Este documento discute o processo de reconhecimento dos direitos dos índios Tabajara no litoral sul da Paraíba. Apresenta o histórico de ocupação das terras Tabajara e seu processo de espoliação ao longo do tempo. Descreve também o atual processo de demarcação de terras indígenas junto à FUNAI, visando o reconhecimento da identidade étnica do povo Tabajara e a garantia de seus direitos constitucionais às terras tradicionais.
1. OS ÍNDIOS TABAJARA EM BUSCA DOS SEUS DIREITOS
Jamerson Bezerra Lucena1
Ruth Henrique da Silva2
RESUMO
Este trabalho apresenta um debate sobre os direitos indígenas brasileiros, incluindo o processo
de reivindicação e demarcação de terras indígenas. E focaliza no processo de reconhecimento
étnico dos índios Tabajara situados no litoral sul paraibano que estão relacionados a conflitos
territoriais existentes naquela área, e a expectativa de conseguir através da Fundação Nacional
do Índio - FUNAI e do Ministério Público Federal a garantia dos seus direitos estabelecidos
na Constituição Federal de 1988. Conceitos relacionados à identidade étnica e seus
desdobramentos são utilizados para fundamentar cientificamente, e que o processo de
demarcação de terras indígenas passa por legislações políticas específicas e de intervenção
jurídica.
Palavras-chave: Direitos indígenas do Brasil; Indígenas Tabajara; Identidade étnica.
1. INTRODUÇÃO
Primeiramente gostaria de esclarecer que o contato com os índios Tabajara ocorreu
quando eu estava estagiando na Fundação Nacional do Índio – FUNAI no ano de 2010-2011
em João Pessoa, e a partir daí tomei conhecimento sobre as questões indígenas e os conflitos
territoriais existentes com essa etnia indígena. Os índios Tabajara atualmente estão
localizados na zona rural do município do Conde litoral sul da Paraíba e outra parte está
vivendo na periferia da capital paraibana.
Os objetivos desse trabalho são de demonstrar como está ocorrendo o processo de
reconhecimento de identificação étnica do povo indígena Tabajara, e consequentemente o
processo de demarcação de Terra Indígena com a assistência do órgão indigenista Federal,
nesse caso, a FUNAI.
1
Formado em Administração/IESP e Mestrando em Antropologia pelo PPGA/UFPB.
2
Professora Adjunto da UFPB e no Programa de Pós-Graduação em Antropologia – PPGA/UFPB.
2. Devido ao processo de espoliação de suas terras no decorrer do tempo os índios
Tabajara foram se organizando, e desde o ano de 2006 vem buscando junto a Fundação
Nacional do Índio - FUNAI retomar as suas terras de origem. Vale ressaltar que esse processo
ocorreu porque suas terras de origem foram ocupadas por latifundiários e empresários, e dessa
forma os Tabajara reivindicam seus direitos junto ao órgão indigenista federal. No ano de
2009 os índios Tabajara conseguiram da FUNAI a autorização para a formação de um Grupo
Técnico (GT) para a construção de um Relatório de Fundamentação Antropológica, e como
consequência disso será constituído neste ano de 2015 um GT para iniciar o processo de
delimitação de Terra Indígena dos Tabajara no litoral sul paraibano, conforme declaração do
presidente da FUNAI, Flávio Chiarelli.
2 METODOLOGIA
Realizarei procedimentos metodológicos de acordo com o Código de Ética da
Associação Brasileira de Antropologia – ABA, pois, seguindo as instruções da ABA, as
populações tem o direito de acesso aos resultados da investigação, de ser informadas sobre a
pesquisa entre outros direitos pertinentes às populações pesquisadas.
Farei entrevistas com os anciãos, lideranças indígenas e com o cacique dos Tabajara
no intuito de coletar informações relevantes para dar uma maior legitimidade ao meu artigo
científico. Vale ressaltar, que a permissão para a entrevista será mediante a leitura e entrega
do Termo de Consentimento Livre Esclarecido (TCLE) quando se fizer necessário e propício,
seguindo também, com rigor, o código de ética da ABA e da Comissão Nacional de Ética em
Pesquisa (Parecer nº 695/2008/CONEP).
