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O TutorO Tutor
Robin Schone
Resumo:
Elizabeth Petre é a honrada esposa de um aspirante a primeiro
Ministro britânico. Diante da Sociedade tem que representar o papel da
esposa perfeita, em sua casa, seu marido se mostra desdenhoso, quando
não indiferente com ela. Para Elizabeth é cada vez mais penoso que seu
marido a mantenha longe de seu coração e de seu leito e tem a idéia de
voltar a seduzí-lo, de fazer com que esqueça suas inúmeras amantes,
aprendendo as mesmas artes que elas.
Para conseguir, recorre a Ramiel Devington, o filho bastardo de uma
nobre inglesa e um Sheik árabe. Repudiado pela sociedade britânica, ele aceita a
proposta da dama, pois intui que apesar de sua fria aparência, Elizabeth
esconde um espírito livre e apaixonado que prisioneiro de convencionalismos,
anseia em escapar e poder desfrutar tudo o que a vida pode oferecer. Dia a dia,
lição a lição, Ramiel vai mostrando a Elizabeth um mundo desconhecido,
ensinando-lhe todos os segredos da arte da sedução e sutilmente, atiça o
fogo e a sensualidade, com conseqüências dramáticas e inesperadas para os dois.
*Baixei da Net a uns dois anos, sem formatação e em TM, dei uma ajeitada...
CAPÍTULO I
Ramiel não consentiria que nenhuma mulher o chantageasse e
não lhe importava quão forte pudesse ser sua necessidade de
satisfação sexual. Apoiou-se contra a porta da biblioteca e
observou com os olhos semicerrados à mulher que estava em pé
frente às portas envidraçadas que davam ao jardim. Ligeiros
retalhos de bruma se estendiam entre ela e as cortinas abertas. Em
contraste com estas, como colunas de seda amarela, a mulher
parecia um escuro monólito embainhado em lã negra.
Elizabeth Petre.
De costas, não a reconheceu, coberta como estava, dos pés a
cabeça com um chapéu e uma grossa capa negra. Mas na realidade
não a teria reconhecido nem nua frente a ele, com os braços e as
pernas abertas lhe convidando lascivamente.
Ele era o Sheik Bastardo, filho ilegítimo de uma condessa
inglesa e de um Sheik árabe. Ela era a esposa do ministro da
Economia e Fazenda e seu pai o primeiro-ministro da Inglaterra.
Pessoas como ela não se misturava socialmente com gente como
ele, salvo a portas fechadas e sob lençóis de seda.
Ramiel pensou na mulher de escuros cabelos cuja cama acabava
de deixar, apenas uma hora. A marquesa de Clairdon o tinha
seduzido num baile de rameiras, onde tinha dançado nua igual ao
resto das assistentes. Usara-o para alimentar sua excitação sexual e
durante algumas horas se converteu no animal que ela desejava,
investindo, esmagando e amassando no interior de seu corpo até
encontrar aquele momento de liberação perfeita onde não existiam
nem passado, nem futuro, nem Arábia, nem Inglaterra, somente o
esquecimento.
Talvez teria possuído também aquela mulher se esta não tivesse
forçado a entrada de sua casa deliberadamente através da coação e
a chantagem. Com os músculos tensos pela cólera contida, afastou
devagar do frio contato do
mogno e atravessou silencioso o tapete persa que cobria o chão da
biblioteca.
— O que é que pretende, senhora Petre, invadindo meu lar e me
ameaçando?
Sua voz, um áspero murmúrio de refinamento inglês que
ocultava a ferocidade árabe, ricocheteou no arco formado pelas
portas e alcançou a barra de bronze da cortina que bordeava o
muito alto teto circular.
Pôde sentir o sobressalto de temor da mulher, farejando-o quase
por cima da neblina úmida.
Ramiel desejava que sentisse medo. Desejava que se desse
conta de quão vulnerável era, sozinha na guarida do Sheik
Bastardo sem que seu marido ou seu pai pudessem protegê-la.
Queria que soubesse da maneira mais elementar e primitiva
possível que seu corpo lhe pertencia para dar a quem quisesse e
que não admitiria chantagens na hora de conceder seus favores
sexuais.
Ramiel fez uma pausa sob o abajur aceso e esperou a que a
mulher se voltasse e enfrentasse as conseqüências de sua maneira
de agir.
O gás que queimava vaiou, causando uma pequena explosão
no gélido silêncio.
—Vamos, senhora Petre! Não foi tão reservada com meu criado.
—Disse, provocando-a brandamente, sabendo o que ela queria,
desafiando-a a pronunciar as palavras. Palavras proibidas, palavras
conhecidas: «Quero gozar com um árabe. Quero desfrutar com um
bastardo»—. O que poderia querer uma mulher como você, de um
homem como eu?
Lenta, muito lentamente, a mulher se voltou, num redemoinho
de lã entre as brilhantes colunas amarelas das cortinas de seda. O
véu negro que cobria sua face não pôde ocultar a impressão que lhe
causou.
Um sorriso zombeteiro se apropriou dos lábios de Ramiel.
Sabia o que ela estava pensando. O que toda mulher inglesa
pensava quando o via pela primeira vez. Um homem que é meio
árabe não tem o cabelo da cor do trigo dourado pelo sol.
Um homem que é meio árabe não se veste como um cavalheiro
inglês. Um homem que é meio árabe...
—Quero que me ensine como agradar um homem.
A voz da mulher estava sufocada pelo véu, mas suas palavras
foram diáfanas. Não eram as que tinha esperado.
Durante um minuto que pareceu eterno, o coração de Ramiel
deixou de pulsar dentro de seu peito. Imagens eróticas desfilaram
ante seus olhos... Uma mulher... Nua... Possuindo-o... De todas as
formas em que uma mulher pode possuir um homem... Pelo prazer
dele... E também pelo dela.
Um fogo abrasador estalou entre suas pernas. Podia sentir,
contra sua vontade, que sua pele se inchava, endurecia, lhe
trazendo lembranças que nunca voltariam, exilado como estava
naquele país frio e sem paixão aonde as mulheres o usavam para
suas próprias necessidades... Ou o desprezavam pelas suas.
Uma fúria primitiva se apropriou de seu ânimo.
Contra Elizabeth Petre, por invadir seu lar para sua própria
satisfação egoísta sob a aparência de querer aprender como dar
prazer a um homem. Contra ele mesmo que aos trinta e oito anos
ainda sentia a necessidade de pegar o que ela podia oferecer, ainda
sabendo que era uma mentira: as mulheres inglesas não estavam
interessadas em aprender a fazer gozar um Sheik Bastardo.
Com uma lentidão deliberada, Ramiel se aproximou da
mulher, escondida atrás de um manto de respeitabilidade. Para sua
surpresa, ela não retrocedeu ante sua fúria.
E também para a dela, ele se contentou só levantando seu véu
para trás.
De perto e sem o fino tecido negro que impedia sua visão, a
mulher pôde apreciar claramente sua estirpe árabe. Tinha a pele
escura, torrada pelo mesmo sol que tinha dourado seu cabelo.
Agora ela se daria conta de que sua aparência de cavalheiro
inglês era só isso, uma aparência. Tinha aprendido a ser homem
num país aonde a mulher vale a metade do que vale um homem...
Podiam ser vendidas, violadas ou assassinadas por se atrever a
fazer muito menos do que aquela mulher se atrevia a fazer agora.
Elizabeth Petre devia sentir medo.
—Agora, me diga de novo o que deseja. - Murmurou sedutor.
Ela não retrocedeu ante o aroma que ele emanava: brandy
misturado com perfume, suor e sexo.
—Quero que me ensine como agradar a um homem. - Repetiu
serena, elevando a cabeça para lhe olhar nos olhos.
Não media mais de um metro sessenta... Tinha que levantar
muito a vista.
A senhora Elizabeth Petre tinha a pele muito branca, o tipo de
brancura estimável que num leilão árabe representa a escravidão
para uma mulher. Não era jovem. Ramiel julgou que devia ter mais
de trinta. Mostrava ligeiras rugas nos extremos de seus pálidos
olhos cor avelã. O rosto que se elevava para ele era mais redondo
que oval, o nariz mais arrebitado que aquilino e seus lábios muito
magros. Tinha as pupilas dilatadas, mas, além disso, sua face não
refletia nem rastro do temor que certamente estava sentindo.
Maldita seja! Por que não o demonstrava? Um músculo se
moveu nervosamentna seu queixo.
— E o que lhe faz acreditar que sou capaz de lhe ensinar
semelhante proeza, senhora Petre?
—Porque você é o... —Vacilou um instante ante seu apelido,
Sheik Bastardo. Podia ser o bastante atrevida para tentar
chantageá-lo em troca de sexo, mas não o suficiente para lhe
chamar bastardo.
—Porque você é o único homem que... —Nem sequer era capaz
de terminar a frase, que ele era o único homem na Inglaterra
famoso por ter recebido um harém ao cumprir os treze anos.
Levantou ainda mais o queixo.
—Porque ouvi por acaso uma... Uma mulher dizer que se os
maridos estivessem dotados só com a metade de suas habilidades,
não haveria uma só mulher infiel em toda a Inglaterra.
A brutalidade de Ramiel estalou num mordaz sarcasmo.
—Então me envie a seu marido, senhora e o instruirei para que
você possa lhe ser fiel.
Os lábios de Elizabeth Petre se endureceram, contraindo pela
inquietação... O temor ou a ira.
—Vejo que não me deixará conservar nem sequer um pouco de
orgulho. Muito bem. Amo a meu marido. Não é ele quem necessita
de adestramento para evitar que eu me extravie, mas justamente o
contrário. Não desejo me
deitar com você, senhor. Só quero que me ensine como agradar
meu marido para que ele se deite comigo.
Todo o calor do corpo de Ramiel se dissipou.
— Você não deseja se sujar com as mãos de um árabe, senhora
Petre? —Perguntou suave e perigosamente.
—Eu não desejo ser infiel a meu marido, —respondeu sem
alterar.
Ramiel se encheu com uma reticente admiração. A Elizabeth
Petre não faltava valor.
Havia rumores de que o ministro da Economia e Fazenda tinha
uma amante.
Edward Petre era um plebeu. Se pertencesse à classe dos
aristocratas, a sociedade não estaria interessada em suas relações
extraconjugais, mas seus eleitores eram de classe média e exigiam
que seus representantes políticos fossem tão irrepreensíveis
moralmente como era sua rainha.
Sem dúvida, Elizabeth Petre estava mais preocupada com a
possível ruína da carreira de seu marido que por perder seus
cuidados no dormitório.
—As mulheres que amam seus maridos não pedem a
desconhecidos que lhes ensinem como agradar um homem. - Disse
cortante.
—Não, as covardes que amam seus maridos não pedem a
pessoas desconhecidas que lhes ensinem como agradar um homem.
As covardes dormem sozinhas, noite após noite. As covardes
aceitam o fato de que seus maridos encontrem prazer com outra.
As covardes não fazem nada, não as mulheres.
A palavra covarde retumbou no repentino silêncio.
Uma respiração, em intervalos breves e rápidos enfraqueceu o
rosto de Ramiel... O fôlego da mulher. Um hálito semelhante, com
pausas mais largas, misturou com o dela no ar frio do inverno...
Seu próprio fôlego era impossível saber. A mulher tinha o rosto de
uma esfinge.
Elizabeth Petre piscou rapidamente.
Durante um instante eterno, Ramiel pensou que tinha pestanejado
num áspero intento de paquerar, mas logo viu o brilho das
lágrimas, que formavam um filme sobre seus olhos.
—Resisto a ser uma pessoa covarde. —Ergueu os ombros. O
movimento provocou que as barbatanas de um espartilho muito
apertado rangessem. - Por isso, uma vez mais, rogo-lhe que me
ensine como agradar um homem.
O sangue golpeou as têmporas de Ramiel.
De algum jeito, as mulheres árabes e as inglesas se pareciam.
A mulher árabe usa véu, a inglesa, espartilho. Uma esposa árabe
aceita às concubinas de seu marido com resignação. Uma esposa
inglesa aceita às amantes de seu marido ignorando-as.
Em nenhuma das duas culturas, uma mulher pactua
descaradamente instrução sexual com outro homem para assegurar
as cuidados de seu marido.
Ramiel notou um aroma desagradável que provinha da capa de
Elizabeth. Tinham lavado a lã recentemente.
As mulheres vinham a ele envoltas em perfumes. Nenhuma lhe
tinha aproximado jamais cheirando a benzeno.
Ramiel se perguntou de que cor seria seu cabelo... E qual seria
sua reação se estirasse a mão e lhe tirasse da cabeça o horrível
chapéu negro que o ocultava. Deu um passo atrás com brutalidade.
— E como poderia lhe ensinar a dar prazer a seu marido se eu
mesmo não me deitar com você, senhora Petre? —Espetou-lhe.
Os olhos dela permaneceram imperturbáveis, indiferentes à
curiosidade sexual que se apoderava do corpo de Ramiel.
—As mulheres que vivem nos haréns, aprendem a agradar a um
homem indo para cama com outro?
Por um segundo, Ramiel se transladou para a Arábia, quando
tinha doze anos. Uma concubina de loiros cabelos, a favorita de um
visir, havia sentido a curiosidade de provar o filho infiel, ainda sem
circuncidar, do Sheik. Ramiel, preso entre o sonho e os seios
perfumados de ópio, tinha pensado que era uma hurí, um anjo
muçulmano enviado para fazê-lo desfrutar do paraíso.
A concubina tinha sido lapidada no dia seguinte.
—Uma mulher árabe seria condenada a morte se o fizesse. -
Disse Ramiel, rotundamente.
—Mas você esteve com essas mulheres...
—Estive com muitas mulheres...
Ela ignorou sua brutalidade.
—Portanto, se for possível que uma mulher árabe aprenda a
agradar a um homem sem contar com a experiência pessoal, não
vejo motivo pelo qual você, um homem que se beneficiou dessa
preparação, não possa por sua vez instruir uma mulher inglesa.
Muitas mulheres inglesas lhe tinham pedido a Ramiel que
mostrasse as técnicas sexuais que os homens árabes usavam para
agradar uma mulher. Mas nenhuma lhe tinha pedido jamais que lhe
ensinasse as técnicas sexuais que as mulheres árabes empregavam
para agradar um homem.
Foram os efeitos dos fortes licores consumidos misturados com
uma noite de sexo intenso, que provocaram a seguinte pergunta de
Ramiel. Ou talvez foi a mesma Elizabeth Petre. E perceber uma
pontada de dor ante o que nenhuma mulher, nem oriental nem
ocidental, arriscaria por ele como o que aquela confrontava por seu
marido. Punha em jogo sua reputação e seu matrimônio para
aprender a agradar sexualmente um homem para que não tivesse
que recorrer a uma amante.
O que faltaria para que uma mulher como ela, uma mulher
respeitável, queria um homem como ele, nascido na Inglaterra e
acolhido na Arábia, e que agora não pertencia a nenhum dos dois
lugares?
Como seria ter uma mulher disposta a fazer tudo para obter seu
amor?
—Se eu me fizesse cargo de sua instrução, senhora Petre, o que
quer aprender?
—Tudo o que possa me ensinar.
Aquele tudo vibrou no frio ar matinal.
O olhar de Ramiel se cravou no seu.
—Entretanto, você disse que não tem nenhum desejo de ir para a
cama comigo. - Disse com dureza.
O rosto de Elizabeth permaneceu impassível. Era o rosto de uma
mulher que não está interessada na paixão de um homem, nem na
sua própria.
—Estou segura de que você possui suficiente conhecimento para
ambos.
—Sem dúvida. Mas meu conhecimento se centra nas mulheres.
—De repente, sua inocência lhe repugnou. - Não tenho por
costume seduzir os homens.
—Mas as mulheres... Flertam com você, não é assim? —Insistiu
ela.
O corpo nu da marquesa tinha brilhado suarento enquanto
dançava ao ritmo de seu desejo. Não possuíra nenhuma
delicadeza... Nem fora nem dentro da cama.
—As debutantes flertam. As mulheres com as quais me deito
não são virgens. - Examinou com insolência a volumosa capa
negra de Elizabeth Petre, que não deixava entrever nem o vigor dos
seios, nem a curva dos quadris para seduzir um homem. - São
mulheres experimentadas que sabem o que querem.
—E me diga se for tão amável, o que é o que querem?
—Prazer, senhora Petre. —Foi intencionalmente comum e
grosseiro. - Querem o prazer de uma mulher. - E você acredita que
como sou maior que essas mulheres e meu corpo não é tão perfeito
como o seu...
- Acredita que eu não desejo também prazer, Lorde Safyre?
O olhar de Ramiel se encontrou com a dela.
Uma corrente elétrica de desejo puro e inocente percorreu
subitamente seu corpo.
Emanava de Elizabeth Petre.
Desejos sensuais, desejos sexuais...
E seu rosto continuava sendo uma máscara sem expressão.
Uma mulher virtuosa não devia buscar um homem para aprender
a agradar a seu marido.
Uma mulher virtuosa não devia admitir que desejava satisfação
física em seu matrimônio.
Quem era Elizabeth Petre para se atrever a fazer o que outras
mulheres nem sequer sonhavam?
—Um homem é algo mais que uma série de alavancas e molas
que devem ficar em funcionamento para receber satisfação. -
Exortou Ramiel de forma brusca, profundamente consciente da fria
perfeição daquela pálida pele feminina e do sangue quente que
palpitava entre suas pernas.
- O gozo de um homem depende da habilidade de uma mulher
para receber prazer. Se você desejar este último, ele obterá o
primeiro.
Elizabeth ficou rígida e seu espartilho rangeu de novo de modo
revelador. A ira apareceu em seus olhos... Ou possivelmente fora o
reflexo da luz do abajur que se encontrava sobre ambos.
—Tenho dois filhos, senhor. Sou plenamente consciente de que
um homem não é feito de alavancas e molas. Além disso, se a
satisfação de meu marido dependesse do desejo de uma mulher,
então não teria abandonado meu leito. Por último, Lorde Safyre,
me ensinará você, como agradar um homem ou não?
O corpo de Ramiel adquiriu uma certa tensão.
Elizabeth Petre lhe estava oferecendo a suprema fantasia, a qual
aspira um homem. Uma mulher a quem podia ensinar todos os atos
sexuais que sempre tinha sonhado que uma mulher fizesse... Com
ele... A ele.
—Pagarei-lhe. - Ofereceu ela, torpemente.
Ramiel a examinou cuidadosamente, tentando ver além daquela
máscara sem emoção que era seu rosto.
— Como me pagará, senhora Petre?
Não restava dúvida da grosseira sugestão.
—Com moeda inglesa.
Nem tampouco podia haver engano na ingenuidade deliberada
que ela tinha empregado.
Ramiel dirigiu um resolvido olhar pela biblioteca, para as
prateleiras que iam do teto ao chão transbordantes de livros
encadernados em couro, aos custosos painéis revestidos de seda
distribuídos nas três paredes restantes, ao aparador com
incrustações de madrepérola, a lareira de mogno esculpida,
verdadeira obra de arte da marcenaria inglesa.
—Esta é uma das vantagens de que meu pai seja um Sheik. Não
necessito seu dinheiro. - Replicou com desinteresse fingido,
perguntando de uma vez até onde chegaria ela em sua busca de
conhecimento sexual, e até onde iria sua busca de esquecimento. -
E Para falar a verdade, nem o dinheiro de ninguém.
O olhar da mulher não vacilou frente à sua.
Ela podia lhe chantagear... Mas não suplicaria.
— Sabe o que me está pedindo, senhora Petre? —Perguntou-lhe
brandamente.
—Sim.
A ignorância brilhou em seus claros olhos cor avelã.
Elizabeth Petre pensava que uma mulher como ela, uma mulher
mais velha e sem o corpo «perfeito», uma mulher com dois filhos,
casada respeitosamente, não podia apresentar atrativo algum para
um homem como ele. Não compreendia que a curiosidade de um
homem pudesse converter numa força motriz ou que o desejo de
uma mulher pudesse provocar uma atração poderosa.
Ramiel conhecia estas coisas muito bem. E também sabia que o
desejo mútuo podia unir um homem e uma mulher de maneira mais
forte que os votos pronunciados numa igreja ou numa mesquita.
Um opaco resplendor ambarino penetrou pelos cristais. Em algum
lugar sobre a neblina amarelada que anunciava outra manhã
londrina brilhava o sol e o começo de um novo dia.
Girando bruscamente, Ramiel cruzou o tapete e estirou o braço
para pegar de uma das prateleiras, um pequeno volume forrado em
couro. ““ O Jardim Perfumado”, do Sheik Mohamed ao Nefzawi”.
Em árabe se titulava “Ao Rawd ao atir fi nuzhat ao khatir”, “ O
Jardim Perfumado” para o deleite da alma. Tinha sido traduzido
mais popularmente como “ O Jardim Perfumado” para a
pulverização da alma.
Ramiel o tinha memorizado e repetido tantas vezes como os
meninos na Inglaterra faziam com as gramáticas grega e latina.
Embora a gramática preparava os meninos ingleses para ler os
autores gregos e latinos, “ O Jardim Perfumado” tinha
proporcionado a Ramiel os conhecimentos suficientes para
satisfazer a uma mulher.
Também brindava excelentes conselhos para as mulheres que
queriam aprender agradar um homem.
Sem se deter para reconsiderar aquele ato, voltou-se para a
janela e lhe ofereceu o livro.
—Amanhã pela manhã, senhora Petre. Esteja aqui. Em minha
biblioteca. —Mohamed havia dito que tinha chegado Às...— As
cinco em ponto.
Uma pequena e magra mão embainhada numa luva de couro
negro surgiram entre as pesadas dobras de sua capa de lã. Os
delicados dedos aferraram com firmeza o livro.
—Não compreendo.
—Você deseja que eu a instrua, madame; portanto, o farei. As
aulas começam amanhã pela manhã. Este será seu livro de texto.
Leia a introdução e o primeiro capítulo.
Elizabeth baixou a cabeça. O véu dobrado para cima mantinha
seu rosto em sombra, ocultando sua expressão.
—”O Jardim Perfumado”, do... — Desistiu de tentar pronunciar
o resto do título. - Sheik Nefzawi. - Suponho que não é um livro
sobre o cultivo das flores.
Os lábios de Ramiel se contraíram numa divertida careta.
—Não, senhora Petre, é evidente que não.
—Certamente, tampouco é imprescindível começar as aulas tão
logo. Necessitarei de tempo para assimilar o que li...
Ramiel não queria lhe dar tempo para assimilar.
Queria impressioná-la.
Queria excitá-la.
Queria lhe arrancar aquela aborrecida capa negra e sua fria
reserva inglesa e encontrar a mulher que havia sob ela.
—Você me pediu que a instruísse, senhora Petre. Se tiver que
fazê-lo, deve seguir minhas indicações. Sem contar com o prefácio
e a introdução, há vinte e um capítulos no ” O Jardim Perfumado”.
Amanhã veremos a introdução e o primeiro capítulo. Depois de
amanhã discutiremos o segundo e assim sucessivamente, até que
termine sua instrução. Se precisar de mais tempo para refletir sobre
suas lições, terá que procurar outro tutor.
A batida distante de uma porta no apartamento de cobertura
ressoou através das paredes, como se tivesse divulgado no
momento justo, seguiu-lhe um estrepitoso som de metal, uma
frigideira colocada com força sobre a cozinha de ferro enquanto o
cozinheiro preparava o café da manhã para os serventes que já se
levantaram.
O livro e sua mão enluvada desapareceram dentro da negra capa
de lã. O espartilho rangeu perceptivelmente pelo brusco
movimento.
- As cinco é muito tarde. Teremos que começar às quatro e meia.
Importava-lhe pouco a hora em que se levassem a cabo as aulas,
seu único interesse era ver quanto aprenderia uma mulher como ela
de um homem como ele.
—Como você deseje.
Seu pescoço era magro como a mão. Os sapatos que apareciam
por debaixo de sua protetora capa eram estreitos.
O que desejava encerrar tão estreitamente dentro dos limites
daquele espartilho, a pele... Ou o desejo?
—Toda escola tem suas regras, senhora Petre. A regra número
um é a seguinte: não usará espartilho enquanto estiver em minha
casa.
Sua fina pele branca ficou de uma cor vermelha carmesim.
Ramiel se perguntou se adquiriria essa mesma cor acesa quando
se excitava sexualmente.
Perguntou se alguma vez seu marido a tinha excitado
sexualmente.
Elizabeth girou com força a cabeça para trás.
—O que eu use ou não use, Lorde Safyre, não lhe incumbe...
—Pelo contrário, senhora Petre. Você me procurou para lhe
ensinar o que dá prazer a um homem. Portanto, o que você usa me
incumbe se for em detrimento da consecução desse objetivo.
Asseguro-lhe, um ruidoso espartilho não causa prazer a um
homem.
—Talvez não a um homem de sua natureza...
A boca de Ramiel se endureceu involuntariamente.
Infiel. Bastardo. Não havia nome que não lhe tivessem chamado,
em árabe ou em inglês. Sentia estranhamente desiludido ao
comprovar que ela tinha os mesmos prejuízos que outros.
—Já comprovará, senhora Petre, que quando se trata do prazer
sexual, todos os homens são de uma certa natureza.
Jogou para trás o queixo num gesto que cada vez se fazia mais
familiar.
—Não tolerarei nenhum tipo de contato físico com você.
Ramiel sorriu cinicamente. Havia coisas que afetavam uma
pessoa muito mais que o simples contato.
Palavras.
A morte.
Dabid...
—Como você queira. —Inclinou fugazmente a cabeça e os
ombros numa pequena reverência. - Lhe dou minha palavra como
homem do Ocidente e do Oriente que não tocarei seu corpo.
Embora parecesse impossível Elizabeth ficou ainda mais rígida.
Acompanhou-lhe o ranger de seu espartilho.
—Estou segura de que você compreenderá que nossas aulas
devem ser mantidas no mais estrito sigilo...
Ramiel pensou na ironia da formalidade inglesa. Ela o tinha
chantageado e, entretanto, pretendia que ele se comportasse como
um cavalheiro e fosse reservado com aquela indiscrição.
