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III – Comunicação (fragmento inicial)

NICHI NICHI KORE KO NICHI: TODO DIA É UM LINDO DIA
john cage 1958 - tradução walter vetor 2007

E se eu fizer trinta e duas perguntas?
E se eu parar de perguntar agora e então?
Isto tornará as coisas mais claras?
A comunicação é uma coisa clara?
O que é comunicação?
Música, o que ela comunica?
O que é claro a mim é claro a você?
A música são somente sons?
Então o que ela comunica?
Há um caminhão passando pela música?
Se eu posso vê-lo, posso ouvi-lo também?
Se eu não o ouço, ele ainda está comunicando?
Se enquanto o vejo não posso ouvi-lo, mas ouço algo além, digamos uma batedeira, por que estou
olhando para dentro, seria a batedeira ou o caminhão o que comunica?
Qual é mais musical, um caminhão passando por uma fábrica ou um caminhão 	
passando por uma escola de música?
As pessoas de dentro e de fora da escola são não-musicáveis?
Se as pessoas de dentro não podem ouvir bem, isto mudaria minha pergunta?
Você entende o que eu quero dizer com dentro da escola?
Os sons são sons somente ou eles são Beethoven?
Pessoas não são sons, são?
Existe algo como o silêncio?
Desde que eu desista das pessoas, eu estaria ainda dando ouvidos a algo?
Digamos que esteja perdido na selva, eu tenho de ouvir um fluxo tagarela?
Sempre há algo para ouvir, nunca um pouco de paz e silêncio?
Se minha cabeça é cheia de harmonia, ritmo e melodia, o que acontece comigo quando o telefone
toca, eu quero dizer, ao meu pedaço de paz?
E se estivessem na minha cabeça a harmonia, o ritmo e a melodia européias, o que aconteceria com
a história, digamos da música javanesa, na minha cabeça?
Estamos chegando a algum lugar fazendo perguntas?
Onde estamos indo?
Esta é a vigésima oitava pergunta?
São importantes algumas destas perguntas?
“Como você precisa agir com cautela em termos dualísticos?”
Eu ainda tenho mais duas perguntas?
E agora, eu não tenho nenhuma?
Agora que fiz trinta e duas perguntas, posso fazer mais quarenta e quatro?
Eu posso, mas eu devo?
Por que devo prosseguir perguntando?
Existe alguma razão em perguntar por quê?
Por que eu responderia o porquê se perguntas não são palavras, mas sons?
Se palavras são sons, elas são musicais ou apenas barulhos?
Se sons são barulhos não palavras, eles tem significado?
Eles são musicais?
Digamos que existem dois sons e duas pessoas e cada um deles é lindo,
existe entre estes quatro alguma comunicação?
E se existem regras, quem as fez, eu pergunto a vocês?
Começa em algum lugar, quero dizer, e onde pára?
O que acontecerá a mim ou você se estiver em um lugar onde não há beleza?
Pergunto a vocês alguma vez, também, sons acontecendo em tempo, o que	 acontecerá a nossa experiência de ouvir, de vocês, minha, a nossos ouvidos, ouvindo, o que acontecerá se os sons que são
belos pararem	 alguma vez e só sobrarem os sons sem beleza, feios, o que acontecerá?
Nós sempre estivemos aptos para sacar que o que achávamos feio era belo?
Se excluirmos a beleza, o que nós temos?
Temos a verdade?
Temos a religião?
Temos uma mitologia?
Saberíamos o que fazer com ela se tivéssemos uma?
Temos um meio de fazer dinheiro?
E se o dinheiro é feito, será para ser gasto com música?
Se a Rússia gasta sessenta milhões na Feira de Bruxelas, muito disso para a música e a dança e nos
Estados Unidos se gasta um décimo disso, algo como seis milhões, isto significa que nove entre dez
americanos sejam tão musicais quanto todos os russos juntos?
Se excluirmos o dinheiro, o que nós temos?
Desde que nós ainda não tenhamos excluído a verdade, onde a procuraremos?
Não dissemos que não estávamos indo, ou só perguntamos onde estamos indo?
Se não dissemos que não estávamos indo, por que não dissemos?
Se tivéssemos algum senso na cabeça, não saberíamos a verdade ao invés
de andarmos em círculo à procura dela?
Como estaríamos então aptos, como eles dizem, a beber um copo de água?
Nós sabemos (ou não?) a religião, a mitologia, a filosofia e a metafísica de trás	
pra frente e adiante de todo mundo, logo se necessita de que tivéssemos
uma para cada um de nós se tivéssemos uma, mas não temos, temos?
Mas e música, temos alguma música?
Não seria melhor se excluíssemos a música também?
Então o que nós teríamos?
Jazz?
O que restou?
Vocês querem dizer é um jogo sem propósitos?
É isto que acontece quando você acorda e escuta o primeiro som de cada dia?
É possível que eu possa continuar monotonamente perguntando para sempre?
Eu teria de saber quantas perguntas eu iria fazer?
Eu teria de saber como fazer contas para poder perguntar?
Eu teria de saber a hora de parar?
Seria por acaso que estamos vivos e fazemos uma pergunta?
Quanto mais viveremos estando aptos para viver?
MÚSICA CONTEMPORÂNEA		
NÃO É A MÚSICA DO FUTURO
NEM A MÚSICA DO PASSADO		
MAS APENAS
MÚSICA DO PRESENTE NA GENTE:		
ESTE MOMENTO, AGORA,
						
ESTE AGORA MOMENTO.
AGORA GAROA.
Algo inesperado aconteceu: estava fazendo
perguntas; agora estou citando uma conferencia
que pronunciei anos atrás. É claro que farei
mais algumas perguntas depois, mas não agora:
tenho citações a fazer.
O MOMENTO ESTÁ SEMPRE MUDANDO.
(ESTAVA EM SILÊNCIO: AGORA ESTOU
FALANDO.)
COMO PODEMOS FALAR O QUE É MÚSICA
CONTEMPORÂNEA, 	
SENDO QUE AGORA NÃO A ESTAMOS
OUVINDO, E SIM OUVINDO UMA
CONFERÊNCIA SOBRE ELA. E NÃO É ISSO.
ISTO É “MOSTRAR A LÍNGUA”. PARTINDO
DE ONDE ESTAMOS AGORA PARA
A MÚSICA CONTEMPORÂNEA
(ESTAMOS SÓ PENSANDO NELA) CADA UM
DE NÓS ESTÁ PENSANDO POR SI MESMO,
EM SUA PRÓPRIA EXPERIÊNCIA, E CADA
EXPERIÊNCIA É DIFERENTE E CADA
EXPERIÊNCIA ESTÁ MUDANDO E ENQUANTO ESTAMOS PENSANDO ESTOU
FALANDO E A MÚSICA CONTEMPORÂNEA
ESTÁ MUDANDO.
			
COMO A VIDA MUDA. 	
SE NÃO ESTIVESSE MUDANDO
ESTARÍAMOS MORTOS, E, É CLARO,
PARA ALGUNS DE NÓS, ÀS VEZES
ESTÁ MORTO, MAS A QUALQUER
MOMENTO MUDA E VIVE DE NOVO.
FALANDO POR UM MOMENTO SOBRE
LEITE CONTEMPORÂNEO:
SE A TEMPERATURA ESTÁ MUDANDO,
FERMENTOU ETC., E ENTÃO UMA NOVA

GARRAFA ETC., A MENOS QUE O
SEPARANDO NA MUDANÇA POR
SOLIDIFICAÇÃO OU REFRIGERAÇÃO
(QUE É UM MEIO DE DESACELERAR
SUA VIVICITUDE) 	
(ISTO É ACADEMIAS E MUSEUS SÃO
MEIOS DE PRESERVAÇÃO
NÓS SEPARAMOS COISAS
TEMPORARIAMENTE DA VIDA (POR
MUDANÇA) MAS A QUALQUER MOMENTO
A DESTRUIÇÃO PODE CHEGAR DE
REPENTE E ENTÃO O QUE ACONTECE É O
REFRESCAMENTO
QUANDO NÓS SEPARAMOS A MÚSICA DA
VIDA TEMOS A ARTE (UM COMPÊNDIO DE
OBRAS PRIMAS). COM A MÚSICA
CONTEMPORÂNEA, QUANDO É
REALMENTE CONTEMPORÂNEA, NÓS
NÃO TEMOS TEMPO PARA FAZER ESTA
SEPARAÇÃO (QUE NOS
PROTEJE DE VIVER), E ENTÃO, 	
A MÚSICA CONTEMPORÂNEA É
NEM TANTO SÓ ARTE QUANTO VIDA E
QUALQUER UM FAZENDO-A NÃO
FINDARÃO O MAIS BREVE QUE ELE
COMEÇA A FAZER OUTRO APENAS COMO
AS PESSOAS SEGUEM LAVANDO A LOUÇA,
ESCOVANDO OS DENTES, PEGANDO NO
SONO,
E ASSIM VAI. 			
MUITO FREQUENTEMENTE NINGUÉM
SABE QUE A MÚSICA CONTEMPORÂNEA
É OU PODERIA SER ARTE.		
ELE SIMPLESMENTE PENSA QUE ELA
É IRRITANTE.			
IRRITANTE DE UM MODO OU DE OUTRO,
ISTO É DIZER MANTENDO-NOS A
TENTOS À OSSIFICAÇÃO.
						
