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O futuro será feminista, antirracista e
ecossocialista, ou não será:
Programa da candidatura
da Coletiva Feminista
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O futuro será feminista, antirracista e ecossocialista, ou não será:
introdução ao programa da
candidatura da Coletiva Feminista
Após a eclosão da crise capitalista de 2007-8, têm ficado cada vez mais evidentes,
em escala global, os efeitos destrutivos da lógica irracional de acumulação incessan-
te do capital. O preço de uma produção de capital que não cessa de aumentar – sob a
forma de dinheiro, mercadoria ou meios de produção – é a precarização das condições
de trabalho e de vida da população trabalhadora, a expansão da pobreza e da fome e a
disseminação do ódio, da violência e da guerra. Nesse verdadeiro moedor de carne hu-
mana, o alvo principal são os setores mais oprimidos. Populações negras e indígenas,
LGBTQIA+ e mulheres enfrentam maior precariedade no trabalho e formas variadas de
violência. No caso específico das mulheres, há ainda o peso conferido pelas duplas e
triplas jornadas resultantes do trabalho de garantia da reprodução cotidiana (cuidados
com a casa, com as crianças e os idosos). Como uma síntese macabra desse processo, a
catástrofe ambiental coloca em risco o futuro. Não apenas um futuro específico, mas a
própria possibilidade de que a humanidade venha a ter qualquer futuro.
Nesse cenário, o Brasil ocupa uma posição estratégica. Por sua dimensão continental,
por seu relativo desenvolvimento industrial, por sua grande população, por sua impor-
tância geopolítica e pela abundante presença de importantes recursos naturais, o país
poderia desempenhar papel relevante no enfrentamento à destrutividade alimentada
pelo capital. Entretanto, especialmente a partir dos governos Temer e Bolsonaro, a op-
ção das classes dominantes no país tem sido por reforçar a subordinação brasileira no
plano internacional e lidar com a sua crise consumindo sem medida tanto os recursos
naturais, quanto as vidas da população trabalhadora. A Emenda Constitucional do Teto
de Gastos, aprovada durante o governo golpista e ilegítimo de Michel Temer, constitui o
símbolo máximo dessa opção ao priorizar a destinação de recursos públicos à remune-
ração do capital, em lugar da oferta de serviços públicos de qualidade. Esse projeto de
sociedade, entretanto, tem muitas outras facetas: o avanço do desmatamento, a elimi-
nação de direitos de toda ordem e a redução do espaço democrático.
O estado do Rio de Janeiro, por sua vez, encontra-se no olho desse furacão. Por um
lado, sua estrutura econômica foi uma das mais atingidas pelos impactos conjugados
da Operação Lava-Jato e da reorientação global do capitalismo após o início de sua cri-
se, que golpearam fortemente os setores da construção civil, da construção naval e do
refino de petróleo. O resultado é uma situação econômico-social que possui indicadores
de pobreza, desemprego, fome e violência policial particularmente dramáticos. Por ou-
tro lado, o estado é o berço do bolsonarismo, força política de caráter neofascista que se
alimenta do ódio e da dominação violenta – seja por meio do aparato estatal, seja atra-
vés de grupos privados – sobre as/os exploradas/os e oprimidas/os. Essa posição está
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solidamente representada no estado, com o governador Cláudio Castro, eleito na chapa
de Wilson Witzel, cuja plataforma de campanha incluía a defesa para que policiais exe-
cutassem criminosos armados. Na Assembleia Legislativa (ALERJ), a agenda do governo
estadual é operada, em larga medida, pelo presidente André Ceciliano (PT), que articula
dezenas de deputados neofascistas, ultraconservadores e/ou ligados aos grupos mili-
cianos que dominam violentamente grande parte do território do estado.
Foi a dobradinha Castro-Ceciliano que articulou tanto a privatização da CEDAE, en-
tregando ao capital privado um importante patrimônio da população, quanto a adesão
do Rio de Janeiro ao chamado Regime de Recuperação Fiscal, que aprofunda a lógi-
ca da austeridade, dificultando os investimentos em serviços públicos. Em paralelo, o
grande crescimento dos royalties obtidos a partir da exploração do petróleo no estado,
que possibilitaria a realização desses investimentos, vem sendo aproveitado por Castro
para barganhar apoio político das prefeituras fluminenses e pavimentar seu caminho a
um novo mandato. A força social e política do bolsonarismo no Rio de Janeiro é, ainda,
responsável pelo impacto desproporcionalmente elevado da pandemia de Covid-19 no
estado, tando em termos de mortes, quanto no aprofundamento da crise social. No eixo
Palácio Guanabara-ALERJ, portando, corrupção endêmica e fortalecimento das milícias
constituem duas faces da mesma moeda.
Nesse cenário, não há outra saída que não seja puxar o freio de emergência. É pre-
ciso construir outra lógica de organização social, que seja pautada pela preservação
das condições de vida digna no planeta em todos os âmbitos. Para estarmos à altura
desse desafio, será necessário contar com o esforço consciente e articulado de todas/
os que atualmente pagam o preço da destruição capitalista – mulheres, indígenas,
negro/as e todas/os as/os trabalhadoras/es. Como parte desse esforço, apresenta-
mos a pré-candidatura da Coletiva Feminista à ALERJ. Afinal, se são as mulheres que
carregam alguns dos fardos mais pesados, assistindo seus filhos serem assassinados
pela violência estatal, sendo responsabilizadas pela reprodução familiar cotidiana em
um cenário de rápida redução do poder de compra dos salários e tendo seus direitos
reprodutivos atacados, foram elas também que protagonizaram grande parte das lu-
tas sociais e da resistência aos ataques no país e no estado nos últimos anos. O Fora
Cunha, a Primavera Feminista, o Ele Não e o Tsunami da Educação – liderado por uma
categoria composta majoritariamente por trabalhadoras mulheres – já demonstraram
a força contida em sua organização e mobilização.
Mas, além, de feminista, a Coletiva é também antirracista e ecossocialista. Antirra-
cista porque rejeita o genocídio e todas as formas de opressão e violência a que a po-
pulação negra está sujeita. Defende, ao contrário, uma política de defesa e valorização
da vida, que parta da auto-organização do próprio movimento negro para derrubar as
estruturas racistas que organizam a vida social. Ecossocialista porque tem compromis-
so com a vida e o uso sustentável e comunitário dos bens naturais. Assim, se opõe à
transformação da água, da energia elétrica e dos alimentos em mercadorias e defende
que os recursos dos fundos públicos sejam destinados a fomentar a produção da ener-
gia solar e eólica comunitárias, o saneamento ambiental local e a produção alimentar
descentralizada e orgânica para garantia da soberania alimentar da população.
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A proposta de uma candidatura coletiva se inspira em outras iniciativas similares, que
têm impactado significativamente a política em diferentes regiões do Brasil, como é
o caso da Bancada Feminista na Câmara Municipal de São Paulo. Esse caráter coletivo
subverte a lógica tradicional da representação parlamentar – pautada pelo personalis-
mo e pelo carreirismo – e expressa toda a diversidade etária, racial, profissional, pessoal,
etc que constitui a força das mulheres em movimento. São quatro cocandidatas com
trajetórias de décadas nas mais variadas lutas das/os dominadas/os e oprimidas/os,
que se propõem, precisamente, a constituir uma trincheira dessas lutas na Assembleia
Legislativa. Das lutas à ALERJ e de volta às lutas. Esse é o circuito que queremos fortale-
cer, sem sucumbir às pressões da institucionalidade estatal e com total independência
política em relação a todos os governos, mas tampouco sem abdicar de um significativo
espaço de reverberação de nossas denúncias e de divulgação de nossas ideias.
Nesse esforço, sabemos que enfrentaremos a ofensiva conservadora contra as mu-
lheres, que objetiva reduzir seu raio de ação social, confinando-as ao espaço doméstico
e submetendo-as à autoridade patriarcal. Mas enfrentaremos, também, o feminismo
liberal, que defende a ascensão de algumas no interior das estruturas do capitalismo –
seja pela aceitação da lógica das grandes corporações, seja pelo “empreendedorismo”
destituído de direitos – como resposta aos anseios de todas. Contrariando essa lógica,
o feminismo popular que defendemos é um feminismo que entende que a dominação
e a opressão atualmente exercidas sobre as mulheres são peças da engrenagem capi-
talista. Afinal, tanto o trabalho de reprodução social realizado gratuitamente pelas mu-
lheres, quanto a prática de remunerá-las abaixo dos homens por outros trabalhos são
utilizados para rebaixar os salários de toda a classe trabalhadora. Nosso feminismo en-
tende, assim, que não é possível obter a libertação de todas as mulheres sem derrubar
o capitalismo e que, de maneira complementar, não é possível derrubá-lo sem enfrentar
diretamente a dominação e a opressão a que as mulheres estão sujeitas. Nossa luta,
portanto, é pela organização da sociedade para a liberdade e o atendimento das neces-
sidades de toda a população, e não para a perpetuação da exploração e da opressão em
favor dos lucros de poucos. É a luta pela construção do socialismo. Nesse programa esse
será o olhar que lançaremos aos diversos pontos e problemas a serem examinados. Um
olhar que compreende o peso adicional que cada um deles deposita sobre as costas das
mulheres, mas parte daí para oferecer propostas e possibilidades de soluções que estão
a serviço dos interesses de todas/os as/os exploradas/os e oprimidas/os.
Essa posição serviu de base para um processo de construção do nosso programa em
diálogo com intelectuais e ativistas das mais diversas áreas, em encontros que cha-
mamos de Elabora Coletiva. Esses encontros, a vinculação das co-candidatas às lutas
sociais do estado e a nossa disposição para ocupar as ruas nessas eleições fazem dessa
uma verdadeira campanha-movimento, pronta para colocar mais mulheres feministas
na ALERJ. Conheça nossas ideias e venha se juntar a essa construção Coletiva!
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1. Orçamento público, financiamento de políticas sociais,
combate à fome e garantia do emprego e renda digna
Se o orçamento é público, não pode ser secreto ou via de apropriação do fundo
público por interesses privados. Uma mandata Coletiva Feminista na ALERJ deve se
voltar à alocação dos recursos públicos para bens comuns de interesse das maiorias,
da classe trabalhadora, entendendo que o orçamento não é apenas uma peça técnica,
mas que expressa, sobretudo, uma correlação de forças política e social. Longe de ser
uma ficção, ele vem operando prioritariamente para os ricos e os que estão em seu en-
torno. Nossa atuação na ALERJ será para reverter essa lógica! Afinal, os recursos vêm
majoritariamente da renda, do salário dos(as) trabalhadores(as), por meio de uma tri-
butação regressiva e injusta. A Coletiva Feminista ocupará este espaço para disputar o
fundo público com essa concepção, bem como para democratizar o processo decisório
sobre o ciclo orçamentário de leis que são aprovadas no parlamento estadual – o Pla-
no Plurianual (PPA), a Lei de Diretrizes Orçamentárias (LDO) e a Lei Orçamentária Anual
– tendo em vista saturar o processo de presença popular e decisões substantivas em
favor das maiorias.
Estamos falando de qual volume de recursos? Como se organiza o Orçamento do
Estado do Rio de Janeiro? No ano de exercício de 2021, segundo o Portal da Transparên-
cia do Rio de Janeiro (http://www.transparencia.rj.gov.br/ ), temos uma despesa total do
orçamento de R$ 89,5 bilhões: cerca de R$ 50,1 no Orçamento Fiscal, R$ 34,2 bilhões no
Orçamento da Seguridade Social, e R$ 5,1 bilhões em refinanciamento da dívida. A recei-
ta do estado do Rio de Janeiro foi de R$ 69,2 bilhões o que implicou numa previsão de
déficit de cerca de R$ 20 bilhões, coberto com créditos suplementares aprovados pela
ALERJ. A Prestação de Contas do governo Castro explica que houve a alocação de crédi-
tos suplementares em função de um aumento na receita, bem como do aumento do que
chamam de participações especiais: os royalties e outras receitas. Isso pode explicar,
em parte, as diferenças imensas entre as Despesas Autorizadas na LOA e as que foram
efetivamente pagas em 2021, muito maiores.
Sobre os royalties, eles são a segunda maior fonte de receita – 15,62% - depois do
ICMS – 45,3%. Os recursos de participação especial foram alocados no RioPrevidência,
no pagamento da dívida com a União (Regime de Recuperação Fiscal), transferências aos
municípios e outros gastos como o PASEP, em 2021. Este perfil de alocação dos recursos
públicos indica que os royalties estão sendo alocados fora de sua concepção original, de
recursos de investimento. Por lei estadual há autorização para isso no Estado do Rio de
Janeiro, mas revela uma espécie de desvio de função dos royalties, ainda que legal. Ou-
tro aspecto aqui é que o Rio de Janeiro é responsável por 80,6% da produção petrolífera.
Assim, é preciso observar se o pacto federativo está sendo justo com o Estado do Rio de
Janeiro e se, internamente, os recursos estão sendo repartidos entre os municípios para
investimentos. Tudo indica que não há vista o dito anteriormente. A Coletiva Feminista
se propõe a colocar essa alocação dos royalties em questão!
Vejamos agora as primeiras seis funções do orçamento do Estado do Rio de Janeiro
em volume de recursos pagos e autorizados em 2021:
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Tabela 1 – Orçamento do Estado do Rio de Janeiro 2021 – Funções
Funções Pago (R$ Bilhões) Autorizado (R$ Bilhões)
Previdência Social 24,1 992 mi
Segurança Pública 10,3 1,03
Saúde 8,3 549 mi
Educação 7,3 1,5
Encargos Especiais 6,1 35 mi
Transportes 1,0 348 mi
Fonte: Portal da Transparência do Governo do Estado do Rio de Janeiro – acesso em 18 de agosto de 2022
Saltam aos olhos alguns elementos: a distância abissal entre o Autorizado e o Pago;
o peso da segurança pública maior que em educação e saúde; a insignificância da fun-
ção assistência social, o que pode nos dizer que o governo do Estado não tem cumprido
suas funções no âmbito do SUAS em termos de volume de recursos para os municípios;
a importância dos Encargos Especiais onde estão os juros, encargos e amortizações
da dívida do Rio; o volume gigantesco de recursos alocados no RioPrevidência, o que
corresponde ao que revelou a CPI da Previdência na ALERJ, já que houve aplicações de
risco e criminosas dos recursos das aposentadorias de trabalhadores públicos, abrindo
um “rombo” administrativo. Também é evidente a face penal e punitiva do Estado que
cresceu dez vezes em relação ao autorizado, o que é coerente com as operações poli-
ciais letais no Rio de Janeiro.
Enquanto o orçamento é apropriado dessa maneira pela por setores empresariais,
pela agenda conservadora e pelos parlamentares alinhados ao governo Castro, a popu-
lação trabalhadora do Rio de Janeiro enfrenta uma profunda crise social. No primeiro
trimestre de 2022, os desempregados no estado eram mais de 1,3 milhão, correspon-
dendo ao terceiro maior índice do país (14,9%). Como consequência dessa situação, 22%
da população encontrava-se em situação de pobreza, quadro que era ainda mais na Bai-
xada Fluminense, alcançando 33% dos habitantes. Já a insegurança alimentar atingia,
em algum grau, 60% do total da população do Rio de Janeiro.
A partir dessa análise, apresentamos as seguintes proposições:
•	 Lutar na ALERJ para desbloquear o orçamento público do Rio de Janeiro pelos cons-
trangimentos do ajuste fiscal brasileiro e sua tradução no Estado: o Regime de Re-
cuperação Fiscal e o teto de gastos. E, mais recentemente, o corte de recursos do
ICMS fragilizando as políticas públicas e sociais no Estado para os objetivos eleito-
reiros federais e estaduais. Nesse sentido, é preciso estudar medidas para baixar os
custos dos combustíveis, o que afeta milhões de trabalhadores e o preço dos ali-
mentos e transportes, mas não ao custo da saúde e educação. Essas medidas vêm
significando a paralisia de políticas públicas centrais e a drenagem de recursos de
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forma opaca, a exemplo do que revelou a CPI da Previdência, quando identificou a
aplicação de recursos da previdência social do funcionalismo em um paraíso fiscal.
•	 Construir propostas de priorização no orçamento público de políticas sociais que
incidam na reprodução social da classe trabalhadora em geral e das mulheres, em
especial, destacadamente educação, saúde e assistência social. Nesta última, o
Estado vem se abstendo de suas funções e possibilidades previstas no Sistema
Único de Assistência Social. Outro aspecto aqui é a recomposição salarial de traba-
lhadores do serviço público, que vem sendo duramente atingidos pelo Regime de
Recuperação Fiscal.
•	 Elaborar propostas de alocação de significativos recursos para políticas de em-
prego e renda dignos, como as frentes de obras em equipamentos públicos e
infraestrutura urbana (escolas, postos de saúde, saneamento básico, etc), a va-
lorização do salário-mínimo estadual e o estabelecimento de um programa per-
manente de renda mínima que efetivamente supere a precariedade do Supera
Rio de Cláudio Castro.
•	 Combater as tendências que vem operando de alocar recursos públicos em parce-
rias público-privadas em várias esferas, a exemplo de instituições típicas da con-
trarreforma do Estado, como organizações sociais na saúde, comunidades terapêu-
ticas, e na assistência social - muitas delas rompendo com o princípio republicano
da laicidade do Estado -, e que se constituem em verdadeiras gambiarras de recur-
sos públicos ao invés de prestação de serviços com maior qualidade.
•	 Fortalecer a alocação de recursos públicos numa perspectiva antirracista, fe-
minista e ecossocialista, eixos que devem transversalizar a formulação do orça-
mento público, dando incentivos às instituições e políticas públicas que asse-
gurem esses princípios.
•	 A Mandata Coletiva Feminista pretende dinamizar um Fórum Popular de Orçamen-
to Público no Estado Rio de Janeiro, a exemplo de iniciativas municipais e nacionais
que já houve, fortalecendo a organização política dos movimentos sociais e sindical
para o controle democrático do orçamento público. Este espaço articulará fóruns
setoriais que já existem, e tem o objetivo central de pressionar a ALERJ para a alo-
cação de recursos nas políticas sociais de educação, saúde e assistência social, nas
universidades públicas, em ciência e tecnologia, saneamento, habitação, etc.
•	 Nessa perspectiva, a mandata se articulará com universidades públicas do Rio
de Janeiro e movimentos sociais e sindicais, tendo em vista a viabilização de
espaços de formação para a apropriação por estes últimos dos temas que en-
volvem o orçamento público.
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•	 A Coletiva Feminista fará a divulgação sistemática de dados orçamentários para
os fóruns, movimentos sociais e sindical, para que possam formular suas pautas. E
trabalhará para que a ALERJ e a cidadania no Estado do Rio de Janeiro possuam um
instrumento de monitoramento do Orçamento mais eficiente que o atual Portal da
Transparência do Governo do Estado, marcado pela lentidão e por uma disponibili-
zação das informações que não facilita o acesso leigo.
•	 Nossa mandata estará voltada à alocação de recursos públicos no setor público.
Nesse sentido, somos contra as emendas parlamentares tradicionais ou “de relator”,
que vêm sendo chamadas de ‘orçamento secreto’ no nível federal. O parlamento
deve alterar, recompor o orçamento, propor leis. Não deve ter recursos “carimbados”
aos parlamentares que instauram uma dinâmica promíscua, quando não corrupta,
entre o Executivo e o Legislativo. Os recursos devem ir para as funções públicas a
que se destinam diretamente, sem intermediários, sejam os parlamentares, sejam
as tais parcerias-público-privadas em voga. Nesse passo, somos também contra o
“orçamento impositivo” para emendas parlamentares, uma verdadeira distorção do
orçamento público. Defendemos orçamento impositivo – que obriga o executivo a
gastar – nas políticas sociais e públicas de interesse das maiorias!
•	 Lutaremos para que as renúncias fiscais/gastos tributários sejam seriamente dis-
cutidos e revistos no Estado do Rio de Janeiro. Esse mecanismo vem constituindo
grande perda de recursos públicos para o favorecimento de segmentos empresa-
riais próximos do projeto do governo de plantão. Uma mandata de esquerda deve
trabalhar para conter ou denunciar esses mecanismos de apropriação privada do
fundo público.
•	 Do ponto de vista tributário, faz-se necessário debater no Rio de Janeiro uma ver-
dadeira reforma nacional, pois essa matéria é federal. A reforma tributária de ser
orientada pelo princípio da progressividade (a exemplo do imposto sobre grandes
fortunas), que atinja os altos rendimentos e a grande propriedade, tendo em vista
financiar as políticas públicas efetivamente relevantes. O âmbito tributário tem
uma relação forte com o pacto federativo. Devemos colocar em questão se os re-
cursos que o Rio de Janeiro gera, retornam de forma suficiente para nosso estado, a
exemplo dos royalties, mas sempre pensando de forma solidária com o país. Estudo
divulgado pela ASDUERJ, preocupada com o orçamento da UERJ e da educação,
mostra que apenas cerca de 10% dos recursos do Estado do Rio de Janeiro retor-
nam para o estado: “Em 2021 o Rio de Janeiro arrecadou, em receitas federais para
União cerca de R$ 359 bilhões. E recebeu no mesmo período pouco mais de R$ 26
bilhões ou 7,28% da Receita Federal Arrecadada.”
•	 Num estado do Rio de Janeiro que já levou à prisão quatro governadores e des-
tituiu o mandato do último, o tema do orçamento e do fechamento dos dutos de
improbidade e corrupção não é uma questão menor. Isso reforça a perspectiva de
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controle democrático, já pontada antes, bem como de certa vigilância parlamentar,
o que ademais é uma função precípua da ALERJ, que aprova a prestação de contas
do executivo, após análise do Tribunal de Contas do Estado (TCE). Nesse sentido, a
mandata se propõe a mobilizar todos os recursos possíveis para assegurar dinheiro
público para o público. Seja junto as bancadas de esquerda e/ou na ALERJ como um
todo, trabalharemos pela instauração de CPIs quando necessário, e pela difusão de
seus resultados e responsabilização dos envolvidos.
•	 Nosso estado tem uma forte presença da indústria de óleo e gás, especialmente
da Petrobras. Nossa mandata estará de olho na aplicação dos royalties do petróleo
em efetivos investimentos. Esse recurso visa compensar os impactos ambientais
e sociais da indústria petrolífera e se caracteriza pela obrigação de investimentos.