—Os árabes têm uma palavra para um homem que fala do que
acontece na intimidade entre ele e uma mulher. Chamam-no siba,
está proibido. Asseguro-lhe que em nenhum caso a comprometerei.
Ela apertou sua boca com o controle do que os ingleses usavam
em momentos difíceis. Era evidente que não confiava no conceito
de honra árabe.
—Que você tenha um bom dia, Lorde Safyre.
Ramiel inclinou a cabeça.
—MA’A e-salemma, senhora Petre. Estou seguro de que
conhece o caminho de saída.
A partida de Elizabeth Petre foi patente por um movimento
áspero de lã e o clique seco da porta da biblioteca, que se abriu e
logo se fechou. Ramiel observou com atenção a neblina amarela
que se formava no exterior e se perguntou como tinha chegado até
sua casa. Um carro de aluguel? Sua própria carruagem?
Imaginava que teria sido um carro de aluguel. A mulher se dava
conta perfeitamente do perigo que corria se tirasse o chapéu a
relação entre ambos.
O estômago de Ramiel se contraiu de raiva.
O filho.
Ele era o Sheik Bastardo. Ele era Lorde Safyre. E ele era o ibn.
O filho... Que tinha falhado. Nunca mais levaria o título de Ramiel
ibn Sheik Safyre. Ramiel, filho do Sheik Safyre.
Voltou-se, com o corpo tenso como não o tinha estado nos
últimos trinta minutos.
Mohamed usava um turbante, calças folgadas e thobs, uma
camisa solta até as pantorrilhas. Estava com o Ramiel de os vinte e
seis anos. Um eunuco para proteger ao filho bastardo de um Sheik
que aos doze anos não soubera proteger. E tampouco soubera aos
vinte e nove.
Ramiel procurou em seu casaco e encontrou ali o cartão. No
ângulo inferior direito estava impressa uma direção com uma
decorativa letra.
—Siga Elizabeth Petre, Mohamed. Assegure-se de que não se
meta em mais problemas dos que já se colocou.
A expressão de Ramiel se endureceu.
A homens como o ministro da Economia e Fazenda que se
casavam com mulheres virtuosas para que lhes dessem filhos não
lhes agradaria que sua esposa realizasse esses mesmos atos sexuais
que eles procuravam em seus amantes.
Ramiel tinha sido banido do país de seu pai. Não tinha nenhum
desejo de sê-lo também do de sua mãe. Se sua instrução lhe
conduzia problemas, devia estar preparado.
—Quando ela estiver dentro, a salvo, vigie a casa. Siga seu
marido. Quero saber quem é sua amante, onde e quando se
encontra com ela e quanto tempo leva mantendo essa relação.
CAPÍTULO II
O ar denso da manhã envolvia o carro de aluguel, que despedia
um aroma acre, como se tratasse de um ser vivo, com um coração
pulsando ao compasso do de Elizabeth e respirando quando ela o
fazia. Sua bolsa, aonde tinha metido o livro depois de deixar a casa
do Sheik Bastardo, pressionava a parte interior de suas coxas. No
exterior da suja janela do carro se moviam figuras esfumadas na
neblina que começava a se dissipar. Os vendedores apregoavam
suas mercadorias e os serventes regateavam os preços como se ela
não tivesse passado os trinta minutos mais longos de sua vida
tratando de convencer ao sedutor mais famoso da Inglaterra para
que lhe ensinasse como lhe agradar sexualmente um homem.
A voz do Sheik Bastardo ainda ressonava zombeteira, um
sussurro de cortesia inglesa com um tom áspero.
— Sabe o que me está pedindo, senhora Petre?
Sim.
Mentirosa, mentirosa, mentirosa, chiavam as rodas da
carruagem. Uma mulher como ela desconhecia por completo o
preço que um homem como ele podia exigir pelo conhecimento
carnal.
A ira invadiu Elizabeth como um fluxo ardente;
Como se atrevia a lhe dizer que a satisfação de um homem
radicava na habilidade feminina de receber prazer, como se fosse
culpa dela que seu marido tivesse uma amante?
Ainda sentia no nariz o aroma da fragrância dele! O Perfume de
mulher, indubitavelmente.
Era como se ele se impregnasse daquela fragrância.
Não, era como se ele se impregnasse da mulher que o tinha
usado.
Cheirava como se tivesse esfregado cada centímetro de seu
corpo contra cada centímetro daquele corpo feminino.
Elizabeth fechou os olhos ante aquela imagem involuntária da
pele cítrica pressionando para baixo, ao redor e dentro do corpo
pálido de uma mulher.
Luzes azuis e verdes cintilaram atrás de suas pálpebras
Não, as luzes não eram nem azuis nem verdes. Eram turquesas.
Da mesma cor que os olhos do Sheik Bastardo.
Seu cabelo era inglês e sua pele árabe, mas seus olhos não
pertenciam nem ao Oriente e nem ao Ocidente,
Falavam de lugares aos quais Elizabeth nunca tinha ido, de
prazeres que só tinha imaginado.
Aqueles olhos a tinham julgado como mulher e a tinham achado
imperfeita.
A roda posterior da carruagem se afundou num buraco, fazendo-
a abrir bruscamente os olhos. Cruzou os braços enquanto cravava o
olhar no couro gasto do assento.
As mulheres como ela, mais velhas e com defeitos, não eram
escolhidas por homens como o Sheik Bastardo, mas também
tinham direito a sentir prazer e ela não ia se amedrontar porque a
fizesse precaver de cada segundo de sua idade ou de cada
imperfeição de seu corpo.
Durante dezessete anos tinha sido uma filha obediente
submetendo-se a vontade de seus pais. Durante outros dezesseis
anos tinha sido uma esposa dócil, reprimindo seus desejos para não
provocar o rechaço de seu marido.
O Sheik Bastardo havia dito que o livro com que planejava
instruí-la tinha vinte e um capítulos.
Podia suportar aqueles olhos turquesas, zombeteiros e
cúmplices durante três semanas.
Podia suportar tudo como aprender aquilo que precisava
saber.
O carro de aluguel se deteve com brutalidade.
Elizabeth demorou alguns segundos em dar conta de que tinha
chegado a seu destino e que não estava de novo detida no meio do
tráfico. Empregou vários segundos mais em localizar o cabo da
porta e abrir de um puxão.
As esquinas da rua pareciam estranhas através do véu, negro,
como se tivessem trocado de algum jeito escura, mas evidente nas
duas últimas horas. Uma transformação que não se podia explicar
pelo simples passado da alvorada obscura a claridade do dia.
—É um xelim e dois penes, madame.
Olhou fixamente ao chofer.
Era um esqueleto de homem, consumido pela falta de
alimento e pelas quatorze horas diárias de trabalho. Um halo de luz
rodeava sua cabeça, o sol da manhã aparecendo través das nuvens
de fumaça e neblina suspensas no céu, que rodeavam Londres em
novembro, dezembro e janeiro, mas que esse ano se prolongaram
até o mês de fevereiro.
Elizabeth tinha dinheiro e saúde, contava com um marido
distinto e dois filhos. Por que não podia estar contente com o que
tinha?
Colocou a mão nele bolsa, agarrou uma moeda e a lançou.
—Fique com o trôco.
O chofer o colheu com destreza e se levantou o chapéu:
—Obrigado, madame. Necessitará o carro outra vez?
Ainda não era muito tarde, sussurrou Elizabeth. Podia lhe
pagar ao chofer agora para devolver o livro ao Sheik Bastardo e
não seria necessário que tivesse mais contato com ele.
Mas não era a mesma mulher da semana passada. Nem
voltaria a ser nunca.
Seu marido se pavoneou abertamente com sua amante
público. Enquanto satisfazia seus apetites em outro lugar, ela tinha
reprimido suas necessidades físicas acreditando que a felicidade
conjugal se achava na família, não na carne.
Seu matrimônio havia estado apoiado em mentiras.
—Hoje não, obrigado. Mas sim necessitarei de um, manhã pela
manhã. As quatro em ponto.
Um sorriso de orelha a orelha apagou momentaneamente as
linhas de cansaço cinzeladas no rosto do chofer e revelou a
juventude que lhe pertencia por sua idade, embora não por sua
experiência. Estalou os dedos para o cavalo.
—Aqui estarei, madame.
Elizabeth contemplou como o carro se perdia rapidamentna
meio à torrente matinal de cavalos, carruagens e retalhos
amarelados de neblina.
Não tinha calculado ter que esperar uma hora que o Sheik
Bastardo voltasse para sua casa depois de sua farra noturna. Agora
teria que procurar alguma desculpa para explicar sua volta, numa
hora em que normalmente deveria estar na cama.
Um súbito estremecimento provocou que sua pele formigasse.
Alguém a estava observando.
Voltou-se enquanto sentia que o estômago lhe revolvia.
Não havia ninguém na calçada.
— Arenque A meio pene! Arenque fresco! Compre o seu para o
café da manhã! Arenque A meio pene!
Ao outro lado da rua, na calçada da frente, um jovem
empurrava um carrinho de mão, vozeando sua mercadoria. Perto
dali, apoiado contra um edifício de tijolo, havia uma escura
figura...
Um grupo de cavalos obstaculizou sua visão. O vapor
emanava de seus corpos. Atiravam de uma carreta em que se
amontoavam barris. Uma vez que teve passado, Elizabeth observou
que o vendedor de pescado se deteve. A parte posterior de uma
capa negra se inclinava sobre seu carrinho de mão.
Uma mulher, sem dúvida uma criada, que comprava arenque
fresco para o café da manhã.
O temor se misturou com o alívio. Ninguém sabia de sua reunião
com o Sheik Bastardo.
Desta vez.
Depois de caminhar três ruas até sua casa, ficou empapada
de um suor fétido.
E ainda podia cheirar o perfume.
Sigilosamente, abriu com a chave a porta de entrada e, ao
empurrá-la, Elizabeth surpreendeu ao mordomo no instantna que
vestia a jaqueta.
O coração lhe acelerou.
Quando o mordomo árabe lhe tinha negado a entrada,
Elizabeth lhe tinha dado seu cartão para intimidá-lo com o poder
político de sua família.
Sem dúvida, o criado havia entregado o cartão a seu amo. E
certamente seguiria estando em seu poder. Com o canto dobrado
para baixo, que indicava que ela o tinha visitado pessoalmente.
O Sheik Bastardo havia dito que toda escola tem suas regras.
Sua primeira regra era que não poderia usar espartilho em sua casa.
Elizabeth tinha empregado a intimidação para obter uma
audiência com ele. Por que não teria que usar ele a coação para
humilhá-la?
—Ouça, que diabos está fazendo?
Elizabeth jogou atrás seu véu justo quando um par de grandes
mãos sardentas a agarrou para arrojá-la à rua.
O mordomo ficou petrificado e sua jaqueta negra se inclinou.
— Senhora Petre!
—Bom dia, Beadles. —Nunca tinha visto seu mordomo sem as
luvas postas. A visão daquelas mãos cheias de sardas invadiu sua
mente, enquanto procurava uma apressada explicação. - É um dia
formoso. Pensei que uma caminhada melhoraria meu apetite. Já
serviu o café da manhã ao senhor Petre?
Beadles ajustou a jaqueta rapidamente. Sua expressão
malévola mudou instantaneamente, a outra de deferência.
—Certamente que não, senhora. —De repente, dando conta de
que não
tinha as luvas, escondeu bruscamente as mãos nas costas. - Deveria
ter chamado um lacaio. Não é seguro para uma mulher andar
sozinha pela rua nestas horas da madrugada.
Elizabeth se sentiu levemente divertida ante a rapidez com
que tinha assumido o perfeito acento de um cavalheiro quando só
alguns segundos antes tinha usado o dialeto.
—Não era necessário, Beadles. Foi um passeio curto.
Sob a volumosa capa de lã apertou com força sua bolsa
enquanto avançava com calma, como se fosse o mais normal do
mundo que a senhora da casa saísse a caminhar antes que seus
criados se levantassem.
—Por favor, mande chamar Emma. Preciso me trocar para... —
O que? A cama? — O café da manhã.
Beadles tinha muita dignidade para fazer comentários sobre o
estranho comportamento de sua senhora. A parte superior de sua
calva cabeça resplandecia sob o débil raio de luz que tinha seguido
os passos dela.
Elizabeth mordeu o lábio para conter uma risada histérica.
Era tudo tão comum... Tão normal.
Quem poderia suspeitar jamais que a senhora Elizabeth Ann
Petre, filha do primeiro-ministro e esposa do ministro da Economia
e Fazenda, tinha empregado a intimidação para entrar na casa do
Sheik Bastardo a fim de convencê-lo que a ensinasse a dar prazer a
um homem?
Talvez despertasse para dar conta de que tudo tinha sido um
sonho e de que seu marido era exatamente o que sempre tinha
pensado. Um homem que se sentia mais cômodo com a política
que com as mulheres.
Talvez despertasse para encontrar que os desagradáveis
rumores de que tinha uma amante eram falsos.
De repente, seu plano para ser adestrada pelo Sheik Bastardo,
idéia que antes lhe tinha parecido audaz e atrevida, se convertesse
num pouco simplesmente vulgar.
Tinha falado de seu próprio matrimônio com outro homem.
Um homem que lhe havia dito coisas que um cavalheiro jamais
diria a uma dama. Palavras vulgares como «deitar» com uma
mulher.
Elizabeth tinha falado de temas empregado palavras que
nenhuma dama pronunciaria jamais. Tratou de caminhar devagar,
evitando subir as escadas correndo. Precisava ver seu marido.
Necessitava que lhe assegurasse que ainda era uma mulher
virtuosa e respeitável.
Seu dormitório era contíguo ao dele. Só daria uma olhada para
ver se ele estava acordado. Então teriam a conversa que deveriam
ter tido há anos se não fora pela falta de coragem dela.
Com o coração pulsando fortemente, abriu cuidadosamente a
porta de Edward. O dormitório estava vazio. Os lençóis engomados
de linho e a colcha de veludo verde escuro estavam dobrados
pulcramente. Era evidente que não havia dormindo em sua cama.
As lágrimas lhe queimaram as pálpebras.
Fechou a porta cuidadosamente, temendo soltar as lágrimas
que ao longo da última semana ameaçavam continuamente
aparecer e ao se voltar... Quase morre de um enfarte. Uma mulher
singela, de rosto redondo, sorriu-lhe enigmaticamente do outro
lado da cama intacta de Elizabeth.
—Levantou cedo esta manhã, senhora Petre. Trouxe-lhe uma
jarra de chocolate. Apesar de que já passou o pior do inverno,
ainda faz bastante frio.
Elizabeth respirou fundo para reprimir o grito que lutava por
sair. —Obrigado, Emma. Foi muito amável por sua parte.
—O decano chamou ao telefone. O jovem Phillip fez outra das
suas.
Um sorriso iluminou os olhos de Elizabeth ao ouvir o nome de
seu filho caçula, agora em seu segundo trimestre na Eton. Aos onze
anos, Phillip era audaz e preparado e ela o adorava. Não importava
que não tivesse herdado as habilidades intelectuais de seu pai ou de
seu avô. Tinha o dom da risada. E todo isso, misturado com uma
travessa inclinação para a aventura, tinha dado várias
oportunidades para Elizabeth conhecer melhor o decano durante
aqueles últimos meses.
Emma depositou a bandeja de prata sobre a mesinha de noite e
arrumou seu conteúdo até ficar satisfeita.
—O decano falou com o secretário do senhor Petre.
Com atitude indiferente, Elizabeth cruzou o escuro tapete de lã
azul tão inglesa comparada com o vistoso tapete oriental que cobria
o chão da biblioteca do Sheik Bastardo, até sua escrivaninha.
—Está bem. Suponho que o senhor Petre já saiu para alguma de
suas reuniões.
Ao ruído surdo do líquido vertido na xícara lhe seguiu o aroma
doce do chocolate.
—Não saberia lhe dizer, senhora.
Quantas mentiras! Pensou Elizabeth de maneira sombria
enquanto deslizava a bolsa com o livro proibido sob a
escrivaninha.
Emma sabia perfeitamente que o senhor Petre não tinha
dormindo em sua cama. E sem dúvidas, também sabiam o resto dos
criados.
Durante quanto tempo a tinham protegido do fato de que seu
marido preferia o leito de outra mulher? Tirou a capa e o chapéu e
os jogou sobre a cadeira de respaldo alto. Seguiram-lhe as luvas
negras.
Em silêncio, aceitou a delicada xícara de porcelana chinesa
decorada com rosas, que Emma lhe oferecia. Incapaz de enfrentar
os olhos da criada dirigiu-se a janela para olhar para fora. A pálida
e amarelada luz do sol brilhava sobre o jardim de rosas, nodoso e
sem vida. A palha seca cobria a terra erma para proteger as raízes
escondidas, algo pouco atrativo, mas efetivo.
A voz do Sheik Bastardo dançava e resplandecia dentro de sua
cabeça. “Já comprovará, senhora Petre, que quando se trata do
prazer sexual, todos os homens são de uma certa natureza”.
Quantas vezes havia pensado que seu marido se levantava cedo
para atender seus compromissos parlamentares, quando na
realidade nem sequer tinha voltado para casa?
Apoiou sua testa sobre o frio vidro. A fumaça quente subia da
xícara em embaçava a janela. Hoje era segunda-feira. Segundo sua
agenda, Elizabeth devia visitar um hospital as dez horas e as doze
fazer-se de anfitriã num almoço beneficente. Precisava preparar sua
indumentária e um breve discurso, mas só podia pensar no quarto
vazio ao lado do seu.
O que aconteceria se não fosse seu desconhecimento em matéria
sexual que tinha afastado Edward? E se fosse... Ela? Seu corpo, sua
personalidade e
sua carência absoluta de carisma político que não tinha
conseguido herdar de sua mãe ou de seu pai?
Um pardal desapareceu como uma flecha no céu. Levava em seu
pico uma parte de feno para acrescentar ao seu ninho. De repente,
Elizabeth soube o que necessitava.
Precisava se rodear do amor sem complicações de um menino.
Ou talvez precisava estar segura de que seu encontro clandestino
com o Sheik Bastardo não tivesse abaciado de algum jeito a
relação com seus filhos.
Elizabeth deu as costas ao desolado jardim de rosas.
—Diga ao secretário do senhor Petre que envie uma nota a
Organização de Caridade das Boas Mulheres. Que escreva que não
poderei assistir a inauguração do hospital nem fazer o discurso do
almoço, por causa de uma emergência imprevista.
—Muito bem, madame.
Um vigor renovado fluiu pelas veias de Elizabeth. Ser uma
esposa desejável talvez estivesse além de suas capacidades, mas ser
uma boa mãe, não.
Dirigiu a Emma um sorriso enigmático.
—Diga também a cozinheira que prepare um piquenique para
meus dois famintos filhos. Logo mande chamar uma carruagem
para que me leve à estação de trem. Irei passar o dia com eles.
Um perfume suave e fugaz atormentou seu nariz.
O perfume.
—Mas primeiro quero que me prepare um banho, por favor.
— Desejaria tomar um refrigerante, senhora Petre?
O decano observou com determinação o ornamentado relógio de
bolso de ouro. Seus bigodes, cuidadosamente recortados e
prateados pela idade, se retorceram. Não gostava de tratar assuntos
com uma simples mulher, embora fosse a mãe de dois de seus
alunos. Especialmente quando chegava de improviso e sem marcar
uma entrevista prévia.
Elizabeth sorriu, negando a se sentir intimidada pelos intentos
evidentes daquele ancião, de fazer justamente isso. Depois de
enfrentar o Sheik Bastardo não acreditava que nenhum homem
pudesse voltar a incomodá-la alguma vez.
—Não, obrigado, decano Whitaker. O que fez meu filho agora?
—O jovem Phillip atacou um estudante no café desta manhã. - O
decano deslizou seu relógio novamente para o bolso e lhe cravou
um olhar sob suas povoadas sobrancelhas brancas.
—Teve que ser seguro fisicamente.
— E o que fez o outro estudante para provocá-lo? — Perguntou
ela bruscamente com seus instintos maternais a flor de pele.
—O jovem Phillip assegura que o jovem Bernard é um whig,
madame e como tal é uma vergonha a sua consciência social.
Elizabeth se sentia dividida entre a risada e o temor. Por um lado,
Phillip jamais tinha demonstrado nenhum interesse pela política. E
por outro, nunca antes se envolvera numa discussão. Que
simultaneamente tivesse desenvolvido as duas tendências fez com
que soasse um alarme dentro de sua cabeça.
— E o que tem a dizer o jovem Bernard? — Perguntou
brandamente.
—Não diz nada, madame. O aberrante desdobramento de
violência de seu filho o deixou feito um trêmulo feixe de nervos.
Elizabeth analisou a fúria do decano durante segundos longos.
Finalmente perguntou: — Em que curso, rogo-lhe que me você
diga, encontra o jovem Bernard?
—O jovem Bernard está no... Quinto curso. - O decano revelou
esta informação com reticência. Possuía boas razões.
Phillip tinha onze anos e estava no primeiro curso. Bernard no
quinto. Só lhe faltava completar um curso mais antes de se graduar.
Seu filho devia ser realmente atrevido se tinha conseguido
deixar um estudante quatro ou seis anos maior que ele feito um
«trêmulo feixe de nervos».
— Suspenderá Phillip, decano Whitaker? Porque se pensa em
fazê-lo, devo lhe informar de que, há algum tempo, já estive
considerando tirá-lo daqui. Harrow acredito eu, oferece um modelo
mais elevado de educação que Eton. E é obvio, que se retiro
Phillip, também terei que levar Richard. Sei que só faltam seis
meses para os exames, mas de todo modo...
—Não há necessidade de se precipitar, senhora Petre. —O
decano resistia a perder não só o dinheiro, mas também o prestígio.
Os dois meninos tinham
um avô e um pai muito influentes e ambos haviam estudado em
Eton. - Estou seguro de que com os recursos monetários
apropriados... Depois de tudo, os danos foram mínimos e os
meninos são jovens.
Elizabeth ficou em pé.
—Por favor, entre em contato com o senhor Kinder, secretário
de meu marido. Ele se encarregará de todo o necessário para pagar
os danos causados. Agora eu gostaria de ver meus filhos.
—O jovem Phillip está de castigo e o jovem Richard está em
aula. Talvez em outra ocasião...
—Temo-me que não, decano Whitaker. — Disse ela com
firmeza. - Harrow parece cada vez mais tentador.
—Muito bem, senhora Petre.
Ele fez soar uma pequena campainha de bronze.
Imediatamente, seu secretário, um homem de média idade e com os
ombros cansados, que tinha de tímido o que o decano de agressivo,
entrou na sala.
—Faça vir os irmãos Petre a sala de visitas, senhor Hayden.
Senhora Petre, por favor, me siga.
Os sapatos de ambos ressoaram sobre o corredor de madeira.
Os do decano, suaves e discretos e os dela, agudos e inoportunos.
Eton é um lugar deprimente, pensou Elizabeth. Tudo era de
madeira brilhante. Não havia nenhuma marca de dedos que
pudesse fazer pensar que centenas de meninos ocupavam suas
veneradas salas-de-aula.
O decano abriu com força uma porta e deu um passo atrás
para deixá-la passar.
—Sinta-se cômoda, senhora Petre, rogo. O jovem Phillip e o
jovem Richard chegarão imediatamente.
A sala de visitas não convidava precisamente ao conforto.
Tinha duas poltronas de couro situadas frente a um rígido sofá de
nogueira de oito pés, com um respaldo dividido em três seções
ovaladas. Um pequeno fogo de carvão ardia na escura lareira de
granito ao lado do sofá.
Elizabeth tirou a capa, o chapéu e as luvas, apoiou na beirada
do sofá e contemplou as brasas acesas. Desejava poder conservar
seus dois filhos em casa, seguros e protegidos de todo perigo.
Desejava que fosse suficiente ser mãe.
Desejava...
—Olá, mãe.
Elizabeth se virou.
Phillip estava em pé junto à porta de entrada, com seu cabelo
cor castanho escuro penteado cuidadosamente para trás. Movia-se
nervoso, trocando o peso de uma perna a outra. Tinha o olho
esquerdo fechado devido à inflamação. O olho direito brilhava com
lágrimas contidas.
Elizabeth queria correr, abraçá-lo. Cobri-lo de abraços e
beijos. Queria levá-lo de Eton e de todos seus perigos. Queria lhe
dar a dignidade que tão corajosamente estava lutando por
conservar.
—Olá, Phillip.
—Falaste com o decano.
Elizabeth não se incomodou em responder ao que era evidente.
— Irão me expulsar?
— Isso é o que quer?
—Não.
— Quer me dizer por que brigaste com um jovem do quinto
curso? Tinha todas as possibilidades de ganhar.
Phillip apertou os punhos.
—Bernard é um whig...
—Por favor, não insulte minha inteligência repetindo essa tolice.
Além disso, já não os chamamos de whigs, agora são liberais.
Seus ombros relaxaram.
—Já não sou um menino, mãe.
—Sei que não é, Phillip. – Ela brindou-lhe com um malicioso
sorriso. - Seu olho arroxeado o demonstra.
O moço se ergueu ainda mais ante aquelas palavras... E pareceu
se tornar ainda mais jovem do que era. —Por favor, não me peça
que te diga qual foi à causa da briga. Não quero te mentir.
—Obviamente, lhe devo perguntar isso e dado que nunca antes
me mentiste, não acredito que o faça agora.
Phillip olhou os sapatos e finalmente, balbuciou:
—Ele disse algo...
—A respeito de ti?
—Não.
—A respeito de Richard?
Ele elevou o queixo e olhou fixamente por cima da cabeça de
sua mãe.
—Não quero lhe dizer.
Elizabeth sentiu que a invadia um repentino pressentimento. Os
meninos, apesar de sua idade, repetiam as mesmas intrigas que
seus pais. Se ela tinha ouvido por acaso rumores com respeito à
relação extraconjugal de Edward era muito provável que também
seus filhos o tivessem feito.
