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Escola E.B 2,3 Dr. António  Francisco Colaço Retalhos de Poesia… Trabalho Realizado por: João Francisco 8ºB Nº9 Rodrigo Silva  8ºB Nº15
Alguns dos principais escritores da literatura portuguesa António Nobre (1867-1900)Florbela Espanca (1894-1930)Jaime Cortesão (1884-1960)Teixeira de Pascoaes (1877-1952)Camilo Pessanha (1867-1926)Raul Brandão (1867-1930)
António Nobre Enterro de Ophelia Morreu, Vae a dormir, vae a sonhar... Deixal-a! (Fallae baixinho: agora mesmo se ficou...) Como padres orando, os choupos formam ala, Nas margens do ribeiro onde ella se afogou... Toda de branco vae, n'esse habito de opala, Para um convento: não o que o Hamlet lhe indicou, Mas para um outro, horror! que tem por nome Valla, D'onde jamais saiu quem, lá, uma vez entrou!... O lindo Por-do-Sol, que era doido por ella, Que a perseguia sempre, em palacio e na rua, Vede-o, coitado! mal pode suster a vela... Como damas de honor, nymphas seguem-lhe os rastros, E, assomando no céu, sua Madrinha, a Lua, Por ellavae desfiando as suas contas, Astros!
Florbela Espanca Os Meus Versos Rasga esses versos que eu te fiz, amor! Deita-os ao nada, ao pó, ao esquecimento, Que a cinza os cubra, que os arraste o vento, Que a tempestade os leve aonde for! Rasga-os na mente, se os souberes de cor, Que volte ao nada o nada de um momento! Julguei-me grande pelo sentimento, E pelo orgulho ainda sou maior!... Tanto verso já disse o que eu sonhei! Tantos penaram já o que eu penei! Asas que passam, todo o mundo as sente... Rasgas os meus versos... Pobre endoidecida! Como se um grande amor cá nesta vida Não fosse o mesmo amor de toda a gente!...
Jaime Cortesão 	Oração do Deus-MeninoEra noite; e por encantoEu nasci, raiou o Dia.Sentiu meu pai que era Santo,Minha mãe, Virgem-MariaAs palhinhas de BelémMe serviram de mantéu;Mas minha mãe, por ser Mãe,É a Rainha do Céu.Nem há graça embaladora,Como a de mãe, quando cria;É como Nossa Senhora,Mãe de Deus, Ave-Maria! Está no Céu o menino,Quando sua mãe o embala.Ouve-se o coro divinoDos anjos, a acompanhá-la.Como num altar de ermida,Ando no teu coração;Para ti sou mais que a vidaE trago o mundo na mão.Não sei de pais, em verdade,Mais pobrezinhos que os meus;Mas o amor dá divindade,E eu sou o filho de Deus!
Teixeira de Pascoaes 	De Noite 	Quando me deito ao pé da minha dôr, Minha Noiva-phantasma; e em derredorDo meu leito, a penumbra se condensa, E já não vejo mais que a noite imensa, Ante os meus olhos intimos, acêsos, Extaticos, surprêsos, Aparece-me o Reino Espiritual... E ali, despido o habito carnal, Tu brincas e passeias; não comigo, Mas com a minha dôr... o amôr antigo. A minha dôr está comtigo ali, Como, outrora, eu estava ao pé de ti... Se fôsse a minha dôr, com que alegria, De novo, a tua face beijaria! Mas eu não sou a dôr, a dôr etérea... Sou a Carne que soffre; esta miseriaQue no silencio clama! A Sombra, o Corpo doloroso, o Drama...
Camilo Pessanha Em um Retrato 	De sob o cômoro quadrangular Da terra fresca que me há de inumar, E depois de já muito ter chovido, Quando a erva alastrar com o olvido, Ainda, amigo, o mesmo meu olhar Há de ir humilde, atravessando o mar, Envolver-te de preito enternecido, Como o de um pobre cão agradecido.