A nosso ver, deveriam voltar-se a um grande programa de obras públicas, destaca-
damente de saneamento básico, educação e saúde, fortalecendo essas políticas e
gerando emprego e renda tão necessários neste país e estado marcado pela fome
e o desemprego. Basta de enfeitar vias públicas onde vivem as altas rendas!
•	 Para além do controle democrático, sugerimos pensar num orçamento participati-
vo no Estado do Rio de Janeiro, superando os limites das experiências conhecidas,
que disponibilizavam percentuais ínfimos e apenas de investimento para as deci-
sões de assembleias comunitárias. Nossa mandata propõe pensar outras formas
que disponibilizem o conjunto do orçamento ao crivo popular por meio de assem-
bleias públicas comunitárias, setoriais e interlocução com os conselhos de políti-
cas públicas ainda existentes ou a serem retomados após esses anos destrutivos.
•	 Propomos uma auditoria da dívida pública do Estado do Rio de Janeiro, que explodiu
entre 1999 e 2019, passando de um estoque de 15,2 bilhões para 90,7 bilhões, o que
implica juros, encargos e amortizações escorchantes. Os resultados das CPIs da
Dívida e da Previdência precisam ser considerados e as responsabilidades cobra-
das, fechando a gambiarra de recursos para os credores (destacadamente a União)
e para os gastos administrativos irresponsáveis no RioPrevidência.
•	 Valorização, através de um piso salarial, das atividades socialmente atribuídas às
mulheres no mercado de trabalho, pois afinal são as atividades relacionados aos
cuidados. Dentre elas, destaca-se a do serviço doméstico, majoritariamente de-
sempenhado por mulheres negras. Destacamos também as profissionais de edu-
cação, saúde, comércio, serviço social e alojamento.
2. Chega de violência policial! A juventude negra quer viver
De acordo com o Censo do IBGE de 2010, o estado do Rio de Janeiro possui 12,4% de
pessoas autodeclaradas pretas, estando apenas atrás da Bahia, com 17,1%. Somando-se
os 39,3% de autodeclaradas pardos, temos que 51,7% da população total do estado é
composta por negras/os. Tal como em todo o Brasil, o cotidiano da população negra flu-
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minense é inteiramente atravessado pelo racismo estrutural. Mais do que uma herança
do período colonial e dos mais de três séculos de escravidão, esse racismo é reafirmado
e reproduzido até hoje.
Seu peso é sentido em todos os aspectos e momentos das vidas das pessoas ne-
gras. Desde a educação que invisibiliza e deprecia a cultura e as pessoas negras, até o
mercado de trabalho que reserva os empregos mais precários e mal pagos para negras/
os. Desde a precariedade habitacional que compromete uma série de direitos, como o
acesso ao saneamento básico, até a discriminação aberta em locais de trabalho, lazer e
órgãos do próprio poder público.
Entretanto, especialmente no Rio de Janeiro, o seu impacto mais visível é na definição
da política de Segurança Pública. Há décadas, a chamada política de guerra às drogas
tem servido para justificar ações policiais violentas que atentam contra todos os direitos
das/os moradoras/es das favelas e periferias, majoritariamente negras/os. As denúncias
de invasões de domicílios, roubos de pertences, esculachos e humilhações por policiais
se acumulam sem consequências efetivas para os agentes denunciados.
Sem dúvida, a face mais cruel desse processo é o verdadeiro genocídio da juventude
negra e periférica produzido pelas polícias. Apenas no ano de 2020, as ações policiais
no estado resultaram em 1.245 mortes, sendo 86% de pessoas negras. Já em 2021, as
polícias foram responsáveis por 35% das mortes da região metropolitana, ultrapassan-
do em muito a média nacional de 12,9%. Diante desses dados, os pesquisadores Daniel
Hirata, Carolina Grillo, Diogo Lyra e Renato Dirk apontam, com razão, a existência de um
fenômeno de “estatização das mortes”. Esse genocídio é completado por uma política
de encarceramento igualmente violenta. Segundo dados de 2021, o estado do Rio de
Janeiro tem a segunda maior população carcerária do país, com uma superlotação do
sistema que chegava a 56% da sua capacidade. Do total de detentas/os, 43% (o quinto
maior percentual do Brasil) eram presos provisórios, ou seja, não haviam sequer sido jul-
gados ainda. Cabe destacar que, em âmbito nacional, mais de 2/3 das/os presas/os são
negros e que as mulheres têm tido uma série de direitos específicos sistematicamente
negados pelo sistema prisional.
Os governos de Wilson Witzel e Cláudio Castro se destacaram por aprofundarem essa
lógica genocida que já caracterizava as polícias do Rio de Janeiro. Eleito na onda neo-
fascista bolsonarista que varreu as eleições de 2018, Witzel fez das execuções policiais
a base de sua política de segurança pública, defendendo que os agentes “mirassem na
cabecinha”. Já Cláudio Castro, por sua vez, foi o governador responsável por enfrentar
e desrespeitar a ADPF 635 do Supremo Tribunal Federal, que proibiu o uso de helicóp-
teros blindados (os caveirões aéreos) como plataforma de tiros em operações policiais
e também as operações em perímetros escolares e hospitalares e a utilização desses
equipamentos como base operacional das polícias civil e militar, além de determinar a
preservação dos vestígios das cenas de crimes praticados por policiais e a proibição da
remoção indevida de corpo sob o pretexto de oferecer socorro médico.
Com a aproximação das eleições de 2022, Castro tem apostado ainda mais no reforço
da letalidade policial como forma de produzir uma imagem de dureza no combate à crimi-
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nalidade que se reverta em votos. Com isso, nos últimos 14 meses foram registradas três
das quatro maiores chacinas policiais na história do estado. Em maio de 2021, uma ação
no Jacarezinho deixou 28 mortos. Já em maio de 2022, foram 25 mortos em operação na
Vila Cruzeiro. E, por fim, em julho, foram registradas 17 mortes no Complexo do Alemão.
Os vitimados por esse genocídio têm um perfil predominante bastante definido: são
jovens e negros. Em 2020, por exemplo, entre os mortos em ações policiais, 75% eram
negros (um índice muito acima dos 51,7% de negros na população estadual) e 68% ti-
nham menos de 25 anos. Terminando de roubar o futuro dos jovens assassinados, o
genocídio também lança um fardo extra sobre as suas mães, quase sempre, mulheres
negras. Muitas vezes já inteiramente responsáveis pela criação dos filhos, como mães
solo, empurradas para empregos precários e enfrentando jornadas duplas ou triplas,
passam também a viver a dor da perda e a luta por justiça.
Em meio a esse quadro, defensores do genocídio da população jovem, negra e favela-
da têm se articulado na Assembleia Legislativa do Estado do Rio de Janeiro (ALERJ) para
apresentarem pedidos de anistia a policiais civis, militares e penais, além de bombeiros,
envolvidos em mortes em serviço. Trata-se de um esforço para aumentar a impunidade
desfrutada pelos agentes da segurança pública no estado e aprofundar a institucionali-
zação da política genocida, desobedecendo preceitos constitucionais. Da mesma forma,
é na Alerj que se busca aprovar iniciativas como as autonomias das polícias – que con-
tribuem para a perpetuação da impunidade – e o aumento do orçamento da Segurança
Pública, sem avaliação ou debate sobre prioridades. Este aumento no orçamento acon-
tece em detrimento do investimento em saúde e educação, ou ainda através da retirada
de verbas de outras pastas, como se tentou fazer com a Cultura com o Projeto de Lei nº
45/2019, que destinaria 10% do total arrecadado em bilheteria de eventos esportivos e
culturais para as polícias. Além disso, o aumento no orçamento da Segurança é canalizado
na maioria das vezes para a compra de armamentos e o investimento em políticas que já
nascem extremamente problemáticas, como o projeto “Cidade Integrada”, de Castro.
Por fim, não é possível dissociar esse quadro de avanço das práticas genocidas de ou-
tros aspectos da política de segurança pública nacional e estadual, sempre respaldados
por clamores conservadores por maior endurecimento da ação policial e punitiva. Assim,
em um do país que já conta com uma das maiores populações carcerárias do mundo,
vemos se avolumar a pressão por redução da maioridade penal. Ao mesmo tempo, as ini-
ciativas de reestruturação das carreiras policiais representam, na verdade, uma ampliação
da lógica militarizada e miliciana das forças de segurança pública. Essa lógica amplia os
poderes das polícias estaduais atribuindo a elas ações de fiscalização de eventos e con-
trole de armas, ao mesmo tempo em que enfraquece as instâncias de controle, como as
corregedorias. Dessa forma, contribuem, ainda, para a disseminação do medo que alimen-
ta o mercado de segurança privada, que é dominado pelos próprios policiais.
Para enfrentar esse cenário, a Coletiva Feminista se coloca ao lado dos movimen-
tos de favelas, de mães de vítimas da violência policial e de defesa dos direitos hu-
manos, defendendo:
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•	 Por uma concepção ampla de segurança pública: espaços públicos ocupados com
arte, cultura e trabalho, iluminação de qualidade e transporte público integrado,
eficiente e funcionando 24h;
•	 Direcionamento do poder público estadual para o tratamento da questão das dro-
gas como tema de saúde pública e fortalecimento das lutas pela descriminalização
do consumo de drogas – inclusive, com a publicação de cartilhas sobre políticas de
redução de danos;
•	 Luta, em articulação com movimentos sociais, pelo desencarceramento. As práti-
cas de tortura e morte da população negra também acontecem em locais de priva-
ção ou restrição de liberdade;
•	 Combate à expansão dos poderes policiais em ações de controle de armas, fiscali-
zação de eventos, que apontam para uma legalização do viés miliciano da categoria;
•	 Exigência de saída das Forças Armadas e das polícias Militar, Civil e Rodoviária Fe-
deral das favelas, junto com seus equipamentos bélicos;
•	 Cobrança de ações efetivas de fiscalização pelo Ministério Público, na esteira da
elaboração de um Plano Estadual de Diminuição da Letalidade Policial – conforme
determinação do STF –, que inclua medidas de controle sobre as operações poli-
ciais em favelas e periferias;
•	 Fim da polícia militar, incluindo o fim do desvio do orçamento público da saúde,
educação e cultura para as polícias e o combate a todas as medidas que reforcem a
lógica militarizada e miliciana das polícias, que é voltada para o combate à própria
população em detrimento do fortalecimento das ações investigativas e de inteli-
gência que combatam realmente o crime organizado;
3. Pela socialização do trabalho doméstico e de cuidado e o
combate à violência contra a mulher
Há uma naturalização social de que as mulheres sejam responsáveis pelas tarefas
domésticas da casa e de cuidado com os mais novos, os mais velhos, e demais mem-
bros da família. Aquilo que chamamos de reprodução social da vida é tudo o que envolve
processos cotidianos para garantir que homens e mulheres possam sair de suas casas
pra trabalhar todos os dias, também garantir a sobrevivência o cotidiano da vida de um
núcleo familiar, desde os bebês, crianças, idosos e deficientes físicos. Outra dimensão
disso é a reprodução geracional, a própria concepção, gestação, parto, amamentação e
primeiros cuidados da vida de um bebê. Apesar de apenas a reprodução biológica dife-
renciar homens e mulheres (e homens trans sem cirurgia de transição de gênero), toda a
gama de tarefas de cuidado e trabalho doméstico recaem sobre as mulheres. Particular-
mente as mulheres negras, além de serem responsabilizadas por tais trabalhos em suas
13
casas e, muitas vezes, serem mães solo chefes de família, há uma grande concentração
de mulheres negras trabalhando como empregadas domésticas em casas de famílias
brancas e em trabalhos vinculados à reprodução social como cuidadoras de idosos, téc-
nicas de enfermagem, enfermeiras, assistentes sociais, professoras de educação infan-
til, etc. São vítimas das jornadas duplas, triplas ou até mesmo das jornadas contínuas,
com cada vez menos fronteiras entre trabalho remunerado e trabalho reprodutivo.
A pandemia visibilizou ainda mais essa desigualdade de gênero e raça que se repro-
duze no espaço doméstico. Enquanto as famílias forem o centro principal das tarefas
de cuidados, a sobrecarga sobre a mulher trabalhadora, negra, e inclusive as meninas,
sempre será muito superior. Este trabalho realizado no âmbito familiar é absolutamente
invisibilizado, não reconhecido, desvalorizado e não-remunerado. Enquanto não enfren-
tarmos isso como um problema social, a mulher acaba por ter seu tempo drasticamente
reduzido, impactando suas possibilidades de educação, emprego, renda e afetando di-
retamente sua saúde física e mental. Para superar essa situação que estrutura de forma
profunda a opressão e a sobrecarga de trabalho das mulheres, é preciso que o Estado se
responsabilize através de um Sistema Estadual de Cuidado.
Além disso, é preciso que a violência doméstica contra as mulheres não seja seja
tratada como um problema social. Junto com isso, que seja compreendido que toda a
gama de violências reprodutivas e sexuais, desde o assédio, estupro, até a violência obs-
tétrica, a falta de condições para acompanhamento pré-natal, acesso à contracepção,
planejamento familiar, atendimento ginecológico, devem ser prioridades em nosso SUS
e políticas públicas. A justiça reprodutiva, conceito criado pelo movimento de mulheres
negras, amplia o debate sobre os direitos sexuais e reprodutivos já que traz a justiça
social e os direitos humanos para o centro do debate. Não separa as condições sociais
objetivas da situação específica da mulher para ter acesso e garantias para realizar es-
colhas e ter controle sobre o seu sistema reprodutivo e sua saúde. Inclusive, sobre a sua
capacidade de decidir ou não ter filhos, e o próprio direito de exercer à maternidade.
Reconhecemos, ainda, que a capacidade de ter garantido direitos sexuais e reprodutivos
passa pelo respeito à infância, e a garantia que nas escolas haja educação sexual para
que meninas e meninos possam reconhecer processos de assédio sexual e a introdução
na vida sexual de forma consciente, sabendo se proteger e utilizar contraceptivos para
a sua segurança. E que crianças LGBTI+ possam compreender sua orientação sexual e
identidade de gênero com acolhimento de profissionais.
•	 Pela criação do Sistema Estadual de Cuidado, que englobe em uma única rede a
criação, em todos os bairros, de Restaurantes Públicos com mercados populares
com alimentos orgânicos, distribuição de cesta básica e vinculação a hortas co-
munitárias, agroecologia e agricultura familiar. Além de Lavanderias Populares, bi-
bliotecas e espaços de recreação infantil, centros de acolhimento para idosos com
atividades de saúde, lazer e cultura;
14
•	 Enfrentamento a toda forma de violência contra a mulher, com a garantia da prote-
ção e acolhimento, além do encaminhamento aos serviços de atendimento psicos-
social, jurídico, garantia de renda estadual básica, cuidados de saúde e moradia ade-
quada. Campanhas de prevenção ao feminicídio, controle de acesso a armas, novas
unidades de Delegacia de Atendimento à Mulher (DEAM) com equipes multidiscipli-
nares e garantia de policiais mulheres, integrada à rede estadual de atendimento;
•	 Educação sexual para decidir, contraceptivos para não engravidar e aborto legal para
não morrer! Fiscalização e pressão sob a rede pública de hospitais para garantir o
acesso das mulheres ao aborto legal nos casos previstos em lei. Ampliação da licença
parental compartilhada de pelo menos 1 ano e universalização do acesso a creche;
•	 Fortalecer a proposta da Agenda Marielle Franco 2022 de criação de um Obser-
vatório Estadual da Violência Doméstica, de Gênero e Feminicídio e de um Fundo
Estadual de Prevenção e Combate ao Feminicídio;
4. Defesa do SUS gratuito e universal
O momento mais dramático da pandemia de Covid-19 evidenciou a importância do
Sistema Único de Saúde nas vidas de todas/os. Foram as/os trabalhadoras/es do SUS
que estiveram na linha de frente no tratamento das/os infectadas/os e, também, tem
sido as/os responsáveis pela vacinação da população. O SUS é fruto de lutas históricas
das/os trabalhadoras/es brasileiras/os, que garantiram sua inscrição na Constituição de
1988. Em abrangência territorial, alcance populacional e variedade dos tratamentos ofe-
recidos, é um sistema que praticamente não possui paralelos no planeta. Nesse sistema,
o âmbito estadual é responsável pelo atendimento de nível médio de complexidade,
como os exames laboratoriais e investigativos.
Apesar disso, ao longo das últimas décadas, o SUS tem sido alvo de pesados ataques
das classes dominantes e seus representantes políticos, que objetivavam se apropriar
privadamente de recursos que deveriam servir à população e, especialmente, à classe
trabalhadora. Esses ataques se apresentam, em grande medida, pela combinação de sub-
financiamento e privatização. Nesse sentido, a contínua redução de recursos do SUS (mui-
tas vezes, destinando valores abaixo dos mínimos constitucionalmente determinados) di-
ficulta o bom funcionamento das unidades de saúde – pela ausência de infraestrutura,
escassez de servidores, falta de insumos, etc –, abrindo as portas para o falacioso discurso
da “ineficiência” do serviço público, que, por sua vez, busca legitimar a privatização.
No caso específico da saúde, o modelo prioritário de privatização no estado do Rio de
Janeiro ao longo das últimas décadas foi o das chamadas organizações sociais (OS), que
assumem a gestão direta de unidades com financiamento público. Entre 2007 e 2020, en-
tretanto, as fraudes na Secretaria de Saúde do estado, quase sempre vinculadas à atua-
ção das OS, resultou no desvio de 1,8 bilhões de reais. Indo além, são constantes os relatos
de assédio moral, desrespeito a direitos trabalhistas e imposição de jornadas extenuantes
aos trabalhadores contratados pelas OS (que não são servidores públicos estáveis).
15
As principais consequências desse necessário são a crescente degradação do atendi-
mento oferecido pelo Estado à classe trabalhadora e o crescimento dos planos de saúde
privados. Somados a esses obstáculos econômicos mais gerais, mulheres, negras/os e
população LGBTI+ enfrentam, ainda, os efeitos das opressões historicamente existentes
na sociedade brasileira, que têm sido impulsionadas pelo avanço de ideologias conser-
vadoras nos últimos anos. Assim, são alvos do preconceito, da desinformação e da vio-
lência racial e de gênero, que se expressam pela violência obstétrica, pela dificuldade no
acesso ao aborto legal, pela estigmatização e associação a determinadas doenças, etc.
Para alterar esse quadro, a Coletiva Feminista propõe:
•	 Maior investimento em estrutura e equipamentos, com abertura de concursos pú-
blicos para novos profissionais, levando em conta demandas acumuladas pela pan-
demia. Respeito e melhoria dos planos de cargos e salários dos trabalhadores da
saúde pública;
•	 Fim das Organizações Sociais e da privatização/terceirização na saúde, com defesa
dos direitos trabalhistas das/os terceirizados;
•	 Realização de um mapeamento estadual das unidades de saúde, priorizando a
abertura de novas unidades em regiões com maior carência;
•	 Qualificação profissional dos trabalhadores dos serviços com formação continuada
sobre racismo, discriminação sexual e de gênero;
•	 Valorização da rede obstétrica com implementação de atendimento pré e neonatal
integral e acompanhamento puerperal, com: (i) preparação para o parto humaniza-
do pelo SUS, (ii) ampliação de concursos públicos para profissionais e novas unida-
des de casas de parto. (iii) processo de acompanhamento continuado, por equipe
multidisciplinar do SUS, com foco no cuidado clínico, nutricional e psicológico da
pessoa gestante, em puerpério e da criança;
•	 Programa de qualificação profissional para eliminação da violência obstétrica e da
mortalidade materna que atinge prioritariamente as mulheres negras, com plano
de atenção diferenciada de pré e neonatal;
•	 Plano de incentivo ao aleitamento materno e fortalecimento da rede de Banco de
Leite Humano;
•	 Divulgação da legislação que permite o aborto no Brasil (nos casos de estupro,
risco de vida da mulher e anencefalia) nas unidades de saúde, junto à lista da rede
pública apta a realização de tal procedimento. Atendimento para o aborto legal em
toda a rede pública e até a 12º semana de gestação, combinado com programa de
atenção humanizada em toda rede de assistência obstétrica, com elaboração de
um protocolo municipal que qualifique essa atenção. Serviços de acompanhamen-
to psicológico a mulheres que realizarem aborto;
16
•	 Garantia de transparência no sistema de agendamentos e alocação de prioridades
nas consultas e intervenções do SUS;
•	 Investimento e valorização dos profissionais na Rede de Atenção à Saúde Mental,
nos Centros de Atendimento Psicossocial, nos Serviços Residenciais Terapêuticos
e nas unidades de acolhimento, em defesa da reforma psiquiátrica e da luta anti-
manicomial. Combate às comunidades terapêuticas e aos convênios com organi-
zações sociais na Rede de Atenção à Saúde Mental;
•	 Programa de planejamento reprodutivo ligado ao Programa Saúde da Família;
•	 Programa de prevenção, com campanha permanente de informação, de infecções
sexualmente transmissíveis (IST);
•	 Distribuição de absorventes em todas as unidades de saúde, escolas municipais e
equipamentos de assistência social;
•	 Políticas que atendam às especificidades da população negra, com processos de
formação dos trabalhadores da saúde, e inclusão do fator raça na política nacional
de humanização da atenção e gestão do SUS. Fortalecimento da participação dos
movimentos negros nos conselhos e espaços de controle social de saúde;
5. Propostas para a educação no Estado do Rio de Janeiro: A
educação para todas, todos e todes!
Após mais de dois anos de pandemia da Covid-19, a educação é, sem dúvida, um
dos setores da vida mais prejudicados práticas sociais, com resultados devasta-
dores. O fechamento das escolas, o ensino remoto, e o retorno parcial e híbrido
revelou à sociedade fluminense aquilo que a/os educadora/es já sabiam. As con-
dições objetivas de estudo e de trabalho no âmbito escolar, que já eram insufi-
cientes, com a pandemia, tornaram inexequíveis as práticas pedagógicas, com um
mínimo de qualidade, para a maioria da classe trabalhadora e de suas/seus filha/
os. Estudantes em insegurança alimentar e sem acesso ao ensino (remoto). O ple-
no retorno às atividades presenciais, que se deu efetivamente neste ano de 2022,
serviu para esgarçar ainda mais os problemas estruturais e subjetivos acumulados
durante a pandemia. Desta feita, o agravamento da questão social tem levado ao
abandono dos estudos e à diminuição da qualidade da aprendizagem daqueles que
conseguiram permanecer na escola, assolados por todo tipo de dificuldades. Enfim,
a catástrofe social abateu-se também sobre a educação, deixando marcas que se
prolongarão por muito tempo
A questão educacional se apresenta cada vez mais como espaço de debates de con-
cepções e práticas, onde se disputam perspectivas de país, de mundo, de sociedade e,
portanto, de pessoa humana. Assim, é tarefa da classe trabalhadora combater as pro-
postas oriundas da classe dominante e, mais ainda, sistematizar e consolidar suas pró-
17
prias posições. Este texto visa levar ao debate político nove proposições para a cons-
trução de uma política educacional para o estado do Rio de Janeiro, não perdendo
de vista a situação da educação no País.