— Disse o jovem Bernard algo a respeito de seu pai, Phillip?
Ele piscou com seu olhar ainda fixo acima da cabeça dela. Era
evidente que aquela piscada significava que estava no certo. Por
que teria sido uma esposa tão complacente? Nada disto deveria ter
ocorrido, nem a seu marido, nem a ela e nem a seus filhos.
—Phillip.
Seu filho lhe suplicou em silencio com o olhar, familiarizado
com aquele tom particular de voz.
Elizabeth sentiu que lhe rompia o coração.
Salvo pela cor de seu cabelo, Phillip era muito parecido o pai.
Os mesmos olhos castanhos e o nariz nobre... E, entretanto não
havia nada de Edward nele. Elizabeth não podia imaginar Edward
com um olho arroxeado. Nem sequer na idade de Phillip.
Deu alguns tapinhas na poltrona que havia a seu lado.
—Trouxe uma coisa para você.
O olho arroxeado a olhou com receio.
-O que?
—Uma caixa de chocolates Cadbury.
O suborno obtinha o que todo o amor do mundo não teria obtido
jamais. Phillip saltou para o cesto e se sentou aos pés de sua mãe.
—Não deve premiar a conduta violenta, mãe.
A voz em tom de recriminação não pertencia nem a um menino
nem a um homem, mas a alguém que estava entre as duas etapas
da vida.
Elizabeth se voltou para seu filho maior com um prazer
manifesto.
—E você não deve permitir que seu irmão se meta com meninos
que têm o dobro do seu... - Sua boca se abriu emocionada. —
Richard!
Ele estava pálido. Custou-lhe reconhecer o menino que a tinha
incomodado incessantemente durante as férias, lhe pedindo uma
bicicleta nova. Inclusive seu cabelo negro escuro, como o de seu
pai, estava murcho e sem vida.
Elizabeth ficou em pé e lhe tocou a testa.
—Richard, você está doente?
O moço permitiu a carícia.
—Agora estou bem.
— Por que não me comunicou isso, o decano?
—Não era nada, mãe. Somente um resfriado.
—Está comendo bem?
—Mãe!
— Quer vir para casa para descansar?
Richard afastou sua mão.
—Não.
— Quer de uma caixa de doces? —Perguntou ela com aspereza.
Um sorriso ambíguo apareceu em seus lábios.
—Não me oporia a isso.
—Então, se una a nós e faremos uma festa. Ordenei a cozinheira
que preparasse uma cesta de piquenique.
Phillip já tinha invadido a cesta e descoberto em seu interior os
tesouros ocultos. Com solenidade, passou a caixa de doces a
Richard.
Foi como se os dois moços estivessem selando um pacto. Entre
goles de cidra de maçã e mordidas de rosbife, um saboroso queijo
de Stilton, vegetais em vinagre e pão-doce recheados de geléia de
morango, Richard alardeava sobre seus estudos, enquanto Phillip
presumia sobre seus truques para escapar deles. A reunião chegou
a seu fim muito rápido.
Elizabeth guardou os pratos e talheres na cesta e envolveu a
comida restante em dois guardanapos.
—Richard, coma. Phillip, não quero mais briga. E agora não me
importa se vai ofender sua dignidade, mas quero um abraço de
cada um de vós.
Phillip, como se tivesse estado esperando a permissão durante
todo esse tempo, lançou-se para ela e pressionou o rosto em seu
ventre.
—Amo você, MA.
Elizabeth se sentiu invadida por uma forte onda de
superproteção. «MA» havia sido o apelido especial que Phillip
havia lhe colocado desde pequeno. Richard era maior que
Elizabeth. Surpreendeu-a abraçando-a e afundando o rosto em seu
pescoço, tal como fazia quando era pequeno. Um fôlego quente e
úmido fez cócegas sobre sua pele.
—Eu também, MA.
Elizabeth aspirou o aroma de sua pele profundamente. Ele
cheirava a sabão, suor e a seu próprio aroma particular. A
maturidade estava afastando Richard de seu lado, mas ainda
cheirava como quando era pequeno.
Piscou para evitar que as quentes lágrimas que lhe queimavam
as pálpebras deslizassem por seu rosto.
—Seu pai e eu também os amamos. Sua declaração foi acolhida
em silêncio. Como se tivessem num acordo tácito, Richard e
Phillip se separaram de seus braços.
Elizabeth jurou ali mesmo que faria tudo para voltar a unir sua
família.
A viagem em trem de volta para Londres foi um calvário longo e
penoso. O balanço monótono devia lhe ter provocado sono, mas
não foi assim. Pensou em Edward e na sua cama vazia. Pensou em
seus filhos e em como se afastaram quando ela tinha mencionado o
pai. Pensou no Sheik Bastardo e no perfume que o envolvia. E não
importava de que maneira tinha tentado representar-lhe, mas não
podia imaginar que Edward tivesse encontrado jamais em sua
amante o prazer que o Sheik Bastardo obviamente tinha achado na
dele.
O chofer estava aguardando-a na estação. Seu marido não a
esperava em casa.
Rechaçando de maneira cortês, mas firme, a insistência do
criado e depois de sua jovem para que fizesse um jantar leve,
Elizabeth se preparou para deitar. No instante que fechou a porta
de seus aposentos, Elizabeth procurou o livro em sua mesa.
Cheirava a couro e tinta fresca, como se o tivessem publicado a
pouco tempo. Com muito cuidado, passou a página do título e leu a
austera letra negra sobre o fino papel branco de vitela.
“O JARDIM PERFUMADO” DO SHEIK NEFZAWI”.
Um manual de erotismo árabe (século XVI): tradução, revisão e
correção. Cosmopoli: MDCCCLXXXVI: Para a Sociedade Kama
Shastra de Londres e Benarés e somente para distribuição privada.
(Paginação: XVI + 256). Erotismo”.
Elizabeth jamais vira semelhante palavra. A data de publicação
era de 1886, mas o livro estava recém impresso. Com impaciência,
passou o índice e se deteve ao chegar à introdução. Seus olhos
pareceram ir sozinhos aos parágrafos iniciais. “Louvado seja Deus,
que pôs o prazer maior do homem nas partes naturais da mulher e
destinou as partes naturais do homem para dar o maior gozo à
mulher. Não dotou às partes da mulher de nenhuma sensação
prazeirosa ou satisfatória até que tenham sido penetrados pelo
instrumento do macho e de igual modo, os órgãos sexuais do
homem não conhecem nem a quietude nem o descanso até não ter
penetrado nos da fêmea”.
Uma aguda pontada de desejo sacudiu violentamente suas
entranhas. Seguiu-lhe a lembrança dos zombeteiros olhos do Sheik
Bastardo. E não teve dúvida alguma de que ele aceitara ensiná-la
com o único fim de humilhá-la. Um homem como ele nunca
perdoaria uma mulher que o tinha ameaçado para entrar a força em
sua casa.
Um homem como ele jamais compreenderia que uma mulher
cujo cabelo mostrava os primeiros fios prateados da idade e cujo
corpo revelava as conseqüências de duas gestações ardia com o
mesmo desejo que as mulheres jovens e bonitas liberadas do peso
da virtude.
Com determinação, sentou-se e procurou pluma e papel na
gaveta. Ele não precisava saber quanto desejava ela o gozo
feminino com o qual a tinha ridicularizado. A única coisa que o
Sheik Bastardo tinha que saber era que ela desejava instrução
sexual, para que seu marido ficasse satisfeito.
CAPÍTULO III
O abajur a gás do exterior brilhava como um farol. Um baixo
relincho pareceu romper a névoa matinal, do cavalo preso ao carro
que a esperava no outro lado da rua.
Com os dedos trêmulos, Elizabeth ergueu a mão para a aldrava
de bronze. Estava fria, úmida e dura. Um elemento sem adornos
que se pendurava entre as faces de um leão.
Cada fibra de seu corpo gritava que se detivesse. Uma mulher
respeitável não aparecia em público sem levar um espartilho. Uma
mulher respeitável não lia um livro erótico do século XVI. Uma
mulher respeitável não procurava instrução sexual, mas ela sim e
sabia que agora nada podia detê-la.
O golpe seco do bronze rasgou a névoa. Imediatamente, a
porta se abriu de par em par.
Elizabeth se preparou, mas não foi o hostil mordomo árabe
com sua branca túnica quem a recebeu. Uma moça de rosto
recatado e vestida com avental e touca, brancos. O uniforme
tradicional dos criados ingleses. Ela fez-lhe uma reverência, como
se o fato de que uma mulher visitasse o Sheik Bastardo sem
acompanhante às quatro e meia da manhã fosse algo freqüente e
habitual. «E talvez fosse», pensou Elizabeth de maneira sombria,
enquanto franqueava a porta.
—Bom dia, senhora. Faz um tempo horrível, não? Milord me
ordenou que a fizesse passar diretamente. Faça o favor de me dar
sua capa?
Elizabeth se aferrou à bolsa sob a grossa lã negra. Sem o
suporte do espartilho, sentia os seios pesados e grandes e os
mamilos duros e maltratados.
—Não será necessário.
Durante um segundo a jovem pareceu querer insistir, mas
fazendo uma nova reverência, murmurou:
—Muito bem, senhora. Siga-me, por favor.
As paredes de mogno do corredor tinham incrustações de
madrepérola. O brilhante abajur do teto criava um jogo de sombras
e luzes com o vigamento de madeira em concha. Peças de
porcelana do tamanho de um homem montavam guarda na parte
inferior de uma escada circular. Um tapete oriental de um
vermelho e amarelo brilhantes, subia pelas escadas e desaparecia
na escuridão.
Não restava dúvida de que o Sheik Bastardo tinha ordenado
que as luzes do corredor estivessem todas acesas para que ela
pudesse ver a loucura de seu intento desesperado, por lhe intimidar
vinte e quatro horas antes.
Tinha funcionado.
Que tola havia sido pensando que podia persuadir aquele
homem com dinheiro! Evidentemente, o número de suas proezas
sexuais só era superado por suas posses materiais. Se, como ela
suspeitava, aquele encontro matinal tinha surto de seu desejo de
humilhá-la, seria sua primeira e única lição. Qualquer que fosse o
conhecimento que iria adquirir, este dependeria unicamente de sua
própria vontade e não se preocuparia o mínimo pela delicadeza
inglesa.
A introdução e o primeiro capítulo do “jardim perfumado”
tinham conteúdos que não compreendia e ao menos estava decidida
a entendê-los.
A jovem golpeou brandamente a porta da biblioteca antes de
abri-la.
A cena que aguardava Elizabeth não era a que tinha
imaginado. Esperava que a biblioteca estivesse iluminada por uma
luz fria e estéril como estava na manhã anterior. Não era assim.
Vestido com uma jaqueta de tweed, o Sheik Bastardo estava
sentado detrás de uma enorme mesa de mogno, com sua cabeça
inclinada sobre um livro e o cabelo dourado resplandecente sob a
luz do abajur a gás. Chamas amarelas e laranjas dançavam na
formosa lareira de mogno, a sua esquerda. Uma pequena xícara
fumegante descansava junto a seu cotovelo direito. Era café e seu
delicioso aroma impregnava o ar. Uma bandeja de prata, com sua
jarra também de prata, repousavam num extremo da mesa.
Aquele aspecto tão inglês despertou um novo repico de temor
dentro de sua cabeça.
O sexo era misterioso, exótico e estrangeiro. Se ele estivesse
de vestimenta árabe, como seu criado no dia anterior, Elizabeth
podia sentar frente a ele e estudar com equanimidade da arte do
amor erótico. Discutir sobre isso com um nome que facilmente
podia presidir sua mesa de jantar deixava a satisfação sexual no
terreno filosófico e o transformava no fruto proibido de que tinha
sido privada durante dezesseis anos.
A jovem pigarreou brandamente.
- Desculpe, milord. Chegou à dama. Deseja que lhe traga algo
mais?
O Sheik Bastardo não ouviu a criada ou preferiu ignorá-la. Ou
talvez ignorasse Elizabeth, para demonstrar o pouco que importava
a um homem como ele.
Elizabeth se sentiu súbitamente como seu jardim de rosas,
desolado e fora de temporada. Como sem dúvida, ele planejava que
ela se sentisse.
Jogou os ombros para trás... E se perguntou se as plantas se
sentiriam tão nuas e vulneráveis sem suas folhas, como ela sem seu
espartilho.
Os batimentos de seu coração lhe pareceram intermináveis
antes que ele fechasse o livro bruscamente e levantasse a cabeça.
—Obrigado, Lucy. Por favor, leve a capa da senhora Petre e
traga outra xícara.
Elizabeth sentiu que lhe gelava o sangue. Vagamente
percebeu que a criada fazia uma reverência. Depois, a capa
deslizou de seus ombros e a porta da biblioteca se fechou com um
estalo repentino no meio do silêncio.
O Sheik Bastardo, e sim, pensou Elizabeth à medida que a
surpresa cedia a fúria, ele era um bastardo, ficou em pé e assinalou
com a mão uma poltrona de couro vermelho colocada diante de sua
escrivaninha.
—Por favor, rogo-lhe que sente, senhora Petre.
Elizabeth nunca havia se sentido tão furiosa e nem traída.
Tinha imaginado que ele ia tentar humilhá-la. Não tinha imaginado
que lhe mentisse. —Siba, Lorde Safyre. —Apertou os lábios para
evitar que tremessem. - Você me assegurou que um homem árabe
não compromete uma mulher.
Ramiel elevou as sobrancelhas simulando se surpreender.
Dois retalhos de marrom dourado um pouco mais escuros que o
ouro leonino de seu cabelo.
— E você acredita que o tenho feito?
—Se tivesse desejado ser identificada, não teria usado um véu.
Não havia nenhuma necessidade de me chamar pelo meu nome. Os
criados falam.
— E devo supor que os homens ingleses não o fazem? —Uma
ligeira brincadeira brilhava em seus olhos, como uma sombra mais
escura. - Se você não desejava que os criados ingleses a
conhecessem, senhora Petre, não deveria ter deixado um cartão a
um deles.
—Seu mordomo é árabe. - Disse ela com dureza.
— Ah, sim? E o que pensa que sou eu? Árabe ou inglês?
Ela teve que exercer todo o controle de que dispunha para não
lhe dizer exatamente o que era ele.
—Seus mamilos estão duros, senhora Petre. Excita-a, a ira?
Elizabeth sentiu que o fôlego ficou preso na garganta.
De repente, ele sorriu, descobrindo dentes brancos e perfeitos.
Era um sorriso atraente, cheio de calidez e picardia.
Ela não pôde deixar de associá-lo a Phillip, seu filho caçula,
que sorria também assim quando fazia algo totalmente disparatado
e desejava evitar o castigo.
—Por favor, senhora Petre, sente. Minha criadagem é bem
escolhida para não repetir os nomes de meus convidados. Na
Arábia, os servos desrespeitosos são açoitados ou vendidos.
—Na Inglaterra é proibido açoitar criados. – Ela replicou
gélidamente. - Nem tampouco consentimos a escravidão.
—Mas não é proibido comprar a um criado, uma passagem de
ida num navio de carga oriental. Ah, aqui está Lucy. Coloque a
xícara e o pires sobre a bandeja... Assim. Esta bem. Obrigado. Já
não necessitaremos mais de seu serviço.
Elizabeth teve que controlar seu corpo para evitar que este
seguisse de maneira independente, a criada que saia da biblioteca.
Embora o Sheik Bastardo não a tivesse traído, havia falado a
palavra mamilos.
Mas o sentido comum a advertiu de que era ela quem lhe tinha
pedido que a instruísse nas maneiras de agradar um homem. Se não
podia suportar que ele pronunciasse uma parte da anatomia da
mulher, como reagiria quando discutissem sobre a anatomia de um
cavalheiro?
Indiferente a batalha em seu interior, Ramiel serviu uma
bebida surpreendentemente negra dentro da pequena xícara, logo
acrescentou o que parecia ser um pouco de água. Ofereceu-lhe o
café, apresentando-o de maneira formal, pegando delicadamente a
beirada do pires.
—Venha, senhora Petre. Sente. A menos que tenha trocado de
parecer, é obvio.
Era como se lhe tivesse atirado a luva no colo. Aquele gesto
provocantemente correto implicava que se aquela lição fracassara e
a culpa seria única e exclusivamente dela. Era um desafio que não
podia recusar.
Elizabeth se ergueu ainda mais, o qual realçou seus seios,
aumentando o atrito de seus mamilos. Lentamente, cruzou a grande
distancia que os separava pelo tapete oriental e se sentou na
beirada da poltrona de couro vermelho.
As normas da correta etiqueta, indicavam que uma mulher
devia tirar as luvas se tinha intenção de ficar mais de quinze
minutos. E também que não escondesse o rosto atrás de um véu.
Fria e metodicamente, tirou as luvas e acomodou o véu sob seu
chapéu. Fazendo equilíbrio com as luvas e a bolsa sobre o colo,
estirou a mão para alcançar o pires de porcelana, veteado de azul.
—Obrigado.
O café estava espesso, tão doce e tão forte que quase a deixou
sem respiração. Além disso, estava fervendo.
Ofegando, pousou rapidamente o pires e a xícara sobre a
mesa. — O que é isto?
—Café turco. Está recém feito. Deve soprá-lo e logo tomá-lo de
um gole. Leu os capítulos designados?
Elizabeth colocou a mão sobre a garganta, sentia como se a
tivessem escaldado.
—Sim.
Ramiel se reclinou no assento. Em seu rosto aparecia um jogo
de luzes e sombras.
— E o que aprendeu?
Os olhos turquesas deixaram de ser zombeteiros. Eram os
olhos de um homem penosamente atraente observando uma mulher
penosamente pouco agraciada.
Elizabeth se esqueceu imediatamente da dor na garganta.
Vestindo uma expressão insípida que a sociedade exigia de uma
mulher respeitável em público, evitando mostrar qualquer emoção
ordinária e vulgar, procurou no interior de sua bolsa e extraiu o
livro e um maço de papéis. Deixou o livro sobre a mesa, ao lado da
pequena xícara. Sentindo como se fosse uma menina em idade
escolar, consultou os papéis.
—Estima-se que “O Jardim Perfumado” foi escrito no começo
do século XVI. Acredita-se que o autor nasceu na Nefzaoua, um
povo situado na costa do lago Sebkha Melrir, ao sul de Tunísia, daí
seu nome, Sheik Nefzawi, já que muitos árabes adquirem sua
denominação pelo lugar de nascimento. Embora “O Jardim
Perfumado” não é exatamente uma recopilação de autores, é
provável que algumas seções tenham sido tiradas de diferente
escritores árabes e hindus.
—Senhora Petre.
Elizabeth apertou os dentes.
O Sheik Bastardo pronunciava seu nome como se de verdade
ela fosse uma menina em idade escolar... E bastante estúpida, por
certo.
Ela levantou o rosto. Os olhos turquesas estavam escurecidos
pelas grossas sobrancelhas negras.
— Sim, Lorde Safyre?
—Senhora Petre, acaso lhe disse que lesse as notas do tradutor?
Os dedos da mulher se apertaram com raiva, enrugando suas
notas.
—Não.
—Então prescindamos da história do livro e do autor e
procedamos com a seção também conhecida como «Comentários
gerais sobre o coito». Ele sorriu, desafiando-a a que continuasse.
Elizabeth pensou em seu marido com outra mulher. Pensou
em seus dois filhos, inimizados com seu pai. Respirou
profundamente, para acalmar os fortes batimentos de seu coração.
—Muito bem. - Disse com certa tranqüilidade, voltando para
suas notas. - O Sheik assegura que o maior prazer do homem
reside nas partes naturais da mulher e que não conhece nem a
quietude até que ele. —elevou a cabeça, cravando seu olhar na
dele, — a penetre.
Ela se negou a afastar o olhar daqueles olhos de cor turquesa.
E também se negou a reconhecer que seus seios se endureceram.
De repente, Elizabeth sentiu desejos de humilhá-lo da mesma
forma que ele queria denegri-la. Queria ser ela quem o
envergonhasse e o escandalizasse.
—Então, Lorde Safyre, parece que o comentário que você fez
ontem referente a que todos os homens são da mesma natureza é
certo. Mas estou
confusa com respeito à referência do Sheik sobre que “o homem
funciona da mesma maneira que uma maça de morteiro, enquanto a
mulher colabora com ele com movimentos lascivos...”
O chiado do abajur de gás sobre a mesa afogou o rugido de
seu coração. Os lenhos que ardiam na lareira se partiram e
rangeram.
Finalmente, ele disse com suavidade:
— O que é o que a confunde, senhora Petre?
Havia chegado o momento. Já não podia pretender ser pudica.
O sexo não era um assunto pudico.
Elizabeth se perguntou se ele conseguia ouvir as batidas de
seu coração.
—Antes de me casar, minha mãe me recomendou que me
deitasse sem me mover quando meu marido me visitasse. Não
compreendo como pode se mover uma mulher, sem entorpecer as
ações do homem.
O Sheik Bastardo estava sentado como se fosse de pedra. Até
a fumaça que subia de seu café parecia haver gelado.
Ela tinha conseguido escandalizá-lo. Ela tinha conseguido
escandalizar a si mesma.
Uma coisa era contar a um desconhecido a infidelidade de seu
marido e outra muito distinta era dar detalhes sobre seu leito
conjugal.
O calor na biblioteca se tornou repentinamente insuportável.
Distraídamente, ela procurou suas luvas e sua bolsa.
—Desculpe...
Um rangido de madeira lhe fez levantar a cabeça bruscamente.
O Sheik Bastardo se inclinou para diante em sua cadeira. Seus
olhos ardiam à luz do abajur.
—Em árabe a palavra dok significa amassar, golpear. É uma
combinação do movimento de investida que um homem utiliza
para alcançar o clímax dentro da mulher, com a pressão de sua
pélvis contra ela para incrementar suas sensações, daí o símile com
a «maça». Sedimento é um movimento de balanço. Uma mulher
pode levantar ou balançar seus quadris para cima, para encontrar
com o embate para baixo, do homem. Ou pode rebolar seus quadris
de um lado a outro para complementar os movimentos de impulso
dele. Chegará um momento em que os movimentos do homem
serão muito rápidos ou fortes, para que a mulher possa se mover
sem deslocá-lo. Nesse momento,
a melhor maneira de agradar tanto a ele como a ela mesma é
envolvendo suas pernas ao redor de sua cintura e simplesmente
sustentando-o, enquanto que ele faz ambos alcançar o orgasmo.
Uma sensação elétrica sacudiu o corpo de Elizabeth.
De repente, as palavras do Sheik Bastardo se transformaram em
imagens visuais, como se estivesse observando a projeção de uma
lanterna mágica. Mas as cenas se projetavam em seus olhos e não
sobre uma parede. Não eram as inocentes transparências pintadas
A mão que mostrava a seus filhos para entretê-los e educá-los.
Eram fotografias eróticas, fotografias explícitas iluminadas por
uma luz muito mais quente que um tênue resplendor.
Havia um homem nu e figuras que avançavam em sucessão
rápida, de maneira que investia e esfregava alternativamente seu
corpo escuro entre as pernas pálidas e estendidas que subiam cada
vez mais alto sobre os quadris magros e musculosos. Pela primeira
vez em sua vida, a mulher de cabelo cor mogno estava
completamente aberta e vulnerável debaixo dele. Não havia nada
que detivesse o homem, que golpeava e pressionava dentro de sua
suavidade e não havia nada que ela pudesse fazer para reter seu
próprio prazer... A realidade retornou com o eco distante de uma
porta que se fechava bruscamente.
Elizabeth piscou.
Estava com as palmas das mãos úmidas. Como também
estavam outras partes de seu corpo nas quais era melhor não
pensar. E ainda não estavam nem na metade da primeira lição.
Jogou seus ombros para trás.
—Desculpe, posso lhe pedir que me empreste uma pluma e um
tinteiro? Eu gostaria de fazer algumas anotações.
O assombroso hipnotismo de seus olhos se cristalizou.
— Pensa você consultar suas notas quando seu marido visitar
seu leito, senhora Petre? — Ele disse com acidez.
—Se for necessário, Lorde Safyre. – Ela replicou imperturbável.
Como resposta, ele empurrou um tinteiro de bronze para o
outro lado da mesa, abriu uma gaveta e tirou uma pluma.
Uma pesada pluma de ouro.
Elizabeth a esquentou entre seus dedos como se fosse feita de
cerne, em vez de metal. Depois de inundar de maneira decidida a
ponta dentro do tinteiro, apoiou a pluma sobre suas notas.
— Poderia repetir o que acaba de dizer, por favor?
Felizmente, as imagens proibidas estiveram ausentes em sua
segunda explicação, mais fria e breve.
—Obrigado, Lorde Safyre. —Terminou de escrever com um
pequeno gesto de ênfase e novamente consultou suas notas. - A
introdução termina dando o título completo da obra do Sheik, “ O
Jardim Perfumado” para a pulverização da alma. Continuamos
então com o capítulo um?
O Sheik Bastardo sorriu, um sorriso masculino, planejando
sua vingança.
—Naturalmente.
—O Sheik assegura que os homens se excitam pelo uso de
perfumes...
—Está adiantando, senhora Petre. Não só saltou o começo do
capítulo, mas também omitiu os dois subcapítulos: «Qualidades
que as mulheres procuram no homem» e «Os diferentes tamanhos
do membro viril».
“Membro viril” ressoou em seus ouvidos como um eco.
Elizabeth aferrou a grossa pluma para acalmar sua respiração
entrecortada. Aquele era o momento que tanto havia temido, mas
agora que chegara, sentia extranhamente animada.
—Encontrei algo que valesse a pena, Lorde Safyre. - Mentiu.
—Uma lástima, senhora Petre. Você recordará que a introdução
finaliza com o amigo e conselheiro do Sheik lhe respirando a
acrescentar a seu trabalho um suplemento que incluísse coisas
como a maneira de eliminar encantamentos e métodos para
incrementar o tamanho do membro viril. O capítulo um se titula «O
que concerne aos homens meritórios». O Sheik dá grande
importância às genitálias masculinas. Se seu marido sofrer de
abatimento sexual, você deve poder julgar se é devido ao tamanho
de seu membro, em cujo caso deve saber qual é a longitude correta,
para... Alongá-lo.