PARA QUALQUER UM DE NÓS A MÚSICA
CONTEMPORÂNEA É OU PODERIA SER
UM MODO DE VIDA.
HEXAGRAMPO - gregorio gananian e danielly omm (2012)

49 KO
4 MÊNG
arnaldo antunes
pesquisa
txt para três fontes _ daniel scandurra (2011)
música de invenção
é o livro-fonte,
lançado em 1998 é composto por
uma seleção de textos organizada pelo autor
augusto de campos, sobre música não popular
ou dita experimental, de invenção, vanguarda.
são artigos divulgados em diversas mídias
impressas
(a partir da década de 70 até o início de 90)
e divididos em algumas seções,
uma delas dedicada
exclusivamente a john cage: “musicaos”.
augusto foi um dos primeiros, senão o
primeiro
brasileiro a (divulgar) escrever (a) sobre (obra de)
músicos-inventores fundamen
tais como webern, varèse, satie e é claro
cage:
“o mais completo artista intersemiótico de nosso tempo,
o poeta dos multimídia,
o profeta e guerrilheiro da arte
inter|in|disciplinar”.
noigandres–antitodotédio
simultaneamente a um aprofundamento
no campo da música de invenção,
uma procura por cage
(em linguaportuguesa)
nos leva ao próprio augusto
e nesse diálogo um mundoárvo-rebrota
:
de cage à augusto à
poesia concreta, haroldo de campos,
décio pignatari, o grupo noigandres
e são muitos os pontos em comum entre
john cage e noigandres
além de serem pontas-de-lança,
ligados a vanguarda antiartística atemporal
e naturalmente quase nunca compreendidos
pelo público e crítica,
cage, paralelamente as suas inovações musicais
(google: prepared piano, imaginary
landscape, 4’33”..)
desenvolveu um intenso trabalho como escritor,
criando textos incrivelmente inovadores

“interessado na ‘linguagem sem sintaxe’
o que o aproxima da poesia concreta”
: como escreve augusto, responsável pelo
único livro
traduzido para o português de JC já
lançado no brazyl (“de segunda
a um ano” de 1985: até hj primeira e única edição
esgotada) :
“os livros de cage são como a sua própria música,
inovadores e imprevisíveis.
em todos eles há uma mistura
aparentemente disparatada de eventos.
cage fala não apenas de música, mas de ecologia,
política, zen-budismo, cogumelos,
economia e acontecimentos triviais,
extraindo poesia
de tudo e
de nada. um mosaico
de ideias, citações e histórias.
uma concepção tão antiacadêmica
que só poderia mesmo
chocar os meios
universitários mais provincianos.
‘eu estou aqui e não tenho nada a dizer
e o estou dizendo
e isto é poesia’
diz cage
em sua conferência sobre nada (1949)
enquanto os poetas que pretendem dizer tudo
já não nos dizem nada”
i	

	

t	

	

r

	n		e
		t		
de início se faz clara a tônica
de uma pesquisa adentrando essa galáxia:
a cada instante,
um novo beco
de cem saídas.
mas, também logo se percebe,
para a alegria do povo,
que todas essas saídas se entrecruzam, e
por conseqüência,
nos devolvem à john cage
, sem ser esse o ponto final ,
num labirinfinito.
de novo augusto na introdução
de “música de invenção”:
“preocupa-me, nos últimos tempos,
sobretudo,
a dessensibilização auditiva em relação à música
contemporânea. não me conformo com o fato
de a maravilhosa aventura de alto repertório
criada em nosso século, uma das mais ricas
de toda a história da humanidade,
ser tão mal conhecida e divulgada
entre nós,
desfavorecida, como tem sido, pela preguiça auditiva
e pela avidez mercantil das mídias.
a audição qualificada não pode
reduzir-se à música de entretenimento.
já é tempo de dar um tempo
aos colchões sonoros da música palatável
e aprender a ouvir aquela outra música,
a música-pensamento dos grandes mestres e inventores,
que impõe uma outra escuta, onde a reflexão,
a concentração, a sensibilidade
e a inteligência
são ativadas ao extremo.”
ele não chega a citar, neste livro,
a difusão da internet
como meio de comunicação popular
e seu atual papel nessa história.
o panorama quanto à falta de acesso do brasileiro
mudou completamente: o maior problema
já não é mais esse,
porém, permanece (e muito se acentua)
na preguiça auditiva de cada dia.
como não dependemos mais
da boa vontade de editoras e gravadoras
, cabem aos indivíduos
irem atrás da informação,
por vontade própria,
por indicação ou estimulados
por acasos off ou online.
por tanto se faz necessário criar
estímulos para que esse acesso ocorra
e nunca houve um meio
melhor
para isso
[parte de minha parte:
mosaicages.blogspot.com]
pois, assim
como a geração de caetano veloso
se viu no ambiente e no momento histórico
propício para assimilar a antropofagia de oswald
(com ajuda do resgate e reavaliação
promovido pela poesia concreta),
juntar samba, bossa nova, rock´n´beatles...

e desenvolver a tropicália,
vive-se atualmente, por nossa vez,
o ambiente e o momento
histórico propício
para, enfim, travententrar contato
com a obra e o universo desses músicos-inventores,
(do século passado mas ainda novidade e
vanguarda para o futuro do brasil).
basta(oqñé)pouco
e o que surgirá daqui em diante depende de nós,
do que vamos ouvir, do q vamos ver,
ou “ouver”, como prefere décio,
que em 1959 previa:
“eu vejo para o futuro um certo
cessar das transformações
e um longo período de redundâncias mais ou
menos aceitas e que formarão
a linguagem comum universal do fim do século,
quando a ação atual e próxima dos computadores já começar
a se fazer sentir em larga escala.”
cage também, como nesse trecho
de uma conferência de 1974,
(q poderia ser de hélio oiticica):
“assim como hoje qualquer um
se sente capaz de tirar uma fotografia,
no futuro próximo, usando recursos de
gravação e/
ou sistemas eletrônicos,
o espectador se sentirá encorajado
às atividades de compositor e
executante.”
realidade que arnaldo antunes, verifica:
“a linguagem, por exemplo,
da colagem, o mosaico de fragmentos,
poemas modernistas /
letras tropicalistas /
poesia concreta /
modernidade de um modo geral,
os meios digitais de hoje são ideais
para essa expressão.
o próprio copy/paste
já faz isso.
você já pensa um pouco editando
as coisas.”
isto é, a gente tem de superar todos
os pensamentos que separam
a música da vida
diadia _ juliana de lamare
	
daniel scandurra
id ego
“nichi nichi kore ko nichi...” jc
O Remorso da Experteza
Marshall Mcluhan | tradução de William Zeytounlian
	
Com o telégrafo, o homem ocidental
iniciou o processo de colocar seus nervos para
fora do corpo. Tecnologias anteriores tinham
sido extensões de órgãos físicos: a roda é colocar os pés para fora de nós, o muro da cidade
é um externar coletivo da pele. Mas os meios
eletrônicos são, ao contrário, extensões do sistema nervoso central, um campo inclusivo e
simultâneo. Desde o telégrafo, temos extendido os cérebros e nervos do homem ao redor do
globo. Como resultado, a era eletrônica sofre
de uma insegurança total, como um homem
usando o crânio por dentro e o cérebro por fora.
Tornamo-nos peculiarmente vulneráveis. O
ano de estabelecimento do telégrafo comercial
na América, 1844, foi também o ano em que
Kierkegaard publicou O Conceito de Angústia.
	
Uma propriedade característica de todas
as extensões sociais do corpo é que elas voltam
para afligir os inventores como um tipo de remorso da experteza. Como Narciso se apaixonou por uma externação (projeção, extensão) de
si mesmo, o homem invariavelmente parece se
apaixonar pelo novo dispositivo ou engenhoca
que é mera extensão de seu próprio corpo. Dirigindo um automóvel ou assistindo televisão,
tendemos a esquecer que aquilo que usamos é
simplesmente uma parte de nós mesmos presa
fora. Posto dessa maneira, nos tornamos servomecanismos de nossas invenções, respondendo
a elas da forma mecânica, imediata, que nos pedem. O ponto central do mito de Narciso não é
que as pessoas são propensas a se apaixonarem
por suas próprias imagens, mas que as pessoas
se apaixonam por extensões de si mesmas das
quais estão convencidas que não são extensões
de si mesmas. Isso dá, penso, uma imagem razoavelmente boa de todas nossas tecnologias e
nos direciona ao ponto principal, a idolatria da
tecnologia envolve torpor psíquico.
	
