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> Conselho Superior
> Acórdão CS n.º AL-24/2003, de 30 de Abril de 2004

1. Na sintética participação contra o Dr. – advogado que integrou o
Conselho Distrital … da Ordem dos Advogados – o advogado queixoso refere que foi
alvo de duas participações criminais por parte do advogado participado, que julga
que o Dr. devia ter-lhe comunicado, nos termos do art. 88.º do EOA, que iria fazer
essas participações e que por esses motivos põe à consideração do Conselho
Superior a apreciação disciplinar da conduta do participado no tocante à omissão
do dever de comunicação prévia do patrocínio contra advogados (citado art. 88.º
do EOA).
É evidente, pela simples leitura da participação, que não é concretizado
qualquer facto de que resulte que o participado assumiu qualquer patrocínio em
processo crime contra o participante – pressuposto imprescindível para existir a
infracção disciplinar de “omissão do dever de comunicação prévia do patrocínio
contra advogados” (para utilizar as próprias palavras do participante, que, pelo
que se deixa dito, se reportam a uma abstracta infracção disciplinar).
2. Ainda assim, e para uma mais segura apreciação do assunto, entendeuse preferível dar conhecimento ao Sr. Advogado participado para, querendo, dizer
o que se lhe oferecesse sobre a participação e documentos com ela juntos – o que
ele, efectivamente, fez.
3. E certo é que se na participação não se concretizava qualquer facto de
que resultasse que o participado assumiu o patrocínio em caso criminal contra o
participante… das alegações de recurso para a Relação de Lisboa resulta que foi
uma Colega que, como advogada, patrocinou o participado contra o participante…
Aliás seria de estranhar, face ao entendimento doutrinal e jurisprudencial
dominante, que em processo crime o participado fosse advogado em causa
própria. Significa isto que se alguém tinha que fazer a comunicação referida no
art. 88.º do EOA era a colega que assumiu o patrocínio do participado (aspecto
que, obviamente, está fora do âmbito desta apreciação).
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4. Parece efectivamente manifesto que qualquer cidadão, advogado ou
não, pode participar contra quem quer que seja por crimes em que se julgue
ofendido – e seria perfeitamente absurdo que um advogado baleado por outro (que
por hipótese o deixa às portas da morte…) não pudesse participar criminalmente
contra ele… sem previamente lhe fazer a comunicação referida no art. 88.º do
EOA!
Claro que o art. 88.º do EOA, como impressivamente resulta da sua
epígrafe (“Do patrocínio contra advogados e magistrados”), contempla apenas
aqueles casos em que um advogado assume o patrocínio dum cliente contra
advogados ou magistrados – não contempla (e seria absurdo que contemplasse) os
casos em que um advogado, como qualquer cidadão, participa pessoalmente dum
crime de que se supõe vítima.
Pelo exposto, e salvo melhor opinião, sou de parecer que não há quaisquer
indícios de o participado ter cometido qualquer infracção, pelo que devem os
autos ser arquivados.
O relator,
Antunes Ferreira
…
Acordam os da 3.ª Secção do Conselho Superior com o parecer que
antecede pelo que ordenamos o arquivamento nos termos propostos.
Notifique.
Lisboa, 30 de Abril de 2004.

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  • 2. PDF elaborado pela Datajuris 4. Parece efectivamente manifesto que qualquer cidadão, advogado ou não, pode participar contra quem quer que seja por crimes em que se julgue ofendido – e seria perfeitamente absurdo que um advogado baleado por outro (que por hipótese o deixa às portas da morte…) não pudesse participar criminalmente contra ele… sem previamente lhe fazer a comunicação referida no art. 88.º do EOA! Claro que o art. 88.º do EOA, como impressivamente resulta da sua epígrafe (“Do patrocínio contra advogados e magistrados”), contempla apenas aqueles casos em que um advogado assume o patrocínio dum cliente contra advogados ou magistrados – não contempla (e seria absurdo que contemplasse) os casos em que um advogado, como qualquer cidadão, participa pessoalmente dum crime de que se supõe vítima. Pelo exposto, e salvo melhor opinião, sou de parecer que não há quaisquer indícios de o participado ter cometido qualquer infracção, pelo que devem os autos ser arquivados. O relator, Antunes Ferreira … Acordam os da 3.ª Secção do Conselho Superior com o parecer que antecede pelo que ordenamos o arquivamento nos termos propostos. Notifique. Lisboa, 30 de Abril de 2004.