Os olhos turquesas emitiam brilhos. Ramiel estava
desfrutando de seus esforços por incomodá-la.
—De acordo com o Sheik, um homem «meritório» deve possuir
um membro que tenha «como máximo a longitude equivalente ao
longo de doze dedos ou três larguras de mão e como mínimo seis
dedos, ou uma mão e meia de largura».
Elizabeth lutou para evitar que o fogo que transpassava seu
peito subisse para seu rosto.
— Refere-se ao largo da mão de uma mulher ou de um homem,
Sheik?
Ele apoiou suas mãos morenas, uma sobre outra na suntuosa
madeira escura da mesa.
—Será você quem dita, senhora Petre.
Ela jamais tinha visto seu marido sem roupa. Só se vira com o
tamanho de seus dois filhos quando eram pequenos, para comparar
com um homem.
A curiosidade foi mais forte que a prudência.
Aferrou a pluma e ao papel com uma mão e as luvas e à bolsa
com a outra e se inclinou para diante.
Suas mãos eram grandes e escuras e mediam bem mais que a
largura das suas, juntas.
—Duas larguras de mão... —A mão do Sheik Bastardo que
estava mais perto dela se moveu para diante, alguns dez
centímetros. - Três larguras de mão.
Os olhos de Elizabeth se dilataram.
Impossível. Nenhuma mulher podia acomodar trinta
centímetros.
— E bem, senhora Petre?
Elizabeth se recostou em sua cadeira.
—Ou os homens árabes têm membros extremamente grandes ou
mãos muito pequenas, Lorde Safyre. Até o momento em que
cheguemos ao capítulo que contém as receitas para incrementar o
caráter «meritório» do homem, eu sugiro que passemos aos
benefícios do perfume.
Inclinando para diante, molhou a pluma no tinteiro e se
preparou para escrever.
— Que perfume se usa num harém?
Uma risada profunda e masculina alagou a biblioteca.
Elizabeth nunca tinha visto ou ouvido antes um adulto ceder
de maneira tão desinibida ao riso. As damas usavam um risinho
afogado e os cavalheiros riam a gargalhadas. Descobriu que a
risada verdadeira era contagiosa.
O Sheik Bastardo tinha uma série de molares perfeitos.
Ela mordeu os lábios para não cair no ridículo, durante um
momento em que baixou a guarda e seus olhos se encontraram com
os dele e compartilharam o absurdo da situação.
—Touché, Taliba. —Seus olhos turquesas continuaram
cintilando inclusive depois de que a risada se apagou.— Inclino-me
ante sua enorme acuidade... Nesta manhã. Âmbar, almíscar, rosa,
pétalas de flor-de-laranja, jasmim... Todos esses aromas são
habituais entre as mulheres árabes. Que perfume você usa?
Sua voz era rouca, íntima. Não era a voz de um homem com a
intenção de humilhar uma mulher.
Elizabeth voltou bruscamente à cabeça para trás.
—Lamento lhe informar que sou alérgica a perfume. Do que é o
que me chamou... Taliba?
A luz em seus olhos se apagou e passaram da cor da turquesa
polida ao da pedra tosca ainda sem cortar. —Taliba é a palavra
árabe que designa um estudante, senhora Petre.
De maneira absurda, Elizabeth se sentiu decepcionada.
Edward jamais tinha empregado um termo carinhoso com ela, nem
sequer durante os três meses em que a cortejou, nem nos dezesseis
anos de matrimônio.
Simulou estar escrevendo a palavra árabe em suas notas.
— É necessário que uma mulher utilize perfume para atrair um
homem?
— O que aconteceria se lhe dissesse que sim?
Uma grande mancha de tinta negra se estendeu pelo papel.
—Então consultarei o Boticário para ver se há algo que modere
minhas alergias durante o tempo que devo agradar meu marido.
—Não é necessário que sacrifique sua saúde. —O calor e a
risada haviam desaparecido de sua voz. - Um grande Sheik, no
momento de entregar sua filha favorita em matrimônio,
aconselhou-a que a água é o melhor dos perfumes. Você é alérgica
a flores?
—Não.
—Então triture pétalas de flores em sua pele, debaixo de seus
seios e no triângulo de pêlos entre suas coxas. A combinação do
aroma da flor com o calor úmido de seu corpo será bem mais
eficaz que algo que possa comprar num frasco.
O suor perlaba a parte inferior dos seios de Elizabeth, que
rabiscava energicamente... Flores trituradas debaixo de... Durante
alguns momentos, a ponta de aço que rasgava a superfície do papel
afogou o estalo da madeira ardente e o chiado da chama do gás.
Ramiel tinha deduzido que um homem desfrutava da fragrância do
corpo de uma mulher.
Ela se cheirou discretamente. Tudo o que podia cheirar era o
benzeno de seu traje de lã limpo e o forte aroma do café e a fumaça
da madeira que ardia.
— Sabe você o que é um orgasmo, senhora Petre?
Elizabeth deixou de rabiscar subitamente. Sua confusão se
converteu em vergonha, que a sua vez estalou numa fúria
vermelha, brilhante.
Não deixaria que ele a humilhasse.
Elizabeth levantou a cabeça.
Os olhos turquesas estavam esperando os seus.
—Sim, Lorde Safyre. Sei o que é um orgasmo.
Com os olhos semicerrados, ele estudou-a como se fosse um
animal ou um inseto, o qual nunca antes vira.
— O que é?
— O que é?
Durante alguns minutos, a consternação lhe tirou a fala.
Era evidente que ele não acreditava que ela soubesse. Que
lhe pedisse descrever uma experiência tão intensamente pessoal era
escandaloso, mas que acreditasse numa mentirosa era mais do que
podia suportar.
Os lábios dela se contraíram.
—É o... Topo do prazer.
— Já experimentou você esse topo do prazer?
Ela inclinou o queixo e teria respondido com um categórico e
desafiante sim, se não fosse pelo repentino ardor nos olhos dele.
—Acredito que esse não é assunto de sua incumbência.
—Você diz que só deseja aprender a agradar seu marido,
senhora Petre. - Disse ele, com aspereza. - Acaso não deseja
também aprender a sentir você maior prazer?
De repente, Elizabeth se sentiu tremendamente contente por
ter estudado tão afanosamente. Embora não podia igualar seu
conhecimento sexual, certamente podia defender quando tratava de
competir em sagacidade.
Um pequeno sorriso de triunfo se esboçou em seus lábios.
—Certamente, Lorde Safyre. Não pode ter esquecido as palavras
do Sheik. As partes de uma mulher não sentem «nenhuma sensação
prazeirosa ou satisfatória até que as mesmas tenham sido
penetradas pelo instrumento do macho». Assim, ao agradar seu
marido, uma mulher sente prazer em si mesmo. E Edward, pensou
sombria, sentia o maior prazer quando não lhe impunha nenhum
tipo de exigência. Nem sequer tinha se incomodado em abrir a
porta do quarto para ver se ela estava bem quando tinha voltado
para casa.
Mas não desejava pensar em seu fracasso como mulher no
passado.
A satisfação no leito conjugal devia ser possível. Só tinha que...
Aprender a consegui-la.
Sem pensar muito, perguntou-lhe:
— Você se excita com os beijos, Lorde Safyre?
— E seu marido?
Uma sensação de frieza invadiu Elizabeth.
Edward jamais a tinha beijado.
Não, isso não era completamente certo. Quando o pastor os
declarou marido e mulher, Edward tinha pousado brevemente os
lábios sobre os seus. Elizabeth baixou o olhar para o pequeno
relógio de prata que tinha no prendedor de seu vestido. Eram cinco
e dez.
Inclinando-se, apoiou a grossa pluma de ouro sobre a mesa.
—Não discutirei sobre meu marido com você e nem com
ninguém, Lorde Safyre. —Com mais pressa que graça, envolveu o
maço de notas e as colocou com rapidez na bolsa. - Acredito que
nossa aula se concluiu.
E Elizabeth tinha resistido com seu orgulho intacto, embora não
tivesse acontecido o mesmo com seu pudor. Devia sentir aliviada.
Mas não era assim.
—Muito bem, senhora Petre. —O Sheik Bastardo, com seus
olhos novamente zombeteiros, ficou em pé. – Eu a verei amanhã.
Às quatro e meia da manhã.
Pegou o pequeno livro de couro da mesa e o entregou.
—Capítulo dois, senhora Petre.
Assentindo com a cabeça, ela aceitou o livro e se dirigiu para
a porta sem fazer nenhum comentário.
—Regra número dois. Amanhã pela manhã e cada manhã a
partir de agora, você deixará seu chapéu na porta de entrada... E
também sua capa.
A fúria lhe percorreu. Havia obedecido os homens de sua vida
durante trinta e três anos... Por que tinha que acatar as ordens
daquele estranho?
— E se não?
— Então darei por finalizado nosso acordo.
O coração bateu forte em seu peito e depois começou a pulsar
num ritmo desenfreado.
A que ele se referia? Às aulas... Ou a sua palavra de cavalheiro
do Oriente e do Ocidente de que não diria uma palavra a ninguém?
—Devo supor que você não sente grande simpatia nem pelos
chapéus nem pelos espartilhos. - Disse ela com frieza.
A risada retornou a sua voz.
—Supõe corretamente.
— E pelo o que sente estima, Lorde Safyre?
—Por uma mulher, senhora Petre. Uma mulher quente, úmida e
voluptuosa, que não teme sua sexualidade e nem sente vergonha de
satisfazer suas necessidades.
****
O aroma de benzeno seguia suspenso no ar da biblioteca.
Ramiel levantou a pluma que Elizabeth Petre tinha usado para
tomar notas. Qual das duas é você, senhora Petre? —Murmurou
para si enquanto acariciava delicadamente o suave metal, que ainda
conservava o calor da pele. - Uma mulher que tem medo da sua
sexualidade... Ou uma mulher que sente vergonha de satisfazer
suas necessidades?
Ela tinha as mãos pequenas. Obstinada entre seus magros dedos,
a grossa e pesada pluma parecia um primitivo falo de ouro. A
esposa do ministro da Economia e Fazenda teria que usar ambas as
mãos para abranger um homem do tamanho de Ramiel.
A lembrança sacudiu todo seu corpo. “Não compreendo como
pode se mover uma mulher sem entorpecer as ações do homem”.
Depois dos comentários ingênuos do dia anterior pela manhã,
deveria estar preparado para sua honestidade. Não estava. Ela tinha
conseguido surpreendê-lo uma vez mais. Como podia uma mulher
tão inexperiente gerar tanta tensão sexual?
—Ibn.
Os dedos de Ramiel se aferraram compulsivamente ao redor
da pluma de ouro. Preparando o corpo de forma inconsciente para
defender, levantou a cabeça.
Muhamed estava em pé atrás da poltrona de couro vermelho,
que Elizabeth Petre tinha deixado vazia só a alguns momentos.
Uma capa com capuz negro cobria o turbante do mordomo e o
branco thobs de algodão.
Os olhos turquesas se fixaram naqueles tão escuros, que
pareciam negros.
Olhos de Cornualles.
Um sorriso cínico se instalou nos lábios de Ramiel.
Muhamed parecia árabe, mas em realidade não era. Ramiel
parecia inglês, mas em realidade não o era.
Elizabeth Petre, como tantos de sua raça, via só o que estava
preparada para ver.
— O que acontece, Muhamed?
—O marido não saiu de casa ontem pela manhã. Só a mulher, a
senhora Petre. Partiu em sua carruagem antes das dez. Não sei para
onde. Mais tarde, enquanto estava fora, o marido voltou para
jantar. Foi...
— Disse que não tinha saído de casa, —interrompeu Ramiel
bruscamente. - Mas voltou para casa para jantar.
A face de Muhamed, ainda forte e musculosa para a idade de
cinqüenta e três anos, permaneceu impávida.
—Desconheço o motivo disso.
Ramiel sim o conhecia.
Edward Petre tinha passado a noite com sua amante. E
indubitavelmente Elizabeth Petre também sabia. Aonde ela teria
ido pela manhã, deixando sua casa antes da hora em que
acostumavam sair às damas da alta sociedade? As compras? Fazer
visitas? Fuga?
Não, Elizabeth Petre não fugiria. Nem da infidelidade de seu
marido nem de um acordo com um Sheik bastardo.
— Aonde foi o marido depois de jantar?
—Ao edifício do Parlamento. Permaneceu ali até as duas da
manhã. Logo voltou para casa. Está lá agora.
Como também estaria Elizabeth breve.
Teriam leitos matrimoniais separados... Ou compartilhariam o
mesmo?
Imediatamente, Ramiel rechaçou a idéia de que Elizabeth
compartilhasse a cama com outro homem. Não poderia sair de sua
casa se assim fosse. Mas isso não significava que não pudesse
reunir com seu marido em sua cama.
Sentiu uma punhalada de ira em seu interior.
Elizabeth Petre sabia o que era um orgasmo.
Tinha-o aprendido de seu marido? Podia penetrar em sua fria
reserva inglesa sob a aparência de decoro e lhe deixar alcançar o
topo do prazer?
—Não descobriu a identidade da amante de Edward Petre? -
Disse Ramiel em tom imperioso.
Os olhos negros de Muhamed brilharam.
—Não.
—E, entretanto deixaste sua casa sem vigilância. Ordenei-te que
o seguisse até que descobrisse quem é a amante.
—Acreditei oportuno voltar, Ibn.
Ramiel não se deixou enganar pelo estoicismo de Muhamed.
Seus escuros olhos de Cornualles irradiavam desaprovação.
—Se explique.
—A senhora Petre é um problema.
Não parecia ser um problema, apoiada na beirada da poltrona
vermelha, fazendo equilíbrios com sua bolsa, suas luvas e suas
notas.
Seu pálido rosto emoldurado pelo horrível chapéu negro tinha
sido a imagem do decoro até que lhe tinha explicado que um
homem amassa e esmaga seu corpo dentro de uma mulher como se
fosse uma «maça». Então seus claros olhos cor avelã se acenderam
de ardor. Seus soberbos seios se avultaram dentro de seu vestido de
lã, sensíveis. Tão sensível às palavras. Ao suave toque do tecido
esfregando contra a pele livre das ataduras. A cada respiração, seus
mamilos foram ficando cada vez mais duros.
Não era seu corpo o que ela tentava sujeitar com as barbatanas
do espartilho. Eram seus desejos.
Que tipo de homem era Edward Petre que preferia abster da
paixão genuína, pelo prazer pago?
Ramiel apoiou o queixo sobre a ponta de seus dedos,
ocultando-se atrás de uma dura inflexibilidade seus pensamentos e
uma fome voraz e repentina.
—Talvez seja assim. Mas é meu problema.
— Esqueceste, Ibn?
Cada vez que Muhamed o chamava Ibn, Ramiel o recordava.
Algumas vezes, esquecia... Quando tinha sexo com alguém.
Elizabeth Petre o fazia esquecer só com as palavras. Quanto tempo
havia passado de que Ramiel tinha desejado uma mulher... E não
simplesmente para esquecer? Quanto tempo havia passado de que
tinha rido?
—Não esqueci, eunuco. - Replicou fria e deliberadamente,
Ramiel.
Muhamed voltou à cabeça bruscamente.
Imediatamente, Ramiel se arrependeu de suas palavras.
Muhamed não tinha pedido para levar a carga que lhe tocava, como
tampouco ele a sua. Perguntou-se como sobrevivia seu criado,
incapaz de escapar a seu passado dentro do corpo de uma mulher,
embora fosse brevemente. Pelo menos Ramiel tinha esse privilégio.
Minutos inteiros, aonde o único que importava era o som da carne
que investia, úmida e o calor suave de uma pele feminina
possuindo-o, absorvendo-o até que lhe tirasse a dor e deixasse só a
lembrança. Rogava a Alá e a Deus para que lhe permitisse
encontrar uma mulher que pudesse aceitar o que ele não era capaz
de suportar.
—Vá. - Ordenou Ramiel brandamente, controlando a fúria e a
repugnância que sentia por si mesmo. – Contrate alguém. Não me
importa o que custe. Quero saber tudo o que faz Edward Petre.
Todos os lugares que visita. Todas as pessoas com quem fala.
Todas as mulheres com as quais se deitou alguma vez. Eu quero
me inteirar. E espero que não me volte a falhar.
Com o corpo tenso como a cimitarra que levava sob as dobras
da capa e seu thobs, Muhamed se dispôs a se retirar da biblioteca.
Ramiel baixou a vista para a xícara vazia que descansava perto
de seu cotovelo. A xícara cheia que Elizabeth Petre tinha deixado
rapidamente depois de dar um gole no quente café turco.
Muhamed tinha razão. Uma mulher como Elizabeth Petre
podia causar a um homem como ele, muitos problemas. Aqui, na
Inglaterra, ele estaria preparado.
—Muhamed.
O homem da Cornualles se deteve ante o som da voz de
Ramiel, com a mão a ponto de fechar a porta.
—Não repetirei os enganos que cometi no passado.
CAPÍTULO IV
Um estrondoso som metálico afastou bruscamente Elizabeth
debaixo do corpo nu do Sheik Bastardo. Um aroma espesso invadia
o ar. “E por quê, sente estima você, Lorde Safyre? Por uma mulher,
senhora Petre. Uma mulher quente, úmida e voluptuosa, que não
teme sua sexualidade e nem sente vergonha de satisfazer suas
necessidades”.
Elizabeth abriu os olhos de repente.
A face redonda e simpática de Emma estava envolta em
fumaça, inclinou sobre a mesinha junto à cama, fazendo girar uma
colher dentro de uma xícara de porcelana. Uma pequena jarra
descansava ao lado da xícara, sobre uma bandeja de prata.
O aroma forte que impregnava o ar não era o do açucarado do
café turco, pensou Elizabeth entre sonhos. Era o doce aroma do
chocolate.
—Se está doente, Elizabeth, deveria ter enviado uma nota para
minha casa.
Elizabeth pestanejou.
O rosto de sua mãe se fez visível. Estava emoldurada por um
chapéu de seda negro. Seus olhos de cor verde esmeralda
censuravam Elizabeth, como quando era menina e não tinha
completado as expectativas de seus pais.
Elizabeth despertou por completo, com o coração palpitando.
«Ela sabe o do Sheik Bastardo», foi a primeira coisa que pensou. E
imediatamente: como se deu conta?
A manhã anterior tinha sido estranha, mas nessa manhã
Elizabeth tinha retornado a sua casa as cinco e trinta e cinco, um
quarto de hora antes que os criados despertassem. Era impossível
que alguém soubesse algo sobre suas duas visitas ao Sheik
Bastardo.
Mas por que outro motivo estaria sua mãe ali...? - Deveria ter
enviado uma nota para mim. Perfurou as trevas de seu sonho e o
incipiente temor lhe paralisou. Elizabeth olhou rapidamente para a
janela. Era terça-feira. Sua mãe e ela sempre iam às compras as
terças-feiras pela manhã. Depois almoçavam juntas. A julgar pela
cinza luz invernal que entrava pelas cortinas, era quase meio-dia. O
sangue quente se amontoou na face de Elizabeth. Emma e sua mãe
estavam a seu lado observando-a, enquanto ela sonhava que o
Sheik Bastardo se ocupava de seu corpo como se seu membro viril
fosse realmente uma maça e ela uma erva pertinaz que devia ser
totalmente amassada e esmagada até a submissão. “Taliba, ele
tinha lhe sussurrado, investindo forte e profundamente. Mova seus
quadris para mim...”
Apertou suas pálpebras, consciente do áspero sabor do café
turco que seguia em sua boca e o desejo frustrado que continuava
palpitando no mais profundo de seu ser. Emma se atrasou um
pouco em servir o chocolate quente. Uma faísca de ressentimento
se acendeu dentro de Elizabeth. Sua mãe não deveria estar em sua
casa e o Sheik Bastardo não deveria estar em seus sonhos. Abriu os
olhos, se voltou sobre suas costas e forçou um sorriso.
—Bom dia, mãe. Temo que dormi demais. Se me esperar na
sala, me vestirei em seguida me reunirei a ti. Emma, por favor,
acompanhe minha mãe e mande servir o chá.
—Muito bem, senhora.
Sua criada deu um passo atrás e sua mãe deu um passo
adiante.
- Sua face estão vermelhas, filha. Se estiver doente, não há
necessidade que se levante. Sinto ter interrompido seu sonho, mas
estava preocupada. Na segunda-feira você cancelou todos seus
compromissos e agora isto. Sabe que seu pai está preparando
Edward para que se apresente ao primeiro-ministro quando ele se
retirar. Deve abonar o caminho para ele, tal como eu o faço para
seu pai.
O sorriso se congelou no rosto de Elizabeth. Rebecca Walters
estava preocupada... Porque Elizabeth não tinha cumprido com
suas obrigações. As únicas lembranças que tinha Elizabeth de sua
infância eram de sua mãe «abonando» o caminho para seu pai.
Cada momento livre, cada faísca de energia e cada ato de caridade
tinham sido dedicados a uma causa política.
— Alguma vez se cansa, mãe?
Os olhos cor verde esmeralda se abriram com impaciência.
—É obvio que sim. Também seu pai. E também seu marido,
devo acrescentar. Disso se trata tudo. - Assinalou Elizabeth na
cama. - Você na cama... Porque está cansada?
Sim, isso era exatamente do que se tratava, pensou Elizabeth
com um misto de raiva. Estava cansada... Cansada de ocupar o
quarto lugar em seu marido. Edward tinha sua política, sua amante,
seus filhos e logo depois sua esposa. Só por uma vez em sua vida
gostaria de ser a primeira. Somente uma vez em sua vida gostaria
de ficar na cama, livre de compromissos sociais, junto a um
homem que a amava.
—Não, mãe, não estou cansada. Ontem à noite tive uma
enxaqueca e tomei láudano para acalmar a dor. - Mentiu Elizabeth,
plenamente consciente de Emma, que rondava pela porta e tinha
que saber que estava mentindo. - Talvez tomei uma dose excessiva.
— E na segunda-feira?
Elizabeth forçou um sorriso. E adicionou outra mentira: —O
decano chamou. Queria falar comigo imediatamente, por isso...
— O que tem feito Phillip agora?
Poderia ter sido gracioso. Sua mãe repetindo as palavras que a
própria Elizabeth tinha perguntado ao decano. Não era. Enquanto
que Elizabeth considerava as travessuras de seu filho como uma
diversão passível, sua mãe criticava a gritos, as inocentes maldades
de Phillip.
—Não foi nada. - Se apressou em dizer. – Ele esteve envolvido
numa discussão com outro menino. Se não me visto logo, mãe, fará
muito tarde para almoçar. Emma...
Elizabeth se surpreendeu ligeiramente pela maneira em que
Emma empurrou suave, mas firmemente Rebecca Walters do
quarto. À jovem não tinha movido um fio de cabelo quando
escutou a mentira de Elizabeth. Talvez Edward tivesse «abonado»
a casa, para o engano, pensou cinicamente.
Levantou a colcha e arrastou suas pernas até a beirada da
cama. Tinha as pernas pálidas e os tornozelos magros, embora não
delicados. O roçar de suas coxas ao se mover para ao outro lado do
colchão lhe provocou um atrito morno e úmido. “Sabe você o que é
um orgasmo, senhora Petre”?
- Preparo-lhe o banho, senhora?
Elizabeth segurou o lençol com as duas mãos para se sujeitar à
cama. Emma estava em pé na entrada do quarto, observando com
indiferença para ela, cuja camisola lhe tinha subido acima dos
joelhos. Deslizou da cama, com o coração pulsando fortemente.
—Sim, por favor. Voltou muito rápido. Acreditei que foste
acompanhar minha mãe até lá embaixo.
—A senhora Walters não quis que a acompanhasse, senhora.
Disse-me que certamente você precisaria de mim para vestir.
Elizabeth mordeu o lábio inferior para não dizer que Ema era
sua criada e que aqui, nesta casa, a esposa do ministro da
Economia e Fazenda possuía uma categoria superior a da esposa do
primeiro-ministro. Mas em lugar disso disse:
—Então é melhor que me apresse. Não deveria ter me deixado
dormir até tão tarde.
—Por favor, desculpe-me. Pensei que precisaria descansar.
A Elizabeth sentiu seu coração acelerar. Saberiam os
criados...?
Sentia os lábios frios e duros.
— Por que pensou isso, Emma?
—Tem uma agenda muito apertada, senhora. Algumas vezes
acredito que trabalha mais que o senhor Petre.
As palavras da jovem eram muito enigmáticas, para
tranqüilizá-la. Tinha querido dizer que Elizabeth trabalhava muito
«abonando» o chão político a favor de seu marido? Ou que
Elizabeth tinha uma agenda muito apertada devido a suas recentes
escapadas matinais?
O banho quente não serviu para dissipar sua inquietação.
Devia terminar suas aulas logo, antes que a suspeita se tornasse
certeza. Se começasse haver rumores de seus encontros com o
Sheik Bastardo, seu matrimônio estaria terminado. E também a
carreira de seu marido. Mas inclusive enquanto contemplava a
possibilidade de finalizar o quanto antes sua perigosa
aprendizagem, seus pensamentos se dirigiram ao” O Jardim
Perfumado”, deixando de um lado a razão. O que teria escrito o
Sheik no segundo capítulo?
Passou a pedra do sabonete sob seus seios. E se perguntou se
o Sheik Bastardo teria esfregado alguma vez pétalas de flor contra
a pele de uma mulher, naquele lugar.
Emma esperava Elizabeth, com várias peças de roupa.
Ocultando-se atrás de um biombo esmaltado de branco, Elizabeth
colocou alguns calções de algodão, meias de lã e uma regata de
linho antes de se reunir com a jovem, para que a ajudasse com o
espartilho. Elizabeth conteve o fôlego, para que ela pudesse ajustar
bem o objeto. Tinha usado espartilho durante vinte e três anos. Não
deveria se sentir como se as barbatanas fosse uma prisão. Não tinha
sido assim até agora.