Toda geração posta à beira de uma mu-

dança massiva parece, aos futuros observadores,
ter sido alheia às questões e eventos eminentes.
Mas é preciso entender o poder das tecnologias
de isolar os sentidos e, dessa maneira, hipnotizar
a sociedade. A fórmula para a hipnose é “um sentido de cada vez”. Nossos sentidos privados não
são sistemas fechados, mas são incessantemente
traduzidos uns para os outros na experiência que
chamamos de consciência. Nossos sentidos extendidos, ferramentas e tecnologias, têm sido sistemas fechados incapazes de interação. Toda nova
tecnologia diminui o sentido de interação e sensibilidade para a área ministrada precisamente por
aquela tecnologia: ocorre uma espécie de identificação entre observador e objeto. Esse conformar
do espectador com a nova forma ou estrutura torna os que estão imersos mais profundamente em
uma revolução os menos cientes de sua dinâmica.
Em tais épocas, sente-se que o futuro será uma
versão alargada ou muito melhorada do passado
imediato.
	
A nova tecnologia eletrônica, porém, não
é um sistema fechado. Como extensão do sistema
nervoso central, ela lida precisamente em consciência, interação e diálogo. Na era eletrônica,
a própria natureza instantânea da co-existência
em meio a nossos instrumentos tecnológicos gerou uma crise um tanto nova na história humana.
Agora, nossas faculdades e sentidos extendidos
constituem um único campo de experiência que
pede para que se tornem coletivamente conscientes, como o próprio sistema nervoso central. Fragmentação e especialização, características do mecanismo, estão ausentes.
	
Na medida que ignoramos a natureza das
novas formas eletrônicas, somos manipulados por
elas. Deixem-me dar, como exemplo da forma pela
qual a nova tecnologia pode transformar instituições
e modos de proceder, um trecho do testemunho de
Albert Speer, ministro de armamentos da Alemanha
em 1942, nos julgamentos de Nuremberg:
O telefone, a teleimpressora e o sinal sem fio
tornaram possível que ordens dos altos escalões
fossem dadas diretamente aos baixos, onde, tendo em conta a absoluta autoridade por trás delas,
eram levadas a cabo acriticamente; ou enviadas
aos numerosos escritórios e centros de comando
diretamente conectados com a liderança suprema
da qual eles recebiam suas sinistras ordens sem
qualquer intermediário; ou resultaram na extensa vigilância do cidadão; ou em um alto grau de
confidencialidade em torno de incidentes criminais. Para o observador externo, este aparato governamental parece uma aparente confusão de linhas em uma ligação telefônica, mas, como essa,
ele podia ser controlado e operado de uma base
central. Ditaduras anteriores precisavam de colaboradores de alta qualidade até mesmo nos baixos escalões de liderança, homens que podiam
pensar e agir independentemente. Na era da técnica moderna, um sistema autoritário pode passar sem isso. Sozinhos, os meios de comunicação
permitem mecanizar o trabalho de lideranças subordinadas. Como consequência, um novo tipo
se desenvolve: o recipiente acrítico de ordens.

	
Televisão e rádio são imensas extensões
de nós mesmos que nos permitem participar da
vida uns dos outros, assim como a linguagem.
Mas os modos de participação estão previamente
construídos na tecnologia; essas novas linguagens
possuem gramáticas próprias.
	
As formas de pensamento implantadas
pela cultura eletrônica são muito diferentes daquelas nutridas pela cultura impressa. Desde a
Renascença, a maioria dos métodos e procedimentos tiveram a forte tendência de realçar a organização e aplicação visual do conhecimento. Os
pressupostos latentes na segmentação tipográfica
manifestam-se na fragmentação de ofícios e na
especialização de tarefas sociais. Alfabetização
define linearidade, consciência e modo de proceder segundo o princípio de “uma coisa de cada
vez”. Disso deriva a reunião em fileiras e a ordem
na batalha, a hierarquia administrativa e a departamentalização do decoro acadêmico. Gutenberg
nos deu análise e explosão. Pela fragmentação do
campo de percepção e a quebra de informação em
pedaços estáticos, alcançamos maravilhas.

	
Mas os meios eletrônicos procedem diferentemente. Televisão, rádio e o jornal (na medida
que estava ligado com o telégrafo) lidam com espaço auditivo, denominando assim aquela esfera
de relações simultâneas criadas pelo ato de ouvir.
Ouvimos todas as direções de uma vez só: isso
cria um espaço único, não visualizável. A simultaneidade do espaço auditivo é o exato oposto da
linearidade, de considerar uma coisa por vez. É
confuso aprender que o mosaico do jornal é “auditivo” em sua estrutura básica. Isso, contudo, só
quer dizer que qualquer padrão no qual os componentes co-existem sem junção ou conexão linear
direta – criando um campo de relações simultâneas – é auditivo, mesmo se alguns aspectos dele
podem ser vistos. Os itens de notícia e propaganda
que existem sob a data do jornal estão interligados
somente por essa data. Eles não têm interconexão
de lógica ou enunciação. Ainda, eles formam um
mosaico ou imagem coletiva cujas partes são interpenetrantes. Esse é, também, o tipo de ordem
que tende a existir em uma cidade ou cultura. É
um tipo de unidade ressonante, orquestral, não a
unidade do discurso lógico.
	
O poder tribalizante dos novos meios eletrônicos, a forma como nos remontam a campos
unificados das velhas culturas orais, à coesão tribal e padrões pré-individualistas de pensamento,
é pouco compreendido. Tribalismo é o sentimento
de vínculo familiar profundo, a sociedade fechada como norma da comunidade. A alfabetização,
a tecnologia visual, dissolveu a mágica tribal por
meio da ênfase na fragmentação e especialização,
e criou o indivíduo/individual. Os meios eletrônicos, todavia, são formas grupais. O homem pós-letrado dos meios eletrônicos reduz o mundo a
uma tribo ou vilarejo onde tudo acontece a todo
mundo ao mesmo tempo: todos sabem sobre – e
por conseguinte participam em – tudo o que está
acontecendo no momento em que acontece. Porque não nos damos conta disso, devido ao poder
entorpecedor da própria tecnologia, estamos indefesos no curso de uma revolução na vida sensível
norte-americana, via imagem televisiva. É uma
mudança comparável àquela experienciada pelos
europeus nas décadas de vinte e trinta, quando a
nova “imagem” radiofônica reconstituiu, da noite
para o dia, o caráter tribal há muito ausente da
vida europeia. Nosso mundo extremamente visual
teve imunidade à imagem radiofônica, mas não ao
dedo esquadrinhador do mosaico da TV.
	
Seria difícil imaginar um estado de confusão maior do que o nosso próprio. A alfabetização
nos deu um olho por uma orelha e teve êxito em
destribalizar aquela porção de humanidade à qual
chamamos de mundo Ocidental. Estamos agora
em um acelerado programa de destribalização de
todas as partes atrasadas do mundo pela introdução de nossa antiga tecnologia de impressão ao
mesmo tempo que estamos retribalizamos a nós
mesmos, por meio da nova tecnologia eletrônica.
É como se tornar consciente do inconsciente e de
conscientemente promover valores inconscientes
por uma consciência sempre mais clara.
	
Quando colocamos nosso sistema nervoso
central fora de nós, retornamos ao estado nômade
essencial. Nos tornamos como o homem paleolítico mais primitivo, errantes globais novamente,
mas coletores de informação ao invés de coletores de alimento. De agora em diante, a fonte de
alimento, saúde e mesmo vida será informação.
A transformação dessa informação em produtos
agora é um problema para os especialistas em automação e não de máxima divisão do trabalho e
habilidade humanas. Automação, todos sabemos,
dispensa força de trabalho. Isso amedronta o homem mecânico porque ele não sabe o que fazer
com a transição, significando simplesmente que
o trabalho está pronto e acabado. O conceito de
trabalho está intimamente aliado ao de especialização, de funções especiais e não-envolvimento;
antes da especialização não havia trabalho. O homem do futuro não irá trabalhar – a automação
trabalhará para ele –, mas ele deverá se tornar totalmente envolvido como um pintor, um pensador
ou um poeta é. O homem trabalha quando está
parcialmente envolvido. Quando está totalmente
envolvido, ele está jogando ou em lazer.
	