O projeto político-pedagógico dominante, de caráter neoliberal e agora conservador,
vem mantendo a quase totalidade das e dos profissionais da educação, assim como estu-
dantes e seus familiares excluída do processo de elaboração da política educacional, em
nível nacional, estadual, municipal e local. Por sua natureza, esse projeto só pode entregar
uma educação mínima e carregada de deficiências na formação da pessoa humana.
Além disso, as condições objetivas de trabalho e estudo, também fruto da política
dominante, limitam brutalmente o planejamento e a implementação de ações peda-
gógicas à altura das necessidades da classe trabalhadora, de suas filhas e seus filhos.
São condições que normalizam a falta de materiais, a excessiva carga horária das/os
profissionais da educação, e mais uma série de carências que prejudicam o cotidiano do
trabalho escolar.
A construção de políticas educacionais, em suas diversas dimensões, notadamente nos
aspectos propriamente pedagógicos do debate, é de tão grave relevância que é preciso
estar a encargo daqueles que são seus sujeitos – profissionais da educação e comunidade
escolar, apoiadas/os em sua experiência e nos saberes sistematicamente acumulados.
A necessidade sermos os verdadeiros sujeitos da tarefa educacional se torna ainda
mais premente quando nos deparamos com os ataques antidemocráticos à escola e às/
aos trabalhadoras/es da educação. Por um lado, o Movimento Escola Sem Partido, apesar
de ter anunciado o fim de suas atividades, deixou um legado nefasto de desconfiança e
perseguição à autonomia docente, que hoje se mantém vivo através de parlamentares,
prefeitos e governadores eleitos na esteira do neofascismo. Por outro lado, a difusão das
escolas cívico-militares ressalta a aliança entre conservadores e neoliberais, que pre-
cisam sufocar as vozes dissonantes no espaço escolar para poderem avançar com seu
projeto reacionário e tecnicista, que subordina simultaneamente a formação humana à
determinada moral religiosa e às demandas do deus-mercado.
Em defesa da educação pública no estado do Rio de Janeiro, lutaremos na ALERJ, ao
lado das comunidades escolares e universitárias por:
•	 Verba pública somente para a escola pública! Cumprimento imediato do precei-
to constitucional de 25% do orçamento público estadual para a educação;
•	 Universalização da Educação Básica! Nenhuma criança ou adolescente fora da
escola. Garantia imediata de Educação Infantil pública e gratuita, em creches e
pré-escolas, para todas as crianças de até 5 anos de idade;
•	 Ampliação da jornada escolar. Construção de escolas para ampliar progressiva-
mente o tempo de permanência d@s alun@s. Garantia de condições para o desen-
volvimento de atividades escolares de dia inteiro;
•	 Ampliação das vagas nas universidades estaduais e nas escolas técnico-pro-
fissionais! Defesa das políticas sociais e de cotas para o acesso. Garantia de per-
18
manência até a conclusão do curso. Incorporação da rede da FAETEC à secretaria
estadual de educação;
•	 Ampliação e melhoria da infraestrutura educacional! Construção e reforma dos
prédios escolares e dos campi universitários, dotando-os de toda a infraestrutura
necessária, inclusive internet, quadras poliesportivas, bibliotecas, laboratórios;
•	 Mais profissionais para a educação! Contratação imediata de profissionais da
educação para o quadro permanente, via concurso público, em todos os níveis e
modalidades de ensino;
•	 Dignidade para quem educa! Estabelecimento do piso estadual do magistério
em 5 salários mínimos e das e dos demais profissionais da educação em 3 salários
mínimos, apoiando os mesmos valores para o piso nacional;
•	 Democratização radical da educação. Eleições diretas já para todos os diri-
gentes educacionais em todos os níveis – da direção escolar à secretaria es-
tadual de educação! Implementação de efetiva gestão democrática da educação
pública;
•	 Criação de Círculos de Cultura que transformem as escolas em polos culturais
abertas a todos;
•	 Educação para todas, todos e todes! Educação laica e civil. Combate a todas as
formas de racismo, opressão, sexismo, LGBTI+fobia, etarismo, capacitismo, milita-
rização e censura nas escolas e universidades. Por uma educação inclusiva, plural,
emancipadora e calcada no respeito às diferenças;
•	 Programas obrigatórios de formação inicial e continuada de professores/as em
torno das leis 10.639, 11.645 e 12.288, estabelecendo parcerias com universidades
públicas;
6. Direitos LGBTI+
O Brasil é um dos países que mais mata pessoas LGBTI+ no mundo. Além do assassi-
nato, outros conflitos e formas de violência são vividas: depressão, desemprego, índices
alarmantes de ISTs, expulsões de casa, agressões verbais, tortura, estupros corretivos,
abandono na velhice, entre outras.
Nas últimas décadas, se impôs um sistema de governabilidade como parte funda-
mental do presidencialismo de coalizão, que deu a setores ultraconservadores, funda-
mentalistas religiosos e neofascistas um antidemocrático poder de veto com relação
aos direitos LGBTI+. Além disso, a população LGBTI+ se tornou um dos alvos preferenciais
das fake news que coesionam e mobilizam ultraconservadora, como evidenciado pelo
caso do “kit gay”. Nesse circuito, também se estruturam inúmeras relações escusas en-
tre parlamentares de ultradireita e interesses econômicos privados, gerando esquemas
de corrupção. No atual governo, o Ministério da Mulher, da Família e dos Direitos Huma-
19
nos – chefiado até recentemente por Damares Alves –, além de não ter desenvolvido
políticas de assistência à população LGBTI+, se tornou a principal caixa de ressonância
das posições conservadoras.
Não é possível que se mantenha essa lógica que exclui e marginaliza ainda mais um
setor fundamental da sociedade. Como ponto de partida para transformar essa situa-
ção, é preciso que os diversos órgãos competentes sejam pressionados a realizarem
uma efetiva coleta de dados globais sobre a população LGBTI+, o que não existe atual-
mente. O relatório do Grupo Gay da Bahia de 2021, um dos poucos que efetua esse tipo
de pesquisa no país, identificou que 300 LGBTI+ sofreram morte violenta no país em
2021, um aumento de 8% em relação ao ano anterior: foram 276 homicídios (92%) e 24
suicídios (8%), sendo ainda o Brasil o país que mais mata LGBTI+ no mundo: uma morte
a cada 29 horas.
Para que se reverta essa situação é preciso que sejam desenvolvidas e implementa-
das políticas amplas de atendimento aos direitos LGBTI+ com condições dignas de vida,
saúde e educação e respeito.
Diante deste cenário, propomos quatro temas prioritários na ampliação dos direitos
LGBTI+, que se desdobram em inúmeras propostas concretas:
Segurança:
•	 Criação de espaços de acolhimento para pessoas LGBTI+ vítimas de violência;
•	 Capacitação e o treinamento das polícias e forças de segurança, a respeito da di-
versidade sexual;
•	 Inclusão da motivação de discriminação por identidade de gênero e orientação se-
xual nos protocolos de atendimentos da Segurança Pública, com produção de es-
tatísticas regionais e federais;
•	 Espaços de vivência específica para pessoas trans nos presídios, como opção vo-
luntária;
Saúde:
•	 Saúde integral das mulheres lésbicas, bissexuais e homens trans, articulando com
as instituições de formação de profissionais da saúde, combatendo a violência gi-
necológica e obstétrica;
•	 Prevenção ao suicídio de pessoas LGBTI+ e fortalecimento dos mecanismos e equi-
pamentos da política de saúde mental;
•	 Despatologização das identidades LGBTI+, fim das “comunidades terapêuticas”, das
intervenções corporais indevidas em pessoas intersexo, das internações forçadas e
dos tratamentos anticientíficos para a dita “cura gay”;
•	 Combate ao HIV, políticas específicas para a população negra, campesina e indíge-
na, combatendo a mortalidade por aids e coinfecções;
20
•	 Garantir o atendimento do SUS às pessoas trans, com capacitação dos profissio-
nais de saúde e insumos adequados, e demais questões para o processo de hormo-
nioterapia e procedimentos cirúrgicos de afirmação de gênero;
Educação:
•	 Prevenir e enfrentar o bullying e a violência LGBTIAfóbica e promover respeito e va-
lorização da diversidade, com material de formação contra o preconceito, sobre di-
versidade de gênero e sexualidade para a preparação de educadores e estudantes;
•	 Uso de nome social nas escolas e banheiros adequados à identidade de gênero
autopercebida;
•	 Programa nacional de prevenção do abandono escolar e de reinserção no sistema
educativo, em todos os níveis; ações afirmativas para o acesso e permanência nas
Instituições de Ensino Superior;
•	 Cotas para travestis, pessoas trans e de diversidade sexual e de gênero nas univer-
sidades;
Emprego, renda e moradia:
•	 Programas de assistência social, orientação e formação técnica e profissional;
campanhas de valorização do emprego trans;
•	 Cotas no serviço público para travestis, pessoas trans e de diversidade sexual no
serviço público e nas empresas;
•	 Políticas de transporte específicas que garantam assistência e acesso para que a
população LGBTI+ possa se locomover com segurança nas cidades;
•	 Produzir dados sobre pessoas LGBTI+ em situação de rua e articular as políticas de
Assistência Social e habitação, com unidades de acolhimento e políticas afirmati-
vas para habitação popular;
7. Arte e cultura são necessidades básicas: Por uma atuação
na ALERJ que valorize a cultura popular, periférica, de
resistência e feita pela e para a maioria
O Brasil viveu a partir da década de 1990 a instituição de um modelo neoliberal para
a cultura baseado em mecanismos de renúncia fiscal que até hoje mostra suas conse-
quências. A centralização geográfica das produções e do financiamento, assim como a
mercantilização e “tutela” das grandes empresas na aplicação das políticas e dos inves-
timentos são algumas delas. Se os anos de governo Lula permitiram algum avanço para
21
o setor, com a implementação do Sistema Nacional de Cultura (SNC) e iniciativas como
o Cultura Viva-Pontos de Cultura, a política de Dilma Rousseff não foi além, muito pelo
contrário, descontinuou políticas para o setor.
Após o golpe de 2016, o desmonte atinge o orçamento e as políticas públicas, situação
que se aprofunda com o governo Bolsonaro e uma ofensiva ideológica fundamentalista.
A conversão do Ministério da Cultura em Secretaria e a rotatividade e o perfil de seus
secretários atestam o seu caráter conservador. É patente o aparelhamento ideológico
e a censura em instituições, órgãos e agências ligados à cultura. O ataque se dá ainda a
partir das chamadas fake news sobre as políticas do setor e sua aplicação, assim como a
desmoralização de artistas e produtores culturais não alinhados ao credo fascistizante.
Além disso, a pandemia conformou uma dura realidade, paralisando e desorganizando a
complexa rede pela qual se passa o “fazer cultural”. A Lei Aldir Blanc (lei n.14.017/2020) con-
quista que contou com ampla mobilização da sociedade e do setor, foi um importante apoio
econômico a artistas, técnicos, produtores e espaços de cultura espalhados pelo Brasil. Já a
Lei Aldir Blanc 2 (lei n.14.399/2022) e a Lei Paulo Gustavo (Lei Complementar 195, de 2022 ),
novos aportes e apoio significado ao setor cultural, foram alvo de vetos de Bolsonaro, rever-
tidos no Congresso, também com forte mobilização da sociedade e do setor.
Já no Estado do Rio de Janeiro, os governos Wilson Witzel e Cláudio Castro deixam
claro sua política de criminalização da pobreza, militarização das questões sociais e
seus compromissos com uma agenda fundamentalista e conservadora. A Secretaria Es-
tadual de Cultura e Economia Criativa segue sendo historicamente um “balcão de ne-
gócios” e funciona a partir da lógica privatista da renúncia fiscal (ICMS), além de manter
prioridade com grandes empreendimentos e eventos no setor da cultura. A chamada
cadeia produtiva da cultura também sentiu o impacto da pandemia, mas não deixou de
encontrar apoio em projeto de leis que partiram do PSOL. Na capital, o vereador Tarcísio
Motta (PSOL) tem atuado de forma sensível nesse sentido ao aprovar a lei SOS Cultura
(lei n.6771/2020)), assim como atuando na Comissão do Carnaval que aprovou a festa
como direito cultural do carioca.
A partir da expansão e do aprendizado dessas experiências e sempre dialogando com
os diversos atores do setor cultural em todo o Estado do Rio de Janeiro, a Coletiva Femi-
nista do PSOL na ALERJ tem como proposta central lutar pela garantia e pelo aumen-
to do orçamento para o setor a partir de uma perspectiva que valorize a cultura
popular, periférica, de resistência, feita pela e para a maioria da população.
Para isso, é central em nossa atuação o diálogo com mais diversos atores da cul-
tura, compreendendo suas realidades e necessidade concretas. São artistas, técnicas/
os, curadoras/es, gestoras/es, contadoras/es de história, professoras/es de artes, ofici-
neiras/os e diversas/os outras/os trabalhadoras/es que estão diretamente ou indireta-
mente ligados à cultura. Sem esquecer a importância de políticas para o conjunto de
atividades relacionadas direta e indiretamente à cultura, queremos construir projetos
e parcerias que observem as especificidades de cada manifestação cultural e artística.
Nesse sentido, construiremos coletivamente tanto projetos de lei que visem salvaguar-
dar e fomentar manifestações culturais populares e periféricas, quanto fortalecer
as redes locais de produção e difusão cultural.
22
Vale lembrar que a formação sócio histórica do Rio de Janeiro é diversa, marcada
pela riqueza cultural e pela íntima articulação das culturas indígenas, africanas e da
colonização. Embora diversa e rica, essa história também é marcada pela criminalização
e marginalização dos modos de vida e de cultura das classes subalternas e pela sua
racialização. Isso se expressa na criminalização do funk, na violência aos terreiros e às
religiões e expressões culturais de matriz africana, na privatização do carnaval e de fes-
tas populares contraposta a megaeventos, na repressão a artistas de rua, ao hip-hop e
outras produções culturais da periferia, no não financiamento e na desconsideração da
cultura popular e suas expressões.	
Em outro sentido, precisamos pensar a cultura como direito a ser garantido e fomen-
tado pelo Estado, pautado em uma política cultural e projetos de lei pensados para as
trabalhadoras e os trabalhadores. Uma política que lute pela garantia da expansão do
orçamento e que democratize o fomento e tenha como centralidade os atores populares
e periféricos. Também como mandato legislativo, é central fiscalizar e lutar por uma
política cultural de valorização das/os trabalhadoras/es da cultura e de consolidação
e manutenção de uma política estadual continuada para o setor.
Assim, tendo como eixo de luta a garantia e aumento do fomento direto das/os
fazedoras/es de cultura a partir do repasse do Estado do RJ, em uma perspectiva
que valorize a cultura popular, periférica, de resistência feita pela e para a maioria,
levantamos alguns pontos que balizarão as nossas ações na ALERJ.
Buscaremos junto aos setores envolvidos no fazer cultural, assim como em diálogo
com a sociedade, fomentar, propor e avançar com leis e políticas públicas concretas:
Ampliação dos recursos e leis de fomento:
•	 Ampliar a verba pública estadual até se alcançar, em um primeiro momento,
o que está previsto na Constituição Federal, isto é vincular 0,5% da receita tri-
butária líquida dos estados e ao Distrito Federal para o financiamento exclusivo de
programas e projetos culturais, com vistas a chegar a 1,5%;
•	 Criar mecanismos legislativos que obriguem os editais do Estado a favorecer fo-
mento e incentivo a pequenos artistas e produtores culturais, assim como as/os
fazedoras/es de cultura dos territórios periféricos, combatendo a burocracia que
impede a democratização do acesso;
•	 Debater junto aos atores da cultura e pensar mecanismos legais que permitam o
abandono progressivo do financiamento via renúncia fiscal para o fomento direto
público estadual;
•	 Criar mecanismos legais para que os editais do Estado para a cultura abarquem
não apenas a apresentação final de um produto artístico e cultural, mas incentivem
processos de produção e a manutenção de espaços, manifestações culturais
e grupos artísticos;
23
Valorização do trabalho na Cultura:
•	 Lutar na contracorrente da precarização do trabalho que atinge os fazedores de
cultura. Nesse sentido, lutar por direitos trabalhistas e por direitos sociais e previ-
denciários que deem conta da especificidade do trabalho no setor;
•	 Defender a descriminalização e democratização do carnaval e demais festas popu-
lares e produção cultural da classe trabalhadora e da periferia;
Expansão e democratização dos equipamentos culturais:
•	 Expansão dos aparelhos de cultura pelo Estado, a partir do diálogo com as comuni-
dades, visando enfrentar a brutal desigualdade geográfica de tais equipamentos e
garantir o direito à cidade;
•	 Fomentar, reativar e garantir uma gestão democrática de equipamentos culturais
pelo Estado;
•	 Transformar espaços públicos ociosos e prédios abandonados, inclusive as esta-
ções ferroviárias, em espaços para a criação de centros culturais e aberto à ocupa-
ção cultural, via editais públicos;
•	 Ampliar e diversificar o funcionamento dos aparelhos de cultura em especial os
museus, com vistas a incentivar o acesso da classe trabalhadora nestes locais em
horários diversificados;
•	 Criar os Círculos de Cultura que transformem as escolas estaduais também em
espaços públicos de cultura, com abertura aos finais de semana para atividades
culturais e educativas para a população;
•	 Garantir o fomento e manutenção das escolas técnicas de artes do Estado;
•	 Garantir o financiamento contínuo de bibliotecas e espaços culturais afim de que
esses espaços permaneçam operantes, estruturados, vivos e com um corpo admi-
nistrativo e técnico permanente;
•	 Fomentar grupos a partir dos territórios, prevendo em lei como critério o trabalho
comprovado no local de atuação do grupo;
•	 Promover editais específicos para fomento de expressões da juventude negra, tais
como: os elementos do hip hop (rap, grafite, break), o funk e os saraus das periferias;
•	 Promover amplo movimento de elaboração com a sociedade do Plano Estadual de Cul-
tura que atenda aos objetivos da população, principalmente voltado à reparação àque-
las/aqueles a quem historicamente não têm acesso aos espaços culturais do Estado;
24
8. Ecossocialismo contra a barbárie
O tema do ecossocialismo pode ser abordado a partir de diversas chaves. As duas
principais são: o ecossocialismo como uma crítica ecológica da sociedade capitalista e
o ecossocialismo como um programa de transição. No primeiro caso, é possível formular
uma poderosa demonstração de que o capitalismo é inviável ecologicamente e precisa,
portanto, ser superado. No segundo caso, trata-se da formulação de um amplo programa
de demandas/exigências com o objetivo de, em meio à luta, contribuir para a elevação do
nível de consciência da classe trabalhadora. É evidente que, tanto num caso quanto no
outro, a escala mais visível é a nacional e a internacional. As questões e processos locais
de fundo e as urgências mais imediatas do cotidiano não são tão facilmente percebidas
nessa crítica totalizante do sistema. Mas isso não significa que elas não estejam lá ou que
não possam ser adequadamente identificadas, discutidas e enfrentadas. Mais que isso,
em um processo de disputa eleitoral pela câmara estadual, é fundamental trazer à tona
as lutas decisivas que necessariamente são travadas em âmbito local.
Temos duas boas maneiras de fazer isso. Podemos, primeiro, apontar a centralidade
da crise ecológica e, depois, usar o exemplo das mudanças climáticas como o mais em-
blemático para revelar os desafios locais.
Quanto à centralidade da questão ecológica, compreendemos que o futuro que de-
sejamos não apenas deve ser arrancado das entranhas da sociedade capitalista, mas
também deverá ser construído a partir das condições ecológicas legadas por ela. O pe-
rigo realmente dramático que enfrentamos é que esta sociedade vem destruindo-as
rapidamente e continuará a fazê-lo enquanto não a superarmos. À medida que o tempo
passa, mais o nosso futuro assume feições degradadas, estéreis e hostis. E conforme
muitos(as) ecossocialistas costumam insistir, não há como garantir/construir uma so-
ciedade verdadeiramente emancipada e ecologicamente sustentável em Terra arrasada.
Em Terra arrasada, todas as nossas lutas legítimas e importantes veem sua chance
de vitória real minguar e, no limite, desaparecer. A luta contra a desigualdade social
tem características e possibilidades completamente diferentes quando vivemos em um
mundo de superprodução e escassez relativa (nossa realidade atual) ou quando nos de-
paramos com escassez absoluta (um cenário possível de futuro). O combate à fome é
de um jeito quando há comida em excesso combinada a desperdício e má distribuição
e é radicalmente distinto quando simplesmente não há comida suficiente. A luta por
saneamento básico e acesso à água (combinada à luta para reconquistar o caráter
público da Cedae) é uma quando a falta de acesso é provocada por falta de políticas
públicas e é outra quando a falta é provocada pelo envenenamento e destruição genera-
lizados de florestas, rios, lagoas etc. A demarcação de terras indígenas traz inúmeros
impactos ecológicos e humanos positivos quando o principal vetor da conservação ou
destruição da floresta é o ser humano. Mas quando os processos climáticos disparados
por nós começarem a ameaçar a capacidade de reprodução dos diversos biomas, mes-
mo as reservas sofrerão os impactos negativos. Uma reforma agrária e agroecológica
abre possibilidades completamente diferentes quando o principal inimigo a ser enfren-
tado é o latifúndio e o agronegócio ou quando o principal desafio é o empobrecimento
25
crônico de terras antes cultiváveis, a multiplicação e aumento da intensidade das se-
cas, a multiplicação de chuvas torrenciais, a multiplicação de incêndios etc. A defesa
do caráter público da Petrobras abre algumas possibilidades enquanto uma efetiva
transição ainda for um caminho em aberto para evitar os piores impactos de nossa de-
pendência dos combustíveis fósseis. Se deixarmos ser tarde demais, o que fazer com
uma eventual vitória nesta luta? Na verdade, a pergunta vale para todas as lutas acima
enumeradas. Não há, portanto, tempo a perder. E não é mais concebível que qualquer
uma delas desconsidere, teórica e praticamente, os desafios, as urgências e as tarefas
no âmbito ecológico.
