1. De malas prontas para a Lua
Por Nurit Bensusan1
Imagine que você está partindo para Lua a fim de levar uma vida normal por lá.
Para tornar as coisas mais simples, vamos supor que a Lua já possua atmosfera e clima
similar aos da Terra. Você já fez as malas e agora deve decidir quais espécies, entre
milhares existentes na Terra, levará consigo. Sendo pragmático, você começa escolhendo
as espécies que podem ser diretamente exploradas e fornecerão alimentos, fibras,
madeira, remédios e outros produtos, tais como óleo, borracha e resina. A lista pode
atingir facilmente algumas centenas ou mesmo milhares de espécies. Se você pensar
mais um pouco, perceberá a necessidade de adicionar à lista variedades que garantam a
sobrevivência dessa que você já escolheu. Que espécies são essas? Não há resposta
para essa pergunta. Ninguém sabe quais são e quantas são as espécies necessárias
para sustentar a vida humana.
Você, então, poderia tentar outras abordagens, enumerando os serviços
ambientais dos quais você precisaria na Lua, como: purificação da água e do ar;
decomposição do lixo; geração e manutenção da fertilidade do solo; polinização de
espécies alimentares e da vegetação natural; controle de pragas e doenças; dispersão de
sementes; moderação de temperaturas extremas e da força dos ventos; e proteção contra
os danosos raios solares ultravioleta. Quantas espécies seriam necessárias para garantir
todos esses serviços? Quantas espécies, por exemplo, são necessárias para a
manutenção da fertilidade do solo? Em apenas 1 grama de solo há cerca de 30.000
protozoários, 50.000 algas, 400.000 fungos e bilhões de bactérias. Se ampliarmos essa
parcela, encontraremos milhares de insetos e de minhocas. Quais espécies levar? A essa
altura, é de supor que você já tenha desistido da viagem à Lua...
Se você, então, resolveu ficar e percebeu o quanto nossa sobrevivência cotidiana
depende dos serviços que a natureza nos presta, pode também imaginar os resultados de
uma eventual colapso de tais serviços e custos da substituição deles se possível fosse.
Um estudo feito em 1997 mostrou que a substituição dos serviços ambientais poderia
custar mais do que o dobro do PIB mundial. Não podemos esquecer, ainda, dois
agravantes: 1) não temos tecnologia para substituir parte significativa destes serviços; e
2) aqueles que podem ser substituídos terão seus custos significativamente aumentados.
Conclusão: um colapso dos serviços ambientais poderia significar desde um colapso da
vida na Terra como conhecemos até um agravamento da exclusão social, dado o aumento
dos preços dos produtos que dependem dos serviços ambientais, como alimentos,
roupas, água potável e qualidade do ar.
Vamos esperar o próximo táxi rumo à estação lunar e rezar para que haja lugar
para os milhares de espécies que precisamos levar, para chegar lá e começar a destruir
tudo outra vez, até que seja necessária uma nova mudança? Ou vamos tentar preservar
os serviços ambientais, nem que seja por puro egoísmo, já que nossa sobrevivência
depende deles?
1 Extraído do livro “Meio Ambiente. E eu com isso? Editora Petrópolis.