O homem na era eletrônica não têm ambiente exceto o globo e nenhuma ocupação possível exceto a coleta de informação. Pelo simples
mover de informação e varrendo informação

pentahexagrama C A G E
augusto de campos (1977)

contra informação, qualquer meio que seja gera
imensa riqueza. A corporação mais rica do mundo, American Telephone and Telegraph (AT&T),
tem uma única função: fazer informação circular.
Apenas falando uns com os outros, geramos riqueza. Qualquer criança assistindo televisão devia ser paga porque ela está gerando riqueza para
a comunidade. Mas essa riqueza não é dinheiro.
Dinheiro é obsoleto porque armazena trabalho (e
trabalho, como vimos, é em si mesmo obsoleto).
Em uma sociedade não-especialista e sem trabalho, dinheiro é inútil. O que precisamos é de cartão de crédito, que é informação. 	
	
Quando as novas tecnologias se impõem
a sociedades há muito habituadas com tecnologias velhas, resultam disso ansiedades de todos os
tipos. Agora, nosso mundo eletrônico clama por
um campo global unificado de sensibilização; o
tipo de consciência privada apropriada ao homem
da era da imprensa pode ser visto como um nó
insuportável na consciência coletiva exigida pelo
movimento da informação eletrônica. Nesse impasse, a suspensão de todos reflexos automáticos
pareceria adequada. Acredito que artistas, em todos os meios, respondem mais cedo aos desafios
de novas pressões. Gostaria de sugerir que eles
nos mostrassem os meios de viver com a nova
tecnologia sem destruir formas e conquistas primevas. Também, os novos meios não são brinquedos; eles não devem estar nas mãos da Mamãe
Ganso ou do Peter Pan executivos. Eles podem
ser confiados somente a novos artistas.
PAUL ZAUMTHOR – ZUM CAGE

Lucio Agra
_ augusto d campos (1963)
| | | | | _ daniel scandurra (2010)

acaso
john cage | gabriel kerhart | gabriel kerhart
ouvessem
pois é
trecho da matéria “John Cage, um inventor entre nós”
da reportagem local, Folha de S Paulo, 05.10.85
2 páginas e 122 palavras sobre música e dança

Ind
tem
esp
Para obter o valor
de um som, um movimento,
meça do zero. (Preste
atenção no que isso é,
do jeito que é.)

Um pássaro voa.

As

U
A escravidão está abolida.

luz
as madeiras

Um som não tem pernas para se erguer.

O mundo está prenhe: qualquer coisa pode
acontecer.
sa pode

som

Indica no
tempo, no
espaço
As emoções

amor
júbilo
o heroico
maravilha
tranquilidade
medo
raiva
pena
desagrado

Um copo d’água, por favor

movimento

Atividades diferentes
ocorrem em um tempo que é espaço:
são ambas centrais, originais.

estão na plateia.
O telefone toca.
Cada um está no melhor lugar.
A guerra começa a qualquer momento.

Cada agora é o tempo, o espaço.
luzes
inação?

Onde o pássaro voa, voe.

Estão com os olhos abertos?

orelhas?

john cage, 1957 | tradução de William Zeytounlian
erik satie (fragmento inicial + no site 100cage.blogspot.com)
JOHN CAGE 1958 | tradução daniel avila
O texto abaixo apareceu primeiramente no Arts News Annual de 1958. È uma conversa imaginária entre Satie e eu. Por ter morrido mais de 30 anos antes, nenhum de nós ouve o que o outro
diz. Suas observações são as que relatam que tenha feito e citações de seus escritos.
ERIK SATIE
Provavelmente haverá música, mas tenta-remos achar um
canto quieto para podermos conversar.

No entanto, devemos realizar uma música que é como a mobília – ou seja, uma música que fará parte dos ruídos do ambiente, levando-os em consideração. Penso nisso como algo
melodioso, suavizando os barulhos das facas e garfos, sem
dominá-los, sem imposição. Ela preencheria estes pesados
silêncios que às vezes caem sobre amigos jantando juntos.
Ela os livraria do trabalho de ter de prestar atenção às suas
observações banais. E, ao mesmo tempo, ela neutralizaria os
ruídos da rua que tão indiscretamente entram no desenrolar
da conversa. Fazer tal música seria responder a uma necessidade.

Não podemos duvidar que os animais tanto amam quanto
praticam música. Isto é evidente. Mas parece que seu sistema
musical difere do nosso. É uma outra escola... Não estamos
familiarizados com suas obras didáticas. Talvez eles não tenham nenhuma.

Alguns dias atrás choveu. Eu deveria estar lá fora colhendo
cogumelos. Mas aqui estou eu, tendo que escrever sobre
Satie. Em um momento de imprudência eu diria que iria.
Agora estou preocupado com um prazo de entrega. Porque, pelo amor de deus, as pessoas não lêem os livros disponíveis sobre ele, tocam a música que ele publicou? Então
eu poderia voltar ao bosque e gastar meu tempo produtivamente.

Gravações, também, estão disponíveis. Mas seria um ato
de caridade para todo mundo destruí-los assim que fossem
descobertos. Eles são inúteis exceto para isso e para os direitos autorais que o compositor, morto a trinta e poucos
anos, não pode mais recolher.

Quem se interessa por Satie hoje em dia? Pierre Boulez
não: ele possui os doze sons, governa La Domaine Musicale, enquanto Satie tinha somente o Grupo dos Seis e
era chamado de Le Maitre d’Arcueil. Nem Stockhausen: eu
imagino que ele ainda não pensou em Satie... Atividades
musicais atuais envolvem dois problemas: (1) aplicar a idéia
das séries inerente ao sistema de doze sons à organização
de todas as caracte-rísticas do som, isto é, freqüência, duração, amplitude, timbre, produzindo uma situação mais
controlada do que jamais fora tentado (Stockhausen: “Me
faz bem saber que estou no caminho certo”); e (2a) descobrir e agir sobre os novos recursos musicais (todos sons
audíveis em qualquer combinação e qualquer continuidade emitindo de quaisquer pontos no espaço em quaisquer
transfor-mações) nos dados pelo prato ou fita magné-tica,
ou (2b) arranjar, de alguma maneira, ocasiões instrumentais econômicas (fitas são caras) de forma que a ação resultante pressuponha uma totalidade de possibilidades ... Satie
é relevante para a metade do século?
Estou entediado com a morte do coração partido. Tudo que
eu timidamente começo falha com uma ousadia antes desconhecida. O que posso fazer senão virar-me em direção a
Deus nele apontar meu dedo? Cheguei à conclusão de que o
velho é ainda mais estúpido quando está fraco.

Como isto é branco! Nenhuma pintura a ornamenta; é tudo
de uma peça só. (Devaneio sobre um prato)

Eles lhe dirão que eu não sou um músico. Está certo. ...
Tome os Fils des Etoiles ou as Morceaux en forme de poire,
En habit de cheval ou as Sarabandes, está claro que nenhuma idéia musical orientou a criação destas obras.

Tomando as obras de Satie cronologicamente (1886 –
1925), peças sucessivas frequentemente aparecem como
novas partidas (afastamentos/renúncias). Duas peças serão
tão diferentes que não sugerirão que a mesma pessoa as
escreveu. Vez ou outra, por outro lado, obras em sucessão
são tão parecidas (similares), às vezes praticamente idênticas, como para trazer à mente as exibições anuais de pintores, e para permitir aos musicólogos discernir períodos
estilísticos. Estudantes se ocupam com análises generalizadas das questões harmônicas, melôdicas, e rítmicas, com o
objetivo de mostrar que em Socrate, todos estes princípios
formais são encontrados, definidos e reunidos em uma forma homogênea (como convêm a uma obra-prima). Deste
(Do) ponto de vista de um estudante, Pierre Boulez está
certo (é justificado) em rejeitar Satie. As harmonias, melodias e rítmos do Le Bon Maitre não despertam (possuem)
mais o interesse. Elas provêem (suprem/fornecem/dão) de
prazer (agradam) àqueles que não tem melhor uso de seu
tempo (nada melhor para fazer). Eles perderam seu poder
de irritar. Verdade, pode-se não suportar (aturar/tolerar/
aguentar) uma performance de Vexations (durando [minha estimativa] vinte e quatro horas; 840 repetições de uma
peça de vinte e cinco batidas, ela mesma envolvendo uma
estrutura repetitiva: A, A1, A, A2, cada A medindo treze
compassos), mas porque pensar nisso?
Um artista se move conscientemente em uma direção, escolhida por alguma boa razão, colocando uma obra na frente
de outra com a esperança de chegar antes que a morte o
alcance. Mas Satie desprezou a Arte (“J’emmerde l’Art”).
Ele não estava indo a lugar nenhum. O artista conta: 7,8,9,
etc. Satie aparece em pontos imprevisíveis brotando sempre do zero: 112, 2, 49, nada etc. A ausência de transição
é característica não somente entre obras terminadas, mas
nas divisões, grandes e pequenas, dentro de uma só. Era da
mesma forma que Satie vivia: ele nunca teve um trabalho
regular com promoções e bônus. Ninguém pode, com absoluta certeza, dizer nada sobre o Quarteto de Cordas que
ele estava a ponto de escrever quando morreu.

