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Era uma vez uma galinha que todos os dias punha um ovo. E todos os
dias vinha a dona, com uma cestinha, tirar-lho.
- Já pus 1000 ovos. Podia ser mãe de mil filhos. Mas não tenho
nenhum por causa da gente gulosa. – cacarejou certa manhã a
galinha. – Vou fugir.
Se bem o pensou, melhor o fez. Quando a dona entrou na capoeira,
como de costume, esgueirou-se pela porta aberta. Só parou na mata.
Logo aí tratou de fazer o seu ninho com folhas secas, palhas,
penugem, farrapos de lã. Nunca se vira ninho mais lindo, redondo,
confortável. Sentou-se nele e pôs um ovo muito branquinho.


-Vou encher a barriga antes de começar a chocar, que aqui
ninguém me traz de comer – resolveu a galinha, afastando-se em
busca de almoço.


Demorou-se, porque ali tudo lhe era estranho.
Quando voltou, qual não foi o seu
espanto ao ver o ninho cheio de
ovos de todos os tamanhos e
feitios.

-Cocorocó… Que vem a ser isto? –
disse ela. – Na minha capoeira
tiravam-me os ovos, aqui oferecem-
mos. Mas que sorte. E logo se
aninhou.

Daí por diante, a galinha mal saía
do choco. Estava preguiçosa,
sentia o corpo quente como uma
botija.

O tempo foi passando. Quanto, não
sabia, porque não aprendera a
contar nem se guiava pelo
calendário.
Até que…crac! O primeiro ovo estalou e de lá saiu um bicharoco de
bico retorcido.
                        - Ai, mas que filho,
                          eu até desmaio!
                          Em vez de ser pinto
                          é um papagaio.
- exclamou a galinha.
No dia seguinte, outro ovo se abriu e de lá saiu, rastejando, uma
criatura comprida e sarapintada.


                          Ai, mas que filho,
                        como ele é diferente!
                         Em vez de ser pinto
                           é uma serpente.
- exclamou a galinha.
Nessa     mesma     tarde,   o
maior de todos os ovos
partiu-se      ao   meio.    A
galinha             espreitou,
desconfiada. Ao ver o que
tinha à sua frente, pôs-se
a cacarejar:

    Ai, mas que filho,
        este é de truz!
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     é uma avestruz.
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curiosa, picou um deles. Mas ia caindo para o lado.

                       Ai, mas que filho!
                       Deve vir do Nilo!
                      Em vez de ser pinto
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                            Ai, mas que filho!
                            Diz o meu instinto
                            que este finalmente
                            é mesmo um pinto.
- Olhem a minha ninhada! – mostrava ela às galinhas do mato. – É tão
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O papagaio voava para as
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dentro de água e ela não sabia
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rapaz.
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medo      de   uma       galinha?    E
apanhou o frango.
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Aí estava o papagaio, empoleirado numa árvore:
                És ladrão, és ladrão,
                vou prender-te na prisão!
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- Um polícia… - assustou-se o moço. – Deixa-me fugir.
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frango     voltou     para      casa.     Para
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E   por    cima,      a       enfeitar,   sete
berlindes,    um      martelo        e    vinte
pregos,      porque       a    avestruz     só
gostava de pitéus extravagantes.
Depois do jantar, os filhos fizeram uma roda à volta da
galinha e puseram-se a cantar:

                 Somos todos irmãos,
                 somos todos diferentes:
                 há uns que têm bico,
                 outros que têm dentes,
                  há uns que têm escamas,
                  outros que têm asas,
                   na terra e na água
                  fazemos nossas casas.
                   Eu só tenho pescoço
                    Eu voo pelo ar.
                   Eu nado a quatro patas.
                    Eu cá gosto de andar.
                    Somos todos diferentes
                   mas todos queremos bem
                     à boa galinha
                    que é nossa mãe.
                                      Luísa Ducla Soares
FIM

