder, quero saudar, riqueza. Sem riqueza não há municar é algo decisivo, até atividades protegidas. der, mas não há clientes com a crise, como a ultrapassou
na sua pessoa, a Universidade emprego. Algumas pessoas nos maus momentos. rendimento disponível. o setor têxtil?
Católica e saudar que se faça estão tolhidas por uma ideo- LM E quanto às áreas? AM O têxtil arrepiou caminho.
algo de excelência, sobretu- logia que já morreu há mui- LM Sobretudo nos maus mo- AM Quanto às áreas, não lhe LM E o financiamento da Os empresários viraram-se
do, fora de Lisboa, dos gran- tas dezenas de anos. O em- mentos… posso dizer quais é que vivem economia? para as novas tecnologias, os
des centros. Braga e a região presário finalmente percebeu AM Sobretudo nos maus mo- momentos bons. Para fazer o AM Associada à descida da novos produtos, os têxteis téc-
bem merecem. O tema “comu- que é preciso produzir, pro- mentos. É importante e deci- enquadramento: em maio de procura, há uma quebra no fi- nicos. Começaram a olhar para
nicação empresarial” tem esta- duzir bem, com qualidade, sivo saber comunicar. A AIMi- 2011, o antigo Governo assi- nanciamento da economia. a moda, para os novos merca-
do ausente das nossas iniciati- com eficiência. E é preciso ven- nho tem feito o que, às vezes, nou o memorando com a Troi- Porquê? Os mercados disse- dos, começaram a produzir
vas e da atividade empresarial. der com boa margem. Vender as pessoas não percecionam ka, que tem três obrigações: ram que Portugal estava ao com outra qualidade. No cal-
Para iniciar a resposta “Como aqui ou lá fora. Chama-se a como algo importante na de- pôr as contas públicas em or- nível do lixo. Qual foi a con- çado, a mesma coisa, sobretu-
é ser presidente da Associa- isso exportação e internacio- fesa dos seus empresários: pôr dem, recapitalizar e estabili- sequência? Foi que perdemos do no calçado emblemático,
ção Empresarial do Minho?”, é nalização das empresas, ou em cima da mesa um tema zar o sistema financeiro e, fi- a oportunidade de nos finan- porque o made in Portugal não
algo muito simples e pragmá- dos seus produtos. Mas há um que se chama comunicação nalmente, as reformas estru- ciarmos no exterior. O setor passava no estrangeiro. O
tico. É uma honra representar aspeto que me parece impor- permanente. A única pessoa turais. São os três pratos do empresarial do Estado e as made in Italy era, de facto, o
um tecido empresarial que tem tante e cuja falta penaliza mui- que contratei para os quadros menu da Troika. O que é que empresas públicas que esta- valor acrescentado. O mesmo
coisas muito boas. Criamos ri- to a região. A área empresa- da associação foi para a comu- aconteceu depois disso? Com vam endividadas a bancos es- par de sapatos made in Portu-
queza e emprego. Temos em- rial não pensa ainda em quan- nicação e imagem, porque re- as medidas de austeridade, trangeiros tiveram que liqui- gal ou made in Italy tinha va-
presários de excelência, temos to é importante comunicar puto que é algo decisivo para associadas à falta de financia- dar as suas responsabilidades. lores completamente diferen-
coisas que são mostráveis em com os clientes, com os for- as organizações. Só defende- mento da economia, estamos Onde foram buscar o dinhei- tes, em desfavor de Portugal.
qualquer parte do mundo. Por necedores, com os trabalha- mos as nossas empresas se for- hoje em grandes dificuldades. ro? Como não tinham depó- Hoje não é assim. Porquê? Por-
essas razões, é um encanto ser dores, comunicar com os mos capazes de comunicar. É Porquê? Porque o mercado sito a prazo tiveram que ir pe- que o calçado tem uma asso-
presidente da AIMinho. stakeholders, os que vivem nas assim que vencemos num global desceu e, internamen- dir à banca portuguesa. Esse ciação empresarial de excelên-
dinheiro fugiu da economia, cia, um centro tecnológico de
LM Em relação a este tecido do tecido produtivo. Passada calçado de excelência, e os
“
empresarial que a AIMinho meia dúzia de meses, a aus- empresários perceberam que
cobre, quais são as áreas que teridade, por um lado, a falta era preciso antecipar o tema
Hoje, made in Portugal passa bem em qualquer em devido tempo.
estão em pior situação? Que de financiamento por outro,
soluções há para resolver
mercado do mundo está a levar a que a maior par-
esta crise?