Curioso o suficiente, o sistema de doze sons não possui
zero. Dada uma série: 3, 5, 2, 7, 10, 8, 11, 9, 1, 6, 4, 12 e
o plano de obter sua inversão em números de modo que,
quando somados aos da série original, dão 12, obtêm-se 9,
7, 10, 5, 2, 4, 1, 3, 11, 6, 8 e 12. Neste sistema, 12 mais 12 é
igual a 12. Não há suficiente nada nele.
augusto d campos _ anagrams (2012)

+

* página ao lado
PROFILOGRAMA 2
hom’ cage to webern
(1972)
apoio

edição

100cage.blogspot.com.br

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  • 4. III – Comunicação (fragmento inicial) NICHI NICHI KORE KO NICHI: TODO DIA É UM LINDO DIA john cage 1958 - tradução walter vetor 2007 E se eu fizer trinta e duas perguntas? E se eu parar de perguntar agora e então? Isto tornará as coisas mais claras? A comunicação é uma coisa clara? O que é comunicação? Música, o que ela comunica? O que é claro a mim é claro a você? A música são somente sons? Então o que ela comunica? Há um caminhão passando pela música? Se eu posso vê-lo, posso ouvi-lo também? Se eu não o ouço, ele ainda está comunicando? Se enquanto o vejo não posso ouvi-lo, mas ouço algo além, digamos uma batedeira, por que estou olhando para dentro, seria a batedeira ou o caminhão o que comunica? Qual é mais musical, um caminhão passando por uma fábrica ou um caminhão passando por uma escola de música? As pessoas de dentro e de fora da escola são não-musicáveis? Se as pessoas de dentro não podem ouvir bem, isto mudaria minha pergunta? Você entende o que eu quero dizer com dentro da escola? Os sons são sons somente ou eles são Beethoven? Pessoas não são sons, são? Existe algo como o silêncio? Desde que eu desista das pessoas, eu estaria ainda dando ouvidos a algo? Digamos que esteja perdido na selva, eu tenho de ouvir um fluxo tagarela? Sempre há algo para ouvir, nunca um pouco de paz e silêncio? Se minha cabeça é cheia de harmonia, ritmo e melodia, o que acontece comigo quando o telefone toca, eu quero dizer, ao meu pedaço de paz? E se estivessem na minha cabeça a harmonia, o ritmo e a melodia européias, o que aconteceria com a história, digamos da música javanesa, na minha cabeça? Estamos chegando a algum lugar fazendo perguntas? Onde estamos indo? Esta é a vigésima oitava pergunta? São importantes algumas destas perguntas? “Como você precisa agir com cautela em termos dualísticos?” Eu ainda tenho mais duas perguntas? E agora, eu não tenho nenhuma? Agora que fiz trinta e duas perguntas, posso fazer mais quarenta e quatro? Eu posso, mas eu devo? Por que devo prosseguir perguntando?
  • 5. Existe alguma razão em perguntar por quê? Por que eu responderia o porquê se perguntas não são palavras, mas sons? Se palavras são sons, elas são musicais ou apenas barulhos? Se sons são barulhos não palavras, eles tem significado? Eles são musicais? Digamos que existem dois sons e duas pessoas e cada um deles é lindo, existe entre estes quatro alguma comunicação? E se existem regras, quem as fez, eu pergunto a vocês? Começa em algum lugar, quero dizer, e onde pára? O que acontecerá a mim ou você se estiver em um lugar onde não há beleza? Pergunto a vocês alguma vez, também, sons acontecendo em tempo, o que acontecerá a nossa experiência de ouvir, de vocês, minha, a nossos ouvidos, ouvindo, o que acontecerá se os sons que são belos pararem alguma vez e só sobrarem os sons sem beleza, feios, o que acontecerá? Nós sempre estivemos aptos para sacar que o que achávamos feio era belo? Se excluirmos a beleza, o que nós temos? Temos a verdade? Temos a religião? Temos uma mitologia? Saberíamos o que fazer com ela se tivéssemos uma? Temos um meio de fazer dinheiro? E se o dinheiro é feito, será para ser gasto com música? Se a Rússia gasta sessenta milhões na Feira de Bruxelas, muito disso para a música e a dança e nos Estados Unidos se gasta um décimo disso, algo como seis milhões, isto significa que nove entre dez americanos sejam tão musicais quanto todos os russos juntos? Se excluirmos o dinheiro, o que nós temos? Desde que nós ainda não tenhamos excluído a verdade, onde a procuraremos? Não dissemos que não estávamos indo, ou só perguntamos onde estamos indo? Se não dissemos que não estávamos indo, por que não dissemos? Se tivéssemos algum senso na cabeça, não saberíamos a verdade ao invés de andarmos em círculo à procura dela? Como estaríamos então aptos, como eles dizem, a beber um copo de água? Nós sabemos (ou não?) a religião, a mitologia, a filosofia e a metafísica de trás pra frente e adiante de todo mundo, logo se necessita de que tivéssemos uma para cada um de nós se tivéssemos uma, mas não temos, temos? Mas e música, temos alguma música? Não seria melhor se excluíssemos a música também? Então o que nós teríamos? Jazz? O que restou? Vocês querem dizer é um jogo sem propósitos? É isto que acontece quando você acorda e escuta o primeiro som de cada dia? É possível que eu possa continuar monotonamente perguntando para sempre? Eu teria de saber quantas perguntas eu iria fazer? Eu teria de saber como fazer contas para poder perguntar? Eu teria de saber a hora de parar? Seria por acaso que estamos vivos e fazemos uma pergunta? Quanto mais viveremos estando aptos para viver?
  • 6. MÚSICA CONTEMPORÂNEA NÃO É A MÚSICA DO FUTURO NEM A MÚSICA DO PASSADO MAS APENAS MÚSICA DO PRESENTE NA GENTE: ESTE MOMENTO, AGORA, ESTE AGORA MOMENTO. AGORA GAROA. Algo inesperado aconteceu: estava fazendo perguntas; agora estou citando uma conferencia que pronunciei anos atrás. É claro que farei mais algumas perguntas depois, mas não agora: tenho citações a fazer. O MOMENTO ESTÁ SEMPRE MUDANDO. (ESTAVA EM SILÊNCIO: AGORA ESTOU FALANDO.) COMO PODEMOS FALAR O QUE É MÚSICA CONTEMPORÂNEA, SENDO QUE AGORA NÃO A ESTAMOS OUVINDO, E SIM OUVINDO UMA CONFERÊNCIA SOBRE ELA. E NÃO É ISSO. ISTO É “MOSTRAR A LÍNGUA”. PARTINDO DE ONDE ESTAMOS AGORA PARA A MÚSICA CONTEMPORÂNEA (ESTAMOS SÓ PENSANDO NELA) CADA UM DE NÓS ESTÁ PENSANDO POR SI MESMO, EM SUA PRÓPRIA EXPERIÊNCIA, E CADA EXPERIÊNCIA É DIFERENTE E CADA EXPERIÊNCIA ESTÁ MUDANDO E ENQUANTO ESTAMOS PENSANDO ESTOU FALANDO E A MÚSICA CONTEMPORÂNEA ESTÁ MUDANDO. COMO A VIDA MUDA. SE NÃO ESTIVESSE MUDANDO ESTARÍAMOS MORTOS, E, É CLARO, PARA ALGUNS DE NÓS, ÀS VEZES ESTÁ MORTO, MAS A QUALQUER MOMENTO MUDA E VIVE DE NOVO. FALANDO POR UM MOMENTO SOBRE LEITE CONTEMPORÂNEO: SE A TEMPERATURA ESTÁ MUDANDO, FERMENTOU ETC., E ENTÃO UMA NOVA GARRAFA ETC., A MENOS QUE O SEPARANDO NA MUDANÇA POR SOLIDIFICAÇÃO OU REFRIGERAÇÃO (QUE É UM MEIO DE DESACELERAR SUA VIVICITUDE) (ISTO É ACADEMIAS E MUSEUS SÃO MEIOS DE PRESERVAÇÃO NÓS SEPARAMOS COISAS TEMPORARIAMENTE DA VIDA (POR MUDANÇA) MAS A QUALQUER MOMENTO A DESTRUIÇÃO PODE CHEGAR DE REPENTE E ENTÃO O QUE ACONTECE É O REFRESCAMENTO QUANDO NÓS SEPARAMOS A MÚSICA DA VIDA TEMOS A ARTE (UM COMPÊNDIO DE OBRAS PRIMAS). COM A MÚSICA CONTEMPORÂNEA, QUANDO É REALMENTE CONTEMPORÂNEA, NÓS NÃO TEMOS TEMPO PARA FAZER ESTA SEPARAÇÃO (QUE NOS PROTEJE DE VIVER), E ENTÃO, A MÚSICA CONTEMPORÂNEA É NEM TANTO SÓ ARTE QUANTO VIDA E QUALQUER UM FAZENDO-A NÃO FINDARÃO O MAIS BREVE QUE ELE COMEÇA A FAZER OUTRO APENAS COMO AS PESSOAS SEGUEM LAVANDO A LOUÇA, ESCOVANDO OS DENTES, PEGANDO NO SONO, E ASSIM VAI. MUITO FREQUENTEMENTE NINGUÉM SABE QUE A MÚSICA CONTEMPORÂNEA É OU PODERIA SER ARTE. ELE SIMPLESMENTE PENSA QUE ELA É IRRITANTE. IRRITANTE DE UM MODO OU DE OUTRO, ISTO É DIZER MANTENDO-NOS A TENTOS À OSSIFICAÇÃO. PARA QUALQUER UM DE NÓS A MÚSICA CONTEMPORÂNEA É OU PODERIA SER UM MODO DE VIDA.
  • 7. HEXAGRAMPO - gregorio gananian e danielly omm (2012) 49 KO
  • 10.
  • 11.