O espartilho foi rapidamente seguido de duas anáguas.
Elizabeth tentou respirar, inalando o aroma do amido e do sabão de
lavar. Como cheiraria a amante de Edward? Perguntou-se.
Moveria-se Edward como uma maça enquanto que sua amante
balançava os quadris de um lado a outro o acompanhando,
lascivamente? Ou seriam certos movimentos sexuais específicos
dos árabes?
Emma deixou cair um pesado vestido de lã negro sobre as
anquinhas de Elizabeth.
—Se se aproximar da penteadeira, lhe arrumarei o cabelo,
senhora Petre.
Elizabeth ficou pálida.
Emma lhe tinha penteado o cabelo na noite anterior e lhe
fizera, como todos os dias, uma trança. Mais tarde, quando
Elizabeth se vestiu para sua aula, tinha utilizado a trança para fazer
um coque. Após colocar novamente a camisola e pendurar a roupa
para que ninguém soubesse que tinha estado fora da casa, tinha
esquecido de soltar o cabelo.
—Obrigado, Emma. - Disse com os lábios rígidos.
A face de Elizabeth no espelho da penteadeira estava branca
como o giz, a mesma cor que o avental de Emma. As mãos
robustas e eficientes da jovem se moveram habilmente pelas
mechas de cor mogno escuro, desprendendo, desenroscando,
torcendo e voltando a prender.
Emma deu um passo atrás, com seu queixo quadrado e um
pescoço gordinho apareceram no espelho por cima do avental
branco.
— Quer que lhe aproxime seu joalheiro, senhora?
—Não será necessário.
—Muito bem, senhora.
Elizabeth se deu conta de que Emma seguia sendo um enigma,
mesmo depois de dezesseis anos.
— Já foi casada alguma vez, Emma?
—Não, senhora. Os senhores não promovem o matrimônio entre
os criados.
—Eu não me oporia.
A lição secreta da sedução
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A lição secreta da sedução

  • 1. O TutorO Tutor Robin Schone Resumo: Elizabeth Petre é a honrada esposa de um aspirante a primeiro Ministro britânico. Diante da Sociedade tem que representar o papel da esposa perfeita, em sua casa, seu marido se mostra desdenhoso, quando não indiferente com ela. Para Elizabeth é cada vez mais penoso que seu marido a mantenha longe de seu coração e de seu leito e tem a idéia de voltar a seduzí-lo, de fazer com que esqueça suas inúmeras amantes, aprendendo as mesmas artes que elas. Para conseguir, recorre a Ramiel Devington, o filho bastardo de uma nobre inglesa e um Sheik árabe. Repudiado pela sociedade britânica, ele aceita a proposta da dama, pois intui que apesar de sua fria aparência, Elizabeth esconde um espírito livre e apaixonado que prisioneiro de convencionalismos, anseia em escapar e poder desfrutar tudo o que a vida pode oferecer. Dia a dia, lição a lição, Ramiel vai mostrando a Elizabeth um mundo desconhecido, ensinando-lhe todos os segredos da arte da sedução e sutilmente, atiça o fogo e a sensualidade, com conseqüências dramáticas e inesperadas para os dois. *Baixei da Net a uns dois anos, sem formatação e em TM, dei uma ajeitada...
  • 2. CAPÍTULO I Ramiel não consentiria que nenhuma mulher o chantageasse e não lhe importava quão forte pudesse ser sua necessidade de satisfação sexual. Apoiou-se contra a porta da biblioteca e observou com os olhos semicerrados à mulher que estava em pé frente às portas envidraçadas que davam ao jardim. Ligeiros retalhos de bruma se estendiam entre ela e as cortinas abertas. Em contraste com estas, como colunas de seda amarela, a mulher parecia um escuro monólito embainhado em lã negra. Elizabeth Petre. De costas, não a reconheceu, coberta como estava, dos pés a cabeça com um chapéu e uma grossa capa negra. Mas na realidade não a teria reconhecido nem nua frente a ele, com os braços e as pernas abertas lhe convidando lascivamente. Ele era o Sheik Bastardo, filho ilegítimo de uma condessa inglesa e de um Sheik árabe. Ela era a esposa do ministro da Economia e Fazenda e seu pai o primeiro-ministro da Inglaterra. Pessoas como ela não se misturava socialmente com gente como ele, salvo a portas fechadas e sob lençóis de seda.
  • 3. Ramiel pensou na mulher de escuros cabelos cuja cama acabava de deixar, apenas uma hora. A marquesa de Clairdon o tinha seduzido num baile de rameiras, onde tinha dançado nua igual ao resto das assistentes. Usara-o para alimentar sua excitação sexual e durante algumas horas se converteu no animal que ela desejava, investindo, esmagando e amassando no interior de seu corpo até encontrar aquele momento de liberação perfeita onde não existiam nem passado, nem futuro, nem Arábia, nem Inglaterra, somente o esquecimento. Talvez teria possuído também aquela mulher se esta não tivesse forçado a entrada de sua casa deliberadamente através da coação e a chantagem. Com os músculos tensos pela cólera contida, afastou devagar do frio contato do mogno e atravessou silencioso o tapete persa que cobria o chão da biblioteca. — O que é que pretende, senhora Petre, invadindo meu lar e me ameaçando? Sua voz, um áspero murmúrio de refinamento inglês que ocultava a ferocidade árabe, ricocheteou no arco formado pelas portas e alcançou a barra de bronze da cortina que bordeava o muito alto teto circular. Pôde sentir o sobressalto de temor da mulher, farejando-o quase por cima da neblina úmida. Ramiel desejava que sentisse medo. Desejava que se desse conta de quão vulnerável era, sozinha na guarida do Sheik Bastardo sem que seu marido ou seu pai pudessem protegê-la. Queria que soubesse da maneira mais elementar e primitiva possível que seu corpo lhe pertencia para dar a quem quisesse e que não admitiria chantagens na hora de conceder seus favores sexuais. Ramiel fez uma pausa sob o abajur aceso e esperou a que a mulher se voltasse e enfrentasse as conseqüências de sua maneira de agir.
  • 4. O gás que queimava vaiou, causando uma pequena explosão no gélido silêncio. —Vamos, senhora Petre! Não foi tão reservada com meu criado. —Disse, provocando-a brandamente, sabendo o que ela queria, desafiando-a a pronunciar as palavras. Palavras proibidas, palavras conhecidas: «Quero gozar com um árabe. Quero desfrutar com um bastardo»—. O que poderia querer uma mulher como você, de um homem como eu? Lenta, muito lentamente, a mulher se voltou, num redemoinho de lã entre as brilhantes colunas amarelas das cortinas de seda. O véu negro que cobria sua face não pôde ocultar a impressão que lhe causou. Um sorriso zombeteiro se apropriou dos lábios de Ramiel. Sabia o que ela estava pensando. O que toda mulher inglesa pensava quando o via pela primeira vez. Um homem que é meio árabe não tem o cabelo da cor do trigo dourado pelo sol. Um homem que é meio árabe não se veste como um cavalheiro inglês. Um homem que é meio árabe... —Quero que me ensine como agradar um homem. A voz da mulher estava sufocada pelo véu, mas suas palavras foram diáfanas. Não eram as que tinha esperado. Durante um minuto que pareceu eterno, o coração de Ramiel deixou de pulsar dentro de seu peito. Imagens eróticas desfilaram ante seus olhos... Uma mulher... Nua... Possuindo-o... De todas as formas em que uma mulher pode possuir um homem... Pelo prazer dele... E também pelo dela. Um fogo abrasador estalou entre suas pernas. Podia sentir, contra sua vontade, que sua pele se inchava, endurecia, lhe trazendo lembranças que nunca voltariam, exilado como estava naquele país frio e sem paixão aonde as mulheres o usavam para suas próprias necessidades... Ou o desprezavam pelas suas.
  • 5. Uma fúria primitiva se apropriou de seu ânimo. Contra Elizabeth Petre, por invadir seu lar para sua própria satisfação egoísta sob a aparência de querer aprender como dar prazer a um homem. Contra ele mesmo que aos trinta e oito anos ainda sentia a necessidade de pegar o que ela podia oferecer, ainda sabendo que era uma mentira: as mulheres inglesas não estavam interessadas em aprender a fazer gozar um Sheik Bastardo. Com uma lentidão deliberada, Ramiel se aproximou da mulher, escondida atrás de um manto de respeitabilidade. Para sua surpresa, ela não retrocedeu ante sua fúria. E também para a dela, ele se contentou só levantando seu véu para trás. De perto e sem o fino tecido negro que impedia sua visão, a mulher pôde apreciar claramente sua estirpe árabe. Tinha a pele escura, torrada pelo mesmo sol que tinha dourado seu cabelo. Agora ela se daria conta de que sua aparência de cavalheiro inglês era só isso, uma aparência. Tinha aprendido a ser homem num país aonde a mulher vale a metade do que vale um homem... Podiam ser vendidas, violadas ou assassinadas por se atrever a fazer muito menos do que aquela mulher se atrevia a fazer agora. Elizabeth Petre devia sentir medo. —Agora, me diga de novo o que deseja. - Murmurou sedutor. Ela não retrocedeu ante o aroma que ele emanava: brandy misturado com perfume, suor e sexo. —Quero que me ensine como agradar a um homem. - Repetiu serena, elevando a cabeça para lhe olhar nos olhos. Não media mais de um metro sessenta... Tinha que levantar muito a vista. A senhora Elizabeth Petre tinha a pele muito branca, o tipo de brancura estimável que num leilão árabe representa a escravidão
  • 6. para uma mulher. Não era jovem. Ramiel julgou que devia ter mais de trinta. Mostrava ligeiras rugas nos extremos de seus pálidos olhos cor avelã. O rosto que se elevava para ele era mais redondo que oval, o nariz mais arrebitado que aquilino e seus lábios muito magros. Tinha as pupilas dilatadas, mas, além disso, sua face não refletia nem rastro do temor que certamente estava sentindo. Maldita seja! Por que não o demonstrava? Um músculo se moveu nervosamentna seu queixo. — E o que lhe faz acreditar que sou capaz de lhe ensinar semelhante proeza, senhora Petre? —Porque você é o... —Vacilou um instante ante seu apelido, Sheik Bastardo. Podia ser o bastante atrevida para tentar chantageá-lo em troca de sexo, mas não o suficiente para lhe chamar bastardo. —Porque você é o único homem que... —Nem sequer era capaz de terminar a frase, que ele era o único homem na Inglaterra famoso por ter recebido um harém ao cumprir os treze anos. Levantou ainda mais o queixo. —Porque ouvi por acaso uma... Uma mulher dizer que se os maridos estivessem dotados só com a metade de suas habilidades, não haveria uma só mulher infiel em toda a Inglaterra. A brutalidade de Ramiel estalou num mordaz sarcasmo. —Então me envie a seu marido, senhora e o instruirei para que você possa lhe ser fiel. Os lábios de Elizabeth Petre se endureceram, contraindo pela inquietação... O temor ou a ira. —Vejo que não me deixará conservar nem sequer um pouco de orgulho. Muito bem. Amo a meu marido. Não é ele quem necessita
  • 7. de adestramento para evitar que eu me extravie, mas justamente o contrário. Não desejo me deitar com você, senhor. Só quero que me ensine como agradar meu marido para que ele se deite comigo. Todo o calor do corpo de Ramiel se dissipou. — Você não deseja se sujar com as mãos de um árabe, senhora Petre? —Perguntou suave e perigosamente. —Eu não desejo ser infiel a meu marido, —respondeu sem alterar. Ramiel se encheu com uma reticente admiração. A Elizabeth Petre não faltava valor. Havia rumores de que o ministro da Economia e Fazenda tinha uma amante. Edward Petre era um plebeu. Se pertencesse à classe dos aristocratas, a sociedade não estaria interessada em suas relações extraconjugais, mas seus eleitores eram de classe média e exigiam que seus representantes políticos fossem tão irrepreensíveis moralmente como era sua rainha. Sem dúvida, Elizabeth Petre estava mais preocupada com a possível ruína da carreira de seu marido que por perder seus cuidados no dormitório. —As mulheres que amam seus maridos não pedem a desconhecidos que lhes ensinem como agradar um homem. - Disse cortante. —Não, as covardes que amam seus maridos não pedem a pessoas desconhecidas que lhes ensinem como agradar um homem. As covardes dormem sozinhas, noite após noite. As covardes aceitam o fato de que seus maridos encontrem prazer com outra. As covardes não fazem nada, não as mulheres. A palavra covarde retumbou no repentino silêncio. Uma respiração, em intervalos breves e rápidos enfraqueceu o rosto de Ramiel... O fôlego da mulher. Um hálito semelhante, com pausas mais largas, misturou com o dela no ar frio do inverno...
  • 8. Seu próprio fôlego era impossível saber. A mulher tinha o rosto de uma esfinge. Elizabeth Petre piscou rapidamente. Durante um instante eterno, Ramiel pensou que tinha pestanejado num áspero intento de paquerar, mas logo viu o brilho das lágrimas, que formavam um filme sobre seus olhos. —Resisto a ser uma pessoa covarde. —Ergueu os ombros. O movimento provocou que as barbatanas de um espartilho muito apertado rangessem. - Por isso, uma vez mais, rogo-lhe que me ensine como agradar um homem. O sangue golpeou as têmporas de Ramiel. De algum jeito, as mulheres árabes e as inglesas se pareciam. A mulher árabe usa véu, a inglesa, espartilho. Uma esposa árabe aceita às concubinas de seu marido com resignação. Uma esposa inglesa aceita às amantes de seu marido ignorando-as. Em nenhuma das duas culturas, uma mulher pactua descaradamente instrução sexual com outro homem para assegurar as cuidados de seu marido. Ramiel notou um aroma desagradável que provinha da capa de Elizabeth. Tinham lavado a lã recentemente. As mulheres vinham a ele envoltas em perfumes. Nenhuma lhe tinha aproximado jamais cheirando a benzeno. Ramiel se perguntou de que cor seria seu cabelo... E qual seria sua reação se estirasse a mão e lhe tirasse da cabeça o horrível chapéu negro que o ocultava. Deu um passo atrás com brutalidade. — E como poderia lhe ensinar a dar prazer a seu marido se eu mesmo não me deitar com você, senhora Petre? —Espetou-lhe. Os olhos dela permaneceram imperturbáveis, indiferentes à curiosidade sexual que se apoderava do corpo de Ramiel. —As mulheres que vivem nos haréns, aprendem a agradar a um homem indo para cama com outro?
  • 9. Por um segundo, Ramiel se transladou para a Arábia, quando tinha doze anos. Uma concubina de loiros cabelos, a favorita de um visir, havia sentido a curiosidade de provar o filho infiel, ainda sem circuncidar, do Sheik. Ramiel, preso entre o sonho e os seios perfumados de ópio, tinha pensado que era uma hurí, um anjo muçulmano enviado para fazê-lo desfrutar do paraíso. A concubina tinha sido lapidada no dia seguinte. —Uma mulher árabe seria condenada a morte se o fizesse. - Disse Ramiel, rotundamente. —Mas você esteve com essas mulheres... —Estive com muitas mulheres... Ela ignorou sua brutalidade. —Portanto, se for possível que uma mulher árabe aprenda a agradar a um homem sem contar com a experiência pessoal, não vejo motivo pelo qual você, um homem que se beneficiou dessa preparação, não possa por sua vez instruir uma mulher inglesa. Muitas mulheres inglesas lhe tinham pedido a Ramiel que mostrasse as técnicas sexuais que os homens árabes usavam para agradar uma mulher. Mas nenhuma lhe tinha pedido jamais que lhe ensinasse as técnicas sexuais que as mulheres árabes empregavam para agradar um homem. Foram os efeitos dos fortes licores consumidos misturados com uma noite de sexo intenso, que provocaram a seguinte pergunta de Ramiel. Ou talvez foi a mesma Elizabeth Petre. E perceber uma pontada de dor ante o que nenhuma mulher, nem oriental nem ocidental, arriscaria por ele como o que aquela confrontava por seu marido. Punha em jogo sua reputação e seu matrimônio para aprender a agradar sexualmente um homem para que não tivesse que recorrer a uma amante. O que faltaria para que uma mulher como ela, uma mulher respeitável, queria um homem como ele, nascido na Inglaterra e
  • 10. acolhido na Arábia, e que agora não pertencia a nenhum dos dois lugares? Como seria ter uma mulher disposta a fazer tudo para obter seu amor? —Se eu me fizesse cargo de sua instrução, senhora Petre, o que quer aprender? —Tudo o que possa me ensinar. Aquele tudo vibrou no frio ar matinal. O olhar de Ramiel se cravou no seu. —Entretanto, você disse que não tem nenhum desejo de ir para a cama comigo. - Disse com dureza. O rosto de Elizabeth permaneceu impassível. Era o rosto de uma mulher que não está interessada na paixão de um homem, nem na sua própria. —Estou segura de que você possui suficiente conhecimento para ambos. —Sem dúvida. Mas meu conhecimento se centra nas mulheres. —De repente, sua inocência lhe repugnou. - Não tenho por costume seduzir os homens. —Mas as mulheres... Flertam com você, não é assim? —Insistiu ela. O corpo nu da marquesa tinha brilhado suarento enquanto dançava ao ritmo de seu desejo. Não possuíra nenhuma delicadeza... Nem fora nem dentro da cama. —As debutantes flertam. As mulheres com as quais me deito não são virgens. - Examinou com insolência a volumosa capa negra de Elizabeth Petre, que não deixava entrever nem o vigor dos seios, nem a curva dos quadris para seduzir um homem. - São mulheres experimentadas que sabem o que querem. —E me diga se for tão amável, o que é o que querem?
  • 11. —Prazer, senhora Petre. —Foi intencionalmente comum e grosseiro. - Querem o prazer de uma mulher. - E você acredita que como sou maior que essas mulheres e meu corpo não é tão perfeito como o seu... - Acredita que eu não desejo também prazer, Lorde Safyre? O olhar de Ramiel se encontrou com a dela. Uma corrente elétrica de desejo puro e inocente percorreu subitamente seu corpo. Emanava de Elizabeth Petre. Desejos sensuais, desejos sexuais... E seu rosto continuava sendo uma máscara sem expressão. Uma mulher virtuosa não devia buscar um homem para aprender a agradar a seu marido. Uma mulher virtuosa não devia admitir que desejava satisfação física em seu matrimônio. Quem era Elizabeth Petre para se atrever a fazer o que outras mulheres nem sequer sonhavam? —Um homem é algo mais que uma série de alavancas e molas que devem ficar em funcionamento para receber satisfação. - Exortou Ramiel de forma brusca, profundamente consciente da fria perfeição daquela pálida pele feminina e do sangue quente que palpitava entre suas pernas. - O gozo de um homem depende da habilidade de uma mulher para receber prazer. Se você desejar este último, ele obterá o primeiro. Elizabeth ficou rígida e seu espartilho rangeu de novo de modo revelador. A ira apareceu em seus olhos... Ou possivelmente fora o reflexo da luz do abajur que se encontrava sobre ambos. —Tenho dois filhos, senhor. Sou plenamente consciente de que um homem não é feito de alavancas e molas. Além disso, se a satisfação de meu marido dependesse do desejo de uma mulher, então não teria abandonado meu leito. Por último, Lorde Safyre, me ensinará você, como agradar um homem ou não?
  • 12. O corpo de Ramiel adquiriu uma certa tensão. Elizabeth Petre lhe estava oferecendo a suprema fantasia, a qual aspira um homem. Uma mulher a quem podia ensinar todos os atos sexuais que sempre tinha sonhado que uma mulher fizesse... Com ele... A ele. —Pagarei-lhe. - Ofereceu ela, torpemente. Ramiel a examinou cuidadosamente, tentando ver além daquela máscara sem emoção que era seu rosto. — Como me pagará, senhora Petre? Não restava dúvida da grosseira sugestão. —Com moeda inglesa. Nem tampouco podia haver engano na ingenuidade deliberada que ela tinha empregado. Ramiel dirigiu um resolvido olhar pela biblioteca, para as prateleiras que iam do teto ao chão transbordantes de livros encadernados em couro, aos custosos painéis revestidos de seda distribuídos nas três paredes restantes, ao aparador com incrustações de madrepérola, a lareira de mogno esculpida, verdadeira obra de arte da marcenaria inglesa. —Esta é uma das vantagens de que meu pai seja um Sheik. Não necessito seu dinheiro. - Replicou com desinteresse fingido, perguntando de uma vez até onde chegaria ela em sua busca de conhecimento sexual, e até onde iria sua busca de esquecimento. - E Para falar a verdade, nem o dinheiro de ninguém. O olhar da mulher não vacilou frente à sua. Ela podia lhe chantagear... Mas não suplicaria. — Sabe o que me está pedindo, senhora Petre? —Perguntou-lhe brandamente. —Sim. A ignorância brilhou em seus claros olhos cor avelã. Elizabeth Petre pensava que uma mulher como ela, uma mulher mais velha e sem o corpo «perfeito», uma mulher com dois filhos, casada respeitosamente, não podia apresentar atrativo algum para
  • 13. um homem como ele. Não compreendia que a curiosidade de um homem pudesse converter numa força motriz ou que o desejo de uma mulher pudesse provocar uma atração poderosa. Ramiel conhecia estas coisas muito bem. E também sabia que o desejo mútuo podia unir um homem e uma mulher de maneira mais forte que os votos pronunciados numa igreja ou numa mesquita. Um opaco resplendor ambarino penetrou pelos cristais. Em algum lugar sobre a neblina amarelada que anunciava outra manhã londrina brilhava o sol e o começo de um novo dia. Girando bruscamente, Ramiel cruzou o tapete e estirou o braço para pegar de uma das prateleiras, um pequeno volume forrado em couro. ““ O Jardim Perfumado”, do Sheik Mohamed ao Nefzawi”. Em árabe se titulava “Ao Rawd ao atir fi nuzhat ao khatir”, “ O Jardim Perfumado” para o deleite da alma. Tinha sido traduzido mais popularmente como “ O Jardim Perfumado” para a pulverização da alma. Ramiel o tinha memorizado e repetido tantas vezes como os meninos na Inglaterra faziam com as gramáticas grega e latina. Embora a gramática preparava os meninos ingleses para ler os autores gregos e latinos, “ O Jardim Perfumado” tinha proporcionado a Ramiel os conhecimentos suficientes para satisfazer a uma mulher. Também brindava excelentes conselhos para as mulheres que queriam aprender agradar um homem. Sem se deter para reconsiderar aquele ato, voltou-se para a janela e lhe ofereceu o livro. —Amanhã pela manhã, senhora Petre. Esteja aqui. Em minha biblioteca. —Mohamed havia dito que tinha chegado Às...— As cinco em ponto. Uma pequena e magra mão embainhada numa luva de couro negro surgiram entre as pesadas dobras de sua capa de lã. Os delicados dedos aferraram com firmeza o livro. —Não compreendo.
  • 14. —Você deseja que eu a instrua, madame; portanto, o farei. As aulas começam amanhã pela manhã. Este será seu livro de texto. Leia a introdução e o primeiro capítulo. Elizabeth baixou a cabeça. O véu dobrado para cima mantinha seu rosto em sombra, ocultando sua expressão. —”O Jardim Perfumado”, do... — Desistiu de tentar pronunciar o resto do título. - Sheik Nefzawi. - Suponho que não é um livro sobre o cultivo das flores. Os lábios de Ramiel se contraíram numa divertida careta. —Não, senhora Petre, é evidente que não. —Certamente, tampouco é imprescindível começar as aulas tão logo. Necessitarei de tempo para assimilar o que li... Ramiel não queria lhe dar tempo para assimilar. Queria impressioná-la. Queria excitá-la. Queria lhe arrancar aquela aborrecida capa negra e sua fria reserva inglesa e encontrar a mulher que havia sob ela. —Você me pediu que a instruísse, senhora Petre. Se tiver que fazê-lo, deve seguir minhas indicações. Sem contar com o prefácio e a introdução, há vinte e um capítulos no ” O Jardim Perfumado”. Amanhã veremos a introdução e o primeiro capítulo. Depois de amanhã discutiremos o segundo e assim sucessivamente, até que termine sua instrução. Se precisar de mais tempo para refletir sobre suas lições, terá que procurar outro tutor. A batida distante de uma porta no apartamento de cobertura ressoou através das paredes, como se tivesse divulgado no momento justo, seguiu-lhe um estrepitoso som de metal, uma frigideira colocada com força sobre a cozinha de ferro enquanto o cozinheiro preparava o café da manhã para os serventes que já se levantaram. O livro e sua mão enluvada desapareceram dentro da negra capa de lã. O espartilho rangeu perceptivelmente pelo brusco movimento.
  • 15. - As cinco é muito tarde. Teremos que começar às quatro e meia. Importava-lhe pouco a hora em que se levassem a cabo as aulas, seu único interesse era ver quanto aprenderia uma mulher como ela de um homem como ele. —Como você deseje. Seu pescoço era magro como a mão. Os sapatos que apareciam por debaixo de sua protetora capa eram estreitos. O que desejava encerrar tão estreitamente dentro dos limites daquele espartilho, a pele... Ou o desejo? —Toda escola tem suas regras, senhora Petre. A regra número um é a seguinte: não usará espartilho enquanto estiver em minha casa. Sua fina pele branca ficou de uma cor vermelha carmesim. Ramiel se perguntou se adquiriria essa mesma cor acesa quando se excitava sexualmente. Perguntou se alguma vez seu marido a tinha excitado sexualmente. Elizabeth girou com força a cabeça para trás. —O que eu use ou não use, Lorde Safyre, não lhe incumbe... —Pelo contrário, senhora Petre. Você me procurou para lhe ensinar o que dá prazer a um homem. Portanto, o que você usa me incumbe se for em detrimento da consecução desse objetivo. Asseguro-lhe, um ruidoso espartilho não causa prazer a um homem. —Talvez não a um homem de sua natureza... A boca de Ramiel se endureceu involuntariamente. Infiel. Bastardo. Não havia nome que não lhe tivessem chamado, em árabe ou em inglês. Sentia estranhamente desiludido ao comprovar que ela tinha os mesmos prejuízos que outros. —Já comprovará, senhora Petre, que quando se trata do prazer sexual, todos os homens são de uma certa natureza.