” te das áreas esteja em dificul- Continua na página 16
2. 16 www.diariodominho.pt Entrevista Diário do Minho
TERÇA-FEIRA, 10 de abril de 2012
Quem não comunicar bem
não passa na malha dos negócios
DR
Continuação da página 15 radas. Os empresários foram
induzidos em erro durante dé-
LM São, portanto, os parâ-
cadas. Temos empresários no-
metros de qualidade que es-
táveis, com um instinto fatal
tão em causa.
para o negócio. São do me-
AM Os parâmetros de qualida-
lhor que há no mundo. Mas
de, da moda, dos modelos…
o facto de eu, institucional-
mente, ser o presidente da As-
LM O preço, não?
sociação Industrial do Minho
AM O preço, sim. Hoje um par
obriga-me a dizer que não há
de sapatos está ao nível do
empresários nem empresas
preço de Itália. Além da qua-
continuadamente competiti-
lidade que sempre tivemos,
vas, se não houver um país
conseguimos pôr em cima do
continuadamente competiti-
produto a moda, o design, a
vo. E o meu país não o é.
tecnologia, pusemos a marca.
Hoje made in Portugal passa LM Está a referir-se aos fa-
bem em qualquer mercado
tores de produção?
do mundo. É comparável com AM Não vou falar naquela la-
Itália. Estamos a falar de dois
dainha da legislação laboral,
setores que são exportáveis,
que muito ofende os sindica-
o têxtil e o calçado exportam
tos, nem no preço da energia.
muito.
Falo, por exemplo, nesta pou-
ca vergonha que é pagar o
LM Continuo a pensar que
IVA ao Estado, passados uns
para o desenvolvimento des-
dias, e só receber do meu
sa área também terá contri- António Marques e Luísa Magalhães, produtora do programa Periscópio
cliente passados 3, 4 meses,
buído muito uma boa estra-
1 ano. Às vezes nem recebo
tégia de comunicação.
porque as coisas correm mal.
“
AM Quem não comunicar
Uma empresa que venda um
bem, e temos excelentes Mais do que nunca, a comunicação tem que estar milhão de euros, tem que en-
exemplos em Braga de boa
comunicação, quem não co-
na agenda de cada uma das empresas tregar, passados dias, ao Esta-
”
do sabe quanto? Hoje, pela
municar bem não passa na
taxa dos 23, tem que entre-
malha dos negócios. E comu-
gar 230 mil euros, mas prova-
nicar não é só pôr um anún-
velmente só vai receber do
cio no Diário do Minho. Tenho que nunca, a comunicação não achar que é importante. rio tem de comunicar bem. os banqueiros. É importantís-
seu cliente daqui a 4 ou 6 me-
que ajustar a minha comuni- tem que estar na agenda de Mas comunicar é algo instru- Comunicar com os trabalha- simo falar até com a família,
ses. As empresas não têm te-
cação aos vários públicos. Se cada uma das empresas, para mental para esta tarefa nobre dores e as estruturas sindicais. com os colegas de administra-
souraria para aguentar isto.
é um público institucional, se ter sucesso. que é produzir, vender, criar ri- Eu sei que alguns sindicatos ção. Isto é comunicar.
é particular… queza, criar emprego. Tenho a não estão do lado da empre- LM Exige um músculo finan-
LM A Faculdade de Filosofia certeza de que grande parte sa. Dizer do lado da empresa LM É comunicação interna.
ceiro muito grande.