  • 12. pesquisa txt para três fontes _ daniel scandurra (2011) música de invenção é o livro-fonte, lançado em 1998 é composto por uma seleção de textos organizada pelo autor augusto de campos, sobre música não popular ou dita experimental, de invenção, vanguarda. são artigos divulgados em diversas mídias impressas (a partir da década de 70 até o início de 90) e divididos em algumas seções, uma delas dedicada exclusivamente a john cage: “musicaos”. augusto foi um dos primeiros, senão o primeiro brasileiro a (divulgar) escrever (a) sobre (obra de) músicos-inventores fundamen tais como webern, varèse, satie e é claro cage: “o mais completo artista intersemiótico de nosso tempo, o poeta dos multimídia, o profeta e guerrilheiro da arte inter|in|disciplinar”. noigandres–antitodotédio simultaneamente a um aprofundamento no campo da música de invenção, uma procura por cage (em linguaportuguesa) nos leva ao próprio augusto e nesse diálogo um mundoárvo-rebrota : de cage à augusto à poesia concreta, haroldo de campos, décio pignatari, o grupo noigandres e são muitos os pontos em comum entre john cage e noigandres além de serem pontas-de-lança, ligados a vanguarda antiartística atemporal e naturalmente quase nunca compreendidos pelo público e crítica, cage, paralelamente as suas inovações musicais (google: prepared piano, imaginary landscape, 4’33”..) desenvolveu um intenso trabalho como escritor, criando textos incrivelmente inovadores “interessado na ‘linguagem sem sintaxe’ o que o aproxima da poesia concreta” : como escreve augusto, responsável pelo único livro traduzido para o português de JC já lançado no brazyl (“de segunda a um ano” de 1985: até hj primeira e única edição esgotada) : “os livros de cage são como a sua própria música, inovadores e imprevisíveis. em todos eles há uma mistura aparentemente disparatada de eventos. cage fala não apenas de música, mas de ecologia, política, zen-budismo, cogumelos, economia e acontecimentos triviais, extraindo poesia de tudo e de nada. um mosaico de ideias, citações e histórias. uma concepção tão antiacadêmica que só poderia mesmo chocar os meios universitários mais provincianos. ‘eu estou aqui e não tenho nada a dizer e o estou dizendo e isto é poesia’ diz cage em sua conferência sobre nada (1949) enquanto os poetas que pretendem dizer tudo já não nos dizem nada” i t r n e t de início se faz clara a tônica de uma pesquisa adentrando essa galáxia: a cada instante, um novo beco de cem saídas. mas, também logo se percebe, para a alegria do povo, que todas essas saídas se entrecruzam, e por conseqüência, nos devolvem à john cage , sem ser esse o ponto final , num labirinfinito. de novo augusto na introdução de “música de invenção”: “preocupa-me, nos últimos tempos,
  • 13. sobretudo, a dessensibilização auditiva em relação à música contemporânea. não me conformo com o fato de a maravilhosa aventura de alto repertório criada em nosso século, uma das mais ricas de toda a história da humanidade, ser tão mal conhecida e divulgada entre nós, desfavorecida, como tem sido, pela preguiça auditiva e pela avidez mercantil das mídias. a audição qualificada não pode reduzir-se à música de entretenimento. já é tempo de dar um tempo aos colchões sonoros da música palatável e aprender a ouvir aquela outra música, a música-pensamento dos grandes mestres e inventores, que impõe uma outra escuta, onde a reflexão, a concentração, a sensibilidade e a inteligência são ativadas ao extremo.” ele não chega a citar, neste livro, a difusão da internet como meio de comunicação popular e seu atual papel nessa história. o panorama quanto à falta de acesso do brasileiro mudou completamente: o maior problema já não é mais esse, porém, permanece (e muito se acentua) na preguiça auditiva de cada dia. como não dependemos mais da boa vontade de editoras e gravadoras , cabem aos indivíduos irem atrás da informação, por vontade própria, por indicação ou estimulados por acasos off ou online. por tanto se faz necessário criar estímulos para que esse acesso ocorra e nunca houve um meio melhor para isso [parte de minha parte: mosaicages.blogspot.com] pois, assim como a geração de caetano veloso se viu no ambiente e no momento histórico propício para assimilar a antropofagia de oswald (com ajuda do resgate e reavaliação promovido pela poesia concreta), juntar samba, bossa nova, rock´n´beatles... e desenvolver a tropicália, vive-se atualmente, por nossa vez, o ambiente e o momento histórico propício para, enfim, travententrar contato com a obra e o universo desses músicos-inventores, (do século passado mas ainda novidade e vanguarda para o futuro do brasil). basta(oqñé)pouco e o que surgirá daqui em diante depende de nós, do que vamos ouvir, do q vamos ver, ou “ouver”, como prefere décio, que em 1959 previa: “eu vejo para o futuro um certo cessar das transformações e um longo período de redundâncias mais ou menos aceitas e que formarão a linguagem comum universal do fim do século, quando a ação atual e próxima dos computadores já começar a se fazer sentir em larga escala.” cage também, como nesse trecho de uma conferência de 1974, (q poderia ser de hélio oiticica): “assim como hoje qualquer um se sente capaz de tirar uma fotografia, no futuro próximo, usando recursos de gravação e/ ou sistemas eletrônicos, o espectador se sentirá encorajado às atividades de compositor e executante.” realidade que arnaldo antunes, verifica: “a linguagem, por exemplo, da colagem, o mosaico de fragmentos, poemas modernistas / letras tropicalistas / poesia concreta / modernidade de um modo geral, os meios digitais de hoje são ideais para essa expressão. o próprio copy/paste já faz isso. você já pensa um pouco editando as coisas.” isto é, a gente tem de superar todos os pensamentos que separam a música da vida
  • 14. diadia _ juliana de lamare daniel scandurra id ego “nichi nichi kore ko nichi...” jc
  • 15. O Remorso da Experteza Marshall Mcluhan | tradução de William Zeytounlian Com o telégrafo, o homem ocidental iniciou o processo de colocar seus nervos para fora do corpo. Tecnologias anteriores tinham sido extensões de órgãos físicos: a roda é colocar os pés para fora de nós, o muro da cidade é um externar coletivo da pele. Mas os meios eletrônicos são, ao contrário, extensões do sistema nervoso central, um campo inclusivo e simultâneo. Desde o telégrafo, temos extendido os cérebros e nervos do homem ao redor do globo. Como resultado, a era eletrônica sofre de uma insegurança total, como um homem usando o crânio por dentro e o cérebro por fora. Tornamo-nos peculiarmente vulneráveis. O ano de estabelecimento do telégrafo comercial na América, 1844, foi também o ano em que Kierkegaard publicou O Conceito de Angústia. Uma propriedade característica de todas as extensões sociais do corpo é que elas voltam para afligir os inventores como um tipo de remorso da experteza. Como Narciso se apaixonou por uma externação (projeção, extensão) de si mesmo, o homem invariavelmente parece se apaixonar pelo novo dispositivo ou engenhoca que é mera extensão de seu próprio corpo. Dirigindo um automóvel ou assistindo televisão, tendemos a esquecer que aquilo que usamos é simplesmente uma parte de nós mesmos presa fora. Posto dessa maneira, nos tornamos servomecanismos de nossas invenções, respondendo a elas da forma mecânica, imediata, que nos pedem. O ponto central do mito de Narciso não é que as pessoas são propensas a se apaixonarem por suas próprias imagens, mas que as pessoas se apaixonam por extensões de si mesmas das quais estão convencidas que não são extensões de si mesmas. Isso dá, penso, uma imagem razoavelmente boa de todas nossas tecnologias e nos direciona ao ponto principal, a idolatria da tecnologia envolve torpor psíquico. Toda geração posta à beira de uma mu- dança massiva parece, aos futuros observadores, ter sido alheia às questões e eventos eminentes. Mas é preciso entender o poder das tecnologias de isolar os sentidos e, dessa maneira, hipnotizar a sociedade. A fórmula para a hipnose é “um sentido de cada vez”. Nossos sentidos privados não são sistemas fechados, mas são incessantemente traduzidos uns para os outros na experiência que chamamos de consciência. Nossos sentidos extendidos, ferramentas e tecnologias, têm sido sistemas fechados incapazes de interação. Toda nova tecnologia diminui o sentido de interação e sensibilidade para a área ministrada precisamente por aquela tecnologia: ocorre uma espécie de identificação entre observador e objeto. Esse conformar do espectador com a nova forma ou estrutura torna os que estão imersos mais profundamente em uma revolução os menos cientes de sua dinâmica. Em tais épocas, sente-se que o futuro será uma versão alargada ou muito melhorada do passado imediato. A nova tecnologia eletrônica, porém, não é um sistema fechado. Como extensão do sistema nervoso central, ela lida precisamente em consciência, interação e diálogo. Na era eletrônica, a própria natureza instantânea da co-existência em meio a nossos instrumentos tecnológicos gerou uma crise um tanto nova na história humana. Agora, nossas faculdades e sentidos extendidos constituem um único campo de experiência que pede para que se tornem coletivamente conscientes, como o próprio sistema nervoso central. Fragmentação e especialização, características do mecanismo, estão ausentes. Na medida que ignoramos a natureza das novas formas eletrônicas, somos manipulados por elas. Deixem-me dar, como exemplo da forma pela qual a nova tecnologia pode transformar instituições e modos de proceder, um trecho do testemunho de Albert Speer, ministro de armamentos da Alemanha em 1942, nos julgamentos de Nuremberg:
  • 16. O telefone, a teleimpressora e o sinal sem fio tornaram possível que ordens dos altos escalões fossem dadas diretamente aos baixos, onde, tendo em conta a absoluta autoridade por trás delas, eram levadas a cabo acriticamente; ou enviadas aos numerosos escritórios e centros de comando diretamente conectados com a liderança suprema da qual eles recebiam suas sinistras ordens sem qualquer intermediário; ou resultaram na extensa vigilância do cidadão; ou em um alto grau de confidencialidade em torno de incidentes criminais. Para o observador externo, este aparato governamental parece uma aparente confusão de linhas em uma ligação telefônica, mas, como essa, ele podia ser controlado e operado de uma base central. Ditaduras anteriores precisavam de colaboradores de alta qualidade até mesmo nos baixos escalões de liderança, homens que podiam pensar e agir independentemente. Na era da técnica moderna, um sistema autoritário pode passar sem isso. Sozinhos, os meios de comunicação permitem mecanizar o trabalho de lideranças subordinadas. Como consequência, um novo tipo se desenvolve: o recipiente acrítico de ordens. Televisão e rádio são imensas extensões de nós mesmos que nos permitem participar da vida uns dos outros, assim como a linguagem. Mas os modos de participação estão previamente construídos na tecnologia; essas novas linguagens possuem gramáticas próprias. As formas de pensamento implantadas pela cultura eletrônica são muito diferentes daquelas nutridas pela cultura impressa. Desde a Renascença, a maioria dos métodos e procedimentos tiveram a forte tendência de realçar a organização e aplicação visual do conhecimento. Os pressupostos latentes na segmentação tipográfica manifestam-se na fragmentação de ofícios e na especialização de tarefas sociais. Alfabetização define linearidade, consciência e modo de proceder segundo o princípio de “uma coisa de cada vez”. Disso deriva a reunião em fileiras e a ordem na batalha, a hierarquia administrativa e a departamentalização do decoro acadêmico. Gutenberg nos deu análise e explosão. Pela fragmentação do campo de percepção e a quebra de informação em pedaços estáticos, alcançamos maravilhas. Mas os meios eletrônicos procedem diferentemente. Televisão, rádio e o jornal (na medida que estava ligado com o telégrafo) lidam com espaço auditivo, denominando assim aquela esfera de relações simultâneas criadas pelo ato de ouvir. Ouvimos todas as direções de uma vez só: isso cria um espaço único, não visualizável. A simultaneidade do espaço auditivo é o exato oposto da linearidade, de considerar uma coisa por vez. É confuso aprender que o mosaico do jornal é “auditivo” em sua estrutura básica. Isso, contudo, só quer dizer que qualquer padrão no qual os componentes co-existem sem junção ou conexão linear direta – criando um campo de relações simultâneas – é auditivo, mesmo se alguns aspectos dele podem ser vistos. Os itens de notícia e propaganda que existem sob a data do jornal estão interligados somente por essa data. Eles não têm interconexão de lógica ou enunciação. Ainda, eles formam um mosaico ou imagem coletiva cujas partes são interpenetrantes. Esse é, também, o tipo de ordem que tende a existir em uma cidade ou cultura. É um tipo de unidade ressonante, orquestral, não a unidade do discurso lógico. O poder tribalizante dos novos meios eletrônicos, a forma como nos remontam a campos unificados das velhas culturas orais, à coesão tribal e padrões pré-individualistas de pensamento, é pouco compreendido. Tribalismo é o sentimento de vínculo familiar profundo, a sociedade fechada como norma da comunidade. A alfabetização, a tecnologia visual, dissolveu a mágica tribal por meio da ênfase na fragmentação e especialização, e criou o indivíduo/individual. Os meios eletrônicos, todavia, são formas grupais. O homem pós-letrado dos meios eletrônicos reduz o mundo a uma tribo ou vilarejo onde tudo acontece a todo mundo ao mesmo tempo: todos sabem sobre – e por conseguinte participam em – tudo o que está acontecendo no momento em que acontece. Porque não nos damos conta disso, devido ao poder entorpecedor da própria tecnologia, estamos indefesos no curso de uma revolução na vida sensível norte-americana, via imagem televisiva. É uma mudança comparável àquela experienciada pelos europeus nas décadas de vinte e trinta, quando a
  • 17. nova “imagem” radiofônica reconstituiu, da noite para o dia, o caráter tribal há muito ausente da vida europeia. Nosso mundo extremamente visual teve imunidade à imagem radiofônica, mas não ao dedo esquadrinhador do mosaico da TV. Seria difícil imaginar um estado de confusão maior do que o nosso próprio. A alfabetização nos deu um olho por uma orelha e teve êxito em destribalizar aquela porção de humanidade à qual chamamos de mundo Ocidental. Estamos agora em um acelerado programa de destribalização de todas as partes atrasadas do mundo pela introdução de nossa antiga tecnologia de impressão ao mesmo tempo que estamos retribalizamos a nós mesmos, por meio da nova tecnologia eletrônica. É como se tornar consciente do inconsciente e de conscientemente promover valores inconscientes por uma consciência sempre mais clara. Quando colocamos nosso sistema nervoso central fora de nós, retornamos ao estado nômade essencial. Nos tornamos como o homem paleolítico mais primitivo, errantes globais novamente, mas coletores de informação ao invés de coletores de alimento. De agora em diante, a fonte de alimento, saúde e mesmo vida será informação. A transformação dessa informação em produtos agora é um problema para os especialistas em automação e não de máxima divisão do trabalho e habilidade humanas. Automação, todos sabemos, dispensa força de trabalho. Isso amedronta o homem mecânico porque ele não sabe o que fazer com a transição, significando simplesmente que o trabalho está pronto e acabado. O conceito de trabalho está intimamente aliado ao de especialização, de funções especiais e não-envolvimento; antes da especialização não havia trabalho. O homem do futuro não irá trabalhar – a automação trabalhará para ele –, mas ele deverá se tornar totalmente envolvido como um pintor, um pensador ou um poeta é. O homem trabalha quando está parcialmente envolvido. Quando está totalmente envolvido, ele está jogando ou em lazer. O homem na era eletrônica não têm ambiente exceto o globo e nenhuma ocupação possível exceto a coleta de informação. Pelo simples mover de informação e varrendo informação pentahexagrama C A G E augusto de campos (1977) contra informação, qualquer meio que seja gera imensa riqueza. A corporação mais rica do mundo, American Telephone and Telegraph (AT&T), tem uma única função: fazer informação circular. Apenas falando uns com os outros, geramos riqueza. Qualquer criança assistindo televisão devia ser paga porque ela está gerando riqueza para a comunidade. Mas essa riqueza não é dinheiro. Dinheiro é obsoleto porque armazena trabalho (e trabalho, como vimos, é em si mesmo obsoleto). Em uma sociedade não-especialista e sem trabalho, dinheiro é inútil. O que precisamos é de cartão de crédito, que é informação. Quando as novas tecnologias se impõem a sociedades há muito habituadas com tecnologias velhas, resultam disso ansiedades de todos os tipos. Agora, nosso mundo eletrônico clama por um campo global unificado de sensibilização; o tipo de consciência privada apropriada ao homem da era da imprensa pode ser visto como um nó insuportável na consciência coletiva exigida pelo movimento da informação eletrônica. Nesse impasse, a suspensão de todos reflexos automáticos pareceria adequada. Acredito que artistas, em todos os meios, respondem mais cedo aos desafios de novas pressões. Gostaria de sugerir que eles nos mostrassem os meios de viver com a nova tecnologia sem destruir formas e conquistas primevas. Também, os novos meios não são brinquedos; eles não devem estar nas mãos da Mamãe Ganso ou do Peter Pan executivos. Eles podem ser confiados somente a novos artistas.