Além disso, pretendo coletar dados, informações de documentos pertinentes que estão
sob os cuidados dos órgãos de apoio aos indígenas, tais como FUNAI, Secretaria Especial de
Saúde Indígena (SESAI), além do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), que
estão inerentes ao processo de inter-relação e contato dos índios Tabajara com os brancos
como, por exemplo, levantamento de famílias indígenas Tabajara que moram na cidade de
João Pessoa e zona rural, demonstrando a situação de risco social dessa etnia indígena
Dentre as possibilidades que a antropologia oferece, optarei pelo relato etnográfico
por crer que através dessa ação torna-se mais eficaz a comunicação, proporcionando o
encontro com a alteridade. E isto nos faz ter um “olhar devidamente sensibilizado pela teoria
3. disponível” e o ouvir “preparado para eliminar todos os ruídos” (CARDOSO DE OLIVEIRA,
1998, p. 19, 21).
3. FUNDAMENTAÇÃO TEÓRICA
Os índios Tabajara fazem parte da história da Paraíba principalmente no momento em
que eles, liderados pelo índio Piragibe, aliaram-se aos portugueses no século XVI “iniciando-
se uma fase de sangrentas vitórias contra os Potiguara e franceses em favor da tão sonhada
colonização e dominação do território pela coroa portuguesa” (FARIAS & BARCELOS,
2012, p. 76). Como consagração pelos serviços prestados aos portugueses foi doada, ainda em
1614, pelo Capitão-Mor da Paraíba, três sesmarias que tinham juntas, uma dimensão que ia do
rio Gramame até o rio Abiaí, no Litoral Sul da Paraíba (ANDRADE et al, 2012). No século
XIX os índios Tabajara ocupavam a sesmaria do litoral sul paraibano denominada, Jacoca.
Território demarcado na década de 1860 que continha 57 lotes, onde as famílias indígenas
Tabajara viviam no Sítio dos Caboclos no município do Conde, estado da Paraíba (FARIAS
& BARCELOS, 2012, P. 86).
As reivindicações a respeito dos direitos indígenas brasileiros estão estabelecidos na
Constituição Federal do Brasil de 1988, e no Decreto nº 1.775, de 08 de janeiro de 1996 que
trata sobre o procedimento administrativo de demarcação de terras indígenas. Desta forma,
cabe a FUNAI tomar providências para garantir o acesso indígena à terra, com a realização de
processos administrativos previstos pelo Decreto nº 1.775/1996, “Identificação de delimitação
de Terra Indígena - T.I.”, através da composição de Grupos Técnicos (GT) formado por
equipe multidisciplinar e coordenado por um antropólogo para a construção de um Relatório
de Fundamentação Antropológica. O produto deste trabalho é um relatório antropológico
realizado por uma expertise da área identificada como indígena, cujo resumo é encaminhado
ao Ministério da Justiça (MJ) e publicado no Diário Oficial da União (DOU) e no Diário
Oficial do Estado (DOE) em que incida (m) a Terra Indígena (T.I.). A partir de então,
conforme previsto no Decreto nº 1.775/96, as partes afetadas no processo de identificação e
delimitação de T.I., têm 60 dias para questionar o relatório circunstanciado, emitido pela
FUNAI, e esta mais 90 dias para contra argumentar. Aprovado todo o processo, procede-se à
demarcação física da T.I. pelo órgão indigenista federal e posterior encaminhamento à
Presidência da República para homologação e registro na Secretaria de Patrimônio da União
4. (SPU). Havendo questionamentos jurídicos das terras identificadas como indígenas pelo
estado brasileiro o processo administrativo pode ser interrompido até ter uma decisão judicial.
Esse processo de demarcação de terras indígenas no Brasil passa pelo conceito de
territorialização3
que tem o intuito de proporcionar uma reorganização social estabelecendo
uma identificação étnica, e assim, constituindo um conjunto sociocultural permeado de
mecanismos políticos especializados com o intuito de se manter o controle social estável.
Outro conceito fundamental para esclarecer melhor esse processo é o de indianidade4
que traz essa característica comum a todos os grupos indígenas que contam com a
presença/atuação do órgão tutor. Vale ressaltar que as formas de identificar-se, o sentimento
de pertença são construídos de acordo com a interação com os outros, e é a partir dela que se
organizam como grupo étnico.
Portanto, de acordo com Fredrik Barth (2000, p. 32) “grupos étnicos passam a ser
vistos como um tipo de organização social. Nesse sentido, organizacional quando atores tendo
como finalidade a interação usam identidades étnicas para se categorizar e categorizar os
outros passam a formar grupos étnicos”.