Passando agora às mudanças climáticas, dificilmente encontraríamos exemplo mais
adequado em meio à crise ecológica, pois se trata de um processo global que, no entan-
to, necessariamente se manifesta de modo local e, vale acrescentar, desigual (inclusive,
impactando de maneira mais dramática a população pobre e negra).
Ao passo em que a velha esperança de preservar a estabilidade climática dos últimos
12 mil anos vai se dissolvendo, torna-se cada vez mais evidente a urgência de divisar
estratégias de adaptação a esse mundo novo que vai se formando a passos rápidos. Em
parte, uma nova camada de problemas e dificuldades é acrescentada ao plano mais am-
plo de articulação global de esforços. Mas, além disso, o novo quadro de crise climática
permanente confere ao âmbito local uma centralidade relativamente nova, traz a urgên-
cia de estratégias de adaptação para o seio do debate estadual e municipal.
É evidente que muitas questões ecológicas de grande importância vêm sendo dispu-
tadas há décadas nas cidades. Contudo, repentinamente, as cidades tornaram-se um
terreno de disputa decisivo na definição das formas pelas quais a humanidade tentará
adaptar-se a um meio ambiente crescentemente hostil.
Mesmo mapeando bastante genericamente as maneiras mais prováveis em que a
crise climática se traduz em novos e maiores desafios para as cidades, já é possível ter
clareza do quão dramaticamente mal preparadas elas estão, inclusive as cidades flumi-
nenses. Todas elas, sem nenhuma exceção digna de nota, enfrentam com dificuldades
bastantes severas, e com escasso sucesso, desafios ambientais com níveis de comple-
xidade incomparavelmente menores. Nosso histórico precário é um ingrediente a mais
a reforçar a urgência de prepararmos nossas cidades e nossas populações para riscos
muito maiores do que aqueles que costumam nos atropelar cotidianamente.
Mais cedo ou mais tarde, a crise climática convocará o Estado à mesma proatividade
concentrada e unilateral que observamos em 2020, ao redor do mundo, com a pandemia
de Covid-19. Quanto mais distante o povo estiver das posições de poder, mais aquele
exercício coercitivo assumirá formas de violência e segregação crescentes. É verdade
que, como a experiência latinoamericana demonstra fartamente, os processos eleito-
rais, na melhor das hipóteses, são capazes de assentar o poder popular sobre bases
muito frágeis e instáveis. Mas esse cenário de encruzilhada nos indica que, na luta pelo
poder real, não podemos abrir mão de disputar as eleições estaduais com uma pauta
ecológica radical e a consciência do momento grave pelo qual passamos e do futuro ain-
da mais difícil que se avizinha. Nesse sentido, apresentamos como um primeiro passo o
seguinte conjunto de propostas:
26
•	 Pelo desmatamento zero e defesa do reflorestamento massivo da mata atlântica;
•	 Mapeamento de riscos (chuva, incêndios, deslizamentos, alagamentos, produção
de alimentos) e realização de obras públicas para produzir uma infraestrutura ur-
bana que minimize os impactos previstos: elevação do nível do mar, chuvas torren-
ciais, tempestades de vento/raios etc;
•	 Adaptação/criação de equipamentos públicos para receber dignamente desabrigados;
•	 Política pública específica para auxiliar material e financeiramente atingidos por
eventos climáticos;
•	 Efetivação da fiscalização e da sanção aos crimes ambientais;
•	 Defesa do avanço da reforma agrária agroecológica no estado, apresentando
projetos concretos de segurança alimentar, como o de destinar terrenos públicos
do estado, nas cidades (particularmente nas favelas e periferias) para a criação de
hortas comunitárias de produção de alimentos orgânicos, com um programa de
qualificação e emprego de mulheres para trabalharem nesses cultivos, além do
estabelecimento de convênios com as famílias assentadas no estado. Destinação
preferencial desses alimentos para a merenda escolar da rede estadual de educa-
ção e para os restaurantes populares estaduais;
•	 Fomento à agricultura urbana e periurbana;
•	 propor, na ALERJ, que recursos do FECAM – Fundo Estadual de Conservação Am-
biental, oriundos dos royalties do petróleo, sejam empregados na construção e ma-
nutenção de usinas de geração comunitária de energia solar e eólica, privile-
giando – em um primeiro momento – as comunidades quilombolas e indígenas do
estado, e avançando progressivamente para as áreas urbanas periféricas e faveliza-
das, em que o custo da energia é insuportável para as famílias trabalhadoras. Esse
programa deve buscar parcerias com universidades e centros de pesquisa públicos,
para evitar que a transição energética seja sequestrada pelas grandes empresas
capitalistas que buscam monopolizar essas tecnologias e difundir a ideologia do
“capitalismo verde”;
•	 por uma política de transição energética que combata a instalação da termelétrica
de Sepetiba e busque fontes alternativas de produção de energia, a partir de resí-
duos, etc;
•	 apoio ao desenvolvimento de programas de educação ambiental nas escolas, em
parceria com universidades como a Universidade Federal Rural do Rio de Janeiro
(UFRRJ);
•	 apoio às lutas de quilombolas e indígenas no estado do Rio de Janeiro, que são pro-
tagonistas fundamentais da luta ambiental;
27
9. Em defesa das empresas públicas estatais! Não à
privatização
As empresas estatais sempre foram fundamentais para a economia brasileira. O
que seria do setor de petróleo, de gás e de combustíveis se a Petrobras e suas sub-
sidiárias não existissem? O que seria da distribuição de correspondências e pro-
dutos sem os Correios? O que seria da vida dos brasileiros sem serviços baratos de
água e luz?
Mesmo as estatais gerando crescimento econômico, investimentos, empregos,
inovação, soberania e preços de bens e serviços menores do que o mercado, os
privatistas nunca descansam e trabalham dia após dia para entregar o patrimônio
público para seus amigos e clientes.
As empresas estatais estão sendo destruídas; todos os serviços e atenção à popula-
ção pioraram nestes últimos anos. Existe falta de investimento para empresas estatais
por parte dos governos porque o objetivo do modelo neoliberal é sucatear os servi-
ços públicos para depois privatizar tudo: águas, Amazônia, grandes empresas estatais,
venda do Pré-sal para empresas estrangeiras. Desde o golpe de 2016, as privatizações
das maiores empresas se aceleraram: CEDAE, Eletrobras, BR Distribuidora, Liquigás,
Gaspetro, Refinaria Landulpho Alves, diversas ações do BNDES, aeroportos, estra-
das e um longo e triste etc. No final, se trata de uma perda acelerada de patrimônio e
soberania nacional.
Tomemos o caso com dados de duas empresas estatais fundamentais:
Sobre a Petrobras
A Petrobras é sem sombra de dúvidas a joia da coroa dos privatistas. Afinal de
contas, segundo a lista Forbes Global 2000 para o ano de 2022, a Petrobras é a
maior empresa do Brasil e a 65ª do mundo. Apesar de não ter conseguido vendê-la
integralmente como empresa, as privatizações da empresa já somam mais de R$
280 bilhões em valores atuais. Segundo o Observatório Social do Petróleo, o processo
de privatização da Petrobras se acelera: a empresa vendeu por R$ 155,5 bilhões em ati-
vos. O estado do Rio de Janeiro, sendo a sede da Petrobras, é particularmente afetado
pelo desmonte da empresa, com diminuição imenso de investimentos, emprego e renda.
A magnitude desse impacto é evidenciada pelo fato de que o setor de petróleo e gás,
liderado pela Petrobras, responde por 30% do PIB do estado.
Desde o início do governo Bolsonaro, a gasolina subiu quatro vezes mais que o salá-
rio mínimo. Desde 2021 o preço da gasolina, do diesel e do gás de cozinha estão nos
maiores patamares da história. A média do preço do botijão chegou a R$ 120, o equiva-
lente a 10% do salário-mínimo. Nunca foi tão caro abastecer um veículo ou cozinhar
sua própria comida, mesmo o Brasil sendo o nono maior produtor de petróleo e o
nono país com maior capacidade de refino do mundo.
Isso é decorrência da atual política de preços da Petrobras, criada logo após o
28
golpe – em outubro de 2016 – pelo então presidente da companhia, Pedro Parente,
nomeado por Michel Temer. Os preços dos combustíveis no país estão alinhados com
os preços internacionais, ou seja, quando sobe o preço internacional automaticamente
sobem os preços nas refinarias, independentemente da situação econômica e da pro-
dução nacional. O Preço de Paridade de Importação (PPI) é a responsável pela alta dos
preços, e não os impostos ou a situação econômica global.
Para diminuir o preço dos combustíveis, em época de eleições, o governo Bolsonaro
estabeleceu um teto para o ICMS, imposto que compõe a arrecadação dos estados e
deveria servir para os serviços públicos. Desde a instauração deste subsídio, a Petrobras
pôde praticar preços de gasolina, diesel e gás de cozinha mesmo acima do PPI, ou seja,
os estados renunciaram a recursos fundamentais para que a Petrobras possa lucrar ain-
da mais e manter a política de pagamentos recorde de dividendos. É preciso acabar com
o Preço de Paridade de Importação, qualquer outra solução é ineficiente e mantém o
empobrecimento do país em favor dos acionistas da empresa.
Como resultado dos enormes preços dos combustíveis, a Petrobrás vem baten-
do recorde de lucros e de pagamento de dividendos, chegando no 2º trimestre de
2022, a ser a maior pagadora de dividendos dentre todas as empresas do mundo!
No segundo trimestre deste ano, foi um total de US$ 9,7 bilhões, quase 10 vezes mais que
no mesmo período de 2021.
Sobre a CEDAE
Segundo dados oficiais, 35,6% da população do estado do Rio de Janeiro não tem aces-
so à rede de esgoto. O acesso à rede de água chega a 92,9% da população. Mesmo assim, a
Companhia Estadual de Água e Esgoto do Rio de Janeiro (CEDAE), foi privatizada recen-
temente. A luta contra a privatização vem desde os anos 90. Em 20 de fevereiro de 2017,
a Alerj aprovou, por 41 votos favoráveis e 28 contrários, a alienação de 100% das ações da
CEDAE (lei n°. 7.529/2017). Desde 2021, o governo Bolsonaro e o governador Cláudio Cas-
tro conseguiram avançar no desmonte com o argumento de concessão e não privatiza-
ção e, mediante leilão de 4 lotes, entregaram a parte mais lucrativa, 80% da empresa,
à iniciativa privada. O serviço de abastecimento de água e coleta de esgoto estará nas
mãos do capital privado por 35 anos. A CEDAE continuará existindo, para captação e tra-
tamento de água, fornecendo a água já tratada para os concessionários que realizarão a
distribuição, a etapa do processo que gera mais lucros.
A empresa Aegea, que tem como sócios o fundo soberano de Cingapura (GIC) e a
Itaúsa, foi a vencedora do leilão, arrematando dois dos quatro lotes (1 e 4). O grupo Iguá,
do fundo canadense CPPIB, ganhou o bloco 2. O grupo Águas do Brasil venceu o leilão
do bloco 3. A empresa Águas do Rio é a mais nova empresa do grupo Aegea, criada em
2010, assinou, contrato com o governo do estado e prefeituras para assumir os serviços
de água e esgoto em 48 de 64 municípios fluminenses, incluindo 124 bairros no Centro e
nas Zonas Sul e Norte da capital.
A privatização é apresentada como resposta à má gestão pública, mas, na prática, sig-
nifica aumento da tarifa, redução do atendimento e da qualidade e privilegia áreas de
29
maior “retorno”, mantendo os marginalizados com atendimento precário ou sem atendi-
mento. A distribuição de saneamento básico deveria ser algo garantido para todos, mas
as empresas privadas atuam em sentido contrário. Os investimentos da empresa conces-
sionária de esgoto Zona Oeste Mais Saneamento, controlada pela Saab e BRK, na Zona
Oeste do Rio de janeiro, excluem favelas não urbanizadas. Lá, quase a metade da meta de
ampliação da rede nos primeiros cinco anos de contrato (2012-2017) foi executada pela
prefeitura (228 km ante 500 km no total).
Logo, são pelo menos três as mentiras propagandeadas pelos privatistas: a CEDAE dá
prejuízo, as tarifas da água vão baixar com a privatização; os serviços vão melhorar. Não
só as empresas estatais não são deficitárias como possuem lucros milionários apesar da
má gestão dos políticos que querem lucrar com a venda do patrimônio público. Privati-
zar a água, portanto, só atende aos interesses dos grandes empresários que lucram com
serviços essenciais. Água é um direito, não mercadoria. Garantir o controle público desse
bem é indispensável para assegurar esse direito fundamental à vida. Não à privatização
da água! Não à privatização da CEDAE!
Para garantir a defesa das estatais frente aos ataques privatistas e fortalecer sua
ação em defesa dos interesses da população trabalhadora, defendemos:
•	 Por uma Petrobras 100% estatal, como empresa integrada (do poço ao posto) e pela
exploração estatal do petróleo do Pré-Sal, para garantir soberania e independência
nacional. Fiscalizar o repasse dos royalties e seu investimento. Anular os mecanis-
mos que comprometem os royalties, como os de “securitização” (venda de títulos
da dívida do Estado com garantia dos royalties do petróleo, para pagar as apo-
sentadorias dos funcionários públicos de RJ). Os royalties do petróleo do Pré-Sal
devem servir para saúde e Educação;
•	 Derrubar a Lei Kandir que prevê a isenção do pagamento de ICMS sobre as expor-
tações de produtos primários e semielaborados ou serviços;
•	 Oposição à privatização do Pré-sal através da venda da Pré-sal Petróleo S.A. (PPSA)
e da venda antecipada do óleo da União no Pré-sal. Segundo cálculos do próprio
governo a privatização entregaria 75% do valor do Pré-sal para os seus compradores;
•	 Oposição à política Preço de Paridade de Importação (PPI), política de preços que de-
termina que as refinarias da Petrobras cobrem preços como se estivessem importan-
do combustíveis do mercado internacional. O preço dos combustíveis deve ter como
referência os custos internos de produção e refino; um dos mais baixos do mundo;
•	 Colaborar para a autossuficiência nacional: Reverter a venda dos ativos da empresa
a privados, retomar construção de refinarias, terminar o COMPERJ. Abrir uma fá-
brica de fertilizantes (Fafen) no estado do Rio, o que ajudará também à soberania
alimentar! Ampliação da capacidade de produção para depender cada vez menos
30
da produção externa de derivados de petróleo. A retomada dos empreendimentos
permitirá recuperar emprego e renda;
•	 Pela transição energética! Ampliar o investimento em renováveis, reduzidas a nú-
meros pífios nos governos Temer e Bolsonaro. Voltar a produzir nas usinas da Pe-
trobras Biocombustível e abrir uma usina no Estado do Rio, em parceria com a
agricultura familiar! Usar sistemas solares e eólicos em plataformas de petróleo.
Retomar parques eólicos vendidos. Propor políticas de descarbonizarão das ativi-
dades e redução de danos no entorno;
•	 Defender o direito à água para toda a população, é lutar pela reestatização da
CEDAE. É preciso combater o racismo ambiental e garantir a preservação incondi-
cional da CEDAE para produção de água nas mãos do Estado assim como gestão
dos 16 municípios do Estado de RJ que não foram concessionados;
•	 Construir linha direta com as comunidades alijadas do acesso ao saneamento bá-
sico e articular comitês para denúncia, fiscalização e acompanhamento da garan-
tia desse direito;
•	 Lutar pela democratização da gestão de todas as empresas públicas, com fiscali-
zação pela população e os trabalhadores, para controle e transparência do funcio-
namento da empresa;
10. Transporte digno, moradia e direito à cidade
A vida nas cidades tem como seus pilares fundamentais a moradia e o transporte.
Enquanto a primeira proporciona segurança e conforto para o cotidiano e a reprodução
da vida familiar, o segundo possibilita o acesso ao emprego, ao lazer, à cultura, à saúde
e à educação. É a partir da conjugação desses fatores que podemos começar a falar de
um efetivo direito à cidade, entendido como o acesso a todas as potencialidades sociais,
culturais, econômicas, políticas e de serviços da vida urbana.
No estado do Rio de Janeiro, quase todos os seus 92 municípios são bastante ur-
banizados, mas morar com dignidade e se deslocar com qualidade é algo que passa
longe do cotidiano da imensa maioria da população trabalhadora. Com estruturas ur-
banas pensadas para atender às necessidades da acumulação de capital, o direito à
cidade ainda é uma miragem.
Embora as cidades possuam autonomia administrativa, o tema urbano não é de com-
petência unicamente da esfera municipal. Há numerosos serviços e aspectos que estão
sob a responsabilidade exclusiva ou compartilhada da esfera estadual, que também se
encarrega de fiscalizar alguns aspectos e deve atuar na coordenação das iniciativas em
âmbito estadual, garantindo a articulação mais eficaz das diferentes cidades.
Nos últimos quatro anos, com a gestão Wilson Witzel/Cláudio Castro, entretanto, esse
quadro apenas se agravou. Segundo dados do próprio governo estadual, o deficit habita-
cional do Rio de Janeiro é de cerca de 500 mil moradias. O programa Casa da Gente, foi
lançado por Castro em 2021 com grande pompa, sendo apresentado como “o maior pro-
31
grama habitacional da história do Rio de Janeiro”. Sua projeção inicial era de construir 50
mil unidades em todas as regiões do estado ao longo de cinco anos. Até o final desse ano
de 2022, a meta era garantir 10 mil unidades, o que ainda está longe de ser alcançado.
Enquanto busca se fortalecer eleitoralmente pela propaganda de um programa que
sequer cumpre as suas próprias metas, o governo Castro desvia recursos sistemati-
camente do Fundo Estadual de Habitação de Interesse Social (FEHIS). Apenas em seu
mandato, esse desvio já ultrapassa os 300 milhões de reais. Com dotação orçamentária
prevista em lei, o FEHIS poderia ser utilizado para acelerar o enfrentamento ao deficit
habitacional, mas suas verbas têm sido aplicadas em outras áreas sem nenhuma trans-
parência ou qualquer justificativa por parte do governo.
A moradia digna, entretanto, não se resume ao acesso à unidade habitacional. Ela
deve ser entendida como a porta de acesso a um conjunto de serviços e elementos
de infraestrutura que são fundamentais à vida urbana. Nesse sentido, cabe destacar
que o Rio de Janeiro ainda enfrenta um pesado deficit no saneamento básico, uma
vez que 35% da população do estado não tem acesso à rede de coleta de esgotos,
o que resulta em ampliação dos danos ambientais e das probabilidades de adoeci-
mento. Questões recentes como a contaminação da água da Região Metropolitana
do Rio de Janeiro por geosmina, ou problemas históricos como a poluição da Baía
de Guanabara precisam ser enfrentadas pelo estado. Uma gestão pública e eficaz
de tratamento de esgoto, distribuição de água e despoluição de rios, lagoas e baías
pode e deve ser implementada em nosso estado.
No campo do transporte, a situação também é dramática. A maior parte dos modais
sob a responsabilidade do estado opera na região metropolitana, que concentra mais
de 70% de toda a população estadual e a maior massa de deslocamentos diários. Aqui, a
regra tem sido garantir lucros exorbitantes para as concessionárias privadas que admi-
nistram os modais. Ao longo dos últimos quatro anos, as tarifas da Supervia, das barcas
e do metrô tiveram, respectivamente 19%, 26% e 51% de reajuste. No mesmo período, o
reajuste do salário mínimo estadual não chegou aos 9%.
Esse encarecimento das tarifas não foi acompanhado de nenhuma melhora signifi-
cativa na qualidade dos serviços oferecidos. Na Supervia, são comuns as interrupções
do serviço por horas. No metrô e na própria Supervia, a truculência dos seguranças
contra usuários e trabalhadores (comerciantes, artistas de rua, etc) é frequente e ab-
solutamente injustificada.
Por fim, a própria estrutura do sistema de transportes continua orientada para prio-
rizar os deslocamentos casa-trabalho-casa, uma vez que só articulam os centros às
periferias. Não há nenhuma intenção de favorecer os deslocamentos entre as diferentes
áreas periféricas, possibilitando o fortalecimento dos laços sociais entre os moradores
dessas áreas. E mesmo na articulação centro-periferia, a organização do sistema coloca
os interesses da população trabalhadora em segundo plano em relação aos interesses
dos grandes empresários. É a pressão exercida pelas empresas de ônibus, por exemplo,
que explica porque o transporte por barcas não alcançou ainda outras áreas, como São
Gonçalo, ou porque as linhas do metrô não se expandiram em direção a municípios da
32
Baixada Fluminense. Essas duas iniciativas poderiam contribuir enormemente para re-
duzir os engarrafamentos e, portanto, os tempos de deslocamento, além de favorece-
rem modais de transporte muito menos poluentes do que ônibus e carros.
O resultado dessa configuração da vida urbana é a imposição de um pesado fardo à
população trabalhadora. Muitas vezes, o acesso à habitação só é viabilizado pela au-
toconstrução – frequentemente, sem a garantia jurídica da propriedade do terreno –,
que implica o gasto de recursos, energia e tempo livre dos próprios trabalhadores para
acessarem um direito que o estado deveria garantir. E, como visto, mesmo a obtenção
de uma unidade habitacional não garante o acesso ao conjunto dos elementos compo-
nentes do direito à cidade pleno. Em paralelo, existem dezenas de milhares de imóveis
desocupados no estado, que servem apenas à especulação imobiliária. A atual organi-
zação do sistema de transportes e seu funcionamento, por sua vez, fazem com que os
deslocamentos diários consumam longas horas em condições altamente desconfortá-
veis e a preços extorsivos.
Como principais responsáveis pelo trabalho de reprodução social, as mulheres ten-
dem a enfrentar de forma mais dura as consequências desse quadro da vida urbana
no estado. Por um lado, a falta de qualidade das habitações e a escassez de serviços
e infraestrutura urbanos dificultam a realização de inúmeras tarefas domésticas e au-
mentam a probabilidade de adoecimento de membros da família que passam a requerer
cuidados mais constantes. Por outro lado, o tempo consumido nos transportes torna
mais extenuantes as duplas e triplas jornadas, reduzindo ainda mais o tempo disponível
para o lazer, o autodesenvolvimento e o convívio com a família e as/os amigas/os.