  • 18. PAUL ZAUMTHOR – ZUM CAGE Lucio Agra
  • 19.
  • 20.
  • 21. _ augusto d campos (1963) | | | | | _ daniel scandurra (2010) acaso
  • 22. john cage | gabriel kerhart | gabriel kerhart
  • 25. trecho da matéria “John Cage, um inventor entre nós” da reportagem local, Folha de S Paulo, 05.10.85
  • 26. 2 páginas e 122 palavras sobre música e dança Ind tem esp Para obter o valor de um som, um movimento, meça do zero. (Preste atenção no que isso é, do jeito que é.) Um pássaro voa. As U A escravidão está abolida. luz as madeiras Um som não tem pernas para se erguer. O mundo está prenhe: qualquer coisa pode acontecer.
  • 27. sa pode som Indica no tempo, no espaço As emoções amor júbilo o heroico maravilha tranquilidade medo raiva pena desagrado Um copo d’água, por favor movimento Atividades diferentes ocorrem em um tempo que é espaço: são ambas centrais, originais. estão na plateia. O telefone toca. Cada um está no melhor lugar. A guerra começa a qualquer momento. Cada agora é o tempo, o espaço. luzes inação? Onde o pássaro voa, voe. Estão com os olhos abertos? orelhas? john cage, 1957 | tradução de William Zeytounlian
  • 28. erik satie (fragmento inicial + no site 100cage.blogspot.com) JOHN CAGE 1958 | tradução daniel avila O texto abaixo apareceu primeiramente no Arts News Annual de 1958. È uma conversa imaginária entre Satie e eu. Por ter morrido mais de 30 anos antes, nenhum de nós ouve o que o outro diz. Suas observações são as que relatam que tenha feito e citações de seus escritos. ERIK SATIE Provavelmente haverá música, mas tenta-remos achar um canto quieto para podermos conversar. No entanto, devemos realizar uma música que é como a mobília – ou seja, uma música que fará parte dos ruídos do ambiente, levando-os em consideração. Penso nisso como algo melodioso, suavizando os barulhos das facas e garfos, sem dominá-los, sem imposição. Ela preencheria estes pesados silêncios que às vezes caem sobre amigos jantando juntos. Ela os livraria do trabalho de ter de prestar atenção às suas observações banais. E, ao mesmo tempo, ela neutralizaria os ruídos da rua que tão indiscretamente entram no desenrolar da conversa. Fazer tal música seria responder a uma necessidade. Não podemos duvidar que os animais tanto amam quanto praticam música. Isto é evidente. Mas parece que seu sistema musical difere do nosso. É uma outra escola... Não estamos familiarizados com suas obras didáticas. Talvez eles não tenham nenhuma. Alguns dias atrás choveu. Eu deveria estar lá fora colhendo cogumelos. Mas aqui estou eu, tendo que escrever sobre Satie. Em um momento de imprudência eu diria que iria. Agora estou preocupado com um prazo de entrega. Porque, pelo amor de deus, as pessoas não lêem os livros disponíveis sobre ele, tocam a música que ele publicou? Então eu poderia voltar ao bosque e gastar meu tempo produtivamente. Gravações, também, estão disponíveis. Mas seria um ato de caridade para todo mundo destruí-los assim que fossem descobertos. Eles são inúteis exceto para isso e para os direitos autorais que o compositor, morto a trinta e poucos anos, não pode mais recolher. Quem se interessa por Satie hoje em dia? Pierre Boulez não: ele possui os doze sons, governa La Domaine Musicale, enquanto Satie tinha somente o Grupo dos Seis e era chamado de Le Maitre d’Arcueil. Nem Stockhausen: eu imagino que ele ainda não pensou em Satie... Atividades musicais atuais envolvem dois problemas: (1) aplicar a idéia das séries inerente ao sistema de doze sons à organização de todas as caracte-rísticas do som, isto é, freqüência, duração, amplitude, timbre, produzindo uma situação mais controlada do que jamais fora tentado (Stockhausen: “Me faz bem saber que estou no caminho certo”); e (2a) descobrir e agir sobre os novos recursos musicais (todos sons audíveis em qualquer combinação e qualquer continuidade emitindo de quaisquer pontos no espaço em quaisquer transfor-mações) nos dados pelo prato ou fita magné-tica, ou (2b) arranjar, de alguma maneira, ocasiões instrumentais econômicas (fitas são caras) de forma que a ação resultante pressuponha uma totalidade de possibilidades ... Satie é relevante para a metade do século?
  • 29. Estou entediado com a morte do coração partido. Tudo que eu timidamente começo falha com uma ousadia antes desconhecida. O que posso fazer senão virar-me em direção a Deus nele apontar meu dedo? Cheguei à conclusão de que o velho é ainda mais estúpido quando está fraco. Como isto é branco! Nenhuma pintura a ornamenta; é tudo de uma peça só. (Devaneio sobre um prato) Eles lhe dirão que eu não sou um músico. Está certo. ... Tome os Fils des Etoiles ou as Morceaux en forme de poire, En habit de cheval ou as Sarabandes, está claro que nenhuma idéia musical orientou a criação destas obras. Tomando as obras de Satie cronologicamente (1886 – 1925), peças sucessivas frequentemente aparecem como novas partidas (afastamentos/renúncias). Duas peças serão tão diferentes que não sugerirão que a mesma pessoa as escreveu. Vez ou outra, por outro lado, obras em sucessão são tão parecidas (similares), às vezes praticamente idênticas, como para trazer à mente as exibições anuais de pintores, e para permitir aos musicólogos discernir períodos estilísticos. Estudantes se ocupam com análises generalizadas das questões harmônicas, melôdicas, e rítmicas, com o objetivo de mostrar que em Socrate, todos estes princípios formais são encontrados, definidos e reunidos em uma forma homogênea (como convêm a uma obra-prima). Deste (Do) ponto de vista de um estudante, Pierre Boulez está certo (é justificado) em rejeitar Satie. As harmonias, melodias e rítmos do Le Bon Maitre não despertam (possuem) mais o interesse. Elas provêem (suprem/fornecem/dão) de prazer (agradam) àqueles que não tem melhor uso de seu tempo (nada melhor para fazer). Eles perderam seu poder de irritar. Verdade, pode-se não suportar (aturar/tolerar/ aguentar) uma performance de Vexations (durando [minha estimativa] vinte e quatro horas; 840 repetições de uma peça de vinte e cinco batidas, ela mesma envolvendo uma estrutura repetitiva: A, A1, A, A2, cada A medindo treze compassos), mas porque pensar nisso? Um artista se move conscientemente em uma direção, escolhida por alguma boa razão, colocando uma obra na frente de outra com a esperança de chegar antes que a morte o alcance. Mas Satie desprezou a Arte (“J’emmerde l’Art”). Ele não estava indo a lugar nenhum. O artista conta: 7,8,9, etc. Satie aparece em pontos imprevisíveis brotando sempre do zero: 112, 2, 49, nada etc. A ausência de transição é característica não somente entre obras terminadas, mas nas divisões, grandes e pequenas, dentro de uma só. Era da mesma forma que Satie vivia: ele nunca teve um trabalho regular com promoções e bônus. Ninguém pode, com absoluta certeza, dizer nada sobre o Quarteto de Cordas que ele estava a ponto de escrever quando morreu. Curioso o suficiente, o sistema de doze sons não possui zero. Dada uma série: 3, 5, 2, 7, 10, 8, 11, 9, 1, 6, 4, 12 e o plano de obter sua inversão em números de modo que, quando somados aos da série original, dão 12, obtêm-se 9, 7, 10, 5, 2, 4, 1, 3, 11, 6, 8 e 12. Neste sistema, 12 mais 12 é igual a 12. Não há suficiente nada nele.
  • 30. augusto d campos _ anagrams (2012) + * página ao lado PROFILOGRAMA 2 hom’ cage to webern (1972)
  • 31.