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DOMINGO

DOMINGO

Recife, 22 de dezembro de 2013

Recife, 22 de dezembro de 2013

funcionário público
aposentado William
Ribeiro caminha pela sede do Santa
Cruz, para em frente
à sala da memória
do clube, mete a mão no bolso e
saca um molho de chaves. Em segundos, a porta para o passado de
glórias coral está aberta. Entre os
inúmeros troféus, fotos históricas e
outras relíquias, aquele senhor de 75
anos, 64 vividos dentro daquele
mesmo quarteirão, é a testemunha
viva da quase centenária agremiação.
William fez parte do infantil do
Santa no final da década de 1940 e
começo da de 1950 e teve o privilégio de dar os primeiros chutes na
bola de futebol num campo do Arruda que ainda era no sentido contrário ao de hoje. Ele acompanhou
o passo a passo de toda a transformação pela qual o templo dos tricolores viveu até hoje.
“A paixão do torcedor que se vê
hoje já existia lá atrás, com as doações que o pessoal fazia”, recorda.
“Mesmo quando não havia um pedido formal do clube, eu via muita
gente deixando caldeirões de areia,
tijolos, ferro, cobre. Tudo o que eles
encontravam pela rua e pudesse ajudar numa obra de melhoramento do
espaço era colocado num canto do
terreno”, conta.
Perguntado se algum dia imaginou

ite

Os primeiros chutes no campo do Arruda

3

0lim

Pa
ixã
o10

0lim

ite

18:53

o10
ixã
Pa

2

19/12/2013

Fincando os pés na Beberibe

O

WILLIAM foi atleta coral no futebol de campo, no infantil, e de salão, no adulto
que aquele descampado pudesse se
transformar no Mundão do Arruda,
os olhos de William marejam. Após
uma pausa, ele faz uma ponte entre
um passado muito distante, quando
fazia parte do Infantil do clube, e um,
quem sabe, futuro próximo. “Quando entro no auditório e vejo aquelas
fotos (da maquete da Arena Coral)
me lembro que muita gente não
acreditava que tudo isso pudesse
acontecer. Mas aconteceu”.
Por pressão do padrasto, William
não seguiu no futebol de campo,
mas não arredou o pé do Arruda. Foi
o responsável por levar o futebol de
salão para o Santa, chegou a ser ca-

MINI-ALAMBRADO cercava antigo campo do Arruda

pitão do time que levantou o primeiro título estadual da modalidade
e assumiu a diretoria de esportes
amadores. É um dos atuais sócios
beneméritos do clube, assessor do
presidente Antônio Luiz Neto e braço
direito do curador Dirceu Paiva.
Assim como no tempo em que
corria atrás de uma bola no primeiro campo, o Arruda é a sua segunda casa. “Os dois anos em que
morei longe daqui foram terríveis.
Como funcionário da Sudene, fui
morar na vila que eles fizeram no
Ipsep. Mas não aguentei, vendi o
apartamento e voltei para as bandas
de cá”, arremata.

GAROTO
William é o
último em
pé, da
esquerda
para direita

Em meados da década de 1940, o
Santa Cruz chegava ao Arruda literalmente. Sabendo que o Centro Esportivo
Tabajaras estava para entregar o seu
campo alugado ao proprietário, o comendador Arthur Lundgren, a diretoria
tricolor se candidatou a ser a próxima inquilina. Pagou um reajuste de 50% nas
mensalidades e foi obrigado a adiantar
o valor relativo a um ano de contrato.
Obedecidas as exigências, o Santa
começava a fincar os seus pés naquele quarteirão da Beberibe. O próximo
passo seria decisivo. No começo dos
anos 1950, o então presidente Aristófanes de Andrade comandou um movimento de compra definitivamente do
terreno. O valor pedido pelo proprietário foi de Cr$ 4 milhões.
No Banco do Povo, o clube conseguiu
o empréstimo de Cr$ 2 milhões. A
outra metade veio em forma de doação
pública intervivos feita pela Prefeitura
do Recife. Foi aí que José do Rego Maciel, prefeito e torcedor do Santa, entrou
na história e deu o nome ao estádio.
O processo de compra do terreno
não foi fácil. Arthur Lundgren recebeu
uma proposta melhor e por pouco o
acordo anterior não foi desfeito. Só não
foi por causa da obstinação de uma
pessoa. “Aristófanes merecia uma estátua de ouro aqui, no Arruda. Sem ele,
nada disso teria acontecido”, explica o