  • 16. Jogou para trás o queixo num gesto que cada vez se fazia mais familiar. —Não tolerarei nenhum tipo de contato físico com você. Ramiel sorriu cinicamente. Havia coisas que afetavam uma pessoa muito mais que o simples contato. Palavras. A morte. Dabid... —Como você queira. —Inclinou fugazmente a cabeça e os ombros numa pequena reverência. - Lhe dou minha palavra como homem do Ocidente e do Oriente que não tocarei seu corpo. Embora parecesse impossível Elizabeth ficou ainda mais rígida. Acompanhou-lhe o ranger de seu espartilho. —Estou segura de que você compreenderá que nossas aulas devem ser mantidas no mais estrito sigilo... Ramiel pensou na ironia da formalidade inglesa. Ela o tinha chantageado e, entretanto, pretendia que ele se comportasse como um cavalheiro e fosse reservado com aquela indiscrição. —Os árabes têm uma palavra para um homem que fala do que acontece na intimidade entre ele e uma mulher. Chamam-no siba, está proibido. Asseguro-lhe que em nenhum caso a comprometerei. Ela apertou sua boca com o controle do que os ingleses usavam em momentos difíceis. Era evidente que não confiava no conceito de honra árabe. —Que você tenha um bom dia, Lorde Safyre. Ramiel inclinou a cabeça. —MA’A e-salemma, senhora Petre. Estou seguro de que conhece o caminho de saída. A partida de Elizabeth Petre foi patente por um movimento áspero de lã e o clique seco da porta da biblioteca, que se abriu e logo se fechou. Ramiel observou com atenção a neblina amarela que se formava no exterior e se perguntou como tinha chegado até sua casa. Um carro de aluguel? Sua própria carruagem?
  • 17. Imaginava que teria sido um carro de aluguel. A mulher se dava conta perfeitamente do perigo que corria se tirasse o chapéu a relação entre ambos. O estômago de Ramiel se contraiu de raiva. O filho. Ele era o Sheik Bastardo. Ele era Lorde Safyre. E ele era o ibn. O filho... Que tinha falhado. Nunca mais levaria o título de Ramiel ibn Sheik Safyre. Ramiel, filho do Sheik Safyre. Voltou-se, com o corpo tenso como não o tinha estado nos últimos trinta minutos. Mohamed usava um turbante, calças folgadas e thobs, uma camisa solta até as pantorrilhas. Estava com o Ramiel de os vinte e seis anos. Um eunuco para proteger ao filho bastardo de um Sheik que aos doze anos não soubera proteger. E tampouco soubera aos vinte e nove. Ramiel procurou em seu casaco e encontrou ali o cartão. No ângulo inferior direito estava impressa uma direção com uma decorativa letra. —Siga Elizabeth Petre, Mohamed. Assegure-se de que não se meta em mais problemas dos que já se colocou. A expressão de Ramiel se endureceu. A homens como o ministro da Economia e Fazenda que se casavam com mulheres virtuosas para que lhes dessem filhos não lhes agradaria que sua esposa realizasse esses mesmos atos sexuais que eles procuravam em seus amantes. Ramiel tinha sido banido do país de seu pai. Não tinha nenhum desejo de sê-lo também do de sua mãe. Se sua instrução lhe conduzia problemas, devia estar preparado. —Quando ela estiver dentro, a salvo, vigie a casa. Siga seu marido. Quero saber quem é sua amante, onde e quando se encontra com ela e quanto tempo leva mantendo essa relação.
  • 18. CAPÍTULO II O ar denso da manhã envolvia o carro de aluguel, que despedia um aroma acre, como se tratasse de um ser vivo, com um coração pulsando ao compasso do de Elizabeth e respirando quando ela o fazia. Sua bolsa, aonde tinha metido o livro depois de deixar a casa do Sheik Bastardo, pressionava a parte interior de suas coxas. No exterior da suja janela do carro se moviam figuras esfumadas na neblina que começava a se dissipar. Os vendedores apregoavam suas mercadorias e os serventes regateavam os preços como se ela não tivesse passado os trinta minutos mais longos de sua vida tratando de convencer ao sedutor mais famoso da Inglaterra para que lhe ensinasse como lhe agradar sexualmente um homem. A voz do Sheik Bastardo ainda ressonava zombeteira, um sussurro de cortesia inglesa com um tom áspero. — Sabe o que me está pedindo, senhora Petre? Sim. Mentirosa, mentirosa, mentirosa, chiavam as rodas da carruagem. Uma mulher como ela desconhecia por completo o preço que um homem como ele podia exigir pelo conhecimento carnal. A ira invadiu Elizabeth como um fluxo ardente; Como se atrevia a lhe dizer que a satisfação de um homem radicava na habilidade feminina de receber prazer, como se fosse culpa dela que seu marido tivesse uma amante? Ainda sentia no nariz o aroma da fragrância dele! O Perfume de mulher, indubitavelmente. Era como se ele se impregnasse daquela fragrância. Não, era como se ele se impregnasse da mulher que o tinha usado. Cheirava como se tivesse esfregado cada centímetro de seu corpo contra cada centímetro daquele corpo feminino.
  • 19. Elizabeth fechou os olhos ante aquela imagem involuntária da pele cítrica pressionando para baixo, ao redor e dentro do corpo pálido de uma mulher. Luzes azuis e verdes cintilaram atrás de suas pálpebras Não, as luzes não eram nem azuis nem verdes. Eram turquesas. Da mesma cor que os olhos do Sheik Bastardo. Seu cabelo era inglês e sua pele árabe, mas seus olhos não pertenciam nem ao Oriente e nem ao Ocidente, Falavam de lugares aos quais Elizabeth nunca tinha ido, de prazeres que só tinha imaginado. Aqueles olhos a tinham julgado como mulher e a tinham achado imperfeita. A roda posterior da carruagem se afundou num buraco, fazendo- a abrir bruscamente os olhos. Cruzou os braços enquanto cravava o olhar no couro gasto do assento. As mulheres como ela, mais velhas e com defeitos, não eram escolhidas por homens como o Sheik Bastardo, mas também tinham direito a sentir prazer e ela não ia se amedrontar porque a fizesse precaver de cada segundo de sua idade ou de cada imperfeição de seu corpo. Durante dezessete anos tinha sido uma filha obediente submetendo-se a vontade de seus pais. Durante outros dezesseis anos tinha sido uma esposa dócil, reprimindo seus desejos para não provocar o rechaço de seu marido. O Sheik Bastardo havia dito que o livro com que planejava instruí-la tinha vinte e um capítulos. Podia suportar aqueles olhos turquesas, zombeteiros e cúmplices durante três semanas. Podia suportar tudo como aprender aquilo que precisava saber. O carro de aluguel se deteve com brutalidade.
  • 20. Elizabeth demorou alguns segundos em dar conta de que tinha chegado a seu destino e que não estava de novo detida no meio do tráfico. Empregou vários segundos mais em localizar o cabo da porta e abrir de um puxão. As esquinas da rua pareciam estranhas através do véu, negro, como se tivessem trocado de algum jeito escura, mas evidente nas duas últimas horas. Uma transformação que não se podia explicar pelo simples passado da alvorada obscura a claridade do dia. —É um xelim e dois penes, madame. Olhou fixamente ao chofer. Era um esqueleto de homem, consumido pela falta de alimento e pelas quatorze horas diárias de trabalho. Um halo de luz rodeava sua cabeça, o sol da manhã aparecendo través das nuvens de fumaça e neblina suspensas no céu, que rodeavam Londres em novembro, dezembro e janeiro, mas que esse ano se prolongaram até o mês de fevereiro. Elizabeth tinha dinheiro e saúde, contava com um marido distinto e dois filhos. Por que não podia estar contente com o que tinha? Colocou a mão nele bolsa, agarrou uma moeda e a lançou. —Fique com o trôco. O chofer o colheu com destreza e se levantou o chapéu: —Obrigado, madame. Necessitará o carro outra vez? Ainda não era muito tarde, sussurrou Elizabeth. Podia lhe pagar ao chofer agora para devolver o livro ao Sheik Bastardo e não seria necessário que tivesse mais contato com ele. Mas não era a mesma mulher da semana passada. Nem voltaria a ser nunca. Seu marido se pavoneou abertamente com sua amante público. Enquanto satisfazia seus apetites em outro lugar, ela tinha reprimido suas necessidades físicas acreditando que a felicidade conjugal se achava na família, não na carne. Seu matrimônio havia estado apoiado em mentiras.
  • 21. —Hoje não, obrigado. Mas sim necessitarei de um, manhã pela manhã. As quatro em ponto. Um sorriso de orelha a orelha apagou momentaneamente as linhas de cansaço cinzeladas no rosto do chofer e revelou a juventude que lhe pertencia por sua idade, embora não por sua experiência. Estalou os dedos para o cavalo. —Aqui estarei, madame. Elizabeth contemplou como o carro se perdia rapidamentna meio à torrente matinal de cavalos, carruagens e retalhos amarelados de neblina. Não tinha calculado ter que esperar uma hora que o Sheik Bastardo voltasse para sua casa depois de sua farra noturna. Agora teria que procurar alguma desculpa para explicar sua volta, numa hora em que normalmente deveria estar na cama. Um súbito estremecimento provocou que sua pele formigasse. Alguém a estava observando. Voltou-se enquanto sentia que o estômago lhe revolvia. Não havia ninguém na calçada. — Arenque A meio pene! Arenque fresco! Compre o seu para o café da manhã! Arenque A meio pene! Ao outro lado da rua, na calçada da frente, um jovem empurrava um carrinho de mão, vozeando sua mercadoria. Perto dali, apoiado contra um edifício de tijolo, havia uma escura figura... Um grupo de cavalos obstaculizou sua visão. O vapor emanava de seus corpos. Atiravam de uma carreta em que se amontoavam barris. Uma vez que teve passado, Elizabeth observou que o vendedor de pescado se deteve. A parte posterior de uma capa negra se inclinava sobre seu carrinho de mão. Uma mulher, sem dúvida uma criada, que comprava arenque fresco para o café da manhã.
  • 22. O temor se misturou com o alívio. Ninguém sabia de sua reunião com o Sheik Bastardo. Desta vez. Depois de caminhar três ruas até sua casa, ficou empapada de um suor fétido. E ainda podia cheirar o perfume. Sigilosamente, abriu com a chave a porta de entrada e, ao empurrá-la, Elizabeth surpreendeu ao mordomo no instantna que vestia a jaqueta. O coração lhe acelerou. Quando o mordomo árabe lhe tinha negado a entrada, Elizabeth lhe tinha dado seu cartão para intimidá-lo com o poder político de sua família. Sem dúvida, o criado havia entregado o cartão a seu amo. E certamente seguiria estando em seu poder. Com o canto dobrado para baixo, que indicava que ela o tinha visitado pessoalmente. O Sheik Bastardo havia dito que toda escola tem suas regras. Sua primeira regra era que não poderia usar espartilho em sua casa. Elizabeth tinha empregado a intimidação para obter uma audiência com ele. Por que não teria que usar ele a coação para humilhá-la? —Ouça, que diabos está fazendo? Elizabeth jogou atrás seu véu justo quando um par de grandes mãos sardentas a agarrou para arrojá-la à rua. O mordomo ficou petrificado e sua jaqueta negra se inclinou. — Senhora Petre! —Bom dia, Beadles. —Nunca tinha visto seu mordomo sem as luvas postas. A visão daquelas mãos cheias de sardas invadiu sua mente, enquanto procurava uma apressada explicação. - É um dia formoso. Pensei que uma caminhada melhoraria meu apetite. Já serviu o café da manhã ao senhor Petre?
  • 23. Beadles ajustou a jaqueta rapidamente. Sua expressão malévola mudou instantaneamente, a outra de deferência. —Certamente que não, senhora. —De repente, dando conta de que não tinha as luvas, escondeu bruscamente as mãos nas costas. - Deveria ter chamado um lacaio. Não é seguro para uma mulher andar sozinha pela rua nestas horas da madrugada. Elizabeth se sentiu levemente divertida ante a rapidez com que tinha assumido o perfeito acento de um cavalheiro quando só alguns segundos antes tinha usado o dialeto. —Não era necessário, Beadles. Foi um passeio curto. Sob a volumosa capa de lã apertou com força sua bolsa enquanto avançava com calma, como se fosse o mais normal do mundo que a senhora da casa saísse a caminhar antes que seus criados se levantassem. —Por favor, mande chamar Emma. Preciso me trocar para... — O que? A cama? — O café da manhã. Beadles tinha muita dignidade para fazer comentários sobre o estranho comportamento de sua senhora. A parte superior de sua calva cabeça resplandecia sob o débil raio de luz que tinha seguido os passos dela. Elizabeth mordeu o lábio para conter uma risada histérica. Era tudo tão comum... Tão normal. Quem poderia suspeitar jamais que a senhora Elizabeth Ann Petre, filha do primeiro-ministro e esposa do ministro da Economia e Fazenda, tinha empregado a intimidação para entrar na casa do Sheik Bastardo a fim de convencê-lo que a ensinasse a dar prazer a um homem? Talvez despertasse para dar conta de que tudo tinha sido um sonho e de que seu marido era exatamente o que sempre tinha
  • 24. pensado. Um homem que se sentia mais cômodo com a política que com as mulheres. Talvez despertasse para encontrar que os desagradáveis rumores de que tinha uma amante eram falsos. De repente, seu plano para ser adestrada pelo Sheik Bastardo, idéia que antes lhe tinha parecido audaz e atrevida, se convertesse num pouco simplesmente vulgar. Tinha falado de seu próprio matrimônio com outro homem. Um homem que lhe havia dito coisas que um cavalheiro jamais diria a uma dama. Palavras vulgares como «deitar» com uma mulher. Elizabeth tinha falado de temas empregado palavras que nenhuma dama pronunciaria jamais. Tratou de caminhar devagar, evitando subir as escadas correndo. Precisava ver seu marido. Necessitava que lhe assegurasse que ainda era uma mulher virtuosa e respeitável. Seu dormitório era contíguo ao dele. Só daria uma olhada para ver se ele estava acordado. Então teriam a conversa que deveriam ter tido há anos se não fora pela falta de coragem dela. Com o coração pulsando fortemente, abriu cuidadosamente a porta de Edward. O dormitório estava vazio. Os lençóis engomados de linho e a colcha de veludo verde escuro estavam dobrados pulcramente. Era evidente que não havia dormindo em sua cama. As lágrimas lhe queimaram as pálpebras. Fechou a porta cuidadosamente, temendo soltar as lágrimas que ao longo da última semana ameaçavam continuamente aparecer e ao se voltar... Quase morre de um enfarte. Uma mulher singela, de rosto redondo, sorriu-lhe enigmaticamente do outro lado da cama intacta de Elizabeth. —Levantou cedo esta manhã, senhora Petre. Trouxe-lhe uma jarra de chocolate. Apesar de que já passou o pior do inverno, ainda faz bastante frio.
  • 25. Elizabeth respirou fundo para reprimir o grito que lutava por sair. —Obrigado, Emma. Foi muito amável por sua parte. —O decano chamou ao telefone. O jovem Phillip fez outra das suas. Um sorriso iluminou os olhos de Elizabeth ao ouvir o nome de seu filho caçula, agora em seu segundo trimestre na Eton. Aos onze anos, Phillip era audaz e preparado e ela o adorava. Não importava que não tivesse herdado as habilidades intelectuais de seu pai ou de seu avô. Tinha o dom da risada. E todo isso, misturado com uma travessa inclinação para a aventura, tinha dado várias oportunidades para Elizabeth conhecer melhor o decano durante aqueles últimos meses. Emma depositou a bandeja de prata sobre a mesinha de noite e arrumou seu conteúdo até ficar satisfeita. —O decano falou com o secretário do senhor Petre. Com atitude indiferente, Elizabeth cruzou o escuro tapete de lã azul tão inglesa comparada com o vistoso tapete oriental que cobria o chão da biblioteca do Sheik Bastardo, até sua escrivaninha. —Está bem. Suponho que o senhor Petre já saiu para alguma de suas reuniões. Ao ruído surdo do líquido vertido na xícara lhe seguiu o aroma doce do chocolate. —Não saberia lhe dizer, senhora. Quantas mentiras! Pensou Elizabeth de maneira sombria enquanto deslizava a bolsa com o livro proibido sob a escrivaninha. Emma sabia perfeitamente que o senhor Petre não tinha dormindo em sua cama. E sem dúvidas, também sabiam o resto dos criados. Durante quanto tempo a tinham protegido do fato de que seu marido preferia o leito de outra mulher? Tirou a capa e o chapéu e
  • 26. os jogou sobre a cadeira de respaldo alto. Seguiram-lhe as luvas negras. Em silêncio, aceitou a delicada xícara de porcelana chinesa decorada com rosas, que Emma lhe oferecia. Incapaz de enfrentar os olhos da criada dirigiu-se a janela para olhar para fora. A pálida e amarelada luz do sol brilhava sobre o jardim de rosas, nodoso e sem vida. A palha seca cobria a terra erma para proteger as raízes escondidas, algo pouco atrativo, mas efetivo. A voz do Sheik Bastardo dançava e resplandecia dentro de sua cabeça. “Já comprovará, senhora Petre, que quando se trata do prazer sexual, todos os homens são de uma certa natureza”. Quantas vezes havia pensado que seu marido se levantava cedo para atender seus compromissos parlamentares, quando na realidade nem sequer tinha voltado para casa? Apoiou sua testa sobre o frio vidro. A fumaça quente subia da xícara em embaçava a janela. Hoje era segunda-feira. Segundo sua agenda, Elizabeth devia visitar um hospital as dez horas e as doze fazer-se de anfitriã num almoço beneficente. Precisava preparar sua indumentária e um breve discurso, mas só podia pensar no quarto vazio ao lado do seu. O que aconteceria se não fosse seu desconhecimento em matéria sexual que tinha afastado Edward? E se fosse... Ela? Seu corpo, sua personalidade e sua carência absoluta de carisma político que não tinha conseguido herdar de sua mãe ou de seu pai? Um pardal desapareceu como uma flecha no céu. Levava em seu pico uma parte de feno para acrescentar ao seu ninho. De repente, Elizabeth soube o que necessitava. Precisava se rodear do amor sem complicações de um menino.
  • 27. Ou talvez precisava estar segura de que seu encontro clandestino com o Sheik Bastardo não tivesse abaciado de algum jeito a relação com seus filhos. Elizabeth deu as costas ao desolado jardim de rosas. —Diga ao secretário do senhor Petre que envie uma nota a Organização de Caridade das Boas Mulheres. Que escreva que não poderei assistir a inauguração do hospital nem fazer o discurso do almoço, por causa de uma emergência imprevista. —Muito bem, madame. Um vigor renovado fluiu pelas veias de Elizabeth. Ser uma esposa desejável talvez estivesse além de suas capacidades, mas ser uma boa mãe, não. Dirigiu a Emma um sorriso enigmático. —Diga também a cozinheira que prepare um piquenique para meus dois famintos filhos. Logo mande chamar uma carruagem para que me leve à estação de trem. Irei passar o dia com eles. Um perfume suave e fugaz atormentou seu nariz. O perfume. —Mas primeiro quero que me prepare um banho, por favor. — Desejaria tomar um refrigerante, senhora Petre? O decano observou com determinação o ornamentado relógio de bolso de ouro. Seus bigodes, cuidadosamente recortados e prateados pela idade, se retorceram. Não gostava de tratar assuntos com uma simples mulher, embora fosse a mãe de dois de seus alunos. Especialmente quando chegava de improviso e sem marcar uma entrevista prévia. Elizabeth sorriu, negando a se sentir intimidada pelos intentos evidentes daquele ancião, de fazer justamente isso. Depois de enfrentar o Sheik Bastardo não acreditava que nenhum homem pudesse voltar a incomodá-la alguma vez. —Não, obrigado, decano Whitaker. O que fez meu filho agora?
  • 28. —O jovem Phillip atacou um estudante no café desta manhã. - O decano deslizou seu relógio novamente para o bolso e lhe cravou um olhar sob suas povoadas sobrancelhas brancas. —Teve que ser seguro fisicamente. — E o que fez o outro estudante para provocá-lo? — Perguntou ela bruscamente com seus instintos maternais a flor de pele. —O jovem Phillip assegura que o jovem Bernard é um whig, madame e como tal é uma vergonha a sua consciência social. Elizabeth se sentia dividida entre a risada e o temor. Por um lado, Phillip jamais tinha demonstrado nenhum interesse pela política. E por outro, nunca antes se envolvera numa discussão. Que simultaneamente tivesse desenvolvido as duas tendências fez com que soasse um alarme dentro de sua cabeça. — E o que tem a dizer o jovem Bernard? — Perguntou brandamente. —Não diz nada, madame. O aberrante desdobramento de violência de seu filho o deixou feito um trêmulo feixe de nervos. Elizabeth analisou a fúria do decano durante segundos longos. Finalmente perguntou: — Em que curso, rogo-lhe que me você diga, encontra o jovem Bernard? —O jovem Bernard está no... Quinto curso. - O decano revelou esta informação com reticência. Possuía boas razões. Phillip tinha onze anos e estava no primeiro curso. Bernard no quinto. Só lhe faltava completar um curso mais antes de se graduar. Seu filho devia ser realmente atrevido se tinha conseguido deixar um estudante quatro ou seis anos maior que ele feito um «trêmulo feixe de nervos». — Suspenderá Phillip, decano Whitaker? Porque se pensa em fazê-lo, devo lhe informar de que, há algum tempo, já estive considerando tirá-lo daqui. Harrow acredito eu, oferece um modelo mais elevado de educação que Eton. E é obvio, que se retiro Phillip, também terei que levar Richard. Sei que só faltam seis meses para os exames, mas de todo modo...
  • 29. —Não há necessidade de se precipitar, senhora Petre. —O decano resistia a perder não só o dinheiro, mas também o prestígio. Os dois meninos tinham um avô e um pai muito influentes e ambos haviam estudado em Eton. - Estou seguro de que com os recursos monetários apropriados... Depois de tudo, os danos foram mínimos e os meninos são jovens. Elizabeth ficou em pé. —Por favor, entre em contato com o senhor Kinder, secretário de meu marido. Ele se encarregará de todo o necessário para pagar os danos causados. Agora eu gostaria de ver meus filhos. —O jovem Phillip está de castigo e o jovem Richard está em aula. Talvez em outra ocasião... —Temo-me que não, decano Whitaker. — Disse ela com firmeza. - Harrow parece cada vez mais tentador. —Muito bem, senhora Petre. Ele fez soar uma pequena campainha de bronze. Imediatamente, seu secretário, um homem de média idade e com os ombros cansados, que tinha de tímido o que o decano de agressivo, entrou na sala. —Faça vir os irmãos Petre a sala de visitas, senhor Hayden. Senhora Petre, por favor, me siga. Os sapatos de ambos ressoaram sobre o corredor de madeira. Os do decano, suaves e discretos e os dela, agudos e inoportunos. Eton é um lugar deprimente, pensou Elizabeth. Tudo era de madeira brilhante. Não havia nenhuma marca de dedos que pudesse fazer pensar que centenas de meninos ocupavam suas veneradas salas-de-aula. O decano abriu com força uma porta e deu um passo atrás para deixá-la passar. —Sinta-se cômoda, senhora Petre, rogo. O jovem Phillip e o jovem Richard chegarão imediatamente.
  • 30. A sala de visitas não convidava precisamente ao conforto. Tinha duas poltronas de couro situadas frente a um rígido sofá de nogueira de oito pés, com um respaldo dividido em três seções ovaladas. Um pequeno fogo de carvão ardia na escura lareira de granito ao lado do sofá. Elizabeth tirou a capa, o chapéu e as luvas, apoiou na beirada do sofá e contemplou as brasas acesas. Desejava poder conservar seus dois filhos em casa, seguros e protegidos de todo perigo. Desejava que fosse suficiente ser mãe. Desejava... —Olá, mãe. Elizabeth se virou. Phillip estava em pé junto à porta de entrada, com seu cabelo cor castanho escuro penteado cuidadosamente para trás. Movia-se nervoso, trocando o peso de uma perna a outra. Tinha o olho esquerdo fechado devido à inflamação. O olho direito brilhava com lágrimas contidas. Elizabeth queria correr, abraçá-lo. Cobri-lo de abraços e beijos. Queria levá-lo de Eton e de todos seus perigos. Queria lhe dar a dignidade que tão corajosamente estava lutando por conservar. —Olá, Phillip. —Falaste com o decano. Elizabeth não se incomodou em responder ao que era evidente. — Irão me expulsar? — Isso é o que quer? —Não. — Quer me dizer por que brigaste com um jovem do quinto curso? Tinha todas as possibilidades de ganhar. Phillip apertou os punhos. —Bernard é um whig...
  • 31. —Por favor, não insulte minha inteligência repetindo essa tolice. Além disso, já não os chamamos de whigs, agora são liberais. Seus ombros relaxaram. —Já não sou um menino, mãe. —Sei que não é, Phillip. – Ela brindou-lhe com um malicioso sorriso. - Seu olho arroxeado o demonstra. O moço se ergueu ainda mais ante aquelas palavras... E pareceu se tornar ainda mais jovem do que era. —Por favor, não me peça que te diga qual foi à causa da briga. Não quero te mentir. —Obviamente, lhe devo perguntar isso e dado que nunca antes me mentiste, não acredito que o faça agora. Phillip olhou os sapatos e finalmente, balbuciou: —Ele disse algo... —A respeito de ti? —Não. —A respeito de Richard? Ele elevou o queixo e olhou fixamente por cima da cabeça de sua mãe. —Não quero lhe dizer. Elizabeth sentiu que a invadia um repentino pressentimento. Os meninos, apesar de sua idade, repetiam as mesmas intrigas que seus pais. Se ela tinha ouvido por acaso rumores com respeito à relação extraconjugal de Edward era muito provável que também seus filhos o tivessem feito. — Disse o jovem Bernard algo a respeito de seu pai, Phillip? Ele piscou com seu olhar ainda fixo acima da cabeça dela. Era evidente que aquela piscada significava que estava no certo. Por que teria sido uma esposa tão complacente? Nada disto deveria ter ocorrido, nem a seu marido, nem a ela e nem a seus filhos. —Phillip. Seu filho lhe suplicou em silencio com o olhar, familiarizado com aquele tom particular de voz. Elizabeth sentiu que lhe rompia o coração.