Para enfrentar esse projeto de cidade alinhado aos interesses do capital e destrutivo
para a população trabalhadora, defendemos:
•	 Aplicação integral dos recursos do Fundo Estadual de Habitação de Interesse So-
cial (FEHIS) na habitação popular;
•	 Impulsionamento de programas de regularização fundiária e urbanização em fave-
las, loteamentos, periferias, etc;
•	 Utilização de todos os mecanismos legais de garantia da função social da proprie-
dade e combate à especulação imobiliária;
•	 Construção de habitações seguras e em locais seguros, próximo ao local de tra-
balho para população moradora de área de riscos, quando da impossibilidade de
obras de contenção de encostas;
•	 Revogação das concessões dos transportes públicos: trem, barcas e metrô;
•	 Redução dovalordas passagens e melhoria da qualidade dotrem, das barcas e do metrô;
•	 Passe livre para estudantes, desempregados e aposentados no metrô, no trem e
nas barcas;
•	 Expansão das linhas do metrô e das barcas, em direção aos demais municípios da
Região Metropolitana, como São Gonçalo, São João de Meriti, Duque de Caxias, etc.

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Programa da Coletiva Feminista

  • 1. O futuro será feminista, antirracista e ecossocialista, ou não será: Programa da candidatura da Coletiva Feminista
  • 2. 2 O futuro será feminista, antirracista e ecossocialista, ou não será: introdução ao programa da candidatura da Coletiva Feminista Após a eclosão da crise capitalista de 2007-8, têm ficado cada vez mais evidentes, em escala global, os efeitos destrutivos da lógica irracional de acumulação incessan- te do capital. O preço de uma produção de capital que não cessa de aumentar – sob a forma de dinheiro, mercadoria ou meios de produção – é a precarização das condições de trabalho e de vida da população trabalhadora, a expansão da pobreza e da fome e a disseminação do ódio, da violência e da guerra. Nesse verdadeiro moedor de carne hu- mana, o alvo principal são os setores mais oprimidos. Populações negras e indígenas, LGBTQIA+ e mulheres enfrentam maior precariedade no trabalho e formas variadas de violência. No caso específico das mulheres, há ainda o peso conferido pelas duplas e triplas jornadas resultantes do trabalho de garantia da reprodução cotidiana (cuidados com a casa, com as crianças e os idosos). Como uma síntese macabra desse processo, a catástrofe ambiental coloca em risco o futuro. Não apenas um futuro específico, mas a própria possibilidade de que a humanidade venha a ter qualquer futuro. Nesse cenário, o Brasil ocupa uma posição estratégica. Por sua dimensão continental, por seu relativo desenvolvimento industrial, por sua grande população, por sua impor- tância geopolítica e pela abundante presença de importantes recursos naturais, o país poderia desempenhar papel relevante no enfrentamento à destrutividade alimentada pelo capital. Entretanto, especialmente a partir dos governos Temer e Bolsonaro, a op- ção das classes dominantes no país tem sido por reforçar a subordinação brasileira no plano internacional e lidar com a sua crise consumindo sem medida tanto os recursos naturais, quanto as vidas da população trabalhadora. A Emenda Constitucional do Teto de Gastos, aprovada durante o governo golpista e ilegítimo de Michel Temer, constitui o símbolo máximo dessa opção ao priorizar a destinação de recursos públicos à remune- ração do capital, em lugar da oferta de serviços públicos de qualidade. Esse projeto de sociedade, entretanto, tem muitas outras facetas: o avanço do desmatamento, a elimi- nação de direitos de toda ordem e a redução do espaço democrático. O estado do Rio de Janeiro, por sua vez, encontra-se no olho desse furacão. Por um lado, sua estrutura econômica foi uma das mais atingidas pelos impactos conjugados da Operação Lava-Jato e da reorientação global do capitalismo após o início de sua cri- se, que golpearam fortemente os setores da construção civil, da construção naval e do refino de petróleo. O resultado é uma situação econômico-social que possui indicadores de pobreza, desemprego, fome e violência policial particularmente dramáticos. Por ou- tro lado, o estado é o berço do bolsonarismo, força política de caráter neofascista que se alimenta do ódio e da dominação violenta – seja por meio do aparato estatal, seja atra- vés de grupos privados – sobre as/os exploradas/os e oprimidas/os. Essa posição está
  • 3. 3 solidamente representada no estado, com o governador Cláudio Castro, eleito na chapa de Wilson Witzel, cuja plataforma de campanha incluía a defesa para que policiais exe- cutassem criminosos armados. Na Assembleia Legislativa (ALERJ), a agenda do governo estadual é operada, em larga medida, pelo presidente André Ceciliano (PT), que articula dezenas de deputados neofascistas, ultraconservadores e/ou ligados aos grupos mili- cianos que dominam violentamente grande parte do território do estado. Foi a dobradinha Castro-Ceciliano que articulou tanto a privatização da CEDAE, en- tregando ao capital privado um importante patrimônio da população, quanto a adesão do Rio de Janeiro ao chamado Regime de Recuperação Fiscal, que aprofunda a lógi- ca da austeridade, dificultando os investimentos em serviços públicos. Em paralelo, o grande crescimento dos royalties obtidos a partir da exploração do petróleo no estado, que possibilitaria a realização desses investimentos, vem sendo aproveitado por Castro para barganhar apoio político das prefeituras fluminenses e pavimentar seu caminho a um novo mandato. A força social e política do bolsonarismo no Rio de Janeiro é, ainda, responsável pelo impacto desproporcionalmente elevado da pandemia de Covid-19 no estado, tando em termos de mortes, quanto no aprofundamento da crise social. No eixo Palácio Guanabara-ALERJ, portando, corrupção endêmica e fortalecimento das milícias constituem duas faces da mesma moeda. Nesse cenário, não há outra saída que não seja puxar o freio de emergência. É pre- ciso construir outra lógica de organização social, que seja pautada pela preservação das condições de vida digna no planeta em todos os âmbitos. Para estarmos à altura desse desafio, será necessário contar com o esforço consciente e articulado de todas/ os que atualmente pagam o preço da destruição capitalista – mulheres, indígenas, negro/as e todas/os as/os trabalhadoras/es. Como parte desse esforço, apresenta- mos a pré-candidatura da Coletiva Feminista à ALERJ. Afinal, se são as mulheres que carregam alguns dos fardos mais pesados, assistindo seus filhos serem assassinados pela violência estatal, sendo responsabilizadas pela reprodução familiar cotidiana em um cenário de rápida redução do poder de compra dos salários e tendo seus direitos reprodutivos atacados, foram elas também que protagonizaram grande parte das lu- tas sociais e da resistência aos ataques no país e no estado nos últimos anos. O Fora Cunha, a Primavera Feminista, o Ele Não e o Tsunami da Educação – liderado por uma categoria composta majoritariamente por trabalhadoras mulheres – já demonstraram a força contida em sua organização e mobilização. Mas, além, de feminista, a Coletiva é também antirracista e ecossocialista. Antirra- cista porque rejeita o genocídio e todas as formas de opressão e violência a que a po- pulação negra está sujeita. Defende, ao contrário, uma política de defesa e valorização da vida, que parta da auto-organização do próprio movimento negro para derrubar as estruturas racistas que organizam a vida social. Ecossocialista porque tem compromis- so com a vida e o uso sustentável e comunitário dos bens naturais. Assim, se opõe à transformação da água, da energia elétrica e dos alimentos em mercadorias e defende que os recursos dos fundos públicos sejam destinados a fomentar a produção da ener- gia solar e eólica comunitárias, o saneamento ambiental local e a produção alimentar descentralizada e orgânica para garantia da soberania alimentar da população.
  • 4. 4 A proposta de uma candidatura coletiva se inspira em outras iniciativas similares, que têm impactado significativamente a política em diferentes regiões do Brasil, como é o caso da Bancada Feminista na Câmara Municipal de São Paulo. Esse caráter coletivo subverte a lógica tradicional da representação parlamentar – pautada pelo personalis- mo e pelo carreirismo – e expressa toda a diversidade etária, racial, profissional, pessoal, etc que constitui a força das mulheres em movimento. São quatro cocandidatas com trajetórias de décadas nas mais variadas lutas das/os dominadas/os e oprimidas/os, que se propõem, precisamente, a constituir uma trincheira dessas lutas na Assembleia Legislativa. Das lutas à ALERJ e de volta às lutas. Esse é o circuito que queremos fortale- cer, sem sucumbir às pressões da institucionalidade estatal e com total independência política em relação a todos os governos, mas tampouco sem abdicar de um significativo espaço de reverberação de nossas denúncias e de divulgação de nossas ideias. Nesse esforço, sabemos que enfrentaremos a ofensiva conservadora contra as mu- lheres, que objetiva reduzir seu raio de ação social, confinando-as ao espaço doméstico e submetendo-as à autoridade patriarcal. Mas enfrentaremos, também, o feminismo liberal, que defende a ascensão de algumas no interior das estruturas do capitalismo – seja pela aceitação da lógica das grandes corporações, seja pelo “empreendedorismo” destituído de direitos – como resposta aos anseios de todas. Contrariando essa lógica, o feminismo popular que defendemos é um feminismo que entende que a dominação e a opressão atualmente exercidas sobre as mulheres são peças da engrenagem capi- talista. Afinal, tanto o trabalho de reprodução social realizado gratuitamente pelas mu- lheres, quanto a prática de remunerá-las abaixo dos homens por outros trabalhos são utilizados para rebaixar os salários de toda a classe trabalhadora. Nosso feminismo en- tende, assim, que não é possível obter a libertação de todas as mulheres sem derrubar o capitalismo e que, de maneira complementar, não é possível derrubá-lo sem enfrentar diretamente a dominação e a opressão a que as mulheres estão sujeitas. Nossa luta, portanto, é pela organização da sociedade para a liberdade e o atendimento das neces- sidades de toda a população, e não para a perpetuação da exploração e da opressão em favor dos lucros de poucos. É a luta pela construção do socialismo. Nesse programa esse será o olhar que lançaremos aos diversos pontos e problemas a serem examinados. Um olhar que compreende o peso adicional que cada um deles deposita sobre as costas das mulheres, mas parte daí para oferecer propostas e possibilidades de soluções que estão a serviço dos interesses de todas/os as/os exploradas/os e oprimidas/os. Essa posição serviu de base para um processo de construção do nosso programa em diálogo com intelectuais e ativistas das mais diversas áreas, em encontros que cha- mamos de Elabora Coletiva. Esses encontros, a vinculação das co-candidatas às lutas sociais do estado e a nossa disposição para ocupar as ruas nessas eleições fazem dessa uma verdadeira campanha-movimento, pronta para colocar mais mulheres feministas na ALERJ. Conheça nossas ideias e venha se juntar a essa construção Coletiva!
  • 5. 5 1. Orçamento público, financiamento de políticas sociais, combate à fome e garantia do emprego e renda digna Se o orçamento é público, não pode ser secreto ou via de apropriação do fundo público por interesses privados. Uma mandata Coletiva Feminista na ALERJ deve se voltar à alocação dos recursos públicos para bens comuns de interesse das maiorias, da classe trabalhadora, entendendo que o orçamento não é apenas uma peça técnica, mas que expressa, sobretudo, uma correlação de forças política e social. Longe de ser uma ficção, ele vem operando prioritariamente para os ricos e os que estão em seu en- torno. Nossa atuação na ALERJ será para reverter essa lógica! Afinal, os recursos vêm majoritariamente da renda, do salário dos(as) trabalhadores(as), por meio de uma tri- butação regressiva e injusta. A Coletiva Feminista ocupará este espaço para disputar o fundo público com essa concepção, bem como para democratizar o processo decisório sobre o ciclo orçamentário de leis que são aprovadas no parlamento estadual – o Pla- no Plurianual (PPA), a Lei de Diretrizes Orçamentárias (LDO) e a Lei Orçamentária Anual – tendo em vista saturar o processo de presença popular e decisões substantivas em favor das maiorias. Estamos falando de qual volume de recursos? Como se organiza o Orçamento do Estado do Rio de Janeiro? No ano de exercício de 2021, segundo o Portal da Transparên- cia do Rio de Janeiro (http://www.transparencia.rj.gov.br/ ), temos uma despesa total do orçamento de R$ 89,5 bilhões: cerca de R$ 50,1 no Orçamento Fiscal, R$ 34,2 bilhões no Orçamento da Seguridade Social, e R$ 5,1 bilhões em refinanciamento da dívida. A recei- ta do estado do Rio de Janeiro foi de R$ 69,2 bilhões o que implicou numa previsão de déficit de cerca de R$ 20 bilhões, coberto com créditos suplementares aprovados pela ALERJ. A Prestação de Contas do governo Castro explica que houve a alocação de crédi- tos suplementares em função de um aumento na receita, bem como do aumento do que chamam de participações especiais: os royalties e outras receitas. Isso pode explicar, em parte, as diferenças imensas entre as Despesas Autorizadas na LOA e as que foram efetivamente pagas em 2021, muito maiores. Sobre os royalties, eles são a segunda maior fonte de receita – 15,62% - depois do ICMS – 45,3%. Os recursos de participação especial foram alocados no RioPrevidência, no pagamento da dívida com a União (Regime de Recuperação Fiscal), transferências aos municípios e outros gastos como o PASEP, em 2021. Este perfil de alocação dos recursos públicos indica que os royalties estão sendo alocados fora de sua concepção original, de recursos de investimento. Por lei estadual há autorização para isso no Estado do Rio de Janeiro, mas revela uma espécie de desvio de função dos royalties, ainda que legal. Ou- tro aspecto aqui é que o Rio de Janeiro é responsável por 80,6% da produção petrolífera. Assim, é preciso observar se o pacto federativo está sendo justo com o Estado do Rio de Janeiro e se, internamente, os recursos estão sendo repartidos entre os municípios para investimentos. Tudo indica que não há vista o dito anteriormente. A Coletiva Feminista se propõe a colocar essa alocação dos royalties em questão! Vejamos agora as primeiras seis funções do orçamento do Estado do Rio de Janeiro em volume de recursos pagos e autorizados em 2021:
  • 6. 6 Tabela 1 – Orçamento do Estado do Rio de Janeiro 2021 – Funções Funções Pago (R$ Bilhões) Autorizado (R$ Bilhões) Previdência Social 24,1 992 mi Segurança Pública 10,3 1,03 Saúde 8,3 549 mi Educação 7,3 1,5 Encargos Especiais 6,1 35 mi Transportes 1,0 348 mi Fonte: Portal da Transparência do Governo do Estado do Rio de Janeiro – acesso em 18 de agosto de 2022 Saltam aos olhos alguns elementos: a distância abissal entre o Autorizado e o Pago; o peso da segurança pública maior que em educação e saúde; a insignificância da fun- ção assistência social, o que pode nos dizer que o governo do Estado não tem cumprido suas funções no âmbito do SUAS em termos de volume de recursos para os municípios; a importância dos Encargos Especiais onde estão os juros, encargos e amortizações da dívida do Rio; o volume gigantesco de recursos alocados no RioPrevidência, o que corresponde ao que revelou a CPI da Previdência na ALERJ, já que houve aplicações de risco e criminosas dos recursos das aposentadorias de trabalhadores públicos, abrindo um “rombo” administrativo. Também é evidente a face penal e punitiva do Estado que cresceu dez vezes em relação ao autorizado, o que é coerente com as operações poli- ciais letais no Rio de Janeiro. Enquanto o orçamento é apropriado dessa maneira pela por setores empresariais, pela agenda conservadora e pelos parlamentares alinhados ao governo Castro, a popu- lação trabalhadora do Rio de Janeiro enfrenta uma profunda crise social. No primeiro trimestre de 2022, os desempregados no estado eram mais de 1,3 milhão, correspon- dendo ao terceiro maior índice do país (14,9%). Como consequência dessa situação, 22% da população encontrava-se em situação de pobreza, quadro que era ainda mais na Bai- xada Fluminense, alcançando 33% dos habitantes. Já a insegurança alimentar atingia, em algum grau, 60% do total da população do Rio de Janeiro. A partir dessa análise, apresentamos as seguintes proposições: • Lutar na ALERJ para desbloquear o orçamento público do Rio de Janeiro pelos cons- trangimentos do ajuste fiscal brasileiro e sua tradução no Estado: o Regime de Re- cuperação Fiscal e o teto de gastos. E, mais recentemente, o corte de recursos do ICMS fragilizando as políticas públicas e sociais no Estado para os objetivos eleito- reiros federais e estaduais. Nesse sentido, é preciso estudar medidas para baixar os custos dos combustíveis, o que afeta milhões de trabalhadores e o preço dos ali- mentos e transportes, mas não ao custo da saúde e educação. Essas medidas vêm significando a paralisia de políticas públicas centrais e a drenagem de recursos de
  • 7. 7 forma opaca, a exemplo do que revelou a CPI da Previdência, quando identificou a aplicação de recursos da previdência social do funcionalismo em um paraíso fiscal. • Construir propostas de priorização no orçamento público de políticas sociais que incidam na reprodução social da classe trabalhadora em geral e das mulheres, em especial, destacadamente educação, saúde e assistência social. Nesta última, o Estado vem se abstendo de suas funções e possibilidades previstas no Sistema Único de Assistência Social. Outro aspecto aqui é a recomposição salarial de traba- lhadores do serviço público, que vem sendo duramente atingidos pelo Regime de Recuperação Fiscal. • Elaborar propostas de alocação de significativos recursos para políticas de em- prego e renda dignos, como as frentes de obras em equipamentos públicos e infraestrutura urbana (escolas, postos de saúde, saneamento básico, etc), a va- lorização do salário-mínimo estadual e o estabelecimento de um programa per- manente de renda mínima que efetivamente supere a precariedade do Supera Rio de Cláudio Castro. • Combater as tendências que vem operando de alocar recursos públicos em parce- rias público-privadas em várias esferas, a exemplo de instituições típicas da con- trarreforma do Estado, como organizações sociais na saúde, comunidades terapêu- ticas, e na assistência social - muitas delas rompendo com o princípio republicano da laicidade do Estado -, e que se constituem em verdadeiras gambiarras de recur- sos públicos ao invés de prestação de serviços com maior qualidade. • Fortalecer a alocação de recursos públicos numa perspectiva antirracista, fe- minista e ecossocialista, eixos que devem transversalizar a formulação do orça- mento público, dando incentivos às instituições e políticas públicas que asse- gurem esses princípios. • A Mandata Coletiva Feminista pretende dinamizar um Fórum Popular de Orçamen- to Público no Estado Rio de Janeiro, a exemplo de iniciativas municipais e nacionais que já houve, fortalecendo a organização política dos movimentos sociais e sindical para o controle democrático do orçamento público. Este espaço articulará fóruns setoriais que já existem, e tem o objetivo central de pressionar a ALERJ para a alo- cação de recursos nas políticas sociais de educação, saúde e assistência social, nas universidades públicas, em ciência e tecnologia, saneamento, habitação, etc. • Nessa perspectiva, a mandata se articulará com universidades públicas do Rio de Janeiro e movimentos sociais e sindicais, tendo em vista a viabilização de espaços de formação para a apropriação por estes últimos dos temas que en- volvem o orçamento público.