chove um dia, outro dia, sempre.amanhece um dia nublado,outro dia alvorece áspero e negro.o vento abala a pedrasobre que é construído o casebre.o inverno tem a sua voz própria,a sua cor, o seu vestido em farraposcom que agasalha os montesdeixando-lhe os ossos de fora.mas o inverno é sonho.só agora o compreendo.é sonho concentrado:sob esta casca ressequidaestá uma primavera intacta.esta voz clamorosa é a voz dos mortos.uma pausa,a prostração da tempestade,e depois redobra o clamor...andam aqui as suas lágrimas...na sufocaçãoreconheço esta voz que me chama.e depois a tempestade,novos gritos,a escuridão profunda... Raul Brandão Excerto do poema “Papéis do Gabiru” de Raul Brandão

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Escolas portuguesas e poetas clássicos

  • 1. Escola E.B 2,3 Dr. António Francisco Colaço Retalhos de Poesia… Trabalho Realizado por: João Francisco 8ºB Nº9 Rodrigo Silva 8ºB Nº15
  • 2. Alguns dos principais escritores da literatura portuguesa António Nobre (1867-1900)Florbela Espanca (1894-1930)Jaime Cortesão (1884-1960)Teixeira de Pascoaes (1877-1952)Camilo Pessanha (1867-1926)Raul Brandão (1867-1930)
  • 3. António Nobre Enterro de Ophelia Morreu, Vae a dormir, vae a sonhar... Deixal-a! (Fallae baixinho: agora mesmo se ficou...) Como padres orando, os choupos formam ala, Nas margens do ribeiro onde ella se afogou... Toda de branco vae, n'esse habito de opala, Para um convento: não o que o Hamlet lhe indicou, Mas para um outro, horror! que tem por nome Valla, D'onde jamais saiu quem, lá, uma vez entrou!... O lindo Por-do-Sol, que era doido por ella, Que a perseguia sempre, em palacio e na rua, Vede-o, coitado! mal pode suster a vela... Como damas de honor, nymphas seguem-lhe os rastros, E, assomando no céu, sua Madrinha, a Lua, Por ellavae desfiando as suas contas, Astros!
  • 4. Florbela Espanca Os Meus Versos Rasga esses versos que eu te fiz, amor! Deita-os ao nada, ao pó, ao esquecimento, Que a cinza os cubra, que os arraste o vento, Que a tempestade os leve aonde for! Rasga-os na mente, se os souberes de cor, Que volte ao nada o nada de um momento! Julguei-me grande pelo sentimento, E pelo orgulho ainda sou maior!... Tanto verso já disse o que eu sonhei! Tantos penaram já o que eu penei! Asas que passam, todo o mundo as sente... Rasgas os meus versos... Pobre endoidecida! Como se um grande amor cá nesta vida Não fosse o mesmo amor de toda a gente!...
  • 5. Jaime Cortesão Oração do Deus-MeninoEra noite; e por encantoEu nasci, raiou o Dia.Sentiu meu pai que era Santo,Minha mãe, Virgem-MariaAs palhinhas de BelémMe serviram de mantéu;Mas minha mãe, por ser Mãe,É a Rainha do Céu.Nem há graça embaladora,Como a de mãe, quando cria;É como Nossa Senhora,Mãe de Deus, Ave-Maria! Está no Céu o menino,Quando sua mãe o embala.Ouve-se o coro divinoDos anjos, a acompanhá-la.Como num altar de ermida,Ando no teu coração;Para ti sou mais que a vidaE trago o mundo na mão.Não sei de pais, em verdade,Mais pobrezinhos que os meus;Mas o amor dá divindade,E eu sou o filho de Deus!
  • 6. Teixeira de Pascoaes De Noite Quando me deito ao pé da minha dôr, Minha Noiva-phantasma; e em derredorDo meu leito, a penumbra se condensa, E já não vejo mais que a noite imensa, Ante os meus olhos intimos, acêsos, Extaticos, surprêsos, Aparece-me o Reino Espiritual... E ali, despido o habito carnal, Tu brincas e passeias; não comigo, Mas com a minha dôr... o amôr antigo. A minha dôr está comtigo ali, Como, outrora, eu estava ao pé de ti... Se fôsse a minha dôr, com que alegria, De novo, a tua face beijaria! Mas eu não sou a dôr, a dôr etérea... Sou a Carne que soffre; esta miseriaQue no silencio clama! A Sombra, o Corpo doloroso, o Drama...
  • 7. Camilo Pessanha Em um Retrato De sob o cômoro quadrangular Da terra fresca que me há de inumar, E depois de já muito ter chovido, Quando a erva alastrar com o olvido, Ainda, amigo, o mesmo meu olhar Há de ir humilde, atravessando o mar, Envolver-te de preito enternecido, Como o de um pobre cão agradecido.
  • 8. chove um dia, outro dia, sempre.amanhece um dia nublado,outro dia alvorece áspero e negro.o vento abala a pedrasobre que é construído o casebre.o inverno tem a sua voz própria,a sua cor, o seu vestido em farraposcom que agasalha os montesdeixando-lhe os ossos de fora.mas o inverno é sonho.só agora o compreendo.é sonho concentrado:sob esta casca ressequidaestá uma primavera intacta.esta voz clamorosa é a voz dos mortos.uma pausa,a prostração da tempestade,e depois redobra o clamor...andam aqui as suas lágrimas...na sufocaçãoreconheço esta voz que me chama.e depois a tempestade,novos gritos,a escuridão profunda... Raul Brandão Excerto do poema “Papéis do Gabiru” de Raul Brandão