  • 32. Salvo pela cor de seu cabelo, Phillip era muito parecido o pai. Os mesmos olhos castanhos e o nariz nobre... E, entretanto não havia nada de Edward nele. Elizabeth não podia imaginar Edward com um olho arroxeado. Nem sequer na idade de Phillip. Deu alguns tapinhas na poltrona que havia a seu lado. —Trouxe uma coisa para você. O olho arroxeado a olhou com receio. -O que? —Uma caixa de chocolates Cadbury. O suborno obtinha o que todo o amor do mundo não teria obtido jamais. Phillip saltou para o cesto e se sentou aos pés de sua mãe. —Não deve premiar a conduta violenta, mãe. A voz em tom de recriminação não pertencia nem a um menino nem a um homem, mas a alguém que estava entre as duas etapas da vida. Elizabeth se voltou para seu filho maior com um prazer manifesto. —E você não deve permitir que seu irmão se meta com meninos que têm o dobro do seu... - Sua boca se abriu emocionada. — Richard! Ele estava pálido. Custou-lhe reconhecer o menino que a tinha incomodado incessantemente durante as férias, lhe pedindo uma bicicleta nova. Inclusive seu cabelo negro escuro, como o de seu pai, estava murcho e sem vida. Elizabeth ficou em pé e lhe tocou a testa. —Richard, você está doente? O moço permitiu a carícia. —Agora estou bem. — Por que não me comunicou isso, o decano? —Não era nada, mãe. Somente um resfriado. —Está comendo bem? —Mãe! — Quer vir para casa para descansar?
  • 33. Richard afastou sua mão. —Não. — Quer de uma caixa de doces? —Perguntou ela com aspereza. Um sorriso ambíguo apareceu em seus lábios. —Não me oporia a isso. —Então, se una a nós e faremos uma festa. Ordenei a cozinheira que preparasse uma cesta de piquenique. Phillip já tinha invadido a cesta e descoberto em seu interior os tesouros ocultos. Com solenidade, passou a caixa de doces a Richard. Foi como se os dois moços estivessem selando um pacto. Entre goles de cidra de maçã e mordidas de rosbife, um saboroso queijo de Stilton, vegetais em vinagre e pão-doce recheados de geléia de morango, Richard alardeava sobre seus estudos, enquanto Phillip presumia sobre seus truques para escapar deles. A reunião chegou a seu fim muito rápido. Elizabeth guardou os pratos e talheres na cesta e envolveu a comida restante em dois guardanapos. —Richard, coma. Phillip, não quero mais briga. E agora não me importa se vai ofender sua dignidade, mas quero um abraço de cada um de vós. Phillip, como se tivesse estado esperando a permissão durante todo esse tempo, lançou-se para ela e pressionou o rosto em seu ventre. —Amo você, MA. Elizabeth se sentiu invadida por uma forte onda de superproteção. «MA» havia sido o apelido especial que Phillip havia lhe colocado desde pequeno. Richard era maior que Elizabeth. Surpreendeu-a abraçando-a e afundando o rosto em seu pescoço, tal como fazia quando era pequeno. Um fôlego quente e úmido fez cócegas sobre sua pele. —Eu também, MA.
  • 34. Elizabeth aspirou o aroma de sua pele profundamente. Ele cheirava a sabão, suor e a seu próprio aroma particular. A maturidade estava afastando Richard de seu lado, mas ainda cheirava como quando era pequeno. Piscou para evitar que as quentes lágrimas que lhe queimavam as pálpebras deslizassem por seu rosto. —Seu pai e eu também os amamos. Sua declaração foi acolhida em silêncio. Como se tivessem num acordo tácito, Richard e Phillip se separaram de seus braços. Elizabeth jurou ali mesmo que faria tudo para voltar a unir sua família. A viagem em trem de volta para Londres foi um calvário longo e penoso. O balanço monótono devia lhe ter provocado sono, mas não foi assim. Pensou em Edward e na sua cama vazia. Pensou em seus filhos e em como se afastaram quando ela tinha mencionado o pai. Pensou no Sheik Bastardo e no perfume que o envolvia. E não importava de que maneira tinha tentado representar-lhe, mas não podia imaginar que Edward tivesse encontrado jamais em sua amante o prazer que o Sheik Bastardo obviamente tinha achado na dele. O chofer estava aguardando-a na estação. Seu marido não a esperava em casa. Rechaçando de maneira cortês, mas firme, a insistência do criado e depois de sua jovem para que fizesse um jantar leve, Elizabeth se preparou para deitar. No instante que fechou a porta de seus aposentos, Elizabeth procurou o livro em sua mesa. Cheirava a couro e tinta fresca, como se o tivessem publicado a pouco tempo. Com muito cuidado, passou a página do título e leu a austera letra negra sobre o fino papel branco de vitela. “O JARDIM PERFUMADO” DO SHEIK NEFZAWI”.
  • 35. Um manual de erotismo árabe (século XVI): tradução, revisão e correção. Cosmopoli: MDCCCLXXXVI: Para a Sociedade Kama Shastra de Londres e Benarés e somente para distribuição privada. (Paginação: XVI + 256). Erotismo”. Elizabeth jamais vira semelhante palavra. A data de publicação era de 1886, mas o livro estava recém impresso. Com impaciência, passou o índice e se deteve ao chegar à introdução. Seus olhos pareceram ir sozinhos aos parágrafos iniciais. “Louvado seja Deus, que pôs o prazer maior do homem nas partes naturais da mulher e destinou as partes naturais do homem para dar o maior gozo à mulher. Não dotou às partes da mulher de nenhuma sensação prazeirosa ou satisfatória até que tenham sido penetrados pelo instrumento do macho e de igual modo, os órgãos sexuais do homem não conhecem nem a quietude nem o descanso até não ter penetrado nos da fêmea”. Uma aguda pontada de desejo sacudiu violentamente suas entranhas. Seguiu-lhe a lembrança dos zombeteiros olhos do Sheik Bastardo. E não teve dúvida alguma de que ele aceitara ensiná-la com o único fim de humilhá-la. Um homem como ele nunca perdoaria uma mulher que o tinha ameaçado para entrar a força em sua casa. Um homem como ele jamais compreenderia que uma mulher cujo cabelo mostrava os primeiros fios prateados da idade e cujo corpo revelava as conseqüências de duas gestações ardia com o mesmo desejo que as mulheres jovens e bonitas liberadas do peso da virtude. Com determinação, sentou-se e procurou pluma e papel na gaveta. Ele não precisava saber quanto desejava ela o gozo feminino com o qual a tinha ridicularizado. A única coisa que o Sheik Bastardo tinha que saber era que ela desejava instrução sexual, para que seu marido ficasse satisfeito.
  • 36. CAPÍTULO III O abajur a gás do exterior brilhava como um farol. Um baixo relincho pareceu romper a névoa matinal, do cavalo preso ao carro que a esperava no outro lado da rua. Com os dedos trêmulos, Elizabeth ergueu a mão para a aldrava de bronze. Estava fria, úmida e dura. Um elemento sem adornos que se pendurava entre as faces de um leão. Cada fibra de seu corpo gritava que se detivesse. Uma mulher respeitável não aparecia em público sem levar um espartilho. Uma mulher respeitável não lia um livro erótico do século XVI. Uma mulher respeitável não procurava instrução sexual, mas ela sim e sabia que agora nada podia detê-la. O golpe seco do bronze rasgou a névoa. Imediatamente, a porta se abriu de par em par. Elizabeth se preparou, mas não foi o hostil mordomo árabe com sua branca túnica quem a recebeu. Uma moça de rosto recatado e vestida com avental e touca, brancos. O uniforme tradicional dos criados ingleses. Ela fez-lhe uma reverência, como se o fato de que uma mulher visitasse o Sheik Bastardo sem acompanhante às quatro e meia da manhã fosse algo freqüente e habitual. «E talvez fosse», pensou Elizabeth de maneira sombria, enquanto franqueava a porta. —Bom dia, senhora. Faz um tempo horrível, não? Milord me ordenou que a fizesse passar diretamente. Faça o favor de me dar sua capa? Elizabeth se aferrou à bolsa sob a grossa lã negra. Sem o suporte do espartilho, sentia os seios pesados e grandes e os mamilos duros e maltratados. —Não será necessário. Durante um segundo a jovem pareceu querer insistir, mas fazendo uma nova reverência, murmurou: —Muito bem, senhora. Siga-me, por favor.
  • 37. As paredes de mogno do corredor tinham incrustações de madrepérola. O brilhante abajur do teto criava um jogo de sombras e luzes com o vigamento de madeira em concha. Peças de porcelana do tamanho de um homem montavam guarda na parte inferior de uma escada circular. Um tapete oriental de um vermelho e amarelo brilhantes, subia pelas escadas e desaparecia na escuridão. Não restava dúvida de que o Sheik Bastardo tinha ordenado que as luzes do corredor estivessem todas acesas para que ela pudesse ver a loucura de seu intento desesperado, por lhe intimidar vinte e quatro horas antes. Tinha funcionado. Que tola havia sido pensando que podia persuadir aquele homem com dinheiro! Evidentemente, o número de suas proezas sexuais só era superado por suas posses materiais. Se, como ela suspeitava, aquele encontro matinal tinha surto de seu desejo de humilhá-la, seria sua primeira e única lição. Qualquer que fosse o conhecimento que iria adquirir, este dependeria unicamente de sua própria vontade e não se preocuparia o mínimo pela delicadeza inglesa. A introdução e o primeiro capítulo do “jardim perfumado” tinham conteúdos que não compreendia e ao menos estava decidida a entendê-los. A jovem golpeou brandamente a porta da biblioteca antes de abri-la. A cena que aguardava Elizabeth não era a que tinha imaginado. Esperava que a biblioteca estivesse iluminada por uma luz fria e estéril como estava na manhã anterior. Não era assim. Vestido com uma jaqueta de tweed, o Sheik Bastardo estava sentado detrás de uma enorme mesa de mogno, com sua cabeça inclinada sobre um livro e o cabelo dourado resplandecente sob a luz do abajur a gás. Chamas amarelas e laranjas dançavam na formosa lareira de mogno, a sua esquerda. Uma pequena xícara
  • 38. fumegante descansava junto a seu cotovelo direito. Era café e seu delicioso aroma impregnava o ar. Uma bandeja de prata, com sua jarra também de prata, repousavam num extremo da mesa. Aquele aspecto tão inglês despertou um novo repico de temor dentro de sua cabeça. O sexo era misterioso, exótico e estrangeiro. Se ele estivesse de vestimenta árabe, como seu criado no dia anterior, Elizabeth podia sentar frente a ele e estudar com equanimidade da arte do amor erótico. Discutir sobre isso com um nome que facilmente podia presidir sua mesa de jantar deixava a satisfação sexual no terreno filosófico e o transformava no fruto proibido de que tinha sido privada durante dezesseis anos. A jovem pigarreou brandamente. - Desculpe, milord. Chegou à dama. Deseja que lhe traga algo mais? O Sheik Bastardo não ouviu a criada ou preferiu ignorá-la. Ou talvez ignorasse Elizabeth, para demonstrar o pouco que importava a um homem como ele. Elizabeth se sentiu súbitamente como seu jardim de rosas, desolado e fora de temporada. Como sem dúvida, ele planejava que ela se sentisse. Jogou os ombros para trás... E se perguntou se as plantas se sentiriam tão nuas e vulneráveis sem suas folhas, como ela sem seu espartilho. Os batimentos de seu coração lhe pareceram intermináveis antes que ele fechasse o livro bruscamente e levantasse a cabeça. —Obrigado, Lucy. Por favor, leve a capa da senhora Petre e traga outra xícara. Elizabeth sentiu que lhe gelava o sangue. Vagamente percebeu que a criada fazia uma reverência. Depois, a capa
  • 39. deslizou de seus ombros e a porta da biblioteca se fechou com um estalo repentino no meio do silêncio. O Sheik Bastardo, e sim, pensou Elizabeth à medida que a surpresa cedia a fúria, ele era um bastardo, ficou em pé e assinalou com a mão uma poltrona de couro vermelho colocada diante de sua escrivaninha. —Por favor, rogo-lhe que sente, senhora Petre. Elizabeth nunca havia se sentido tão furiosa e nem traída. Tinha imaginado que ele ia tentar humilhá-la. Não tinha imaginado que lhe mentisse. —Siba, Lorde Safyre. —Apertou os lábios para evitar que tremessem. - Você me assegurou que um homem árabe não compromete uma mulher. Ramiel elevou as sobrancelhas simulando se surpreender. Dois retalhos de marrom dourado um pouco mais escuros que o ouro leonino de seu cabelo. — E você acredita que o tenho feito? —Se tivesse desejado ser identificada, não teria usado um véu. Não havia nenhuma necessidade de me chamar pelo meu nome. Os criados falam. — E devo supor que os homens ingleses não o fazem? —Uma ligeira brincadeira brilhava em seus olhos, como uma sombra mais escura. - Se você não desejava que os criados ingleses a conhecessem, senhora Petre, não deveria ter deixado um cartão a um deles. —Seu mordomo é árabe. - Disse ela com dureza. — Ah, sim? E o que pensa que sou eu? Árabe ou inglês? Ela teve que exercer todo o controle de que dispunha para não lhe dizer exatamente o que era ele. —Seus mamilos estão duros, senhora Petre. Excita-a, a ira? Elizabeth sentiu que o fôlego ficou preso na garganta. De repente, ele sorriu, descobrindo dentes brancos e perfeitos. Era um sorriso atraente, cheio de calidez e picardia.
  • 40. Ela não pôde deixar de associá-lo a Phillip, seu filho caçula, que sorria também assim quando fazia algo totalmente disparatado e desejava evitar o castigo. —Por favor, senhora Petre, sente. Minha criadagem é bem escolhida para não repetir os nomes de meus convidados. Na Arábia, os servos desrespeitosos são açoitados ou vendidos. —Na Inglaterra é proibido açoitar criados. – Ela replicou gélidamente. - Nem tampouco consentimos a escravidão. —Mas não é proibido comprar a um criado, uma passagem de ida num navio de carga oriental. Ah, aqui está Lucy. Coloque a xícara e o pires sobre a bandeja... Assim. Esta bem. Obrigado. Já não necessitaremos mais de seu serviço. Elizabeth teve que controlar seu corpo para evitar que este seguisse de maneira independente, a criada que saia da biblioteca. Embora o Sheik Bastardo não a tivesse traído, havia falado a palavra mamilos. Mas o sentido comum a advertiu de que era ela quem lhe tinha pedido que a instruísse nas maneiras de agradar um homem. Se não podia suportar que ele pronunciasse uma parte da anatomia da mulher, como reagiria quando discutissem sobre a anatomia de um cavalheiro? Indiferente a batalha em seu interior, Ramiel serviu uma bebida surpreendentemente negra dentro da pequena xícara, logo acrescentou o que parecia ser um pouco de água. Ofereceu-lhe o café, apresentando-o de maneira formal, pegando delicadamente a beirada do pires. —Venha, senhora Petre. Sente. A menos que tenha trocado de parecer, é obvio. Era como se lhe tivesse atirado a luva no colo. Aquele gesto provocantemente correto implicava que se aquela lição fracassara e a culpa seria única e exclusivamente dela. Era um desafio que não podia recusar.
  • 41. Elizabeth se ergueu ainda mais, o qual realçou seus seios, aumentando o atrito de seus mamilos. Lentamente, cruzou a grande distancia que os separava pelo tapete oriental e se sentou na beirada da poltrona de couro vermelho. As normas da correta etiqueta, indicavam que uma mulher devia tirar as luvas se tinha intenção de ficar mais de quinze minutos. E também que não escondesse o rosto atrás de um véu. Fria e metodicamente, tirou as luvas e acomodou o véu sob seu chapéu. Fazendo equilíbrio com as luvas e a bolsa sobre o colo, estirou a mão para alcançar o pires de porcelana, veteado de azul. —Obrigado. O café estava espesso, tão doce e tão forte que quase a deixou sem respiração. Além disso, estava fervendo. Ofegando, pousou rapidamente o pires e a xícara sobre a mesa. — O que é isto? —Café turco. Está recém feito. Deve soprá-lo e logo tomá-lo de um gole. Leu os capítulos designados? Elizabeth colocou a mão sobre a garganta, sentia como se a tivessem escaldado. —Sim. Ramiel se reclinou no assento. Em seu rosto aparecia um jogo de luzes e sombras. — E o que aprendeu? Os olhos turquesas deixaram de ser zombeteiros. Eram os olhos de um homem penosamente atraente observando uma mulher penosamente pouco agraciada. Elizabeth se esqueceu imediatamente da dor na garganta. Vestindo uma expressão insípida que a sociedade exigia de uma mulher respeitável em público, evitando mostrar qualquer emoção ordinária e vulgar, procurou no interior de sua bolsa e extraiu o livro e um maço de papéis. Deixou o livro sobre a mesa, ao lado da
  • 42. pequena xícara. Sentindo como se fosse uma menina em idade escolar, consultou os papéis. —Estima-se que “O Jardim Perfumado” foi escrito no começo do século XVI. Acredita-se que o autor nasceu na Nefzaoua, um povo situado na costa do lago Sebkha Melrir, ao sul de Tunísia, daí seu nome, Sheik Nefzawi, já que muitos árabes adquirem sua denominação pelo lugar de nascimento. Embora “O Jardim Perfumado” não é exatamente uma recopilação de autores, é provável que algumas seções tenham sido tiradas de diferente escritores árabes e hindus. —Senhora Petre. Elizabeth apertou os dentes. O Sheik Bastardo pronunciava seu nome como se de verdade ela fosse uma menina em idade escolar... E bastante estúpida, por certo. Ela levantou o rosto. Os olhos turquesas estavam escurecidos pelas grossas sobrancelhas negras. — Sim, Lorde Safyre? —Senhora Petre, acaso lhe disse que lesse as notas do tradutor? Os dedos da mulher se apertaram com raiva, enrugando suas notas. —Não. —Então prescindamos da história do livro e do autor e procedamos com a seção também conhecida como «Comentários gerais sobre o coito». Ele sorriu, desafiando-a a que continuasse. Elizabeth pensou em seu marido com outra mulher. Pensou em seus dois filhos, inimizados com seu pai. Respirou profundamente, para acalmar os fortes batimentos de seu coração. —Muito bem. - Disse com certa tranqüilidade, voltando para suas notas. - O Sheik assegura que o maior prazer do homem reside nas partes naturais da mulher e que não conhece nem a
  • 43. quietude até que ele. —elevou a cabeça, cravando seu olhar na dele, — a penetre. Ela se negou a afastar o olhar daqueles olhos de cor turquesa. E também se negou a reconhecer que seus seios se endureceram. De repente, Elizabeth sentiu desejos de humilhá-lo da mesma forma que ele queria denegri-la. Queria ser ela quem o envergonhasse e o escandalizasse. —Então, Lorde Safyre, parece que o comentário que você fez ontem referente a que todos os homens são da mesma natureza é certo. Mas estou confusa com respeito à referência do Sheik sobre que “o homem funciona da mesma maneira que uma maça de morteiro, enquanto a mulher colabora com ele com movimentos lascivos...” O chiado do abajur de gás sobre a mesa afogou o rugido de seu coração. Os lenhos que ardiam na lareira se partiram e rangeram. Finalmente, ele disse com suavidade: — O que é o que a confunde, senhora Petre? Havia chegado o momento. Já não podia pretender ser pudica. O sexo não era um assunto pudico. Elizabeth se perguntou se ele conseguia ouvir as batidas de seu coração. —Antes de me casar, minha mãe me recomendou que me deitasse sem me mover quando meu marido me visitasse. Não compreendo como pode se mover uma mulher, sem entorpecer as ações do homem. O Sheik Bastardo estava sentado como se fosse de pedra. Até a fumaça que subia de seu café parecia haver gelado. Ela tinha conseguido escandalizá-lo. Ela tinha conseguido escandalizar a si mesma.
  • 44. Uma coisa era contar a um desconhecido a infidelidade de seu marido e outra muito distinta era dar detalhes sobre seu leito conjugal. O calor na biblioteca se tornou repentinamente insuportável. Distraídamente, ela procurou suas luvas e sua bolsa. —Desculpe... Um rangido de madeira lhe fez levantar a cabeça bruscamente. O Sheik Bastardo se inclinou para diante em sua cadeira. Seus olhos ardiam à luz do abajur. —Em árabe a palavra dok significa amassar, golpear. É uma combinação do movimento de investida que um homem utiliza para alcançar o clímax dentro da mulher, com a pressão de sua pélvis contra ela para incrementar suas sensações, daí o símile com a «maça». Sedimento é um movimento de balanço. Uma mulher pode levantar ou balançar seus quadris para cima, para encontrar com o embate para baixo, do homem. Ou pode rebolar seus quadris de um lado a outro para complementar os movimentos de impulso dele. Chegará um momento em que os movimentos do homem serão muito rápidos ou fortes, para que a mulher possa se mover sem deslocá-lo. Nesse momento, a melhor maneira de agradar tanto a ele como a ela mesma é envolvendo suas pernas ao redor de sua cintura e simplesmente sustentando-o, enquanto que ele faz ambos alcançar o orgasmo. Uma sensação elétrica sacudiu o corpo de Elizabeth. De repente, as palavras do Sheik Bastardo se transformaram em imagens visuais, como se estivesse observando a projeção de uma lanterna mágica. Mas as cenas se projetavam em seus olhos e não sobre uma parede. Não eram as inocentes transparências pintadas A mão que mostrava a seus filhos para entretê-los e educá-los. Eram fotografias eróticas, fotografias explícitas iluminadas por uma luz muito mais quente que um tênue resplendor. Havia um homem nu e figuras que avançavam em sucessão rápida, de maneira que investia e esfregava alternativamente seu
  • 45. corpo escuro entre as pernas pálidas e estendidas que subiam cada vez mais alto sobre os quadris magros e musculosos. Pela primeira vez em sua vida, a mulher de cabelo cor mogno estava completamente aberta e vulnerável debaixo dele. Não havia nada que detivesse o homem, que golpeava e pressionava dentro de sua suavidade e não havia nada que ela pudesse fazer para reter seu próprio prazer... A realidade retornou com o eco distante de uma porta que se fechava bruscamente. Elizabeth piscou. Estava com as palmas das mãos úmidas. Como também estavam outras partes de seu corpo nas quais era melhor não pensar. E ainda não estavam nem na metade da primeira lição. Jogou seus ombros para trás. —Desculpe, posso lhe pedir que me empreste uma pluma e um tinteiro? Eu gostaria de fazer algumas anotações. O assombroso hipnotismo de seus olhos se cristalizou. — Pensa você consultar suas notas quando seu marido visitar seu leito, senhora Petre? — Ele disse com acidez. —Se for necessário, Lorde Safyre. – Ela replicou imperturbável. Como resposta, ele empurrou um tinteiro de bronze para o outro lado da mesa, abriu uma gaveta e tirou uma pluma. Uma pesada pluma de ouro. Elizabeth a esquentou entre seus dedos como se fosse feita de cerne, em vez de metal. Depois de inundar de maneira decidida a ponta dentro do tinteiro, apoiou a pluma sobre suas notas. — Poderia repetir o que acaba de dizer, por favor? Felizmente, as imagens proibidas estiveram ausentes em sua segunda explicação, mais fria e breve. —Obrigado, Lorde Safyre. —Terminou de escrever com um pequeno gesto de ênfase e novamente consultou suas notas. - A introdução termina dando o título completo da obra do Sheik, “ O
  • 46. Jardim Perfumado” para a pulverização da alma. Continuamos então com o capítulo um? O Sheik Bastardo sorriu, um sorriso masculino, planejando sua vingança. —Naturalmente. —O Sheik assegura que os homens se excitam pelo uso de perfumes... —Está adiantando, senhora Petre. Não só saltou o começo do capítulo, mas também omitiu os dois subcapítulos: «Qualidades que as mulheres procuram no homem» e «Os diferentes tamanhos do membro viril». “Membro viril” ressoou em seus ouvidos como um eco. Elizabeth aferrou a grossa pluma para acalmar sua respiração entrecortada. Aquele era o momento que tanto havia temido, mas agora que chegara, sentia extranhamente animada. —Encontrei algo que valesse a pena, Lorde Safyre. - Mentiu. —Uma lástima, senhora Petre. Você recordará que a introdução finaliza com o amigo e conselheiro do Sheik lhe respirando a acrescentar a seu trabalho um suplemento que incluísse coisas como a maneira de eliminar encantamentos e métodos para incrementar o tamanho do membro viril. O capítulo um se titula «O que concerne aos homens meritórios». O Sheik dá grande importância às genitálias masculinas. Se seu marido sofrer de abatimento sexual, você deve poder julgar se é devido ao tamanho de seu membro, em cujo caso deve saber qual é a longitude correta, para... Alongá-lo. Os olhos turquesas emitiam brilhos. Ramiel estava desfrutando de seus esforços por incomodá-la. —De acordo com o Sheik, um homem «meritório» deve possuir um membro que tenha «como máximo a longitude equivalente ao
  • 47. longo de doze dedos ou três larguras de mão e como mínimo seis dedos, ou uma mão e meia de largura». Elizabeth lutou para evitar que o fogo que transpassava seu peito subisse para seu rosto. — Refere-se ao largo da mão de uma mulher ou de um homem, Sheik? Ele apoiou suas mãos morenas, uma sobre outra na suntuosa madeira escura da mesa. —Será você quem dita, senhora Petre. Ela jamais tinha visto seu marido sem roupa. Só se vira com o tamanho de seus dois filhos quando eram pequenos, para comparar com um homem. A curiosidade foi mais forte que a prudência. Aferrou a pluma e ao papel com uma mão e as luvas e à bolsa com a outra e se inclinou para diante. Suas mãos eram grandes e escuras e mediam bem mais que a largura das suas, juntas. —Duas larguras de mão... —A mão do Sheik Bastardo que estava mais perto dela se moveu para diante, alguns dez centímetros. - Três larguras de mão. Os olhos de Elizabeth se dilataram. Impossível. Nenhuma mulher podia acomodar trinta centímetros. — E bem, senhora Petre? Elizabeth se recostou em sua cadeira. —Ou os homens árabes têm membros extremamente grandes ou mãos muito pequenas, Lorde Safyre. Até o momento em que cheguemos ao capítulo que contém as receitas para incrementar o caráter «meritório» do homem, eu sugiro que passemos aos benefícios do perfume. Inclinando para diante, molhou a pluma no tinteiro e se preparou para escrever. — Que perfume se usa num harém?