  • 8. 8 • A Coletiva Feminista fará a divulgação sistemática de dados orçamentários para os fóruns, movimentos sociais e sindical, para que possam formular suas pautas. E trabalhará para que a ALERJ e a cidadania no Estado do Rio de Janeiro possuam um instrumento de monitoramento do Orçamento mais eficiente que o atual Portal da Transparência do Governo do Estado, marcado pela lentidão e por uma disponibili- zação das informações que não facilita o acesso leigo. • Nossa mandata estará voltada à alocação de recursos públicos no setor público. Nesse sentido, somos contra as emendas parlamentares tradicionais ou “de relator”, que vêm sendo chamadas de ‘orçamento secreto’ no nível federal. O parlamento deve alterar, recompor o orçamento, propor leis. Não deve ter recursos “carimbados” aos parlamentares que instauram uma dinâmica promíscua, quando não corrupta, entre o Executivo e o Legislativo. Os recursos devem ir para as funções públicas a que se destinam diretamente, sem intermediários, sejam os parlamentares, sejam as tais parcerias-público-privadas em voga. Nesse passo, somos também contra o “orçamento impositivo” para emendas parlamentares, uma verdadeira distorção do orçamento público. Defendemos orçamento impositivo – que obriga o executivo a gastar – nas políticas sociais e públicas de interesse das maiorias! • Lutaremos para que as renúncias fiscais/gastos tributários sejam seriamente dis- cutidos e revistos no Estado do Rio de Janeiro. Esse mecanismo vem constituindo grande perda de recursos públicos para o favorecimento de segmentos empresa- riais próximos do projeto do governo de plantão. Uma mandata de esquerda deve trabalhar para conter ou denunciar esses mecanismos de apropriação privada do fundo público. • Do ponto de vista tributário, faz-se necessário debater no Rio de Janeiro uma ver- dadeira reforma nacional, pois essa matéria é federal. A reforma tributária de ser orientada pelo princípio da progressividade (a exemplo do imposto sobre grandes fortunas), que atinja os altos rendimentos e a grande propriedade, tendo em vista financiar as políticas públicas efetivamente relevantes. O âmbito tributário tem uma relação forte com o pacto federativo. Devemos colocar em questão se os re- cursos que o Rio de Janeiro gera, retornam de forma suficiente para nosso estado, a exemplo dos royalties, mas sempre pensando de forma solidária com o país. Estudo divulgado pela ASDUERJ, preocupada com o orçamento da UERJ e da educação, mostra que apenas cerca de 10% dos recursos do Estado do Rio de Janeiro retor- nam para o estado: “Em 2021 o Rio de Janeiro arrecadou, em receitas federais para União cerca de R$ 359 bilhões. E recebeu no mesmo período pouco mais de R$ 26 bilhões ou 7,28% da Receita Federal Arrecadada.” • Num estado do Rio de Janeiro que já levou à prisão quatro governadores e des- tituiu o mandato do último, o tema do orçamento e do fechamento dos dutos de improbidade e corrupção não é uma questão menor. Isso reforça a perspectiva de
  • 9. 9 controle democrático, já pontada antes, bem como de certa vigilância parlamentar, o que ademais é uma função precípua da ALERJ, que aprova a prestação de contas do executivo, após análise do Tribunal de Contas do Estado (TCE). Nesse sentido, a mandata se propõe a mobilizar todos os recursos possíveis para assegurar dinheiro público para o público. Seja junto as bancadas de esquerda e/ou na ALERJ como um todo, trabalharemos pela instauração de CPIs quando necessário, e pela difusão de seus resultados e responsabilização dos envolvidos. • Nosso estado tem uma forte presença da indústria de óleo e gás, especialmente da Petrobras. Nossa mandata estará de olho na aplicação dos royalties do petróleo em efetivos investimentos. Esse recurso visa compensar os impactos ambientais e sociais da indústria petrolífera e se caracteriza pela obrigação de investimentos. A nosso ver, deveriam voltar-se a um grande programa de obras públicas, destaca- damente de saneamento básico, educação e saúde, fortalecendo essas políticas e gerando emprego e renda tão necessários neste país e estado marcado pela fome e o desemprego. Basta de enfeitar vias públicas onde vivem as altas rendas! • Para além do controle democrático, sugerimos pensar num orçamento participati- vo no Estado do Rio de Janeiro, superando os limites das experiências conhecidas, que disponibilizavam percentuais ínfimos e apenas de investimento para as deci- sões de assembleias comunitárias. Nossa mandata propõe pensar outras formas que disponibilizem o conjunto do orçamento ao crivo popular por meio de assem- bleias públicas comunitárias, setoriais e interlocução com os conselhos de políti- cas públicas ainda existentes ou a serem retomados após esses anos destrutivos. • Propomos uma auditoria da dívida pública do Estado do Rio de Janeiro, que explodiu entre 1999 e 2019, passando de um estoque de 15,2 bilhões para 90,7 bilhões, o que implica juros, encargos e amortizações escorchantes. Os resultados das CPIs da Dívida e da Previdência precisam ser considerados e as responsabilidades cobra- das, fechando a gambiarra de recursos para os credores (destacadamente a União) e para os gastos administrativos irresponsáveis no RioPrevidência. • Valorização, através de um piso salarial, das atividades socialmente atribuídas às mulheres no mercado de trabalho, pois afinal são as atividades relacionados aos cuidados. Dentre elas, destaca-se a do serviço doméstico, majoritariamente de- sempenhado por mulheres negras. Destacamos também as profissionais de edu- cação, saúde, comércio, serviço social e alojamento. 2. Chega de violência policial! A juventude negra quer viver De acordo com o Censo do IBGE de 2010, o estado do Rio de Janeiro possui 12,4% de pessoas autodeclaradas pretas, estando apenas atrás da Bahia, com 17,1%. Somando-se os 39,3% de autodeclaradas pardos, temos que 51,7% da população total do estado é composta por negras/os. Tal como em todo o Brasil, o cotidiano da população negra flu-
  • 10. 10 minense é inteiramente atravessado pelo racismo estrutural. Mais do que uma herança do período colonial e dos mais de três séculos de escravidão, esse racismo é reafirmado e reproduzido até hoje. Seu peso é sentido em todos os aspectos e momentos das vidas das pessoas ne- gras. Desde a educação que invisibiliza e deprecia a cultura e as pessoas negras, até o mercado de trabalho que reserva os empregos mais precários e mal pagos para negras/ os. Desde a precariedade habitacional que compromete uma série de direitos, como o acesso ao saneamento básico, até a discriminação aberta em locais de trabalho, lazer e órgãos do próprio poder público. Entretanto, especialmente no Rio de Janeiro, o seu impacto mais visível é na definição da política de Segurança Pública. Há décadas, a chamada política de guerra às drogas tem servido para justificar ações policiais violentas que atentam contra todos os direitos das/os moradoras/es das favelas e periferias, majoritariamente negras/os. As denúncias de invasões de domicílios, roubos de pertences, esculachos e humilhações por policiais se acumulam sem consequências efetivas para os agentes denunciados. Sem dúvida, a face mais cruel desse processo é o verdadeiro genocídio da juventude negra e periférica produzido pelas polícias. Apenas no ano de 2020, as ações policiais no estado resultaram em 1.245 mortes, sendo 86% de pessoas negras. Já em 2021, as polícias foram responsáveis por 35% das mortes da região metropolitana, ultrapassan- do em muito a média nacional de 12,9%. Diante desses dados, os pesquisadores Daniel Hirata, Carolina Grillo, Diogo Lyra e Renato Dirk apontam, com razão, a existência de um fenômeno de “estatização das mortes”. Esse genocídio é completado por uma política de encarceramento igualmente violenta. Segundo dados de 2021, o estado do Rio de Janeiro tem a segunda maior população carcerária do país, com uma superlotação do sistema que chegava a 56% da sua capacidade. Do total de detentas/os, 43% (o quinto maior percentual do Brasil) eram presos provisórios, ou seja, não haviam sequer sido jul- gados ainda. Cabe destacar que, em âmbito nacional, mais de 2/3 das/os presas/os são negros e que as mulheres têm tido uma série de direitos específicos sistematicamente negados pelo sistema prisional. Os governos de Wilson Witzel e Cláudio Castro se destacaram por aprofundarem essa lógica genocida que já caracterizava as polícias do Rio de Janeiro. Eleito na onda neo- fascista bolsonarista que varreu as eleições de 2018, Witzel fez das execuções policiais a base de sua política de segurança pública, defendendo que os agentes “mirassem na cabecinha”. Já Cláudio Castro, por sua vez, foi o governador responsável por enfrentar e desrespeitar a ADPF 635 do Supremo Tribunal Federal, que proibiu o uso de helicóp- teros blindados (os caveirões aéreos) como plataforma de tiros em operações policiais e também as operações em perímetros escolares e hospitalares e a utilização desses equipamentos como base operacional das polícias civil e militar, além de determinar a preservação dos vestígios das cenas de crimes praticados por policiais e a proibição da remoção indevida de corpo sob o pretexto de oferecer socorro médico. Com a aproximação das eleições de 2022, Castro tem apostado ainda mais no reforço da letalidade policial como forma de produzir uma imagem de dureza no combate à crimi-
  • 11. 11 nalidade que se reverta em votos. Com isso, nos últimos 14 meses foram registradas três das quatro maiores chacinas policiais na história do estado. Em maio de 2021, uma ação no Jacarezinho deixou 28 mortos. Já em maio de 2022, foram 25 mortos em operação na Vila Cruzeiro. E, por fim, em julho, foram registradas 17 mortes no Complexo do Alemão. Os vitimados por esse genocídio têm um perfil predominante bastante definido: são jovens e negros. Em 2020, por exemplo, entre os mortos em ações policiais, 75% eram negros (um índice muito acima dos 51,7% de negros na população estadual) e 68% ti- nham menos de 25 anos. Terminando de roubar o futuro dos jovens assassinados, o genocídio também lança um fardo extra sobre as suas mães, quase sempre, mulheres negras. Muitas vezes já inteiramente responsáveis pela criação dos filhos, como mães solo, empurradas para empregos precários e enfrentando jornadas duplas ou triplas, passam também a viver a dor da perda e a luta por justiça. Em meio a esse quadro, defensores do genocídio da população jovem, negra e favela- da têm se articulado na Assembleia Legislativa do Estado do Rio de Janeiro (ALERJ) para apresentarem pedidos de anistia a policiais civis, militares e penais, além de bombeiros, envolvidos em mortes em serviço. Trata-se de um esforço para aumentar a impunidade desfrutada pelos agentes da segurança pública no estado e aprofundar a institucionali- zação da política genocida, desobedecendo preceitos constitucionais. Da mesma forma, é na Alerj que se busca aprovar iniciativas como as autonomias das polícias – que con- tribuem para a perpetuação da impunidade – e o aumento do orçamento da Segurança Pública, sem avaliação ou debate sobre prioridades. Este aumento no orçamento acon- tece em detrimento do investimento em saúde e educação, ou ainda através da retirada de verbas de outras pastas, como se tentou fazer com a Cultura com o Projeto de Lei nº 45/2019, que destinaria 10% do total arrecadado em bilheteria de eventos esportivos e culturais para as polícias. Além disso, o aumento no orçamento da Segurança é canalizado na maioria das vezes para a compra de armamentos e o investimento em políticas que já nascem extremamente problemáticas, como o projeto “Cidade Integrada”, de Castro. Por fim, não é possível dissociar esse quadro de avanço das práticas genocidas de ou- tros aspectos da política de segurança pública nacional e estadual, sempre respaldados por clamores conservadores por maior endurecimento da ação policial e punitiva. Assim, em um do país que já conta com uma das maiores populações carcerárias do mundo, vemos se avolumar a pressão por redução da maioridade penal. Ao mesmo tempo, as ini- ciativas de reestruturação das carreiras policiais representam, na verdade, uma ampliação da lógica militarizada e miliciana das forças de segurança pública. Essa lógica amplia os poderes das polícias estaduais atribuindo a elas ações de fiscalização de eventos e con- trole de armas, ao mesmo tempo em que enfraquece as instâncias de controle, como as corregedorias. Dessa forma, contribuem, ainda, para a disseminação do medo que alimen- ta o mercado de segurança privada, que é dominado pelos próprios policiais. Para enfrentar esse cenário, a Coletiva Feminista se coloca ao lado dos movimen- tos de favelas, de mães de vítimas da violência policial e de defesa dos direitos hu- manos, defendendo:
  • 12. 12 • Por uma concepção ampla de segurança pública: espaços públicos ocupados com arte, cultura e trabalho, iluminação de qualidade e transporte público integrado, eficiente e funcionando 24h; • Direcionamento do poder público estadual para o tratamento da questão das dro- gas como tema de saúde pública e fortalecimento das lutas pela descriminalização do consumo de drogas – inclusive, com a publicação de cartilhas sobre políticas de redução de danos; • Luta, em articulação com movimentos sociais, pelo desencarceramento. As práti- cas de tortura e morte da população negra também acontecem em locais de priva- ção ou restrição de liberdade; • Combate à expansão dos poderes policiais em ações de controle de armas, fiscali- zação de eventos, que apontam para uma legalização do viés miliciano da categoria; • Exigência de saída das Forças Armadas e das polícias Militar, Civil e Rodoviária Fe- deral das favelas, junto com seus equipamentos bélicos; • Cobrança de ações efetivas de fiscalização pelo Ministério Público, na esteira da elaboração de um Plano Estadual de Diminuição da Letalidade Policial – conforme determinação do STF –, que inclua medidas de controle sobre as operações poli- ciais em favelas e periferias; • Fim da polícia militar, incluindo o fim do desvio do orçamento público da saúde, educação e cultura para as polícias e o combate a todas as medidas que reforcem a lógica militarizada e miliciana das polícias, que é voltada para o combate à própria população em detrimento do fortalecimento das ações investigativas e de inteli- gência que combatam realmente o crime organizado; 3. Pela socialização do trabalho doméstico e de cuidado e o combate à violência contra a mulher Há uma naturalização social de que as mulheres sejam responsáveis pelas tarefas domésticas da casa e de cuidado com os mais novos, os mais velhos, e demais mem- bros da família. Aquilo que chamamos de reprodução social da vida é tudo o que envolve processos cotidianos para garantir que homens e mulheres possam sair de suas casas pra trabalhar todos os dias, também garantir a sobrevivência o cotidiano da vida de um núcleo familiar, desde os bebês, crianças, idosos e deficientes físicos. Outra dimensão disso é a reprodução geracional, a própria concepção, gestação, parto, amamentação e primeiros cuidados da vida de um bebê. Apesar de apenas a reprodução biológica dife- renciar homens e mulheres (e homens trans sem cirurgia de transição de gênero), toda a gama de tarefas de cuidado e trabalho doméstico recaem sobre as mulheres. Particular- mente as mulheres negras, além de serem responsabilizadas por tais trabalhos em suas
  • 13. 13 casas e, muitas vezes, serem mães solo chefes de família, há uma grande concentração de mulheres negras trabalhando como empregadas domésticas em casas de famílias brancas e em trabalhos vinculados à reprodução social como cuidadoras de idosos, téc- nicas de enfermagem, enfermeiras, assistentes sociais, professoras de educação infan- til, etc. São vítimas das jornadas duplas, triplas ou até mesmo das jornadas contínuas, com cada vez menos fronteiras entre trabalho remunerado e trabalho reprodutivo. A pandemia visibilizou ainda mais essa desigualdade de gênero e raça que se repro- duze no espaço doméstico. Enquanto as famílias forem o centro principal das tarefas de cuidados, a sobrecarga sobre a mulher trabalhadora, negra, e inclusive as meninas, sempre será muito superior. Este trabalho realizado no âmbito familiar é absolutamente invisibilizado, não reconhecido, desvalorizado e não-remunerado. Enquanto não enfren- tarmos isso como um problema social, a mulher acaba por ter seu tempo drasticamente reduzido, impactando suas possibilidades de educação, emprego, renda e afetando di- retamente sua saúde física e mental. Para superar essa situação que estrutura de forma profunda a opressão e a sobrecarga de trabalho das mulheres, é preciso que o Estado se responsabilize através de um Sistema Estadual de Cuidado. Além disso, é preciso que a violência doméstica contra as mulheres não seja seja tratada como um problema social. Junto com isso, que seja compreendido que toda a gama de violências reprodutivas e sexuais, desde o assédio, estupro, até a violência obs- tétrica, a falta de condições para acompanhamento pré-natal, acesso à contracepção, planejamento familiar, atendimento ginecológico, devem ser prioridades em nosso SUS e políticas públicas. A justiça reprodutiva, conceito criado pelo movimento de mulheres negras, amplia o debate sobre os direitos sexuais e reprodutivos já que traz a justiça social e os direitos humanos para o centro do debate. Não separa as condições sociais objetivas da situação específica da mulher para ter acesso e garantias para realizar es- colhas e ter controle sobre o seu sistema reprodutivo e sua saúde. Inclusive, sobre a sua capacidade de decidir ou não ter filhos, e o próprio direito de exercer à maternidade. Reconhecemos, ainda, que a capacidade de ter garantido direitos sexuais e reprodutivos passa pelo respeito à infância, e a garantia que nas escolas haja educação sexual para que meninas e meninos possam reconhecer processos de assédio sexual e a introdução na vida sexual de forma consciente, sabendo se proteger e utilizar contraceptivos para a sua segurança. E que crianças LGBTI+ possam compreender sua orientação sexual e identidade de gênero com acolhimento de profissionais. • Pela criação do Sistema Estadual de Cuidado, que englobe em uma única rede a criação, em todos os bairros, de Restaurantes Públicos com mercados populares com alimentos orgânicos, distribuição de cesta básica e vinculação a hortas co- munitárias, agroecologia e agricultura familiar. Além de Lavanderias Populares, bi- bliotecas e espaços de recreação infantil, centros de acolhimento para idosos com atividades de saúde, lazer e cultura;
  • 14. 14 • Enfrentamento a toda forma de violência contra a mulher, com a garantia da prote- ção e acolhimento, além do encaminhamento aos serviços de atendimento psicos- social, jurídico, garantia de renda estadual básica, cuidados de saúde e moradia ade- quada. Campanhas de prevenção ao feminicídio, controle de acesso a armas, novas unidades de Delegacia de Atendimento à Mulher (DEAM) com equipes multidiscipli- nares e garantia de policiais mulheres, integrada à rede estadual de atendimento; • Educação sexual para decidir, contraceptivos para não engravidar e aborto legal para não morrer! Fiscalização e pressão sob a rede pública de hospitais para garantir o acesso das mulheres ao aborto legal nos casos previstos em lei. Ampliação da licença parental compartilhada de pelo menos 1 ano e universalização do acesso a creche; • Fortalecer a proposta da Agenda Marielle Franco 2022 de criação de um Obser- vatório Estadual da Violência Doméstica, de Gênero e Feminicídio e de um Fundo Estadual de Prevenção e Combate ao Feminicídio; 4. Defesa do SUS gratuito e universal O momento mais dramático da pandemia de Covid-19 evidenciou a importância do Sistema Único de Saúde nas vidas de todas/os. Foram as/os trabalhadoras/es do SUS que estiveram na linha de frente no tratamento das/os infectadas/os e, também, tem sido as/os responsáveis pela vacinação da população. O SUS é fruto de lutas históricas das/os trabalhadoras/es brasileiras/os, que garantiram sua inscrição na Constituição de 1988. Em abrangência territorial, alcance populacional e variedade dos tratamentos ofe- recidos, é um sistema que praticamente não possui paralelos no planeta. Nesse sistema, o âmbito estadual é responsável pelo atendimento de nível médio de complexidade, como os exames laboratoriais e investigativos. Apesar disso, ao longo das últimas décadas, o SUS tem sido alvo de pesados ataques das classes dominantes e seus representantes políticos, que objetivavam se apropriar privadamente de recursos que deveriam servir à população e, especialmente, à classe trabalhadora. Esses ataques se apresentam, em grande medida, pela combinação de sub- financiamento e privatização. Nesse sentido, a contínua redução de recursos do SUS (mui- tas vezes, destinando valores abaixo dos mínimos constitucionalmente determinados) di- ficulta o bom funcionamento das unidades de saúde – pela ausência de infraestrutura, escassez de servidores, falta de insumos, etc –, abrindo as portas para o falacioso discurso da “ineficiência” do serviço público, que, por sua vez, busca legitimar a privatização. No caso específico da saúde, o modelo prioritário de privatização no estado do Rio de Janeiro ao longo das últimas décadas foi o das chamadas organizações sociais (OS), que assumem a gestão direta de unidades com financiamento público. Entre 2007 e 2020, en- tretanto, as fraudes na Secretaria de Saúde do estado, quase sempre vinculadas à atua- ção das OS, resultou no desvio de 1,8 bilhões de reais. Indo além, são constantes os relatos de assédio moral, desrespeito a direitos trabalhistas e imposição de jornadas extenuantes aos trabalhadores contratados pelas OS (que não são servidores públicos estáveis).
