O texto discute como Jesus Cristo poderia ser representado hoje em dia, levando em conta a perseguição de grupos marginalizados no Brasil. Ele argumenta que Cristo poderia ser representado como uma travesti crucificada na Parada do Orgulho Gay, simbolizando a violência contra travestis, ou como um negro nu e algemado, refletindo o racismo na sociedade. O autor critica a hipocrisia de alguns cristãos que pregam o ódio em vez do amor defendido por Cristo.
Baile da Saudade / Loja Maçônica Segredo, Força e União de Juazeiro Ba
Cristo hoje é uma travesti pregada numa cruz e um negrinho pelado, algemado num poste
1. CRISTO HOJE É UMA TRAVESTI PREGADA
NUMA CRUZ E UM NEGRINHO PELADO,
ALGEMADO NUM POSTE
O fato que motivou o texto aqui apresentado foi a encenação da
crucificação apresentada pela transexual Vivyane Beleboni por
ocasião da Parada do Orgulho Gay de São Paulo. Depois de tantos
comentários de vários matizes, escolhemos este como o
melhor. (Nota do Editor
As imagens chocam, e muito, aqueles que foram educados pelo e para o ódio –
ironicamente, através da religião que se distinguiu, ao longo dos séculos, por
um profeta que pregava o amor.
2. Tive aulas de catecismo que me ensinaram sobre a figura de Jesus na cruz
como a representação de sua luta pelos perseguidos da época. “Por isso ele é o
salvador da humanidade”, dizia a professora.
Quarta-feira, 10 de junho de 2015
Jesus Cristo foi crucificado porque defendeu os trabalhadores
explorados, os miseráveis, as prostitutas, os leprosos e até mesmo os
que não acreditavam em sua palavra.
Tudo isso está nas escrituras. Pode ser somente uma metáfora. Não sou um
religioso, tampouco ateu – tenho uma maneira estranha de acreditar, por
exemplo, no Cristo histórico e outras coisas que fazem sentido pra mim –, mas
sempre vi sua história como algo muito presente no mundo ao meu redor, e por
isso acho o cristianismo uma ideia com muito sentido.
Acredite nele ou não, a história de Jesus é a da vítima do ódio mais conhecida
pela humanidade.
Também aprendi de pequeno que os cristãos creem no retorno de Cristo ao
mundo dos mortais. Lá pelos Anos 90, se dizia que isso aconteceria dois mil
anos depois da sua morte.
Onde estaria hoje esse Cristo que renasceu? Levandoem conta o ensinado nas
aulas de catecismo, Cristo seria uma transexual pregada numa cruz na parada
gay, simbolizando as travestis que são espancadas, humilhadas e assassinadas
com requintes de crueldade no Brasil e em vários outros lugares assolados pelo
fanatismo religioso. No caso brasileiro, pasmem, pelo fanatismo
cristão.
Talvez Cristo tenha renascido milhões de vezes no mundo atual, para
ser novamente crucificado.
C O N T I N U A
3. Ele foi um homem atropelado por um caminhoneiro em Goiás, porque
um cristão homofóbico não gostou de vê-loabraçado a outro homem.
Foi um mendigo humilhado na rua com um balde d´água, e um frentista
haitiano acossado por cristãos.
Ele foi aquela menina do Piauí morta após um estupro coletivo, pelos
cristãos que a crucificaram.
Foi aquele negrinho que batia carteiras, ou furtava galinhas, e terminou
nu e algemado ao um poste – as imagens de sua crucificação são
conhecidas, não foram encenadas, mas sim comemoradas por
uma jornalista cristã e seus seguidores também fiéis.
O Cristo crucificado hoje é uma travesti, um homossexual, um palestino, um
imigrante africano ou haitiano, um negro das favelas brasileiras, um índio da
4. Amazônia, ou da Bolívia, ou um mapuche, um nordestino, um menino de rua,
uma mulher que sonha em chegar em casa logo, antes que algo aconteça – ou
em ter pra onde sair de casa logo, antes que algo aconteça.
As imagens de Cristo como uma travestipregada na cruz choca parte da
comunidade cristã brasileira, tanto quanto os primeiros cristãos que pregavam o
amor ao próximo como princípio fundamental de difusão de sua crença
chocavam os romanos. Talvez porque entenderam isso, alguns evangélicos
participaram desta última parada gay defendendo o lema“Jesus cura a
homofobia”.
A tal da blasfêmia, reclamada por alguns pastores oportunistas,
certamente não levará nenhum homossexual a atacar evangélicos
física ou psicologicamente, muitas vezes com resultado de morte. O
contrário, o uso da pregação bíblica para justificar a perseguição e
assassinato de homossexuais e transgêneros, por ódio puro e
simples, é coisa frequente em nosso país.
Penso naquela pobre professora de catecismo, sem ter como saber se ela aderiu
aos novos tempos em que os cristãos são os que odeiam os demais, ou se
continua ensinando o mesmo que ensinou a mim. Na segunda hipótese, temo
que ela possa ter sido linchada por outros cristãos, acusada de comunista,
gayzista e até mesmo ateia.
Nesse momento, sinto que o juiz que condenou Cristo foi o grande vencedor da
História.
Eis o homem
Victor Farinelli (Publicado originalmente em sua conta do Facebook)
Víctor é correspondente do Opera Mundi no Chile e colabora
eventualmente com Revista Fórum, Carta Capital, Blog Maria Fro e Geni.