ESTÁDIO
recebeu
primeira
grande
reforma para
a Minicopa
de 1972

também ex-presidente João Caixero.
Além de liderar o movimento para
adquirir o espaço, Aristófanes encabeçou as campanhas de arrecadação
de material de construção a fim de levantar a estrutura do estádio. Numa
delas, tijolo e cimento serviram de
entrada para um programa de auditório da PRA8, antiga Rádio Clube. No dia
seguinte, foram necessários três caminhões para recolher a doação.
A adesão foi tanta que os proprietários das lojas de material de construção
das redondezas do Arruda foram diretamente à diretoria do clube pedir

1946

1947

1948

1952

1953

O Tricolor chegou a mais um título. Na fase final
do Pernambucano, o Mais Querido foi soberano.
Dos sete jogos, foram cinco vitórias e dois
empates. A decisão seria diante do Náutico, mas
o Timbu abandonou a disputa sob alegação de
não concordar com a indicação do árbitro. O
time com a melhor campanha ficou com a taça.

O bicampeonato viria logo na sequência. Depois
de completar uma primeira fase de maneira quase
perfeita, o Tricolor chegava à decisão do Estadual.
O adversário seria o América. Os alviverdes não
suportaram a força coral. Na primeira partida,
5x3 para o Santa. No jogo de volta, no dia 4 de
abril do ano seguinte, 5x0 a favor do time coral.

O Santa Cruz ainda não era conhecido como o
‘Terror do Nordeste’. Mas a partir de 1948, o
clube coral passou a fazer jus ao título com
grandes campanhas não apenas no estado, mas
também na região. No Torneio dos Campeões, o
Tricolor venceu o Botafogo/PB por 9x3. O
campo dos Aflitos recebeu a partida.

A época dos amistosos internacionais havia
chegado. E, logo nas primeiras partidas, o Santa
Cruz conseguiu fazer história. Em 25 de dezembro de 1952, a equipe das três cores conseguiu
vencer o Chacarita Juniors, tradicional clube
argentino. O placar foi de 2x1 para os tricolores.
O jogo foi realizado no campo da Ilha do Retiro.

No dia 4 de outubro, o Santa Cruz, mais uma vez
na década, mostrava sua força longe de
Pernambuco. O Terror do Nordeste foi até
Salvador para encarar o Bahia, o time mais
tradicional da Boa Terra, e, em plena Fonte Nova,
bateu os donos da casa pelo placar de 2x1.
Hamilton e Paraíba fizeram os gols do Santa.

pelo encerramento das campanhas.
Motivo: o contínuo sumiço de areia e
tijolos, que eram deixados à frente
dos seus estabelecimentos. Em contrapartida, eles próprios forneceriam os
insumos para as primeiras obras do estádio.
“Muita gente fala que o Arruda foi
construído com dinheiro público. Mas
os primeiros empréstimos junto ao
Bandepe só vieram depois que a estrutura já estava de pé, com os primeiros lances de arquibancada prontos, tudo feito com doação e recursos
próprios”, relembra Caixero.