LM Chama-se dominar pro- espera ter uma boa respos- dos empresários não quer ou- é dizer do lado dos trabalha- O problema está em conven- AM Exatamente. É a parte fis-
tocolos. ta dos empresários da re- vir falar do tema. Há-de repa- dores, do empresário, da equi- cer os empresários que, mui-
cal que continua a esmagar as
AM Exatamente. Hoje como gião, no sentido de oferecer rar que, quando a crise apare- pa. Ao contrário do que alguns tas vezes, o seu grande pro-
empresas e as pessoas. Retira-
nunca, recomendaria à minha às pequenas e médias em- ce, a publicidade baixa auto- defendem, retomando Karl blema é um problema inter-
-lhes competitividade. Hoje, os
região, já que a Católica o faz, presas a possibilidade de ga- maticamente, mas temos que Marx, já não vivemos em luta no e é esse que tem de ser
organismos do Estado, que são
e provavelmente a preços mui- nhar um instrumento de fazer um grande esforço. de classes. Hoje trabalhamos resolvido primeiro.
pagos pelos nossos impostos,
to ajustados à carteira de to- formação em termos de co- em equipa, em cooperação. AM Mas eu diria também ou-
pessoas e empresas, têm como
dos, recomendaria que olhas- municação e estratégia que LM A publicidade é apenas Trabalhadores, empresários, tra coisa. Não me sinto bem
passatempo porem pedras no
sem para a comunicação como lhes permita uma visão de um dos aspetos da comuni- clientes, fazemos parte de uma quando se trata mal os em-
caminho. Sou acionista de uma
forma de chegar aos negó- futuro. cação. equipa que tem de marcar go- presários. Hoje, em Portugal,
empresa têxtil que demorou
cios. Num mercado em crise, AM Totalmente de acordo com AM Claro. A publicidade deve los, criar riqueza e emprego. É tudo o que acontece é culpa
mais de 10 anos a ser licen-
se faço coisas boas, tenho de este aspeto da comunicação surgir de uma política de co- importantíssimo ter uma boa dos empresários. Estou nos
ciada...
as comunicar ao mercado in- empresarial. Em momentos de municação. Quando as coisas comunicação com os sindica- antípodas desta visão. Tive-
terno e ao externo. Mais do crise, os empresários podem correm mal é que o empresá- tos, com os fornecedores, com mos foi políticas públicas er- Continua na página 17
3. Diário do Minho
TERÇA-FEIRA, 10 de abril de 2012 Entrevista www.diariodominho.pt 17
Já não vivemos em luta de classes
DR
Continuação da página 16 facilidades que aqui não vou sível? Acha normal, em deter- sassossego intelectual em que
comentar... Devo dizer ainda minadas ruas de Braga, casas vivemos. Por que é que a área
LM Isso é uma burocracia in- que Portugal não controla brutais e a pessoa não paga política não está interessada
compreensível... bem. Tem de facilitar as pes- praticamente IRS? É preciso nisto? Não vou responder. Te-
AM Por que é que a porta do soas e as atividades econó- ter a coragem política para, nho a minha resposta, mas
balneário dos trabalhadores micas, mas também de ter de uma vez por todas, ver o não vou responder.
que abria para a esquerda mão pesada para quem pre- que se passa. Como é que
tem que abrir para a direita? varica. Por exemplo, acha nor- ando de Mercedes ou de Fer- LM Há respostas que não
Mais dois anos. Arranjamos mal alunos universitários de rari, tenho a casa que tenho podem ser transcritas, as-
pequenos problemas que é BMW e Mercedes terem bol- e não pago impostos? De sim, com tanta transparên-
para depois criarmos algumas sas de estudo? Como é pos- onde é que vem esse dinhei- cia. Dr. António Marques de-
pois de esta intervenção ca-
lorosa, revolucionária e ho-
nesta…
Braga, em termos
AM E autêntica!
Instalações da AIMinho
LM E autêntica, resta-nos
de construção, desapareceu ro? É por isso que eu defen-
do a criminalização do enri-
que as finanças não fazem
uma análise das verdadeiras
agradecer a sua presença
aos nossos microfones, e de-
quecimento ilícito não só dos fortunas, ou dos sinais exte- sejar que, à frente da Asso-
LM O que é que se passou no setor da LM Estamos a falar, portanto, de estratégia
construção? empresarial? políticos, mas de todos. Se riores de riqueza? ciação Industrial do Minho,
AM No setor da construção não fomos ca- AM Estamos a falar de estratégia. Braga, em tenho um património de X continue a estar uma pes-
pazes de antecipar. A responsabilidade é termos de construção, desapareceu. São milhões, tenho que provar de LM Contas feitas, acabáva- soa que defende os princí-
dos governos, das câmaras, das associações pequenas obras as que existem. Mas não é onde é que vem o dinheiro. mos por equilibrar as ba- pios e os valores de uma
empresariais, que não tiveram capacidade só Braga, é o Minho, é o Norte, é o país. Se se fizer isso, grande parte lanças do Estado sem a forma tão aguerrida e tão
para convencer os seus clientes. E é também Não há dinheiro para as grandes obras
da corrupção acaba em Por- Troika. honesta. Muito obrigada.