  • 15. 15 As principais consequências desse necessário são a crescente degradação do atendi- mento oferecido pelo Estado à classe trabalhadora e o crescimento dos planos de saúde privados. Somados a esses obstáculos econômicos mais gerais, mulheres, negras/os e população LGBTI+ enfrentam, ainda, os efeitos das opressões historicamente existentes na sociedade brasileira, que têm sido impulsionadas pelo avanço de ideologias conser- vadoras nos últimos anos. Assim, são alvos do preconceito, da desinformação e da vio- lência racial e de gênero, que se expressam pela violência obstétrica, pela dificuldade no acesso ao aborto legal, pela estigmatização e associação a determinadas doenças, etc. Para alterar esse quadro, a Coletiva Feminista propõe: • Maior investimento em estrutura e equipamentos, com abertura de concursos pú- blicos para novos profissionais, levando em conta demandas acumuladas pela pan- demia. Respeito e melhoria dos planos de cargos e salários dos trabalhadores da saúde pública; • Fim das Organizações Sociais e da privatização/terceirização na saúde, com defesa dos direitos trabalhistas das/os terceirizados; • Realização de um mapeamento estadual das unidades de saúde, priorizando a abertura de novas unidades em regiões com maior carência; • Qualificação profissional dos trabalhadores dos serviços com formação continuada sobre racismo, discriminação sexual e de gênero; • Valorização da rede obstétrica com implementação de atendimento pré e neonatal integral e acompanhamento puerperal, com: (i) preparação para o parto humaniza- do pelo SUS, (ii) ampliação de concursos públicos para profissionais e novas unida- des de casas de parto. (iii) processo de acompanhamento continuado, por equipe multidisciplinar do SUS, com foco no cuidado clínico, nutricional e psicológico da pessoa gestante, em puerpério e da criança; • Programa de qualificação profissional para eliminação da violência obstétrica e da mortalidade materna que atinge prioritariamente as mulheres negras, com plano de atenção diferenciada de pré e neonatal; • Plano de incentivo ao aleitamento materno e fortalecimento da rede de Banco de Leite Humano; • Divulgação da legislação que permite o aborto no Brasil (nos casos de estupro, risco de vida da mulher e anencefalia) nas unidades de saúde, junto à lista da rede pública apta a realização de tal procedimento. Atendimento para o aborto legal em toda a rede pública e até a 12º semana de gestação, combinado com programa de atenção humanizada em toda rede de assistência obstétrica, com elaboração de um protocolo municipal que qualifique essa atenção. Serviços de acompanhamen- to psicológico a mulheres que realizarem aborto;
  • 16. 16 • Garantia de transparência no sistema de agendamentos e alocação de prioridades nas consultas e intervenções do SUS; • Investimento e valorização dos profissionais na Rede de Atenção à Saúde Mental, nos Centros de Atendimento Psicossocial, nos Serviços Residenciais Terapêuticos e nas unidades de acolhimento, em defesa da reforma psiquiátrica e da luta anti- manicomial. Combate às comunidades terapêuticas e aos convênios com organi- zações sociais na Rede de Atenção à Saúde Mental; • Programa de planejamento reprodutivo ligado ao Programa Saúde da Família; • Programa de prevenção, com campanha permanente de informação, de infecções sexualmente transmissíveis (IST); • Distribuição de absorventes em todas as unidades de saúde, escolas municipais e equipamentos de assistência social; • Políticas que atendam às especificidades da população negra, com processos de formação dos trabalhadores da saúde, e inclusão do fator raça na política nacional de humanização da atenção e gestão do SUS. Fortalecimento da participação dos movimentos negros nos conselhos e espaços de controle social de saúde; 5. Propostas para a educação no Estado do Rio de Janeiro: A educação para todas, todos e todes! Após mais de dois anos de pandemia da Covid-19, a educação é, sem dúvida, um dos setores da vida mais prejudicados práticas sociais, com resultados devasta- dores. O fechamento das escolas, o ensino remoto, e o retorno parcial e híbrido revelou à sociedade fluminense aquilo que a/os educadora/es já sabiam. As con- dições objetivas de estudo e de trabalho no âmbito escolar, que já eram insufi- cientes, com a pandemia, tornaram inexequíveis as práticas pedagógicas, com um mínimo de qualidade, para a maioria da classe trabalhadora e de suas/seus filha/ os. Estudantes em insegurança alimentar e sem acesso ao ensino (remoto). O ple- no retorno às atividades presenciais, que se deu efetivamente neste ano de 2022, serviu para esgarçar ainda mais os problemas estruturais e subjetivos acumulados durante a pandemia. Desta feita, o agravamento da questão social tem levado ao abandono dos estudos e à diminuição da qualidade da aprendizagem daqueles que conseguiram permanecer na escola, assolados por todo tipo de dificuldades. Enfim, a catástrofe social abateu-se também sobre a educação, deixando marcas que se prolongarão por muito tempo A questão educacional se apresenta cada vez mais como espaço de debates de con- cepções e práticas, onde se disputam perspectivas de país, de mundo, de sociedade e, portanto, de pessoa humana. Assim, é tarefa da classe trabalhadora combater as pro- postas oriundas da classe dominante e, mais ainda, sistematizar e consolidar suas pró-
  • 17. 17 prias posições. Este texto visa levar ao debate político nove proposições para a cons- trução de uma política educacional para o estado do Rio de Janeiro, não perdendo de vista a situação da educação no País. O projeto político-pedagógico dominante, de caráter neoliberal e agora conservador, vem mantendo a quase totalidade das e dos profissionais da educação, assim como estu- dantes e seus familiares excluída do processo de elaboração da política educacional, em nível nacional, estadual, municipal e local. Por sua natureza, esse projeto só pode entregar uma educação mínima e carregada de deficiências na formação da pessoa humana. Além disso, as condições objetivas de trabalho e estudo, também fruto da política dominante, limitam brutalmente o planejamento e a implementação de ações peda- gógicas à altura das necessidades da classe trabalhadora, de suas filhas e seus filhos. São condições que normalizam a falta de materiais, a excessiva carga horária das/os profissionais da educação, e mais uma série de carências que prejudicam o cotidiano do trabalho escolar. A construção de políticas educacionais, em suas diversas dimensões, notadamente nos aspectos propriamente pedagógicos do debate, é de tão grave relevância que é preciso estar a encargo daqueles que são seus sujeitos – profissionais da educação e comunidade escolar, apoiadas/os em sua experiência e nos saberes sistematicamente acumulados. A necessidade sermos os verdadeiros sujeitos da tarefa educacional se torna ainda mais premente quando nos deparamos com os ataques antidemocráticos à escola e às/ aos trabalhadoras/es da educação. Por um lado, o Movimento Escola Sem Partido, apesar de ter anunciado o fim de suas atividades, deixou um legado nefasto de desconfiança e perseguição à autonomia docente, que hoje se mantém vivo através de parlamentares, prefeitos e governadores eleitos na esteira do neofascismo. Por outro lado, a difusão das escolas cívico-militares ressalta a aliança entre conservadores e neoliberais, que pre- cisam sufocar as vozes dissonantes no espaço escolar para poderem avançar com seu projeto reacionário e tecnicista, que subordina simultaneamente a formação humana à determinada moral religiosa e às demandas do deus-mercado. Em defesa da educação pública no estado do Rio de Janeiro, lutaremos na ALERJ, ao lado das comunidades escolares e universitárias por: • Verba pública somente para a escola pública! Cumprimento imediato do precei- to constitucional de 25% do orçamento público estadual para a educação; • Universalização da Educação Básica! Nenhuma criança ou adolescente fora da escola. Garantia imediata de Educação Infantil pública e gratuita, em creches e pré-escolas, para todas as crianças de até 5 anos de idade; • Ampliação da jornada escolar. Construção de escolas para ampliar progressiva- mente o tempo de permanência d@s alun@s. Garantia de condições para o desen- volvimento de atividades escolares de dia inteiro; • Ampliação das vagas nas universidades estaduais e nas escolas técnico-pro- fissionais! Defesa das políticas sociais e de cotas para o acesso. Garantia de per-
  • 18. 18 manência até a conclusão do curso. Incorporação da rede da FAETEC à secretaria estadual de educação; • Ampliação e melhoria da infraestrutura educacional! Construção e reforma dos prédios escolares e dos campi universitários, dotando-os de toda a infraestrutura necessária, inclusive internet, quadras poliesportivas, bibliotecas, laboratórios; • Mais profissionais para a educação! Contratação imediata de profissionais da educação para o quadro permanente, via concurso público, em todos os níveis e modalidades de ensino; • Dignidade para quem educa! Estabelecimento do piso estadual do magistério em 5 salários mínimos e das e dos demais profissionais da educação em 3 salários mínimos, apoiando os mesmos valores para o piso nacional; • Democratização radical da educação. Eleições diretas já para todos os diri- gentes educacionais em todos os níveis – da direção escolar à secretaria es- tadual de educação! Implementação de efetiva gestão democrática da educação pública; • Criação de Círculos de Cultura que transformem as escolas em polos culturais abertas a todos; • Educação para todas, todos e todes! Educação laica e civil. Combate a todas as formas de racismo, opressão, sexismo, LGBTI+fobia, etarismo, capacitismo, milita- rização e censura nas escolas e universidades. Por uma educação inclusiva, plural, emancipadora e calcada no respeito às diferenças; • Programas obrigatórios de formação inicial e continuada de professores/as em torno das leis 10.639, 11.645 e 12.288, estabelecendo parcerias com universidades públicas; 6. Direitos LGBTI+ O Brasil é um dos países que mais mata pessoas LGBTI+ no mundo. Além do assassi- nato, outros conflitos e formas de violência são vividas: depressão, desemprego, índices alarmantes de ISTs, expulsões de casa, agressões verbais, tortura, estupros corretivos, abandono na velhice, entre outras. Nas últimas décadas, se impôs um sistema de governabilidade como parte funda- mental do presidencialismo de coalizão, que deu a setores ultraconservadores, funda- mentalistas religiosos e neofascistas um antidemocrático poder de veto com relação aos direitos LGBTI+. Além disso, a população LGBTI+ se tornou um dos alvos preferenciais das fake news que coesionam e mobilizam ultraconservadora, como evidenciado pelo caso do “kit gay”. Nesse circuito, também se estruturam inúmeras relações escusas en- tre parlamentares de ultradireita e interesses econômicos privados, gerando esquemas de corrupção. No atual governo, o Ministério da Mulher, da Família e dos Direitos Huma-
  • 19. 19 nos – chefiado até recentemente por Damares Alves –, além de não ter desenvolvido políticas de assistência à população LGBTI+, se tornou a principal caixa de ressonância das posições conservadoras. Não é possível que se mantenha essa lógica que exclui e marginaliza ainda mais um setor fundamental da sociedade. Como ponto de partida para transformar essa situa- ção, é preciso que os diversos órgãos competentes sejam pressionados a realizarem uma efetiva coleta de dados globais sobre a população LGBTI+, o que não existe atual- mente. O relatório do Grupo Gay da Bahia de 2021, um dos poucos que efetua esse tipo de pesquisa no país, identificou que 300 LGBTI+ sofreram morte violenta no país em 2021, um aumento de 8% em relação ao ano anterior: foram 276 homicídios (92%) e 24 suicídios (8%), sendo ainda o Brasil o país que mais mata LGBTI+ no mundo: uma morte a cada 29 horas. Para que se reverta essa situação é preciso que sejam desenvolvidas e implementa- das políticas amplas de atendimento aos direitos LGBTI+ com condições dignas de vida, saúde e educação e respeito. Diante deste cenário, propomos quatro temas prioritários na ampliação dos direitos LGBTI+, que se desdobram em inúmeras propostas concretas: Segurança: • Criação de espaços de acolhimento para pessoas LGBTI+ vítimas de violência; • Capacitação e o treinamento das polícias e forças de segurança, a respeito da di- versidade sexual; • Inclusão da motivação de discriminação por identidade de gênero e orientação se- xual nos protocolos de atendimentos da Segurança Pública, com produção de es- tatísticas regionais e federais; • Espaços de vivência específica para pessoas trans nos presídios, como opção vo- luntária; Saúde: • Saúde integral das mulheres lésbicas, bissexuais e homens trans, articulando com as instituições de formação de profissionais da saúde, combatendo a violência gi- necológica e obstétrica; • Prevenção ao suicídio de pessoas LGBTI+ e fortalecimento dos mecanismos e equi- pamentos da política de saúde mental; • Despatologização das identidades LGBTI+, fim das “comunidades terapêuticas”, das intervenções corporais indevidas em pessoas intersexo, das internações forçadas e dos tratamentos anticientíficos para a dita “cura gay”; • Combate ao HIV, políticas específicas para a população negra, campesina e indíge- na, combatendo a mortalidade por aids e coinfecções;
  • 20. 20 • Garantir o atendimento do SUS às pessoas trans, com capacitação dos profissio- nais de saúde e insumos adequados, e demais questões para o processo de hormo- nioterapia e procedimentos cirúrgicos de afirmação de gênero; Educação: • Prevenir e enfrentar o bullying e a violência LGBTIAfóbica e promover respeito e va- lorização da diversidade, com material de formação contra o preconceito, sobre di- versidade de gênero e sexualidade para a preparação de educadores e estudantes; • Uso de nome social nas escolas e banheiros adequados à identidade de gênero autopercebida; • Programa nacional de prevenção do abandono escolar e de reinserção no sistema educativo, em todos os níveis; ações afirmativas para o acesso e permanência nas Instituições de Ensino Superior; • Cotas para travestis, pessoas trans e de diversidade sexual e de gênero nas univer- sidades; Emprego, renda e moradia: • Programas de assistência social, orientação e formação técnica e profissional; campanhas de valorização do emprego trans; • Cotas no serviço público para travestis, pessoas trans e de diversidade sexual no serviço público e nas empresas; • Políticas de transporte específicas que garantam assistência e acesso para que a população LGBTI+ possa se locomover com segurança nas cidades; • Produzir dados sobre pessoas LGBTI+ em situação de rua e articular as políticas de Assistência Social e habitação, com unidades de acolhimento e políticas afirmati- vas para habitação popular; 7. Arte e cultura são necessidades básicas: Por uma atuação na ALERJ que valorize a cultura popular, periférica, de resistência e feita pela e para a maioria O Brasil viveu a partir da década de 1990 a instituição de um modelo neoliberal para a cultura baseado em mecanismos de renúncia fiscal que até hoje mostra suas conse- quências. A centralização geográfica das produções e do financiamento, assim como a mercantilização e “tutela” das grandes empresas na aplicação das políticas e dos inves- timentos são algumas delas. Se os anos de governo Lula permitiram algum avanço para
  • 21. 21 o setor, com a implementação do Sistema Nacional de Cultura (SNC) e iniciativas como o Cultura Viva-Pontos de Cultura, a política de Dilma Rousseff não foi além, muito pelo contrário, descontinuou políticas para o setor. Após o golpe de 2016, o desmonte atinge o orçamento e as políticas públicas, situação que se aprofunda com o governo Bolsonaro e uma ofensiva ideológica fundamentalista. A conversão do Ministério da Cultura em Secretaria e a rotatividade e o perfil de seus secretários atestam o seu caráter conservador. É patente o aparelhamento ideológico e a censura em instituições, órgãos e agências ligados à cultura. O ataque se dá ainda a partir das chamadas fake news sobre as políticas do setor e sua aplicação, assim como a desmoralização de artistas e produtores culturais não alinhados ao credo fascistizante. Além disso, a pandemia conformou uma dura realidade, paralisando e desorganizando a complexa rede pela qual se passa o “fazer cultural”. A Lei Aldir Blanc (lei n.14.017/2020) con- quista que contou com ampla mobilização da sociedade e do setor, foi um importante apoio econômico a artistas, técnicos, produtores e espaços de cultura espalhados pelo Brasil. Já a Lei Aldir Blanc 2 (lei n.14.399/2022) e a Lei Paulo Gustavo (Lei Complementar 195, de 2022 ), novos aportes e apoio significado ao setor cultural, foram alvo de vetos de Bolsonaro, rever- tidos no Congresso, também com forte mobilização da sociedade e do setor. Já no Estado do Rio de Janeiro, os governos Wilson Witzel e Cláudio Castro deixam claro sua política de criminalização da pobreza, militarização das questões sociais e seus compromissos com uma agenda fundamentalista e conservadora. A Secretaria Es- tadual de Cultura e Economia Criativa segue sendo historicamente um “balcão de ne- gócios” e funciona a partir da lógica privatista da renúncia fiscal (ICMS), além de manter prioridade com grandes empreendimentos e eventos no setor da cultura. A chamada cadeia produtiva da cultura também sentiu o impacto da pandemia, mas não deixou de encontrar apoio em projeto de leis que partiram do PSOL. Na capital, o vereador Tarcísio Motta (PSOL) tem atuado de forma sensível nesse sentido ao aprovar a lei SOS Cultura (lei n.6771/2020)), assim como atuando na Comissão do Carnaval que aprovou a festa como direito cultural do carioca. A partir da expansão e do aprendizado dessas experiências e sempre dialogando com os diversos atores do setor cultural em todo o Estado do Rio de Janeiro, a Coletiva Femi- nista do PSOL na ALERJ tem como proposta central lutar pela garantia e pelo aumen- to do orçamento para o setor a partir de uma perspectiva que valorize a cultura popular, periférica, de resistência, feita pela e para a maioria da população. Para isso, é central em nossa atuação o diálogo com mais diversos atores da cul- tura, compreendendo suas realidades e necessidade concretas. São artistas, técnicas/ os, curadoras/es, gestoras/es, contadoras/es de história, professoras/es de artes, ofici- neiras/os e diversas/os outras/os trabalhadoras/es que estão diretamente ou indireta- mente ligados à cultura. Sem esquecer a importância de políticas para o conjunto de atividades relacionadas direta e indiretamente à cultura, queremos construir projetos e parcerias que observem as especificidades de cada manifestação cultural e artística. Nesse sentido, construiremos coletivamente tanto projetos de lei que visem salvaguar- dar e fomentar manifestações culturais populares e periféricas, quanto fortalecer as redes locais de produção e difusão cultural.
  • 22. 22 Vale lembrar que a formação sócio histórica do Rio de Janeiro é diversa, marcada pela riqueza cultural e pela íntima articulação das culturas indígenas, africanas e da colonização. Embora diversa e rica, essa história também é marcada pela criminalização e marginalização dos modos de vida e de cultura das classes subalternas e pela sua racialização. Isso se expressa na criminalização do funk, na violência aos terreiros e às religiões e expressões culturais de matriz africana, na privatização do carnaval e de fes- tas populares contraposta a megaeventos, na repressão a artistas de rua, ao hip-hop e outras produções culturais da periferia, no não financiamento e na desconsideração da cultura popular e suas expressões. Em outro sentido, precisamos pensar a cultura como direito a ser garantido e fomen- tado pelo Estado, pautado em uma política cultural e projetos de lei pensados para as trabalhadoras e os trabalhadores. Uma política que lute pela garantia da expansão do orçamento e que democratize o fomento e tenha como centralidade os atores populares e periféricos. Também como mandato legislativo, é central fiscalizar e lutar por uma política cultural de valorização das/os trabalhadoras/es da cultura e de consolidação e manutenção de uma política estadual continuada para o setor. Assim, tendo como eixo de luta a garantia e aumento do fomento direto das/os fazedoras/es de cultura a partir do repasse do Estado do RJ, em uma perspectiva que valorize a cultura popular, periférica, de resistência feita pela e para a maioria, levantamos alguns pontos que balizarão as nossas ações na ALERJ. Buscaremos junto aos setores envolvidos no fazer cultural, assim como em diálogo com a sociedade, fomentar, propor e avançar com leis e políticas públicas concretas: Ampliação dos recursos e leis de fomento: • Ampliar a verba pública estadual até se alcançar, em um primeiro momento, o que está previsto na Constituição Federal, isto é vincular 0,5% da receita tri- butária líquida dos estados e ao Distrito Federal para o financiamento exclusivo de programas e projetos culturais, com vistas a chegar a 1,5%; • Criar mecanismos legislativos que obriguem os editais do Estado a favorecer fo- mento e incentivo a pequenos artistas e produtores culturais, assim como as/os fazedoras/es de cultura dos territórios periféricos, combatendo a burocracia que impede a democratização do acesso; • Debater junto aos atores da cultura e pensar mecanismos legais que permitam o abandono progressivo do financiamento via renúncia fiscal para o fomento direto público estadual; • Criar mecanismos legais para que os editais do Estado para a cultura abarquem não apenas a apresentação final de um produto artístico e cultural, mas incentivem processos de produção e a manutenção de espaços, manifestações culturais e grupos artísticos;
  • 23. 23 Valorização do trabalho na Cultura: • Lutar na contracorrente da precarização do trabalho que atinge os fazedores de cultura. Nesse sentido, lutar por direitos trabalhistas e por direitos sociais e previ- denciários que deem conta da especificidade do trabalho no setor; • Defender a descriminalização e democratização do carnaval e demais festas popu- lares e produção cultural da classe trabalhadora e da periferia; Expansão e democratização dos equipamentos culturais: • Expansão dos aparelhos de cultura pelo Estado, a partir do diálogo com as comuni- dades, visando enfrentar a brutal desigualdade geográfica de tais equipamentos e garantir o direito à cidade; • Fomentar, reativar e garantir uma gestão democrática de equipamentos culturais pelo Estado; • Transformar espaços públicos ociosos e prédios abandonados, inclusive as esta- ções ferroviárias, em espaços para a criação de centros culturais e aberto à ocupa- ção cultural, via editais públicos; • Ampliar e diversificar o funcionamento dos aparelhos de cultura em especial os museus, com vistas a incentivar o acesso da classe trabalhadora nestes locais em horários diversificados; • Criar os Círculos de Cultura que transformem as escolas estaduais também em espaços públicos de cultura, com abertura aos finais de semana para atividades culturais e educativas para a população; • Garantir o fomento e manutenção das escolas técnicas de artes do Estado; • Garantir o financiamento contínuo de bibliotecas e espaços culturais afim de que esses espaços permaneçam operantes, estruturados, vivos e com um corpo admi- nistrativo e técnico permanente; • Fomentar grupos a partir dos territórios, prevendo em lei como critério o trabalho comprovado no local de atuação do grupo; • Promover editais específicos para fomento de expressões da juventude negra, tais como: os elementos do hip hop (rap, grafite, break), o funk e os saraus das periferias; • Promover amplo movimento de elaboração com a sociedade do Plano Estadual de Cul- tura que atenda aos objetivos da população, principalmente voltado à reparação àque- las/aqueles a quem historicamente não têm acesso aos espaços culturais do Estado;