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Ele acompanhou o passo a passo de toda a transformação pela qual o templo dos tricolores viveu até hoje. “A paixão do torcedor que se vê hoje já existia lá atrás, com as doações que o pessoal fazia”, recorda. “Mesmo quando não havia um pedido formal do clube, eu via muita gente deixando caldeirões de areia, tijolos, ferro, cobre. Tudo o que eles encontravam pela rua e pudesse ajudar numa obra de melhoramento do espaço era colocado num canto do terreno”, conta. Perguntado se algum dia imaginou ite Os primeiros chutes no campo do Arruda 3 0lim Pa ixã o10 0lim ite 18:53 o10 ixã Pa 2 19/12/2013 Fincando os pés na Beberibe O WILLIAM foi atleta coral no futebol de campo, no infantil, e de salão, no adulto que aquele descampado pudesse se transformar no Mundão do Arruda, os olhos de William marejam. Após uma pausa, ele faz uma ponte entre um passado muito distante, quando fazia parte do Infantil do clube, e um, quem sabe, futuro próximo. “Quando entro no auditório e vejo aquelas fotos (da maquete da Arena Coral) me lembro que muita gente não acreditava que tudo isso pudesse acontecer. Mas aconteceu”. Por pressão do padrasto, William não seguiu no futebol de campo, mas não arredou o pé do Arruda. Foi o responsável por levar o futebol de salão para o Santa, chegou a ser ca- MINI-ALAMBRADO cercava antigo campo do Arruda pitão do time que levantou o primeiro título estadual da modalidade e assumiu a diretoria de esportes amadores. É um dos atuais sócios beneméritos do clube, assessor do presidente Antônio Luiz Neto e braço direito do curador Dirceu Paiva. Assim como no tempo em que corria atrás de uma bola no primeiro campo, o Arruda é a sua segunda casa. “Os dois anos em que morei longe daqui foram terríveis. Como funcionário da Sudene, fui morar na vila que eles fizeram no Ipsep. Mas não aguentei, vendi o apartamento e voltei para as bandas de cá”, arremata. GAROTO William é o último em pé, da esquerda para direita Em meados da década de 1940, o Santa Cruz chegava ao Arruda literalmente. Sabendo que o Centro Esportivo Tabajaras estava para entregar o seu campo alugado ao proprietário, o comendador Arthur Lundgren, a diretoria tricolor se candidatou a ser a próxima inquilina. Pagou um reajuste de 50% nas mensalidades e foi obrigado a adiantar o valor relativo a um ano de contrato. Obedecidas as exigências, o Santa começava a fincar os seus pés naquele quarteirão da Beberibe. O próximo passo seria decisivo. No começo dos anos 1950, o então presidente Aristófanes de Andrade comandou um movimento de compra definitivamente do terreno. O valor pedido pelo proprietário foi de Cr$ 4 milhões. No Banco do Povo, o clube conseguiu o empréstimo de Cr$ 2 milhões. A outra metade veio em forma de doação pública intervivos feita pela Prefeitura do Recife. Foi aí que José do Rego Maciel, prefeito e torcedor do Santa, entrou na história e deu o nome ao estádio. O processo de compra do terreno não foi fácil. Arthur Lundgren recebeu uma proposta melhor e por pouco o acordo anterior não foi desfeito. Só não foi por causa da obstinação de uma pessoa. “Aristófanes merecia uma estátua de ouro aqui, no Arruda. Sem ele, nada disso teria acontecido”, explica o ESTÁDIO recebeu primeira grande reforma para a Minicopa de 1972 também ex-presidente João Caixero. Além de liderar o movimento para adquirir o espaço, Aristófanes encabeçou as campanhas de arrecadação de material de construção a fim de levantar a estrutura do estádio. Numa delas, tijolo e cimento serviram de entrada para um programa de auditório da PRA8, antiga Rádio Clube. No dia seguinte, foram necessários três caminhões para recolher a doação. A adesão foi tanta que os proprietários das lojas de material de construção das redondezas do Arruda foram diretamente à diretoria do clube pedir 1946 1947 1948 1952 1953 O Tricolor chegou a mais um título. Na fase final do Pernambucano, o Mais Querido foi soberano. Dos sete jogos, foram cinco vitórias e dois empates. A decisão seria diante do Náutico, mas o Timbu abandonou a disputa sob alegação de não concordar com a indicação do árbitro. O time com a melhor campanha ficou com a taça. O bicampeonato viria logo na sequência. Depois de completar uma primeira fase de maneira quase perfeita, o Tricolor chegava à decisão do Estadual. O adversário seria o América. Os alviverdes não suportaram a força coral. Na primeira partida, 5x3 para o Santa. No jogo de volta, no dia 4 de abril do ano seguinte, 5x0 a favor do time coral. O Santa Cruz ainda não era conhecido como o ‘Terror do Nordeste’. Mas a partir de 1948, o clube coral passou a fazer jus ao título com grandes campanhas não apenas no estado, mas também na região. No Torneio dos Campeões, o Tricolor venceu o Botafogo/PB por 9x3. O campo dos Aflitos recebeu a partida. A época dos amistosos internacionais havia chegado. E, logo nas primeiras partidas, o Santa Cruz conseguiu fazer história. Em 25 de dezembro de 1952, a equipe das três cores conseguiu vencer o Chacarita Juniors, tradicional clube argentino. O placar foi de 2x1 para os tricolores. O jogo foi realizado no campo da Ilha do Retiro. No dia 4 de outubro, o Santa Cruz, mais uma vez na década, mostrava sua força longe de Pernambuco. O Terror do Nordeste foi até Salvador para encarar o Bahia, o time mais tradicional da Boa Terra, e, em plena Fonte Nova, bateu os donos da casa pelo placar de 2x1. Hamilton e Paraíba fizeram os gols do Santa. pelo encerramento das campanhas. Motivo: o contínuo sumiço de areia e tijolos, que eram deixados à frente dos seus estabelecimentos. Em contrapartida, eles próprios forneceriam os insumos para as primeiras obras do estádio. “Muita gente fala que o Arruda foi construído com dinheiro público. Mas os primeiros empréstimos junto ao Bandepe só vieram depois que a estrutura já estava de pé, com os primeiros lances de arquibancada prontos, tudo feito com doação e recursos próprios”, relembra Caixero.