dos empresários. Quando digo que o setor públicas. Essa é uma razão de o investimen-
não é exportável quero dizer que não posso to público e o PIB estarem a cair. Como não tugal. Eu sou dos que enten- AM Podíamos descer o IVA, o AM Felicito a Universidade Ca-
fazer apartamentos aqui e depois exportá- temos possibilidade de fazer grandes obras, dem que, para não esmagar IRC, o IRS e dividíamos o es- tólica e sobretudo a Faculda-
-los. É só para o mercado interno, um mer- restam as pequenas obras de proximidade as pessoas e as empresas, te- forço por todos. Mas o mais de de Filosofia por este em-
cado curto, que se esgota facilmente. Já em que, lamentavelmente, o Governo não está mos que recolher dados so- importante é acabar com a penho numa área tão impor-
2003/2004 estava preocupado com o setor. a pôr na agenda. Mas tem que pôr, urgen- bre quem faz vida faustosa e corrupção. Há coisas que se tante para as nossas empre-
Via em Braga, Famalicão Barcelos – em temente. Podem salvar algumas pequenas
Guimarães, menos – o “vende-se”, “vende-se”, não se sabe de onde é que dizem, boatos, rumores, e não sas e que muito contribuirá
empresas da nossa região e do país, que
“vende-se”. Os empresários do setor da são importantes para a riqueza e sobretudo vem o dinheiro. Por que é podemos continuar neste de- para o seu sucesso.
construção não perceberam a mensagem, para o emprego.
antecipando a correção do mercado. Mais Pub
tarde, há três, quatro anos, a associação LM Mas qual é a solução?
começou a desenhar um projeto que veio a AM A solução é as empresas ganharem
dar no cluster da construção. O cluster da músculo e massa crítica para ir para o exte-
construção não chega a 40 empresas. São rior. Para isso não podem ir sozinhas, não
empresas de novas tecnologias, de energias, temos dimensão. Nenhuma empresa, por
enfim, é muito mais vasto que a construção exemplo, na região do Minho tem capaci-
e obras públicas. Tem uma visão muito mais dade para, isoladamente, assumir grandes
em banda larga. projetos no exterior. É isto que os empresá-
rios, de uma vez por todas, têm de perceber.
LM Esse cluster foi feito na sequência de
Se não perceberem, não vão sobreviver.
um projeto da Associação Empresarial do
Minho… LM Mas há grandes empresas de constru-
AM Sim, desenvolveu-se no sentido de
ção!
conquistar as empresas internacionais. AM São grandes, mas são pequenas no
Porquê? Eu posso exportar lençóis e sapa- mundo. Se é para ir para o exterior, temos
tos, mas não posso exportar prédios. que ter juízo na cabeça e perceber que, so-
Posso exportar experiência e mão de obra zinho, não chego lá. É esta a esperança que
qualificada. Se vou para Angola, levo daqui eu tenho: que os empresários, colocando os
alguns trabalhadores, mas a grande parte olhos naquilo que a sua associação regional
vai ser de Angola, como é evidente. Ainda e outras associações estão a fazer, percebam
hoje lamento os empresários não terem a ideia do cluster, de criar massa crítica, criar
tido a inteligência e a coragem de sair da músculo, preparar as pessoas para a inter-
sua zona cómoda, da sua empresa. Têm de nacionalização. Porque internacionalizar no
ter mais músculo, de caminhar no sentido Irão não é a mesma coisa que na Rússia ou
da concentração da empresa, da concen- na França. Uns mercados exigem pessoas
tração de estruturas, para irem para o com determinado perfil, e outros mercados
exterior. exigem pessoas com outro perfil.