  • 24. 24 8. Ecossocialismo contra a barbárie O tema do ecossocialismo pode ser abordado a partir de diversas chaves. As duas principais são: o ecossocialismo como uma crítica ecológica da sociedade capitalista e o ecossocialismo como um programa de transição. No primeiro caso, é possível formular uma poderosa demonstração de que o capitalismo é inviável ecologicamente e precisa, portanto, ser superado. No segundo caso, trata-se da formulação de um amplo programa de demandas/exigências com o objetivo de, em meio à luta, contribuir para a elevação do nível de consciência da classe trabalhadora. É evidente que, tanto num caso quanto no outro, a escala mais visível é a nacional e a internacional. As questões e processos locais de fundo e as urgências mais imediatas do cotidiano não são tão facilmente percebidas nessa crítica totalizante do sistema. Mas isso não significa que elas não estejam lá ou que não possam ser adequadamente identificadas, discutidas e enfrentadas. Mais que isso, em um processo de disputa eleitoral pela câmara estadual, é fundamental trazer à tona as lutas decisivas que necessariamente são travadas em âmbito local. Temos duas boas maneiras de fazer isso. Podemos, primeiro, apontar a centralidade da crise ecológica e, depois, usar o exemplo das mudanças climáticas como o mais em- blemático para revelar os desafios locais. Quanto à centralidade da questão ecológica, compreendemos que o futuro que de- sejamos não apenas deve ser arrancado das entranhas da sociedade capitalista, mas também deverá ser construído a partir das condições ecológicas legadas por ela. O pe- rigo realmente dramático que enfrentamos é que esta sociedade vem destruindo-as rapidamente e continuará a fazê-lo enquanto não a superarmos. À medida que o tempo passa, mais o nosso futuro assume feições degradadas, estéreis e hostis. E conforme muitos(as) ecossocialistas costumam insistir, não há como garantir/construir uma so- ciedade verdadeiramente emancipada e ecologicamente sustentável em Terra arrasada. Em Terra arrasada, todas as nossas lutas legítimas e importantes veem sua chance de vitória real minguar e, no limite, desaparecer. A luta contra a desigualdade social tem características e possibilidades completamente diferentes quando vivemos em um mundo de superprodução e escassez relativa (nossa realidade atual) ou quando nos de- paramos com escassez absoluta (um cenário possível de futuro). O combate à fome é de um jeito quando há comida em excesso combinada a desperdício e má distribuição e é radicalmente distinto quando simplesmente não há comida suficiente. A luta por saneamento básico e acesso à água (combinada à luta para reconquistar o caráter público da Cedae) é uma quando a falta de acesso é provocada por falta de políticas públicas e é outra quando a falta é provocada pelo envenenamento e destruição genera- lizados de florestas, rios, lagoas etc. A demarcação de terras indígenas traz inúmeros impactos ecológicos e humanos positivos quando o principal vetor da conservação ou destruição da floresta é o ser humano. Mas quando os processos climáticos disparados por nós começarem a ameaçar a capacidade de reprodução dos diversos biomas, mes- mo as reservas sofrerão os impactos negativos. Uma reforma agrária e agroecológica abre possibilidades completamente diferentes quando o principal inimigo a ser enfren- tado é o latifúndio e o agronegócio ou quando o principal desafio é o empobrecimento
  • 25. 25 crônico de terras antes cultiváveis, a multiplicação e aumento da intensidade das se- cas, a multiplicação de chuvas torrenciais, a multiplicação de incêndios etc. A defesa do caráter público da Petrobras abre algumas possibilidades enquanto uma efetiva transição ainda for um caminho em aberto para evitar os piores impactos de nossa de- pendência dos combustíveis fósseis. Se deixarmos ser tarde demais, o que fazer com uma eventual vitória nesta luta? Na verdade, a pergunta vale para todas as lutas acima enumeradas. Não há, portanto, tempo a perder. E não é mais concebível que qualquer uma delas desconsidere, teórica e praticamente, os desafios, as urgências e as tarefas no âmbito ecológico. Passando agora às mudanças climáticas, dificilmente encontraríamos exemplo mais adequado em meio à crise ecológica, pois se trata de um processo global que, no entan- to, necessariamente se manifesta de modo local e, vale acrescentar, desigual (inclusive, impactando de maneira mais dramática a população pobre e negra). Ao passo em que a velha esperança de preservar a estabilidade climática dos últimos 12 mil anos vai se dissolvendo, torna-se cada vez mais evidente a urgência de divisar estratégias de adaptação a esse mundo novo que vai se formando a passos rápidos. Em parte, uma nova camada de problemas e dificuldades é acrescentada ao plano mais am- plo de articulação global de esforços. Mas, além disso, o novo quadro de crise climática permanente confere ao âmbito local uma centralidade relativamente nova, traz a urgên- cia de estratégias de adaptação para o seio do debate estadual e municipal. É evidente que muitas questões ecológicas de grande importância vêm sendo dispu- tadas há décadas nas cidades. Contudo, repentinamente, as cidades tornaram-se um terreno de disputa decisivo na definição das formas pelas quais a humanidade tentará adaptar-se a um meio ambiente crescentemente hostil. Mesmo mapeando bastante genericamente as maneiras mais prováveis em que a crise climática se traduz em novos e maiores desafios para as cidades, já é possível ter clareza do quão dramaticamente mal preparadas elas estão, inclusive as cidades flumi- nenses. Todas elas, sem nenhuma exceção digna de nota, enfrentam com dificuldades bastantes severas, e com escasso sucesso, desafios ambientais com níveis de comple- xidade incomparavelmente menores. Nosso histórico precário é um ingrediente a mais a reforçar a urgência de prepararmos nossas cidades e nossas populações para riscos muito maiores do que aqueles que costumam nos atropelar cotidianamente. Mais cedo ou mais tarde, a crise climática convocará o Estado à mesma proatividade concentrada e unilateral que observamos em 2020, ao redor do mundo, com a pandemia de Covid-19. Quanto mais distante o povo estiver das posições de poder, mais aquele exercício coercitivo assumirá formas de violência e segregação crescentes. É verdade que, como a experiência latinoamericana demonstra fartamente, os processos eleito- rais, na melhor das hipóteses, são capazes de assentar o poder popular sobre bases muito frágeis e instáveis. Mas esse cenário de encruzilhada nos indica que, na luta pelo poder real, não podemos abrir mão de disputar as eleições estaduais com uma pauta ecológica radical e a consciência do momento grave pelo qual passamos e do futuro ain- da mais difícil que se avizinha. Nesse sentido, apresentamos como um primeiro passo o seguinte conjunto de propostas:
  • 26. 26 • Pelo desmatamento zero e defesa do reflorestamento massivo da mata atlântica; • Mapeamento de riscos (chuva, incêndios, deslizamentos, alagamentos, produção de alimentos) e realização de obras públicas para produzir uma infraestrutura ur- bana que minimize os impactos previstos: elevação do nível do mar, chuvas torren- ciais, tempestades de vento/raios etc; • Adaptação/criação de equipamentos públicos para receber dignamente desabrigados; • Política pública específica para auxiliar material e financeiramente atingidos por eventos climáticos; • Efetivação da fiscalização e da sanção aos crimes ambientais; • Defesa do avanço da reforma agrária agroecológica no estado, apresentando projetos concretos de segurança alimentar, como o de destinar terrenos públicos do estado, nas cidades (particularmente nas favelas e periferias) para a criação de hortas comunitárias de produção de alimentos orgânicos, com um programa de qualificação e emprego de mulheres para trabalharem nesses cultivos, além do estabelecimento de convênios com as famílias assentadas no estado. Destinação preferencial desses alimentos para a merenda escolar da rede estadual de educa- ção e para os restaurantes populares estaduais; • Fomento à agricultura urbana e periurbana; • propor, na ALERJ, que recursos do FECAM – Fundo Estadual de Conservação Am- biental, oriundos dos royalties do petróleo, sejam empregados na construção e ma- nutenção de usinas de geração comunitária de energia solar e eólica, privile- giando – em um primeiro momento – as comunidades quilombolas e indígenas do estado, e avançando progressivamente para as áreas urbanas periféricas e faveliza- das, em que o custo da energia é insuportável para as famílias trabalhadoras. Esse programa deve buscar parcerias com universidades e centros de pesquisa públicos, para evitar que a transição energética seja sequestrada pelas grandes empresas capitalistas que buscam monopolizar essas tecnologias e difundir a ideologia do “capitalismo verde”; • por uma política de transição energética que combata a instalação da termelétrica de Sepetiba e busque fontes alternativas de produção de energia, a partir de resí- duos, etc; • apoio ao desenvolvimento de programas de educação ambiental nas escolas, em parceria com universidades como a Universidade Federal Rural do Rio de Janeiro (UFRRJ); • apoio às lutas de quilombolas e indígenas no estado do Rio de Janeiro, que são pro- tagonistas fundamentais da luta ambiental;
  • 27. 27 9. Em defesa das empresas públicas estatais! Não à privatização As empresas estatais sempre foram fundamentais para a economia brasileira. O que seria do setor de petróleo, de gás e de combustíveis se a Petrobras e suas sub- sidiárias não existissem? O que seria da distribuição de correspondências e pro- dutos sem os Correios? O que seria da vida dos brasileiros sem serviços baratos de água e luz? Mesmo as estatais gerando crescimento econômico, investimentos, empregos, inovação, soberania e preços de bens e serviços menores do que o mercado, os privatistas nunca descansam e trabalham dia após dia para entregar o patrimônio público para seus amigos e clientes. As empresas estatais estão sendo destruídas; todos os serviços e atenção à popula- ção pioraram nestes últimos anos. Existe falta de investimento para empresas estatais por parte dos governos porque o objetivo do modelo neoliberal é sucatear os servi- ços públicos para depois privatizar tudo: águas, Amazônia, grandes empresas estatais, venda do Pré-sal para empresas estrangeiras. Desde o golpe de 2016, as privatizações das maiores empresas se aceleraram: CEDAE, Eletrobras, BR Distribuidora, Liquigás, Gaspetro, Refinaria Landulpho Alves, diversas ações do BNDES, aeroportos, estra- das e um longo e triste etc. No final, se trata de uma perda acelerada de patrimônio e soberania nacional. Tomemos o caso com dados de duas empresas estatais fundamentais: Sobre a Petrobras A Petrobras é sem sombra de dúvidas a joia da coroa dos privatistas. Afinal de contas, segundo a lista Forbes Global 2000 para o ano de 2022, a Petrobras é a maior empresa do Brasil e a 65ª do mundo. Apesar de não ter conseguido vendê-la integralmente como empresa, as privatizações da empresa já somam mais de R$ 280 bilhões em valores atuais. Segundo o Observatório Social do Petróleo, o processo de privatização da Petrobras se acelera: a empresa vendeu por R$ 155,5 bilhões em ati- vos. O estado do Rio de Janeiro, sendo a sede da Petrobras, é particularmente afetado pelo desmonte da empresa, com diminuição imenso de investimentos, emprego e renda. A magnitude desse impacto é evidenciada pelo fato de que o setor de petróleo e gás, liderado pela Petrobras, responde por 30% do PIB do estado. Desde o início do governo Bolsonaro, a gasolina subiu quatro vezes mais que o salá- rio mínimo. Desde 2021 o preço da gasolina, do diesel e do gás de cozinha estão nos maiores patamares da história. A média do preço do botijão chegou a R$ 120, o equiva- lente a 10% do salário-mínimo. Nunca foi tão caro abastecer um veículo ou cozinhar sua própria comida, mesmo o Brasil sendo o nono maior produtor de petróleo e o nono país com maior capacidade de refino do mundo. Isso é decorrência da atual política de preços da Petrobras, criada logo após o
  • 28. 28 golpe – em outubro de 2016 – pelo então presidente da companhia, Pedro Parente, nomeado por Michel Temer. Os preços dos combustíveis no país estão alinhados com os preços internacionais, ou seja, quando sobe o preço internacional automaticamente sobem os preços nas refinarias, independentemente da situação econômica e da pro- dução nacional. O Preço de Paridade de Importação (PPI) é a responsável pela alta dos preços, e não os impostos ou a situação econômica global. Para diminuir o preço dos combustíveis, em época de eleições, o governo Bolsonaro estabeleceu um teto para o ICMS, imposto que compõe a arrecadação dos estados e deveria servir para os serviços públicos. Desde a instauração deste subsídio, a Petrobras pôde praticar preços de gasolina, diesel e gás de cozinha mesmo acima do PPI, ou seja, os estados renunciaram a recursos fundamentais para que a Petrobras possa lucrar ain- da mais e manter a política de pagamentos recorde de dividendos. É preciso acabar com o Preço de Paridade de Importação, qualquer outra solução é ineficiente e mantém o empobrecimento do país em favor dos acionistas da empresa. Como resultado dos enormes preços dos combustíveis, a Petrobrás vem baten- do recorde de lucros e de pagamento de dividendos, chegando no 2º trimestre de 2022, a ser a maior pagadora de dividendos dentre todas as empresas do mundo! No segundo trimestre deste ano, foi um total de US$ 9,7 bilhões, quase 10 vezes mais que no mesmo período de 2021. Sobre a CEDAE Segundo dados oficiais, 35,6% da população do estado do Rio de Janeiro não tem aces- so à rede de esgoto. O acesso à rede de água chega a 92,9% da população. Mesmo assim, a Companhia Estadual de Água e Esgoto do Rio de Janeiro (CEDAE), foi privatizada recen- temente. A luta contra a privatização vem desde os anos 90. Em 20 de fevereiro de 2017, a Alerj aprovou, por 41 votos favoráveis e 28 contrários, a alienação de 100% das ações da CEDAE (lei n°. 7.529/2017). Desde 2021, o governo Bolsonaro e o governador Cláudio Cas- tro conseguiram avançar no desmonte com o argumento de concessão e não privatiza- ção e, mediante leilão de 4 lotes, entregaram a parte mais lucrativa, 80% da empresa, à iniciativa privada. O serviço de abastecimento de água e coleta de esgoto estará nas mãos do capital privado por 35 anos. A CEDAE continuará existindo, para captação e tra- tamento de água, fornecendo a água já tratada para os concessionários que realizarão a distribuição, a etapa do processo que gera mais lucros. A empresa Aegea, que tem como sócios o fundo soberano de Cingapura (GIC) e a Itaúsa, foi a vencedora do leilão, arrematando dois dos quatro lotes (1 e 4). O grupo Iguá, do fundo canadense CPPIB, ganhou o bloco 2. O grupo Águas do Brasil venceu o leilão do bloco 3. A empresa Águas do Rio é a mais nova empresa do grupo Aegea, criada em 2010, assinou, contrato com o governo do estado e prefeituras para assumir os serviços de água e esgoto em 48 de 64 municípios fluminenses, incluindo 124 bairros no Centro e nas Zonas Sul e Norte da capital. A privatização é apresentada como resposta à má gestão pública, mas, na prática, sig- nifica aumento da tarifa, redução do atendimento e da qualidade e privilegia áreas de
  • 29. 29 maior “retorno”, mantendo os marginalizados com atendimento precário ou sem atendi- mento. A distribuição de saneamento básico deveria ser algo garantido para todos, mas as empresas privadas atuam em sentido contrário. Os investimentos da empresa conces- sionária de esgoto Zona Oeste Mais Saneamento, controlada pela Saab e BRK, na Zona Oeste do Rio de janeiro, excluem favelas não urbanizadas. Lá, quase a metade da meta de ampliação da rede nos primeiros cinco anos de contrato (2012-2017) foi executada pela prefeitura (228 km ante 500 km no total). Logo, são pelo menos três as mentiras propagandeadas pelos privatistas: a CEDAE dá prejuízo, as tarifas da água vão baixar com a privatização; os serviços vão melhorar. Não só as empresas estatais não são deficitárias como possuem lucros milionários apesar da má gestão dos políticos que querem lucrar com a venda do patrimônio público. Privati- zar a água, portanto, só atende aos interesses dos grandes empresários que lucram com serviços essenciais. Água é um direito, não mercadoria. Garantir o controle público desse bem é indispensável para assegurar esse direito fundamental à vida. Não à privatização da água! Não à privatização da CEDAE! Para garantir a defesa das estatais frente aos ataques privatistas e fortalecer sua ação em defesa dos interesses da população trabalhadora, defendemos: • Por uma Petrobras 100% estatal, como empresa integrada (do poço ao posto) e pela exploração estatal do petróleo do Pré-Sal, para garantir soberania e independência nacional. Fiscalizar o repasse dos royalties e seu investimento. Anular os mecanis- mos que comprometem os royalties, como os de “securitização” (venda de títulos da dívida do Estado com garantia dos royalties do petróleo, para pagar as apo- sentadorias dos funcionários públicos de RJ). Os royalties do petróleo do Pré-Sal devem servir para saúde e Educação; • Derrubar a Lei Kandir que prevê a isenção do pagamento de ICMS sobre as expor- tações de produtos primários e semielaborados ou serviços; • Oposição à privatização do Pré-sal através da venda da Pré-sal Petróleo S.A. (PPSA) e da venda antecipada do óleo da União no Pré-sal. Segundo cálculos do próprio governo a privatização entregaria 75% do valor do Pré-sal para os seus compradores; • Oposição à política Preço de Paridade de Importação (PPI), política de preços que de- termina que as refinarias da Petrobras cobrem preços como se estivessem importan- do combustíveis do mercado internacional. O preço dos combustíveis deve ter como referência os custos internos de produção e refino; um dos mais baixos do mundo; • Colaborar para a autossuficiência nacional: Reverter a venda dos ativos da empresa a privados, retomar construção de refinarias, terminar o COMPERJ. Abrir uma fá- brica de fertilizantes (Fafen) no estado do Rio, o que ajudará também à soberania alimentar! Ampliação da capacidade de produção para depender cada vez menos
  • 30. 30 da produção externa de derivados de petróleo. A retomada dos empreendimentos permitirá recuperar emprego e renda; • Pela transição energética! Ampliar o investimento em renováveis, reduzidas a nú- meros pífios nos governos Temer e Bolsonaro. Voltar a produzir nas usinas da Pe- trobras Biocombustível e abrir uma usina no Estado do Rio, em parceria com a agricultura familiar! Usar sistemas solares e eólicos em plataformas de petróleo. Retomar parques eólicos vendidos. Propor políticas de descarbonizarão das ativi- dades e redução de danos no entorno; • Defender o direito à água para toda a população, é lutar pela reestatização da CEDAE. É preciso combater o racismo ambiental e garantir a preservação incondi- cional da CEDAE para produção de água nas mãos do Estado assim como gestão dos 16 municípios do Estado de RJ que não foram concessionados; • Construir linha direta com as comunidades alijadas do acesso ao saneamento bá- sico e articular comitês para denúncia, fiscalização e acompanhamento da garan- tia desse direito; • Lutar pela democratização da gestão de todas as empresas públicas, com fiscali- zação pela população e os trabalhadores, para controle e transparência do funcio- namento da empresa; 10. Transporte digno, moradia e direito à cidade A vida nas cidades tem como seus pilares fundamentais a moradia e o transporte. Enquanto a primeira proporciona segurança e conforto para o cotidiano e a reprodução da vida familiar, o segundo possibilita o acesso ao emprego, ao lazer, à cultura, à saúde e à educação. É a partir da conjugação desses fatores que podemos começar a falar de um efetivo direito à cidade, entendido como o acesso a todas as potencialidades sociais, culturais, econômicas, políticas e de serviços da vida urbana. No estado do Rio de Janeiro, quase todos os seus 92 municípios são bastante ur- banizados, mas morar com dignidade e se deslocar com qualidade é algo que passa longe do cotidiano da imensa maioria da população trabalhadora. Com estruturas ur- banas pensadas para atender às necessidades da acumulação de capital, o direito à cidade ainda é uma miragem. Embora as cidades possuam autonomia administrativa, o tema urbano não é de com- petência unicamente da esfera municipal. Há numerosos serviços e aspectos que estão sob a responsabilidade exclusiva ou compartilhada da esfera estadual, que também se encarrega de fiscalizar alguns aspectos e deve atuar na coordenação das iniciativas em âmbito estadual, garantindo a articulação mais eficaz das diferentes cidades. Nos últimos quatro anos, com a gestão Wilson Witzel/Cláudio Castro, entretanto, esse quadro apenas se agravou. Segundo dados do próprio governo estadual, o deficit habita- cional do Rio de Janeiro é de cerca de 500 mil moradias. O programa Casa da Gente, foi lançado por Castro em 2021 com grande pompa, sendo apresentado como “o maior pro-
  • 31. 31 grama habitacional da história do Rio de Janeiro”. Sua projeção inicial era de construir 50 mil unidades em todas as regiões do estado ao longo de cinco anos. Até o final desse ano de 2022, a meta era garantir 10 mil unidades, o que ainda está longe de ser alcançado. Enquanto busca se fortalecer eleitoralmente pela propaganda de um programa que sequer cumpre as suas próprias metas, o governo Castro desvia recursos sistemati- camente do Fundo Estadual de Habitação de Interesse Social (FEHIS). Apenas em seu mandato, esse desvio já ultrapassa os 300 milhões de reais. Com dotação orçamentária prevista em lei, o FEHIS poderia ser utilizado para acelerar o enfrentamento ao deficit habitacional, mas suas verbas têm sido aplicadas em outras áreas sem nenhuma trans- parência ou qualquer justificativa por parte do governo. A moradia digna, entretanto, não se resume ao acesso à unidade habitacional. Ela deve ser entendida como a porta de acesso a um conjunto de serviços e elementos de infraestrutura que são fundamentais à vida urbana. Nesse sentido, cabe destacar que o Rio de Janeiro ainda enfrenta um pesado deficit no saneamento básico, uma vez que 35% da população do estado não tem acesso à rede de coleta de esgotos, o que resulta em ampliação dos danos ambientais e das probabilidades de adoeci- mento. Questões recentes como a contaminação da água da Região Metropolitana do Rio de Janeiro por geosmina, ou problemas históricos como a poluição da Baía de Guanabara precisam ser enfrentadas pelo estado. Uma gestão pública e eficaz de tratamento de esgoto, distribuição de água e despoluição de rios, lagoas e baías pode e deve ser implementada em nosso estado. No campo do transporte, a situação também é dramática. A maior parte dos modais sob a responsabilidade do estado opera na região metropolitana, que concentra mais de 70% de toda a população estadual e a maior massa de deslocamentos diários. Aqui, a regra tem sido garantir lucros exorbitantes para as concessionárias privadas que admi- nistram os modais. Ao longo dos últimos quatro anos, as tarifas da Supervia, das barcas e do metrô tiveram, respectivamente 19%, 26% e 51% de reajuste. No mesmo período, o reajuste do salário mínimo estadual não chegou aos 9%. Esse encarecimento das tarifas não foi acompanhado de nenhuma melhora signifi- cativa na qualidade dos serviços oferecidos. Na Supervia, são comuns as interrupções do serviço por horas. No metrô e na própria Supervia, a truculência dos seguranças contra usuários e trabalhadores (comerciantes, artistas de rua, etc) é frequente e ab- solutamente injustificada. Por fim, a própria estrutura do sistema de transportes continua orientada para prio- rizar os deslocamentos casa-trabalho-casa, uma vez que só articulam os centros às periferias. Não há nenhuma intenção de favorecer os deslocamentos entre as diferentes áreas periféricas, possibilitando o fortalecimento dos laços sociais entre os moradores dessas áreas. E mesmo na articulação centro-periferia, a organização do sistema coloca os interesses da população trabalhadora em segundo plano em relação aos interesses dos grandes empresários. É a pressão exercida pelas empresas de ônibus, por exemplo, que explica porque o transporte por barcas não alcançou ainda outras áreas, como São Gonçalo, ou porque as linhas do metrô não se expandiram em direção a municípios da
  • 32. 32 Baixada Fluminense. Essas duas iniciativas poderiam contribuir enormemente para re- duzir os engarrafamentos e, portanto, os tempos de deslocamento, além de favorece- rem modais de transporte muito menos poluentes do que ônibus e carros. O resultado dessa configuração da vida urbana é a imposição de um pesado fardo à população trabalhadora. Muitas vezes, o acesso à habitação só é viabilizado pela au- toconstrução – frequentemente, sem a garantia jurídica da propriedade do terreno –, que implica o gasto de recursos, energia e tempo livre dos próprios trabalhadores para acessarem um direito que o estado deveria garantir. E, como visto, mesmo a obtenção de uma unidade habitacional não garante o acesso ao conjunto dos elementos compo- nentes do direito à cidade pleno. Em paralelo, existem dezenas de milhares de imóveis desocupados no estado, que servem apenas à especulação imobiliária. A atual organi- zação do sistema de transportes e seu funcionamento, por sua vez, fazem com que os deslocamentos diários consumam longas horas em condições altamente desconfortá- veis e a preços extorsivos. Como principais responsáveis pelo trabalho de reprodução social, as mulheres ten- dem a enfrentar de forma mais dura as consequências desse quadro da vida urbana no estado. Por um lado, a falta de qualidade das habitações e a escassez de serviços e infraestrutura urbanos dificultam a realização de inúmeras tarefas domésticas e au- mentam a probabilidade de adoecimento de membros da família que passam a requerer cuidados mais constantes. Por outro lado, o tempo consumido nos transportes torna mais extenuantes as duplas e triplas jornadas, reduzindo ainda mais o tempo disponível para o lazer, o autodesenvolvimento e o convívio com a família e as/os amigas/os. Para enfrentar esse projeto de cidade alinhado aos interesses do capital e destrutivo para a população trabalhadora, defendemos: • Aplicação integral dos recursos do Fundo Estadual de Habitação de Interesse So- cial (FEHIS) na habitação popular; • Impulsionamento de programas de regularização fundiária e urbanização em fave- las, loteamentos, periferias, etc; • Utilização de todos os mecanismos legais de garantia da função social da proprie- dade e combate à especulação imobiliária; • Construção de habitações seguras e em locais seguros, próximo ao local de tra- balho para população moradora de área de riscos, quando da impossibilidade de obras de contenção de encostas; • Revogação das concessões dos transportes públicos: trem, barcas e metrô; • Redução dovalordas passagens e melhoria da qualidade dotrem, das barcas e do metrô; • Passe livre para estudantes, desempregados e aposentados no metrô, no trem e nas barcas; • Expansão das linhas do metrô e das barcas, em direção aos demais municípios da Região Metropolitana, como São Gonçalo, São João de Meriti, Duque de Caxias, etc.