Autor: Profª Mª do Céu Vilas Boas

Adaptação: Profª Júlia Carvalho

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  • 1.
  • 2. Era uma vez uma galinha que todos os dias punha um ovo. E todos os dias vinha a dona, com uma cestinha, tirar-lho. - Já pus 1000 ovos. Podia ser mãe de mil filhos. Mas não tenho nenhum por causa da gente gulosa. – cacarejou certa manhã a galinha. – Vou fugir. Se bem o pensou, melhor o fez. Quando a dona entrou na capoeira, como de costume, esgueirou-se pela porta aberta. Só parou na mata.
  • 3. Logo aí tratou de fazer o seu ninho com folhas secas, palhas, penugem, farrapos de lã. Nunca se vira ninho mais lindo, redondo, confortável. Sentou-se nele e pôs um ovo muito branquinho. -Vou encher a barriga antes de começar a chocar, que aqui ninguém me traz de comer – resolveu a galinha, afastando-se em busca de almoço. Demorou-se, porque ali tudo lhe era estranho.
  • 4. Quando voltou, qual não foi o seu espanto ao ver o ninho cheio de ovos de todos os tamanhos e feitios. -Cocorocó… Que vem a ser isto? – disse ela. – Na minha capoeira tiravam-me os ovos, aqui oferecem- mos. Mas que sorte. E logo se aninhou. Daí por diante, a galinha mal saía do choco. Estava preguiçosa, sentia o corpo quente como uma botija. O tempo foi passando. Quanto, não sabia, porque não aprendera a contar nem se guiava pelo calendário.
  • 5. Até que…crac! O primeiro ovo estalou e de lá saiu um bicharoco de bico retorcido. - Ai, mas que filho, eu até desmaio! Em vez de ser pinto é um papagaio. - exclamou a galinha.
  • 6. No dia seguinte, outro ovo se abriu e de lá saiu, rastejando, uma criatura comprida e sarapintada. Ai, mas que filho, como ele é diferente! Em vez de ser pinto é uma serpente. - exclamou a galinha.
  • 7. Nessa mesma tarde, o maior de todos os ovos partiu-se ao meio. A galinha espreitou, desconfiada. Ao ver o que tinha à sua frente, pôs-se a cacarejar: Ai, mas que filho, este é de truz! Em vez de ser pinto é uma avestruz.
  • 8. Faltavam ainda dois ovos. Que esconderiam lá dentro! A galinha curiosa, picou um deles. Mas ia caindo para o lado. Ai, mas que filho! Deve vir do Nilo! Em vez de ser pinto é um crocodilo.
  • 9. Ainda se não tinha calado quando sentiu um reboliço no último. Ao ver uma penugem amarela, bateu as asas de contentamento e escancarou o bico: Ai, mas que filho! Diz o meu instinto que este finalmente é mesmo um pinto. - Olhem a minha ninhada! – mostrava ela às galinhas do mato. – É tão variada, é tão engraçada. - Trata só do teu pinto. Não ligues aos outros bichos. – aconselhava a perdiz.
  • 10. Mas como podia ela abandoná-los depois de os ter chocado com tanto amor? Que outra mãe havia de tratar deles? Era feliz, mas vivia num desassossego. O papagaio voava para as árvores e ela não sabia voar.
  • 11. O crocodilo só estava bem dentro de água e ela não sabia nadar.
  • 12. A serpente metia-se por todos os buracos e ela era gorda demais para a poder ir buscar.
  • 13. A avestruz, essa, devorava tudo, não havia comida que lhe chegasse.
  • 14. Só o pinto, naturalmente, se portava como um pinto.
  • 15. Mas ela de todos gostava. De todos cuidava.
  • 16. Coçava a serpente quando ela tinha cócegas, porque à pobrezinha faltavam as patas.
  • 17. Enrouquecia de tanto tagarelar com o papagaio, que queria sempre conversa.
  • 18. Cansava-se a carregar petiscos para a comilona da avestruz.
  • 19. Esgravatava o chão em busca de sementes para o pinto.
  • 20. E nos intervalos lavava as dentuças ao crocodilo.
  • 21. Tudo parecia correr bem até que apareceu no bosque um rapaz. - Ah, que belo frango! – disse ele, ao ver o filho verdadeiro da galinha. . -Vou assá-lo para o jantar. - Cocorococó – refilou a galinha, o que quer dizer na sua língua «Não lhe toques, senão pico-te». O rapaz riu. Pois, quem tem medo de uma galinha? E apanhou o frango.
  • 22. Foi então que a serpente, ao ver o que se passava, se pôs a assobiar à sua frente, mostrando os dentes de veneno. - Ai, uma serpente! – gritou ele e atirou-se ao lago para lhe escapar.
  • 23. Foi a vez de o crocodilo avançar de boca aberta. - Ai, que este me come! – gritou novamente o rapaz, subindo para a outra margem, sempre com o frango debaixo do braço.
  • 24. Aí estava o papagaio, empoleirado numa árvore: És ladrão, és ladrão, vou prender-te na prisão! És ladrão, és ladrão, vou prender-te na prisão! - Um polícia… - assustou-se o moço. – Deixa-me fugir.
  • 25. Mas logo atrás de si começou a ouvir uns passos, primeiro distantes, depois cada vez mais próximos. A grande velocidade. Era a avestruz. Apavorado, pensando que um polícia o perseguia, o rapaz largou a ave e só parou, esbaforido, na aldeia.
  • 26. Às costas da irmã avestruz, o frango voltou para casa. Para festejar, a galinha juntou todos os filhos e fez-lhes um bolo com vários andares. Um tinha milho para o frango. Outro, peixe para o crocodilo. Outro, fruta para o papagaio. Outro, ratos para a serpente. E por cima, a enfeitar, sete berlindes, um martelo e vinte pregos, porque a avestruz só gostava de pitéus extravagantes.
  • 27.
  • 28. Depois do jantar, os filhos fizeram uma roda à volta da galinha e puseram-se a cantar: Somos todos irmãos, somos todos diferentes: há uns que têm bico, outros que têm dentes, há uns que têm escamas, outros que têm asas, na terra e na água fazemos nossas casas. Eu só tenho pescoço Eu voo pelo ar. Eu nado a quatro patas. Eu cá gosto de andar. Somos todos diferentes mas todos queremos bem à boa galinha que é nossa mãe. Luísa Ducla Soares
  • 29. FIM Autor: Profª Mª do Céu Vilas Boas Adaptação: Profª Júlia Carvalho