Os direitos indígenas brasileiros está fundamentado principalmente na Constituição
Federal do Brasil de 1988, que garante o direito às terras tradicionalmente ocupadas, como
está exposto no Art. 231 e 232, a saber:
Art. 231. São reconhecidos aos índios sua organização social, costumes, línguas,
crenças e tradições, e os direitos originários sobre as terras que tradicionalmente
ocupam, competindo à União demarcá-las, proteger e fazer respeitar todos os
seus bens.
Art. 232 - Os índios, suas comunidades e organizações são partes legítimas para
ingressar em juízo em defesa de seus direitos e interesses, intervindo o Ministério
Público em todos os atos do processo. (BRASIL, 1988, grifo nosso)
Para legitimar ainda mais os direitos indígenas no Brasil, a despeito da, Constituição
Federal de 1988, temos a promulgação do Decreto nº 5.051/2004, no qual o estado brasileiro
torna-se signatário da Convenção nº
169 sobre povos Indígenas e Tribais em Países
Independentes da Organização Internacional do Trabalho (OIT).
4 CONSIDERAÇÕES FINAIS
3
A noção de territorialização tem a mesma função heurística que a de situação colonial (...), da qual descende e é caudatária
em termos teóricos. É uma intervenção da esfera jurídica que associa – de forma prescritiva e insofismável – um conjunto de
indivíduos e grupos a limites geográficos bem determinados. (OLIVEIRA, 2004, p.23)
4
A indianidade decorre um modo de ser característico de grupos indígenas assistidos pelo órgão tutor, modo de ser que eu
poderia chamar aqui de indianidade para distinguir do modo de vida resultante do arbitrário cultural de cada um.
(OLIVEIRA, 2004, p. 14, grifo do autor).
5. Baseado nesse estudo pode-se dizer que o processo de demarcação de Terras Indígenas
é bastante burocrático e exige um esforço do órgão indigenista federal com a parceria do
Ministério Público para que a Justiça possa ser efetivada de acordo com o que rege a
Constituição Federal do Brasil. Vale ressaltar, o papel fundamental do Ministério Público que
trabalha com imparcialidade priorizando sempre pelo cumprimento dos direitos assegurados
na Constituição.
Dentro desse contexto, pode-se perceber que a etnia indígena Tabajara está procurando
adquirir através da FUNAI à garantia dos seus direitos previstos na Constituição, e com isso
poder voltar a viver em suas terras de origem pelo que determina a lei.
REFERÊNCIAS
ABA – Associação Brasileira de Antropologia. Código de Ética. Disponível em:
http://www.portal.abant.org.br/index.php/institucional/codigo-de-etica. Acesso em: 18 abr.
2015.
ANDRADE, Tânia Maria de; GOMES, Antônio Pessoa; SILVA, Ednaldo dos Santos;
GOMES, João Pessoa; PEREIRA, Pedro Eduardo. Povos Indígenas da Paraíba. João
Pessoa/PB, Editora Grafset, 2012.
BARTH, Frederik. O guru, o iniciador e outras variações antropológicas. Rio de Janeiro:
Editora Contra Capa, 2000.
BRASIL. Constituição da República Federativa do Brasil de 1988. Diário Oficial [da]
República Federativa do Brasil, Brasília, DF, 05 out. 1988. Disponível em:
<www.planalto.gov.br>. Acesso em: 17 abr. 2015.
______. Decreto Nº 1.775, de 08 de janeiro de 1996. Diário Oficial [da]
República Federativa do Brasil, Brasília, DF, 08 jan. 1996. Disponível em:
<http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/decreto/D1775.htm.> Acesso em: 20 abr. 2015.
CARDOSO DE OLIVEIRA, Roberto. O trabalho do antropólogo: olhar, ouvir, escrever. In:
O trabalho do antropólogo. São Paulo: Unesp, Paralelo 15, 1998.
FARIAS, Eliane Silva. BARCELOS, Lusival A.. Memória Tabajara: manifestação de fé e
identidade étnica. João Pessoa:editora da UFPB, 2012.
OLIVEIRA, João Pacheco de. Uma etnologia dos “índios misturados”? IN: OLIVEIRA,
João Pacheco de (org.). A viagem de volta: etnicidade, política e reelaboração cultural no
Nordeste indígena.Rio de Janeiro, 2ª ed.Contra Capa, 2004.