  • 48. Uma risada profunda e masculina alagou a biblioteca. Elizabeth nunca tinha visto ou ouvido antes um adulto ceder de maneira tão desinibida ao riso. As damas usavam um risinho afogado e os cavalheiros riam a gargalhadas. Descobriu que a risada verdadeira era contagiosa. O Sheik Bastardo tinha uma série de molares perfeitos. Ela mordeu os lábios para não cair no ridículo, durante um momento em que baixou a guarda e seus olhos se encontraram com os dele e compartilharam o absurdo da situação. —Touché, Taliba. —Seus olhos turquesas continuaram cintilando inclusive depois de que a risada se apagou.— Inclino-me ante sua enorme acuidade... Nesta manhã. Âmbar, almíscar, rosa, pétalas de flor-de-laranja, jasmim... Todos esses aromas são habituais entre as mulheres árabes. Que perfume você usa? Sua voz era rouca, íntima. Não era a voz de um homem com a intenção de humilhar uma mulher. Elizabeth voltou bruscamente à cabeça para trás. —Lamento lhe informar que sou alérgica a perfume. Do que é o que me chamou... Taliba? A luz em seus olhos se apagou e passaram da cor da turquesa polida ao da pedra tosca ainda sem cortar. —Taliba é a palavra árabe que designa um estudante, senhora Petre. De maneira absurda, Elizabeth se sentiu decepcionada. Edward jamais tinha empregado um termo carinhoso com ela, nem sequer durante os três meses em que a cortejou, nem nos dezesseis anos de matrimônio. Simulou estar escrevendo a palavra árabe em suas notas. — É necessário que uma mulher utilize perfume para atrair um homem? — O que aconteceria se lhe dissesse que sim? Uma grande mancha de tinta negra se estendeu pelo papel. —Então consultarei o Boticário para ver se há algo que modere minhas alergias durante o tempo que devo agradar meu marido.
  • 49. —Não é necessário que sacrifique sua saúde. —O calor e a risada haviam desaparecido de sua voz. - Um grande Sheik, no momento de entregar sua filha favorita em matrimônio, aconselhou-a que a água é o melhor dos perfumes. Você é alérgica a flores? —Não. —Então triture pétalas de flores em sua pele, debaixo de seus seios e no triângulo de pêlos entre suas coxas. A combinação do aroma da flor com o calor úmido de seu corpo será bem mais eficaz que algo que possa comprar num frasco. O suor perlaba a parte inferior dos seios de Elizabeth, que rabiscava energicamente... Flores trituradas debaixo de... Durante alguns momentos, a ponta de aço que rasgava a superfície do papel afogou o estalo da madeira ardente e o chiado da chama do gás. Ramiel tinha deduzido que um homem desfrutava da fragrância do corpo de uma mulher. Ela se cheirou discretamente. Tudo o que podia cheirar era o benzeno de seu traje de lã limpo e o forte aroma do café e a fumaça da madeira que ardia. — Sabe você o que é um orgasmo, senhora Petre? Elizabeth deixou de rabiscar subitamente. Sua confusão se converteu em vergonha, que a sua vez estalou numa fúria vermelha, brilhante. Não deixaria que ele a humilhasse. Elizabeth levantou a cabeça. Os olhos turquesas estavam esperando os seus. —Sim, Lorde Safyre. Sei o que é um orgasmo. Com os olhos semicerrados, ele estudou-a como se fosse um animal ou um inseto, o qual nunca antes vira.
  • 50. — O que é? — O que é? Durante alguns minutos, a consternação lhe tirou a fala. Era evidente que ele não acreditava que ela soubesse. Que lhe pedisse descrever uma experiência tão intensamente pessoal era escandaloso, mas que acreditasse numa mentirosa era mais do que podia suportar. Os lábios dela se contraíram. —É o... Topo do prazer. — Já experimentou você esse topo do prazer? Ela inclinou o queixo e teria respondido com um categórico e desafiante sim, se não fosse pelo repentino ardor nos olhos dele. —Acredito que esse não é assunto de sua incumbência. —Você diz que só deseja aprender a agradar seu marido, senhora Petre. - Disse ele, com aspereza. - Acaso não deseja também aprender a sentir você maior prazer? De repente, Elizabeth se sentiu tremendamente contente por ter estudado tão afanosamente. Embora não podia igualar seu conhecimento sexual, certamente podia defender quando tratava de competir em sagacidade. Um pequeno sorriso de triunfo se esboçou em seus lábios. —Certamente, Lorde Safyre. Não pode ter esquecido as palavras do Sheik. As partes de uma mulher não sentem «nenhuma sensação prazeirosa ou satisfatória até que as mesmas tenham sido penetradas pelo instrumento do macho». Assim, ao agradar seu marido, uma mulher sente prazer em si mesmo. E Edward, pensou sombria, sentia o maior prazer quando não lhe impunha nenhum tipo de exigência. Nem sequer tinha se incomodado em abrir a porta do quarto para ver se ela estava bem quando tinha voltado para casa.
  • 51. Mas não desejava pensar em seu fracasso como mulher no passado. A satisfação no leito conjugal devia ser possível. Só tinha que... Aprender a consegui-la. Sem pensar muito, perguntou-lhe: — Você se excita com os beijos, Lorde Safyre? — E seu marido? Uma sensação de frieza invadiu Elizabeth. Edward jamais a tinha beijado. Não, isso não era completamente certo. Quando o pastor os declarou marido e mulher, Edward tinha pousado brevemente os lábios sobre os seus. Elizabeth baixou o olhar para o pequeno relógio de prata que tinha no prendedor de seu vestido. Eram cinco e dez. Inclinando-se, apoiou a grossa pluma de ouro sobre a mesa. —Não discutirei sobre meu marido com você e nem com ninguém, Lorde Safyre. —Com mais pressa que graça, envolveu o maço de notas e as colocou com rapidez na bolsa. - Acredito que nossa aula se concluiu. E Elizabeth tinha resistido com seu orgulho intacto, embora não tivesse acontecido o mesmo com seu pudor. Devia sentir aliviada. Mas não era assim. —Muito bem, senhora Petre. —O Sheik Bastardo, com seus olhos novamente zombeteiros, ficou em pé. – Eu a verei amanhã. Às quatro e meia da manhã. Pegou o pequeno livro de couro da mesa e o entregou. —Capítulo dois, senhora Petre. Assentindo com a cabeça, ela aceitou o livro e se dirigiu para a porta sem fazer nenhum comentário. —Regra número dois. Amanhã pela manhã e cada manhã a partir de agora, você deixará seu chapéu na porta de entrada... E também sua capa.
  • 52. A fúria lhe percorreu. Havia obedecido os homens de sua vida durante trinta e três anos... Por que tinha que acatar as ordens daquele estranho? — E se não? — Então darei por finalizado nosso acordo. O coração bateu forte em seu peito e depois começou a pulsar num ritmo desenfreado. A que ele se referia? Às aulas... Ou a sua palavra de cavalheiro do Oriente e do Ocidente de que não diria uma palavra a ninguém? —Devo supor que você não sente grande simpatia nem pelos chapéus nem pelos espartilhos. - Disse ela com frieza. A risada retornou a sua voz. —Supõe corretamente. — E pelo o que sente estima, Lorde Safyre? —Por uma mulher, senhora Petre. Uma mulher quente, úmida e voluptuosa, que não teme sua sexualidade e nem sente vergonha de satisfazer suas necessidades. **** O aroma de benzeno seguia suspenso no ar da biblioteca. Ramiel levantou a pluma que Elizabeth Petre tinha usado para tomar notas. Qual das duas é você, senhora Petre? —Murmurou para si enquanto acariciava delicadamente o suave metal, que ainda conservava o calor da pele. - Uma mulher que tem medo da sua sexualidade... Ou uma mulher que sente vergonha de satisfazer suas necessidades? Ela tinha as mãos pequenas. Obstinada entre seus magros dedos, a grossa e pesada pluma parecia um primitivo falo de ouro. A esposa do ministro da Economia e Fazenda teria que usar ambas as mãos para abranger um homem do tamanho de Ramiel. A lembrança sacudiu todo seu corpo. “Não compreendo como pode se mover uma mulher sem entorpecer as ações do homem”.
  • 53. Depois dos comentários ingênuos do dia anterior pela manhã, deveria estar preparado para sua honestidade. Não estava. Ela tinha conseguido surpreendê-lo uma vez mais. Como podia uma mulher tão inexperiente gerar tanta tensão sexual? —Ibn. Os dedos de Ramiel se aferraram compulsivamente ao redor da pluma de ouro. Preparando o corpo de forma inconsciente para defender, levantou a cabeça. Muhamed estava em pé atrás da poltrona de couro vermelho, que Elizabeth Petre tinha deixado vazia só a alguns momentos. Uma capa com capuz negro cobria o turbante do mordomo e o branco thobs de algodão. Os olhos turquesas se fixaram naqueles tão escuros, que pareciam negros. Olhos de Cornualles. Um sorriso cínico se instalou nos lábios de Ramiel. Muhamed parecia árabe, mas em realidade não era. Ramiel parecia inglês, mas em realidade não o era. Elizabeth Petre, como tantos de sua raça, via só o que estava preparada para ver. — O que acontece, Muhamed? —O marido não saiu de casa ontem pela manhã. Só a mulher, a senhora Petre. Partiu em sua carruagem antes das dez. Não sei para onde. Mais tarde, enquanto estava fora, o marido voltou para jantar. Foi... — Disse que não tinha saído de casa, —interrompeu Ramiel bruscamente. - Mas voltou para casa para jantar. A face de Muhamed, ainda forte e musculosa para a idade de cinqüenta e três anos, permaneceu impávida. —Desconheço o motivo disso. Ramiel sim o conhecia.
  • 54. Edward Petre tinha passado a noite com sua amante. E indubitavelmente Elizabeth Petre também sabia. Aonde ela teria ido pela manhã, deixando sua casa antes da hora em que acostumavam sair às damas da alta sociedade? As compras? Fazer visitas? Fuga? Não, Elizabeth Petre não fugiria. Nem da infidelidade de seu marido nem de um acordo com um Sheik bastardo. — Aonde foi o marido depois de jantar? —Ao edifício do Parlamento. Permaneceu ali até as duas da manhã. Logo voltou para casa. Está lá agora. Como também estaria Elizabeth breve. Teriam leitos matrimoniais separados... Ou compartilhariam o mesmo? Imediatamente, Ramiel rechaçou a idéia de que Elizabeth compartilhasse a cama com outro homem. Não poderia sair de sua casa se assim fosse. Mas isso não significava que não pudesse reunir com seu marido em sua cama. Sentiu uma punhalada de ira em seu interior. Elizabeth Petre sabia o que era um orgasmo. Tinha-o aprendido de seu marido? Podia penetrar em sua fria reserva inglesa sob a aparência de decoro e lhe deixar alcançar o topo do prazer? —Não descobriu a identidade da amante de Edward Petre? - Disse Ramiel em tom imperioso. Os olhos negros de Muhamed brilharam. —Não. —E, entretanto deixaste sua casa sem vigilância. Ordenei-te que o seguisse até que descobrisse quem é a amante. —Acreditei oportuno voltar, Ibn. Ramiel não se deixou enganar pelo estoicismo de Muhamed. Seus escuros olhos de Cornualles irradiavam desaprovação. —Se explique. —A senhora Petre é um problema.
  • 55. Não parecia ser um problema, apoiada na beirada da poltrona vermelha, fazendo equilíbrios com sua bolsa, suas luvas e suas notas. Seu pálido rosto emoldurado pelo horrível chapéu negro tinha sido a imagem do decoro até que lhe tinha explicado que um homem amassa e esmaga seu corpo dentro de uma mulher como se fosse uma «maça». Então seus claros olhos cor avelã se acenderam de ardor. Seus soberbos seios se avultaram dentro de seu vestido de lã, sensíveis. Tão sensível às palavras. Ao suave toque do tecido esfregando contra a pele livre das ataduras. A cada respiração, seus mamilos foram ficando cada vez mais duros. Não era seu corpo o que ela tentava sujeitar com as barbatanas do espartilho. Eram seus desejos. Que tipo de homem era Edward Petre que preferia abster da paixão genuína, pelo prazer pago? Ramiel apoiou o queixo sobre a ponta de seus dedos, ocultando-se atrás de uma dura inflexibilidade seus pensamentos e uma fome voraz e repentina. —Talvez seja assim. Mas é meu problema. — Esqueceste, Ibn? Cada vez que Muhamed o chamava Ibn, Ramiel o recordava. Algumas vezes, esquecia... Quando tinha sexo com alguém. Elizabeth Petre o fazia esquecer só com as palavras. Quanto tempo havia passado de que Ramiel tinha desejado uma mulher... E não simplesmente para esquecer? Quanto tempo havia passado de que tinha rido? —Não esqueci, eunuco. - Replicou fria e deliberadamente, Ramiel. Muhamed voltou à cabeça bruscamente. Imediatamente, Ramiel se arrependeu de suas palavras. Muhamed não tinha pedido para levar a carga que lhe tocava, como tampouco ele a sua. Perguntou-se como sobrevivia seu criado, incapaz de escapar a seu passado dentro do corpo de uma mulher,
  • 56. embora fosse brevemente. Pelo menos Ramiel tinha esse privilégio. Minutos inteiros, aonde o único que importava era o som da carne que investia, úmida e o calor suave de uma pele feminina possuindo-o, absorvendo-o até que lhe tirasse a dor e deixasse só a lembrança. Rogava a Alá e a Deus para que lhe permitisse encontrar uma mulher que pudesse aceitar o que ele não era capaz de suportar. —Vá. - Ordenou Ramiel brandamente, controlando a fúria e a repugnância que sentia por si mesmo. – Contrate alguém. Não me importa o que custe. Quero saber tudo o que faz Edward Petre. Todos os lugares que visita. Todas as pessoas com quem fala. Todas as mulheres com as quais se deitou alguma vez. Eu quero me inteirar. E espero que não me volte a falhar. Com o corpo tenso como a cimitarra que levava sob as dobras da capa e seu thobs, Muhamed se dispôs a se retirar da biblioteca. Ramiel baixou a vista para a xícara vazia que descansava perto de seu cotovelo. A xícara cheia que Elizabeth Petre tinha deixado rapidamente depois de dar um gole no quente café turco. Muhamed tinha razão. Uma mulher como Elizabeth Petre podia causar a um homem como ele, muitos problemas. Aqui, na Inglaterra, ele estaria preparado. —Muhamed. O homem da Cornualles se deteve ante o som da voz de Ramiel, com a mão a ponto de fechar a porta. —Não repetirei os enganos que cometi no passado. CAPÍTULO IV
  • 57. Um estrondoso som metálico afastou bruscamente Elizabeth debaixo do corpo nu do Sheik Bastardo. Um aroma espesso invadia o ar. “E por quê, sente estima você, Lorde Safyre? Por uma mulher, senhora Petre. Uma mulher quente, úmida e voluptuosa, que não teme sua sexualidade e nem sente vergonha de satisfazer suas necessidades”. Elizabeth abriu os olhos de repente. A face redonda e simpática de Emma estava envolta em fumaça, inclinou sobre a mesinha junto à cama, fazendo girar uma colher dentro de uma xícara de porcelana. Uma pequena jarra descansava ao lado da xícara, sobre uma bandeja de prata. O aroma forte que impregnava o ar não era o do açucarado do café turco, pensou Elizabeth entre sonhos. Era o doce aroma do chocolate. —Se está doente, Elizabeth, deveria ter enviado uma nota para minha casa. Elizabeth pestanejou. O rosto de sua mãe se fez visível. Estava emoldurada por um chapéu de seda negro. Seus olhos de cor verde esmeralda censuravam Elizabeth, como quando era menina e não tinha completado as expectativas de seus pais. Elizabeth despertou por completo, com o coração palpitando. «Ela sabe o do Sheik Bastardo», foi a primeira coisa que pensou. E imediatamente: como se deu conta? A manhã anterior tinha sido estranha, mas nessa manhã Elizabeth tinha retornado a sua casa as cinco e trinta e cinco, um quarto de hora antes que os criados despertassem. Era impossível que alguém soubesse algo sobre suas duas visitas ao Sheik Bastardo. Mas por que outro motivo estaria sua mãe ali...? - Deveria ter enviado uma nota para mim. Perfurou as trevas de seu sonho e o
  • 58. incipiente temor lhe paralisou. Elizabeth olhou rapidamente para a janela. Era terça-feira. Sua mãe e ela sempre iam às compras as terças-feiras pela manhã. Depois almoçavam juntas. A julgar pela cinza luz invernal que entrava pelas cortinas, era quase meio-dia. O sangue quente se amontoou na face de Elizabeth. Emma e sua mãe estavam a seu lado observando-a, enquanto ela sonhava que o Sheik Bastardo se ocupava de seu corpo como se seu membro viril fosse realmente uma maça e ela uma erva pertinaz que devia ser totalmente amassada e esmagada até a submissão. “Taliba, ele tinha lhe sussurrado, investindo forte e profundamente. Mova seus quadris para mim...” Apertou suas pálpebras, consciente do áspero sabor do café turco que seguia em sua boca e o desejo frustrado que continuava palpitando no mais profundo de seu ser. Emma se atrasou um pouco em servir o chocolate quente. Uma faísca de ressentimento se acendeu dentro de Elizabeth. Sua mãe não deveria estar em sua casa e o Sheik Bastardo não deveria estar em seus sonhos. Abriu os olhos, se voltou sobre suas costas e forçou um sorriso. —Bom dia, mãe. Temo que dormi demais. Se me esperar na sala, me vestirei em seguida me reunirei a ti. Emma, por favor, acompanhe minha mãe e mande servir o chá. —Muito bem, senhora. Sua criada deu um passo atrás e sua mãe deu um passo adiante. - Sua face estão vermelhas, filha. Se estiver doente, não há necessidade que se levante. Sinto ter interrompido seu sonho, mas estava preocupada. Na segunda-feira você cancelou todos seus compromissos e agora isto. Sabe que seu pai está preparando Edward para que se apresente ao primeiro-ministro quando ele se retirar. Deve abonar o caminho para ele, tal como eu o faço para seu pai.
  • 59. O sorriso se congelou no rosto de Elizabeth. Rebecca Walters estava preocupada... Porque Elizabeth não tinha cumprido com suas obrigações. As únicas lembranças que tinha Elizabeth de sua infância eram de sua mãe «abonando» o caminho para seu pai. Cada momento livre, cada faísca de energia e cada ato de caridade tinham sido dedicados a uma causa política. — Alguma vez se cansa, mãe? Os olhos cor verde esmeralda se abriram com impaciência. —É obvio que sim. Também seu pai. E também seu marido, devo acrescentar. Disso se trata tudo. - Assinalou Elizabeth na cama. - Você na cama... Porque está cansada? Sim, isso era exatamente do que se tratava, pensou Elizabeth com um misto de raiva. Estava cansada... Cansada de ocupar o quarto lugar em seu marido. Edward tinha sua política, sua amante, seus filhos e logo depois sua esposa. Só por uma vez em sua vida gostaria de ser a primeira. Somente uma vez em sua vida gostaria de ficar na cama, livre de compromissos sociais, junto a um homem que a amava. —Não, mãe, não estou cansada. Ontem à noite tive uma enxaqueca e tomei láudano para acalmar a dor. - Mentiu Elizabeth, plenamente consciente de Emma, que rondava pela porta e tinha que saber que estava mentindo. - Talvez tomei uma dose excessiva. — E na segunda-feira? Elizabeth forçou um sorriso. E adicionou outra mentira: —O decano chamou. Queria falar comigo imediatamente, por isso... — O que tem feito Phillip agora? Poderia ter sido gracioso. Sua mãe repetindo as palavras que a própria Elizabeth tinha perguntado ao decano. Não era. Enquanto que Elizabeth considerava as travessuras de seu filho como uma diversão passível, sua mãe criticava a gritos, as inocentes maldades de Phillip.
  • 60. —Não foi nada. - Se apressou em dizer. – Ele esteve envolvido numa discussão com outro menino. Se não me visto logo, mãe, fará muito tarde para almoçar. Emma... Elizabeth se surpreendeu ligeiramente pela maneira em que Emma empurrou suave, mas firmemente Rebecca Walters do quarto. À jovem não tinha movido um fio de cabelo quando escutou a mentira de Elizabeth. Talvez Edward tivesse «abonado» a casa, para o engano, pensou cinicamente. Levantou a colcha e arrastou suas pernas até a beirada da cama. Tinha as pernas pálidas e os tornozelos magros, embora não delicados. O roçar de suas coxas ao se mover para ao outro lado do colchão lhe provocou um atrito morno e úmido. “Sabe você o que é um orgasmo, senhora Petre”? - Preparo-lhe o banho, senhora? Elizabeth segurou o lençol com as duas mãos para se sujeitar à cama. Emma estava em pé na entrada do quarto, observando com indiferença para ela, cuja camisola lhe tinha subido acima dos joelhos. Deslizou da cama, com o coração pulsando fortemente. —Sim, por favor. Voltou muito rápido. Acreditei que foste acompanhar minha mãe até lá embaixo. —A senhora Walters não quis que a acompanhasse, senhora. Disse-me que certamente você precisaria de mim para vestir. Elizabeth mordeu o lábio inferior para não dizer que Ema era sua criada e que aqui, nesta casa, a esposa do ministro da Economia e Fazenda possuía uma categoria superior a da esposa do primeiro-ministro. Mas em lugar disso disse: —Então é melhor que me apresse. Não deveria ter me deixado dormir até tão tarde. —Por favor, desculpe-me. Pensei que precisaria descansar. A Elizabeth sentiu seu coração acelerar. Saberiam os criados...? Sentia os lábios frios e duros.
  • 61. — Por que pensou isso, Emma? —Tem uma agenda muito apertada, senhora. Algumas vezes acredito que trabalha mais que o senhor Petre. As palavras da jovem eram muito enigmáticas, para tranqüilizá-la. Tinha querido dizer que Elizabeth trabalhava muito «abonando» o chão político a favor de seu marido? Ou que Elizabeth tinha uma agenda muito apertada devido a suas recentes escapadas matinais? O banho quente não serviu para dissipar sua inquietação. Devia terminar suas aulas logo, antes que a suspeita se tornasse certeza. Se começasse haver rumores de seus encontros com o Sheik Bastardo, seu matrimônio estaria terminado. E também a carreira de seu marido. Mas inclusive enquanto contemplava a possibilidade de finalizar o quanto antes sua perigosa aprendizagem, seus pensamentos se dirigiram ao” O Jardim Perfumado”, deixando de um lado a razão. O que teria escrito o Sheik no segundo capítulo? Passou a pedra do sabonete sob seus seios. E se perguntou se o Sheik Bastardo teria esfregado alguma vez pétalas de flor contra a pele de uma mulher, naquele lugar. Emma esperava Elizabeth, com várias peças de roupa. Ocultando-se atrás de um biombo esmaltado de branco, Elizabeth colocou alguns calções de algodão, meias de lã e uma regata de linho antes de se reunir com a jovem, para que a ajudasse com o espartilho. Elizabeth conteve o fôlego, para que ela pudesse ajustar bem o objeto. Tinha usado espartilho durante vinte e três anos. Não deveria se sentir como se as barbatanas fosse uma prisão. Não tinha sido assim até agora. O espartilho foi rapidamente seguido de duas anáguas. Elizabeth tentou respirar, inalando o aroma do amido e do sabão de lavar. Como cheiraria a amante de Edward? Perguntou-se. Moveria-se Edward como uma maça enquanto que sua amante balançava os quadris de um lado a outro o acompanhando,
  • 62. lascivamente? Ou seriam certos movimentos sexuais específicos dos árabes? Emma deixou cair um pesado vestido de lã negro sobre as anquinhas de Elizabeth. —Se se aproximar da penteadeira, lhe arrumarei o cabelo, senhora Petre. Elizabeth ficou pálida. Emma lhe tinha penteado o cabelo na noite anterior e lhe fizera, como todos os dias, uma trança. Mais tarde, quando Elizabeth se vestiu para sua aula, tinha utilizado a trança para fazer um coque. Após colocar novamente a camisola e pendurar a roupa para que ninguém soubesse que tinha estado fora da casa, tinha esquecido de soltar o cabelo. —Obrigado, Emma. - Disse com os lábios rígidos. A face de Elizabeth no espelho da penteadeira estava branca como o giz, a mesma cor que o avental de Emma. As mãos robustas e eficientes da jovem se moveram habilmente pelas mechas de cor mogno escuro, desprendendo, desenroscando, torcendo e voltando a prender. Emma deu um passo atrás, com seu queixo quadrado e um pescoço gordinho apareceram no espelho por cima do avental branco. — Quer que lhe aproxime seu joalheiro, senhora? —Não será necessário. —Muito bem, senhora. Elizabeth se deu conta de que Emma seguia sendo um enigma, mesmo depois de dezesseis anos. — Já foi casada alguma vez, Emma? —Não, senhora. Os senhores não promovem o matrimônio entre os criados. —Eu não me oporia.